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Tendências do Trabalho - Dez/86
VISÃO DOS PATRÕES
8
-r^oÉssíNÕíc^ 'N
o último dia 12, o país assistiu a um movimento político-operário tem precedentes
quantitativos na história do sindicalismo brasi-
leiro.
Contudo, apesar do caráter inédito, a mobilização será lembrada com o estigma da derrota e os
números do fracasso.
O objetivo dos sindicalistas era barrar o Cruzado
II - um alvo fácil, exposto ao rigor da opinião
pública.
De fato, a posição governamental estava bastante
debilitada sem o apoio das camadas médias e
indefinições no meio empresarial.
Porém, o principal erro do governo não residiu
propriamente nas medidas de ajuste de sua política
econômica, mas sim nos preparativos que antecederam a edição das reformas.
Ironicamente, também foi aí que os sindicalistas
erraram.
05 sindicalistas julgaram ter mais apoio do que
realmente tinham e exatamente como o governo,
não prepararam adequadamente seu pacote de
protestos, numa incrível dialética de equívocos de
senso de oportunidade.
Os líderes do movimento analisaram sua força
pelos seus próprios arautos. Fizeram sua avaliação
baseados em suas próprias propagandas.
Os jornalistas favoráveis a greve conseguiram
estampar em importantes órgãos da grande imprensa manchetes que davam conta da eclosão de um
movimento multo maior do que o exeqüível.
E, desta forma, conseguiram apenas assustar
quem quisesse se mobilizar e reduzir os ganhos de
um protesto que não foi geral, mas que setorizademente, ocorreu em todos os cantos do país.
O protesto teve caráter nacional, cumprindo um
dos objetivos dos seus organizadores, embora fosse
incipiente em certos lugares importantes como São
Paulo e Rio de Janeiro. Porém, pela primeira vez
em muitos anos, alcançou o Nordeste.
Na tentativa de greve geral em julho de-1983,
cerca de oois milhões de trabalhadores atenderam à
convocação, isolada, da CUT.
As avaliações feitas agora, a partir de dados do
Ministério do Trabalho e de gabinetes militares, indicam que a manifestação contrária ao Cruzado II
abrangeu cerca de 10 milhões de pessoas. Naturalmente, a população economicamente ativa cresceu
de julho de 1983 a dezembro de 1986. além do
que; desta vez a convocação para a greve geral envolveu a esmagadora maioria de liderença» sindicais
no país.
Assim sendo, estes dez milhões de hoje representam cerca de 20% da população economicamente
ativa atual.
Para quem aceita a tose de que o movimento sindical é como urn muro que se constrói tijolo por tijolo, há razões para flcir otimista ou preocupado,
dependendo de suas convicções Ideológicas.
Entretanto, uma coisa é certa: houve desgate(s)
político e sindical das lideranças da CUT, CGT e
demais confederações.
0 desgaste sindical em verdade já pró-exlstia,
mas está mais nítido do que jamais foi. 0 fato ó
que a chamada massa trabalhadora não obedece às
palavras-de-ordem e não se subordina às lideranças
como estas desejam.
Vale relembrar aqui, os fatos precedentes ao movimento militar de 1964. Naquela oportunidade, os
sindicatos acreditavam que só faltava "tomar o poder', já que a massa trabalhadora os apoiava integralmente. Como sabemos, não foi o que ocorreu...
Desta forma, o episódio da greve geral acentua,
cristaliflomente, o que se poderia chamar de maturidade ou independência dos trabalhadores brasileiros. O mesmo, ou no mesmo grau, não se pode afirmar de suas lideranças.
A composição do desgaste político obtido com a
precipitação deste movimento é facilmente
observável: conseguiu-se, rapidamente, o que parecia muito difícil - ofuscar o desgaste do próprio
governo e lhe devolver a iniciativa política, no que
pela primeira vez se configura concretamente,
como Pacto Social.
Neste cenário político-sindical, as principais alterações nas relações entre capital e trabalho deverão
ser:
- A CGT continuará a manter uma retórica mais
agressiva até junho, em função da disputa com a
CUT pela manutenção do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo;
- Em decorrência, tanto a CGT quanto a CUT poderão levar os metalúrgicos de São Paulo á greve
neste período;
- Muito boas possibilidades de se concretizar o
. chamado Pacto Social, desde que este se traduza,
realmente, num fato político. Isto, porém, nffo
supõe que cessarão as greves por empresas.
QUINZENA
Publicação do Centro de Pastoral Vergueiro
Entidade civil sem fins lucrativos
Correspondência: Rua Vergueiro, 7290 - Caixa Postal 42.761
CEP: 04299 - Ipiranga - SSo Paulo - SP - Fone 273.653>5
mm
TRABALHADORES
QUINZENA
CUT E CGT
Temporada de greves no cenário sindical
GUSTAVO CORRÊA DE CAMARGO
Se depender das lideranças sindicais ligadas à CUT c CGT, a economia vai experimentar, nos próximos meses, um verdadeiro tiroteio, com reajustes salariais sendo
disparados sucessivamente pela escala móvel para todas as categorias de trabalhadores. E o pacto social náo vai passar das reu- .
nióes com o ministro Almir Pazzianotto,
porque nenhum sindicato poderá aceitar um
acordo em que seja prevista uma trégua nas
greve*.
Esse é o cenário com o qual estão trabalhando líderes das duas principais centrais sindicais para os próximos meses. As
reuniões cora o ministro do Trabalho poderio nem continuar, caso seja aprovada,
nesta quarta-feira, em Brasília, a proposta
que será apresentada pela CUT às demais
centrais e confederações, de suspensão do
diálogo com o governo até que sejam
apresentadas propostas concretas para o
atendimento das reivindicações já encaminhadas.
Pior arrocho. Os sindicalistas - como
Luiz Antônio Medeiros, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, ligado à CGT, e Jacó Bittar, da direção nacional da CUT - reconhecem que, com os sucessivos disparos do gatilho salarial, a inflação tende a crescer, recolocando no cenário econômico a corrida salários-preços,
na qual os salários acabam levando a pior.
Mas adiantam que a própria aceleração da
inflação coloca a necessidade da reposição
das perdas.
-. Estamos vivendo um período de arrocho salarial pior que o da época do Decreto-lei 2.065 - diz o dirigente da CUT, Jacó
Bittar.
Pelas contas que fez, tomando como
base a cotação do mercado paralelo, "o salino-mínimo no Brasil, já com o reajuste
do gatilho, é hoje o menor do mundo, exatos USS 30. Nessas condições, e sabendo
que 70% dos trabalhadores ganham até dois
salários-mínimos, comovamos fazer um
pacto cora o governo?1"
Ele rooerfífiece também que, se o salánoMilrmno fosse aumentado em 100%, haveria
una grave Crise de abastecirrcnlo nc> ru''!>:
';A produção está toda voltada para as elites.'' O que a CUT deseja, então, "são medidas concretas do governo qpe demonstrem a intenção de se corrigir esta situação.
E, isso, até agora, não aconteceu. Essa proposta de pacto social é apenas urna encenação. O governo quer ganhar tempo até
acertar as contas externas e atravessar o
período de reajustes nos.preços."
Pressão. Pelo lado da CGT, as previsões náo são menos pessimistas.
- A inflação voltou e não vamos, hoje.
entrar nessa situação assinando um pacto
com o governo. Vamos cuidar é de obter
aumentos salariais - diz Luiz Antônio Medeiros, do Sindicato dos Metalúrgicos de
São Paulo c que, esta semana, encaminhará
às empresas e à Ficsp a reivindicação de
acioruunento imediato do gatilho salarial.
Pelas contas do sindicato, com base nas
estatísticas do Dieesc, a elevação do custo
de vida cm dezembro foi de 15,89% e não
os 6,35% antecipados pelo governo. Isso
eleva a variação do custo de vida desde novembro, quando os metalúrgicos tiveram
seu último dissídio coletivo, para quase
40%.
Não é possível nem pensar em pacto
social, pelo menos sem reajustes expressivos de salários - diz Medeiros, que enfati'
za; - Até as lideranças mais moderadas, nas
fábricas, estão pressionando para que reivindiquemos imediatamente a cobertura das
perdas com a inflação.
A CUT joga, nas negociações com o
governo, com seu peso no movimento sindical e duvida'que o ministro Pazzianotto
possa fazer um pacto sem a sua participação:
O ministro - afirma Jacó Bittar - não
é louco. Ele sabe que as confederações não
tém capacidade de mobilização. São importantes somente na unidade com a CUT e
a CGT.
Relatório Reservado - 12.01.87
Uma convivência mais difícil
Sinais de tensão nas relações trabalhistas
Enquanto as empresas dos grandes
centros deparavam-se, no fina) da
década de 70, com a crescente mobilização dos trabalhadores, em Manaus a convivência com os sindicatos era marcada pela tranqüilidade.
Esse cenário começou a se modificar a partir de janeiro de 1984. Na
ocasião, um grupo de trabalhadores
das indústrias eletroclctrônicas ligado à Central Única dos Trabalhadores (Cul) conquistou a direção do
sindicato dos metalúrgicos de Manaus e desbancou o presidente, encastelado no poder há mais de 10
anos.
A partir daí, as indústrias passaram a conviver com situações até
então conhecidas apenas através dos
noticiários que chegavam do sul,
principalmente do ABC paulista. A
primeira demonstração de força surgiu cm agosto de 1985, quando os
36 mil trabalhadores metalúrgicos deflagraram uma inédita greve geral.
Mais de um ano depois, a categoria
voltou a repetir a dose. Como saldo
dessas mobilizações, os sindicalistas
podem contabilizar importantes conquistas: redução da jornada de trabalho
de 48 horas. para 45 horas semanais;
estabilidade da gestante por 16 meses a
partir do início da gravidez; e piso salarial de 2 salários mínimos (o dobro
do anterior).
• 0f 01H0 EM $Â0 PAULO — Depois da surpresa, devido à falia de tradição sindical na região, as 'empresas começam a
se preparar para -a- nova realidade. O
sindicato das indústrias eletroeletrônicas
tem promovido periodicamente seminários sobre negociação. Todos os anos,
três representantes das empresas são
enviados a São Paulo, onde acompanham as negociações entre a Fiesp e
os metalúrgicos do ABC. "O sindicalismo é um fato histórico que deve ser
enfrentado com inteligência c bom senso", diz Fernando Bonfim, presidente
do sindicato.
Mas, a julgar pelo saldo da última
greve, nem todas as empresas parecem
estar sintonizadas com essa postura. Na
ocasião, foram demitidos, segundo o
sindicato dos trabalhadores, mais de 2
mil trabalhadores,
por sua participação no movimento. O sindicato
dos empregadores
admite que o corte atingiu 600 trabalhadores. "Foi
uma iniciativa individual das empresas contra a
orientação do sinm
X
dicato",
revela
EU
Bonfim.
Qualquer
que
seja o número, o
M
fato revela a falta
t
de maturidade nas
O
relações trabalhis00
tas. Uma situação
., que pode piorar. Ricardo Moraes
presidente do sindicato dos mctalúr
gicos de Manaus, lembra que a as-M
^^www
w
sociação que dirige considera priorilárias a formação de mitilanlcs c a
implantação de comissões de fábrica "Aí as empresas terão de con-
viver diariamente com a organização
dos trabalhadores", adverte ele.
A VISITA
Lá no canto, há uma mesa
mações, material (jornal, infor-
com um montão de papel em cima. É o nosso arquivo. (...) sim,
mativo, etc) ao associado que
sim, temos o plano de trabalho,
deixe ver. . . Está aquil é meio
difícil encontrar.
Já no dia da
avaliação
encontramos.
não
o
Estava no meio daqueles jornais
yelhos. . .
1
Ah . Naquela parede, no prego menor, estão os recados que
chega ali?
- A história das lutas dos tra-
tatos que tiver com o trabalhaoor associado;
— Os arquivo* precisam ser
tratados com a compreensão et*
que "quem não tem a história
balhadores do município, o nome das lideranças, as atividades
organizada e não a conhece, não
em que participaram estão organizadas em arquivos para servi-
vale a dizer quí, sem a hisíórin
rem de suporte às lutas?
organizada, estaremos sempre co
É este o papel da sede
do sindicato?
poderá fazer história". Isto eqüi-
meçando de novo;
— Os programas de rádio que
são produzidos precisam servir à
deixei pro Joaquim. Puxa, acho
No outro
Dentro de uma prática sindi-
luta, não apenas ser uma ladainha
prego, o maior, estão as notas
cal que dá, realmente, força aos
de recados, que acaba consumin-
que deverão ir para a contabili-
trabalhadores, precisamos, com
do o dinheiro dos trabalhadores
dade.
urgência,
sem
que ele nem- os viu1.
Tomamos a precaução de
deixar a janela fechada para o
repensar o
funciona-
mento de nossas sedes.
A CUT - Regional Sudoeste,
vento não esparramá-las.
render em organização e
consciência. . .
Outros aspectos poderiam st;r
... foi quando os grupos do-
no início de 1986, definia como
abordados,
minantes, fazendo nós, trabalha-
um de seus objetivos a médio
leitura das necessidades concretas
de cada momento da organização
dores, pensar do jeito que inte-
prazo, a retirada da previdência
ressava a eles, nós organizamos
e de outras atividades assisten-
nossos sindicatos. A sede funcio-
ciais das sedes dos sindicatos a
nava assim;
ela ligados.
'Temo» uma baita casa, toda
quartinhos
temos
dar o funcionamento da sede e
funcionando
redifinir seu papel, colocando-a
d serviço da luta organizada. Em
cadeira de dentista, laboratório,
ambulatório, farmácia, fichas paNesta fila estão as pessoas
que querem falar com o presidente.
Ali na frente — outra
briga'.
- estão as pessoas dan-
do em cima do funcionário porque o remédio da CEME não
veio este mês. . ."
Saindo daquela sede de sindicato, qualquer um ficaria pensativo:
— Se a sede funciona assim,
como é que estão a consciência
e a organização dos trabalhadores?
— Com aquele enorme prédio, para fazer encontros de formação, estudo (se é que fazem),
há lugar?
algumas, na prática. Eis algumas
propostas:
- A função primeira da sede
há
No entanto
que apontarão as modificações
a fazer.
Uma coisa é certa, pre-
cisamos avançar na coerência de
nossas propostas.
Se nos dize-
mos combativos, não assistencialistas,
precisamos
provar
pela
prática.
No mínimo, para início, precisamos abrir e aprofundar a discussão no sentido de levar o conjunto dos trabalhadores compreender e apoiar as modificações
que precisarão ser feitas com re-
ciados ao par do conjunto das
lação ao funcionamento da sede.
lutas, onentado-os sobre como
agir nos municípios e comunidades de acordo com o plano e
os objetivostraçados;
- O material (livretos, jornal,
panfletos, etc
, .) que deve ser
distribuído aos trabalhadores é
feito como uma das tarefas
fundamentais, dentro do princípio da democratização sindical,
que inclui a informação;
- Os funcionários que trabalham na sede não podem ser
Precisam
consciência
ser
de
preoarados,
ter
classe, assumir
tempo dos funcionários e direto-
as lutas dos trabalhadores e con-
res para receber, repassar infor
tribuir com ela em todos os con-
o
o
g
o»
o
6 n
é manter os trabalhadores asso-
meros "distribuidores de ficha".
— Com aquele envolvimento
atividades assistenciais,
alguns sindicatos, certas propostas avançaram na discussão e,
ra consulta, etc. . .
em
Este seria um pri-
meiro e decisivo passo para mu-
Nestes
dividida em quartinhos.
o
Z
o
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03
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MOTORISTAS DO RIO
GREVES
ELETRICITÁRIOS
Depois de sete dias paralizados, os eletricitários de S. Paulo
e Santos retornaram ao trabalho
no dia 26 de janeiro. A proposta
inicial era de reajuste de 85%.
A empresa ofereceu 30% que
depois de várias assembléias
acabou sendo aceito. A greve
teve a direção da CGT através
de Rogério Magri, presidente
do Sindicato dos Eletricitários.
Na Eletropaulo seus 22 mil
trabalhadores também estraram
em greve com as mesmas reivin
dicações.
Na Light do Rio os 14 mil
trabalhadores entraram em
greve em 22 de janeiro por 33%
de reposição salarial.
Na Cia. Paulista de Força
e Luz, os 3 mil funcionários de
Campinas fizeram uma greve de
3 dias encerrada no dia 23, pois
aceitaram os 30% de reajuste
proposto pela empresa. Agora,
o piso da empresa é de CZ$
4.040,00. Também houve greve
em Franca e Botucatu.
CONGÁS DE SP
Mil e duzentos trabalhadores
da Congás de S. Paulo entraram
em greve em 21 de janeiro por
reivindicações salariais de 85%
de reajuste. A empresa oferece
de 30 a 45% escalonados. Após
diversas assembléias e por
encaminhamento da CGT foi
aeféTra ó índice de 30%' em 26
de janeiro.
MERGULHADORES
Os trabalhadores em atividades sub-aquáticas (mergulhadores) entraram em greve em 21
de dezembro e assim permaneceram por mais de 15 dias.
A proposta dos 800 mergulhadores do país contém 48
Itens incluindo o aumento do
piso de CZ$ 3 mil para CZ$
9 mil,- adicional por desgaste
orgânico e obrigatoriedade de
seguro de vida.
**•* Os cegonheiros entraram
em
greve em 16 de janeiro por
Cento e dez mil motoristas e
reajustes
escalonados de 75 a
e cobradores do estado do Rio
130%
de
acordo
com a distância
fizeram greve de 2 dias parado
transporte
a
ser
feito. Mil e
lizando a região metropolitana
duzentos
cengonheiros
autônomos
carioca. Conquistaram 72,5% de
aderiram
a
greve
para
conseguir
aumento, agora equiparados aos
um
piso
salarial
unificado
e auprofissionais de S. Paulo.
mento de 73,28%. A greve durou
mais de uma semana.
CERVEJARIA
Com uma greve que durou
5 dias, os 3800 trabalhadores
paralizaram as atividades da
Cia. Antarctica Paulista.
Conquistaram de 10 a 20% de
aumentos escalonados. Os dias
parados serão descontados e
não haverá punições.
S. JOÃO DO MERITI
Foram 2200 funcionários
municipais administrativos e de
serviços de rua que pararam
durante 8 dias por aumento
salarial. A greve encerrou-se
em 24 de janeiro após a conquista de 75,4 por cento de
reajuste retroativos a 12 de
janeiro. O piso. salarial passou
para CZ$ 1,6 mil. Conquistaram também estabilidade após
10 anos de serviço, pensão
para os funcionárias que ficaram viúvas de funcionários
municipais, implantação de
plano de carreira, e estudo de
abono de 20% para os aposentados.
*** Setecentos metalúrgicos
dos estaleiros de Porto Alegre
fizeram greve por 70% de reajuste. A empresa propõe acordo
para não descontar os dias para
dos, não punição da volta ao
trabalho e criação de um plano
de carreira. Foram negadas as
reivindicações de estabilidade
no emprego e redução da jornada.
*** Plásticos: ATMA (900
trabalhadores), SIPIÃO (200),
PENTAFLEX (16) fizeram greve
reivindicando reajustes de 50 a
60% além da redução da jornada.
*•**• A multinacional
TOURING CLUB DO BRASIL en
frentou uma greve de seus motoristas socorristas, operadores
de rádio e mecânicos por piso
salarial de CZ$ 4.500,00 e
melhores condições de trabalho.
SETORES
CURTAS
*** Os carreteiros de adubos
do Porto de Santos fizeram
greve de mais de 5 dias devido
à morosidade com que é feita
o descarregamento dos navios.
Eles acusam a Cia. Docas de
exercer uma má administração.
Alguns navios estão atracados
há mais de 3 meses.
Nas Docas pararam ainda
400 ferroviários que trabalham
também no desembarque de
cargas; além destes, pararam
os revistadores, encarregados de
manobras e feitores de mano- .
bras que querem receber adicio^
nai de risco já pagos à alguns
integrantes tia categoria. Reivindicam, outrossim, adicional de
50% pelo trabalho aos domingos.
LEPRA NA USINA
Já foram identificados 28
casos de lepra na Usina
Presidente Vargas, do grupo
estatal Companhia Siderúrgica
Nacional. Vinte e duas das
vitimas puderam se recuperar
pelo tratamento com sulfona.
Além da lepra,- há casos de
ieucopenia em 18 trabalhadores
que operam em área contaminada com benzeno. Para esses
casos não há tratamento possível. Numa explicação simplista,
a CSN afirma que na região de
Volta Redonda tem grande
incidência de lepra e que para
evitar Ieucopenia são distribuídos equipamentos de proteção. _
GREVES EM OUTROS
Viíwxs^;!:
QUINZENA
TRABALHADORES
SINDICALISTA ESPANCADA
Policiais de Governador Valadares, estado de Minas, no
melhor estilo da velha ditadura,
espancaram a diretora do
Sindicato da Alimentação local,
Alalde Pereira de Souza, após
invadirem sua casa e a prenderem ilegalmente no dia 15 de
janeiro. Sem mandado de prisão
e a pretexto de localizar seu
irmão, Alalde foi presa com
violência e levada para a delegacia onde foi espancada com
um pedaço de pneu durante 4
horas. O delegado Joel Leri
Santos Filho acobertou os
policiais envolvidos, impedindo
a sua identificação.
