A RELAÇÃO PROFESSOR-ALUNO: realidade e possibilidades
Tânia Maria de Moura Fonseca1
Gislene Lonitz Bida2
Resumo: Provocar uma reflexão sobre a importância da relação
professor-aluno no dia a dia escolar foi o principal objetivo deste trabalho. O
estudo e a pesquisa realizada em parceria com os alunos do Curso de
Formação de Docentes do Colégio Estadual Major Vespasiano Carneiro de
Mello mostrou um professor consciente dos problemas vivenciados pela
educação pública, mas que ainda precisa superar seus conflitos. A pesquisa
realizada enfocou quesitos essenciais que fazem do professor um profissional
competente, destacando aspectos relevantes como interação cognoscitiva e
também os aspectos sócio-emocionais presentes no processo ensinoaprendizagem. Foi também indagado sobre o ponto de vista dos alunos do turno
da noite a respeito de sua aprendizagem, dos fatores que determinam o sucesso
ou o fracasso escolar, do seu relacionamento e interação com os professores.
Outro ponto discutido e analisado foi a disciplina que está diretamente ligada à
prática docente, à autoridade profissional, técnica e moral do professor. Os
resultados alcançados foram positivos indicando que a realidade vivida é
passível de mudanças, mas para isso é preciso formar uma consciência coletiva,
onde cada um dos envolvidos no processo ensinar-aprender reconheça a
importância de pensar com mais seriedade sobre o problema da evasão e
repetência, buscando alternativas que viabilizem a melhoria do ensino em nosso
país.
Palavras
chaves:
Fracasso
escolar,
relação
professor-aluno,
realidade, possibilidades.
Abstract: The main objective of this article is to discuss the importance of the teacherstudent relationship in the daily school routine. The study and survey of
the students attending the Docent Preparation Center from Major Vespasiano Carneiro
de Mello State School indicate that teachers are aware of the public school system
problems, but that they still need to overcome their reservations. The survey focused on
essential aspects that make for a competent teacher, highlighting relevant topics like
cognoscitive interaction and also socio-emotional aspects present in the teachinglearning process. Night class students were questioned about their learning, about the
1
2
Professora Pedagoga PDE, Col. Est. Major Vespasiano C. de Mello
Professora Orientadora UEPG
factors that determine their success or failure in school and about their relationship and
interaction with teachers. Another topic that was analyzed is the discipline that is
directly connected to the teaching practice, to the professional, technical and moral
authority of the teacher. The results obtained were positive, indicating that it's possible
to change the current state. It is, however, necessary to establish some collective
awareness where every one involved in the teaching-learning process recognizes the
importance of taking the school desertion and failure problems seriously, searching for
alternatives that will improve the country's education system.
Os altos índices de evasão e repetência na educação formal brasileira é
um desafio que precisa ser enfrentado por todos que direta ou indiretamente
fazem parte do sistema educacional. Outro indicativo que evidencia o fracasso
escolar em nossas escolas é o número de alunos aprovados por conselho de
classe, ou ainda a grande dificuldade que muitos apresentam para aprender os
conteúdos escolares. Tudo isso somado ao desinteresse nas aulas, à
indisciplina e pior ainda á violência física, verbal ou moral apresentam um
quadro assustador, que requer atenção, reflexão e tomada de decisões e
atitudes. É urgente e necessário buscar soluções, mesmo com a consciência
de que os professores, equipe pedagógica e direção de uma escola não têm o
poder de solucionar todos os problemas gerados pelo contexto atual. A
sociedade exclusiva em que vivemos, onde poucos têm muito e a maioria da
população vive em condições precárias, a inversão dos valores morais e éticos
na política e na vida, a desestruturação da família onde os primeiros alicerces
da educação deveriam ser construídos está contribuindo na formação de
crianças e jovens predispostos ao fracasso escolar.
A escola e os professores não podem e nem devem ser vistos como os
“salvadores da Pátria”, mas fazem parte dessa estrutura e têm uma função
social a cumprir: socializar o conhecimento. A tarefa não é das mais fáceis,
pois a concretização do ensino só é efetivada através da aprendizagem e os
fatores que interferem nesse processo de forma positiva ou negativa são
muitos. Entre eles está a relação professor-aluno, ou melhor, o trabalho
desenvolvido pelo professor, que vai do planejamento ao desenvolvimento da
aula e, portanto um ponto possível de ser revisto por todos os educadores, em
todos os níveis de ensino. Pesquisar, refletir, analisar e concluir sobre o
trabalho docente, suas mazelas, seus êxitos é também essencial para a
formação de professores conscientes e capazes de perceber que todo
profissional deve avaliar o seu próprio desempenho e reconhecer no seu
alunado indivíduos em formação.
