CAPÍTULO I
ALTERAÇÕES NO EQUILÍBRIO HIDROELETROLÍTICO
Neste capítulo serão feitas considerações sobre aspectos da fluidoterapia no pré, trans e
pós-operatório visando minorar os riscos inerentes ao trauma cirúrgico.
A anestesia e cirurgia induzem diferentes graus de agressão ao indivíduo. A intensidade
da resposta orgânica está relacionada à severidade dessa agressão e às condições físicas do
animal. É importante lembrar que indivíduos portadores de intercorrência clínica são pacientes
cirúrgicos de alto risco. Neste caso, deve ser bem calculado o momento da cirurgia. Naquelas
eletivas a intervenção pode ser protelada dando tempo à preparação pré-operatória adequada. Na
emergência, no entanto, faz-se necessária decisão criteriosa sobre o momento da operação de vez
que tanto a protelação quanto a intervenção sem adequadas condições orgânicas podem incorrer
em óbito.
Cada tipo de lesão ou patologia requer adoção de maior ou menor número de medidas
pré, trans e pós-operatórias. As queimaduras severas, contusões com esmagamento e as fraturas
são exemplos de agressões que produzem alterações metabólicas agudas e prolongadas.
Outro parâmetro a ser considerado no paciente cirúrgico é o seu estado ou equilíbrio
hidroeletrolítico. No cão, a água é equivalente a 60-65% do peso corporal no adulto, 70-80% nos
jovens e 45-50% nos obesos. No bovino, um embrião possui 95% de sua constituição em água e
o recém-nascido 75% ou mais, decrescendo até
40% na maturidade.
Diversas alterações de ordem clínica e
cirúrgica interferem com o equilíbrio
hidroeletrolítico. A perda de água determina
vários graus de desidratação. No animal
hidratado a distribuição de água é regulada pelas
forças osmóticas dos solutos que variam entre
280 e 310 mOsm/kg [média de 295 mOsm/kg
(Figura 1.1)]. As variações na concentração
sérica do sódio, cationte em maior concentração
no líquido extracelular, provocam desvios da Figura 1.1 - Esquema representativo da
osmolalidade. Assim, o paciente é suscetível à
distribuição hidroeletrolítica
desidratação dos tipos iso, hipo ou hipertônica.
no organismo
Na
desidratação
isotônica
ou
isonatrêmica ocorre perda proporcional de água e
sais existentes no espaço extracelular (Figura 1.2). Nesta condição a migração de líquidos entre
os meios intra e extracelulares é de pouca intensidade, pois a osmolalidade e tonicidade
permanecem constantes (295 mOsm/kg). As causas mais freqüentes são as perdas por diarréia e
vômito, seqüestro de líquido extracelular em lesões e infecções dos tecidos moles e nas
peritonites.
A desidratação hipotônica ou hiponatrêmica é caracterizada por baixa osmolalidade do
espaço extracelular devido a perda de eletrólitos em excesso de água. Há perda de líquido
hiperosmolar (acima de 310 mOsm/kg). O compartimento extracelular torna-se hiposmolar e
hipotônico (abaixo de 280 mOsm/kg) em relação ao intracelular. A passagem de líquido
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2
extracelular para o interior da célula restabelece
o equilíbrio entre os compartimentos a uma
pressão osmótica menor (inferior a 295
mOsm/kg), minimizando, assim, a perda do
meio intracelular. Como se observa, há fuga de
líquido extracelular para fora do corpo e para o
interior da célula que ingurgita (Figura 1.3).
Estes pacientes estão mais predispostos ao
colapso vascular e requerem terapia agressiva.
As causas mais comuns desta alteração incluem
a insuficiência da cortical adrenal, uso
Figura 1.2 - Desidratação isotônica. A perda
inadequado de diuréticos e reposição iatrogênica
proporcional de água e eletrólitos
não altera a osmolaridade entre os de perdas isotônicas com glicose 5% ou água.
Quando
ocorrer
perda
compartimentos orgânicos.
proporcionalmente maior de água que sais
haverá hiperosmolalidade no meio extracelular
caracterizando uma desidratação hipertônica
ou hipernatrêmica. Haverá perda de líquido
hiposmolar (inferior a 280 mOsm/kg). O meio
extracelular
torna-se
hiperosmolar
e
hipertônico (acima de 310 mOsm/kg) em
relação ao intracelular (Figura 1.4). A saída de
líquido da célula restabelece o equilíbrio entre
os compartimentos a uma pressão osmótica
mais elevada (>295 mOsm/kg) e minimiza a
perda do líquido extracelular. A desidratação
hipertônica está associada com baixa ingestão
de água, aumento nas perdas insensíveis
(febre, taquipnéia) e administração de
Figura 1.3 - Desidratação hipotônica. A perda de
soluções muito concentradas.
líquido hipertônico causa desidratação
O potássio merece consideração por
hipotônica.
ser o cationte que ocorre em concentração
maior dentro da célula. Apesar da pequena
quantidade extracelular é crítico que sua concentração permaneça dentro de limites
absolutamente estreitos. As alterações iniciam
em concentrações acima de 6,5 ou abaixo de 2,5
mEq/l. A hipocalemia ou hipopotassemia ocorre
nas perdas gastrintestinais (diarréia, vômito ou
obstrução intestinal), estresse, uso de diuréticos,
na
alcalose,
nos
traumatismos
como
queimaduras, exsudação de feridas e destruição
de tecidos com liberação de potássio das células,
sendo subseqüentemente perdido pela urina. A
anorexia, má nutrição e administração parenteral
de soluções sem potássio também são causas de
Figura 1.4 - Desidratação hipertônica. A perda de hipocalemia. Já, a hipercalemia pode ser
líquido hipotônico torna os meios conseqüência de anúria (falha renal, desidratação
hipertônicos.
e choque), insuficiência adrenal, administração
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3
venosa muito rápida de soluções contendo potássio e por ação das catecolaminas (efeito
catabólico).
Cabe ressaltar ainda que os requerimentos hidroeletrolíticos podem ser classificados em
dois grupos: a) deficiência de volume intersticial e/ou intracelular (desidratação) e, b) diminuição
do volume circulante (hipovolemia). É preciso lembrar, no entanto, que ambos estão
correlacionados devido à constante interação através dos mecanismos de homeostase. Desta
forma, as soluções para fluidoterapia podem ser agrupadas de conformidade com suas
características: a) soluções coloidais para repor a volemia e b) soluções salinas para repor o
volume extravascular (hidratar).
1.0 - HIDRATAÇÃO
Para ser feito o diagnóstico do déficit líquido no organismo podem ser utilizados exames
clínico e de laboratório. Neste
capítulo será dada ênfase à avaliação Quadro 1.1. Parâmetros para avaliação clínica pré-operatória de
cães, relacionando os sinais físicos com o grau de
clínica, de vez que o cirurgião nem
desidratação.
sempre dispõe de tempo ou, mesmo,
apoio laboratorial antes da cirurgia.
Com finalidade didática a
% de
Sinais Físicos
hidroterapia será apresentada em três desidratação
fases: pré, trans e pós-operatória.
4
Sem anormalidade; apenas história clínica de
falta de ingestão de água;
1.1
REPOSIÇÃO
PRÉOPERATÓRIA
6
Leve inelasticidade da pele (flacidez); mucosas e
1.1.1 - Pequenos Animais
pele secas; urina concentrada; cansa facilmente;
No pré-operatório além dos
cuidados rotineiros, que antecedem a
8
Pele sem elasticidade; tempo de reperfusão
cirurgia, está indicada a estabilização
capilar acima de 3 Segundos; olho profundo na
órbita; mucosa oral viscosa e seca; conjuntiva
hidroeletrolítica. Para estimar a
congesta e seca; urina concentrada e escassa;
quantidade de solução a repor é
necessário avaliar o grau de
10-12
Pele com severa falta de elasticidade; reperfusão
espoliação
que
o
indivíduo
capilar acima de 3 Segundos; olho profundo na
apresenta. A avaliação clínica
órbita; mucosa pálida; pulso rápido e fraco;
permite uma estimativa subjetiva,
contrações musculares involuntárias; choque em
animais debilitados;
porém suficiente para evitar
reposição excessiva ou muito aquém
12-15
Choque ou morte iminente.
das reais necessidades do paciente.
