Departamento de Engenharia Mecânica
DEPOSIÇÃO DE PARAFINA EM SEÇÃO ANULAR
Aluno: Matheus de Azevedo A. M. de Assis
Orientador: Luis Fernando A. Azevedo
Introdução
A deposição de parafina em tubulações é um problema crítico na produção de petróleo offshore. O petróleo é extraído do poço e passa pela tubulação imersa em águas geladas. A deposição
gera redução no diâmetro do duto e pode chegar a danificar permanentemente as linhas de
escoamento (Figura 1). É um fenômeno complexo que envolve diversas ciências como mecânica
dos fluidos, transferência de calor e massa, termodinâmica e equilíbrio de fases. Ela ocorre devido
a um fenômeno de transferência de calor entre o óleo e o ambiente externo (Figura 2). Na
produção de petróleo, essa transferência de calor acontece quando o petróleo é extraído do poço e
passa pela tubulação imersa em águas geladas. A deposição pode ocorrer também em risers não
submersos, e em escoamentos bifásicos com gás. Neste último, por exemplo, o efeito JouleThomson pode causar transferência de calor mesmo sem efeitos externos acentuados. Finalmente,
a transferência de calor leva a uma transição de fase nas moléculas de parafina, de líquidas para
sólidas, já que a solubilidade da parafina é diretamente proporcional à temperatura. Após essa
transição de fase as moléculas sólidas de parafina migram e depositam na superfície mais gelada.
Figura 1 - Depósito de parafina no interior de um duto
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Figura 2 - Esquema do fenômeno de transferência de calor. Onde Th é a temperatura de mistura, Td é a
temperatura na interface do depósito, Twi é a temperatura da parede interna, Two é a temperatura externa da
parede, Tc é a temperatura do fluido frio, xd é a espessura do depósito, ri é o raio interno e ro o raio externo.
A maior temperatura na qual aparece o primeiro cristal é chamada de Temperatura Inicial
de Aparecimento de Cristais (TIAC). Quando a parafina atinge uma temperatura menor do que a
TIAC, os cristais começam a se formar e migram para as paredes do duto num processo de
transporte de partículas. Acredita-se que os dois principais mecanismos de transporte de cristais
sejam a difusão molecular e a difusão de soret (Firoozabadi, 2008).
=
Onde J é o fluxo de partículas sólidas,
concentração de partículas sólidas, r é o raio do duto,
+
é o coeficiente de difusão molecular, C é a
é o coeficiente de Soret e T é a temperatura.
Esse dois gradientes tem direção negativa do centro para a periferia do duto. Sendo assim eles
tendem a levar as partículas sólidas precipitadas para a parede do duto. Os cristais precipitados, tendo
atingido as adjacências do duto, geram uma estrutura lamelar, que ao crescer lateralmente geram
flocos finos. Quando os flocos atingem um determinado tamanho e começam a se intercalar
formam um gel (Singh, 2000). A TIAC é determinada pela curva de solubilidade da solução.
Existem varias técnicas para se determinar a TIAC (Kok, 1996), (Monger-McClure, 1999). As
diferentes técnicas fornecem informações de diferentes escalas. As técnicas ópticas geralmente
fornecem a temperatura de aparecimento do primeiro cristal, já as técnicas termométricas oferecem
informações sobre um aglomerado de cristais. Na primeira a temperatura e maior do que na últimatipicamente 10 a 20°C de diferença entre elas.
A espessura do depósito é frequentemente medida através de testes de queda de pressão
entre dois pontos da linha de escoamento (Brown, 1993),(Creek, 1999). Nestes casos a rugosidade
superficial do depósito é um parâmetro importante na determinação da perda de carga na seção. A
rugosidade do depósito de parafina pode modificar os valores de queda de pressão, gerando dados
de espessura de depósito distantes da realidade.
Com o objetivo de caracterizar a rugosidade superficial do depósito de parafina, foi
construída uma seção de testes de geometria anular. Foram realizados testes para a medição de
queda de pressão no escoamento desenvolvido. Os resultados foram comparados com dados
teóricos obtidos por correlações para duto anular. No presente relatório são apresentados os
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resultados iniciais feitos com óleo padrão. Os testes com solução de parafina ainda não foram
realizados por falta de tempo.
