AVALIAÇÃO AMBIENTAL DA APLICAÇÃO DE FOSFOGESSO EM PAVIMENTAÇÃO Glaucia Machado Mesquita (1); Lilian Ribeiro de Rezende (2) (1) Universidade Federal de Goiás, Escola de Engenharia Civil, Programa de Pós-Graduação em Engenharia do Meio Ambiente, Praça Universitária, s/n., Setor Universitário, Goiânia, GO. CEP: 74.605-220 Brasil e-mail: [email protected] (2) Universidade Federal de Goiás, Escola de Engenharia Civil, Programa de Pós-Graduação em Engenharia do Meio Ambiente, Praça Universitária, s/n., Setor Universitário, Goiânia, GO. CEP: 74.605-220 Brasil e-mail: [email protected] RESUMO Proposta: As indústrias que se dedicam à fabricação do ácido fosfórico têm se preocupado em encontrar aplicações para o fosfogesso e assim evitar o acúmulo deste subproduto ou resíduo. Com a preocupação ambiental de disponibilizar áreas para servirem de estocagem de materiais produzidos por diversos tipos de indústrias, tem surgido o interesse de estudar a aplicação desses materiais em obras de pavimentação. O objetivo deste artigo foi avaliar, por meio de parâmetros ambientais, a aplicação de misturas de fosfogesso e solos finos como materiais alternativos para a construção de bases e sub-bases de pavimentos. Método de pesquisa/Abordagens: Foram realizados estudos com amostras de solo, de fosfogesso e de misturas dos dois materiais nas seguintes proporções: 50%solo e 50% fosfogesso, 80% solo e 20% fosfogesso, e 20% solo e 80% fosfogesso. Além de caracterização, foram realizados também ensaios de análise química, solubilização, lixiviação e levantamento radiológico. Resultados: Para as amostras estudadas, tem-se que nenhuma apresenta problemas com contaminação ambiental. No entanto, em função das reações químicas existentes, uma ou outra mistura poderá apresentar melhor desempenho mecânico, e, conseqüentemente, ter uma melhor aplicação em obras reais de pavimentação. Contribuições/Originalidade: Com os dados obtidos, propõe-se uma alternativa viável de reutilização do fosfogesso. Palavras-chave: fosfogesso; caracterização; pavimentação. ABSTRACT Propose: The industries that produce phosphoric acid are involved to find applications for the phosphogypsum and avoid the accumulation of this by-product or waste. With the environmental concern of making available areas to serve as stockpiling of materials produced by several types of industries, it is interest to study the application of those materials in pavements. The objective of this paper was to evaluate, through environmental properties, the application of phosphogypsum and fine soils mixtures as alternative materials for the construction of bases and subbases of pavements. Methods: studies were done with samples of soil, phosphogypsum and of mixtures of the two materials in the following proportions: 50% soil and 50% phosphogypsum, 80% soil and 20% phosphogypsum, and 20% soil and 80% phosphogypsum. Besides characterization tests, they were also studied with chemical analysis and environmental tests. Findings: For the studied samples, one can noted that none presents environmental problems. However, in function of the chemical reactions, one or other mixture can introduce better mechanical behavior, and, consequently, have a better application in real works of paving. Originality/value: With the results, one alternative for the use of phosphogypsum recycled can be proposed. Key-words: Phosphogypsum; characterization; paving. - 82 - 1 INTRODUÇÃO 1.1 Aspectos gerais No Estado de Goiás, assim como em todo o Brasil e em outros países, existem indústrias que utilizam de rochas fosfáticas com a finalidade de se obter o ácido fosfórico, o qual é utilizado na produção de fertilizantes. Em decorrer deste processo químico, origina-se o fosfogesso, um resíduo sólido ou subproduto, também conhecido como gesso químico. A estocagem de grande quantidade deste material envolve uma série de problemas, entre os quais se destacam: a necessidade de dispor-se de grandes áreas para o seu armazenamento e a realização do monitoramento das pilhas de subprodutos, por se tratar de um material que apresenta elementos radioativos e alguns traços de metais pesados, podendo causar