O Quadro 1.1 ilustra os graus de Adaptado de CORNELIUS, 1980.
desidratação e os sinais físicos
correspondentes. É conveniente
lembrar que nos animais obesos ou caquéticos estes sinais podem estar mascarados. Desnutrição
não é sinônimo de desidratação e obesidade não significa boa condição física.
O déficit avaliado, quando aplicado na fórmula:
peso (kg) X % desidratação
---------------------------------- = litros de solução
100
indica a quantidade de solução necessária para
compensar o volume de líquido, que o indivíduo já
perdeu e que deverá ser reposto em 24 horas.
Se o indivíduo não tomar água, principalmente quando apresentar afecções
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4
gastrintestinais, o seu requerimento hidroeletrolítico diário deve ser calculado. Ter em mente que
o requerimento basal é aquele em condições de repouso e em normotermia. As compensações
para perdas digestivas devem considerar a condição de vômito, diarréia ou diarréia e vômito que
devem ser compensados antes da cirurgia. O Quadro 1.2 apresenta as necessidades estimadas de
água, nestas situações, e o requerimento de sódio e potássio que são os principais cationtes nos
meios extra e intracelular respectivamente.
Tomando como exemplo um cão Doberman de 8,0kg, candidato a cirurgia estética de
orelhas (eletiva), mas apresentando um grau de desidratação equivalente a 10% em conseqüência
a vômito e diarréia. O cálculo de solução a repor em 24 horas, conforme a
fórmula, seria de:
8 X 10
- 800 ml (0,8 litros) relativos à desidratação.
--------- = 0,8 litros
- 480 ml relativos às perdas gastrintestinais (60 x 8);
100
- 400ml relativos a seu requerimento diário (50 x 8), na hipótese
de não ingerir água (Quadro 1.2). Este cão deveria receber, portanto, 1680 ml de solução, por
gotejamento venoso durante 24 h. Como é impraticável mantê-lo contido por tanto tempo, a
quantidade calculada pode ser fracionada em várias doses durante o dia (por exemplo: 420 ml a
cada 6 h, para este caso específico). A reposição será mais efetiva se o paciente for reavaliado
antes da reposição de cada fração, pois pode haver mudança no quadro clínico com maior ou
menor requerimento durante o dia.
Nas cirurgias eletivas o cirurgião pode dar-se ao luxo de corrigir completamente a
desidratação antes da intervenção. A emergência e o custo podem tornar-se limitantes. No
primeiro caso não se pode esperar muito para intervir, perdendo um tempo precioso à
sobrevivência, no entanto, pode-se iniciar a reposição enquanto se faz o exame clínico e estão
sendo tomadas as medidas pré-operatórias de rotina. No segundo caso, o custo da internação e
das soluções pode ser antieconômico. Em se tratando de pequenos animais geralmente predomina
o valor afetivo.
A escolha da solução de
reposição é fator importante na
Quadro 1.2. Parâmetros para reposição das necessidades básicas
hidratação. A maioria dos
diárias, das perdas já ocorridas, das perdas
desidratados requer
gastrintestinais relativas à água, sódio e potássio para animais
relativamente mais água que
cães e gatos.
eletrólitos. Quando for associada
uma solução eletrolítica com
Especifica
Água
Sódio
Potássio
outra
glicosada,
ambas
-ção
isotônicas,
a
glicose
é
metabolizada restando a água
Necessida- Cão: 40-50 ml/kg/dia
3 mEq/kg/dia 1 mEq/kg/dia
que é distribuída pelo organismo
des diárias Gato: 70 ml/kg/dia
ou eliminada pela urina.
Quando
houver
Perdas já
6 mEq/100 2mEq/100ml a
desidratação hiponatrêmica será
ocorridas
%depleção x kg
ml a repor
repor
------------------recomendado
administrar
100
solução de NaCl 0,9% com
glicose 5% (150 mEq de Na+,
Perdas
Vômito: 40 ml/kg/dia
9 mEq/100 3 mEq/100ml
150 mEq de Cl- e 50 g de
gastrintesti Diarréia: 50 ml/kg/dia ml
glicose).
Na
desidratação
-nais
Ambos: 60 ml/kg/dia
isonatrêmica pode ser utilizada
solução de NaCl 0,45% e glicose
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5
2,5% (75 mEq de Na+, 75 mEq de Cl- e 25 g de glicose). Nos casos de desidratação hipertônica os
fatores mais importantes são a velocidade de reposição e a concentração de sódio na solução de
indicada. No primeiro caso a reposição não deve ser completada antes de 48 horas pelo risco de
edema cerebral. A solução deve ser de NaCl 0,45% e glicose 2,5%. Nos três tipos de desidratação
o cloreto de sódio pode ser substituído pela solução de Ringer lactato de sódio, nas mesmas
proporções com a glicose.
Na vigência de hipocalemia pode ser administrado cloreto de potássio, via oral, ou
intravenoso. A administração venosa não deve exceder a velocidade de 0,5mEq/kg/h, a não ser
que seja feita monitoração cardíaca com eletrocardiógrafo. O potássio pode induzir arritmias
graves. As necessidades diárias e requerimentos relativos ao potássio estão dispostos no Quadro
1.2.
No cão Doberman de 8 kg, tomado anteriormente como exemplo, seriam necessários
38,4 mEq de potássio: 8 mEq como requerimento diário (8kg x 1mEq); 16mEq pelo volume de
reposição correspondente às perdas ocorridas (800ml x 2  100); 14,4mEq para o volume de
compensação às perdas gastrintestinais (480ml x 3  100).
Considerando que uma ampola de KCl 10% com 10ml de solução possui 1g ou
aproximadamente 14mEq (1 g de KCl = 13,9mEq de K+) serão necessários 27,4ml para o cão de
8kg no exemplo citado. Este volume deve ser diluído em 250ml de NaCl 0,9% e administrado em
gotejamento venoso que não ultrapasse a velocidade de 0,5mEq/kg/h. No cão citado, 4mEq/h ou
seja: os 38,4mEq seriam administrados em aproximadamente 9h:30min. De forma mais simples,
o volume de KCL calculado pode ser diluído em 250ml de solução salina isotônica e
administrado por via subcutânea em várias aplicações ao dia dependendo do tamanho do animal.
Quando se quiser minorar o ônus da internação hospitalar para efetuar hidratação
parenteral, o proprietário pode ser instruído a utilizar hidratantes orais como o Pedialyte® (Abbott
Lab. do Brasil Ltda), usado comumente em pediatria, ou a administrar preparados caseiros (água,
sal e açúcar). Afecções gastrintestinais podem limitar o uso de soluções orais.
1.1.2 - Grandes Animais
É difícil avaliar o grau de
desidratação nas espécies de grande porte. Os Quadro 1.3. Parâmetros para avaliação da
sinais clínicos de turgor da pele, umidade e
desidratação em bovinos (conforme
JENNINGS, 1984).
brilho das mucosas, caráter e posição do olho
na órbita são subjetivos.