PRISÕES EM ANÁPOLIS
A CUT-REGIONAL Anápolis,
estado de Goiás, nos informa
que em 10 de dezembro os
militantes da CUT, Juscelino
Martins Polonial, Carlos Alberto
Lima. Adolfo Bressan Neto,
Manoel Pires de Almeida e
Revalino Antônio de Freitas
foram detidos pela PM e
encaminhados para a polícia
federal quando pregavam cartazes da greve geral do dia 12.
Como tem acontecido em outros
locais, a policia tentou reter um
dos veículos o maior tempo
possível. Ao tentarem recuperar
o veículo apreendido, foram
novamente presos e colocados
numa cela de 2 metros quadrados, s.em ventilação suficiente e
com temperatura de 30 graus.
O interrogatório foi feito no
melhor estilo da velha ditadura
e depois foram soltos.
LEILÃO DE GALINHAS
Enquanto a UDR leiloa
milhares de bois para arrecadar
dinheiro, os trabalhadores rurais
sem,terra leiloam galinhas para
custear suas mobilizações em
favor da reforma agrária. Em
Ceres, Goiás, foram leiloadas
1000 galinhas, o que permitiu
arrecadar CZ 58 mil. Participaram juntamente com os sem
terra os sindicatos da região e
a CPT. O dinheiro será utilizado
para compar alimentos e roupas
para os acampados à margens
de rodovias brasileiras em todas
as regiões do país.
ÍNDIOS E POSSEIROS
Um juiz do estado de Minas
concedeu cautelar para os
proprietários da fazenda Ressaca
em Manga, cujo decreto de
despropriação foi assinado em
15 de janeiro passado pelo
presidnete Sarney. A decisão do
juiz agrava o conflito entre os
índios xacriabás e 526 posseiros
moradores na reserva indígena
no município de Itacarambi que
seriam transferidos para a
fazenda Ressaca. Esta fazenda
desapropriada tem apenas 1 por
cento da área aproveitada e 95
por cento da área é cultivável.
mm
m JORNAL
SIN INFORMA
O Serviço de Intercâmbio
Nacional de Petrópolis nos
informa que:
sendo obrigados a queimarem suas
próprias casas.
ROMARIA LIBERTADORA
Será de 8 a 20 de março, sai
saindo de São Mateus, norte do
Espírito Santo e indo até
Vitória. O objetivo é juntar as
forças do povo para favorecer
e apressar a implantação da
reforma agrária de verdade que
atenda os interesses dos traba balhadores rurais e toda a sociedade brasileira. Maiores informações podem ser obtidas na CPT,
Caixa Postal 165, 29930, São
Mateus-ES com o padre Dimas.
AMEAÇAS DE MORTE
*** Em Panças, estado do
Espírito Santo, o lider sindical
Francisco Domingos Ramos,
juntamente com com o advogado Davi Guerra Felipe, foram
ameaçados de morte na própria sede sindical pelo fazendeiro Milton José Breda, no
dia 18 de setembro.
*** Em Linhares, também
no Espírito Santo, José Rainha,
pai do lider sindical José
Rainha Jr. foi confundido com
este e foi alvo de vários disparos no dia 25 de outubro que
felizmente não o acertaram.
Após o atentado frustrado
Júnior foi avisado que estava
na lista para ser morto juntamente com Maria de Fátima
Ribeiro.
1) Em 22 de outubro, 60
posseiros das fazendas Casa de
Telha e Formosa em Januária,
estado de Minas, foram atacados e invadidos por Hermógenes
Gil ae Almeida e João Deira de
Almeida que cortaram arames,
queimaram roças e fecharam
estradas. Os posseiros moram
lá há mais de 20 anos. A empre
sa NOG RUARAL vem tentando
se apossar das fazendas com a
■*** No acampamento em
conivência da justiça local que
São mateus/Nova Venécia-ES,
deu posse aos invasores. O sindj_ José Pinto Vieira, trabalhador
cato de trabalhadores rurais
•rural foi surpreendido à
abriu processo coletivo contra
caminho de casa no dia 23
Hermógenes e João Deira assina de novembro por 2 pessoas
dos por 84 posseiros.
que dispararam, sem acertar,
vários disparos. Quem informa
2) Duzentos e cinqüenta
tais violências no Espírito
famílias se encontram acampadas Santo é a CPT de Vitória.
na sede do GETAT em Marabá,
MIGRAÇÕES
estado do Pará. Eles foram
despejados das fazendas Pedra
Promovido pelo Serviço
Furada e Água Fria que estavam Pastoral dos Migrantes e pelo ,
na lista para serem desapropriaCentro de Estudos Migratórios
das. O despejo foi assinado pela
foi realizado em S. Paulo nos
juíza Ezilda Pestana em favor dos dias 2 a 4 de dezembro o 29
fazendeiros Jarbas Alves e João
SIMPÓSIO DE MIGRAÇÕES NO
José Veloso, desconhecidos na
BRASIL. Presidido pelo bispo da
região. Com o auxílio da polícia, diocese de JI-PARANÁ, estado
os posseiros foram desalojados
de Rondônia, D. Antônio
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WMmMMmM:
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■
(í)
QUINZENA
Possamai, o simpósio reuniu
participantes de vários estados
e a assessoria de conferencistas
da área econômica, sociológica,
sindical, popular e teológica.
Como é sabido, Rondônia vem
sendo marcada nos últimos anos
por um intenso fluxo migratório.
O 25 simpósio contou também
com um representante da CUT
Nordeste, José Novais, com a
deputada estadual pelo PT-SP,
Luíza Erundina e o assessor do
movimento dos bóias-frias da
região canavieira de Ribeirão
Preto, professor José Gebara.
GUAJAJARAS
Durante os dias 23, 24 e 25
de outubro, em Bacurizinho,
município de Grajaú, realizou-se
por iniciativa de algumas lide-
SENHOR - 13.01.87
TRABALHADORES
dos pescadores e a constituinte"
foi o tema central dos debates.
Participaram 175 pescadores
de 14 municípios. Em todo o
estado existem 80 mil pescadores. Embora eles exerçam uma
das atividades mais antigas da
humanidade, não contam com
reconhecimento profissional.
Enfrentam com desvantagens
a concorrência de grandes
empresas nacionais e
estrangeiras, que enviam
parte significativa do pescado
maranhense para outros
PESCADORES
estados do país. Por isso, entre
os assuntos principais do
Os pescadores do Maranhão
encontro, estavam temas como
estão avançando na sua organia organização sindical, poljtica
zação. De 9 a 12 de outubro
pesqueira, história das colônias
aconteceu em São Luis o maior
e assembléia nacional constituinencontro da categoria já realiza
te.
do no estado. " A organização
ranças dos índios guajajaras, a
1^ assembléia indígena do
Maranhão. Pela primeira vez,
mais de cem índios, representando as áreas indígenas de
Caru, Pindaré, Bacurizinho,
Araribóia e Morro Branco se
reuniram para discutir os seus
problemas. Álvaro Tukano,
coordenador da UNI, veio de
Manaus para dar apoio à
Assembléia. Alguns membros do
CIMI estiveram presentes, mas
sem interferir nos debates.
Escândalo Nobistor
O dr. Tuma tem um nome a zelar
O govemo e seu aliado mais tradicional, isto é, a imCrensa, solicitaram pano rápido para o episódio Noistor, beneficiando-se do ameamento da Nação, mais
ocupada com suas compras de Natal do que com a estranha fuga de quatro dos oito mercenários norteamericanos que estavam recolhidos à prisão da Superintendência da Polícia Federal, em Brasília. Estranhamente, não se nota, desde então, da parte da Policia Federal, aquele seu conhecido empenho em caçar bandidos e cm desvendar mistérios, demonstrado, por exemf)lo, um ano atrás, no episódio do assalto a um banco
)aiano por parte cie militantes do PCBR - que a Policia
Federal preteria dizer PT.
Embora o caso Nobistor tenha o sabor de romance
de^spionagem de terceira, parece evidente que alguém
com poder de decisão resolveu conceder a um punhado de submerccnáiios desastrados, pegos com a
mão na botija em março de 1986, com um carregamento clandestino de armas, cm Niterói, tratamento de
primeira. Os quatro fugitivos só o lizcram porque reconhetidainenic lhes faciliuiram as coisas, como a Policia
Federal já lhes havia
ladlitado as coisas, anteiiormente, conceclendo-lhes o beneficio de acreditar, ou
ungir acreditar, numa história inverossimil, a de que as
anuas se destinavam a desestabilizar o governo de um
distante país airicano.
Ninguém parece ter-se imeressado em la/er a esses
senhores algumas pergumas banais, como, por exemplo, por que se decliear a (ão em ia empreiiada, se. aqui
18.01.87
UJ
2d
SN
3 <
üK
mais por perto, seja no Bico do Papagaio, seja na Nicarágua, sempre haveria gente disposta a anemaiai por
boin preço a encomenda.
Convém ao dr. Romeu Tuma, que não é exatameme
o'encarregado-da carceragem, em Brasília, mas que
gosta de assumir as responsabilidades que cabem » «eu
olkio e á sua coiporação, sobretudo quando elas dizem
respeito á tarefa de acusar opositores do governe), que
ele se apresse a apresentar novos esclarecimentos á opinião pública, em benelicio inclusive de sua própria reputação de policial atilado - reputação que, graças á
ossada de Joseph Mengele, tornou-se internacional. O
dr. Tuma, que tem um nome a zelar, não entraria por
iniciativa própria numa barganha de segunda classe.
Proprietários perdem na Justiça para reforma
CO
Z
u
Tratamento
i^r'; do primeira para
' i. mercenários
de terceira
ANA LÚCIA GUIMARÃES
Da Edltorla Nacional
De um total de 313 imóveis decretados de interesse social para fina de reforCD ma agrária. 42 proprietá-
rios impetraram mandados de segurança no Supremo Tribunal Federal contestando o ato presidencial.
Apesar disto, desde a erlaçSo do Plano Nacional de
Reforma Agrária (PNRA).
em outubro de 1!)K5, o go-
verno vem ganhando todos
os julgamentos dos mandados, mesmo nos casos em
que íornm concedidas liminares.
O ano de l!)l!7 começou
com um bom ritmo quanto
ao volume de decretos que
dáo Inicio ao processo desaproprlatório feito pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Inera). Só do dia 12 a 10 de janeiro foram assinados 10
decretos presidenciais, totalizando uma área de
l
WM0mm<Mm
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84.052 hectares com capacidade para assentar 2.093
famílias. Mas somente depois que os decretos s<ío publicados no DIArlu Oficial
da UnlAo 6 que tem Inicio a
maratona do Incra.
As metas previstas no
PNRA para o ano passado
ainda estão longe de serem
atingidas. Esperava-se desapropriar uma área de 4,6
milhões de hectares e assentar 150 mil famílias.
Mas os dados fornecidos
pelo Incra mostram que. de
marco de 1985 a 16 de janeiro de 1987, foram desapropriados 1,5 milhão de hectares e assentadas apenas
12 mil famílias em 7ü projetos atualmente em execução.
Sò mesmo se em 1987 as
tolsas correrem como espera o ministro da Reforma e Desenvolvimento
Agrário, Danla de Oliveira,
através de ações mais
âgels, è que o governo terá
chances de se aproximar
das metas previstas para
este ano no PNRA. Considerando o acúmulo de
famílias náo-assentadas no
ano passado, o Incra deverá Instalar 438 mil delas.
Segundo o ministro, este
ano será decisivo para a
mm
modo a deixâ-10'pronto para ser Implantado quando
judicialmente o Incra possuir o Imóvel. Normalmente, o período entre a Imissão de posse e a Instalação
do projeto chega a seis meses, prazo que pode complicar a vida de uma família
Inteira que necessite da
terra para sua sobrevivência.
"Com a alteração metodológica que fizemos, esperamos não só eficiência no
processo de instalação do
projeto como também um
ganho de qualidade nos assentamentos, já que os próprios beneficiários os
acompanham desde os primeiros passos", diz ainda
Emplnottl. Hoje, existem
40 projetos em fase final de
elaboração, sendo que os Já
em execução ocupam uma
área de 416 mil hectares.
Para que o Incra Iguale
as imlssões de posse com
os projetos de assentamentos não falta muito. Segundo dados de dezembro de
1986, o Incra se Imitiu na
posse em 117 Imóveis —
aproximadamente a metade das áreas decretadas de
Interesse social —, totalizando 453.609 hectares,
com capacidade para assentar 14.352 famílias.
Outro problema no qual o
governo esbarra dentro do
processo de Implantação
do PNRA é a elaboração fle
projetos de assentamento
feitos hoje por um órgão
acostumado a fazer projetos de colonização que são
verdadeiros "paraíso" para os beneficiados. Tentando fugir do tradicional paternalismo do governo, a
recém-crlada diretoria de
Assentamentos do Incra
mudou o sistema de elaboração dos projetos e agora,
tenta um mecanismo mais
rápido e eficaz.
Este mecanismo está relacionado com o tempo gasto tanto para o Incra se [mltar na posse do imóvel de-i
sapropriado quanto para
levar até lá seu projeto de
assentamento. "A'ssim-qu<
temos um decreto de üedú-i
propriação. chamamos ós
demais órgãos envolvidos
na implantação da Reforma Agrária e Iniciamos os
primeiros estudos que levarão ao projeto de assentamento", explica o diretor
de Assentamentos, Aírton
LuizEmpinottl.
O objetivo è fazer com
que o tempo gasto para a
imissão de posse seja equivalente ao necessário para
a elaboração do prc/Jeto, de
Reforma Agrária, já que as
novas diretorias do Incra e
do Mlrad estão se ajustando aos mecanismos de funcionamento dos órgãos.
O processo desaproprlatôrlo è longo. Publicado o
decreto presidencial no
Diário Oficial da Uniflo, o
Incra inicia o processo Junto á Justiça visando imitarse na posse do imóvel decretado de interesse social.
Antes disto, porém, muitos
proprietários entram com
mandado de segurança no
STF e. quando ganham 11ifilnares. suspendem o processo. Dos 42 mandados de
segurança hoje no Supremo. 19 obtiveram liminares.
Este ô processo mais rápido para interromper a
desapropriação -e envolve
diretamente o nome do
Presidente da República.
Existem ainda ações via
Justiça Federal, normalmente contra o próprio Incra nos Estados, que fogem
do controle do governo. A
regiáo Sul é a que mais produz mandados de segurança contra decretos de desapropriação: atualmente,
existem 21 mandados originados nos Estados do Rio
Grande do Sul. Santa Catarina e Paraná.
Governo reconhece:
massacre no campo
já é intolerável
O massacre no campo se intensifica: de 261 assassínios
por questões, çte terras em
1985 se passou para 272 MO
gno passado. Foi brutal o aumento
do número de mortos no Centro-Oeste, de 27 em 1985 para 67 em 1986, o
que indica o agravamento das tensões
no campo nessa região de fronteira
agrícola. Mas continua sendo na Região Norte, também de fronteira
agrícola, o maior número de casos de
assassínios: 101 em 1986, contra 109
em 1985. Ainda em 1986, houve 52
mortes no Nordeste, 47 no Sudeste e
5 no Sul. Diz o relatório "Conflitos
de Terra", um documento reservado
da Coordenadoria de Conflitos
Agrários do Ministério da Reforma e
Desenvolvimento Agrário-Mirad,
que está havendo "um aumento gradativo e incontrolável da criminalidade organizada na área rural, ultrapassando os limites considerados toleráveis e vitimando consecutiva e
principalmente trabalhadores rurais.
EVOLUÇÃO DO NÚMERO DE TRABALHADORES
RURAIS ASSASSINADOS NO BRASIL (1964-86)
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TRABALHADORES
indígenas e membros de entidades
confessionais e de apoio à reforma
agrária" (o documento não diz quais
seriam os "limites considerados toleráveis" para a matança no campo).
Constatando que a maior parte dos
assassínios ao campo são executados
por pistoleiros de encomenda, o documento-assinala: "Dentre os mandantes, incluem-se, além de latifundiários, empresas de mineração, de
empreendimentos imobiliários e
agropecuários".
Se esses são os algozes, quem são
as vítimas? Dos 272 assassinados por
questões de terra no campo no Brasil
em 1986, 129 eram trabalhadores rurais, 21 eram garimpeiros, 12 eram
peões escravos, 9 eram empregados
de fazenda. Em contrapartida, 19
eram fazendeiros, dos quais 6 mortos
em confrontos com trabalhadores e
13 mortos em confronto com outros
fazendeiros. Um dado significativo:
foram mortos 24 pistoleiros. Mas um
número assusta: foram mortos 21 índios, dado impressionante se se considera quão pequena é a proporção
de índios na população brasileira.
Um deles, o padre Josimo Tavares,
na região do Bico do Papagaio, no
Pará.
Foram mortos ainda dois padres,
dois agentes da Comissão Pastoral da
Terra, um pastor batista um comerr
ciantéligado ao PT, um dirigente sindical. A Polícia também foi atingida:
foi morto um delegado e foram assassinados outros cinco policiais. E
tudo indica que as mortes vão coníi- \
MARCADOS PARA MORRER
Pessoas ameaçadas de morte por motivos de conflitos da terra no Brasil no ano de 1986.
Alguns dos 105 casos denunciados ao Governo.
NOME
Joáo Van Der Heyten
Luiz Tozzino
José Domingos Braghetto
Manoel Rodrigues da Silva
Domenico Zocchi
Tomas Feliu Amengal
Creusa Peixoto
Benedito Ulhoa Vieira
Pascasio Rettler
Antônio Possamai
Geraldo Verdier
Aldo Mogiano
Aparecido José Dias
Henrique Froelich
Isidoro Kozinski
Ricardo Resende Figueira
Emannuel Wambergue
Osvaldo de Alencar Rocha
Hamilton Pereira da Sílva
José Aparecido Rodrigues
Adáo Onofre da Silva
Maria Aparecida
Miguel Savio
.Antônio Amorim
ArlhurPowers
Tiago Hahusseau
Orlando Nascimento
Amercino Inácio da Silva
Francisco Vieira de Souza .
Antônio Zanini
Madalena Hausser
Henrique Dez Roziers
Mozart Niel Patrício
Evae Martins dos Santos
Joáo Rodrigues
Itelvino Furlaneto
Adalberto Pacheco
• - ,)
FUNÇÃO
MUNICÍPIO
Vigário
Vereador
Vigário
Padre
Padre
Padre
Irmá
Arcebispo
Bispo
Bispo
Bispo
Bispo
Bispo •
Bispo
Bispo
Padre
Diretor da CPT* Nacional
Advogado da CPT
Assessor CPT Nacional
Lider Sindical ■
Presidente STR*'
Presidente STR
Presidente STB
Presidente STR
Advogado
Padre'
Presidente STR
Presidente STR
Delegado Sindical
Padre
Irmá
Padre
Diretor STR
Advogada
Presidente STR
Presidente STR
Executiva dos Sem Terra
Cananéla
Miracatu
Barrinha
Sobral
Limoeiro do Norte
Itapipoca
Limoeiro do Norte
Uberaba
Bacabal
Ji-Paraná
Guajará-Mirim
Boa Vista
Registro
Sinoo
Três Lagoas
• Conceição do Araguaia
Marabá
Bico do Papagaio
Goiânia
Brasilandia
Carmo do Rio Verde
Unai
Sáo Miguel do Iguaçu
Tauá
'
Araguacema
Jussara
Jussara
Colméiá.
' Arama
Bom Jesus da Lapa
Tocantinópolis
Gurupl
Araguaina
Filadélfia
Ns.Sra. da Glória
Sáo Miguel do Oeste
Teixeira de Freitas
'. Comlstlo Pastoral da T«rr« • " Sindicato dos Trabalhidore* Rurali
ESTADO
SP
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Fonte: Dados levantados pela Comissão Pastoral da Terra, e pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra.
mm
QUINZENA
TRABALHADORES
nuar, A Comissão Pastoral da Terra
e o Movimento dos Trabalhadores
Rurais Sem Terra denunciaram às
autoridades os casos de 105 militantes pela reforma agrária que já foram
ameaçados de morte e que ainda não
foram assassinados, mas já são cabras marcados para morrerem (veja a
lista abaixo).
Retrato do Brasil foi ao sertão mineiro, na localidade de Cachoeirinha,
Pazzianotto tentou
ganhar o apoio das
centrais. Fracassou
Sérgio Léo
oo
BrasQia — O ministro do Trabalho,
Aimir Pazzianotto, terminou a semana
com sinais de frustração evidentes para
quem o acompanhou na última reunião do
"entendimento nacional", apenas com as
confederações de trabalhadores, na manha
de sexta-feira. Após iniciar as negociações
< com trabalhadores e empresários, na semana anterior, aparentemente como novo
CD superministro, Pazzianotto carregava no
bolso duas propostas para os trabalhadores
que, à medida em que prosseguiam as
conversações, foram bombardeadas pela
< área econômica do governo.
Por saber que seria inevitável o realinhamento de preços, Pazzianotto pretendia obter,Junto aos sindicalistas que participavam do entendimento representando
as facções mais conservadoras do movimento sindical, um acordo em que repartiriam com o governo o ônus do aumento de
preços, em troca de benefícios que poderiam levar às suas bases sindicais. Ele
pensava, já antes da primeira reuniáo com
a CGT, USI c confederações de trabalhadores, em negociar um aumento do salário
mínimo, em tomo de Cz$ 1.500,00, e uma
elevação das contribuições previdenciáriai.