riscos à saúde humana e ao meio ambiente. É importante ressaltar que as leis de proteção ao meio ambiente, tanto no Brasil como em todo o mundo, tornam-se cada vez mais rigorosas no que se refere aos cuidados a serem observados na estocagem de materiais com estas características. A preocupação ambiental associada à disposição em pilhas decorre do fato de que o fosfogesso, embora composto, principalmente, por sulfato de cálcio dihidratado, contém certas impurezas, metais pesados, ânions e radionuclídeos das séries naturais, que podem percolar através da pilha e atingir fontes de água superficiais e subterrâneas (SILVA et al., 2002). Desta forma tem-se a necessidade de se desenvolverem mecanismos para promover a conscientização e a busca de soluções para a implantação de tecnologias capazes de minimizar os impactos decorrentes da disposição destes subprodutos no meio ambiente e reduzindo assim, custos envolvidos nesta atividade. 1.2 O Fosfogesso Fosfogesso é o nome dado ao subproduto da reação química da rocha fosfática com ácido sulfúrico e água. Por meio desta reação, obtem-se o ácido fosfórico, que é usado, principalmente, como matériaprima para a produção de fertilizantes fosfatados.Além do ácido fosfórico, essa reação forma gesso (fosfogesso) e ácido fluorídrico (LUTHER et al., 1993). Essa reação química é a seguinte eq.1. Ca10(PO4)6F2 + 10H2SO4 + 20H2O →10CaSO4 2H2O+ 6H3PO4 + 2HF (eq.1) O fosfogesso é um dos grandes problemas da produção do ácido fosfórico, pois são produzidos de 4 a 6 toneladas para cada tonelada de P2O5 (anidrido fosfórico), (BECKER, 1983). A quantidade produzida é variável e depende da relação CaO/P2O5 da rocha fosfática empregada e do rendimento em P2O5 da fábrica de ácido fosfórico (RAIJ, 2003). No Brasil, a produção média anual é de aproximadamente 3,55 milhões de toneladas. Este material é composto, principalmente, por gesso, ou seja, sulfato de cálcio dihidratado (CaSO4 2H2O) que tem como impurezas: fluoretos, fosfatos, matéria orgânica e minerais como alumínio e ferro, metais pesados e radionuclídeos (LUTHER et al., 1993). Essas impurezas fazem a diferença entre o gesso e o fosfogesso, além de causar restrições ambientais ao descarte e aplicações do fosfogesso. As substâncias constituídas de sulfato de cálcio podem ser divididas em três grandes categorias, dependendo do teor da água de cristalização e da solubilidade: o dihidratado; o hemihidratado; as anidras I, II, e III (CASTILHO JR. et al., 1998). As variações mineralógicas constatadas nos solos tropicais são muito maiores que nos solos de outras regiões. Além disso, muitos dos comportamentos peculiares dos solos tropicais podem ser explicados pela sua constituição mineralógica. O Brasil, país de clima tropical úmido, apresenta grandes faixas de solo tropicais cuja formação provém da ação de processos geológicos ou pedológicos ocorridos nessas regiões (NOGAMI; VILLIBOR, 1995). Já a mecânica dos solos tradicional, não leva em conta a constituição dos grãos em suas propriedades e comportamento tendo uma atenção direcionada para a forma e o tamanho dos grãos na análise de seu comportamento. A importância dos solos tropicais utilizados como material na construção de pavimentos flexíveis no Brasil foi reconhecido no fim da década de trinta, com o surgimento da Seção de Solos de Fundação no Instituto de Pesquisas Tecnológicas de São Paulo (IPT/SP). Neste período, foram iniciados os primeiros trabalhos no campo rodoviário em convênio com o Departamento de Estradas de Rodagem do Estado de São Paulo (DER/SP) através do programa de estabilização de solos, visando o - 83 - revestimento das estradas de terra. Pelo fato dos procedimentos de estudos geotécnicos e de construção se basearem na tecnologia norte-americana, das peculiaridades dos solos tropicais, da falta de materiais granulares naturais, do clima tropical e do trânsito dessas rodovias serem muito elevado, os resultados não foram considerados tão satisfatórios como era esperado (VARGAS, 1994, citado por REZENDE, 2003). 