Para bovinos têm sido estabelecidos,
% de Desidratação
Sinais Clínicos
como parâmetros aproximados, dois graus de
desidratação (Quadro 1.3)
10
Sinais de depressão e apatia;
mucosas ressequidas; perda de
Quando um bovino não tomar
turgor da pele; olho profundo na
voluntariamente as necessidades hídricas
órbita; paciente em estação ou
diárias (necessidades basais), estas devem ser
decúbito esternal;
suplementadas, sendo adicionadas ao déficit
calculado, em quantidade equivalente ao
15
Além dos sinais de grau
relacionado no Quadro 1.4.
moderado,
diminuição
na
Assim, um bovino de 500kg que
temperatura corporal, decúbito
lateral; animal moribundo.
apresentasse uma espoliação de 50 litros, não
tomando água em 24 horas, precisaria de
mais 25 litros. A hidratação parenteral em
bovinos, como se observa, é muito onerosa. Portanto, o objetivo imediato é combater a alteração
que prejudica ou impede a ingestão oral de alimentos e líquidos.
Alceu Gaspar Raiser ([email protected])
Quadro 1.4. Requerimento diário de água (litros/dia) para
animais isotérmicos e febris incapacitados de
ingerir água. Em fêmeas aleitando
acrescentar 1 litro de água por litro de leite
produzido. (Extraído de JENNINGS, 1984).
Peso
(kg)
40
50
60
70
80
90
100
120
140
160
180
200
Temperatura (oC)
+1
+2
+3
3,0
3,7
4,2
4,9
5,3
6,0
6,6
7,4
8,8
9,8
10,0
11,2
3,5
4,2
4,9
5,5
6,2
6,6
7,5
8,4
9,7
10,8
2,0
13,0
4,0
4,6
5,5
6,0
7,0
7,4
8,2
9,6
11,0
12,5
14,2
14,9
Peso
(kg)
Temperatura (oC)
+1
+2
+3
240
280
320
340
380
400
450
500
600
700
900
1000
13,5
15,0
17,8
18,6
19,0
20,0
22,0
25,0
28,0
32,0
40,0
43,0
15,0
18,0
19,0
20,0
22,0
23,0
24,5
27,0
32,0
36,0
45,0
48,0
17,0
19,9
21,0
23,0
25,0
26,0
27,0
29,0
40,0
41,0
50,0
60,0
6
Em relação a avaliação da
desidratação em eqüinos cabe ressaltar
que:
- potros, a semelhança de bezerros,
filhotes de cães e gatos, desidratam
rapidamente e podem alcançar níveis
críticos com vômito e diarréia
moderados quando não tomam água;
- as perdas por diarréia no eqüino
adulto podem variar de 15 a 80 litros de
água por dia;
- o requerimento basal em água é de
40-50ml/kg/dia. O requerimento de
potássio é de 1mEq/kg/dia e a
velocidade de administração, sem
controle eletrocardiográfico, não deve
exceder 0,2-0,3mEq/kg/h;
- na vigência de cólica recomendase associar 1 litro de plasma ou expansor
para cada 9 litros de solução de Ringer
lactato. Assim serão compensados os
desvios de sódio e o seqüestro de
proteínas do plasma para o lúme intestinal.
Para eqüinos têm sido estabelecidos três parâmetros para avaliação da desidratação
como pode ser verificado no Quadro 1.5.
Para melhor aproveitamento das soluções salinas, elas devem ser administradas lentamente e
acompanhadas de monitoração clínica. Sinais de diurese abundante, inquietação, desconforto,
serosidade nasal indicam reposição muito rápida ou uso de solução inadequada. Reduzir ou
suspender a administração até diagnosticar
e corrigir o problema.
No Quadro 1.6 estão relacionadas
Quadro 1.5. Parâmetros para avaliação da desidratação
algumas das soluções mais utilizadas e
em eqüinos.
suas características. Algumas delas
apresentam concentrações variadas. Por
% de
Sinais clínicos
exemplo: a glicose é veiculada em
desidratação
apresentação comercial também a 10%,
Até 4
Inaparentes;
20%, 30%, e 40%. O Cloreto de potássio é
comercializado também em ampolas a
4-6
Perda de elasticidade da pele;
14,85%, 19,8% e 20%. O bicarbonato de
ressecamento das mucosas; tempo de
reperfusão
capilar
aumentado;
sódio também a 3%;
diminuição
no
débito
urinário;
As soluções especificadas no
Quadro 1.6 têm as seguintes indicações:
8 - 10
Os sinais anteriores tornam-se mais
severos; ressecamento da córnea;
- Ringer lactato: hidratante e
diminuição na pressão intra-ocular;
alcalinizante moderado;
retração do olho na órbita; pulso fraco;
- Ringer e NaCl 0,9%: hidratantes
oligúria; depressão; hematócrito acima
e acidificante moderados;
de 60%; jugular com distensão
- Glicose 5% e 50%: hidratante e
comprometida.
energético;
7
Patologia Cirúrgica Veterinária - UFSM, Santa Maria.
- Glico-salina iso e hipotônica: hidratante e energético;
- NaHCO3: alcalinizante;
- KCl: reposição de cloro e potássio;
- Intralipid® e Aminoplasmal®: alimentação parenteral.
Quadro 1.6. Característica de algumas soluções parenterais utilizadas na rotina clínico-cirúrgica.
Solução
Sódio
(mEq/l)
Potássio
(mEq/l)
Cálcio
(mEq/l)
Cloro
(mEq/l)
Tampão
Kcal/l
pH
Ringer lactato
Ringer
NaCl 0,9%
Glicose 5%
Glicose 50%
Glico-salina
Glico-sal. 0,45%
NaHco3
KCl
Aminoplasmal
Intralipid
130
147
154
----154
77
1000
-------
4
4
1380
-
3
5
-
109
156
154
----154
77
--1380
---
lactato
------------glicose
glicose
glicose
glicose
bicarbonato
------aminoácidos
ácidos graxos
9
200
2000
200
100
----200
1100
6,5
5,4
5,4
5,0
4,2
4,7
4,8
7,8
4,5
6,0 - 7,0
-
1.2 - REPOSIÇÃO TRANS-OPERATÓRIA
Com raras exceções, a maioria dos fármacos tranqüilizantes e anestésicos é hipotensora.
Daí a necessidade de preparação pré-operatória, aliada a uma escolha criteriosa do tipo de
anestesia no animal com patologia aguda. Durante a cirurgia ocorrem perdas de grau
proporcional ao tempo e severidade da agressão cirúrgica. Quando da diérese de tecidos ocorre
resposta inflamatória imediata com formação de exsudato, o que resulta em mobilização dos
líquidos para a área lesionada.
Além da perda de volume circulante (hemorragia) há redução do líquido extracelular
devido ao seqüestro para o chamado “terceiro espaço” (que inclui o edema de dissecação extensa,
fuga de líquido para o lúme ou parede de órgãos ocos e cavidade peritoneal); para o meio externo
por evaporação (na superfície corporal, trato respiratório, vísceras expostas); por lesão celular.
A diminuição ou elevação dos níveis de sódio extracelular e potássio intracelular está
ligada a aumento ou diminuição dos líquidos orgânicos. A utilização de uma solução eletrolítica
balanceada durante as intervenções cirúrgicas traz benefícios inquestionáveis. Além de facilitar a
suplementação de anestésico venoso, quando necessário, e a suplementação de fármacos em caso
de emergência hemodinâmica, oferece compensação para as perdas de líquido orgânico. É
recomendada a solução de Ringer lactato de sódio, em dose de 10-20ml/kg/h, para pequenos e 68ml/kg/h para grandes animais. Esta dose pode ser aumentada ou diminuída, durante a cirurgia,
dependendo da reação do paciente.
Além de fazer a reposição hidroeletrolítica o Ringer lactato de sódio tem ação
alcalinizante devido ao incremento na perfusão tecidual, filtração renal e metabolização do
lactato em bicarbonato. Deve ser considerado, no entanto, que o lactato é metabolizado em duas a
três horas pelo fígado. Assim, nos casos de severa acidose láctica e/ou patologia hepática, é
recomendado usar o bicarbonato e sódio na dose de 2-4mEq/kg, diluído em 500ml de solução
Alceu Gaspar Raiser ([email protected])
8
salina e administrado por gotejamento venoso em 4 a 6 horas.
