SOCIEDADE 31
PÚBLICO • SÁBADO, 24 SET 2005
Interior e cidades pequenas de
regiões pobres são mais afectados
Governo e autarquias
terão de repensar
estratégia de
expansão dos pólos
do ensino superior
como instrumento
de desenvolvimento
regional
ANABELA CAMPOS
Apesar de haver institutos
politécnicos afectados pela
redução acentuada de alunos
em Lisboa, Coimbra e Aveiro, a
esmagadora maioria da escolas
abrangidas por este fenómeno
situam-se no interior do país
e em cidades relativamente
pequenas das regiões menos
favorecidas.
É, por exemplo, o caso do Instituto Politécnico de Bragança,
onde várias escolas registaram
perdas superiores a 50 por cento no número de alunos colocados na 1.ª fase do concurso
de acesso ao superior e onde
há uma grande taxa de vagas
sobrantes. Mas também, entre
outros, dos institutos politécnicos de Beja, Setúbal, Viana do
Castelo, Santarém, Castelo
Branco, Guarda, Tomar, Viana
de Castelo e Portalegre. Em algumas das suas unidades, não
foram preenchidas sequer 30
por cento das vagas.
A tendência de perda de
alunos está igualmente a afectar algumas universidades
do interior, nomeadamente a
Universidade da Beira Interior
(UBI) e a Universidade de Évora, embora aqui situação seja
menos preocupante. A UBI e a
Universidade de Évora registaram quebras de cerca de 17
por cento no número de colocações efectuadas nos últimos
dois anos.
A situação agrava-se se tivermos em conta que as duas
universidades só conseguiram
ocupar, respectivamente, 63,1
por cento e 54,6 por cento das
vagas colocadas à disposição.
Nos lugares cimeiros na lista
das universidades com uma
maior número de vagas por
preencher estão também a
Universidade dos Açores (62,7
por cento) e a Universidade do
Algarve (62,7 por cento).
Se 2005 é um ano decisivo para repensar o ensino superior
politécnico, a falta de alunos
irá também obrigar o Governo e as autarquias a rever a
estratégia de expansão dos
estabelecimentos de ensino superior como factor de estímulo
ao desenvolvimento regional.
Hoje verifica-se que canalizar
investimentos para a instalação de instituições de ensino
em regiões menos desenvolvidas por si só não chega, se não
houver argumentos suficientes
para atrair os alunos.
“A permanência da diminuição do número de alunos
nestas instituições, localizadas
em cidades onde têm um forte
impacte na vida económica,
social e cultural, poderá con-
tribuir para acentuar as assimetrias regionais já existentes
em Portugal”, afirma Manuel
Caldeira Cabral, professor do
departamento de Economia da
Universidade do Minho.
O economista, que fez um
levantamento da ocupação
da vagas no ensino superior
público nos últimos três anos,
salienta que esta situação
“serve para ilustrar os limites
de uma política de expansão do
ensino superior que privilegie
sobretudo objectivos de desenvolvimento regional”.
Antes de avançar para
construção de pólos de ensino
superior é preciso ter em conta
variáveis como, por exemplo, a
evolução da população jovem
local; o tipo, a empregabilidade
e a variedade de cursos; os padrões de qualidade do ensino,
defende Manuel Caldeira Cabral. Hoje a oferta é superior
à procura — 46.399 vagas para
38.976 candidatos — e os alunos
inevitavelmente irão optar
pelas universidades de maior
qualidade.
Caldeira Cabral aponta como um dos caminhos possíveis
para os politécnicos a entrada
no mercado da formação profissional, actualmente gerida por
instituições sem competência
pedagógica, como associações
industriais e comerciais. ■
O mergulho da contabilidade
Tradicionalmente, os cursos ligados às contas e à gestão
do mundo empresarial têm estado entre aqueles com
maior empregabilidade, uma realidade que poderá estar
a alterar-se. É que os dados da 1.ª fase das colocações no
ensino superior deste ano atiram para os lugares cimeiros da lista das instituições que mais vagas deixaram
por preencher o Instituto Superior de Contabilidade e
Administração de Lisboa (ISCAL) e o Instituto Superior
de Contabilidade e Administração de Aveiro (ISCA), com
uma quebra de, respectivamente, 84,3 por cento e 84,1
por cento, nos alunos colocados nos últimos dois anos.
O ISCAL é o segundo maior instituto do país na área da
contabilidade, mas viu o número de alunos admitidos na
primeira fase reduzir-se de 272 em 2004 para 43 em 2005.
O ISCA preencheu apenas 21 das 200 vagas existentes.
Engenharia e gestão em perda
Os alunos estão a escassear nos cursos de engenharia
e nas áreas de tecnologia e gestão. Os dados deste ano
revelam que o número de colocados nas áreas de engenharia desceu em mais de 800 alunos, com o Instituto
Superior de Engenharia de Lisboa a destacar-se, devido
uma quebra de 40 por cento. Mas as escolas superiores
de tecnologia e gestão não estão melhor: no seu conjunto
perdem mais de 1200 colocações. Apesar de excepções,
como o Instituto Politécnico de Viseu, a maioria das
instituições não conseguem preencher mais de 40 por
cento das vagas. Esta situação contrasta com a da área
da saúde. Vinte e nove dos 50 politécnicos que conseguiram manter ou aumentar o número de colocações
desde 2003 são institutos de tecnologias da saúde ou
escolas de enfermagem, que preenchem cem por cento
das vagas. A.C.