1.3 Características químicas A composição química do fosfogesso varia com a natureza da rocha fosfática de origem e das operações industriais para a obtenção do ácido fosfórico. Desta forma, a concentração de cada elemento ou composto químico desse subproduto varia entre indústrias. No processo úmido, a definição da composição química do fosfogesso está relacionada aos processos de reação química entre suas matérias-primas e do grau de filtragem usado na separação entre o ácido fosfórico e o fosfogesso.A concentração de gesso ou de sulfato de cálcio no fosfogesso situa-se numa faixa de 80 a 90%, e o percentual restante é constituído por impurezas. De acordo com Silvestre (2002), as impurezas encontradas no fosfogesso podem ser divididas em dois grupos: as pertencentes e as não pertencentes a sua composição química. As impurezas do primeiro grupo são formadas por vários elementos e compostos. A Tabela 1 apresenta os elementos mais encontrados: arsênio (As), bário (Ba), cádmio (Cd), cromo (Cr), chumbo (Pb), mercúrio (Hg), selênio (Se) e prata (Ag), também conhecidos como metais pesados por possuírem massa atômica elevada e que, a partir de determinadas concentrações, tornam-se elementos poluentes, oferecendo riscos de contaminação do solo e de mananciais de água que estejam próximos aos depósitos de fosfogesso. Tabela 1 – Concentração dos elementos que pertencem a matriz de impurezas do fosfogesso bruto (Fonte: Florida Institute of Phosphate Research – EUA) - modificado de Silvestre (2002) Elemento As Ba Cd Cr Pb Hg Se Ag U3O8 1.4 Concentração (ppm) 1,0-5,0 50,0 0,3-0,4 2,0-5,0 2,0-10,0 0,02-0,05 1,0 0,1-0,2 5,0-10,0 Características físicas A Figura 1 apresenta-se a distribuição granulométrica do fosfogesso do “Freeport-McMoran, Inc”, obtida através de um estudo de Taha e Seals (1991), modificado de Kobayashi (2000). Figura 1 - Distribuição granulométrica do fosfogesso de “Freeport-McMoran, Inc”. (TAHA; SEALS, 1991, modificado de KOBAYASHI, 2000) - 84 - A distribuição granulométrica do fosfogesso depende do processo de produção de ácido fosfórico e do grau de trituração da rocha fosfática usada. As dimensões das partículas de fosfogesso, geralmente, variam de 0,02 a 0,05 mm, com mais de 75% do total das partículas passando na peneira nº. 200 (CHANG; MANTELL, 1991; GHAFOORI; CHANG, 1991, citado por KOBAYASHI, 2000). Classificando-se o fosfogesso como um solo pela Classificação “Transportation Research Board” (TRB), seria um solo siltoso (A-4) com pouca ou nenhuma plasticidade, e pelo Sistema Unificado de Classificação de Solos (SUCS) ou “Unified Soil Classification System” (USCS), como um material siltoso de baixa plasticidade (ML) (GERRITY et al., 1994). 1.5 Características Radiológicas No processamento químico da rocha fosfática ocorre uma ruptura do equilíbrio radioativo existente, em decorrência das diferenças de afinidades químicas dos radionuclídeos presentes no minério (ROSA, 1997). O exemplo típico desse comportamento é o apresentado pelo urânio e o rádio que são predominantemente, encontrados no ácido fosfórico e no fosfogesso respectivamente. Nas rochas fosfatadas, os vários membros da série natural do Urânio (238U), Tório (232Th) e seus produtos de decaimento encontram-se em equilíbrio radioativo. Após a digestão da rocha, em plantas que utilizam o processo por via úmida para a produção de fertilizantes, o equilíbrio é quebrado, havendo redistribuição dos radionuclídeos. Aproximadamente 86% do 238U e 70% do 232Th vão para o fertilizante, enquanto 80% do 226Ra vão para o fosfogesso (TITTLEBAUM et al., 1995). Estes radionuclídeos passam então a se comportar de acordo com suas propriedades químicas. Com o processo, os elementos que se encontram na rocha matriz são redistribuídos nos produtos intermediários, finais e subprodutos. A irradiação direta existente em reutilização na construção de estradas pode ser radiologicamente relevante. No entanto, levantamentos realizados em trechos acabados de estradas na qual o fosfogesso foi utilizado mostraram que as taxas de exposição não apresentam valores discerníveis (FERNANDES et al., 2004). 