1.3 - REPOSIÇÃO PÓS-OPERATÓRIA
O pós-operatório tem como prioridade principal a rápida recuperação da capacidade de
automanutenção pelo paciente. Quando for feito um pré-operatório cuidadoso e cirurgia
atraumática, mesmo compensando as perdas trans-operatórias, mas houver falha no
acompanhamento pós-cirúrgico, haverá grande possibilidade de insucesso. Nesta fase, portanto,
deve ser procedida avaliação clínica cuidadosa da dinâmica circulatória, registrando o aporte e as
perdas de líquido diariamente. Para isso canis metálicos com calhas coletoras permitem medir a
quantidade de líquido perdido pela urina e eventual vômito ou diarréia. Anotar também o volume
administrado no trans-operatório e lembrar que as perdas para o “terceiro espaço” comumente
ainda prosseguem após a cirurgia. A avaliação dos sinais físicos permite uma estimativa
aproximada da condição geral.
Pacientes de traumatismo tendem a reter água e sódio. A retenção hídrica é conseqüente
à secreção aumentada e prolongada do hormônio antidiurético (ADH). Há também contribuição
do mecanismo renina-angiotensina-aldosterona. Inicialmente há retenção de líquido como edema
nos tecidos lesionados que atuam a semelhança de esponjas. Mais tarde, o líquido retido por ação
do hormônio antidiurético move-se do leito vascular para o interstício e célula. Ocorre
paralelamente retenção de sal, mas em menor escala e sobrevem hiponatremia dilucional. A
hiponatremia e excreção reduzida de sódio após procedimentos cirúrgicos prolongam a
recuperação do paciente.
Na fase de estresse pelo trauma cirúrgico ocorre gliconeogênese principalmente às
expensas de aminoácidos. O catabolismo protéico está aumentado na fase de regeneração
tecidual. Desta forma, no pós-operatório imediato a fluidoterapia deve constar de uma solução
hidroeletrolítica balanceada, como o Ringer lactato de sódio, à qual pode ser associada outra
contendo aminoácidos e não glicose. O volume de ao menos 50ml/kg/dia para o cão, 70ml/kg/dia
para o gato e 40ml/kg/dia para grandes animais evitará a oligúria e hiponatremia dilucional.
Quantidades maiores ou menores de soluções ou a escolha de diferentes tipos, ficam na
dependência de cuidadosa avaliação clínica.
Pode acontecer de o paciente ter sofrido severa agressão comprometendo sua volemia.
São exemplos as lesões com hemorragia abundante e as queimaduras extensas. Os sinais físicos
indicadores de hipotensão incluem: pulso filiforme ou ausente, colabamento de veias periféricas,
diminuição no débito urinário (<1-2ml/kg/h), bulhas cardíacas mais fracas à auscultação e
variação na coloração das mucosas e tempo de reperfusão capilar (Quadro 1.7).
Estes casos de hipovolemia requerem a reposição de volume com soluções contendo
moléculas que não passam facilmente através da parede capilar e permaneçam no leito vascular
exercendo pressão coloidosmótica. Estas soluções são conhecidas como coloidais. Assim, as
soluções salinas, como a de Ringer ou Ringer lactato, por não manterem pressão coloidosmótica,
podem causar edema nestas situações por passarem rapidamente para o meio intersticial.
Experimentalmente comprovou-se que é necessário um volume três a quatro vezes superior ao de
sangue perdido, quando for substituído por solução salina. Assim, a associação entre soluções
hidratantes e expansores da volemia devem ser associadas numa proporção de 3:1 para que seja
mcorrigidom o déficit hidroeletrolítico e a hipotensão.
Lembrar sempre que as soluções salinas são hidratantes, enquanto que as coloidais
expandem a volemia. A associação entre esses dois grupos de soluções é freqüente, pois os casos
de hipotensão freqüentemente acompanham-se de desidratação.
Patologia Cirúrgica Veterinária - UFSM, Santa Maria.
9
Quadro 1.7. Relação entre variações na coloração das mucosas e tempo de reperfusão capilar com a condição
cardiovascular.
Coloração das mucosas
Tempo de reperfusão
capilar
Condição cardiovascular
Rosa brilhante
Congestas
Rosa-pálidas
1 segundo ou menos
1 segundo ou menos
1 a 3 segundos
Azuladas
1 a 3 segundos
Normal
Vasodilatação; débito cardíaco normal a baixo
Pressão sangüínea e débito cardíaco baixos; vasoconstrição periférica;
Pressão arterial e débito cardíaco muito baixos; hipóxia;
possível dilatação venosa e/ ou refluxo de sangue venoso
em leito capilar.
NELSON, 1976.
1.4 - TRANSFUSÃO DE SANGUE
O sangue é essencial à sobrevivência do ser vivo. A transfusão de um indivíduo para
outro pode oferecer resultados excelentes, mas também desastrosos. Os resultados negativos
decorrem de incompatibilidade imunológica, uso inadequado de anticoagulante, sepsia e
reposição insuficiente ou excessiva de sangue.
1.4.1 - Grupos sangüíneos
A membrana dos eritrócitos apresenta antígenos específicos que determinam os grupos
sangüíneos nas diferentes espécies. Estes antígenos são mucopolissacarídeos e/ou glicolipídios.
No cão estão caracterizados 7 antígenos eritrocitários denominados DEA (Dog
Eritrocyte Antigen) compostos de oito determinantes antigênicos. São eles: DEA1.1; DEA1.2;
DEA3; DEA4; DEA5; DEA6; DEA7; DEA8. O grupo DEA1.1 é o mais antigênico e reativo.
A incidência de reações transfusionais em repetidas transfusões com doador e receptor
ao acaso é de 15%. Aproximadamente 15% dos cães possuem isoanticorpos naturais contra os
grupos sangüíneos DEA3, DEA5, DEA7 e, portanto, capazes de apresentar reação transfusional na
primeira reposição. As reações anti DEA7 são mais freqüentes.
No gato são encontrados 3 tipos específicos de antígenos associados com a membrana
eritrocitária. Os grupos e a incidência são os seguintes: A = 73%; B = 26% e AB = 1%.
Pesquisas nos Estados Unidos da América são conflitantes com aquelas na Austrália,
quando citam que os gatos do grupo B são portadores de títulos elevados de anticorpos naturais
anti-A, que aumentam significativamente o risco de reações já na primeira transfusão.
Na espécie bovina existem 11 sistemas de grupos sangüíneos, sendo, que cada grupo
tem número variável de determinante antigênico. Os sistemas de grupos são os seguintes: A; B;
C; F; J; L; M; S; R‘; T‘; Z.
Cada um dos grupos citados possui vários fenogrupos. Por exemplo: no grupo A
existem 11, no C existem 100 e no B existem 1000.
Os grupos sangüíneos mais imunogênicos são o A, C, B. A maioria dos grupos
sangüíneos não apresenta anticorpos naturais correspondentes, salvo para o grupo J. Animais não
portadores de determinantes antigênicos J, possuem anticorpos naturais anti-J, os quais são mais
facilmente hemolisantes que aglutinantes.
Alceu Gaspar Raiser ([email protected])
10
Os eqüinos possuem oito sistemas de grupos sangüíneos: A; C; D; K; P; Q; T; U. Esses
compreendem cerca de 30 fatores sangüíneos. O número e tipos sangüíneos para cavalos é de
aproximadamente 400 000.
1.4.2 - Acidentes tranfusionais
Quando da transfusão de sangue incompatível a combinação do antígeno eritrocitário
com a Imunoglobulina G (IgG) ou M (IgM), em presença do complemento, resultará em
hemólise ou hemaglutinação.
De modo geral, a primeira transfusão feita a um paciente não determina reação do tipo
incompatibilidade, de vez que é o primeiro contato com o antígeno. Se os animais, doador e
receptor, forem de grupos diferentes, o receptor será sensibilizado a esse antígeno e numa
segunda transfusão apresentará sinais de incompatibilidade, se receber sangue do mesmo grupo
ao qual estiver sensibilizado. Os animais portadores de isoanticorpos naturais podem apresentar
reação já na primeira transfusão.
