1 Produção Textual Prof. Volney Tigrão Texto literário e não-literário Leia os textos a seguir: Texto 1 Pais terão de indenizar professor ridicularizado no Orkut Valor estabelecido era de R$ 20 mil, mas após acordo, caiu para R$ 15 mil; ainda cabe recurso. A Justiça de Rondônia condenou pais de 10 adolescentes a pagarem R$ 15 mil para reparar os danos morais causados ao professor Juliomar Reis Penna. Os estudantes criaram, em 2006, uma comunidade no site de relacionamentos da Google, o Orkut, em que ridicularizam o professor de matemática. Os adolescentes eram alunos de uma escola particular de Cacoal, a cerca de 470 quilômetros de Porto Velho, capital do Estado. Eles já haviam sido condenados a cumprir medidas socioeducativas, entretanto, a vítima também entrou com um pedido de tutela jurisdicional, para que os pais fossem responsabilizados civilmente pelos atos dos filhos. O acórdão da decisão foi publicado no último dia 18, pela 2ª Vara Cível do Tribunal de Justiça. O primeiro valor fixado pelo juiz Edenir Sebastião Albuquerque da Rosa, era de R$ 20 mil, que após recurso das partes, teve redução, e deve ser pago de forma proporcional, ficando os pais da menina que criou a comunidade com maior fatia, algo em torno de R$ 2,6 mil. O restante será dividido de forma igual entre os outros pais. O professor, que não quis comentar muito sobre a decisão, disse que o seu objetivo não foi conseguir dinheiro. "O meu foco era a retratação, não tanto a questão financeira", argumenta. Além de ofensas relativas à obesidade e às roupas de Juliomar, os alunos, segundo a Justiça, os adolescentes também teriam ameaçado furar os pneus de seu carro. A condenação ainda cabe recurso, mas segundo a advogada Ivone Ferreira Magalhães, que representa Juliomar, ao menos o advogado de duas, das 19 pessoas condenadas, já manifestou que seus clientes não têm a intenção de recorrer da sentença. www.opovo.com.br/brasil/820747.html Observe que o texto 1 tem função de informar, isto é, tem linguagem com função utilitária. Texto 2 Da solidão Cecília Meireles Há muitas pessoas que sofrem do mal da solidão. Basta que em redor delas se arme o silêncio, que não se manifeste aos seus olhos nenhuma presença humana, para que delas se apodere imensa angústia: como se o peso do céu desabasse sobre sua cabeça, como se dos horizontes se levantasse o anúncio do fim do mundo. No entanto, haverá na terra verdadeira solidão? Não estamos todos cercados por inúmeros objetos, por infinitas formas da Natureza e o nosso mundo particular não está cheio de lembranças, de sonhos, de raciocínios, de idéias, que impedem uma total solidão? Tudo é vivo e tudo fala, em redor de nós, embora com vida e voz que não são humanas, mas que podemos aprender a escutar, por muitas vezes essa linguagem secreta ajuda 2 a esclarecer o nosso próprio mistério. Como aquele sultão Mamude, que entendia a fala dos pássaros, podemos aplicar toda a nossa sensibilidade a esse aparente vazio de solidão: e pouco a pouco nos sentiremos enriquecidos. Pintores e fotógrafos andam em volta dos objetos à procura de ângulos, jogos de luz, eloqüência de formas, para revelarem aquilo que lhe parece não só o mais estático dos seus aspectos, mas também o mais comunicável, o mais rico de sugestões, o mais capaz de transmitir aquilo que excede os limites físicos desses objetos, constituindo, de certo modo, seu espírito e sua alma. Façamo-nos também desse modo videntes: olhemos devagar para a cor das paredes, o desenho das cadeiras, a transparência das vidraças, os dóceis panos tecidos sem maiores pretensões. Não procuremos neles a beleza que arrebata logo o olhar, o equilíbrio das linhas, a graça das proporções: muitas vezes seu aspecto – como o das criaturas humanas – é inábil e desajeitado. Mas não é isso que