Entender que ser professor é fazer a mediação entre o aluno e o
conhecimento, criando um clima favorável em sala de aula, empregando
metodologias e recursos capazes de despertar o interesse, mantendo a classe
disciplinada, tornando o ensino significativo é vital para a qualificação
profissional do professor.
Promover momentos de reflexão mais aprofundada sobre o trabalho
docente, junto aos alunos do Curso de Formação de Docentes do Colégio
Estadual Major Vespasiano Carneiro de Mello, e ainda de forma indireta
provocar um repensar nos professores que atuam no turno da noite nesse
colégio e alguns professores da rede municipal de ensino, séries iniciais do
Ensino Fundamental, foi o principal objetivo da elaboração do Projeto PDE: A
RELAÇÃO PROFESSOR-ALUNO: realidade e possibilidades.
Num primeiro momento, o projeto foi apresentado a todos os professores
do Colégio durante uma reunião pedagógica no início do ano letivo/2009.
Houve demonstração de interesse pela maioria dos professores presentes,
confirmando que os profissionais que atuam nesse Colégio são conscientes da
real importância do seu trabalho e da necessidade de estabelecer um bom
relacionamento com seus alunos em sala de aula.
Os alunos do Curso de Formação de Docentes conheceram o projeto
em uma aula de Estágio e a receptividade foi positiva, inclusive percebeu-se
certo orgulho em fazer parte de um trabalho científico diretamente ligado à sua
formação, onde teriam um papel importante a desempenhar, construindo e
aprofundando junto com a professora seus conhecimentos sobre o tema
tratado.
Valorizar o aluno ressaltando a importância de sua participação nas
atividades acadêmicas de sala de aula é promover um clima favorável à
aprendizagem criando vínculos de confiança, respeito entre professor e alunos.
A relação professor-aluno está impregnada de história, de séculos de
reflexões sobre o ofício de educar. Até os profissionais que desconhecem
nomes e as obras dos grandes pensadores da educação, são influenciados por
suas idéias em suas práticas pedagógicas. Pensar e rever a nossa prática
docente é urgente e necessário. Perguntar por que a criança tão curiosa
quando começa a descobrir o mundo, vai se desinteressando e aos poucos
achando a escola “chata” e tediosa? Por que o professor ensina e o aluno não
aprende? Por que professor e alunos não conseguem se perceber como
aliados?
ANASTASIOU e ALVES (2006) abordam o ensinar e o aprender com
uma visão diferente, destacando o significado etimológico do verbo ensinar, do
latim ensignare, marcar com um sinal, que deve ser de vida, de busca, de
despertar para o conhecimento. Afirmam também que aluno e professor
precisam sentir o sabor do conhecimento. O dar aula deve ser substituído pela
expressão “fazer aula”, onde professor e alunos desempenham seus papéis,
interagindo e construindo saberes.
ANTUNES (2008) faz uma sátira classificando os docentes em
professores e “professauros”, destacando que o segundo grupo apresenta
formas de pensamento comuns ao período Cretáceo, dominado pelos grandes
dinossauros.
Quanto ao ano letivo que se inicia: Para os professores, uma
oportunidade ímpar de aprender e crescer, um momento mágico de
revisão crítica e decisões corajosas; para os professauros, o
angustiante retorno a uma rotina odiosa, o eterno repetir amanhã tudo
quanto de certo e de errado se fez ontem. (ANTUNES 2008 p.13)
O autor destaca várias características positivas que muitos professores
apresentam e ao mesmo tempo aponta o desânimo, o cansaço, a
repetitividade, a obrigação, o ver no aluno um cliente chato, que está ali apenas
para atrapalhar, incomodar. Fala também dos sonhos que os professores
acalentam, da esperança de superar os desafios, a fim de se fazer da arte de
amar, o segredo de viver; enquanto que os ditos “professauros” a vida se
transforma numa rotina chata, se trabalha por imposição, se casa por
obrigação, seu sonho é a aposentadoria e quem sabe o quanto antes morrer.
No final da página, pergunta: Conhece alguém que pertence a uma ou a outra
categoria? E você, a que categoria pertence?
