O PAPEL DO SUPORTE NO GÊNERO PROPAGANDA SOCIAL Jacqueline R. Fernandes Cláudia L. N. Saito (Orientadora) Resumo: O gênero propaganda social tem como propósito comunicativo prestar um serviço de utilidade pública. Elaborado e distribuído pelo próprio Ministério da Saúde para orientar e criar uma ação preventiva na população, principalmente, a carente, pode ser veiculado nos mais diferentes veículos de circulação (revistas, jornais, televisão, rádios e internet) e suportes (cartazes, folders, folhetos). Entretanto, sabemos que entre todos os suportes, o cartaz é constantemente utilizado por esse gênero por ser mais fácil seu acesso ao público e também ser mais flexível, uma vez que pode ser encontrado afixado em muros, murais, paredes, entre outros. De acordo com Marcuschi (2008, p.173), “o suporte textual não é neutro e o gênero não fica indiferente a ele. (...)”. Nessa pesquisa, temos como objetivo discutir como o suporte exerce um papel imprescindível nas condições de produção desse enunciado multimodal. Palavras-chave: multimodal suporte; gênero propaganda social; enunciado 985 Introdução Nesse artigo, discutimos o papel que exerce o suporte para a atividade funcional do gênero propaganda social. Gênero que se caracteriza por fazer parte de campanhas realizadas pelo governo voltadas às causas sociais com o objetivo principal de prestar um serviço de utilidade pública esclarecendo e orientando sobre acidentes de trânsito; prevenção de doenças; conservação do patrimônio público, entre outros.Como corpus de nossa pesquisa trabalhamos com propagandas sociais que fazem parte da Campanha de Doação de Sangue, desenvolvida pelo Ministério da Saúde em 2009. Esta escolha se deu, primeiro, pelo fato dessas propagandas abordarem o tema saúde e, por fim, por apresentarem uma peculiaridade: serem veiculadas no suporte digital, principalmente, nas suas redes sociais, como o blog, para atrair o públicojovem. Este trabalho está vinculado ao projeto de pesquisa Gêneros textuais e ferramentas didáticas para o ensino e aprendizagem de Língua Portuguesa, coordenado pela Prof.ª Dr. ª Elvira Lopes Nascimento, na Universidade Estadual de Londrina, que tem como objetivo pesquisar diferentes gêneros textuais que abastecem o contexto social, a fim de interferir com uma proposta didática para o ensino e aprendizagem da língua materna. Para tanto, este texto é apresentado e organizado da seguinte forma: a) a discussão sobre o avanço tecnológico e a sua repercussão nos modos de interação verbal; b) a relação do gênero propaganda social e o suporte em que é veiculado; c) apresentação da análise do corpus. 1. Inovações tecnológicas: novas formas de interação A linguagem e o homem como objetos centrais de estudos das ciências humanas, sempre, em toda a história social da humanidade, estiveram ligados por fatores de mudanças sociais, na qual as transformações das atividades sócio-histórica do homem fizeram a sua 986 linguagem se adaptar conforme seu comportamento social, satisfazendo a sua necessidade de interagir com o outro. Essa interação, mais do que uma forma de o sujeito estruturar suas relações com o outro, se tornou até hoje uma ferramenta do agir comunicativo. Como uma atividade sócio-histórica construída e organizada por meio de práticas de linguagem que se materializam em gêneros discursivos, fruto do trabalho coletivo, satisfazendo a intenção comunicativa de cada prática social. Como reitera Marcuschi (2002, p.18) quando afirma que “os gêneros contribuem para ordenar e estabilizar as atividades comunicativas do dia-a-dia”. Entretanto, no século XXI, a troca de informação e interação linguística ganhou proporções amplas de comunicação, na qual é preciso agilidade na recepção e na emissão de informações para participar de certas formas de diálogo no mundo, pois a demora na resposta pode significar perda do turno de fala, dispersão e consequente desconsideração da opinião. Assim, o meio digital passou a exercer papel de suporte dos diversos gêneros textuais que se encontram no mundo, até então, que circulavam estritamente nos meio impresso e eletrônico. Tornando-se um espaço privilegiado de informação dos diferentes meios das atividades de linguagem de distintas esferas da comunicação humana, em um só tempo, atendendo diversos leitores que desfrutam de gêneros múltiplos em um mesmo espaço. O homem está em constante mudança em seu contexto, principalmente, devido à modernidade que trouxe a tecnologia, o gênero também se adapta a essas mudanças para satisfazer as necessidades de comunicação do sujeito. Bakhtin instrumentos de (1929/1994) comunicação já previa