Em animal que nunca recebeu sangue, podem ser feitas várias transfusões com o mesmo
tipo de sangue, durante 4-5 dias, com relativa segurança. A partir de uma semana o receptor já
reagirá aos antígenos do sangue transfundido (quando incompatível) e apresentará isohemolisinas.
A transfusão de sangue incompatível pode causar: a) destruição tardia dos eritrócitos
transfundidos (7-10 dias no cão e menos de 5 no gato); b) sensibilização do receptor a
subseqüente transfusão do mesmo tipo de sangue; c) reação transfusional imediata em um
paciente já sensibilizado e, d) possibilidade de enfermidade hemolítica em recém nascidos que
tenham recebido isoanticorpos de uma mãe sensibilizada.
Podem ocorrer reações de diferentes graus decorrentes da transfusão de sangue. Quando
da primeira transfusão de sangue incompatível é de grau moderado e caracteriza-se por
inquietação, polipnéia e tosse. Pode normalizar em uma hora ou acentuar-se com aceleração do
pulso e respiração, micção forçada, ptialismo e tremores musculares.
Nos casos de hemólise aguda, geralmente após a segunda transfusão de sangue
incompatível, o início dos sinais poderá dar-se em minutos. Clinicamente serão observadas:
dispnéia, emese, tremores, incontinência de urina e fezes, prostração, hipertermia (40-41ºC) e
convulsão. Poderá ocorrer elevação na pressão venosa, diminuição do retorno venoso, falência
cardíaca e hipotensão. Mais tarde serão observadas hemoglobinemia e hemoglobinúria. Os
eritrócitos incompatíveis serão eliminados em 30-90 minutos. Em alguns casos serão observadas
urticária e paresia transitória. Em bovinos pode haver estado de choque caracterizado por epífora,
ptialismo, defecação, micção com hemoglobinúria, timpanismo e hipertermia. Se a reação não for
letal o paciente recuperar-se-á em 12-24 horas.
As hemolisinas imunes desaparecem em 120-360 dias após a transfusão. Mesmo
assim o paciente continuará sensibilizado àquele antígeno por muitos anos. Para prevenir as
reações de incompatibilidade deve ser feita tipificação do sangue dos animais ou, então, fazer
a prova de Jambreau ou prova cruzada. A maneira mais simples e rápida desta prova consiste
em homogeneizar uma gota de soro do receptor com uma gota de sangue do doador sobre
uma lâmina ou placa de vidro e observar a formação ou não de grumos. Este teste não é muito
confiável, pois detecta apenas os casos agudos de incompatibilidade.
Um método mais eficiente da prova de Jambreau consiste de:
a) colher de 3 a 5ml de sangue do doador e igual volume do receptor, em diferentes
tubos de ensaio, deixando coagular;
b) centrifugar as amostras até separar o soro das células;
11
Patologia Cirúrgica Veterinária - UFSM, Santa Maria.
c) retirar 50% do soro de cada amostra e passar para outros dois tubos de ensaio [soro
doador (D) e soro receptor (R)];
d) homogeneizar a porção celular com o soro residual nos tubos de ensaio das amostras
iniciais (suspensão celular D e suspensão celular R);
e) arranjar as amostras em tubos de ensaio conforme disposição no Quadro 1.8 em três
baterias diferentes;
f) a primeira bateria é incubada à temperatura ambiente, a segunda a 37ºC e a terceira à
4oC por 15 minutos;
g) fazer nova centrifugação avaliando a presença de hemólise. A seguir agitar
suavemente todos os tubos para detectar possível aglutinação. Nada sendo observado
macroscopicamente, examinar pequena amostra em uma lâmina ao microscópio. Qualquer grau
de aglutinação ou hemólise, na prova maior, será considerada positiva e a transfusão de sangue,
deste grupo, não deverá ser efetuada em hipótese alguma. Se a prova maior der negativa, com
leve hemólise ou aglutinação, na prova menor, a transfusão poderá ser realizada com aquele tipo
de sangue, em uma emergência, mas com precaução. Quando houver dificuldade para fazer a
prova de Jambreau, pode ser administrado determinado volume do sangue a ser transfundido,
observar o animal por 15-30min e, em caso de reação transfusional, não utilizar o sangue daquele
doador. Este volume-teste pode ser de 5ml para o gato, 20ml para o cão, 50ml para o eqüino e até
250ml para o bovino.
Em caso de reação transfusional suspender imediatamente a transfusão e administrar,
por via venosa, solução hidroeletrolítica balanceada (Ringer lactato), corticosteróide
(Hidrocortisona succinato de sódio). Se ocorrer choque anafilático, primeiro administrar um
vasopressor (adrenalina) ou dopamina) seguido de corticosteróide e antihistamínico
(difenidramina) (ver cap. 3, p.59).
A transfusão poderá causar também reações não imunológicas, como aquelas
decorrentes do excesso de anticoagulante e de sangue contaminado. A heparina em excesso
determinará alterações hemorrágicas e o citrato excitação. Estes transtornos serão evitados
utilizando as proporções adequadas de anticoagulante. A heparina é antagonizada com o sulfato
de protamina e o excesso de citrato com a administração venosa de gluconato de cálcio. Sabe-se
que 10g de Cloreto de cálcio antagonizam 1g de citrato de sódio. O sangue contaminado, quando
administrado, poderá determinar choque pirogênico e sepsemia.
Quadro 1.8. Distribuição das amostras para realização da prova de Jambreau.
Amostras
Soro do doador
Soro receptor
Suspensão celular do doador
Suspensão celular do receptor
Prova Maior
Prova Menor
Controle doador
Controle receptor
--------
0,1ml
0,1ml
--------
0,1ml
0,1ml
--------------0,1ml
--------0,1ml
--------
0,1ml
-------0,1ml
1.4.3 - Colheita e estocagem do sangue
O sangue colhido para transfusão deve ser homogeneizado com uma solução
anticoagulante. Em caso de transfusão imediata, ele deve ser colhido em um frasco contendo
Alceu Gaspar Raiser ([email protected])
12
heparina, cuja dose seja de 60 a 120UI para cada 500ml de sangue. A heparina tem como
inconveniente a ativação e agregação de plaquetas, inibição na formação de trombina e ativação
do fator de coagulação IX.
Os anticoagulantes a base de citrato são mais utilizados e têm a vantagem de serem
conservantes do sangue. São eles:
Ácido Cítrico em Dextrose (ACD); Ácido Cítrico com Fosfato em Dextrose (CPD) que pode ser
adicionado de adenina (CPDA-1);
O ACD e CPD mantêm o sangue viável por 21 dias à temperatura entre 4 e 6oC. O
CPDA-1 apresenta maior percentual de células viáveis aos 35 dias de conservação.
Uma unidade de sangue consiste de aproximadamente 400ml de sangue total colhido em
um frasco plástico ou de vidro contendo ao redor de 100ml de ACD ou CPD. Nas bolsas de
CPDA-1 são ao redor de 63ml de anticoagulante que devem ser completados com 437ml de
sangue. Quando da colheita de sangue, agitar suavemente o frasco em movimentos circulares
para que ocorra homogeneização entre o sangue e anticoagulante.
O sangue, quando estocado, apresenta alguns inconvenientes a medida que vai
envelhecendo:
- excesso de lactato, piruvato e citrato;
- deficiência de cálcio, plaquetas e fatores de coagulação;
- diminuição do hematócrito, proteínas do plasma (hemodiluição) e na liberação de
oxigênio pela hemoglobina;
- o pH acidifica;
- a partir de 4-6 horas após a colheita começam a formar-se microtrombos que
aumentam proporcionalmente ao tempo de estocagem.