Provocar no professor de amanhã e no professor de hoje uma
inquietação, mexer com conceitos arraigados como raízes profundas, foi o
principal objetivo do projeto. Somos professores, mas temos muito ainda de
professauros. Ter consciência de nossas falhas, dos erros que cometemos, das
mudanças que ocorreram no mundo, de que o aluno de hoje não é igual ao de
ontem e que o professor de hoje tem um enorme desafio a enfrentar é um
primeiro passo no difícil caminho que temos a percorrer. Encontrar meios de
preservar saberes e valores e ao mesmo tempo inovar para garantir a criação e
assegurar o progresso é um conflito vivido pelos educadores e pelas escolas
que pretendem cumprir seu papel social.
A primeira atividade proposta aos alunos participantes do projeto foi o
desafio de estudar alguns textos teóricos que fundamentaram o trabalho,
refletir, analisar e expor o assunto. A turma foi dividida em grupos de três ou
quatro elementos, os textos foram distribuídos e a professora fez uma pequena
explanação, orientando sobre o tempo disponível, forma de apresentação,
inclusive destacando a importância de fazer perguntas que estimulassem um
pequeno debate.
Após a leitura, os grupos decidiram repartir o texto, em seguida
distribuíram as partes entre si, enfim organizaram a forma em que fariam a
apresentação do trabalho. O resultado foi muito bom, pois a maioria
demonstrou desembaraço e compreensão sobre a teoria estudada, expondo de
forma clara e fazendo relações com experiências vividas ou observadas. Foram
destacados pontos importantes que favorecem a relação professor aluno e
entre eles falou-se sobre a confiança, pois não existe nenhum tipo de relação
que se sustente sem a sua presença, seja na escola, seja na família e até
mesmo no trabalho
HOUAISS (2004): “Sentimento de segurança na sinceridade ou
competência de alguém, crédito, fé”: Confiança. È clara a definição e
indispensável sua presença em sala de aula, pois sem ela a relação professoraluno se torna difícil e a aprendizagem impossível. Sabemos que essa relação
tem dois lados e depende de ambos, porém é ao professor, como mediador do
processo ensino-aprendizagem, que cabe a responsabilidade de procurar
desenvolver vínculos com seus alunos.
Estabelecer
vínculos
de
confiança
vai
exigir
do
professor
aperfeiçoamento constante, respeito á realidade do aluno e a busca de meios
para trabalhar com uma clientela que chega à escola com informações,
conhecimentos e orientações adquiridas de diferentes formas, como família,
amigos, mídia, igreja, internet e outras. Outro aspecto importante a considerar
na conquista da confiança dos alunos é o domínio dos conteúdos e de
metodologias adequadas, que despertem o interesse e tornem o ensino
significativo.
SANTOS (2008) destaca um conjunto de atitudes que compõe uma
relação de respeito e confiança mútua entre professor e alunos, e ainda ajuda a
promover um contexto propício para uma aprendizagem significativa:
• Propor desafios que estejam ao alcance dos alunos.
• Ajudar na superação das dificuldades.
• Monitorar a linguagem utilizada em sala de aula e a linguagem natural
do aluno.
• Garantir um ambiente em que o aluno se sinta parte do processo.
• Reconhecer e valorizar os pequenos sucessos de cada aluno.
• Estimular a conquista da autonomia em seus alunos.
Outro aspecto apontado pelos grupos, como fator essencial no trabalho
docente é dar significado ao conteúdo trabalhado, procurando estabelecer
pontes entre o novo conhecimento e o saber dos alunos. O professor deve
compreender que o aluno necessita construir um sentido real e concreto com
relação ao conteúdo e para isso precisa interagir com o objeto do
conhecimento.
SANTOS (2008) afirma que o professor precisa vencer algumas
barreiras para promover a aprendizagem significativa:
• Compreender que seu principal papel não é dar aulas, mas, sim
provocar a aprendizagem.
• Refletir e questionar: O que dá mais trabalho, facilitar a aprendizagem
ou impor a aprendizagem?
• Encarar o desafio de oportunizar em suas aulas momentos de trabalho
efetivo dos alunos, em que sejam levados a criar, analisar, simplificar,
enfim a desenvolver sua capacidade de pensar.
• Compreender que a aprendizagem se constrói de dentro para fora e
para isso o aluno precisa interagir, deixar de ser passivo.
• Entender que a finalidade principal da educação escolar é a
aprendizagem, não o programa de ensino.
Dar significado aos conteúdos é um grande desafio que precisamos
encarar, mesmo que isso signifique desmanchar o que já temos pronto, mexer
em nossa acomodação, tirar os pés da terra firme, vencer nossos medos. A
tarefa é árdua e longa, pois os obstáculos são muitos e pode até nos parecer
uma “missão impossível”.