Objetivo
Estimar a rugosidade superficial do depósito de parafina formado, através de medidas de
queda de pressão axial.
Procedimento experimental
a. Descrição da seção de testes
Foi construída uma seção de testes (Figura3) com dois tubos concêntricos de modo a gerar
uma seção anular entre os tubos. O tubo externo é feito em acrílico e o tubo interno em cobre. O
tubo de acrílico possui diâmetro externo igual a 40 mm e o tubo de cobre possui diâmetro externo
igual a 19,05mm. Pela parte interna do tubo interno escoa água a uma temperatura controlada. Um
banho termostático Thermo Scientific Haake A25, foi usado para esse fim. Pelo espaço anular
escoa o óleo. A temperatura do óleo é controlada por uma placa de aquecimento. As mangueiras
do circuito são aquecidas e isoladas por fitas de aquecimento e mantas térmicas respectivamente.
A seção toda fica imersa em um tanque com água, também a temperatura controlada. O controle
externo é importante a fim de diminuir efeitos de perda de calor pelas paredes do duto. Para o
escoamento do óleo, é usada uma bomba de cavidade progressiva NETZSCH, NEMO021 na qual o
ajuste de vazão é feito por um inversor de frequência WEG CFW08. Foi feita uma calibração
usando o fluido de trabalho à temperatura de teste, para construir uma curva vazão versus
frequência.
Figura 3 - Desenho da seção de testes
Este sistema permite gerar, potencialmente, um depósito de parafina sobre o tubo de cobre
(Figura4). O escoamento circula em circuito fechado, por isso é importante trabalhar com volumes
grandes de óleo para ter concentração constante na mistura.
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Figura 4 - Desenho dos tubos concêntricos gerando a seção anular com o depósito sobre o tubo de cobre, em
branco
O tubo de acrílico possui tomadas de pressão axiais. Algumas tomadas podem ser utilizadas
como entrada de termopar para medir a temperatura de mistura do óleo. O tubo de cobre também
possui termopares distribuídos axialmente. Os termopares foram inseridos internamente a fim de
medir a temperatura na parede do duto (Figura5). A ponta do termopar fica a 0,5mm da superfície
externa do tubo.
Figura 5 - Desenho do tubo de cobre e de como são inseridos os termopares
b. Queda de pressão com óleo
Foram realizados testes de queda de pressão, utilizando querosene como fluido de trabalho.
Para realizar a medição de queda de pressão entre dois pontos da seção, foi utilizado um sensor de
pressão a membrana, Validyne. O sensor foi calibrado com o auxílio de um manômetro de coluna
de óleo, Dwyer. Os testes de calibração foram feitos diversas vezes em dias diferentes, a fim de
testar a repetibilidade da calibração da membrana. Os testes de queda de pressão foram feitos com
óleo em escoamento isotérmico a 30°C. A viscosidade cinemática e a massa específica do óleo
foram medidas em laboratório (Figura 6) (Figura7).
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2,5
ν = -0,0173T(°C) + 1,7825
R² = 0,9998
ν (mm2/s)
2
1,5
1
0,5
0
0
20
40
60
Temperatura (°C)
ρ (g/ml)
Figura 6 – Gráfico da variação da viscosidade com a temperatura
0,8
0,79
0,78
0,77
0,76
0,75
0,74
0,73
0,72
0,71
0,7
ρ = 9E-05T2(°C)- 0,0074T(°C) +
0,8944
R² = 1
0
20
40
60
Temperatura (°C)
Figura 7- Gráfico da variação da densidade com a temperatura
Foram feitos cálculos teóricos de queda de pressão para comparar com os dados medidos
experimentalmente.
A queda de pressão em um duto é dada pela seguinte relação
Δ =
Onde
é o diâmetro hidráulico definido como
é o perímetro molhado.
2
=
, onde
é a área transversal e
As correlações usadas para o fator de atrito em duto de seção anular usam um diâmetro
hidráulico modificado chamado de diâmetro laminar equivalente, definido como:
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=
Assim o Δ fica
1− ∗ !