As bolsas para colheita de sangue são mais adequadas, pois minimizam alguns desses
inconvenientes:
- causam menor traumatismo às células, menor grau de ativação das plaquetas e fator
XII;
- são inquebráveis e ocupam menor espaço para estocagem;
- têm menor potencial para contaminação bacteriana;
- facilitam a separação do plasma.
O material de colheita de sangue e o anticoagulante devem estar assépticos e, segundo
alguns autores, estar a baixa temperatura no momento de colher o sangue. Parece, no entanto, que
o choque térmico pode contribuir para hemólise, preferindo-se mantê-los à temperatura ambiente.
Para doador deve-se selecionar um animal dócil, de bom porte físico (ao menos 25kg
para o cão, 5-7kg para o gato e ao redor de 500kg para bovino e eqüino), ter um hematócrito
acima de 40%, estar livre de enfermidades e imunizado contra as viroses mais comuns. Animais
de ambos os sexos podem ser doadores, mas as fêmeas em cio devem ser evitadas devido à
influência do estrogênio sobre o número e função das plaquetas.
A colheita de sangue, em um mesmo doador, pode ser feita a cada 21 dias. O cão e o
gato podem doar ao redor de 15-20ml/kg. Quando submetidos a completa exangüinação
(sacrificados), o cão pode doar 40ml/kg e o gato 30ml/kg. Para grandes animais calcula-se a
volemia (8% do peso) e colhe-se o equivalente a 10-15% da volemia. Um animal de 500kg
poderia doar de 4-7,5 litros de sangue.
A veia jugular é o vaso mais adequado para ser feita punção no animal doador. Em cães
e gatos pode ser feita punção cardíaca: com agulha 18G ou 16G, no cão e 20G no gato. Nestes
casos, preparar assepticamente o lado direito do tórax, quarto espaço intercostal, na área da
articulação costo-condral. Quando a colheita de sangue for feita por punção na veia jugular
também deve ser precedida de tricotomia e anti-sepsia.
Patologia Cirúrgica Veterinária - UFSM, Santa Maria.
13
Em gatos pode-se utilizar uma seringa plástica de 20 ou 50ml contendo anticoagulante
(ACD ou CPD) cuja proporção deve ser proporcional àquela recomendada na bolsa para coleta
de sangue. Sempre que se proceder a punção cardíaca o paciente deve ser anestesiado com
barbitúrico de ultra-curta duração (Tiopental sódico). Quando a colheita de sangue for feita em
frascos sem vácuo, pode ser acelerada por punção cardíaca ou de uma artéria calibrosa.
Em cães a colheita de sangue pode ser feita em fístula artério-venosa iatrogênica.
Nestes casos a fístula é preparada mediante arteriotomia da carótida e flebotomia da jugular,
seguida de anastomose látero-lateral. Na área de anastomose a jugular torna-se distendida,
devido ao alto fluxo sangüíneo, facilitando a punção e colheita do sangue. Cães com este tipo
de fístula podem ser mantidos como doadores por vários anos.
Para grandes animais, em razão do volume de sangue necessário para transfusão ser
maior, recomenda-se diluir 4g de citrato de sódio em 100ml de água destilada.
Esta quantidade de anticoagulante é adequada para 9 litros de sangue.
A transfusão de sangue para o receptor deve ser feita pelas vias peritoneal, medular e
preferencialmente venosa. Quando for utilizado o sangue conservado em refrigeração, este deve
ser aquecido em banho-maria até temperatura ao redor de 37oC e agitado suavemente até
homogeneização.
Os equipos para transfusão de sangue contêm filtros para reter os trombos e
microagregados. Os filtros comuns têm ao redor de 170 e removem coágulos e outras partículas
maiores. Existem filtros com poros de até 20 para remover microtrombos, mas seu uso é
controvertido na medicina humana e não utilizado na medicina veterinária.
A quantidade de sangue a ser transfundido depende dos requerimentos do receptor. Em
casos menos agudos pode ser de 10-15ml/kg (5ml/minuto) em pequenos animais e 15-25ml/kg
(até 40ml/minuto) para bovinos e eqüinos. Um parâmetro mais seguro para eqüinos e bovinos
seria administrar 1 litro a cada 10 minutos nos adultos e 1 litro por hora nos potros e bezerros.
A transfusão de sangue requer monitoração clínica constante durante o período de
administração. Emergências cirúrgicas podem requerer várias vezes essas quantidades em curto
período de tempo. Uma reposição mais específica, tentando administrar um volume mais
aproximado da necessidade real, para pequenos animais, pode ser obtida conforme a seguinte
fórmula:
Htde - Htr
ml de sangue = peso (kg) X ----------- X 90 (cão) ou 70 (gato) ou 40 (bovino e eqüino)
Htdo
onde: Htde = hematócrito desejado; Htr = hematócrito do receptor; HTdo = hematócrito do sangue
a ser transfundido, já no frasco com anticoagulante;  = constante que para o cão é 90, para o
gato 70 e para grandes animais ao redor de 40.
As indicações para transfusão de sangue incluem: hemorragia, anemia não regenerativa,
alterações de coagulação, choque hemorrágico, anemia hemolítica não autoimune,
trombocitopenia, enfermidade hepática e hipoproteinemia.
1.4.4 - Administração de volume globular (papa de hemácias)
O volume globular ou papa de hemácias compreende a fração celular obtida por
sedimentação ou centrifugação após a decantação ou pipetagem do plasma. As células vermelhas
são separadas do plasma com centrifugação a 2000rpm por 30 minutos. Com centrifugação a
375rpm, durante 15-20 minutos restará um plasma rico em plaquetas.
Alceu Gaspar Raiser ([email protected])
14
Uma alternativa simples para obtenção da papa de hemácias é deixar o sangue colhido
em repouso por 36-48 horas, tempo em que a porção celular sedimentará. Em seguida pode ser
feita a decantação ou pipetagem do sobrenadante que deve ser acondicionado em frasco
esterilizado.
Após centrifugação do sangue colhido com citrato, em um frasco de 500ml serão
obtidos ao redor de 250ml de volume globular com um hematócrito entre 50 e 80%.
O volume globular ou papa de hemácias é pobre em eletrólitos, tem menos
anticoagulante e menor volume que equivalente quantidade de células no sangue total. O número
de plaquetas e fibrinogênio também estará diminuído.
A administração de papa de hemácias é feita como a transfusão de sangue, porém, é
mais viscosa. Por isso a administração deve ser feita com agulhas de maior calibre ou com
diluição em solução salina isotônica para facilitar a reposição. A proporção entre solução salina e
papa de hemácias é de 0,5:1 ou de 1:1. Assim, para cada 100ml de papa de hemácias deverão ser
acrescentados 50 ou 100ml de solução salina isotônica.
Em caso de anemia a administração deve ser lenta para evitar sobrecarga cardíaca. Em
pacientes com anemia crônica não deve ultrapassar a velocidade de 10ml/kg/h.
A papa de hemácias está indicada para o animal que precise melhorar sua capacidade de
transporte de oxigênio e não apenas reposição da volemia. Utilizar sempre que o hematócrito
esteja inferior a 25%.
Alguns sinais físicos indicadores da necessidade de transfundir papa de hemácias
incluem: fraqueza excessiva, edema, ortopnéia e anorexia prolongada.
1.4.5 - Transfusão de plasma
O plasma pode ser obtido do sangue cuja porção celular tenha sedimentado, dentro de 6
horas após a colheita, quando forem necessários fatores de coagulação viáveis, ou em qualquer
estágio, mesmo após 21 dias de conservação.
De um frasco de 500ml de sangue, em anticoagulante, podem ser obtidos 250 ml de
plasma. O plasma congelado (à temperaturas entre -40 e -60oC) pode ser conservado por mais de
um ano. Em congeladores domésticos em temperatura de -20oC conserva-se por dois a quatro
meses.