SANTOS (2008) afirma que o principal papel do professor, na promoção
da aprendizagem significativa, é desafiar os conceitos já assimilados, para que
se ampliem e se tornem mais sólidos, possibilitando estabelecer ligações com
novos conhecimentos. Um conceito bem elaborado e consistente é com
certeza um ótimo alicerce para a aquisição de novos conceitos. Preparar uma
aula significativa requer que o professor busque formas de desafiar as
estruturas conceituais dos alunos. Esse desafio pode ser promovido através de
uma pergunta, de um questionamento, de uma problematização ou qualquer
outro recurso que desperte a curiosidade, o interesse, que “mexa” com os
alunos.
Ainda segundo o autor, são dois os tipos de aprendizagem que ocorrem
numa sala de aula: a aprendizagem superficial e a aprendizagem profunda.
A aprendizagem superficial acontece quando se dá maior importância ao
que será exigido como tarefa, às exigências que serão feitas sobre o conteúdo.
A memorização das informações para provas é uma conseqüência, existe uma
imposição externa, não há reflexão, um pensar sobre, os elementos ficam
soltos e são esquecidos facilmente.
A aprendizagem profunda acontece quando o aluno quer entender o
significado do que está estudando, é levado a pensar sobre o conteúdo, a
relacioná-lo com aprendizagens anteriores, com suas vivências, quando
argumenta, pergunta, responde.
Os motivos que levam a uma ou outra aprendizagem estão relacionados
às condições dos alunos, ao seu universo e principalmente à própria situação
de ensino, ao que acontece em sala de aula que é o resultado da vontade e
capacidade do professor para dar ou não significado ao que ensina. Promover
uma aprendizagem profunda significa planejar e organizar situações de ensino
que motivem, desafiem e estabeleçam uma relação de respeito e confiança
entre professor e alunos.
Na continuidade do desenvolvimento do projeto, foi proposto aos alunos
a elaboração de questões para entrevistar professores e alunos, buscando
questionar aspectos relevantes sobre a relação professor-aluno. As questões
foram elaboradas individualmente e analisadas pela professora servindo de
base para a elaboração da entrevista que foi realizada posteriormente.
Os principais aspectos abordados na elaboração das perguntas estavam
relacionados principalmente à disciplina escolar, à competência do professor
como fator primordial relacionado ao sucesso ou fracasso do aluno, à
importância do planejamento, do domínio de classe. Algumas questões
destacaram de forma evidente a preocupação com o papel do aluno, seus
deveres, suas responsabilidades e sobre a necessidade de uma escola
exigente, onde ter direitos é resultado do cumprimento dos deveres.
Na revista Atividades e Experiências - Positivo – Março/2008, LUFT fala
sobre o sentido da educação. Para ela educar não é simplesmente instruir,
ensinar a calcular, ler e escrever; educar é primeiramente ensinar a pensar, é
preparar para questionar, ser capaz e consciente na hora de fazer escolhas e
viver sua vida. Educar é fazer enxergar o mundo, suas belezas, suas regras,
seus perigos e suas possibilidades.
Desenvolver a capacidade de discernir, entender, julgar, escolher é mais
importante do que um belo prédio, alta tecnologia. Ela afirma também, que
embora todos busquem ter uma vida alegre e saudável, é preciso seriedade,
limites dentro da escola, pois só assim se aprende a distinguir o certo e o
errado, o bom e o mau, o melhor ou o pior. A vida não perdoa, as regras
precisam existir e precisam ser cumpridas, até mesmo as punições devem
fazer parte do dia a dia educacional.
A escola deve ser amorosa e alegre, mas deve ter autoridade e
hierarquia, deve incutir nos alunos o respeito por si mesmo, pela natureza, pelo
outro e pela vida. A escola precisa ter normas que devem ser respeitadas por
todos, não se pode admitir a prática do “faça o que eu digo, mas não faça o
que eu faço”. Cumprir horários e prazos, ser assíduo não vale só para o aluno,
vale para todos que compõem o ambiente escolar.
Com relação ao planejamento, LIBÂNEO (1991) afirma que a escola, os
professores e os alunos fazem parte da dinâmica das relações sociais; que o
meio escolar sofre influências da economia, da política e da cultura que
caracterizam a sociedade de classes. O meio escolar está impregnado de
interesses e implicações sociais, portanto é preciso refletir muito na hora de
planejar. O planejamento deve ser uma ação consciente do professor
determinando o rumo que quer dar ao seu trabalho. É um meio para se
programar as ações docentes, mas é também um momento de pesquisa e
reflexão ligado à avaliação.