"# ∗!
1 − ∗!
1+ ∗ +
Δ =
2
E os fatores de atrito laminar e turbulento são respectivamente
01
95
1
2,51
;
= −2"-. /
+
6
$ =
'(
3,7 '( 5 *+,
*+,
Onde '( =
8 9:
7
;
e 0 = <.-=> ? (=< (
>@>?".
O cálculo da queda de pressão teórica foi feito por correlações que se aplicam a escoamento
desenvolvido. Foram utilizadas correlações do tipo Colebrook para o caso turbulento e 95/Re para o
caso laminar. Foi utilizada uma correção do diâmetro hidráulico para diâmetro laminar equivalente,
proposta por Leung & Jones (Singhal, 2005), para considerar a geometria anular. A queda de
pressão teórica no canal é da ordem de 10 mmca (milímetros de coluna d’água).
c. Queda de pressão com depósito de parafina
Para realização dos testes de queda de pressão em um escoamento com depósito de
parafina, é necessário gerar um gradiente de temperatura negativo, do centro até a parede do duto.
Para isso é necessário resfriar o tubo interno a uma temperatura abaixo da TIAC. Assim gera-se
um gradiente radial de temperatura que permite a migração de partículas sólidas de parafina, fora
de solução, para as paredes do duto. O resfriamento gera a transição de fase da parafina em
solução, de líquido para sólido. A viscosidade das soluções de parafina varia drasticamente com a
temperatura, próximo a TIAC, como ilustrado na Figura 8.
Temperatura (°C)
1
1
10
100
µ (Pa.s)
0,1
0,01
0,001
Figura 8 - Curva de solubilidade obtida por reometria para uma solução de 10% em massa de parafina em
querosene
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Para um depósito em regime pemanente deve haver um gradiente de temperatura no líquido
variando da temperatura na interface do depósito, Td, à temperatura do fluido quente, Th. A
figura(2) ilustra o gradiente entre Td e Th. Com isso, a viscosidade do fluido em escoamento é
uma função do raio. Neste caso deve-se definir uma temperatura de filme, tipicamente:
+
2
Visto isso, a viscosidade utilizada no cálculo da queda de pressão teórica deve ser referente
a uma temperatura de filme. Os testes com formação de depósito de parafina ainda não foram
feitos. Para realiza-los serão necessários testes de medição de queda de pressão com óleo padrão
sob escoamento não-isotérmico, a fim de definir a temperatura de filme a ser utilizada.
Além disso, alguns parâmetros que influenciam o processo de deposição de parafina
precisam ser especificados de modo a aperfeiçoar as medições. A concentração de parafina, assim
como o gradiente de temperatura devem ser escolhidos de modo a facilitar a medição do depósito e
a execução das medidas de pressão. A figura (9) ilustra a curva de solubilidade de três soluções,
com diferentes porcentagens de parafina sólida, obtida por DSC.
A
=
B
25,0
Parafina sólida (wt%)
20,0
5% wt
15,0
10% wt
10,0
20% wt
5,0
0,0
-20,0
0,0
20,0
40,0
Temp (°C)
Figura 8- curva de solubilidade obtida por DSC para três soluções com concentração em massa de parafina
diferente
Soluções com maior porcentagem de parafina formam depósitos maiores (Fong, 2007).
Desse modo, variando a concentração da solução de parafina, podemos modificar a espessura do
depósito que irá se formar. Para permitir a visualização uma solução com maior concentração seria
mais adequada. Porém, soluções com alta concentração de parafina podem entupir o circuito de
medição do sensor de pressão, exigindo um aumento na temperatura de teste, Th. Por isso, deve-se
escolher uma solução com concentração intermediária. Acredito que 10%wt, seja uma
porcentagem adequada (Tabela 1).
O procedimento para os testes com parafina baseia-se na redução da temperatura da água
que escoa no tubo interno, a fim de gerar o gradiente necessário para dar inicio a deposição. É
preciso um gradiente compatível com a TIAC da solução trabalho de parafina que irá ser utilizada.