1.6 Utilização do Fosfogesso O fosfogesso tem competido economicamente com o gesso natural em países onde não existem jazidas deste mineral, como por exemplo, o Japão. Entretanto, pode haver a necessidade de secagem e eliminação de suas impurezas, indesejáveis em determinadas aplicações específicas, o que pode inviabilizar economicamente seu uso. A utilização do gesso químico em quantidades industrialmente interessantes parece repousar em duas alternativas principais. Uma delas seria a utilização do gesso químico, ou seja, do sulfato de cálcio, no lugar do calcário para produção do clínquer de cimento Portland. A outra, seria a utilização do gesso como matéria-prima portadora de cálcio, em que exige que a mistura crua introduzida no forno de cimento contenha a quantidade mínima de coque ou de carvão de madeira, necessária para deslocar o enxofre sulfático presente, transformando-o em SO2 (dióxido de enxofre). Atualmente, tem-se a utilização do fosfogesso nos seguintes setores: agricultura, indústrias, construção civil e pavimentação. 1.7 Ensaios ambientais Os problemas ambientais decorrentes da estocagem ao ar livre têm as seguintes origens: contaminação atmosférica com fluoretos e outros elementos tóxicos; poluição das águas subterrâneas; inalação de poeiras (partículas minúsculas) e impacto visual. Castilho Jr. (1998) realizou ensaios de lixiviação com o fosfogesso coletado no final do processo industrial e com o fosfogesso coletado nas pilhas da Copebrás-Cubatão (1997). Este ensaio foi realizado segundo a NBR 10.005 (ABNT, 1987) – Lixiviação de Resíduos, que fixa as condições para a lixiviação de resíduos, tendo em vista sua classificação. A classificação de um resíduo é de fundamental importância para seu possível aproveitamento, pois as decisões técnicas e econômicas tomadas em todas as etapas do tratamento deste tipo de material (manipulação, armazenagem, coleta, transporte e disposição final) deverão estar de acordo com a classificação dos mesmos. Através das prescrições normativas da ABNT é possível padronizar a classificação dos resíduos. - 85 - 2 OBJETIVO O objetivo deste artigo é apresentar resultados de ensaios ambientais e avaliar o comportamento de misturas de um solo tropical fino característico da região e do fosfogesso produzido no Estado de Goiás, como materiais alternativos para a construção de bases e sub-bases de pavimentos. 3 METODOLOGIA 3.1 Ensaios ambientais 3.1.1 Lixiviação e Solubilização O ensaio de lixiviação foi realizado conforme a NBR 10005 (ABNT, 2004a) que descreve todos os passos deste ensaio de maneira a proporcionar o efeito de percolação dos elementos contidos no resíduo sólido ou solo contaminado, e então analisando os elementos indicados ou impostos pela NBR 10004 (ABNT, 2004b). Para o ensaio de solubilização utiliza-se a NBR 10006 (ABNT, 2004c) que descreve todos os passos deste ensaio de maneira a proporcionar o efeito de solubilização dos elementos contidos no resíduo sólido ou solo contaminado. Desta forma, foram enviados aproximadamente 1,5 kg de cada amostra (solo, fosfogesso, mistura A, B e C) para a realização dos ensaios. 3.1.2 Avaliação Radiométrica Nesta pesquisa foi utilizado o medidor Geiger da marca Ludlum, modelo 2401 EW, sendo que esta avaliação foi realizada inicialmente no momento da coleta do fosfogesso na pilha (Figura 2). Para a realização da avaliação radiométrica com as amostras preparadas em laboratório, foram utilizados os corpos-de-prova confeccionados para o ensaio de compactação. Assim, as leituras radiométricas foram executadas em cada amostra distintamente (Misturas A, B, C, solo e fosfogesso) após a compactação, sendo esta uma medição direta. Figura 2 - (a) coleta do fosfogesso (b) leitura radiométrica do fosfogesso. 3.2 Ensaios complementares Para complementar o estudo de materiais alternativos utilizados em pavimentação (resíduos sólidos e solos tropicais finos), torna-se necessária a realização de ensaios com as amostras para determinação do complexo sortido, pH em água e pH em KCl. As análises químicas servem para a identificação do potencial hidrogeniônico (pH); determinação da matéria orgânica (MO); das bases trocáveis; da acidez e da capacidade de troca catiônica (CTC). 