O autor lembra também que a ação docente ganha eficácia na medida
em que o professor vai acumulando e enriquecendo experiências ao lidar com
as situações concretas de ensino. Isso significa que para planejar o professor
vai utilizar seu conhecimento didático e metodológico, e ao mesmo tempo sua
experiência prática. O registro dos novos conhecimentos e novas experiências
no plano de ensino vai possibilitar ao docente um criar e recriar sua própria
didática, enriquecendo sua prática profissional e propiciando uma maior
segurança em sala de aula.
LIBÂNEO (1991) observa que para planejar é necessário conhecer as
reais condições dos alunos. Não adianta introduzir matéria nova, se os alunos
carecem de pré-requisitos. Um professor não pode justificar o fracasso dos
alunos pela falta da base anterior; o suprimento das condições prévias de
aprendizagem deve constar no plano de ensino. Não deve alegar que os
alunos são desinteressados; é ele que deve criar condições, utilizando
metodologias adequadas, tornando o ensino significativo e interessante. Enfim,
todas as dificuldades apresentadas pelos alunos, que atrapalham a
aprendizagem, devem ser o ponto de referência para planejar e iniciar ou dar
continuidade ao trabalho escolar.
Algumas das questões elaboradas pelos alunos sugeriam também que
se indagasse sobre quem é o aluno da escola pública, que características os
nossos docentes vêem nesse aluno, se existe diferença entre ele e o aluno da
escola particular. Ficou evidente a preocupação sobre o que se ouve e se vê a
respeito da clientela escolar que freqüenta as escolas Municipais e Estaduais.
Como diz LIBÂNEO (1991), alguns professores estabelecem padrões de
desempenho, considerando um aluno normal aquele que tem melhores
condições socioeconômicas e maior desenvolvimento intelectual. Crianças que
apresentam condições diferentes a essa, são consideradas carentes,
atrasadas, candidatas a uma provável reprovação. Condicionam o sucesso
escolar a uma condição de vida, esquecendo que o desenvolvimento das
capacidades mentais, a aprendizagem do aluno deve ter como ponto de partida
a realidade que a criança apresenta ao ingressar na escola. Se o meio social
em que a criança ou adolescente vive não dispõe das condições para o
desenvolvimento intelectual, a escola, o ensino pode prover um ambiente
necessário de estimulação e é para isso que o professor se prepara
profissionalmente.
A importância do professor no processo ensino-aprendizagem é
evidente, está posto como condição essencial para a melhoria ou não do
ensino - aprendizagem. Conduzir a ação educativa para um resultado positivo
depende em grande parte da relação professor-aluno em sala de aula, da
postura, vontade e comprometimento do professor. Respeitar o aluno, ser
capaz de percebê-lo como um individuo em desenvolvimento, que precisa de
apoio, de estimulo, de compreensão e de muita cobrança vai trazer mudanças
positivas no processo ensino-aprendizagem.
O professor pode não ser o único responsável pelo fracasso escolar,
mas ter consciência da importância do seu trabalho é motivo suficiente para
que repense seu papel, reflita sobre seu desempenho, procure alternativas,
perceba que pode sim fazer a diferença.
As respostas obtidas nas entrevistas mostram que a maioria dos
professores participantes dessa etapa do projeto ao responder as questões
propostas, reconhece o trabalho docente como um dos fatores que interferem
diretamente para o sucesso ou o fracasso do aluno na aprendizagem escolar,
embora atribuam também ao meio social uma parcela bastante significativa da
culpa desse fracasso.
Na entrevista os professores apontaram como principais fatores
responsáveis pela evasão escolar e a repetência o meio social/família, o
desempenho do professor e o sistema educacional. A quantificação das
respostas dadas resultou no gráfico a seguir.
Fatores que contribuem para o fracasso escolar na
visão dos professores entrevistados
Meio Social/Família
Desempenho Professor
Sistema Educacional
16%
46%
38%
Essa percepção dos professores não é utópica, pois os pesquisadores
dos fatos educacionais já apontaram resultados muito semelhantes a esse.