Boa vontade
Baseado em levantamentos do Depar-_
lamento Intersindical de Estudo Estatísticos Sõcio-Econômicos(Dicese), que mostravam crescimento de salários de 50%
para trabalhadores em Sâo Paulo, que
passaram a ter pisos salariais superiores ao
salário mínimo, o ministro do Trabalho
consolidou, no governo, a proposta de
aumentar o mínimo, para aproximá-lo de
seus níveis reais de mercado.
Seria um forma de mostrar a boa
vontade do govemo, sem reflexos negativos para a economia, argumentou Pazzianotto, que pensava em trazer o mínimo ao
maior valor já alcançado por esse salário
na história do país, pouco mais de
1.500,00, atingidos em 1959, segundo cálculos de seu Ministério.
z
Reunido com as confederações de trabalhadores tradicionalmente muito ligadas
ao seu ministério — pelo menos tres presi-
para contar a história de um conflito
que já tem mais de 20 anos,
Nossos repórteres relatam a tragédia de dezenas de famílias de posseiros que hoje vivem em situação de
miséria. É uma história triste que para alguns terminou de uma forma
que se torna a cada dia mais comum
na história da luta camponesa no
Brasil (veja gráfico abaixo): em assassinato.
dentes dessas confederações já foram condecorados com a Ordem do Mérito do
Trabalho, concedida pelo ministro — Pazzianotto recebeu a reivindicação de aumento para os proventos dos aposentados
e comprometeu-se também a consegui-lo,
mas esbarrou no veto do Ministério do
Planejamento.
Como Pazzianotto, o ministro da Previdência, Raphael de Almeida Magalhães,
pretendia aumentar os proventos dos aposentados, aproximando-os, pelo menos, do
salário mínimo vigente (Cz$ 964,80) para
cerca de 4 milhões e 100 mil aposentados
ue ganham menos que isso. Na reunião
to Conselho de Desenvolvimento Social
(CDS), segunda-feira, com a presença de
Pazzianotto, Magalhães apresentou a proposta, sugerindo que fosse posta em prática aproveitando-se o superávit da Previdência em 1986, de Cz$ 21 bilhões.
3
A idéia recebeu parecer negativo do
Ministério do Planejamento sob a alegação
de que, de acordo com a Constituição
Federal, a nova despesa só poderia ser
aprovada se também se criasse uma"fonte
complementar de custeio", ou seja, se se
aumentasse a contribuição previdenciária,
medida considerada impopular. Não agradou a Sayad a proposta de usar o superávit,
pois não há garantias de que ele se repita.
Sem proposta
Sem o aumento de aposentadoria, envolvido em demorada discussão com a área
econômica, que também apresentou críticas ao aumento do salário mínimo, Pazzianotto se viu sem proposta para convencer
os sindicalistas a compartilnar a responsabilidade pelas medidas econômicas em preparo pelo govemo. Cálculos oficiais mostram que é no próprio govemo, municipal,
estadual ou federal, que está o maior
número de trabalhadores com renda de um
salário mínimo, que, ao contrário dos outros setores, não conseguiram aumentar
seus rendimentos com o Plano Cruzado.
Um aumento de salário de quase 50%,
como pretendia o ministro do Trabalho,
teria efeitos indesejáveis no crescimento
das folhas de pagamento, argumentaram
técnicos do Ministério do Planejamento.
Na Fazenda, enquanto o ministro Dflson
Funaro atacava a proposta de aumento de
aproximadamente Czj 1.500,00, alguns de
seus assessores diretos a defendiam como
viável. A falta de definição do govemo —
apesar da insistência de Pazzianotto —
levaram o ministro do Trabalho a frustrar
os empresários e sindicalistas que esperavam uma proposta concreta na reunião de
quinta-feira,
A reboque da área econômica, Pazzianotto chegou a levar em conta a proposta
dos empresários, discutida anteriormente e
aprovada pelo ministro Dflson Funaro, e o
realinhamento em tomo de 25% nos preços dos produtos.
A equipe de assessores próximos a
Funaro, porém estava dividida ao meio
em relação à proposta e, enquanto Pazzianotto discutia com empresários e trabalhadores com a perspectiva de um reajuste
linear e igual para todos os preços, a
Fazenda já montava outro pacote de realinhamento que atendia à proposta de um
grupo de assessores de Funaro: reajuste
entre 10% a 30%, de acordo com as
planilhas de custos das empresas, analisadas pelo Conselho Interministerial de Preços (CIP).
Já na penúltima reunião do "entendimento nacional", na terça-feira, o presidente da CGT, Joaquim dos Santos Andrade, o Joaquinzio, percebeu que nlo haveria espaço de negociação e que as propostas do govemo, que a essa altura deixara
de ser parte interessada e assumira a posição de "árbitro", seriam mais próximas às
intenções dos empresários. Foi por isso
que nào quis participar da última reunião
conjunta do entendimento", na quintafeira. Deixou sozinho o vice-presidente da
entidade, Ricardo Baldino, que, irritado
com a falta de definição após o fim do
encontro, respondia a uma repórter: "Eu
também quena saber por que o Joaquinzio
não está aqui,"
Oferta única
Pazzianotto acredita ainda, porém, que
poderá obter junto ao presidente José
Samey um aumento do salário mínimo
próximo a Cz$ 1.500,00, única oferta concreta para fazer frente às críticas da CUT
— c talvez até da CGT — contra o
realinhamento de preços, que podem resultar em uma sucessão de greves em todo
o país. Ou mesmo, como quer a CUT,
numa nova greve geral.
Esse salário, que poderá apresentar na
reunião com as confederações, na próxima
quinta-feira, seria a sua contrapartida para
Sue os sindicalistas aceitem sua proposta
e trégua. Não haveria compromisso pelo
fim das greves setoriais, mas os líderes
sindicais se comprometeriam a não participar de nenhun. movimento nacional contra
a política econômica do govemo, como a
greve geral que a CUT pretende articular, Ú
TRABALHADORES
a partir desta semana.
— As propostas apresentadas pelos
empresários e trabalhadores nâo constituirão parâmetros; seráo fonte de avaüaçáo
— comentava Pazzianotto, na madrugada
de sexta-feira, após o encontro para o
"entendimento nacional", ainda sem uma
alternativa do governo para apresentar ao
salário mínimo, mas consciente de que não
seria de forma alguma próxima aos Cz$
4.884,64 desejados pelo sindicalistas, que,
por falta de proposta do governo, nâo
puderam sequer negociar. CGT, USI e
confederações estavam dispostas a baixar
suas reivindicações para até um reajuste
imediato de CzS l./OO.OO, complementado, em dois anos e meio, até chegar aos
Cz$ 4.884.64.
Como a direita vê o Pacto
A Central Unlca dos Trabalhadores. CUT. com 1 064 entidades liilidas, e uma espécie de departamento sindicai do PT. Oas três
centrais existentes, e a mais forte.
Perdeu força com o fracasso da greve geral do
dia 12 de dezembro, mas ganhou experiência.
Está acumulando forças para uma nova greve
HDD
<
iLD
O
8
Dirigida pelo metalúrgico paulista
Joaquim dos Santos Andrade, o
"Joaouiníáo". i CGT. com 1 341
entidades filiados, faz tudo para ser
mais moderada que a CUT. mas
nâo consegue. Temendo ser ultrapassada pela sua
rival, avança nas negociações secretas com o governo, mas. na hora de ir para as fábricas, recua.
O gatilho dos 20% nâo é uma proposta, mas uma lei. Ele foi incluído no picolé do Pleno Cruzado
para eleito psicológico e agora virou um pesadelo para o governo.
Achava-se que tudo ia dar certo e ele nâo seria
necessário. Agora que o Cruzado deu errado, o
governo nâo sabe como se livrar do gatilho.
Ti
^
^
É a proposta mais radical saída do
setor trabalhista. Ela prevê que o
gatilho seja acionado a cada salto de
5% da Inflação. Isso significaria o
estabelecimento de uma escala móvel para os salários, que poderiam
subir a cada semana.
A CGT quer que o gatilho dispare a
cada degrau de 10% da inflação,
Aritmeticamente, o número 10 está
a meio caminho dos 20% da lei e
dos 5% propostos pela CUT, Na
realidade, ela dá aos assalariados
proteção total contra a inflação.
Pela lei, cada categoria profissional
tem direito â correção do seu salário
toda vez que a inflação o tiver corroído em 20%, O gatilho já foi acionado para reajustar o salário mínimo
ei previsível que dispare a cada
meses.
.';
-^
<
I-
z
<
>
Em tese. ela dá proteção quase absoluta aos salários. Se a moeda cai, o
contracheque rapidamente engorda.
Cria um sistema de correção quase
tâo eficaz quanto o que existe hoje
para as cadernetas de poupança.
Z
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UJ
ü
Na prática, esse supergatilho provoca uma explosão inflacionária. Em
pouco mais de um ano ela poderia I
passar fácil a casa dos 1 000%. Pela tradição brasileira, bastariam seis
meses para que a CUT estivesse no
poder ou na cadeia.
NENHUMA
Ik
Trata-se de uma proposta
feita apenas para marcar
posição, inclusive porque
a CUT se recusa a participar dos entendimentos
com o governo. Ela sustenta que a negociação
não é séria.
Com a correção salarial a cada pulo
de 10% os trabalhadores estariam
garantidos contra a Inflação em condições quase idênticas ás propostas
pela CUT. Também é. em última análise, uma escala móvel de salários.
"P
0 supergatilho da CGT tem o mesmo efeito que o da CUT, mas pode demorar alguns meses para levar a inflação a 1 000%. Ao fim
da explosão inflacionária, a CGT
pode estar dissolvida, junto com a
CUT ou pela CUT.
Coloca os salários a salvo da inflação a cada soluço de 20%. Sua vantagem intrínseca era demonstrar
que. de parte do governo, o Plano
Cruzado estava disposto a defender
a renda dos trabalhadores a despeiIp de acidentes de percurso.
^-
^=
O naufrágio do Cruzado colocou o
governo diante da necessidade de
reconhecer que não pode cumprir
a lei. Pelos cálculos dos próprios
pais da reforma econômica, se o
gatilho for mantido a Inflação deste ano ficará entre 500% e 700%.
NENHUMA
MUITO POUCAS
Joaquinzão sabe que sua
proposta não tem chances. Ele a põe na mesa
apenas para justlticar a
sua presença nas conversas, públicas e secretas,
com o governo, protegendo-se das críticas da CUT.
O gatilho só sobreviverá
pela inércia. Nenhuma autoridade do governo Sarney admite sua permanência e nos próximos dias
ele deverá ser substituído
por outra fórmula, mais
amarga.
i
4
O
3
TRABALHADORES
0 ministro OHson f umro sabe que
um bom pedaço do governo e do
empresirlido torce pira que ele
patrocine uma fórmula de achatamanto salarial que. por antipitlca,
laça com que ele sala do ministério com os ossos
quebrados. Sua disposição é a de nio propor nada sozinho, muito menos remédios amargos.
0 presidente da Conlederaçáo Nacional do Comércio, Antônio de
Oliveira Santos, propôs na quintafeira um novo gatilho, que dispara
em beneficio dos salários mais baixos e acerta na cabeça da classe média. Ela teria
alguma simpatia junto ao empresariado, mas parece ter nascido para ser "queimada".
J-Jjf IJS* *
^
junaro acha que uma ampla rodada
do gatilho é direito adquirido do trabalhador e. portanto, Inegociável.
Quer que o governo, o PMDB e o PFL
negociem com empresários e trabalhadores uma nova lei salarial para
vigorar a partir de março ou abril
Enquanto náo se chega a uma nova
lei salarial, o presidente da CNC
acha que o gatilho deve ser acionado nos 20% da lei para quem ganha
até 4 salários mínimos. Quem ganha
mais que isso fica com um abono
de apenas 650 cruzados.
120.%=.
<
A manutenção do oalilho acalma o
movimento sindical a mostra 101
trabalhadores qua o governo, apesar
de assustado, perdeu a mania de
correr aos seus bolsos sempre que
se vé em dificuldades. Essa fórmula
fortalece Samey.
Coloca sob a proteçáo do gatilho
cerca de 60% dos trabalhadores
brasileiros, precisamente aqueles
que mais sofrem quando a inflação
começa a corroer seus salários.
Além disso, ajuda as empresas a segurar os salários maiores.
<
>
r^
Por ser um adiamento da questáo
social de janeiro para marco, o problema da inflação e dos salários reaparece em menos de noventa dias,
com Funaro ou sem ele. Essa decisão pode fortalecer a Impressáo de
que o governo náo sabe o que fazer.
GRANDES
ò
Acerta a testa da classe média e descontenta precisamente o pedaço da
massa de assalariados com capacidade de mobilização sindical. O que
esse gatilho segura em matéria de
salários libera em termos de greves
e confrontos sociais.
[\
É provável que se siga por
esse caminho, sobretudo
se Funaro endossar esta
Idéia publicamente, pois
nesse caso terá sido ele a
quebrar, por pouco tempo, os ossos de seus adversários no governo.
a Em Brasília,
s a trégua não sai
u
|
.%
A negociação trlpartite,
depois de quatro
reuniões, deu em nada
.J
6"-
Se o sonho do assalariado é ter o
seu salário corrigido sob a proteçáo de um aanto que resolva as
conseqüências da Inflaçáo. o sonho do empresariado conservador
é acabar pura e simplesmente com o gatilho.
tob a proteçáo de outro santo que o livre das
greves. Na semana passada a idéia do fim do
gatilho prosperou no Banco Central.
C^
Apresentada como espantalho, a
proposta do fim do gatilho faria com
que os salários ficassem sob o efeito corrosivo da Inflaçáo. Uma taxa
de 20% na desvaiorizaçáo da moeda
significaria o confisco de 8% do valor real dos salários.
0 fim do gatilho eliminaria o impacto dos aumentos de salários sobre a
Inflaçáo e conteria o que o governo
chama de pressáo de demanda, pois
os assalariados ficariam sem dinheiro para comprar. Teria o efeito de
uma medida de choque.
A providência é politicamente Inviável, pois poderia levar o país á convulsão social. Economicamente tudo
indica que, em vez.de conter a demanda, criaria uma recessáo semelhante á de 1981. Náo tem o apoio
nem do PDS, quanto mais do
POUCAS
NENHUMA
Esta proposta náo deve
vingar, mas funciona como
um marco das pretensões
do empresariado. Sua flexibilidade permite que se
mexa no patamar do gatilho e no tamanho do abono, ao gosto do freguês.
0 simples fato de a idéia
ter circulado no Banco
Central mostra que há burocratas que náo sabem
em que governo estáo e o
governo náo sabe que tipo
de burocrata sustenta na
cúpula econômica.
Cynthia Poter
Por volta das 9h30 da noite da
última quinta-feira, 22, o presidente
da Fiesp, Mário Arnato, pediu a pa:
lavra no gabinete do ministro do
Trabalho. Depois de cinco horas de
reunião, seu desabafo foi curto e
grosso. Com a aprovação de seus
pares, declarou que se não houvesse
um realinhamento de preços
"agora e já", 40% da indústria paulista parariain de produzir haveria
desobediência generalizada, e "uma
explosão, porque ninguém consegue produzir abaixo dos custos". Era
o inicio do fim da mais longa e trabalhosa reunião tripartite, entre
w
empresários, governo e trabalhadores, verdadeira maratona em busca
de um entendimento que permitisse
uma tréfçua.
P
■ azzianotto fez mais um esforço,
e pediu mais uma das muitas interrupções do encontro para conversar
separadamente com as lideranças
sindicais. Em nome do futuro do
País, sugeriu uma contraproposta
de rcalinhamento de preços de 1896
(contra os 25% pleiteados pelos empresários) e por instantes chegou a
pairar no ar a idéia de que os trabalhadores a aceitariam ;m troca de
uma estabilidade por 90 dias. Náo
houve acordo. Nervos á ílor da
pele em ambos os lados, o vicepresidente da CGT, Ricardo Baldino, recusou-se a assinar uma nota
em que, defendendo a continuidade
das negociações, concordasse em
deixar a>critério do governo o realinhamento de preços e a fixação do
salário mínimo. "Você veio aqui
beneficiar-se das fotos?", perguntou Pazzianotto. "Nào preciso
disso, e se sou incômodo vou embora", respondeu Baldino. "Não,
aqui você é bem aceito", retomou o
ministro, e os ânimos serenaram.
Mas estava selada a incompatibilidade total de posições de empresários e trabalhadores sobre realinhamento de preços e salários.
As 00hl5, Pazzianotto, com olhos
vagos, gestos cansados e profundas
olheiras, dava conta do espólio da
reunião. "Todas as partes reconhecem e enaltecem a oportunidade
criada pelo governo com a realização dessa discussão e todos os participantes manifestaram-se unanimemente pela continuação das negociações." (Quatro horas antes, o ministro confidenciara a 5<7i/íor, entre
dois goles de cafezinho, que só via
"sombras e nevoeiro" pela frente.
"As negociações continuam, mas
- sem trégua e sem pacto", resumiu
Baldino á saída da reunião. E admitiu que, mesmo com o dcòcto que
sem dúvida o governo baixará, a
CGT continuará conversando, embora disposta a jogar todo o seu
peso em mobilizações e greves.
'Uma coisa não exclui a outra", declarou. A reunião do Fórum'Sindical (que inclui a CUT), nesta quartafeira, 28, portanto, será movimentada. A CUT tentará capitalizar toda
a frustração do fracasso. A CGT
terá de provar que nem tudo foi
perdido, e lutar para não ficar a reboque de sua rival. Para isso, terá
de se acertar, interna e preliminarmente, antes mesmo cie sua plenária, no sábado, 31. Isto porque,
durante as negociações, houve alguma divergência interna.
Os dirigentes da entidade ligados
ao PC do B desistiram e afastaramse das conversas ainda na segunda
rodada, e nào compareceram á reunião do dia 20. E o próprio presidente da entidade, Joaquim dos
Santos Andrade, não se a presentou
ao último encontro, além de ter
saído antes do término do anterior.
Joaquinzão, conversando com as federações em São Paulo, na própria
quinta, 22, teria concluído pela inviabilidade do acordo e se poupado
do trabalhode viajar. O vicedeJoaquinzão é que teve de arcar sozinho
com o ônus do encontro. Ao sair,
Baldino respondia visivelmente irritado aos que lhe perguntaram o
porquê da ausência de Joaquinzão:
'É o que eu também gostaria de saber."
Na verdade, essa ausência contribuiu para enfraquecer politicamente os trabalhaclores nas negociações. Segundo as próprias lideranças confidenciam, a maior parte
deles são bons interlocutores, porém maus negociadores, até por
falta de prática de alguns líderes de
confederações, afastados há muito
tempo, ou desde sempre, das mesas
de negociação. O que ocoire, igualmente, com boa oarte das lideranças empresariais.
A falta de prática ajuda a explicar
por que algumas opoituniclacles de
entendimento foram perdidas. Os
empresários, pouco aleitos ao jogo
de cintura e do toma-lá-dá-cá que
se desenvolve nas negociações de
base, tomaram muitas vezes posições a ^riori inllexíveis, complicando
até a troca de idéias. A rigor, não
conseguiam entenderrse direito Jtem
entre eles mesmos. Um exemplo.
Pazzianotto, habilmente, esquivouse de todas as pressões e literalmente cobrou dos empresários uma
posição sobre o ■ mínimo. Albano
Franco propôs Cz$ 1,320, Benedito
Ferraz, da CNTT, íícúu em Cz$
1.100, Antônio Oliveira Santos, da
CNC, lançou CzJ 1.200 (que, tiliás,
é o piso de sua categoria). Santos já
tinha levado um puxão de orelhas
por ter avançado uma proposta de
mínimo (20% de gatilho, mais 30%
de inflação acumulada sobre o va lor
atual) que não agradou seus pares.
Entre as oportunidades perdidas
ficou também o que viria a ser a
proposta dos trabalhadores para o
salário mínimü. A partir da idéia
básica de admitir o salário do
Dicese (Cz$ 4.884), o ponto de partida era conceder, a partir de janeiro, o salário ensaiado pelo go-
OTV
verno (1.567) mais uma de seis parcelas da diferença entre esse valor e
a referência do Dieese (6 x 552). O
valor inicial no novo mínimo seria,
portanto, Cz$ 2.119 e as demais
parcelas seriam concedidas trimestralmente. Os trabalhadores estavam dispostos a negociar, entretanto, ate um mínimo de Cz$ 1.709
a partir de fevereiro (que já garantiria uma reposição de 28%) com reposições mensais de 10% (ou a negociar). Depois de vários jogos de j
cena entre os próprios trabalhadores (a USI, subitamente radical,
disse que se retiraria se o salário ficasse abaixo de Cz$ 2.119), a proposta vingou. Mas nem chegou a
ser apresentada, porque o momento havia passado.
Da mesma forma, já depois de
encerrada a reunião, nas conversas
de corredor, Albano Franco, Antônio de Oliveira Santos, Flávio Brito
(pelos empresários) e Baldino (pelos
trabalhadores) praticamene fecharam um acordo. Baldino propôs
um gatilho geral a partir de I* de
janeiro, de 25% sobre a última correção. Albano contrapôs dois gatilhos de 25%. Oliveira Santos contraargumentou que seria necessário
baixar um pouco o mínimo c suspender o gatilho por 90 dias. Baldino admitiu 60 dias. Brito concordou. E haveria o rcalinhamento de
preços de 25%. A proposta pocieria
interessar a todos. Percebendo a luz
no fim do túnel, Pazzianotto, rapidamente, chamou o presidente da
CNT1, Calixto Ramos, para sentarem todos novamente. Mas Calixto,
intimidado, alegou não haver mais
tempo útil para a discussão e se retirou com as demais confederações.