O plasma congelado e/ou refrigerado deve ser aquecido em banho-maria à 37oC antes da
administração. A transfusão de plasma deve ser precedida de prova cruzada, pois as técnicas de
separação do mesmo, em Medicina Veterinária, podem deixar alguma porção de volume
globular.
A transfusão de plasma está indicada nos casos de hipoproteinemia e para reposição de
volume quando o hematócrito for alto com proteínas do plasma baixas e para repor fatores de
coagulação, quando colhido há menos de 6 horas.
Como dose média indica-se 6-10ml/kg, via intravenosa. Pode ser empregada a seguinte
fórmula:
Peso (kg) X 0,05 X Déficit Protéico (g/dl)
Plasma (l) = ------------------------------------------------Proteína no plasma doador (g/dl)
Assim, um cavalo de 450kg, com 3,5g/dl de proteína total no plasma apresenta um
déficit de 3,5g/dl (normal é 7-8g/dl). Considerando que o plasma doador tenha 8g/dl de proteína
total, serão necessários:
450 X 0,05 x 3,5
--------------------- = 9,8 litros de plasma
8
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Quando for obtido de sangue refrigerado, o plasma apresenta como inconvenientes o
baixo pH, nível elevado de lactato e potássio ligeiramente acima do normal.
1.4.6 - Administração de substitutos ou expansores do plasma
Existem substâncias que podem ser utilizadas como substitutos do plasma por terem a
capacidade de expandir a volemia. Como permanecem por um tempo maior na circulação, do que
as soluções salinas e devido ao seu efeito sobre a pressão oncótica, atraem líquido do meio
intersticial, o que contribui para expandir a volemia.
Na escolha do expansor deve-se optar pelo tempo de permanência nos vasos,
pelo tamanho da molécula (casos de vasoplegia – alto peso molecular), e pela capacidade de
expandir o volume circulante. Os expansores de baixo peso molecular (35000-40000D) como os
polímeros de gelatina e dextrano 40 expandem o plasma 1,75 a 2x o volume administrado, porém
têm duração de 4 a 6 h; já, os expansores de alto peso molecular (> 70000D) como o Dextrano 70
e o hidroxietilamido, têm menor capacidade de expansão, porém permanecem na circulação por
24h ou mais.
1.4.6.1 - Dextranos
São polissacarídeos constituídos de moléculas grandes, elevado peso molecular e poder
oncótico acentuado, largamente utilizados como expansores do plasma.
O dextrano pode ser encontrado em três tipos:
- dextrano de alta viscosidade, com peso molecular de 500.000D que só é utilizado em
experimentação animal;
- dextrano 70 ou de médio peso molecular (70.000 a 80.000D) que é indicado para repor
a volemia nos pacientes com grandes queimaduras, pois permanece por maior tempo no leito
vascular. Aumenta a viscosidade sangüínea e promove sangramentos ao ser administrado mesmo
em doses relativamente baixas;
- dextrano 40 ou de baixo peso molecular (40.000). É o mais utilizado e apresenta várias
propriedades. As principais são: expansor da volemia; hemodiluente (diminui a viscosidade
sangüínea); atrai líquido do interstício para a luz do vaso (corrige edema intersticial); evita a
agregação e aglutinação de hemácias e plaquetas; tem ação antitrombótica e favorece a diurese.
O dextrano 40 apresenta como desvantagens: tendência à hemorragia devido a diluição
do fibrinogênio e desagregação de plaquetas e hemácias; pode comportar-se como antígeno e
determinar reação de hipersensibilidade (mais comum no eqüino); pode causar insuficiência renal
aguda e interferir com a tipagem sangüínea. Os dextranos 40 e 70 são veiculados em frascos de
500ml, diluídos em solução de cloreto de sódio ou glicose.
1.4.6.2 - Polímeros de gelatina
Estes polímeros de gelatina bovina são veiculados em solução salina balanceada a 3,5%.
Possuem um peso molecular ao redor de 35.000. As principais vantagens destas soluções
incluem: expansão plasmática acentuada e duradoura; hemodiluição; ação hiperoncótica
moderada; não interferem com a tipagem sangüínea; auxiliam a neutralização da acidose e
correção dos distúrbios hidroeletrolíticos; têm baixa interferência com a coagulação; aumentam a
filtração glomerular; têm boa tolerância orgânica e não apresentam reações imunológicas.
A poligelina (polímero de gelatina degradada) é a mais utilizada e tem o nome
comercial de Haemaccel® (Hoechst do Brasil Quim e Farm SA), Hisocel® (Frenesius Labs Ltda),
Polisocel® (Halex-Istar Ltda), ou Gelafundin® (Laboratórios B. Braun). O Gelafundin não possui
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ligações de uréia, sendo obtido por um processo de succinilação o que lhe permite uma maior
reposição de volume em comparação as gelatinas anteriores.
1.4.6.3 – Hidroxietilamido
É uma molécula polimérica composta primariamente de amilopectina (98%). Seu alto
peso molecular (450000D) permite uma permanência intravascular mais prolongada (> 25h),
exercendo considerável pressão oncótica. Embora aumente o tempo de coagulação capilar em
testes laboratoriais, não tem sido associado com episódios clínicos e a incidência de anafilaxia é
muito baixa. Aumenta os níveis de amilase sérica mas não afeta a função pancreática. A dose não
deverá exceder 22ml/kg/dia. É comercializado como Plasmin® (Halex-Istar Lda.).
1.5 - TERAPIA ENERGÉTICA
A terapia calórica reveste-se de importância quando a patologia for crônica e o pósoperatório prolongado. A melhor via de reposição calórica é a oral. Existem circunstâncias, no
entanto, como cirurgias do trato digestivo superior que impedem a administração oral de
energéticos. Nestes casos pode ser utilizada uma via enteral. Às vezes pode ser necessária a
nutrição parenteral, como nos casos do coma ou inconsciência por períodos prolongados.
A intervenção nutricional está indicada em casos como por exemplo:
- história de patologia gastrintestinal como vômito, regurgitação, diarréia prolongados;
- caquexia geral, enfermidade crônica debilitante;
- alimentação oral interrompida há mais de 5 dias;
- terapia com fármacos catabólicos concorrentes como corticosteróides, antibióticos,
imunossupressores, anti-neoplásicos;
- drenagem abundante, nefro ou enteropatias, queimaduras extensas, etc...
Segundo CRANE & BETTS (1988) a necessidade energética diária (Taxa Metabólica Basal)
para pequenos animais é calculada pela seguinte fórmula:
para animais entre 2 e 45kg: 30 x peso (kg) + 70 = kcal/dia
para animais <2kg e > 45kg: 70 x peso0,75 = kcal/dia
Assim um cão de 10kg terá um requerimento de 393kcal/dia quando mantido no canil,
conforme o cálculo:
70 x 100,75
10 x 30 +70 = 370kcal/dia;
a atividade moderada (repouso no canil) requer mais 25% de calorias. No caso:
370 + (370 x 25%) = 462,5kcal/dia;
animal em convalescença e em repouso no canil requer mais 35% de calorias. Assim:
370 + (370 x 35%) = 499,5kcal/dia;
animal politraumatizado tem requerimento aumentado 50%. No exemplo:
370 + (370 x 50%) = 555kcal/dia;
animal com sepsia tem requerimento elevado para mais 70%. Nesta condição:
370 + (370 x 70%) = 629kcal/dia;
animal com queimadura extensa tem requerimento aumentado em até 100%. Então:
370 + (370 x 100%) = 740kcal/dia.
O Quadro 1.9 apresenta o requerimento energético aproximado para pequenos animais
em diferentes situações.
A solução energética para reposição das kcal deve conter 4g de proteína para cada
100kcal. Assim recomenda-se sempre associar soluções contendo aminoácidos.