3.3 Compactação, Expansão e “California Bearing Ratio” (CBR) Quando se realiza a compactação de um solo, sob diferentes condições de umidade e para uma determinada energia de compactação conforme NBR 7182 (ABNT, 1986a), obtém-se a curva de variação dos pesos específicos em função da umidade. Após a compactação do material na energia Intermediária, onde são aplicados 26 golpes por camada, e formados cinco camadas no total os corpos- - 86 - de-prova ficaram imersos em água por quatro dias consecutivos, sendo efetuada diariamente leitura no extensômetro para determinar a expansão. Com a conclusão do ensaio de expansão, foi realizado o ensaio de CBR que consiste na aplicação de um carregamento estático em um corpo-de-prova sob condição saturada (após quatro dias). Conforme NBR 9895 (ABNT, 1987a), este carregamento se dá por meio da penetração de um pistão de diâmetro padronizado, em velocidade constante, acompanhado de registros de cargas de reação por meio de um anel dinamométrico acoplado à prensa. A realização do ensaio de CBR teve como objetivo principal definir, em laboratório, os valores de suporte dos materiais estudados. 4 ANÁLISE DE RESULTADOS 4.1 Ensaios ambientais 4.1.1 Lixiviação e Solubilização Os resultados obtidos no ensaio de lixiviação para as amostras estudadas. Os resultados dos parâmetros inorgânicos das amostras analisadas encontram-se dentro dos limites especificados pela norma brasileira. Os resultados obtidos no ensaio de solubilização para as amostras estudadas. Pode-se observar que o solo apresentou concentração de Fluoreto no extrato solubilizado acima dos especificados pela norma. O fosfogesso e as Misturas A e C apresentaram valores de Alumínio, Bário, Fluoreto e Sulfato acima dos especificados nos extratos dos solubilizados. A Mistura B apresentou valores de Alumínio, Fluoreto e Sulfato acima dos limites do extrato do solubilizado. Assim, constata-se que os elementos identificados nas amostras estão vinculados às rochas que deram origem tanto ao fosfogesso como ao solo. Devido às características químicas identificadas nos ensaios de solubilização as amostras são classificadas como Classe II A - Não Inerte. Nos ensaios de lixiviação das amostras ensaiadas, tem-se que as mesmas são classificadas como material, Classe II - Não Perigoso. As amostras foram classificadas como não inerte, pois quando submetidas a um contato dinâmico e estático com água destilada ou deionizada, à temperatura ambiente, não geraram alguns parâmetros solubilizados em concentração superiores aos padrões de potabilidade da água. Assim, tem-se que os materiais estudados nesta pesquisa devem ser acondicionados e identificados adequadamente e destinado para co-processamento, reaproveitamento ou disposição em aterro industrial para resíduos Classe II. 4.1.2 Avaliação Radiométrica Posteriormente aos ensaios de compactação, foi realizada a leitura radiométrica, nos corpos-de-prova do solo, do fosfogesso e das Misturas A, B, C para verificar se ocorre algum risco de contaminação radiométrica durante o processo de reaproveitamento do fosfogesso. Nesta etapa foram obtidas leituras 0,00mR/h, mostrando a baixa emanação de irradiação dos materiais estudados. Assim, estas misturas não apresentam nenhum risco de utilização. 4.2 Ensaios complementares Na determinação do pH do fosfogesso obteve-se o valor de 3,7. Este resultado encontra-se no intervalo de variação de 2,4 a 6,0, observado na literatura para diferentes tipos de fosfogesso (SILVESTRE, 2003; TAKEDA, 1998). Os resultados da análise química apresentados na Tabela 2 mostram que a diferença entre o pH em KCL e em água foi positiva e semelhante à diferença encontrada para o solo. A capacidade de troca catiônica (CTC) do fosfogesso é alta (maior que 11,30 mEq/ 100 cm3). O fosfogesso apresentou teor de alumínio trocável intermediário e o valor obtido para a saturação de - 87 - bases (V) é considerado alto. Neste material constata-se, ainda, a existência de grande quantidade de cálcio e fósforo, presente na rocha fosfática. Para o solo utilizado na pesquisa, o pH obtido foi próximo de 6,0, sendo característico de solos tropicais. Verifica-se que existe predominância de oxi-hidróxidos de ferro, já que a diferença entre o pH em KCL e em água foi