Cvidentementc, Baldino estava
disposto a investir ainda nesta hipótese, levando Joaquim a assumi-la
rapidamente junto a . Pa77.ianotto,
ainda na sexta-feira, 23. O ministro,
por sua vez, acionaria Albano. A valer o que o próprio Albano Franco
confidenciou ao vice-presidente da
CGT antes do início da reunião
("temos de chegar a um acordo de
qualqucV jeito para não deixar o
governo agir pela própria cabeça c
passarmos, nós, por usurpadores, e
vocês por radidais"). a proposta teria uma chance, embora remota.
Fosse possível um eletrocardiograma das conversações, acusaria
intensa taquicardia antes do momento fatal. Um simples cronograma indica. Após a primeira reunião tripartite, Pazzianotto jantou
com Samey na segunda-feira, 19, »
voltou a reunii-sc ."üinclena manhã w
mm
do dia sejçuime: túiha esperanças.
No mesmo instante, as confederações c a CGT acordavam, entre elas,
que suspenderiam as negociações se
não houvesse proposta concreta do
governo naquela tarde. O pacto estava ameaçado. Mas de tarde nào
houve proposta concreta do go
verno e os trabalhadores não
saíram.
Foram acordados 10 dos 12 pontos de pauta {") propostos por Pazzianotto. Nova reunião foi marcada
para quinta-feira. As expecutivas
cresceram. Na quarta, 21, Pazzianotto voltou a reunir-se com Sarncy, animado. Ao mesmo tempo,
reuniam-se no Rio os empresários e
em Brasília as confederações. Os
empresários endureciam. Na Capital Federal, a Contag por um triz
nào decidiu sair fora, acompanhada
pelas demais confederações, porque
as questões de política agrícola e re-
lòmia agrária estavam formuladas
vagamente ou esquecidas. O presideme do PMDB, Ulysses Guimarães, depois de duas horas de conversa com Pazzianotto, expressava
sua preocupação. Na manhã de
quinta-feira, o diretor da Contag,
Francisco Urbano, foi a Pa/zianotto
e deixou entrever que as confederações se retirariam se não houvesse
uma nova tripartite - com data
marcada - para analisar suas questões. Pazzianotto, que já se desentendera com o presidente da Contag, José Francisco da Silva, na reunião anterior, amaciou. Pediu um
documentocicondicionou a reunião
ao prosseguimento das negociações. Esteve também no Ministério
do Trabalho o ministro Sayad, para
longa conversação. E á tarde a reunião começou em nível algo melhor, mas abaixo das expectativas.
Mário Amato, a caminho do en-
contro, desabalasa no carro que era
perda de tempo. Líderes sindicais
entraram na sala declarando as
imensas dificuldades pela frente.
O pacto acabou não saindo.
Mas, de qualquer forma, uma coisa
parece clara para os participantes:
as conversações, apesar de tudo,
tèm de continuar. Até porque se esf>alham, entre empresários e trabahadores, a absoluta convicção de
que quaisquer medidas que o governo possa tomar serão, necessariamente, paliativas.
(') Entrr os ponta em que houve acordo tslio: a
nectaidade dt uma nova Uzislafio sindkaJ; a refulamfniafâe da partieipaçio da IraiaJÁadorti
nos lueros dai mprtuu; e aiámáammío do
DUtu pata elaborado d* um indke dt inflafdo a
partir dt uma nova eeita bdiica; a liimiatèo ngoroía do tfeito iuipemivo nos tüuúüoi t»ttiabtltàmtnlo dt um diálogp Iripartitt pemtmrtit, com ou
itm Corutlho Ecanòrmco t Social, vinculado ao
Ministério do Trabalho.
Improbabilidade do pacto social
ANTÔNIO DIAS 1.E1TE
Reflexões mais demoradas sobre o
pacto ou entendimento ou acordo
social nos levam à conclusão da sua
inviabilidade política, no Brasil, neste momento.
Essa impressão se reforça à medida que nos aprofundamos no exame
das condiçõesque um amplo entendimento nacional deveria satisfazer.
Pelo menos, foi' o que me ocorreu
desde que, em janeiro deste ano,
comecei a analisar, passo a passo, os
principais temas, éticos e econômicos, que o pacto envolve. A principiar
pela decisão fundamental de como
repartir sacrifícios entre as diversas
categorias de assalariados e os vários grupos de capitalistas com um
mínimo de iniqüidade.
O desdobramento da questão nos
leva A essência do projeto político
que se pretende adotar para o país na
etapa histórica que se inicia com a
discussão de nova Constituição.
Para os que optamos por uma
democracia pluralista e por organização econômica predominantemente privada e capitalista, como mais
adequada para o futuro próximo, é
fundamental que ela venha acompanhada de modernização do capitalismo e de redução da desigualdade
na distribuição de renda entre capitalistas e assalariados, o que implica
renúncia de privilégios por parte dos
primeiros.
Nessa mesma linha, é natural que
os assalariados, através das organizações sindicais, busquem o crescimento de sua quota parte na repartição da renda, como aconteceu nas
principais1 democracias ocidentais.
Mas é importante, também, que eles
concorram para o eficiente funcionamento do aparelho produtivo e se
autolimitem, nas reivindicações, dentro do que seja compatível com o
|
Káclo~
nâo "tfefrt
comldai .
a cesta
*—<&v^J
crescimenlo econômico sustentado do
país, sob pena de inviabilização desse
objetivo maior e, portanto, da sua
bropria ascensão econômica e social.
f Mas, além da questão central do
regime econômico que deva predominar, há que considerar aspectos
específicos e mais complexos da Área
rural. Aí, além da repartição da
renda, há a repartição da terra. E há,
ainda, a questão da extensão plena,
ao campo, de legislação trabalhista e
previdenciária. Envolve, também, o
aspecto da eficiência técnica da
organização produtiva da qual depende, por. sua vez, e em última
análise, a alimentação de toda a
população.
: Há finalmente, a responsabilidade
do Estado, em termos- administrativos e da sua auto-reforma, no sentido
de produzir o máximo de serviços
pelo menor custo, com o menor peso
relativo, enfim, sobre os ombros da
população.
O percurso que fizemos no ano
passado e que resultou em cinco
Ww-
artigos publicados nesta seção em
janeiro e fevereiro, demandou dois
meses de reflexão e iniciou-se com a
idéia de que o proposto pacto requer
detalhamento, e não pode ser simplesmente matéria de discurso com
definição política imprecisa. Essa
convicção nos levou a identificar
questões políticas essenciais, mais
complexas do oue se poderia imaginar a partir da expressão de um
simples desejo de propor e viabilizar
um entendimento nacional. Por outro
lado, a nesse mesmo período, •■
declarações sucessivas das várias
partes interessadas não pareciam
indicar a existência de um clima
para discussão, em termos objetivos,
das questões cuja solução é indispensável A formulação do pacto social.
Do lado do governo, ao que se saiba,
do que se tornou público, não foi nem
tentada. O que há é discurso genérico, e prudente, acredito que motivado
pelo constrangimento em propor,
frontalmente, uma fórmula de repartição de contribuições entre os brasileiros.
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A amarga conclusão é de que um
pacto, entendimento ou acordo social
é improvável. 0 problema da repar^
lição dos sacrifícios há que ficar,
portanto, a cargo do Congresso Nacional que tem, aliás, atribuição para
tanto, e que pode assumir toda a
responsabilidade de analisar e votar
uma proposta que, nesse sentido, lhe
seja feita pelo poder Executivo.
Ambos podem, além disso, ouvir,
previamente, uma a uma, as partes
Interessadas,
Se a questão vier a ser posta nestes
termos, resta saber se o Congresso
Nacional, com a mal definida atitude
ideológica das representações partidárias, e a dispersão de lideranças,
tem condições de decidir sobre um
caminho político nítido, e de elaborar
um projeto econômico viável. Ou se
cairá na armadilha de uma solução
simplesmente distributivista e demagógica, que dará continuidade ao
processo in/lacionárlo com novos
patamares, cada vez mais altos, que
acabarão por inviabilizar o funcionamento do pais. Nesta hipótese,
toda a questão há de ser afinal
revista, em muito piores condições do
que as de hoje.
ANIÒMIO DIAt Ullt. 6Í. lol n.lnl»rr« do. Uloot t l**t<a
(IMf-73). prnMmK do Cio. Volo do «io Oot. (H»7- «I •
é pfelMtor ooOMolodo d* iunomlo do UnlvonkMlo
f odorol do Rio do Jonolro (Uf RJ).
Existe no Brasil a tal corrida
entre salários e preços?
Aloysio Biondi
É bom parar prá pensar, neste momento em que o Governo está em
busca de uma saída para a crise,
procurando a colaboração dos empresários e trabalhadores. Neste momento, em que a inflação atinge altas taxas devido ao desrepresamento
dos preços, ministros e assessores
defendem o fim do gatilho salarial, e
vêm com aquela história toda de que
de nada adianta reajustar salários,
porque isso somente provoca mais
inflação, implantando-se nova corrida entre salários e çreços, etcétera e
tal. A própria opinião pública, a própria massa trabalhadora, mesmo que
defenda os reajustes salariais, não
coloca essas teorias em dúvida, o
que aumenta as expectativas inflacionárias. Por que? Considera-se que
os reajustes salariais são inevitáveis,
e considera-se, também, oue a inflação é inevitável, uma fatalidade. Não
é isso mesmo? Não.
Há uma teoria em voga, mesmo
entre economistass de esquerda, segundo a qual a inflação nada mais e
do que a "guerra" entre os diversos
segmentos da sociedade, para conseguir conquistar uma fatia maior do
Bolo da renda nacional. De acordo
com essa teoria, mera versão sofisticada da antiga tese da corrida entre
salários e preços, existiria inflação
porque os trabalhadores tentam conquistar salários maiores para aumentarem também a fatia do bolo
que lhes cabe, e isso faz com que, no
momento seguinte, os empresários,
que viram parte da fatia dos seus
lucros ser comida pelos aumentos de
salários, partem também eles para
aumentar preços, com batalhas intermediárias de que participam banqueiros, os agricultores'etcétera.
Chegou a hora de fazer uma per-
gunta: essa teoria se aplica mesmo
ao Brasil, ou apenas aos países desenvolvidos há muitas décadas? Nesses países, houve avanços sociais e
políticos ao longo de séculos e, por
força desses avanços, a distribuição
do bolo da renda nacional é muito
mais justa. As empresas trabalham
com margens de lucro infinitamente
menores, o mercado financeiro nao
leva as taxas de juros às nuvens a
seu bel prazer, o governo não consegue cobrar impostos escorchantes,
os salários tém um nível civilizado
sinteticamente; nesses países, a diyi:
são do bolo da renda nacional foi
sendo consolidada, ao longo de séculos, com fatias progressivamente
mais equitativas para os diversos
segmentos sociais. Aqui no Brasil,
com poucç mais de três décadas de
urbanização, industrialização e politização, a situação é inversa. Por isso mesmo, como é reconhecido até
pela direita, os padrões salariais no
Brasil ainda são demasiado baixos. E
isto leva às conclusões a que se quer
chegar: o "fator trabalho", o assalariado ainda está longe, no Brasil, de
ter conseguido a fatia que lhe deveria caber, na divisão do bolo da renda nacional. Isto significa que aumentos salariais no Brasil não
devem ser considerados como es,topins de corridas com os preços. E a
mentalidade empresarial, governamental e de toda a sociedade que
precisa mudar, enxergando-se que
como nos demais países, é inevitável
que os assalariados conquistem
maior fatia da renda nacional. Em
bom português, é preciso que empresariado e governo, se desejam mesmo um país moderno e mais democrático, entendam que os aumentos
salariais devem ser absorvidos pelas
empresas, isto é, que as empresas
(como nos países ricos) terão que
passar a operar com margens de lucros não tão altas como agora. Se
houvesse compreensão dessa realidade, os salários subiriam sem trazer riscos de recaídas inflacionárias
— porque as empresas não aumentariam seus preços a pretexto de compensar os avanços salariais.
Utópico? O empresariado brasileiro não está preparado para ter essa
visão da realidade? Errado. Ainda
agora, nas reuniões realizadas em
Brasília para dar início à discussão
do "pacto social", a Confederação
Nacional do Comércio surgiu com
uma proposta nessa direção, numa
atitude que demonstra que, mesmo
aos trancos e barrancos, a sociedade
brasileira. vai-se transformando. Para a Confederação, o "pacto" e o controle da inflação serão possíveis se
as empresas assinarem acordos com
o Governo para reduzirem suas margens de lucros — da mesma forma
que os trabalhadores reduziriam,
temporiamente, suas pretensões salariais até que a inflação esteja sob
controle. Está claro que a proposta
da Confederação decorre de uma situação conjuntural, da preocupação
com a necessidade de evitar uma
"explosão inflacionárla". Mas já é
um avanço. Abre caminho cara que
se discuta qual a participação que o
assalariado, o "fator trabalho", deve
vir a ter na renda nacional. Sem inflação.
O
n
os
o
t
00
Armistício
em Paris
Começa a fase crítica da
dívida: com ou sem FMI,
o Brasil reduzirá os juros?
A Cacex conseguiu segurar a informaçio sobre os dados da balança comercial cm 1986 durante 22
dias, Mas na quinta-feira, dia 22,
seu diretor, Roberto Fendt, não teve
mais jeito se não anunciar os escassos e preocupantes resultados: um
pequeno saldo de US$ 156 milhões,
semelhante ao obtido em outubro e
novembro, mas muito menor do
que o alcançado até setembro (em
tomo de USS 1 bilhão mensais).
Isso reduziu o superávit comercial
durante o ano passado para USS
9,5 bilhões, ou seja, 3 bilhões a menos que o esperado pelo governo
no começo do ano e 1 bilhão a menos do que a mais recente previsão
(cita, em novembro, pelo Banco
Central. A Cacex atribui o mau desempenho das exportações, cm
queda abrupta e mal explicada, á
redução constante nos preços dos
produtos primários no Exterior
(mas bem que poderia ter debitado
a responsabilidade aos que subláturam exportações ou adiam negócios
esperando uma máxi) e decidiu
congelar as guias de importação de
cerca de 5 mil itens, até que as exportações voltem a um patamar de
USS 2 bilhões mensais, atingido na
maior pane de 1985 e 1986.
Quem acredita que, em 1987, a
dívida externa voltará a governar
ostensivamente a política econômica brasileira, tal como ocorreu
nos anos de recessão, contabiliza
esse dado a iávor de sua crença.
Quem não acrediu lembra do
acordo ümiado com o Clube de
Paris, na madrugada da quartafeira, dia 21, um dia antes da divulgação do pobre superávit de dezembro. E ressalta que ele se consumou
sem que o Brasil fosse obrigado a
aceitar a supervisão do FMI.
Segundo o acordo, os credores concordaram em reesíiàlonar
USS 3,274 bilhões (principal e juros
da dívida de 1985 e 1986), além de
USS 500 milhões do principal referente ao primeiro semestre deste
ano. O Brasil terá seis anos para pagar (queria sete), com três de carèn-,
cia (queria cinco). Além disso tudo,
vai pagar USS 348 milhões em juros
de mora (em três prestaçõçs semestrais a partir de junho de 1988) e
USS 1,3 bilhão, relativo a obriga-
ções anteriores vencidas e não mais
renegociáveis.
A combinação dessas duas informações, uma, sombria, outra, de
certo alívio, embora os juros não
tenham sido fixados, dá bem a idéia
da situação real. Nuvens obscurecem o fronl externo, e é fácil prever
a dificuldade das negociações que
só agora começam para valer. Os
banqueiros aceitarão fazer uma renegociação ampla da divida brasileira P É possível reduzir os encargos
da divida, principalmente os
spreads? O Brasil terá de lazer um
acordo Ibrmal com o FMI ou bastarão uma ou duas visitas anuais de
técnicos da instituição, para troca
de informações? Conseguirá o dinheiro novo que lhe permitirá
manter um crescimento razoável
{5% por exemplo), esfriando o saldo
comercial e a busca obsessiva de
mais exportações, para não esfolar
o mercado interno?
IMo meio de tudo isso, só há uma
certeza: a renegociação que houver,
se fora do FMI, são será global ou
plurianual, mas provisória e limitada no tempo ( 'precária", dizem
ilguns), tal como aconteceu no
Clube de Paris. A dívida a vencer nn
primeiro semestre deste ano foi renegociada; em julho vai verificar se
o estado da economia estimula o
refinanciamento das parcelas - USS
700 milhões- relativas ao segundo
semestre. Nesse caso, de tempos em
tempos será necessário fazer novas e
desgastantes rodadas.
Meses atrás, no embalo do primeiro CFuzado, dizia-se aos quatro
ventos que a divida externa não seria obstáculo ao oescimento da
economia • decidido pela sociedade
brasileira. Fixou-se até uma meia
para 1'987: reduzir pela metade as
transferências líquidas de recursos
financeiros, ou seja, de 5% para
'2,5% do PIB. É a diferença entre os
capitais que entram, sob a forma de
empréstimos, financiamentos e investimentos diretos, e Os capitais
que saem, sob a forma de pagamentos de .juros, remessas cie lucros, amortizações do f5rincipiil da
dívida. Isto significaria diminuir a
saída de capitais de USS 12 bilhões
(como vem oconendo anualmente
nos últimos anos) para algo como 6
bilhões em 1987
Dizia-se, com razão, que o Brasil,
e, de resto, toda a América Latina,
não podia continuar sendo um exportador de capitais (nos últimos
cinco anos, a saída liquida passou
de USS 60 bilhões) e que esse dinheiro, ficando aqui, iria csiímular
lamo o invesiimento interno, como
permitiria aumentar as importações
de máquinas e insumos
O objetivo de reduzir a exponaçâo de capital pennanece. Mas o
discurso, e a ação das autoridaclc-s,
moderou-se nuiiio uliiinamenie.
Nunca se falou em ruptura ames.
nem o governo brasileiro aclmiiiu
publicaineme fazer como o pemano: definir ciuc so paga juros
cquivalenics a 10% das expoiiaçõcs.
e pronto. O máximo que o minisno Dilson Funaro reconheceii foi.
em caso de extrema secura de dólares, centralizar o câmbio e só liberar
remessas se entrar o dinheiro correspondente. Trata-se de moratória
não declarada, forçada pela necessidade, e o ex-ministro Delfim Netio
recorreu a ela na virada cie 1983
para 1984. Mas agora, com o governo assustado pela inllação c pela
crise cambial decorrente da meiairava nas exportações e nas resenhas,
a pala\Ta-chave é negociação.
Tudo o que foi negociado até
aqui, de uma divida loial de USS
101 bilhões no fim do ano passado,
parou em 1986. Segundo as estimativas do Banco Central, o Brasil, em
tese, deve pagar este ano, pelo principal da divida, sem contar os juros,
USS 14,4 bilhões. O primeiro
passo, então, é renegociar a dívida
que vence este ano (as amortizações
estão suspensas até março, en.(quanto não se acerta com os credores). Se não renegociar, o Brasil terá
de pagar esses USS 14,4 bilhões do
principal, mais os juros, os lucros e
tudo o que entra na conta de serviços, deficitária. Tudo somado, são
USS 25,4 bilhões. O previsível superávit da balança eomercial seria capaz de pagar talvez, um terço disso.
Aí o País é que fecha, não o balanço
de pagamentos.
Ó mais provável, nesse processo,
ê que se repita o caminho dos anos
anteriores. Renegocia-se o principal
da dívida com os bancos privados,
pagam-se os juros. Embora mais
palatáveis, ainda assim os problemas avultam. Supondo que se confirme a previsão do Banco Central
para 1987 - pagamento de juros no
valor de USS 8,3 bilhões, remessas
de lucros de USS 1,25 bilhão, entre
outros itens -, o buraco na conta de
seiviços chegará a USS 11,3 bilhões.
M
as há também quem diga que
o FMI não é mais o bicho-papào deantes - e não apenas os exministros do governo anterior. O
próprio Fernão Bracher já alinnou
(e desmentiu) que esse seria o caminho "se a situação piorar". E o se- A
M
ISJ
00
mm
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Mi
ECONOMIA
QUINZENA
nador pcemctlebtiyt Fcnumclo
HcMric|Lic Cardoso, voltando na sfinaiia passada da Euiopa, alirnia
que o Brasil deveria repensar suas
lelações com o Fundo. Em seus
coniaios na Franca, Cardoso cenameiue colheu a impressão de que o
FMI, de agora em diante dirigido
por Mithel Camdessus, banqueiro
ligado ao amigo gabinete socialista
e ao presidente FraiK.ois Mitterrand, tende a ser mais flexível nas
orientações c exigências aos paises
devedores.
O conselho mais claro, porém,
veio do respeitado jornal londrino
Finatttui Timet. Analisando o Cruzado, e os erros que determinaram
o adiamento dos "ajustes necessários" para depois das eleições, o
jornal recomenda a Sarnev "aban-
POLÍTICA
donar algumas das exterioridades
populistas", introduzir reiormas no
Cruz-ado ("que permitam um crescimento mais ordenado"), cortar gastos públicos e subsídios, criar uma
"atmoslera mais atraente para ocajital estrangeiro". Lm editorial publicado na tei\a-léira, dia 20, o jornal dfat que Sarney "deve preparar o
terreno rara a aceitação pública de
um monitoramento mais íinne pelo
FMI, o que possivelmente será uma
condição crucial para que os bancos
internacionais se disponham a dar
novos créditos e para que o Clube
de Paris reescalone a dívida do Brasil". Para o Clube, que terminou a
reunião antes do editorial, não íbi
preciso. No caso dos banqueiros, a
negociação está apenas começando.