Para grandes animais o requerimento calórico tem sido calculado da seguinte maneira:
Em umidade relativa do ar ao redor de 70% a necessidade calórica basal será de
80kcal/kg/dia (27oC); 90kcal/kg/dia (32oC); 100kcal/kg (37oC de temperatura ambiente). Em
Patologia Cirúrgica Veterinária - UFSM, Santa Maria.
17
umidade relativa do ar maior,
aumentam
os
requerimentos Quadro 1.9. Requerimento calórico (Kcal/dia) para pequenos
animais nas condições de taxa basal e repouso no
conforme a variação da temperatura.
canil.
Assim, um bovino de 400kg, terá um
requerimento energético basal de
Peso
Taxa
Repouso Peso
Taxa
Repouso
(kg)
metabóno canil
(kg) metabóno canil
32000kcal/dia à uma temperatura de
lica
-lica
27oC.
Para proceder a reposição
70
88
820
1025
01
25
calórica deve-se calcular a quantidade
130
163
880
1100
03
27
de kcal/dia requerida pelo animal,
220
275
970
1213
05
30
conhecer o teor calórico da solução a
310
388
1090
1363
08
34
administrar,
a
velocidade
de
370
463
1210
1513
10
38
administração e o volume para 24h.
460
575
1270
1588
13
40
As soluções energéticas são
520
650
1390
1738
15
44
aquelas compostas por carbohidratos,
610
763
1276
1595
18
48
aminoácidos e lipídeos. Quando for
670
838
1316
1645
20
50
utilizada solução glicosada, como
730
913
1394
1743
22
54
fonte energética, lembrar que a
790
988
1509
1886
24
60
velocidade de administração não deve
ser superior a 0,5g/kg/h, que é a
capacidade renal para retenção da mesma.
Considerando, por exemplo, para um cão de 10kg, que tem um requerimento energético
basal de 393kcal/dia, seriam necessários ao redor de 100 de glicose (1g= 4kcal) para atender sua
necessidade basal. Se o animal estiver no canil, mas em convalescença, seu requerimento seria de
530kcal/dia. Neste caso o volume de glicose passaria para 132,5g. Um litro de glicose a 20%
oferece 800kcal. Este cão deverá receber o soro glicosado, em gotejamento que não ultrapasse
5g/h. Assim, em 24h seriam administradas apenas 120g, insuficiente para reposição de seu
requerimento energético.
Deve ser considerado, ainda, que para cada 100kcal a repor são necessárias 4g de
proteína. Para tanto deve ser associada administração de aminoácidos (1g = 4kcal). Assim uma
solução de aminoácidos a 10% contem 400kcal/litro.
Os ácidos graxos são altamente energéticos (1g = 9kcal) e podem ser encontrados na
forma de emulsão de lipídios (Intralipid®) em concentrações a 10 e 20%. O Intralipid® a 10% é
uma apresentação comercial contento 4500kcal/l ou, quando a 20%, contendo 8110kcal/l, sendo
veiculada em frascos de 100, 250 e 500ml.
A reposição energética parenteral deve ser instituída nos pacientes em jejum a mais de
quatro dias. Deve ser considerado o alto custo destas soluções ao decidir pelo seu uso.
A reposição energética deve ser fundamentalmente por via digestiva, quer seja oral, por
faringostomia ou gastrostomia.
1.6 - MONITORIZAÇÃO DAS RESPOSTAS À TERAPIA
A medida que se procede a reposição de soluções parenterais podem ser observados
sinais clínicos que indicam recuperação ou agravamento do estado geral do paciente. A
hidratação e a reposição da volemia são controladas com maior segurança através de
monitorização da pressão venosa central, embora esta não seja muito fiel às reposições com
soluções salinas.
Entre as medidas indicadas para avaliar e controlar as respostas do paciente à terapia
estão relacionados:
Alceu Gaspar Raiser ([email protected])
18
- o registro das reposições e perdas diárias controlando o vômito, fezes, urina e pesando
seguidamente o animal;
- observar os sinais físicos de: início do fluxo urinário, estado de alerta, elasticidade da
pele, coloração das mucosas, intensidade do pulso femoral, tempo de reperfusão capilar, repleção
venosa e temperatura entre outros. Vômito indica reposição muito rápida. Em caso de hidratação
excessiva pode ser detectada congestão venosa, secreção nasal serosa e estertor úmido na área
pulmonar. Estes sinais ocorrem devido às alterações determinadas pelo aumento na pressão
venosa;
- associar exames laboratoriais como: determinação do hematócrito, das proteínas totais,
gasometria, ionograma, provas de função renal, hepática, pancreática, entre outros.
1.7 - VIAS PARA ADMINISTRAÇÃO DE SOLUÇÕES PARENTERAIS
Diferentes vias podem ser utilizadas para administração de soluções parenterais, no
entanto, cada uma apresenta vantagens e desvantagens estando sujeitas à interferência de
diferentes fatores. Normalmente o tipo de solução e a condição do paciente ditam a via de
reposição. As vias mais utilizadas são as seguintes:
1.7.1 - Oral
É a via mais fisiológica e a que apresenta menor risco de alterações fisiológicas. É a
mais adequada para reposição calórica. Quando o paciente não aceitar voluntariamente, ou estiver
inconsciente poderá ser forçado através da boca ou por tubo de faringostomia ou gastrostomia.
Nos casos de alteração gastrintestinal está contra-indicada.
1.7.2 - Subcutânea
Esta via apresenta limitações quanto ao tipo e quantidade de solução. Soluções sem
sódio, como o soro glicosado, ou hipotônicas são absorvidas lentamente por esta via e,
dependendo do estado geral, podem piorar o quadro clínico. Isto ocorre porque ao serem
introduzidas no tecido subcutâneo atraem sódio orgânico e conseqüentemente líquido intersticial
até haver isonatremia. O mesmo pode ser dito das soluções hipertônicas relativamente à atração
osmótica da água. No paciente hipotenso a absorção é lenta ou não ocorre.
1.7.3 - Venosa
A via venosa é a mais indicada para reposição de grandes quantidades de volume. Além
disso permite rápida reposição sendo a via ideal para o paciente hipotenso ou com desidratação
acima de 8%. Deve ser a via preferencial para transfusão de sangue, derivados ou expansores do
plasma.
Nos casos em que houver dificuldade para venóclise deve ser procedida punção ou
cateterização da veia jugular mediante abordagem cirúrgica. Para tanto é recomendada tricotomia
e anti-sepsia cervical, infiltração tópica com 1 a 2 ml de lidocaína 2% e incisão cutânea em V
com o vértice em sentido caudal, seguida de divulsão romba com pinça de Kely, para expor a
veia. Desta forma pode ser feita punção ou cateterização por visualização direta do vaso.
Instalado o dispositivo (Insyte® ou Abbocath®), este é fixado por ponto de reparo ou adesivo na
pele e, em seguida, é procedida a síntese cutânea. O catéter é exteriorizado por um dos ângulos da
sutura. A seguir adaptar bandagem protetora. Recuperado o paciente, o catéter será removido
mediante compressão local, sobre a veia, por aproximadamente 3 minutos até que haja
hemostasia.
1.7.4 - Peritoneal
Patologia Cirúrgica Veterinária - UFSM, Santa Maria.
19
Esta via tem sido indicada para cães novos nos quais seja difícil a punção venosa ou em
caso de hipotensão, nos animais adultos. Apresenta, no entanto, algumas limitações. Nos
pacientes com hipotensão ou anemia crônica tem conduzido a óbito. Isto parece estar relacionado
ao poder coloidosmótico do sangue administrado na cavidade peritoneal o qual, sendo maior,
atrairá líquido para si em detrimento dos volumes intersticial e intravascular. Este fenômeno
ocorre também com soluções hipertônicas, em relação ao forte efeito osmótico.
Outras vias como intramuscular ou intrarticular são impraticáveis, pois permitem
administração de pequeno volume. A via intramedular, recomendada em cães novos, tem risco de
sepsia.
1.8 - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Alterações no equilíbrio hidroeletrolítico.