positiva. A CTC do solo é baixa (menor que 4,62 mEq/ 100 cm3). Para o solo estudado, não existe alumínio trocável. Observa-se também que o valor obtido para a saturação de bases (V) está situado entre 25 e 50%, sendo classificado como baixo. Isso indica que o solo é intemperizado. Tabela 2 – Resultados das análises químicas Características pH em água pH em KCL ∆pH (KCL - água) Ca + Mg (mEq/ 100cm3) Ca (mEq/ 100 cm3) Mg (mEq/ 100 cm3) K (mEq/ 100 cm3) Al (mEq/ 100 cm3) Acidez total H +Al (mEq/ 100 cm3) CTC (mEq/ 100 cm3) Saturação de Alumínio (%Al) Saturação de Bases (%V) Matéria Orgânica (%) Fósforo (mg/dm3) Ca/Mg (%) Fosfogesso 3,7 3,9 0,2 94,8 94,7 0,1 0,03 0,5 Solo 6,1 6,3 0,2 0,3 0,2 0,1 0,09 0,0 Mistura A 6,0 5,9 -0,1 94,6 94,5 0,1 0,05 0,0 Mistura B Mistura C 5,9 5,4 5,9 5,3 0,0 -0,1 86,9 96,9 86,8 96,8 0,1 0,1 0,06 0,06 0,0 0,0 0,7 0,4 1,0 1,0 1,4 95,5 1,0 99 0,4 180 947,0 0,8 0,0 49 1,0 1,0 2,0 95,7 0,0 99 0,7 100 945,0 88,0 0,0 99 0,7 100 868,0 98,4 0,0 99 0,7 230 968 Ao misturar fosfogesso e solo, estando suas partículas livres para reagirem, ocorrerá agregação dos materiais pelo seguinte motivo: como o pH do fosfogesso é baixo, ele influencia na redução da carga negativa e facilita a floculação por ácidos. Este fato é confirmado com o aumento da acidez total que gera aumento da carga e, conseqüentemente, redução da defloculação. 4.3 Compactação, Expansão e “California Bearing Ratio” (CBR) Os resultados dos ensaios de compactação executados com a energia Proctor Intermediária, para a definição da umidade ótima e peso específico aparente seco máximo. Os mesmos moldes foram utilizados no estudo do “California Bearing Ratio” (CBR) e da expansão. O Gráfico 2 apresenta as curvas de compactação e de saturação (Sr = 100%) obtidas para o fosfogesso, o solo e para as Misturas A, B, e C preparadas em laboratório. Com os resultados apresentados nesta pesquisa, verifica-se que as misturas de fosfogesso e solo argiloso (Misturas A e B) apresentam maior potencial de uso quando compactadas. Com os valores obtidos na Tabela 3, tem-se que com aumento do teor de fosfogesso na mistura ocorre diminuição no valor do peso específico aparente seco máximo e aumento no valor da umidade ótima. As amostras do fosfogesso e da Mistura C apresentaram certa dificuldade na determinação da curva de compactação pelo fato de terem sido obtidos valores de umidade muito elevados para esses materiais. As Mistura A e B não apresentaram nenhuma dificuldade no momento da compactação. A constatação bibliográfica é de que o fosfogesso, no seu estado puro, apresenta problemas de compactabilidade no campo em casos de umidade acima da ótima (CASTILHO JR., 1998). - 88 - Solo Mistura B Sr = 100% Solo Sr = 100% Mistura B Fosfogesso 3 γd (kN/m ) 3 γd (kN/m ) Sr 100% Fosfogesso 13,0 12,5 12,0 11,5 11,0 10,5 10,0 9,5 9,0 8,5 (a) 19 18 17 16 15 14 13 12 11 10 (b) 15 25 30 35 40 45 50 55 60 65 70 75 w (%) Mistura A Mistura C Sr = 100% Mistura A Sr = 100% Mistura C 20 25 30 35 w (%) 40 45 50 Gráfico 2 – Curvas de compactação e saturação: (a) Fosfogesso; (b) Solo, Mistura A, Mistura B e Mistura C Tabela 3 - Resultados de compactação, expansão e CBR (Energia Proctor Intermediário) Propriedades 3 γdmáx (kN/m ) wot (%) CBR (%) Expansão (%) Fosfogesso 11,0 44,0 0,6 0,05 Amostras Mistura A Mistura B 13,8 16,4 34,4 20,5 15,0 37,0 0,22 0,04 Solo 16,9 20,0 15,2 0,02 Mistura C 12,0 43,8 7,0 0,40 Obs: γdmáx = peso específico aparente seco máximo; wot = umidade ótima; CBR = “Califórnia Bearing Ratio” O Gráfico 3 mostra as curvas de CBR x umidade do fosfogesso, solo e das Misturas A, B e C. De acordo com o Gráfico 3a, constata-se que o fosfogesso puro não apresenta capacidade de suporte e, portanto, sozinho, não poderia ser utilizado numa obra. No entanto, Castilho Jr.