O que é o clube de Paris
O Clube de Paris é um fórum
internacional para o
reescalonamento do serviço
da divida concedido ou
garantido por credores
oficiais de forma bilateral
Não tem nem um número
fixo de membros nem uma
estrutura institucional.
Representa, isto sim, um
conjunto de práticas e
procedimentos que se
desenvolveram ao longo de 30
anos, desde o primeiro
encontro a d hoc realizado
para a Argentina em 1956.
NACIONAL
Quem consente,cala
Glaucio Ary Diilon Soares
Centro de Estudos Latino-Americanos,
Universidade da Flórida
tros tópicos. A partir de 1970, o Congresso passou a rejeitar os próprios projetos e
ficou impossibilitado de sequer fiscalizar as
atividades do Executivo.
Após o Ato Institucional n? 5 (dezem- n
bro de 1968), como o mostra a figura I,
o Legislativo passou a aprovar praticamente todos os projetos enviados pelo Executi- >
vo. As raras rejeições ocorriam por recomendação do próprio Executivo, nos cao
sos em que pretendia apresentar outro pro- (-1
jeto, considerado melhor. Até 1968, o Con- m
gresso produzia leis, e cerca de 8017o dos
projetos de sua iniciativa eram aprovados.
O AI-5 mudou isso e, de 1970 em diante, Kl
os parlamentares passaram a rejeitar sistematicamente os próprios projetos: menos
de lO^o, em média, eram aprovados, c estes quase sempre provinham de fato do 00
Executivo, sendo apenas apresentados via
Legislativo. Dados da Secretaria da Câmara dos Deputados atestam que, em 1972,
o Congresso aprovou apenas 5^» dos proje-
a
Durante o regime militar, a
bancada arenista foi utilizada
para asfixiar o Congresso.
Repudiando sistematicamente
iniciativas legislativas de seus
próprios colegas, os deputados
do partido majoritário
apoiavam uma estrutura de
poder que os deixava sem
funções. Inverteu-se assim o
velho provérbio.
Uma das primeiras preocupações
do governo militar — revelando
sua vocaçSo autoritária — foi
monopolizar a produçfio de leis. O monopólio foi estabelecido por etapas. Já em
1964, o Executivo passou a legislar autonomamente, por meio de dccretos-lcis, enquanto o Congresso Cicou impossibilitado,
por força do Ato Institucional n? I (abril
de 1964), de rejeitar projetos enviados pelo Executivo. Em 1967, o poder do Legislativo sofreu nova restrição: já nâo podia
fazer leis que implicassem criação de despesas, outorgando-se o Executivo exclusividade legislativa em matéria financeira,
tributária, de criação de cargos, de aumento de vencimentos, bem como no que dissesse respeito aos efetivos das forças armadas, à organização administrativo-judiciária e à anistia de presos políticos, entre ou-
s
i—«
1
As reuniões são
tradicionalmente conduzidas
por um representante do
Tesouro francês e é
franqueada a qualquer credor
oficial que aceite as práticas
e procedimentos do Clube.
Desde 1983. o Clube de
Paris tem concluído, em
média, mais de 16
reescalonamcntos anuais,
comparados com apenas cerca
de 3 na década anterior. Em
1985 foram concluídos 21
acordos com membros do
FMI, representando um alivio
crediticio para os devedores
de US$18 bilhões.
PERCENTAGEM DE PROJETOS APROVADOS. PELO LEGISLATIVO,
SEGUNDO A ORIGEM
ngem legislativa
ongem axecuiiv*
n
o
H
C
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O
<
03
QUINZENA
tos de lei apresentados pelos dois partidos
existentes (Aliança Renovadora Nacional e
Movimento Democrático Brasileiro); em
1973, T/« foram aprovados e em 1974, primeiro ano do governo Geisel, 67o.
Outra série de dados, divulgada pelo
Processamento de Dados do Senado
(Prodasen), mostra que essa forma de suicídio legislativo só cessou a partir de 1979,
com o governo Figueiredo. A instituição
encarregada de matar, no nascedouro, as
leis propostas por parlamentares era a
Arena, cujos deputados e senadores eram
obrigados a votar contra os projetos apresentados pelos colegas (figura 2).
Em 1967, como reação à impossibilidade de rejeitar os projetos enviados pelo
Executivo, o Congresso procurara reforçar
sua função fiscalizadora, lançando mão
dos requerimentos de informação. Estes
haviam se tornado o único meio a que o
Legislativo podia recorrer para exercer algum controle sobre as ações do Executivo.
Permitiam, por exemplo, verificar se os
fundos destinados à construção de uma
ponte tinham sido efetivamente usados para tal. O número dos requerimentos de informação, que tinha sido de 1.309 em 1966,
saltou para 3.598 em 1967. Também este
recurso, entretanto, foi obstado pelo Al-5:
em 1970 e 1971 foram apresentados no
Congresso, respectivamente, seis e 25 requerimentos de informação (figura 3).
Acresce que poucos eram respondidos.
Com o AI-5, portanto, o Congresso foi
despojado de suas funções e a Arena foi utilizada pelo regime militar como instrumento desse processa
O esvaziamento do Legislativo e o
absolutismo do Executivo geraram uma situação contraditória
para a Arena e, posteriormente, para o
Partido Democrático Social. Como membros do partido do governo — e de um governo punitivo e autoritário —, os políticos dessas legendas viam-se forçados a
apoiar publicamente uma estrutura de poder que os deixava sem funções. Como parlamentares, entretanto, defrontavam com
a expectativa de seus eleitores de que gerassem, defendessem, aprovassenle implementassem idéias sob a forma de projetos
de lei. '
Era notória a má vontade dos governos
militares contra as iniciativas legiferantes,
como o demonstram as restrições legais impostas pelos primeiros governos militares
e mantidas pelos últimos, inclusive o de
Geisel, em que se iniciou a distensão. Os
parlamentares arenistas que tomavam iniciativas legislativas sem autorização do
Executivo tornavam-se malvistos pelo governo e muitos foram hostilizados. Uma
das medidas punitivas mais utilizadas era
impedir-lhes o acesso aos centros de poder
no âmbito do governo. Como tampouco
podiam legislar, ficavam sem instrumentos
de ação.
A submissão da Arena (e, mais tarde, do
PDS) ao Executivo era irrestrita. Foi a própria Arena que matou sistematicamente, na
raiz, as iniciativas legislativas dos membros
de suas bancadas. Os parlamentares arenistas tiveram de se resignar a apoiar os pro-
POLÍTICA NACIONAL
/
^J
PEBCÍNTAOEM DE REJEIÇÃO. PELA CÂMARA FEDERAL.
DE PROJETOS ORIGINADOS NA PRÓPRIA CASA
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1978
1979
1990
1981
1
jetos enviados ao Congresso pelo Executivo, por irrelevantes que fossem, e a rejeitar sistematicamente os projetos dos próprios colegas de partido, além, obviamente, daqueles emanados do MDB. Ao defender um sistema que exigia a inércia do Legislativo, caíram na imobilidade.
É escusado dizer que o comportamento
de muitos parlamentares arenistas no Congresso não correspondia às suas crenças íntimas, como o demonstrou uma pesquisa
realizada por César Guimarães e Luiz Henrique Nunes Bahia e publicada no Jornal
do Brasil (14/04/1975). De fato, esse trabalho revelou que a maior parte dos parlamentares arenistas rejeitava a lei de fidelidade partidária, o sistema bipartidário, o
AI-5 na forma em que existia e as restrições às funções do Legislativo. Esses resultados configuravam uma situação esquizofrênica, em que parlamentares deviam dizer o que não pensavam e defender posições de que discordavam.
A contradição dos arenistas espelha-se
nitidamente em frase dita por Petrõnio
Portella (Arena/Pi) em entrevista comigo,
em 1972. Quando eu criticava o próprio senador, o Senado e a Arena por legitimar
um governo ditatorial, ele respondeu:
"Professor, não temos poder para obter o
poder que não lemos."
Petrõnio Portella deu grande impulso
não só ao sistema de informações computadorizadas (Prodasen) e à biblioteca do Senado, como à formação técnica do pessoal
auxiliar. Visava com isto, por um lado, que
o Senado pudesse vir a ser chamado para
exercer relevantes funções de assessoria na
formulação de políticas durante a ditadura; por outro, capacitar a casa para exercer em nível ótimo suas funções normais
numa democracia plena, se e quando esta
fosse restaurada.
A posição de Petrõnio Portella tinha
muitas semelhanças com a de Célio Borja
(Arena/GB), cuja grande preocupação, em
determinado momento, era evitar novo endurecimento. Durante a ditadura militar,
vários movimentos de rebeldia do Congresso tinham provocado punições, seja na forma de cassações, seja na de restrições à atividade legislativa. A preocupação de evitar novas punições e maiores restrições á
atividade parlamentar era comum a muitos parlamentares da Arena e vário; mo-
19«2
J
derados do MDB.
Se havia ou não perigo de novo fechamento, era quase impossível aferir. Como
saber o que se passava por trás das portas
— fechadas — de apartamentos, escritórios e quartéis? Em entrevistas feitas em
1972 e 1973 com representantes do governo e vários militares, colhemos respostas
que variavam de um extremo a outro. Havia os que afirmavam, pessimisticamente,
que haveria novo fechamento a qualquer
provocação, e os que proclamavam, confiantes, o fim da era dos fechamentos. Na
inexistência de uma política explícita e de
uma legislação clara sobre os limiies das
atividades do Legislativo, muitas decisões
eram tomadas ad hoc. Acresce que os centros de deciíão eram muitos e que as medidas do Executivo dependiam mais de movimentos de pessoas e grupos do que de
uma hierarquia legal. Tudo isso se somava para gerar enorme insegurança com relação aos limites da ação parlamentar.
Para parlamentares "institucionalistas",
como Petrõnio Portella e Célio Borja, a salvaguarda do Legislativo como instituição
se sobrepunha a considerações de ordem
ético-ideológica sobre a legitimidade do governo militar e de suas ações. A presença
do Legislativo — ainda que com funções
muito reduzidas — era considerada indispensável: o fechamento da única via para
uma saída eventual da ditadura poderia dar
lugar à instalação de um regime desabridamente coercitivo. Em 1973, Célio Borja, provavelmente um dos que mais a sério levaram o problema da criação de uma
nova ordem institucional, estaria disposto
a aceitar uma redefinição do papel do Congresso, enfatizando, por um lado, que esse papel varia muito entre os países democráticos e, por outro, que o Congresso já
fizera o que lhe cabia em prol da institucionalização de uma nova divisão de funções e de poderes. Deixava assim subentendido que cfibia ao Executivo levar a cabo
a sua parte, institucionalizando uma nova
divisão de poderes e, sobretudo, respeitando-a.
Esses parlamentares não tinham, contudo, uma teoria orientadora ou um plano
de ação para provocar essa salda: limitavam-se a esperar que circunstSncias exter-
;-z£izi3sSs-:*
mmmmmm
jywwwtwwin i-Ê^S: ' ■*•; ^iüi&^tk. '>.
QUINZENA
POLÍTICA NACIONAL
nas ao Congresso possibilitassem um retorno à democracia. Vale lembrar, entretanto,
que nossas entrevistas foram feitas, em sua
maioria, em 1972/1973, durante o governo
Mediei, que se caracterizou por um fechamento quase total. Naquelas circunstâncias,
só era possível optar entre a espera apática
ou a rebeldia violenta.
0 argumento de que a atuação da
oposição, particularmente a parlamentar, poderia levar o pats,
nas palavras do presidente Geisel, "a um
retrocesso político" era conhecido de todos. As posições com relação ao tema variavam muito. Havia desde a que valorizava acima de tudo a preservação do Legislativo — exemplificada por Célio Borja
—, até a que preferia arriscar o fechamento total, cada uma com sua lógica e sua
fundamentação ideológica.
Lysâneas Maciel, na época deputado federal pelo MDB/GB, expressou, no meu
entender, a lógica da ação. Em entrevista
pessoal (realizada em 1972, antes de sua
cassação), expôs claramente seu ponto de
vista: "...O dilema da oposição é exercer
ou preservar o mandato; exercer uma oposição imperceptível ou exercer uma oposição real, efetiva."
i
■ £
O deputado insistia em que a linha divisória para o comportamento da oposição
deveria ser estabelecida pela própria oposição, aduzindo, como exemplo-limite: "Se
falar em direitos humanos é uma provocação para o sistema, então realmente seremos subversivos... Não podemos aceitar,
sob pena de opressão contra o povo que
nos elegeu e contra nós mesmos, que o governo estabeleça as regras do que é permitido discutir no Congresso... Mesmo num
Congresso castrado, é possível exercer oposição. Há linhas de comportamento da
oposição que — todos nós estamos plenamente conscientes — não devemos adotar... Mas há uma responsabilidade mínima, que tem de ser exercida totalmente, e
a defesa dos direitos civis é uma delas. É
umí íôiía de que não se pode abrir mão,
que não se pode negociar, com a qual não
se potfe contemporizar, porque um sujeito
que está sendo morto não pode esperar."
Esta posição traça a fronteira adhusslvel para Lysâneas Maciel. O contraste en-
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MDB
tre ela e a dos parlamentares da Arena que
justificavam o autoritarismo era gritante.
Vejamos, por exemplo, o que tinha a dizer, em 1975, o deputado Álvaro Valle
(Arena/GB), talvez o representante mais
coerente desse grupo: "Parece que, num
mundo que se transforma e redescobre valores, há os que querem, aqui em nossa terra, involuir para uma democracia liberal,
felizmente aterrada em toda parte... Talvez haja brasileiros presos injustamente, e
será nosso dever defendê-los. Há movimentos políticos que não conseguem, infelizmente, se desenvolver. Mas quando, em
que país ou em que tempo da história a liberdade foi absoluta e a justiça humana,
perfeita?... Os liberais de sempre repetem
o seu papel decorado e o dizem à perfeição. Mas erraram de teatro, e neste já é outra a peça que se representa. Não vamos
repetir a campanha do brigadeiro Eduardo Gomes ou reviver a UDN (União Democrática Nacional) dos anos 40. Foram
momentos de nossa história, válidos, e aos
quais devemos muito de nossa liberdade e
dos direitos que temos até agora assegurados. Mas numa nação de cem milhões de
habitantes, que enfrenta crises de desenvolvimento, o individualismo liberal não pode ser a meta, não pode ser o eixo do debate político... Se políticos foram afastados do mando sem que isso modificasse a
rotina de qualquer brasileiro, foi talvez porque estivessem afastados da nação. Militares nunca tomam o poder: eles o ocupam
quando há um vácuo."
DE REQUERIMENTOS DE INFORMAÇÃO APRESENTADOS
1«V4
ATIVIDADE PARLAMENTAR POR PARTIDO EM 1973
1«fl
1969
'970
19"
ARENA
A argumentação do deputado Álvaro
Valle — que, curiosamente, preside hoje o
Partido Liberal — repousa sobre quatro
pontos: 1) a democracia liberal está historicamente ultrapassada; 2) implicitamente,
o deputado admite injustiças e imperfeições
do regime, mas justifica-as porque estão
presentes emtodos os regimes; 3) os problemas do subdesenvolvimento são muito
mais importantes que os das prisões injustas, da tortura e da violência, que deveriam
ocupar lugar secundário nos debates parlamentares; 4) cassados e perseguidos políticos perderam seus direitos porque tinham perdido contato com a nação, não
tratando de seus problemas reais.
Álvaro Valle expressou, de forma articulada, o pensamento da minoria arenista
que considerava pequenos os custos políticos do regime, comparados aos seus benefícios econômicos. Era a época do "milagre" , e muitos acreditavam que o regime militar trans/ormaria o Brasil em potência econômica.
As entrevistas com membros da
oposição, particularmente daquela definida então como a mais radical, também deixaram algumas impressões nítidas.
Posições que na época eram consideradas radicais pelo regime militar são definidas como naturais, ou mesmo essenciais ao
exercício de qualquer mandato em todos os
países democráticos. Muitas delas, inclusive, foram reincorporadas às preocupações políticas cotidianas no Brasil de Figueiredo. Ações impensáveis no governo
Mediei e que, mesmo no governo Geisel,
podiam custar a perda de um mandato são
hoje legítimas e corriqueiras.
A oposição tinha idéias muito claras sobre como resistir à repressão, mas não linha um plano escalonado de abertura política, ou um projeto político para o futuro. Durante a ditadura, limitava-se a combatê-la, não tendo porém condições de elaborar um projeto de abertura sistemática
e muito menos de vendê-lo ao governo.
Os moderados preferiram não exercer o
mandato. Aos olhos dos radicais, essa opção tinha motivações individuais: não exerciam o mandato para preservá-lo, ou seja,
preservar as benesses e os privilégios que
o acompanhavam. Segundo os próprios
moderados, contudo, traiava-sc de uma
5
PROPOSIÇÕES APRESENTADAS NA CÂMARA FEDERAL
EM 197S, POR PARTIDO POLÍTICO
MDB
Arana
lndk:>c««>
I
1
M
Paiectfti
-
1
-
3
30
Projaio» da daciaio lagitlativo
2
Propoataa da amanda 1 Conuiiuiçío
16 129%,
29(53%:
Projatos da lai compiamamar
13 122%)
47 178%!
5Ü9 I30%l
1 106 165%.
Pioiaiot da laí
Projetos da raaoluçlo
29 I45*i
22 134*.
Raquanmanios
13 (23%l
44 177*1
opção instiiucionalista: o que faziam era
um sacrifício pessoal, e inclusive de sua reputação política, em prol da preservação
do Legislativo.
Essa é uma problemática que nâo se coloca em regimes democráticos, e que náo
poria, portanto, Petrônio Portella e Célio
Borja em campo oposto ao de Lysâneas
Maciel e Francisco Pinto (MDB/DA). Numa democracia, os congressistas ter-se-iam
reagrupado de acordo com novas linhas divisórias, possivelmente associadas a políticas econômicas e sociais. Em condições
ditatoriais, contudo, as questões políticas
ganham preponderância, e muitos dos que
antes tinham estado unidos se dividiram e
alguns, que estavam afastados, se uniram.
A maioria dos parlamentares arenistas
rejeitava a perda de funções pelo Legislativo; comportava-se, contudo, de maneira
conformista, no justificado receio de punições impostas pelo regime militar. Ao lado dessa maioria havia uma minoria que
aceitava e justificava plenamente as restrições impostas à atividade legislativa. A repressão a que estava submetida a sociedade civil impôs um dilema a iodos os eleitos, já que, por um lado, após 1974, o eleitorado — particularmente o urbano — começou a punir os políticos favoráveis à ditadura, retirando-lhes o voto, e por outro,
nSo podiam, sob pena de confrontação
com o regime militar, advogar a recuperação, pelo Legislativo, das funções perdidas.
Essa situação teve conseqüências para o
comportamento parlamentar da Arena. Para evitar a ira militar e o possível fechamento do Congresso, seus deputados aceitaram
a usurpação contínua de prerrogativas tradicionais do Legislativo. Limitaram assim
sua atividade legislativa, caindo no imobilismo. De fato, a participação da Arena nos
trabalhos ficou muito aquém do que seria
de esperar com base no numero de seus parlamentares. A maioria deles resolveu, simplesmente, não fazer coisa alguma.
|\
o MDB, muitos parlamentares
% usaram e arriscaram seu mandaJL i to para fazer oposição ao regime
militar. Alguns, como Lysâneas Maciel,
efetivamente o perderam. O fato de que as
iniciativas legislativas eram enterradas pelo próprio Congresso, atemorizado, não
impediu que vários parlamentares emedebistas fizessem pleno uso de seu mandato
para, com discursos, projetos de lei, projetos de emenda constitucional e requerimentos de informação, transformar o Legislativo num poder que respondia mais ao
Oa outra origam
10 118*1
nmu
'3 120*1
dinamismo da minoria emedebista que à
inércia da maioria arenista. Mas também
no interior do MDB fez-se sentir n divisão
entre os moderados, que preferiam arriscar menos, e os autênticos, partidários de
arriscar tudo. Nesse partido, foram os moderados que viveram a contradição de limitar sua ação de opositores no seio de um
partido de oposição ao regime.
O MDB aproveitou-se do imobilismo da
Arena para assumir a iniciativa legislativa.
Apresentou mais projetos de lei, mesmo sabendo, de antemão, que estes seriam rejeitados; apresentou mais requerimentos de
informação, tentando fiscalizar o Executivo, e participou com maior assiduidade
dos debates na Câmara e no Senado. Já em
1973, em pleno governo Mediei, contando
com 87 deputados, apresentou 263 projetos de lei. quatro a mais que a Arena, que
tinha 223 deputados. No total de projetos
e requerimentos, o MDB apresentou 3,6
projetos por deputado, ao passo que a
Arena apresentou 1,2 (figura 4).