procuramos, apenas: é o seu sentido íntimo que tentamos discernir. Amemos nessas humildes coisas a carga de experiências que representam, e a repercussão, nelas sensível, de tanto trabalho humano, por infindáveis séculos. Amemos o que sentimos de nós mesmos, nessas variadas coisas, já que, por egoístas que somos, não sabemos amar senão aquilo em que nos encontramos. Amemos o antigo encantamento dos nossos olhos infantis, quando começavam a descobrir o mundo: as nervuras das madeiras, com seus caminhos de bosques e ondas e horizontes; o desenho dos azulejos; o esmalte das louças; os tranqüilos, metódicos telhados... Amemos o rumor da água que corre, os sons das máquinas, a inquieta voz dos animais, que desejaríamos traduzir. Tudo palpita em redor de nós, e é como um dever de amor aplicarmos o ouvido, a vista, o coração a essa infinidade de formas naturais ou artificiais que encerram seu segredo, suas memórias, suas silenciosas experiências. A rosa que se despede de si mesma, o espelho onde pousa o nosso rosto, a fronha por onde se desenham os sonhos de quem dorme, tudo, tudo é um mundo com passado, presente, futuro, pelo qual transitamos atentos ou distraídos. Mundo delicado, que não se impõe com violência: que aceita a nossa frivolidade ou o nosso respeito; que espera que o descubramos, sem se anunciar nem pretender prevalecer; que pode ficar para sempre ignorado, sem que por isto deixe de existir; que não faz da sua presença um anúncio exigente. “Estou aqui, estou aqui!” Mas, concentrado em sua essência, só se revela quando os nossos sentidos estão aptos para o descobrirem. E que em silêncio nos oferece sua múltipla companhia, generosa e invisível. Oh! se vos queixais de solidão humana, prestai atenção, em redor de vós, a essa prestigiosa presença, a essa copiosa linguagem que de tudo transborda, e que conversará convosco interminavelmente. (Cecília Meireles. Escolha o seu sonho. 21ª ed. Rio de Janeiro/São Paulo, Editora Record, 1998.) Como você pode perceber pela leitura dos dois textos, há algumas características que os diferenciam. Vale lembrar que apenas o conteúdo não serve como base para a classificação de texto literário e não-literário, visto que não há conteúdos exclusivos para cada tipo de texto. Nem se pode afirmar que a distinção entre eles se dá pelo fato de o primeiro ser real e o segundo, fictício. Vejamos, então, no quadro a seguir, as principais diferenças entre texto literário e nãoliterário. TEXTO NÃO-LITERÁRIO Linguagem com sentido único Denotação Tem função utilitária TEXTO LITERÁRIO Linguagem plurissignificativa Conotação Tem função estética 3 Preso à realidade Linguagem clara e objetiva Predomínio da função referencial da linguagem Documentação da realidade Transcende a realidade Linguagem subjetiva Predomínio da função poética da linguagem Recriação da realidade Texto literário e texto não-literário Relacionando o texto literário ao não-literário, devemos considerar que o texto literário tem uma dimensão estética, plurissignificativa e de intenso dinamismo, que possibilita a criação de novas relações de sentido, com predomínio da função poética da linguagem. É, portanto, um espaço relevante de reflexão sobre a realidade, envolvendo um processo de recriação lúdica dessa realidade. No texto não-literário, as relações são mais restritas, tendo em vista a necessidade de uma informação mais objetiva e direta no processo de documentação da realidade, com predomínio da função referencial da linguagem, e na interação entre os indivíduos, com predomínio de outras funções. A produção de um texto literário implica: · a valorização da forma · a reflexão sobre o real · a reconstrução da linguagem · a plurissignificação · a intangibilidade da organização lingüística “Quer passar, quer passar, o Tigrão vai te ensinar.”