Letras VI HISTÓRIA DAS IDÉIAS LINGUÍSTICAS Prova II (Gabarito) Sexta-Feira, 26 de novembro de 2010 Para responder às questões da prova, considere o texto abaixo: 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 Depois de exaustiva busca nos anais da Arquidiocese de Diamantina e em antigos arquivos do Estado de Minas Gerais, foi encontrada explicação provavelmente confiável para a origem da expressão mineira “uai”. Os Inconfidentes Mineiros, considerados subversivos pela Coroa Portuguesa, comunicavam-se através de senhas, para se protegerem da polícia lusitana. Como conspiravam em porões e sendo quase todos de origem maçônica, recebiam os companheiros com as três batidas clássicas da Maçonaria nas portas dos esconderijos. Lá de dentro, perguntavam: quem é?, e os de fora respondiam: UAI - as iniciais de União, Amor e Independência. Só mediante o uso dessa senha a porta seria aberta aos visitantes. Conjurada a revolta, sobrou a senha, que acabou virando costume entre as gentes das Alterosas. Os mineiros assumiram a simpática palavrinha e, a partir de então, a incorporaram ao vocabulário cotidiano, assim como “tutu” e “trem”. (Correio Braziliense) 1. Identifique, no texto acima, pelo menos um elemento de língua (langue) e um elemento de fala (parole), segundo a dicotomia proposta por Saussure. Justifique sua resposta. (5 pontos) Para Saussure, língua é a parte autônoma e social da linguagem, isto é, o que é comum a todos os falantes, enquanto fala é a parte individual da linguagem. São elementos de língua: cada um dos grafemas (“d”, “e”, “p”, etc.) ou cada uma das palavras (“depois”, “de”, “exaustiva”, etc.) do texto, porque são compartilhadas por todos os falantes do português. São elementos de fala: o uso que se faz de cada um dos elementos de língua (ou seja, as construções específicas em que aparecem esses elementos de língua, como “depois de exaustiva busca”, “foi encontrada explicação”, etc.). 2. Identifique, no texto acima, pelo menos um elemento de competência (conhecimento) e um elemento de performance (uso), segundo a dicotomia proposta por Chomsky. Justifique sua resposta. (5 pontos) Para Chomsky, a competência linguística é o que permite ao falante dizer o que diz; a performance é a maneira por meio da qual ele diz. No texto, são elementos de competência: a capacidade de o falante associar significados a itens lexicais e de estabelecer relações entre itens lexicais. São elementos de performance: cada um dos itens lexicais efetivamente utilizados, ou cada uma das relações efetivamente constituídas no texto. 3. O termo “companheiros” (linha 6) é marcado ou não-marcado quanto ao gênero? Explique por quê. (5 pontos) O termo “companheiros” é não-marcado, porque não significa, no contexto, indivíduos do sexo masculino, mas apenas aqueles que faziam parte da maçonaria. O fato de os maçons serem homens não afeta a marcação do termo, que somente seria marcado em oposição a “companheiras”, como em “companheiras e companheiros”. 4. Qual é o tema e o rema do enunciado “Conjurada a revolta, sobrou a senha, que acabou virando costume entre as gentes das Alterosas” (linhas 8 e 9).? Justifique sua resposta. (5 pontos) O tema do enunciado (isto é, o assunto de que se fala, e que recebe por isso maior saliência enunciativa) é “a senha”; o rema (ou aquilo que se fala sobre o tema) é o restante da sentença: “conjurada a revolta, sobrou ... , que acabou virando costume entre as gentes das Alterosas”. 5. A etimologia proposta para a expressão “uai” confirma ou nega o método comparativo desenvolvido no século XIX para explicar a mudança linguística? Explique por quê. (5 pontos) Nega. O método comparativo apoiava-se em dados fonéticos e contrastava itens lexicais de diferentes línguas. Essas características são estranhas à explicação proposta para o termo “uai”. 6. A descrição proposta incorre no "subjetivismo idealista" ou no "objetivismo abstrato" dos estudos da linguagem denunciado por Bakhtin? Justifique sua resposta. (5 pontos) No subjetivismo idealista. A explicação supõe que a mudança na língua (ou seja, a criação do vocábulo “uai”) tem participação do falante, mas este falante aparece diluído e idealizado. A reconstrução de seu contexto histórico (a Inconfidência Mineira) é feita de forma episódica e caricatural, sem referência às condições de produção efetivas de seu discurso, ou seja, sem recurso à ideologia e às formações sócio-históricas que informavam seu processo de interação verbal.