LIBÂNEO (1991) lembra que os dados demonstram que a escola pública
não consegue reter as crianças na escola, a perda de alunos já nessa década
é significativa e preocupante. Diz ele que isso pode ser explicado por fatores
externos à escola, mas que a exclusão escolar tem a ver, principalmente com o
que a escola e os professores fazem ou deixam de fazer. Uma pesquisa da
Fundação Carlos Chagas, São Paulo, em 1981, pesquisou as causas mais
gerais da repetência escolar. O seu objetivo foi de verificar e explicar esse
problema não só pelas dificuldades dos alunos, mas por fatores como
condições familiares, o corpo docente, a relação professor-aluno e aspectos da
própria estruturação da organização escolar. A conclusão a que esse estudo
chegou foi de que não se pode atribuir culpa a um só fator. Entre as principais
causas encontradas, como as condições de vida e as condições físicas e
psicológicas, a mais decisiva foi o fato de que a escola, na sua organização
curricular e metodológica, não esta preparada para trabalhar com crianças e
jovens provenientes de um nível sócio-econômico baixo.
A escola e os objetivos escolares têm em vista um aluno idealizado e
não um aluno concreto. A escola supõe que o aluno tenha todos os prérequisitos necessários à aprendizagem dos conhecimentos que vêm expressos
nos currículos, ignorando totalmente os conhecimentos e experiências, o seu
nível de preparo para aprender determinados conteúdos.
Os alunos que não se enquadram no modelo pré-estabelecido pela
escola são considerados preguiçosos e desinteressados, o que desencadeia
um processo natural de exclusão escolar. A escola e os professores
esquecem-se de que o ponto para iniciar a aprendizagem precisa estar
diretamente vinculado ao que o aluno já conhece, é como querer ancorar um
navio numa profundidade em que a corrente da âncora não alcança.
O papel social da escola é de assegurar a apropriação dos
conhecimentos humanos a todos os que vivem nessa sociedade, e isso requer
uma tomada de posição, um compromisso ético-político de todos os
professores no sentido de buscar meios e condições para que a unidade
ensino-aprendizagem se torne realidade. Uma das principais qualidades do
professor é de saber vincular as tarefas escolares com as condições prévias
dos alunos para enfrentá-las, pois é daí que surgem as condições necessárias
à aprendizagem. É essencial que o processo pedagógico seja organizado de
forma a fazer com que as dificuldades, tornem-se subjetivas na mente do
aluno, provocando nele a vontade de vencê-las. Essas dificuldades precisam
ser bem dosadas, não devem nunca exceder a capacidade de entendimento,
nem devem ser tão fáceis que não exijam pelo menos um pouco de esforço
para resolvê-las. Toda nova aprendizagem deve de alguma forma estar ligada
a um conhecimento já existente na cabeça do aluno.
Na entrevista realizada foi perguntado também, porque alguns
professores conseguem manter a disciplina em sala de aula e outros não. As
respostas apontaram o professor e o que diz respeito ao seu trabalho como
responsáveis diretos pelo comportamento inadequado dos alunos.
Porque o professor não consegue manter a disciplina em
sala de aula
Falta de domínio nos conteúdos/liberdade excessiva aos alunos/problemas na relação
professor-aluno
Falta de planejamento ou metodologia inadequada
Não gostam do que fazem/vocação
6%
48%
46%
Na questão sobre o segredo da boa relação professor-aluno, os
resultados demonstram com clareza que o próprio professor se percebe como
responsável
pelo
ambiente
escolar
favorável
ao
processo
ensino-
aprendizagem. Os resultados apontados no gráfico apontam as qualidades que
um professor precisa ter, do emocional ao intelectual e técnico.
Condições para boa relação professor - aluno
Respeito, equilíbrio emocional, compreensão e confiança são a base para a eficiência do
trabalho docente;
Conhecimento, compromisso, organização e firmeza;
Entusiasmo, criatividade e poder de comunicação.
9%
19%
72%
Foi perguntado se o professor pode ser fator decisivo para o sucesso ou
o fracasso do aluno, as respostas demonstraram a percepção clara da grande
maioria dos professores em relação à sua própria responsabilidade no que diz
respeito aos resultados da aprendizagem escolar.
O professor pode ser fator decisivo para o sucesso ou o
fracasso do aluno
Não
11%
Sim
89%
Sobre a importância do planejamento houve um consenso em todas as
respostas. Ficou evidente que os professores tem consciência de que um
trabalho sério requer sempre um pensar, decidir, planejar.
O planejamento é um guia, estabelece diretrizes e os meios para a
realização do trabalho docente. Ele não assegura por si só, a qualidade da
aula, mas é um instrumento que vai possibilitar ao professor maior segurança,
melhor aproveitamento do tempo disponível, o uso de estratégias adequadas a
cada conteúdo a ser assimilado, pelos alunos.