Em 1974, ano de transição para o governo Geisel, os dois partidos tinham o mesmo número de deputados que no ano anterior, mas o MDB apresentou 278 projetos de lei contra 237 da Arena. Dados de
outro tipo e de outra fonte apontam na
mesma direção: os membros do MDB apresentaram 58% das proposições de iniciativa de deputados e fizeram nada menos que
3.133 pronunciamentos, respondendo, assim, pela maioria das iniciativas, a despeito de serem minoria
Em 1975 o domínio das atividades da
Câmara Federal pelo MDB era falo consumado' o partido apresentou 1105 projetos de lei. contra apenas 509 da Arena
(aos quais se somaram 48 do Executivo, 29
do Senado, dois de comissões e dois da Mesa); 29 emendas à Constituição, contra 16
6
Discursos (grinda expadlemat
Discursos por deputado
Projetos
.
>
3
:
A
ssim, numa Câmara dos Deputados com maioria arenista e num
Senado com mais de 2/3 de
arenistas, o MDB dominou a atividade parlamentar. Acuada pela contradição de ser
o partido de um governo militar que negava funções e legitimidade ao Parlamento,
a Arena respondia com a apatia. Os parlamentares do MDB sabiam, claro, que seus
projetos tinham pequena probabilidade de
aprovação, mas esta era apenas um dos
seus objetivos. Nas palavras do jornalista
Marcondes Sampaio, em 1976: "Deputados da oposição chegam a apresentar determinados projetos menos com o objetivo de vê-los transformados em lei de imediato e mais no intuito de provocarem o debate. Isso ocorre, com freqüência, por
exemplo, em relação a temas institucionais,
diante dos quais o MDB pretende fixar posição junto à opinião pública, mesmo reconhecendo a inviabilidade do seu acolhimento pelo governo. Exemplos típicos são
as propostas de emenda constitucional..."
As diferenças entre a Arena e o MDB
não esgotam, entretanto, a análise da atividade parlamentar Também no interior
de cada partido produzia-se uma contradição que seguia linhas Ideológicas. Assim,
dos 36 emedebistas inscritos para falar no
expediente de agosto de 1976, 18 eram autênticos, enquanto nenhum dos oito arenistas inscritos era renovador. Isso sugere que,
ATIVIDADE PARLAMENTAR POR PARTIDO
NO PRIMEIRO SEMESTRE DE 1976
CAmara doa DeputAdoa
1
da Arena; 47 propostas de lei complementar,
contra 13 da Arena; 44 requerimentos, contra 13 da Arena (figura 5).
Em 1976. o domínio do MDB no Congresso estava consolidado. No primeiro semestre do ano, os deputados desse partido
minoritário pronunciaram 64% dos discursos feitos no grande expediente da Câmara dos Deputados; 68% dos projetos foram
apresentados por emedebistas, o que nos
dá uma taxa de 3,7 projetos por deputado
do MDB e de 1,3 por deputado da Arena.
No Senado, a discrepância se repelia: os 20
senadores emedebistas fizeram em média
14 discursos cada um, enquanto os 45 senadores arenistas fizeram cm média, cada
um, a metade, Dos senadores nrenisias, 11
não fizeram qualquer pronunciamento durante todo o semestre. No mesmo período,
os senadores emedebistas apresentaram 127
proposições, ou seja, 6,4 por senador, enquanto os arenistas, com 42 proposições,
ficaram com uma média de 0,9 por senador (figura 6)
At<>na
MDB
S8IM*I
102 164 SI
0.16
270 (32*1
Projetos por deputado
1,3
Senado
Arana
Discursos
Discursos por senador
Projetos
Projetos por senador
316 153*1
7
42 125*1
0.9
0,49
575 168%)
3,7
MDB
231 147*1
14
127 175*1
6.4
www
m&Mmm
QUINZENA
no MDB, os moderados nâo coagiam —
ou não conseguiam coagir — os autênticos,
enquanto na Arena a relação se invertia:
o grupo renovador funcionava como se estivesse tolhido, seja pela direção partidária, seja como resultado direto da contradição, ainda mais aguçada, de pertencer à
ala liberal do partido que apoiava a ditadura militar. O resultado é que a composição ideológica da atividade parlamentar
não correspondia à composição partidária
do Parlamento, que funcionou como órgão simbólico de oposição ao regime.
Os legisladores democratas dos partidos
do governo em regimes militares-autoritários vivem uma difícil contradição: por
um lado, como representantes da sociedade civil, devem defender os direitos humanos e políticos da sociedade, evitando sua
usurpação por outros grupos, inclusive pelos militares; por outro lado, como membros do partido do governo militar num regime ditatorial, devem defender as ações
POLÍTICA NACIONAL
do governo, que priva seus representados
e eles próprios de direitos fundamentais. Os
parlamentares da Arena, partido do governo ditatorial militar, viveram essa contradição e caíram na apatia, deixando o campo livre para que o MDB dominasse o cenário parlamentar. Na experiência parlamentar brasileira, inverteu-se o provérbio:
nas ditaduras, quem consente, cala.
SUGESTÕES PARA LEITURX
VALLE A., Estruturas políticas brasileiras. Rio
de Janeiro, Laudes, 1970.
ABRANCHES S. e SOARES G., "Al funções
do Legislativo", Rio de Janeiro, Revista de
Administração Pública, vol. I, 1973.
KLEIN L. e FIGUEIREDO M., Legitimidade
e coaçõo no Brasilpds-M. Rio de Janeiro, Forense Universitária, 1978.
SOARES G., "As políticas de cassaçôes". Rio
de Janeiro, Dados, vol. 21, 1979.
Os generais de Sarney
e seus projetos mirabolantes
p Brasil, o poder passa por cima do
N próprio presidente da República:
enquanto Sarney fica no 3.° andar
do Palácio do Planalto, no andar
superior trabalham os generais
Bayma Denys, do Gabinete Militar, e Ivan
Mendes, do SNI, que controlam a grande
máquina que conduz o poder no País.
A, pesar do gabinete da
Presidência ficar no
terceiro andar do Palácio do Planalto —
simbolizando o espaço das decisões da república — é no quarto
andar que se encontra a grande
máquina que conduz o poder no
Brasil.
Enquanto no terceiro andar o
presidente Sarney se avizinha do
seu secretário-particular, Jorge
Murad — um genro voluntarioso
e de postura asséptica —, do seu
"ghost-writer", Joaquim Campeio; do biógrafo da corte, Virgílio Costa (filho do escritor Odylo
Costa Filho), cuja principal tarefa é preparar as memórias do governo Sarney; do embaixador
Rubens Ricupero, que decifra para o presidente as sutilezas do jogo diplomático; do ministro do
Planejamento, JoSo Sayad, que
hoje se esforça para ficar no cargo; e do ex-parlamentar maranhense, Edson Vidigal, que foi
contemplado com uma assessoria
pelo amigo presidente. No quarto
andar estão o SNI, o Gabinete
Militar e o Gabinete Civil.
Ocupando mais de 90 "to dos
gabinetes do último andar do palácio,. ,QS, chamados ministros da
casa, Çeneial .Jvan de Sou/a,
Mendes, Rubens Bayma Denvs e
Marco Maciel, só dividem o seu
brilho com a presença da estonteante Roseane Sarney que trabalha num amplo gabinete no lado
oposto ao do ministro Marco
Maciel. Único espaço onde a imprensa não tem transito livre, independente de audiências previamente marcadas, o quarto andar
do Palácio do Planalto encerra
na verdade o centro nervoso do
poder.
O ministro-chefe do Serviço
Nacional de Informações, o General Ivan de Souza Mendes —
hoje o colaborador mais intimo e
de maior ascendência sobre o presidente da República —, nas primeiras horas do dia se dirige ao
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3
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gabinete do presidente Sarney
municiando-o de todas as informação possíveis. Aberta a jornada de trabalho palaciana, Ivan de
Souza Mendes poderá retornar a
qualquer momento ao gabinete
presidencial para qualquer despacho, sem nenhuma formalidade.
Liderando dois mil e setecentos
funcionários, oficialmente reconhecidos, distribuídos nos quatro
cantos do país para aiudá-lo a assessorar o presidente na orientação das atividades de informações, o General Ivan de Souza
Mendes sabe que tem a gratidão
do presidente Sarney pelo seu
comportamento nos dramáticos
momentos da doença e morte do
presidente Tancredo Neves. Num
palácio que jamais se preparou
p'ara recebê-lo, apoiado por um
partido que nâo era o seu e governando com um ministério que
não havia nomeado, o presidente
Sarney teve no General Ivan o seu
grande apoio inicial, até ocupar
com uma certa segurança o seu
gabinete no terceiro andar. Nâo
foi por acaso que no Natal de
1985 o casal Maristela e Ivan de
Souza Mendes teve a honra de
sentar-se à mesa na residência
presidencial para a grande ceia.
O ministro-chefe
do SNI recebeu,
do presidente da
República, a tarefa de
comandar o Palácio do
Planalto em sua
ausência.
mmmmÊmmÊÊÊÊÊmmÊÊmmÊÊÊÊBsam
O General Ivan, por sua relação pessoal com o presidente ao
lado da misteriosa e mitológica
máquina que administra, recebeu
também a tarefa de comandar o
Palácio do Planalto — c de tabela
o poder nas ausências do presidente da República. Quando o
presidente Sarney se ausentou do
país no ano passado, enquanto o
senador, Fragelli, dormitava na
mesa presidencial, o General Ivan
dividia com o ministro Marco
Maciel o comando efetivo do Estado. Fato semelhante ocorreu
neste final de ano quando o presidente Sarney se exilou na ilha do
Curupu, no Maranhão. Mais
uma vez o Palácio do Planalto fi•cou nas mãos do General Ivan.
Foi do ministro-chefe do Servi-
QUINZENA
POLÍTICA
laborador importante no esquema do presidente Sarney. ideologicamente afinados, Sarney tem
no ministro Maciel o interloculor
para o bordado político partidário que os militares não estão habituados a ter, É bem verdade
que essa tarefa o presidente vem
tentando transferir para o machadiano ministro Paulo Brossard, cujas declarações políticas
têm encantado os militares.
De gestos fleumáticos e postura aristocrática, o General Bayma
Denys conduz o Gabinete Militar
do Palácio do Planalto, mas sua
grande força decorre de sua função de Secretário do Conselho de
Segurança Nacional, que poderia
ser atribuída a qualquer ministro
de Estado. Denys — que cultiva a
apreciável preocupação de refazer a imagem do Exército brasileiro — por isso nunca descuida
da questão nos seus freqüentes
encontros com a imorensa —
ço Nacional de informações a primeira manifestação de apoio ao
presidente Sarney quando Tancredo vivia seus últimos dias hospitalizado em Sâo Paulo. "Evidentemente que temos que ser, e
sou, inteiramente leal ao presidente Sarney na situação em que
ele está e que ele venha a ficar".
As palavras de Souza Mendes, ditas numa inusitada coletiva à imprensa, no momento em que nação se preparava para assistir a
morte de Tancredo e os políticos
a duvidarem da autoridade de
S^rneynj3ãf;a. ^çriur .o., pais,
além de um claro recado das Forças Armadas, credenciou o General Ivan como o grande interlocutor do presidente, dentre as inúmeras questões de Estado, no delicado humor dos militares.
Hoje menos autorizado, diante
da sua derrota eleitoral, o ministro Marco Maciel ainda é um co-
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GENERAL
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conduz junto à Presidência da
República todos os programas e
projetos em andamento ou em
elaboração nos demais ministérios. O Conselho de Segurana
Nacional chegou ao requinte de
levar aos ministérios da área econômica a sua proposta de renegociação da divida externa. Da mesma forma o CSN é capaz de estar
presente, estudar e acompanhar
qualquer problema social, político ou econômico no Brasil: Não é
por acaso que um dos três blocos
do anexo do Palácio do Planalto
atende basicamente à secretaria
do Conselho de Segurança Nacional.
Filho do marechal Odilio
Denys, um dos principais articuladores do golpe de 1964, Bayma
Denys conheceu os mecanismos
do Conselho de Segurança Nacional quando foi seu assessor-secretário durante o governo do General Mediei (1969 — 1974). Depois
de servir como adido militar do
Brasil na Itália retornou ao país
em 1982 para comandar a 4Í Brigada de Infantaria em Belo Horizonte, ocasião em que conheceu o
então governador de Minas, Tancredo Neves.
SALÃO
DE
REUNIÕES
SALÃO
DO
2° ANDAR
ROSEANA
SARNEY
NACIONAL
Relatório Reservado - 19.01.87
Nos quartéis
Com sua experiência de militar e
político no" governo oriundo do movimento de 64, o senador eleito Jarbas
Passarinho. (PDS-PA), embora faça a
previsão de um período de profunda
instabilidade institucional somado a
uma crise econômica, descarta, em
análises reservadas, a possibilidade de
qualquer tipo de intervenção militar,
A seu ver, golpe militar somente
seria possível caso os militares tivessem deixado o poder logo após a euforia do milagre econômico. Como a
abertura política veio no bojo da recessão e de escândalos financeiros,
Passarinho, que responde pela presidência nacional do PDS, acha que os
militares só voltarão a pensar em deixar os quartéis num quadro de profunda convulsão social e ainda convocados por entidades civis.
GENERAL
IVAN D€
SOUZA MENDES
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E presidente não presidência?
Reconheça o primeiro responsável pelo desastre
Doiu Roseaiia Murad já nirpreendeu íavoi-avclmcnte
a imprensa com declarações nada confomiistas e no
outro dia se notabilizou por uma frase que desnuda as
contradições do governo. Ela irrompeu no gabinete da
Secretaria do Planejamento e apostrofou os três ministros que ali estavam reunidos para discutir a momentosa questão do gatilho salarial, ou seja, João Sayad, titular da Seplan, Dilson Funaro, da Fazenda, e Almir
Pazzianotto, do Trabalho. "Como é que vocês querem
revogar o que sequer foi testado?", perguntou donaRoseana. Não há registro de qualquer reação de monta
dos interpelados, e nem mesmo de uma troca de olhat-es entre atônitos e perplexos. A frase parece oportuna,
mas a situação em que foi pronunciada, se não constrangeu os ministros, constrange querti não enxerga o
Palácio do Planalto como a corte provinciana de uma
semicolõnia tropical.
Dona Roseana consegue reunir çm sua pessoa algumas condições excepcionais: filha do presidente da República, mulher do secretário particular do próprio e
assessora da Casa Civil. Além disso, participa das sessões do impbrtantissimo Conselho de Desenvolvimento
Econômico, criação do general Ernesto Geisel exumada repentinamente por José Samey. Ao certo, esteve presente á primeira reunião do CDE da Nova República, seguncia-feira, 12. Haverá quem entenda o
desembaraço com que dona Roseana anda pelo Planalto, mas a situação relatada pelos jornais na manhã
do dia 15 configura excesso de desembaraço. Em todo
caso, a filha do presidente chegava-se á sala da Seplan
como Mercúrio. Convocava os -ministros para uma
imediata conversa com papai. Ou será que disse "o sr.
presidente"? Pouco importa. A filha servira o aperitivo,
o pai vinha com o prato de resistência: "Vocês disseram que o gatilho era bom, então vocês mentiram para
mim. '
Existe uma tradição do poder à brasileira de que a figura do presidente tem de ser preservada a todo custo.
Talvez por causa disso, permitiu-se, por exemplo, que
mais de um general ficasse no trono tio regime militar a
despeito da esderose. Consta, no entanto, que a única
doença de Samey é a hipocondria, o que facilita as coisas da tradição. De fato, ganha espaço a insinuação,
quando não a tese explicitada com todas as letras, de
que o presidente foi enganado. Iludiu-se com as jsromessas do Cruzado nem mais,, nem menos, do que os
cidadãos embaildeirados de fiscais do congelamento.
Esta é a idéia, e Sarney acaba de embarcar nela, fingindo não lhe perceber o anverso: ele leva nota zero em
economia, o que se justifica em poetas mas não se admite em presidentes da República. Nem todos os poetas são, contudo, invulneráveis aos encantos do poder,
e este vale bem um fingimento e outros sacrifícios.
Ao exibir o espanto de quem cai das nuvens, Sarney
não está sozinho. Numa reunião na residência brasiliense do dr. Ulysses Guimarães, na madrugada do dia
11, o ministro Sayad afirmou: "Fomos atirados a um
abismo." Identificou-se entre as vitimas, 130 milhões,
se diligentemente contadas, mas não declinou o nome
dos arquitetos de tamanha operação, capaz de derrubar
uma nação em peso. As forças ocultas ou os lados gregos? A sabotagem do eüablishmenl ou dissídios técnico-
políticos da área econômica? A precariedade da transição ou as divisões intestinais do govemo e da Aliança
Democrática? A incompetência, a tibieza, a preguiça do
Executivo, ou a sua fragilidade política? DesembrulheM o teste proposto á inteligência dos leitores. É possível
que a solução correta aponte para respostas positivas a
todos os quesitos. Assim como se daria se as perguntas
se referissem à qualidade do espetáculo que estamos vivendo. Tragédia ou comédia? Melodrama ou óperabufa?
Anote-se, porém, a diferença entre Sayad e Samey.
O ministro pode-se permitir o patético, sobretudo em
espetáculo tão versátil e tratancio-se de novato no jogo
político. Samey, não, por mais que se tenha inebriado
com a miragem da popularidade do Cruzado, na
apressada convicção de que o Jbope em alta subsdtui
dignamente a legitimação das umas. Samey sabe o que
lhe falta epor que a nau dos cruzados foi a oique muito
antes de akançar a Terra Santa. Cortesâos de vários calibres e extrações pretendem poupá-lo, mas ele conhece os seus pecados. Teimara em não confessá-los,
nem por isso provará a sua inocência.
Há o pecado original da traição cometida contra a
Nação, que reclamava diretas-já e teve de se contentar
com a decisão do Colégio Eleitoral, com a agravante
da ficção constitucional que colocou Samey no lugar
de Tancredo. Mas a vida oferece a oportunioade de redenção aos homens de boa-fé. A Nova República poderia ter justíficado o adjetivo. A transição, em dois
anos, poderia ter sido límpida e firme. Não foi. Ao entulho autoritário não removido juntou-se o lixo das
promessas descumpridas e do alto desse pedestal o
presidente Samey moveu a sua ação de acenos sedutores ao poder militar, a manobra de mesuras e piscadelas destinada a provar aos generais a sua confiabilidade.
Samey pretende ter sido enganado, no episódio do
Cruzado, mas toda a sociedade parece mais habilitada a
se enxergar como vítima de um grande engano, desdobrado em dois anos de govemo Samey.
Um, especialmente, entre os pecados presidenciais,
acaba sendo altamente emblemático dos demais. Remonta a meados de fevereiro de 86, quando Samey
completou a reforma ministerial e anunciou itu
governo. Através de uma operação entre amigos, de
azedo sabor udenista e alcance pouco mais que familiar, ele forçava uma "abertura" para a direita. Privilegiava, no jogo do poder político e na manipulação dê
verbas imponentes, velhos sócios de negócios particulares e ex-comparsas paisanos da ditadura fardada. O
malogro do Cruzado,- que sairia duas semanas depois,
nascia ali, naquela reforma que encolhia a corte en- .quanto dilatava as ambições de Samey.
Na idéia democrática do congelamento' de preços e
salários, o Cruzado mostrava o seu mérito. Teria sido
preciso, porém, dizer à Nação que a idéia não poderia
ser etema e que Funaro não é Mandrake - e cuidaram
de selecionar a retórica da euforia. Apresentou-se o pa■ liativo como elixir de longa vida, mas as causas da
doença, endividamento extemo e interno, penmaneciam.
O Plano feneceu num rápido Outono, baddo pela sabotagem conjugada de setores do govemo e do empresariado, pela incapacidade do Executivo de resistir às
pressões políticas e econômicas, ou mesmo pela sua
própria identificação com o sistema. Havia um projeto
inicial de retoques e reformas, a serem implementados
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j
j
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;
iSiSíSiSí¥»S^>i«™í
POLíTICA NACIONAL
periodicamente. Letra morta.
Samey diz agora que mentiram para ele e acusa empresários de inesperada filiação às idéias de Bakunin,
enquanto se adota a expressão desobediência àvil com
impropricdade proporcional ao desconhecimento do
vetusto anarquista e outros grandes rebeldes. No caso,
seria razoável falar em desobediência comercial, mas
este é apenas um dos quadros em que a singular tragédia brasileira descamba para a ópera-bufa. Um honrado jornalista, falecido há mais de 20 anos, sustentava
que no Brasil a situação é sempre grave e jamais séria.
No entanto, não falta quem se preocupe com as penpectívas de uma epidemia de desobediência civil, na
acepção certa de resistência da sociedade ao desgoverno. Neste sentido, o documento aprovado pela Direção Nacional do PMDB, reunida no dia 14 com os
governadores eleitos em novembro sob sua legenda,
merece ser levado a sério.
O pronunciamento peemedebista vai muito além da
afanosa busca do vocábulo adequado para definir um
acerto in extrenús entre governo, empresários e trabalhadores. Os homens começaram falando em pacto,
recuaram para entendimento, apelam enfim para uma
palavra que já ocorrera em 79 ao então ministro Delfim
Netto: trégua. A lembrança não é animadora, a trégua
delíinesca não saiu do esboço. O propósito do PMDB
parece bem mais vasto do que qualquer tentativa de rolar tensões. Dá até para desconfiar que o partido avalia
todos os riscos presentes, inclusive aauele de que o povo
se questione sobre a utilidade da democracia, se logo
em seguida ao voto é penalizado pelo anti-Cruzado.
O PMDB cumprirá seu compromisso?