(1998) encontrou valores de CBR de 11% e 4% e expansão de 0,47% e 0,18% para as amostras de fosfogesso coletadas em diferentes indústrias e compactadas na energia Proctor Normal. Neste caso, o autor afirma que em função de suas propriedades de compactação e capacidade de suporte os materiais estudados poderiam ser utilizados na construção de pavimentos. Com os valores de CBR apresentados na Tabela 2, verifica-se que a Mistura B (20 % de fosfogesso) apresentou maior potencial de aplicação, podendo ser utilizada em camadas de sub-base de pavimentos (CBR ≥ 20%). A Mistura C (80% de fosfogesso) não seria indicada para uma aplicação prática. O solo e a Mistura A poderiam ser utilizados no máximo como reforço do subleito ou na construção de aterros em geral. Com relação à expansão, nenhum material apresentou problema. Para viabilizar a utilização dessas misturas em outras camadas, visando à melhoria do CBR, torna-se necessário realizar ensaios com maiores energias de compactação ou proceder à estabilização química do material com cimento ou cal. Solo Mistura B Fosfogesso CBR (%) CBR (%) 0,30 0,20 0,10 0,00 Mistura A Mistura C 45 40 35 30 25 20 15 10 5 0 30 34 38 42 46 50 54 58 62 66 70 15 19 23 27 31 35 39 43 47 51 w (%) w (%) (a) (b) Gráfico 3 – Curvas de CBR: (a) Fosfogesso; (b) Solo, Mistura A, Mistura B e Mistura C - 89 - Os resultados permitem concluir que: As Misturas A, B e C, o solo e o fosfogesso, foram ambientalmente classificados como, pertencentes à Classe II-A - Não inerte e Classe II - Não Perigoso. Alguns componentes apresentaram valores superiores aos limites especificados pela NBR-10004 (ABNT, 2004a). No entanto, esta constatação não impede o uso do fosfogesso, porque esses elementos podem ser característicos da rocha fosfática de origem. Na realização do levantamento radiométrico constatou-se baixa emanação de irradiação dos materiais estudados. Assim, estas misturas não apresentam nenhum risco em sua utilização. Com os resultados obtidos nas análises químicas, podem ser observadas a existência de reações entre as partículas do solo e do fosfogesso, o que explica as variações de resistência obtidas nos ensaios mecânicos. Quando compactados, observa-se que quanto maior a quantidade de fosfogesso presente na mistura, menor é o valor do peso específico aparente seco máximo (em torno de 12 kN/m3) e maior é o teor de umidade ótima (superior a 30%). Todos os materiais estudados apresentaram valores de expansão muito baixos. Para os materiais compactados na energia Proctor Intermediária, constata-se que o fosfogesso puro não apresenta capacidade de suporte e, portanto, sozinho, não poderia ser utilizado em obras de pavimentação (CBR = 0,6%). No entanto, verifica-se que a Mistura B (20 % de fosfogesso) apresentou maior potencial de aplicação, podendo ser utilizada em camadas de sub-base de pavimentos (CBR = 37%). A Mistura C (80% de fosfogesso) não seria indicada para uma aplicação prática, pois apresentou capacidade de suporte baixa e semelhante aos solos normalmente encontrados nos subleitos brasileiros (CBR = 7,0%). O solo e a Mistura A (50% de fosfogesso) poderiam ser utilizados no máximo como reforço do subleito ou na construção de aterros em geral (CBR = 15%). Para viabilizar a utilização dessas misturas em outras camadas, visando à melhoria do CBR, torna-se necessário realizar ensaios com maiores energias de compactação ou proceder à estabilização química do material com cimento ou cal. Os resultados obtidos nesse estudo são válidos para o fosfogesso gerado através do processo dihidratado obtido no estado de Goiás. A partir das metodologias adotadas, permite-se concluir que o fosfogesso misturado a solos finos regionais pode ser utilizado na construção de aterros, camadas de reforço do subleito e até sub-base de pavimentos. Com base nos estudos ambientais, nenhum problema foi detectado. 5 REFERÊNCIAS ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 10.005. Procedimento para obtenção de extrato lixiviação de resíduos. Rio de Janeiro, 2004b. 16p. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 10.006. Procedimento para obtenção de extrato solubilização de resíduos. Rio de Janeiro, 2004c. 3p. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 10004: Resíduos sólidos Classificação. Rio de Janeiro, 2004a. 71p. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 7182. Solo - Ensaio de compactação. Rio de Janeiro, 1986. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 9895. 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