Importância do Planejamento
Fator decisivo para uma aula de qualidade
Diretriz e segurança no trabalho do professor
61%
80%
39%
60%
40%
20%
0%
Na questão sobre como o professor vê o aluno da escola pública as
respostas abordaram vários itens, sendo a maioria dos professores considera-o
um aluno normal, igual a qualquer aluno de qualquer escola, com suas
facilidades e suas dificuldades.
Como o professor vê o aluno da escola pública
Igual a qualquer aluno de
qualquer escola
2%
Participativo e
3%
interessado
Desinteressado
2%
7%
Dócil e afável
Sem limites
Sem base/desinformado
Carente de atenção
37%
12%
5%
Vale registrar algumas frases escritas pelos professores entrevistados
sobre este assunto:3
“Acredito que os alunos da escola pública não apresentam um único
perfil, assim como os da escola particular”.
“O aluno da escola pública é igual aos outros, o que o torna diferente é a
pouca cobrança e ajuda da família sobre o seu estudo”.
“O aluno da escola pública é aquele que precisa realmente aprender e
muitas vezes não está sendo estimulado para isso”.
“Muitos entram na escola com vontade de aprender e são dedicados,
mas quando não são incentivados e cobrados perdem o interesse e
comparecem à escola apenas por obrigação”.
“Todos os alunos são ideais se o professor se fizer ideal”.
“Um aluno cheio de surpresas a serem descobertas, podendo ter muitas
habilidade
e
facilidades
ou
apresentar
dificuldades,
falta
de
bom
comportamento, incertezas a serem manejadas pelo professor”.
“Desinteressados, estudam pouco fora da sala de aula, não há cobrança
da maioria dos pais, por outro lado quando interessados são criativos”.
“O aluno da escola pública é muito bom, é aberto às inovações, é
curioso.
Só
é
preciso
melhorar
o
sistema
educacional,
um
maior
comprometimento dos professores e da família”
“O aluno da escola pública é tão bom quanto o aluno da escola
particular, porém a falta de planejamento da SEED desestrutura a escola,
fazendo com que o aluno sofra a consequências disso”.
“Igual a qualquer de outra escola; com limitações ou não; com desejo de
saber ou não; com família estruturada ou não, com recursos financeiros ou
não”.
3
A entrevista não solicitou a identificação dos professores participantes, não sendo possível determinar a
autoria das frases citadas.
“Indiferente da situação econômica, eles são capazes de aprender e
aprender com qualidade. São esforçados e sabem o que querem na vida. E a
escola na maioria das vezes é o “lobo mau” no final de cada história dentro de
seus muros”.
“Só se vê bem com o coração” (Saint Exupéry) “É disso que todo o aluno
precisa, tanto na escola pública como na particular: amor, pois só o amor
constrói”.
Perceber o aluno da escola pública como um indivíduo normal, igual a
todos os outros, com suas potencialidades e suas dificuldades, mas capaz de
aprender é um grande passo em direção a melhoria da qualidade de ensino em
nossas escolas. Melhor ainda quando o professor consegue identificar que ele
também tem responsabilidade, que a culpa do fracasso escolar não é exclusiva
do aluno ou do meio social ou do sistema educacional.
Reclamar que o aluno não corresponde às suas expectativas, que as
cobranças da escola conduzem ao fazer inócuo, falso, está na fala de muitos
“professauros” que povoam nossas escolas. Porque não se perguntar: O que
posso fazer para melhorar esse quadro tão criticado por mim? Porque não
refletir sobre suas aulas: Conheço meus alunos? Será que minha metodologia
é adequada/ Estou sendo claro em minhas explicações? Meus alunos estão
conseguindo acompanhar meu raciocínio? São muitas as perguntas a serem
feitas quando se tem consciência de sua responsabilidade, quando se é um
professor compromissado, que gosta de ensinar e consegue perceber que não
existe ensino se não houver aprendizagem.
Nas entrevistas com alunos do ensino noturno abordaram-se aspectos
referentes à aprendizagem, às qualidades de um bom professor, ao lado
afetivo do relacionamento professor-aluno, à responsabilidade e ao papel do
aluno. Foram realizadas 28 entrevistas e os resultados demonstraram que
muitos de nossos alunos são conscientes de suas obrigações, de que
conseguem perceber que uma grande parte da culpa pelo fracasso na escola
cabe a eles mesmos: “Como todo professor tem suas obrigações, o aluno deve
ter também, como fazer tarefas, cumprir seus compromissos na data certa, ser
educado e tratar o professor com respeito” (afirmativa de um aluno).
