Coleção Ignatiana — 39
Coleção Ignatiana
1. Vida religiosa na Companhia de Jesus (esg.)
2. Mensagens à Companhia de Jesus (esg.)
3. Orientações para a Companhia de Jesus (esg.)
4. A experiência de Deus na vida religiosa, Pedro Arrupe (esg.)
5. Fome de pão e evangelização, Pedro Arrupe (esg.)
6. A Igreja é a esperança dos homens, Pedro Arrupe (esg.)
7. Diretrizes para a formação, VV.AA., 2ª ed. (esg.)
8. A obra de aculturação, Pedro Arrupe (esg.)
9. Comunidade apostólica, Pedro Arrupe e outros
10. Discernimento comunitário, 2ª ed. (esg.)
11. O nosso modo de proceder, Pedro Arrupe (esg.)
12. Comunidades de vida cristã, Pedro Arrupe e outros
13. Para chegar à CVX, 2ª ed.
14. Inspiração trinitária do carisma inaciano, Pedro Arrupe
15. Colaboração fraterna na obra de evangelização, P. Arrupe (osg.)
16. Nossos colégios: hoje e amanhã, 2ª ed., (esg.)
17 Análise marxista, Pedro Arrupe (esg.)
18. O superior local e a conta de consciência
19. Palavra de Inácio de Loyola a um jesuíta de hoje
20. Discurso do papa João Paulo II aos provinciais
21. Informação sobre a formação
22. Normas para a Companhia de Jesus
23. A vocação do irmão jesuíta, George E. Ganss
24. Lançando sementes de fé e justiça, Robert J. Starratt
25. Companheiros de Jesus enviados ao mundo de hoje
26. Opção preferencial pelos pobres
27. Deliberação que deu origem aos jesuítas
28. Exercícios de discernimento frente à realidade social (esg.)
29. Apostolado universitário na Companhia de Jesus
30. Fé e justiça nos Colégios da Companhia de Jesus (esg.)
31. Cartas, alocuções e homilias, Peter-Hans Kolvenbach
32. Novas cartas, alocuções e homilias
33. Cartas a todos os jesuítas
34. Diretrizes da formação da Companhia de Jesus no Brasil
35. Primeira Congregação dos Provinciais Jesuítas
36. Antigos alunos e a espiritualidade inaciana
37. Princípios gerais da comunidade de vida cristã, CVX
38. Visita do Padre Geral ao Brasil
39. Subsídios para a pedagogia inaciana
Subsídios para
Pedagogia
Inaciana
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ISBN: 85-15-01642-7
© Edições loyola, São Paulo, Brasil, 1997.
Índice
Apresentação
...................................................................
7
Contribuições para a implementação
da Pedagogia Inaciana na América Latina
Introdução ......................................................................... 11
I. O paradigma pedagógico inaciano ...........................
Experimentar.....................................................................
Refletir...............................................................................
Ação..................................................................................
Avaliação...........................................................................
15
20
21
24
26
II. Os sujeitos do paradigma ........................................ 31
III. O paradigma inaciano em âmbito institucional .
Introdução.......................................................................
O objetivo externo de nossos colégios ........................
A experiência do contexto . ..........................................
A formação das pessoas responsáveis pela mudança.
33
33
34
36
45
Anexo 1: Notas ao paradigma inaciano ..................... 53
1. A partir da perspectiva do carisma inaciano............. 53
2. Fé, justiça e discernimento no paradigma inaciano . 54
3. A partir da antropologia filosófica ............................. 55
“Cartilha do PPI”
Apresentação da Cartilha do PPI
. ............................
Contextualização (PPI nn. 33-41)...................................
Experiência (PPI nn. 42-46)............................................
Reflexão (PPI nn. 47-58).................................................
Ação (PPI nn. 59-62).......................................................
Avaliação (PPI nn. 63-67)...............................................
Vantagens do paradigma pedagógico inaciano (PPI).....
Aplicabilidade do paradigma pedagógico inaciano........
Ficha do PPI.....................................................................
Traços típicos da pedagogia inaciana.............................
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O Professor do Colégio Jesuíta
como educador da fé
O professor do colégio jesuíta como educador da fé ... 1. Introdução, histórico e finalidade do documento......
2. A educação formal como campo de evangelização...
3. Situação e missão do professor num colégio jesuíta.
4. A educação da fé num colégio jesuíta.......................
5. O sentido da fé que promove a justiça......................
6. Etapas ou pedagogia da fé..........................................
7. Os agentes do serviço de Educação da fé.................
8. Meios de exercer a Educação da fé...........................
9. Os exercícios espirituais de Santo Inácio como
escola de fé..................................................................
10. Dificuldades e desafios da educação da fé..............
11. Formação religiosa do educador da fé.....................
12. Implicações e conseqüências para o colégio jesuíta... 13. Conclusão...................................................................
Bibliografia
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. ..................................................................... 99
Explicação de alguns termos usados no documento ... 101
6
Apresentação
Após o lançamento do documento Pedagogia inaciana —
uma proposta prática, a CONEJ (Comissão Nacional de Educação
dos Jesuítas) publica agora uma série de subsídios que muito
poderá contribuir para a compreensão e a implementação do
paradigma pedagógico inaciano.
O primeiro é uma contribuição dos delegados de educação
jesuíta da América Latina e enfatiza a necessidade de implantar a
pedagogia inaciana, tendo como referência o contexto do nosso
continente.