O texto do documento do PMDB não permite duas
ou mais leituras. O partido sabe que, ao contrário de
Samey, foi legitimado pela escolha popular. Por isso,
sente-se à vontade para fixar as condições do seu apoio
ao governo. O PMDB é contra o arrocho salarial, a recessão, a especulação financeira, a alta dos juros. É a (avor da reforma agrária c da suspensão parcial do pagamento da divida exiema. Existe até, no documento,
apesar das cautelas de linguagem, a referência ás irregularidades que se cometem á sombra do governo.
Fala-se em corrupção, regime de incompetência, tráfico
de inlluència impune, parasitismo e clientelismo.
Alude-se a quem? Não será a ministros e funcionários
peemedebistas.
A leitura é uma só, mas não é oue afugente ponderáveis dúvidas. Dizem respeito às chances efctiyas de um
entendimento entre os dois cidadãos que estão na capa
desta edição de Senhor, e entre o governo desta medíocre transição e a Nação carente e abandonada. No momento da morte de Tancredo, era visível a ausência de
saídas fora da parceria Samey-Ulysses. A aliança entre
o presidente por acaso e o senhor diretas-já legitimaria
o governo nascido do frágil, inconfiável conúbio entre
inimigos aparentemente irreconciliáveis. Mas Samey
provou, não com palavras oficiais, mas com os fatos,
que não queria Ulysses por perto. E certo dia disse a
um ministro, hoje fora do governo: "Estou cansado
deste Ulysses que me aponta o dedo na cara.'
Os dois cavalheiros da capa são, de fato, muito diferentes e o documento do PMDB é um dedo na cara de
Samey. Aponta para o primeiro responsável por estes
dois anos perdidos, enquanto a Nação se dá conta de
que os perdeu. Num momento apinhado de esperanças, teríamos a certeza da iminência de outra reforma
ministerial, da soberania da Constituinte como primeiro e maior poder da transição, da convocação das
diretas para a Presidência logo depois de colocado o
ponto final da nova Constituição. Mas a turva hora que
vivemos não favorece certezas. O PMDB têm, de fato.
consciência da sua responsabilidade e está preparado
para ir até as últimas conseqüências do seu documento? E ainda há tempo para acertar o passo com
Samey?
s:^5>
"Breve estarei em Assunção
0 vice-presidente do Partido Liberal Autêntico é da opinião que a conquistada
democracia ainda é possível pela via pacífica e que as eleições presidenciais
previstas para 1988 serão realizadas
ntu
Horacio Verbitsky
Desterrado desde 1982,
quando o ditador Alfredo Stroessner náo "engoliu"
a edição do seu livro "O general comerciante", Domingo Laino tentou, por cinco
vezes, regressar ao Paraguai,
no que sempre foi impedido.
Já refeito das agressões recebidas, juntamente com
aqueles que o acompanharam na sua última tentativa
- a 24 de junho último - de
regresso à pátria (o cx-cmbaixador norte-americano
Robert White e o seu assis-
tente argentino Alfredo
Forti; os deputados uruguaios Roberto Asiaín e L6pcz Balestra; Melinda Roerik, do Centro de Estudos
Internacionais de Washington; e o almirante norteamericano John Lee, membro do Conselho do Centro
de Estudos Políticos de Washington), o vice-presidente
do Partido Libera! Radical
Autêntico respondeu a algumas perguntas colocadas
por cadernos do terceiro mundo.
a
Há alguma diferença entre
essa sua última tentativa e as
anteriores?
,- As primeiras três tentativas foram feitas sozinho, sem
qualquer comitiva ou amigo
nacional ou estrangeiro que me
acompanhasse. Não tiveram
grande repercussão. A quarta
já foi feita com a mediação da
igreja católica, quando do Ano
Internacional da Família. O
governo havia dito que eu poderia, regressar com a minha
esposa c meus quatro, filhos
3
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H
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c
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mmmmmam
INTERNACIONAL
por via terrestre, mas quando
nos apresentamos, minha entrada foi recusada. O portavoz do governo faltou à sua
palavra, apesar da mediação do
arcebispo. Finalmente desloquei-me a Washington onde
recebi a colaboração do senador Edward Kennedy, que enviou uma carta a Stroessncr
pedindo-lhe que me deixasse
entrar, além de cerca de meia
centena de representantes dos
partidos políticos que também
se dirigiram a Stroessner.
Dessa vez a repercussão foi
bastante maior devido às personalidades que me acompanharam e à cobertura da viagem feita por três canais da
televisão norte-americana.
'■ Apesar da maior repercussão e do interesse despertado
nos Estados Unidos não con'
seguiu entrar...
- Mas já não é a mesma
coisa. Antes Stroessner acusava-me de incendiado subversivo. Hoje, homens como o ministro do Interior Augusto
Montanaro, o fiscal-geral do
Estado Clotildo Giménez Benítez e outros, já não me qualificam assim, afirmam que o
meu caso está em estudo e dão
a entender que eventualmente
poderei regressar ao país. Isso
se deve às pressões a que estão
sujeitos, sobretudo por parte
dos países europeus do Mercado Comum, dos Estados Unidos (desde a agressão física ao
embaixador White) e do governo uruguaio.
Raízes da transição
Como vê a situação da ditadura mais longa da história
americana?
- Estamos em vias de uma
transição para a democracia,
baseada em condições objetivas internas e no plano internacional. A democratização da
Argentina, Uruguai, Brasil e
Bolívia; os recentes acontecimentos nas Filipinas e no Haiti,
todos esses fatos funcionam
como uma pressão para que
Stroessner se sinta cada vez
mais isolado na comunidade
internacional. E mesmo dentro
do Paraguai também existem
novidades políticas e sócioeconômicas, como, por exemplo, o que aconteceu com os
camponeses da zona do Alto
Paraná, no estado de Caaguazú, que faz fronteira com o
Brasil.
Que acontecimentos foram
esses?
- Organizações camponesas
e camponeses organizados
ocuparam terras incultas. Fizeram as suas casas e começaram a lavrar, até que a repressão chegou de forma selvagem
e assassinou os irmãos Martínez, filiados ao Partido Liberal. A 40km de Juan 0'Leary,
em Caaguazú, cerca de vinte
camponeses foram enforcados
nas árvores pela" polícia, fatos
OS DIREITOS HUMANOS NO PARAGUAI
Em 1986 o povo paraguaio rompeu ,a "barreira
do medo" e saiu às ruas "depois de anos de silên-.
cio e obediência", nos diz o informe sobre a situai
ção dos direitos humanos, elaborado pelo PRODEMÜ5 (Promoção e Defesa, dos Direitos Humanos).
De acordo com esse informe o povo. paraguaio
viveu em 1986 uma aguda deterioração desses direitos com o recrudescimento da repressão gove_r
namentai "em fgce das invariáveis demonstrações
pacíficas de descontentamento popular".
Mesmo assim, 1986 "pode ser considerado o ano da mobilização ou o ano da reação popular
frente aos abusos da autoridade diante da necessidade de reivindicar os direitos largamente postergados", completou o relatório da Prodemos, organização dirigida pelo combativo bispo católico,
Mário N. Medina.
que são do conhedmento público (chegaram até a ser publicados nos jornais controlados pelo sistema) e que foram
condenados pelo bispo catójico
de Chaco, Melanio Medina. É
patente também a grave situação sócio-econômica, que pode
ser verificada no fluxo contínuo de paraguaios que saem do
país, apesar da crise nos outros
países vizinhos para onde se
dirigem, porque no Paraguai
ela é muito mais aguda.
O sistema também foi abalado pelo desmantelamento de
muitos negócios ilícito^. A polícia argentina tem investigado
a entrada irregular de mais de
500 automóveis Mercedes
Benz trazidos do Paraguai, por
onde também passam os canais
do narcotráfico. Na ilha argentina de Cerrito foram apreendidos 287kg de maconha. Há
paraguaios implicados, juntamente com o secretário particular do governador Florencio
Tenev, que está intimamente
ligado ao governo Stroessner.
Do ponto de vista econômico também existem sintomas
de debilidade. De janeiro a julho de 1986 as exportações
caíram 46% em relação ao
mesmo período de 1985, e o
montante de dólares que vão
entrar este ano não serão suficientes para cobrir os serviços
da dívida externa paraguaia,
que é de 1,8 bilhão de dólares a
pública, ou de três bilhões se se
juntar a privada. Dividida por
Ires milhões de habitantes, dá
cerca de mil dólares per capita.
O valor das exportações
anuais, que era de 300 milhões
de dólares, caiu para 220 milhões, devido à seca e às inundações. A superfície das culturas de soja e algodão - produtos que representam mais de
60% das exportações do país diminuiu. Acrescente-se a tudo
isso a deterioração dós preços
de produtos agrícolas no mercado mundial, que afeta todo o
Terceiro Mundo.
Por outro lado, são visíveis
as conseqüências do término
das grandes obras da barragem
de llaipu, que deram origem a
W>M$Ê$
.■-.■-.V-M^;'
-
receitas muito grandes, como a
entrada de 18 bilhões de dólares só numa década. Como a
construção da hidrelétrica de
Yaciretá continua muito lenta
em relação ao cronograma
previsto, os trabalhadores de
Itaipu ficarão desempregados.
Existe um estoque de capital
cm depósito, máquinas valiosas
que se deterioram e que portanto não servem para novas
obras. Tudo isso afeta a estrutura do poder, enfraquecendo-o. As cxporlaçõcs ilícitas são volumosas, cquivalcndo-se às legais, c são constituídas principalmente de madeira
e grãos que saem pelo Brasil
sem pagar impostos.
Dialogar com todos
os setores
E quanto à situação política?
- As condições objetivas
alteraram-sc e o movimento
democrático avançou. Muito
importante para p transição d.i
ditadura para a democracia
pluralista foi ter-se conseguido
um maior empenho tia igreja
católica paraguaia, que tem
feito apelos ao diálogo nacional. A fé religiosa está presente cm 909Í- da população.
Por que é que a igreja mudou o seu conipanameiun?
- Ela sempre teve diferentes correntes. A linha, digamos
assim, agrária, que sempre criticou o regime, representada
petos bispos Ramón Botarin.
da província de Misiont:.. e
Melanio Medina. passou a
orientar a igreja. Por outro lado, dentro do Partido Colorado começam a aparecer contradições, pratica-se pela primeira vez uma certa democracia, com duas chapas em algumas seções.
Você considera possível
uma aliança com alguns desses
setores colorados?
- Os que criticam o sistema
vigente e apregoam princípios
de democracia pluralista estão
paru nós numa posição aceita- jk
mmvmm
www
INTERNACIONAL
vcl. Issu diminui u csfcru de
inHucncia do sislcma, cnlraquecendo-o basumtc. Temos
que dialogar com todos os sclores, inclusive com a ditadura,
como defende a igreja, para
chegarmos a uma transição pacífica, sem desordem, para
sairmos desta situação de uma
forma não-violenta, sem mortes nem derramamento de sangue.
Existe no Paraguai esse
verdadeiro rastro de sangue e
morte como acontece no Chile?
- São fenômenos diferentes. A ditadura paraguaia é
mais antiga. Teve início com
Moringo em 1944, e aí levamos quase meio século de autocracia. O Paraguai teve a sua
experiência armada, uma revolução em 1947 que custou
muitas vidas, onde todos os
partidos foram derrotados por
Moringo e pelo Partido Colorado. Em 1959-60 tivemos
também as nossas guerrilhas
liberais, nos bosques de Caaguazú, vencidas pelo sistema
de Stroessner. Segundo a polícia paraguaia, houve projetos
de atentados e uma experiência
armada que nós não acompanhamos. O Chile é muito diferente. Todos conhecem as
circunstâncias da derrubada e
assassinato de Allende e a ação
de Pinochet. Açftcs tremendamente violentas geram diferentes tipos de rcaçáo. No
Chile existem um Partido Comunista e uma esquerda organizada e forte, o que não
acontece no Paraguai,Às vezes, os mais impacientes redimiiim uni outro tipo de política - n iirmuda - par» o nosso
país. A nossa resposta d qi(c
muitas vc/.cs podem ocorrer
ações espetaculares sem no
entanto darem qualquer frulo
real para o advento de uma
democracia pluralista, como a
que esperamos alcançar depois
de tanta paciência. Esta crise
econômica nos faz sofrer mas
ao mesmo tempo permite que
vejamos o sistema ditatorial
não apenas opressivo no plano
político mas também nos pla-
nos econômico e social.
sa, incluindo os camponeses liberais. Quando monsenhor
Melanio Medina vem a Buenos
Aires, conversamos sobre o
Paraguai e a problemática latino-americana. Estamos de
acordo com o arcebispo Ismael
Rolón no seu empenho pelo
diálogo nacional. Não existem
pontos de conflito.
Essas forças sociais estão
reunidas num centro unificador?
Qual é o panorama geral
- Não estão, mas há um
das forças políticas?
esforço para se conseguir isso.
- Existem dois partidos
O Acordo Nacional, que reúne
fortes, o Partido Liberal Radi" febrerista»",
democratas
cal Autêntico c o Colorado,
cristãos, liberais radicais audois partidos tradicionais que
no próximo ano completam tênticos e um setor colorado
cem anos de existência. Os foi um projeto importante mas
Que influência pode ter a
dois reúnem de 70 a 90% do não conseguiu abranger as for- posição norte-americana no
eleitorado. O restante fka di- ças sociais, culturais e univer- Paraguai?
vidido entre o Partido Revolu- sitárias para ampliar o espectro
- Muito grande e não apecionário Febrerista, filiado à desse acordo que continua a nas no Paraguai. É o centro do
Internacional
Socialista, o ser essencialmenie político. poder cuja importância é inePartido Democrata-Cristão e o O apelo da igreja 39 diálogo gável. O embaixador Clyde
poderá contribuir para que Taylor e outros emissários expequeno Partido Comunista,
se tenha um espectro mais põem teoricamente a sua preoque foi muito castigado pelo
amplo.
cupação com a violência e os
sistema. O seu secretário-gedireitos humanos e sobre a neral, Juan José Soler, é um dos
As
relações
com
a
igreja
cessidade de que o Paraguai
desaparecidos,
presumiveltransite para uma abertura
mente morto em alguma demaior no campo político. Nos
pendência da polícia. Esses três
Como os liberais se dão
Estados Unidos, a política é
partidos poderiam ter entre 10 coin a igreja?
mais complexa do que nos
e 30% do eleitorado. O Colo- Historicamente,
houve nossos
países
periféricos.
rado e o Liberal têm sofrido
uma
tensão
com
a
igreja
católiExistem
diversos
grupos de
com os ataques do sistema;
ca
à
luz
dos
princípios
univerpressão,
o
Pentágono,
a CIA, o
Stroessner dividiu o seu prósais
que
deram
origem
ao
liCongresso,
o
Departamento
de
prio partido e o liberalismo.
beralismo:
o
laicismo
c
a
soEstado, a opinião pública. Para
Essa última corrente está dividida em três grupos: o Liberal, breposição da razão sobre a fé se averiguar sobre a profundio Liberal Radical, que tem re- como forma de se chegar à dade da mudança da antiga
presem ação eleitoral, e o Li- verdade. Nos últimos tempos posição para esta nova no que
beral Radical Autêntico, que existe uma maior atenção do se refere ao nosso país haveria
apesar de não estar rcjiisirado liberalismo em relação à pro- que verificar c estudar cada
na Junta LIeiloral é o principal blemática paraguaia dentro de um desses fatores de poder,
partido da oposição. O Colo- um contexto tereciro-mundis- cuja complexidade os coloca
rado está dividido entre os mi- ta. Estamos lutando não só fora do nosso alcance.
litares, o sirocssnerismo sem contra graves violações •dos^
Quando voei voltará a AsSlrocssner, e os que crilicam o direitos humanos, que constisirocssnerismo, os chamados tuem um problema político, sunção?
- Muito cm breve. Existem
"tradicionalislas", A parlir da como ainda contra a opressáo
econômica
que
muilas
vezes
condições
objetivas internos e
abertura democniiica da Artem
as
suas
origens
paro
além
externas,
gentina, do Uruguai e do Urasil o governo viu-s^c forçado a das fronteiros do país. Certos
Haverá eleições presidenter uma posição mais lolcranie princípios liberais clássicos,
com a oposição , permitindo como a especialização paro o ciais a curto prazo?
- Em 1988 acabo o manmanifestações públicas dos comércio inlernncionnl c o nnticonservodorismo
econômico
doto
de Stroessner,
partidos. Com um ano de vida,
o Movimento Intcrsindical de cm benefício da mAo ipvisívcl
Voei será candidato?
Trabalhadores foi protagonista do mercado não se ajustam aos
interesses
de
países
como
o
Nunca pensei nisso. A
de fatos imporianies, como o
Paraguai,
beneficiando
apenas
longa
ditadura requer uma
desfile de cinco mil pessoas no
os
países,
que
controlam
o
ecotransição.
Portanto, se o meu
1- de Maio deste ano. Também
partido assim o decidir, e em
os médicos dos hospitais se nomia.
Mas como são concreui- eleições livres, poderia sê-lo.
manifestaram
reivindicando
melhores salários. As associa- mente as relações com a igre- Deverei estar no lugar onde
possa prestar mais benefícios à
ções em geral, os camponeses ja?
- Muito boas, sobretudo causa do povo pelas suas reisem terra e os estudantes militam de forma cada vez mais com os setores que se ocupa- vindicações políticas, econômiram da organização campone- cas e sociais.
•
ativa contra o ditador.
As forças políticas e sociais
■
mmmmmm
O Paraguai busca seu Tancredo
A saúde de Stroessner e algumas brechas no sistema
de poder podem antecipar a transição democrática
na mais velha ditadura do Ocidente.
Oiio horas de unia manhã de
primavera em Assunção. As árvores
cstâo floridas e as ruas coalhadas de
policiais em volta da Vinte y Cinco
de Mayo, uma das principais, onde
lica a sede da Associação Nacional
Republicana ou Partido Colorado,
"um dos mais poderosos do Contincmc", segundo o seu principal
condutor, general Alfredo Stroessner, astro das comemorações dos
99 anos de sua fundação.
Nos altos dos edilkios, soldados
armados de fuzis-metralhadora e
binóculos vigiam, atentamente, todos os movimentos. Um helicóptero da segurança sobrevoa diversas
vezes a área c pousa no teto de um
edilicio. Os alto-falantes, a todo volume, emoam marchas nacionalistas e a televisão já está pronta para
transmitir, dentro de instantes, as
imagens do "maior desllle da
América Latina a 72 países do
mundo", segundo apregoa, a todo
instante, o locutor oficial.
Uma multidão de politicos, militares e dirigentes, usando no pescoço o simbolo do partido, um
lenço vennelho, aguarda, juntamente com convidados estrangeiros, a chegada do chefe supremo,
que, neste momento, acompanhado dos seus principais assessores
homenageia, no Panteão Nacional,
os heróis da pátria. Que, como ele,
também foram generais e permaneceram décadas no poder.
Pontualmente, ás 8h30, chega ao
local uma limusine blindada c reluzente, acompanhada de várias.outras, repletas de guarda-costas e
3uatro caminhonetas com dezenas
e soldados armados até os demes.
O carro pára em frente á tribuna de
honra e desce o convidado especial.
Sua. Excia. o general-de-exérciio
Don Alfredo Stroessner, presidente
da República do Paraguai e
comandante-em-chefe das Forças
Armadas da nação, ás vésperas de
completar seus 74 anos. Ele está impecável num temo de tropical inglês
escuro e usa sapatos de cromo alemão. No pescoço, destaca-se o
lenço vennelho. É saudado triunfalmente, como um monarca pelos
seus súditos. Agradece as reverências e sobe triunfalmente as escadas
em direção á tribuna de honra.
Toma assento junto aos seus minis-
tros e, em seguida, ordena, pela trigésima segunda vez consecutiva, o
início de um espetáculo que poderá
comandar até a morte.
r\ partir de então, durante cinco
horas seguidas, mais de cem mil
pessoas com vestimentas típicas,
lenços, faixas e galhardetes vermelhos, cultuarão a personalidade do
ídolo, como nas típicas manifestações nazistas. Suas faixas canegam
sempre palavras de ordem, do tipo
"Stroessner até a morte" ou "General, sua reeleição está assegurada".
Ê, sem dúvida, um espetáculo
impressionante pela mobilização de
massa. São dirigentes partidários,
funcionários públicos civis e militares, que, no Paraguai, são obrigados a se filiar e a descontar 5% do
salário para o partido do governo.
Ou, então, operários e camponeses,
trazidos em ônibus cedidos gratuitamente pelas empresas de transportes, de todos os pontos do país.
Falta apenas o fundamental: a participação popular. É como se fosse
um desfile de escolas de samba no
Carnaval do Rio, sem ninguém nas
arquibancadas. Somente alguns
coneligionários aplaudem os amigos ou parentes.
Mas que país é este onde acontece de tudo? De desfiles memoráveis ao fechamento de jornais, prisões arbitrárias, torturas, todo tipo
de tráfico, de pele de jacarés a drogas, ainda serve de abrigo para exditadores ou criminosos nazistas? É
o país do general Stroessner. Herói
da guerra do Chaco contra a Bolívia, o então general-dc-divisão Alfredo. Stroessner foi levadç ao poder, em 1954, depois de um golpe
de Estado que clenubou o presidente constitucional. Seu gosto pelo
poder foi tanto que nunca mais o
abandonou. Com base num estado
de sítio pennanente, que ele mesmo
criou para ser implacável com os
opositores, Stroessner ampliou,
cada vez mais, os seus tentáculos sobre o governo e o partido que o escolheu. Nomeou pessoas de sua total confiança para todos os cargoschaves do governo e dividiu com
elas o poder e as negociatas que, segundo economistas paraguaios, vão
a mais de US$ 500 milhões anuais o equivalente a dois terços da eco-
nomia do pais.