A primeira questão solicitou que fossem apontados três fatores que
prejudicam a aprendizagem, as respostas foram bastante diversificadas, sendo
que das sete razões citadas, cinco referem-se ao trabalho realizado pelo
professor e três ao comportamento dos alunos.
Fatores que mais prejudicam a aprendizagem na visão
dos alunos
Indisciplina
Faltas
11%
11%
11%
Desinteresse
4%
Monotonia das aulas
7%
Relacionamento do
professor com os alunos
Conversas paralelas
31%
25%
Professor desanimado
A segunda questão perguntou se gostar ou não do professor interfere na
aprendizagem, a maior parte dos alunos respondeu sim, ficando evidente a
importância do aspecto afetivo, portanto desenvolver uma relação amistosa em
sala de aula cria condições favoráveis ao processo ensino-aprendizagem.
Gostar ou não do professor interfere na aprendizagem
Não
18%
Sim
82%
Os alunos entrevistados também apontaram qualidades que apreciam
em seus professores, entre elas foi possível destacar paciência, respeito ao
aluno, dedicação, bom humor, ser exigente, explicar bem, ser dinâmico, ser
dedicado, criatividade e estar bem atualizado.
Foi indagado sobre o que não gostam em seu professores e as
respostas foram: mau humor, insegurança, não impor limites, não exigir, não
dar atividades para fixação, arrogância, “enrolador”, cobrar o que não ensinou
faltoso e falar rápido demais.
Os entrevistados também afirmaram que o melhor professor não é
aquele que “passa a mão na cabeça do aluno”, ou seja, o professor “bonzinho”.
O bom professor é o que ensina bem e depois cobra, exige do aluno.
A última questão pergunta se o aluno também é culpado por não
aprender, todos responderam sim, porque não se esforçam ou não prestam
atenção nas aulas.
As respostas obtidas na entrevista demonstram que existe um grau bem
significativo de consciência e conhecimento da realidade que vivenciamos em
nossas escolas. Os professores e os alunos não são indivíduos alienados,
reconhecem seus papéis e suas falhas no contexto escolar, porém isso não é o
suficiente para modificar ou reverter o fracasso escolar, seja pela evasão, seja
pela reprovação ou pela aprovação pelo conselho de classe.
A jornada a percorrer é longa, os obstáculos são muitos, porém
reconhecer que existem possibilidades, que ninguém pode fazer mágica, mas
que mesmo com limitações é possível mudar pelo menos alguns aspectos da
realidade da sala de aula, é um começo, é iniciar a caminhada rumo a uma
educação verdadeiramente democrática.
Estou semeando as sementes da minha mais alta esperança. Não
busco discípulos para comunicar-lhes saberes. Busco discípulos,
para neles plantar minhas esperanças”. (Rubens Alves)
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Fonte: GUEDES, Egly. Saboreando a Educação. Caicó – RN, 2009. Disponível
em:http://egly-saboreandoaeducao.blogspot.com/2009/09/diante-do-que-foi-expostopercebe-se.html
REFERÊNCIAS
ANASTASIOU, L. das G. Camargo; ALVES, L. Pessate (orgs). Processos de
Ensinagem na Universidade. 6ª ed. - Joinville SC: Univille, 2006. 144 p.
ANTUNES, Celso. Professores e Professauros: Reflexões sobre a aula e práticas
pedagógicas diversas. 2ª Ed. – Petrópolis RJ: Ed. Vozes, 2008.
BYINGTON, C. A. Botelho. A Construção Amorosa do Saber: O fundamento e a
finalidade da Pedagogia Junguiana. São Paulo: Religare, 2003.
HOUAISS, Antônio; VILLAR, Mauro de Sales e FRANCO, Francisco Manoel de
Mello. Minidicionário Houaiss da língua portuguesa. 2ª Ed. – Rio de Janeiro, 2004.
LIBÂNEO, J. Carlos. Didática. (Coleção Magistério 2º Grau. Série formação de
professores). 1ª reinpressão. São Paulo: Cortez, 1991.
LUFT, Lya. O sentido da educação. Revista atividades e experiências, nº 1, Curitiba:
Positivo, 2008, p.52.
SANTOS, Julio César Furtado. Aprendizagem significativa: modalidades de
aprendizagem e o papel do professor. 1ª Ed. Porto Alegre: Mediação, 2008.
VASCONCELLOS, Celso dos Santos. Construção do conhecimento em sala de aula.
São Paulo: Libertad, 1994 (Cadernos Pedagógicos do Libertad,2).
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A RELAÇÃO PROFESSOR-ALUNO: realidade e possibilidades