social, que os histórica gêneros e como culturalmente 987 construídos, que se caracterizam pela maleabilidade e plasticidade dinâmica, uma vez que são imbricados nas ações sociais. Por isso que Marcuschi (2002) ressalta que a demanda da tecnologia, empregada principalmente com a expansão da imprensa, na qual frutificou novos suportes como, principalmente, rádio, televisão e internet, para atender a nova agilidade comunicativa, trouxe a demanda de novos gêneros, criados por esses inovadores suportes midiáticos (relativo à mídia). Segundo o autor: Numa terceira fase, a partir do século XV, os gêneros expandem-se com o flores cimento da cultura impressa para, na fase intermediária de industrialização iniciada no século XVlII, dar início a uma grande ampliação. Hoje, em plena fase da denominada cultura eletrônica, com o telefone, o gravador, o rádio, a TV e, particularmente o computador pessoal e sua aplicação mais notável, a intemet, presenciamos uma explosão de novos gêneros e novas formas de comunicação, tanto na oralidade como na escrita. (MARCUSCH, 2002, p.18) Mas é errôneo pensar que o surgimento desses novos gêneros foram algo inovador; “a tecnologia favorece o surgimento de formas inovadoras, mas não absolutamente novas” (MARCUSCHI, 2002, p.19). A tecnificação fez com os suportes dessa fase moderna hibridizassem os gêneros que antes eram apenas usados no seu suporte impresso, por exemplo. Como o bilhete, que para muitos circulavam apenas via suporte papel, mas que hoje por junções de diferentes gêneros e pelo suporte virtual que hibridizou esse gênero com outros (como o gênero carta), o bilhete se transformou em scraps usados para enviar mensagens instantâneas virtualmente, nas salas de relacionamentos como Orkut, Twitter e MSN (SANTOS, 2008, s/p). 988 Dessa forma, percebemos que a maioria dos gêneros hoje, em meio ao uso constante de tecnologia, principalmente a virtual, está propensa a sofrer mudanças na sua função comunicativa e cognitiva por consequência do seu suporte. Os suportes estão permitindo aos gêneros anexarem formas e aparatos semióticos e estruturais de outros gêneros, simultaneamente desempenhando funções comunicativas diferentes em um mesmo espaço. Reforçando as palavras de Marcushi, Maingueneau (1996) defende que o suporte é fundamental na emergência e na estabilização de um gênero, significando que ele em alguns gêneros determinam sua funcionalidade, ainda mais quando agregados ao uso de suportes gerados pela demanda tecnológica. Como, por exemplo, na esfera publicitária, em que a venda de um produto/ interceptação da ideia (interação de linguagem em uso) demorada é sinônimo de perda de mercado. Com a era da tecnologia principalmente a virtual, a propaganda passa a ser indexada por meio de suportes mais eficientes, tanto pela agilidade noticiada quanto pela quantidade maior de informações imbricadas nela. Dessa maneira, Haag afirma: O ciberespaço se mostra como um grande e híbrido suporte de comunicação, que traz consigo novas necessidades para a sociedade e novas circunstâncias de comunicação, que, apesar de fundamentalmente escritas, devem ser ágeis e dinâmicas. A partir da criação do novo suporte virtual de comunicação, produzem-se também novas motivações sociais, entre as quais – por „utilitarista” que possa parecer – está a inserção sobretudo das novas gerações no ambiente virtual.O ciberespaço se mostra como um grande e híbrido suporte de comunicação (HAAG, 2005, p.3) 989 2. A relação do suporte com o gênero Propaganda Social em prol à doação de sangue A esfera publicitária como demanda gêneros que intencionam persuadir, convencer o leitor/público em fazer algo, a sua emergência em conquistar uma demanda grande de indivíduos que vão comprar ou aderir a uma idéia é de grande importância o suporte escolhido. Atualmente conquistar um público de leitores grande é a grande “jogada” publicitária. Para as campanhas de propagandas de cunho social, a conquista de público de todas as classes sociais, etnias e níveis de escolaridade é seu objetivo maior, o suporte exerce função ainda mais relevante para a funcionalidade do gênero, uma vez que o lócus em que esse ele circulará tem que ser flexível e de fácil acesso ao público. Segundo Marcuschi (2008, p.173), sendo o suporte ser “um lócus físico ou virtual” podendo ser classificado em convencional ou incidental (convencionais: aqueles suportes típicos ou característicos. Incidentais: são meios casuais e que emergem em situações especiais ou até mesmo corriqueiras) dependendo da intencionalidade do autor e do público que ele quer conquistar, o gênero pode utilizar