Faz parte do jogo do poder as
mesmas autoridade» que tôm os comandos lícitos terem também os
ilícitos. A^sim, o general Andrés
Rodrigues, que além de comandante da mais forte guamição do
país, também chefia o tráfico de
drogas, já foi indiciado inclusive em
processos., nos Estados Unidos. O
mesmo ocorre com o próprio filho
de Stroessner, coronel-aviador
Gustavo Adolfo, de 47 anos, que
controla o contrabando de uísque'c
cigarros e também os cassinos do
país.
Apesar da seria crise social, econômica c política que atravessa a
nação, Stroessner não admite qualquer tipo de transição ou abertura
democrática num governo, que, segundo suas próprias palavras, "vive
uma normalidade democrática e
constitucional". Não pensa também
na possibilidade de um sucessor,
porque "a eleição livre é um direito
do povo". Quando perguntado
pelo enviado especial de Senhor se vai
concorrer ao seu oitavo mandato,
Stroessner é categórico: "Não confirmo nem desminto, porque nunca
fui candidato de mim mesmo e sim
de um partido político que é a expressão mais relevante cia maioria
cívica da República." Seus principais colaboradores, no entanto,
confirmam mais uma nova candidatura e, segundo o deputado federal e membro da junta de governo
do Partido Colorado, Salvador Paredes, açual embaixador no Brasil,
"ela será imbatível na convenção de
agosto do próximo ano. Porque
Stroessner detém 8596 dos votos cios
600 convencionais".
No entanto, a verdade é que não
existe hoje um sucessor natural para
Stroessner talvez porque, segundo
os lideres oposicionistas, ele cometeu o mesmo erro dos seus antecessores: preocupado cm se eternizar
nó poder, não criou quadros políticos para sucedê-lo. Como as pressões internas e externas contra o seu
governo aumentam a cada dia, .a
sucessão poderá ser. mais uma vez,
sangrenta, como c a tradição do
país, onde jamais um governante
conseguiu passar a faixa presidencial ao seu sucessor. Na última
Guerra Civil, antes de Stroessner tf
mm
3UIN3
INTERNACIONAL
MA
subir ao poder, morreram três mil
paraguaios.
Acontece que Stroessner é considerado, inclusive pelos seus opositores, como o fundador do Paraguai moderno. Ele acredita que pôs
fim a um estado de anarquia que
chegou a gerar "vinte e dois presidentes em 31 anos, o que significa
um presidente a cada 19 meses".
Construiu escolas, hospitais, estradas e levou energia elétrica, antes só
existente em Assunção e mais três
cidades, a 200 localidades, depois
da construção da hidrelétrica de
Itaipu, em sociedade com o Brasil e
que endividou o país em mais de
USS 8 bilhões, quatro vezes o valor
total de sua dívida externa.
c
waso nao consiga cumprir mais
um mandato, até 1992, Stroessner
gostaria de indicar o seu fiel amigo
e guarda-costas, general Andrcs
Rodrigues, ou o próprio filho, coronel Gustavo Adolfo, mas será
muito dificil por causa do envolvimento de amoos com a corrupção e
tráfico de tóxicos. Há quem diga
que ele tem uma cartada pronta
para esses casos: colocaria um titere
civil de sua confiança e continuaria
no comando das Forças ArmadasTambém nas oposições não é fácil encontrar um nome para suceder Stroessner, pois, segundo seus
lideres reconhecem, "precisa superar seu extremado fracionamento e
os conflitos internos que as afligem". A verdade é que, depois de
32 anos de poder, Stroessner conseguiu liquidar com toda a oposição e
o país necessita, urgentemente e
primeiro de tudo, organi/ar a sociedade civil. O artigo 79 da Constituição, que estabelece o estado de sítio
permanente, proíbe qualquer tipo
de organização social, seja sob a
forma de sindicatos, de associações
de classes ou através de partidos de
oposição autênticos. Esse artigo dá
ao governo o poder de prender, banir ou até mesmo faier desaparecer
qualquer pessoa, a exemplo do que
ocorria no Brasil na época do AI-5.
Com base nele, milhares de pessoas
foram expulsas ou se exilaram no
Exterior. Calcula-se que existam,
hoje, cerca de 800 mil exilados, a
maior parte na Argentina. Centenas
de outras, inclusive brasileiros, continuam desaparecidas ou presas,
sem processo formado nos cárceres
paraguaios, como o de Tacumbu,
nos arredores de Assunção.
Enquanto isso, os protegidos do
regime são intocáveis c go/am dos
privilégios da mesma lei. O tráfico,
o roubo e o contrabando são insti-
tucionalizados. A maconha, cultivada no pais, e a cocaína, importada da Bolívia, são exportadas para
todo o mundo, principalmente
para o Brasil c Estados Unidos, em
quantidades incalculáveis. Só de
carros brasileiros roubados, existem
quase cem mil trafegando livremente pelas ruas do Paraguai. Para
o diretor da Divisão Fazendária da
Polícia Federal, Renato Torrano,
isso só é possível porque as autoridades paraguaias não exigem catilicados de propriedade ou guia de imponação para curos estrangeiros.
Biusta uma dedaração cm canóno de
propriedade do veiculo, o que - para
ele - significa a institucionalização de
um ciime. Além disto, o Paraguai é
hoje o segundo exportador mundial
de uisque, na maioria l;üso, com cerca
de 500 mil caixas anuais, o mesmo
ocorrendo com relógios e artigos eleQüiücos, quase todos ialsilicados em
Taiwan e importados através da LinliiLs Aéreas Paraguayas. E isso rende
ao pais mais de USS ()00 milhões, o
dobro das MUIS ex|«mamões legais.
Diante de ioda essa situação, o
país busca um lidei que poderia
pór fim a este estado de coisas e
promover uma transição pacífica de
poder. Um dos nomes que vem
crescendo, ultimamente, é o do empresário e jornalista Aldo Zucolillo,
56 anos, hoje um dos símbolos da
resistência à ditadura de Stroessner.
Zucolillo ganhou prestígio internacional após batalhar, nos órgãos de
defesa, dos direitos humanos de
todo o mundo, pela reabertura de
seu jornal ABC Color, fechado há
dois anos, por ordem expressa de
Stroessner, devido às denúncias
contra todos os crimes cometidos
pelo regime. Agora, poderá ser
uma opção para uma transição civil
pacífica, que contaria inclusive com
o apoio dos Estados Unidos de Ronald Reagan, um tanto desconfiados de que o regime Stroessner já
tem seus dias tomados.
\J governo norte-americano, signüicativameme, vem ameaçando
Stroessner, nuie outras medidas,
como a de lamelar a suspensão de
empréstimos ao Paraguai, com a
reabertura do jornal de Zucolillo.
Mas, como tudo no Paraguai, Zucolillo também é contraditório c, às
vezes, até ingênuo. Sentado na sua
cadeira na direção do jornal, onde
vai iodos os dias como se o jornal
estivesse em pleno funcionamento,
Zucolillo, um ex-atleta de .mais de
1,80 m de altura, condena a ajuda
militar c econômica do Brasil ao
Paraguai, inclusive a recente doação
de cinco aviões militares àquele país
e diz que se o governo da Nova República cortasse este tipo de ajuda
como fizeram os Estados Unidos, o
regime Stroessner já teria caído.
Mas, em seguida, após uma longa
KMVedura de Unré - bebida típica á
base de erva-mate - ele é capaz de
desabafas como este: "Nós estamos
ansiosos para que surja aqui um
militar que tenha a coragem do general Figueiredo, para empunar
esse país para a democracia.
Em todo caso, as oposições autênticas do Paraguai, buscando
uma "saída honrosa" para o sistema, criaram o chamado Acordo
Nacional, formado pelos partidos
Liberal Autêntico, Revolucionário
Febrerista, Democrata Cristão e
pelo Movimento Popular Colorado-Mopoco. Eles propõem
um "diálogo nacional", a ser conduzido pelo arcebispo de Assunção,
monsenlior Ismael Sólon, e pedem,
entre outras medida.s, o levaniamento do estado de sitio pennanente, anistia política, liberdade de
imprensa, e a convocação de uma
Assembléia Nacional Constituinte,
através de eleições livres e soberanas. Só assim, poderia ser mudada
a atual lei eleitoral, enxertada na
Constituição, que não permite a alternância de partidos politicos no
poder e possibilitou a Stroessner
tornar-se o segundo mais amigo ditador do mundo, perdendo apenas
para Kim 11 Sung, da Coréia do
Norte na chefia do governo desde
1945. Stroessner, com essa simples
penada, inviabilizou, portanto,
qualquer tipo de diálogo.
Os dissidentes do Partido Colorado acreditam que não haverá
transição governamental sem o
apoio' do próprio Stroessner. Acreditam, também, que ele terá de ceder ás crescentes pressões externas e
internas que vem sofrendo dos seus
próprios aliados ou ex-aliados. O
embaixador Clyde Taylor, dos Estados Unidos, vem realizando fre3Cientes reuniões com os membros
o Acordo Nacional, visando a
uma substituição pacifica de
Stroessner, e o governo Ronald Reagan condiciona qualquer ajuda ao
regime de Stroessner a três avanços
democráticos: o levantamento do
estado,,de sítio permanente, a permissão para a volta ao país do vicepresidente do Partido Liberal Autêntico, Domingos Laiho, e a reabertura do jornal ÁUC Color.
O Movimento Popular Colorado-Mopoco -, fundado no exílio, em 1954, por membros tio
Partido Colorado, expulsos do país
por ordem de Stroessner, acha que
poderá chegar ao poder num processo de democratização gradual,
mas, até que isso possa ocorrer, seu
presidente, advogado Waldino Lovera, de 59 anos, que só pôde voltar
ao pais no ano passado, após a rcdemocraiLmçào da Argentina, Um-
O general Alfredo Stroessner
não costuma dar entrevistas. Depois de muita insistência do enviado de Snüwf, ele resolveu falar. Mesmo assim, exigiu que as
perguntas fossem feitas por escrito. Dois meses detxns, cie as respondeu. O general, que está no
poder há 32 anos com base num
regime ditatorial e fortemente anticomunista, também se acha no
direito de dar aula de democracia
aos Estados Unidos, a exemplo do
seu amigo general Augusto Pinochet, do Chile. A seguir, publicamos um resumo da sua entrevista :
P - Afirma-se, no Brasil, que o sr.
acaba de perder o apoio do governo doi
Estados Unidos e eslá experimenlando
um cresdmmío da oposição da Igreja no
seu país. Além disto, diz-se que o sr. estaria com uma doença grave, o que o levaria a se operar na Alemanha Ocidental, a convite do chanceler Helmul
Kolü. Isso seria um motivo para o sr.
passar a morar na Baviera, terra dos
seus ancestrais. O que o serüior tem a
dizer sobre isto?
R - Não é sério, e muito menos
responsável, falar de apoio norteamericano. Pode-se, isto sim,
iálar-se de amigáveis relações bilaterais paraguaio-norte-americanas, as quais mantém-se
em nível satisfatório, já que o governo desse pais amigo não pode
confundir a normalidade constitucional do Paraguai com nenhuma
situação de fato que se possa datem outras latitudes. Não dependemos de nenhum "apoio", venha
de onde vier, ou de quem quer
que seja. Estamos a par da realidade universal e estaremos, também, ao lado daqueles que lutam
guai e Brasil, tem a sua casa, c tambóm sede do partido, permanentemente vigiada pela polícia de
Stroessner, que segue todos os seus
passos.
,
Isto, no entanto, é o mínimo que'
pode acontecer a um dissidente no
Paraguai. O vice-presidente do Partido Liberal Autêntico, Domingos
Laino, um economista de 49 anos,
exilado desde 1982, já tentou regressar cinco vezes ao seu país, onde
vivem sua mulher e quatro filhos.
• Sem sucesso. Na última, em junho
passado, foi espancado terrivelmente pela polícia, no próprio aeroporto, e mandado de volta no
mesmo avião para o Uruguai.
mantendo a bandeira da liberdade, defendendo os valores substanciais do homem, a independência c soberania dos povos. Há
mais ainda. Nós nos mantemos irreversivelmente fiéis á nossa posição anticomunista. Em relação á
última parte da sua pergunta, a
única veracidade é que recebi um
convite oficial para visitar a República Federal da Alemanha, terra
de meus antepassados paternos, o
qual não consegui efetivar ainda
pelo acúmulo de tarelás junto a
meu povo. No que se refere à minha saúde, todos os jornalistas
que visitam o Paraguai e meus
compatriotas podem estar certos
de que minhas energias não têm
diminuído para continuar trabalhando pelo bem de minha pátria.
milhões e meio morando em seu território e um milhão fora de suas fronteiras. Muitos deles não podem sequer
desembarcar no seu país, como é o caso
do líder oposicionista Domingos Laino.
Essa situação pode um dia terminar e
todos os cidadãos paraguaios viverem
em paz no seu país, como acontece hoje
no Brasil e nos demais países democrátiÍos do mundo?
. , ,
, ,
P - Depois da redemocralitaçâo do
Brasil, Argentina e Uruguai, com a instalação de governos civis, através do
voto direto, o sr. acredita que possam ser
mantidos governos fortes, presididos /wr
militares, como os do Faraguai e do
Chile r
R - O Paraguai tem um governo
constitucional, emanado do voto
popular, desenvolvendo-se na
plena normalidade democrática.
Elimino que, de boa fé, se possa confundir a origem e a natureza
política do governo paraguaio
com alguma situação institucional
que demande democratização ou
transição. Não creio afortunada a
pergunta que induz a atribuir caráter militar a meu govemo, pois,
da mesma maneira, poderíamos
perguntar-lhe onde se situa a presidência do general Eisenhower
nos Estados Unidos, ou á do general De Gaulle, quando ocupou á"
presidência da França.
'? - O Paraguai tem fioje cerca de quatro milhões e meio de habitantes. Três
l - Quanto aos cidadãos excluídos do país, há somente duas pessoas que não podem desemoarcar: o escritor comunista espanholizado Augusto Roa Bastos e o
agitador Domingos Laino, ao
qual o senhor chama de líder oposicionista. Situações como as que
provocam esses dois sujeitos são as
que criam tensões inconvenientes
para todos e alteram o clima necessário para as liberdades democrátic*s.
P - Um problema sério entre o Brasil e o
Paraguai, hoje, é a questão de fronleiras. Não mais de limites, como no passado, e sim de tráfico de drogas, contrabando de mercadorias agrícolas (café e
soja), manufaturados (automóveis e caminhões) e, agora, produtos eletrônicos,
prinápalmente na área de informática.
Como pode ser regularizado isso?
R - A questão do comércio fronteiriço resolver-se-á com a abundância dos bens intercambiais.
São os desequilíbrios que estimulam as desairosas práticas, e cremos que estará no interesse comum de todos aperfeiçoar táticas
inteligentes para facilitar o intercâmbio c desestimular o comércio
ilegal. O'comércio regular vai-se
consolidando, o qual afiançar-se-á
quanto mais rapidamente as fronteiras deixem de ser o último reduto das práticas ilegais de toda
ordem, como acontece em todas
as partes.
M
P
o
r
3
ü jonuilista c empresário Aldo
Zucolilln lonhccc a llmdo o governo de Suocssiier. Ex-unújío
cio ditador paraguaio, c easado
com a irmã do civil mais fone do
regime, o clielc do Cerimonial da
Presidência da República e liei
amigo de Siroessner. Contado Papailardo. Seu irmão é embaixador
do Paraguai em Londres. Há dois
anos, Zucolillo participa de todas
as reuniões da Socieuadc Intcramericana de Imprensa - SIP -,
protestando contra o fechamento
do seu jornal, ABC Color, o mais
importante do país, por ordem direta de Stroessner.
Em Assunção, Zucolillo falou
com euforia sobre a situação do
Paraguai de hoje e qual deverá ser
o seu destino.
baridade de casos de torturas,
mortes, roubos, negociatas fantásticas. Você imagina, então, a existência de jornais livres como o
ABC Color fazendo investigações.
Essa ditadura não suportaria. A
ditadura de Stroessner não suporta 30 dias de liberdade de imprensa.
P - 0 que o seu jornal linha de lào perigoso para o regune?
P - £ qual o papel de Stroessner nesse
sistema? Como ele gerencia essa corrupção?
R - O mesmo da maioria dos jornais do mundo. A defesa de setores da sociedade que se julgavam
prejudicados pela ditadura de
Stroessner. Até 1967, não havia no
Paraguai nenhum jornal que se
preocupasse com a defesa dos cidadãos. Nós passamos, então, a
inteiprctar os anseios, as esperanças, as alegrias e as tristezas da população. Como faz toda a imprensa livre e honesta do mundo.
P - £ qual foi o argumerdo do governo
para fccltar o jornal?
R - O mesmo que alegam todas as
ditaduras. O mesmo argumento
3ue levou a Polônia a fechar o sinicato Solidariedade ej^ue ievou o
governo sandinista dá Nicarágua a
fechar o jornal La Prensa: Que estávamos fazendo subversão.
P - E a Constiluiçào paraguaia permite
isso?
R - Absolutamente. É um ato inteiramente inconstitucional. Arbitrário. Ditatorial. Repudiado por
todo o munao. Desde o Departamento de Estado americano, à Sociedade Intcramericana de Imprensa, a todos os jornalistas livres
do mundo. Sc você pega os jornais
daqui, hoje, são' um verdadeiro
romance de Agatha Christic.
Mesmo com toda a censura imposta pelo governo, com a autocensura, ainda assim há uma bar-
? - Na sua opinião, qual a principal
característica da ditadura paraguaia?
R - Isso aqui é uma grande fazenda de 400 mil quilômetros
quadrados, com um fazendeiro
corrupto e sanguinário que c
Stroessner. Sua fortuna e a das
pessoas que estão ligadas a ele é
incalculável. Tem ministros há 32
anos nos cargos. Generais há 25
anos nos mesmos comandos.
Todo esse pessoal é controlado
por Stroessner.
R - Essa é a grande habilidade de
Siroessner e é isto que o mantém
há 3 2 anos no poder. É ele quem
corta o bolo c distribui as fatias. E
está sempre em busca de novos
bolos para alimentar a corrupção.
Nós devemos hoje cerca de 2 bilhões e meio de dólares, fora
Itaipu. Quanto está no boisodos
militares corruptos, dos seus amigos, de sua família? Existem informações de que vão a 500 milhões
de dólares, somente em contas
bancárias no exterior, fora os bens
como empresas, navios, prédios e
outros negócios.
? ■s E de que vivem o Paraguai e Stroessner?
R - Do Brasil. Porque o Brasil é,
hoje, o pais mais importante para
o Paraguai. E Stroessner defende
os interesses brasileiros nessa região geoeconômica. Por exemplo,
o tratado de Itaipu é uma aliança
perpétua assinada entre Stroessner
e a então ditadura brasileira. Ele
pode ser uma boa aliança ou um
novo Canaf Ho Panamá na
América do 'Sul, se não for renegóciaclo. Além disso, o comércio
ilícito paraguaio, que representa
dois terços da nossa economia,
vem ou vai p'ara o Brasil, nosso
maior parceiro econômico em
operações legais e ilega[s. Por tudo
isso, nossa sorte depende do Bra-
P - Smdo assim, como se poderia acabar com o contrabando e o tráfico na
frorüeira dos dois países?
R - Você tocou na coluna principal que sustenta o governo de
Stroessner. O tráfico de drogas, o
contrabando, o roubo de carros.
Aqui existem milhares de carros
roubados no Brasil. São, na sua
maioria, de um tenente, capitão,
comissário de polícia, primo ou
amante de uma autoridade. São
cerca de cem mil e você pode
comprá-los, tranqüilamente, pelos
anúncios dos jornais. Um Santana, por exemplo, custa entre mil
e mil c quinhentos dólares. Isto
porque o crime aqui c institucionalizado. É ele quem mantém o
sistema de poder. O Brasil poderia
nos dar uma boa mão, obrigando
o governo de Stroessner a legalizar
o comércio entre os dois países.
Com isso, já solucionaríamos
grande parte dos nossos problemas. Isto porque aqui o governo
coloca policiais corruptos para
criar obstáculos ao comércio legal.
Sc você suborna, essas barreiras
são retiradas; caso contrário, náo.
P - Diante dessa situação, quais as possibilidades de o Paraguai jmrtiápar do
Mercado Corrum entre o Brasil, Argentina e Uruguai?
R - Nenhuma. Como um governo
corrupto como o nosso poderia
negociar com esses países cm
igualdade de condições? Além do
mais, o que Stroessner poderia
conversar numa mesa de negociações com Samcy, Alfonsín, Sanguinetti ou Alan Garcia? Isso ele
fazia, com desenvoltura, na época
das ditaduras militares, mas agora
. é um estranho no ninho.
P - £ o Brasil, o que poderia fazer
neste momento?
R - Nós precisamos que o presidente José Samey e as demais autoridades da Nova República nos
ajudem a sair da situação em que
estamos há 32 anos. Se o presidente Samey fizesse a Stroessner a
metade das criticas feitas pelo presidente Alfonsín, este governo já
teria caído. Regimes como os de
Stroessner e Pinochet não podem
continuar existindo neste final do
■ sé culo XX.
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