Para a solução trabalho de parafina sugerida (10%wt), a TIAC é de 26,1ºC. Para iniciar o processo
de deposição, imaginando Th=35°C, a temperatura na interface externa do tubo de cobre é alterada
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para um valor abaixo da TIAC, imaginemos 15°C. O gradiente radial de temperatura irá gerar o
aparecimento de um depósito na superfície externa do tubo de cobre.
%
WAX
5
10
20
TIAC
20,6
26,1
32,0
sd
0,1
0,1
0,1
Tabela 1- Valor da TIAC para várias soluções, medida por DSC
Uma vez gerado o depósito, a medida de queda de pressão será utilizada para estimar a
rugosidade superficial do depósito, já que o fator de atrito depende da rugosidade superficial do
tubo, que deve der alterada com o aparecimento do depósito.
Resultados
Os dados experimentais de queda de pressão sob escoamento isotérmico ficaram muito
próximos aos valores teóricos usando correlações para escoamento laminar e turbulento, como
ilustrado na figura(10). A incerteza experimental associada se deve principalmente a oscilação nos
valores de pressão medida causada pela pulsação da bomba de cavidade progressiva usada no
experimento.
100,00
dP (mmH2O)
medida1
medida2
10,00
laminar
teórico
turbulento
teórico
1,00
1,E+03
1,E+04
Re
Figura 10 - Comparação teórico experimental da queda de pressão para vários Re
Nas pressões baixas a incerteza é maior, devido ao baixo valor absoluto da grandeza. Fica difícil
saber qual seria a correlação mais adequada para analisar esses dados, laminar ou turbulento.
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Conclusões
Os testes de queda de pressão com óleo tiveram bons resultados, garantindo ótimo nível de
confiança na medição com o sensor Validyne. Os testes de queda de pressão com parafina serão
feitos em trabalho futuros, assim como os cálculos para medição da rugosidade superficial do
depósito. Para garantir um depósito visível e um teste sob condições possíveis de ser realizado, foi
sugerida uma solução de parafina 10%wt. Essa solução possui uma TIAC de 26,1ºC. Estima-se
que um gradiente de temperatura compatível com a TIAC da solução trabalho, seria alcançado
com um Tc de 15°C.
Referências
[1] Banki, R.,Hoteit, H., Firoozabadi, A.(2008). Mathematical formulation and numerical
modeling of wax deposition in pipelines from enthalphy-porosity approach and irreversible
thermodynamics. Int. Journal of Heat and Mass Transfer, 3387-3398.
[2]Singh, P., Venkatesan, R., Fogler,H.S. (2000). Formation and aging of incipient thin film waxoil gels. Materials, Interfaces and Electrochemicam Phenomena, 1059-1074.
[3]Kok, M.V.,Létoffé, J-M., Claudy, P., Martin, D., Garcin, M., Vollet, J-L. (1996). Comparison
of Wax Appearance Temperatures of Crude Oils by Differenctial Scanning Calorimetry,
Thermomicroscopy and Viscosimetry. Fuel, 787-790.
[4]Monger-McClure, T.G., Tackett, J.E., Merril, L.S. (1 de Februrary de 1999). Comparisons of
Cloud Point Measurement and Paraffin Prediction Methods. SPE Production & Facilities,
pp. 4-16.
[5]Brown, T.S., Niesen, V.G., Erickson, D.D. (1993). Measurement and Prediction of the
Kinectics of Paraffin Deposition. SPE. Huston.
[6]Creek, J.L., Lund, H.J., Brill, J.P.,Volk, M. (1999). Wax Deposition in Single Phase Flow.
Fluid Phase Equilibria, 801-811.
[7]Singhal, N., Shah, S.N., Jain, S. (2005). Friction Pressure Correlations for Newtonian and NonNewtonian Fluids in Concentric Annuli. SPE. Oklahama City.
[8]Fong, N., Mehrotra, A.K. (2007). Deposition under Turbulent Flow of Wax-Solvent Mixtures in
a Bench-Scale Flow-Loop Apparatus with Heat Tranfert. Energy & Fuels, 1277-1286.
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