um desses suportes. Sendo assim, com o objetivo de conquistar o público jovem para a doação de sangue, a campanha social de 2009, veiculada pelo governo federal, utilizou o que o Ministério da Saúde chamou de “veículos para atrair mais doadores”, ou seja, o lócus virtual.No meio virtual, a campanha de doação de sangue trouxe como forma de divulgação o gênero propaganda social estruturado da seguinte forma: 990 Como se tratava de uma campanha que objetiva “aumentar o número de doadores e torná-los frequentes” (BRASIL, 2009, s/p) e tendo no jovem a visão de que “Eles são os que mais têm hábito de vida saudável e os que conseguem mobilizar os amigos e os conhecidos” (idem), o governo apostando no lócus virtual em um tipo de intencionalidade que apresentava uma situação excepcional (conquistar não todos os públicos, mas todos os grupos de jovens), divulgou sua campanha nos mais diferentes suportes que o gênero propaganda social pudesse alcançar, desde o rádio e a TV, até blogs, Orkut, MSN, Twitter, 991 facebook, e o Google, com o slogan: Entre para a Corrente Sanguínea. Doe e convide alguém a doar. 3. O suporte digital: base de propagação e circulação Propaganda Social em busca de despertar a doação de sangue. da Criar um blog ou escrever um diário? Mandar um e-mail ou ir até o correio postar uma carta? Postar no nickname do seu MSN para todos os seus amigos ver que você está dando aula particular ou sair nas ruas colando cartazes? Essas são perguntas retóricas que servem para reafirmamos ainda mais a utilização mais comum do século XXI, a internet/meio virtual para as nossas atividades de comunicação. Prático, de rápida propagação e recepção, além de ser uma ferramenta que se tornou imprescindível na vida de qualquer ser humano. Com a era do ciberespaço abrem-se um espaço que vai além da comunicação das ruas. O telefone, o e-mail, o blog, são mecanismos de chegar até a informação de forma rápida, bem mais dinâmica e com economia de tempo. São suportes agregados para suprir a agilidade que tem de se travar a comunicação, abrindo também um campo maior para a recepção de informações que antes eram quase impossíveis de se ter. “O computador é, entretanto, o catalisador de uma transformação maior que, dissociando o texto de suas encarnações materiais, dá-lhe uma plasticidade e uma mobilidade desconhecidas até agora” (ANIS& MARTY apud, COSTA, 2005, p.105) Os suportes da internet têm relação centralmente com a idéia de um lócus no qual o texto se fixa e que tem repercussão sobre o gênero que está sendo veiculado. Mas a idéia de hipergênero postulada por MarcuschI (2002, 2006, 2008) permite aos suportes da internet travar um dialogismo entre o autor do texto e seus leitores uma construção do gênero não linear, como os gêneros impressos possuem, cabendo ao leitor 992 montar seu texto e, no caso da propaganda social, contribuir para que sua função de convencer outros leitores a doar sangue, seja ainda mais eficaz. Isso porque: O escritor de um hipertexto produz uma série de previsões para ligações possíveis entre segmentos, que se tornam opções de escolha para os hipernavegadores. O interessante é que cada leitor faz suas escolhas e seus caminhos que no geral não são similares ao de outro (MARCUSCHI, 2001, p83) Veja no blog ComuniqueC (http://comuniquec.wordpress.com/2009/07/20/doe-sangue-a-correntedo-bem) e papo do gordo (www.papodegordo.com.br), respectivamente, a campanha de doação de sangue, que trás os scraps postados pelos leitores incitados em convencer outros leitores a apoiar a campanha de doação de sangue: A Corrente do Bem: “Entre para a Corrente Sanguínea. Doe e convide alguém a doar” | Papo de Buteco | 21/07/2009 at 4:37 am [...] Recebi, por email, uma dica do Dudu do Papo de Gordo sobre uma campanha entre blogs sobre a doação de sangue.“Cerca de 1,8% da população brasileira já doou sangue nos últimos cinco anos. Os homens são responsáveis por mais de 70% das doações e os jovens entre 18 e 29 anos correspondem a 50% dos doadores. “O jovem é um ator fundamental nessa corrente. Eles são os que mais têm hábito de vida saudável e os que conseguem mobilizar os amigos e os conhecidos”, diz Genovez.Em 2008, foram registrados 3,1 milhões de doações de sangue. Apesar de representar um percentual médio de doações nos últimos cinco anos, o Brasil opera em constante estado de emergência no que diz respeito aos estoques de sangue. Todos os dias milhares de procedimentos hospitalares são realizados e, em muitos deles, o sangue 993 está presente. Por isso, é necessário que sempre haja estoque nos hemocentros que recebem o sangue de doadores