LUÍS EFIGÉNIO
Politécnico de Castelo Branco: as escolas do interior não atraem alunos
ESTABELECIMENTO
IP Lisboa – Inst. Sup. de Contab. e Adm. de Lisboa
U. de Aveiro – Inst. Sup. de Contab. e Adm. de Aveiro
IP Setúbal – Esc. Sup. de Tecnologia do Barreiro
IP Setúbal – Esc. Sup. de Tecnologia de Setúbal
IP Coimbra – Inst. Sup. de Contab. de Coimbra
IP Coimbra – Inst. Sup. de Engenharia de Coimbra
IP Beja – Esc. Sup. Agrária de Beja
U. Algarve – E. S. de Gestão, Hot, e Tur. (Portimão)
IP Viana do Castelo – Esc. Sup. Agrária Ponte de ima
IP Bragança – Esc. Sup. de Tecn. e Gestão de Bragança
IP Santarém – Esc. Sup. Gestão de Santarém
IP Setúbal – Esc. Sup. Ciências Empresariais de Setúbal
IP Santarém – Esc. Sup. Agrária de Santarém
IP Castelo Branco – Esc. Sup. Agrária de Castelo Branco
IP Beja – Esc. Sup. tecnologia e Gestão de Beja
IP V. Castelo – E. Sup. de Tecn. e Gestão de V. Castelo
2005/2003
Var%
Colocados
-84,3
-84,1
-76,2
-71,7
-70,1
-67,1
-60,2
-58,8
-58,5
-58,4
-56,7
-56,6
-56,2
-54,7
-54
-53,7
2005
2004
Var%
Média mínima
Ocupação provas ingresso
12,9
10,5
15
20,5
21,9
17,9
22,8
39,2
30
19,6
36,3
42,5
23,7
28,6
28,6
39,1
93,7
91,1
72,5
65
77,9
88,7
87,4
101,1
92,9
78,9
80,8
90,4
85,2
82
71,7
80,1
Atrasos na impressão
de alguns manuais
Alguns dos manuais escolares escolhidos pelas escolas
para este ano lectivo, que
arrancou há duas semanas,
estão esgotados e outros ainda não foram impressos.
De acordo com a Rádio
Renascença (RR), as lacunas
mais significativas afectam
as novas edições de livros escolares para os 3.º e 6.º anos
do ensino básico e para o 12.º
ano do ensino secundário.
Susana Almeida, da Texto
Editora, admitiu em declarações à RR que há alguns
atrasos na impressão de
certos manuais, mas justifica a demora com o facto de
só em Julho os professores
indicarem às editoras quais
os livros escolhidos para o
ano lectivo que começa em
Setembro.
“As editoras colocam os
livros disponíveis para os
professores analisarem na
altura decidida pelo Ministério da Educação e os
resultados dessas escolhas
por parte dos professores
são disponibilizados aos
editores durante o mês de
Julho”, explicou Susana
Almeida.
“É praticamente impossível conseguir reimprimir tudo no período de
pouco mais de um mês”,
justificou ainda a responsável da Texto Editora.
Mais do que os atrasos das
editoras, a Confederação
Nacional da Associações
de Pais (Confap) critica os
professores.
É que há casos, segundo
afirmou Albino Almeida,
presidente da Confap, de docentes que ameaçam marcar
falta de material aos alunos
sem livros escolares. “Temos
várias denúncias de pais que
dizem que os professores vão
começar a marcar faltas de
material para a semana.”
Albino Almeida classifica
a atitude dos docentes como,
“além de incompreensível,
inaceitável”. ■
Contratados mais
2400 professores
Mais 2374 professores foram
contratados pelo Ministério
da Educação no final da 2.ª
colocação cíclica de docentes.
Os resultados desta fase,
que decorre semanalmente
e que se destina a encontrar
professores para substituir
outros em falta — porque
nem chegaram a assumir
o lugar, por doença, requisição, licenças de maternidade ou outros motivos
— foram divulgados ontem
e podem ser consultados em
www.dgrhe.min-edu.pt.
Das quase 2400 novas colocações, quase metade (1161)
dizem respeito a contratações para todo o ano lectivo.
As restantes são para substituições temporárias.
Até este momento, o Mi-
nistério da Educação já teve
necessidade de chamar 17 mil
professores para além dos
150 mil que são dos quadros.
Destes 17 mil contratados,
a grande maioria (14 mil)
diz respeito a necessidades
para todo o ano lectivo. Mas
só cerca de metade correspondem a horários lectivos
completos.
Com estas contratações
diminui assim para cerca de
23 mil o número de candidatos que se apresentaram ao
concurso de professores para
2005/2006 e que não conseguiram até agora qualquer
colocação.
Os resultados da próxima
colocação cíclica deverão
ser conhecidos na quarta ou
quinta-feira da semana que
vem. ■ I.L.
Governo mexe
no acesso ao superior
Universidades e politécnicos
deverão ter a possibilidade de
definir critérios próprios para
a selecção de alunos de 15 por
cento das suas vagas.
A notícia foi avançada na
edição de ontem do Diário de
Notícias, que cita o ministro
da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Mariano Gago.
O governante explicou que a
esmagadora maioria dos
lugares no ensino superior
continuarão a ser preenchidos à luz das regras em vigor
actualmente.
O que se pretende com a
mudança legislativa que está a ser preparada é dar uma
hipótese aos alunos que,
tendo aptidões para o curso
superior que procuram, não
têm as médias exigidas para
uma colocação através dos
meios tradicionais.
A ideia é que esta possibilidade já esteja em vigor no
próximo ano lectivo, disse
Gago ao DN. Os candidatos
terão na mesma que ter no
mínimo 9,5 valores nas provas de ingresso. Mas “um
estabelecimento da área
técnica poderá, por exemplo,
estabelecer uma prova prática” que será tida em conta
na selecção dos candidatos a
estas vagas especiais. ■
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