voluntários.DOAÇÃO – Para ser um doador de sangue, o indivíduo tem que ser saudável, ter entre 18 e 65 anos, pesar mais de 50 quilos e não ter sido contaminado por doença transmissível. A recomendação do Ministério da Saúde é que as pessoas doem sangue, no máximo, três vezes ao ano. Os homens podem doar a cada três meses e as mulheres, a cada quatro meses, devido aos intervalos do ciclo menstrual.” ( Portal Saúde )Se você não sabe onde fica o posto de coleta, veja aqui onde fica o hemocentro mais perto da sua casa.Participe, você também! Baixe aqui o Folder da campanha Camila Dias disse: 20 de julho de 2009 às 10:17 Gente, Vamos é fazer tão essa fácil campanha doar! dar certo! Aliás tem que colocar aí na lista de condições e recomendações se mulheres grávidas podem doar (eu não sei se podem)… Ah, e as pessoas que fizeram tattoo e piercings há pouco tempo podem ou não doar? Abraços! Thiago Passos disse: 20 de julho de 2009 às 11:02 Um detalhe que eu descobri tem pouco tempo: mesmo pessoas com tatuagem, como eu, podem doar sangue! Vamos colaborar!! Rebecca Garcia disse: 20 de julho de 2009 às 12:54 Realmente é muito fácil doar e seguro! Eu mesma já doei diversas vezes, porém, de 1 ano pra cá não tenho doado por estar com a taxa de ferro 994 baixa. É rápido, indolor a ajuda muuuita gente!! Outra doação importante, que deveria ser mais divulgada, é a doação de medula É óssea. isso aí, vamos ajudar quem está mais precisando. Com tatoo e piercing não há problemas. O piercing, pode ser feito depois de 3 meses, se não me engano, pra poder ser verificado no teste de hiv, a tatoo acho Es´pero que é 3 que anos. Não me tenha lembro exatamente. ajudado. Abraços :) Observe que os seguidores de ambos os blogs se comunicam e ajudam a estruturar o texto. O gênero que, em suportes impressos, seria apenas a imagem no item 1 deste artigo, e que tinha a finalidade de convencer os diversos leitores, passa ao suporte virtual ser toda essa campanha que envolve outros gêneros, como os scraps, por exemplo, assim como outras semióticas, como as fotos dos blogueiros, além da expansão da linguagem com a intenção de enfatizar a importância de se doar sangue. De acordo com Xavier (2004, p.171) “a forma híbrida, dinâmica e flexível de linguagem que dialoga com outras interfaces semióticas, adiciona e condiciona à sua superfície formas outras de textualidade”. Os meios virtuais, como organizadores na produção dos diversos gêneros, beneficiados pela liberdade de expressão e pela tolerância ao diferente, eles vão testando novas formas de verbalização, regulando o formato de seu texto a cada nova situação de comunicação. A prática. O intenso uso e participação dos interlocutores atentos às novas formas de dialogar, interagir, comunicar, presentes em cada um dos novos gêneros digitais, na qual “O hipertexto vem, portanto, inaugurar um novo espaço 995 para a escrita, que possuirá, de acordo com os gêneros virtuais emergentes no contexto da tecnologia digital, características sui generis.” (HEINE, 2005, p.2) Já para Marcuschi (2001, p.86), o hipertexto se caracteriza, como um processo de escritura/ leitura eletrônica multilinearizado, multisequencial e indeterminado, realizado em um “novo espaço de escrita” que faz do leitor simultaneamente co-autor do texto final Conclusão Com a realização desta pesquisa, pudemos constatar que diferente dos suportes impressos, o suporte virtual pretende criar conexões entre os textos objetivando expandir a rede de conhecimentos dos navegadores, proporcionando assim, uma intensidade maior de propagação das funções dos gêneros. Dessa maneira para o gênero propaganda social, a persuasão, no ciberespaço, tem uma maior abrangência de públicos, na qual a construção da informação é construída junto aos leitores. O ciberespaço proporciona um maior interesse a partir do momento que cria um simulacro de interatividade face a face entre o autor do texto e os internautas. Concluindo com as palavras de Marcuschi (2001), a língua é um dos mais poderosos mecanismos de identidade cultural, inserção social e comunicação é incontestável, e, aliada a suportes que proporcionam a interação entre os sujeitos por meio dela, uma vez que para alguns gêneros o suporte é que lhe proporciona sua função, ela, sem dúvida, se transforma em um dos instrumentos de transmissão de informações, interação e conhecimento mais usados para as atividades de linguagem humana, materializada através dos gêneros texto. 996 Referências Bibliográficas. BAKTHIN, M.M. Os gêneros do discurso. In: BAKHTIN, M.M. Estética da criação verbal. 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