O segundo, elaborado pelo Centro Pedagógico Pe. Arrupe, é
uma “cartilha”. Como o próprio título sugere, pretende ser algo que
facilite uma primeira aproximação ao documento Pedagogia inaciana,
mas que não dispense a leitura e o estudo aprofundado do próprio
documento.
Por último, um texto elaborado por Pe. Martinho Lenz, que nos
remete a uma reflexão sobre o papel do professor como educador
da fé. Trata-se de um texto de plena atualidade que muito poderá
contribuir para aprofundar a missão dos educadores nos colégios, à
luz da proposta pedagógica inaciana.
Salvador, 10 de setembro de 1997.
Pe. Domingos Mianulli, sj
Coord. CONEJ
7
Contribuições
para a implementação da
Pedagogia
Inaciana na
América Latina
10
Introdução
A publicação das Características da educação da Companhia de Jesus (1986) foi recebida muito positivamente por
todas as instituições educativas dos jesuítas. Nesse texto fica
definida a identidade de tais instituições da Companhia no
nosso tempo.
Essas diretrizes e orientações foram então especificadas e
traduzidas em cada Província, conforme os desafios e necessidades
dos contextos locais, nacionais e regionais. Daí surgiram os próprios
“Planejamentos apostólicos”, “Projetos educativos”, “Propostas do centro educativo” ou “Carta de princípios”. Me­diante tais documentos,
promoveu-se a divulgação e a assimilação paulatina das Características
nos diversos centros de educação.
No processo de sua aplicação concreta, ficou evidenciada, no
entanto, a necessidade de uma metodologia mais específica e operativa. Para responder a tal necessidade, o ICAJE, sob a coordenação de
Pe. Vincent Duminuco, secretário-geral para o apostolado educativo,
elaborou o documento Pedagogia ina­ciana: uma proposta prática1.
Tal documento supõe, naturalmente, que em cada região deverão
ser feitas ainda as adaptações culturais pertinentes.
Os delegados de educação das Assistências da Companhia
de Jesus na América Latina, desejosos de assumir tal responsa1. Publicado por Edições Loyola em outubro de 1993.
11
bilidade e promover esse trabalho em continuidade e coerentemente com tais documentos, oferecem com estas Contribuições
as linhas fundamentais para a adaptação e a implementação
práticas em nossas instituições educativas.
O documento elaborado pelo ICAJE é para todos nós o marco
referencial compartilhado com as outras regiões da Companhia de
Jesus no mundo. Ao realizar agora um primeiro esforço para adaptá-lo
a nosso próprio contexto, assinalamos como elementos específicos
na América Latina e como algo que nos deve orientar na aplicação
progressiva da pedagogia inaciana os seguintes pontos:
• A referência explícita a nosso próprio contexto e o convite
a assumi-lo como referência em nossos planejamentos e em
nosso trabalho educativo.
• O retomar da experiência vivida neste continente durante as
últimas décadas: nestes anos tem havido um frutuoso esforço para aprender a descobrir o Senhor nos rostos sofridos
do continente. Esta tarefa nos tem levado a unir a análise
da realidade com o discernimento apostólico. Neste esforço,
descobrimos que o paradigma proposto pela Conferência
Episcopal em Medellín (ver-julgar-agir) se enriquece e esclarece
mediante as cinco etapas com que resumimos o processo
paradigmático dos Exercícios.
• A decisão de enquadrar o trabalho de nossas instituições
educativas no conjunto do plano apostólico de cada uma de
nossas Províncias, dispostos ao apoio mútuo e à colaboração
que isso exige com as outras áreas de nosso trabalho.
A intenção fundamental das presentes páginas é sugerir caminhos concretos e adaptados à realidade latino-americana, de modo
que em nossos colégios e em todas as formas de nosso serviço
educativo se obtenham a renovação e as mudanças necessárias na
instituição, nas pessoas e na prática educativa.
Três são os pressupostos fundamentais deste documento das
Contribuições:
Primeiro. A finalidade de todo o serviço educativo da
Companhia de Jesus, derivada da missão do serviço da fé e da
12
justiça, é promover a formação das pessoas que constituem a
comu­nidade educativa, a fim de que todos possamos cooperar
para a transformação de nossa realidade social, na justiça, no
amor e na verdade.
Segundo. Para nos encaminhar a tal tarefa, o processo pedagógico deve inspirar e dinamizar os quatro elementos que definem
toda instituição educativa: seus objetivos e políticas gerais; a formação
das pessoas e suas relações interpessoais; a estrutura organizacional;
os processos administrativos e as técnicas educativas. Sublinham-se,
assim, as orientações e as propostas das Características e da Pedagogia inaciana, que são aplicáveis não só no trabalho acadêmico e
na aula, como também em todos os âmbitos compreendidos por
um trabalho educativo.
Terceiro. Para atingir os objetivos, é necessário utilizar uma metodologia apropriada, que se define em três campos fundamentais:
a) a formulação dos objetivos, opções e pressupostos teóricos
que o inspiram;
b) a explicitação dos caminhos, chamados freqüentemente “paradigmas”, com que se procede para obter tais objetivos;
c) a proposição de técnicas, mecanismos e instrumentos que
permitam levar à prática o paradigma escolhido.
As Características da educação na Companhia de Jesus expõem
amplamente os objetivos, opções e pressupostos. O documento
Pedagogia inaciana: uma proposta prática sugere, em seus diversos
apêndices, algumas técnicas e mecanismos operativos, a título de
exemplo.
Dedicamos agora especial atenção ao paradigma, porque nele
se descobre o processo que pode guiar operativamente toda nossa
atividade em cada um dos quatro elementos que definem a instituição educativa. As técnicas e recursos com que se vive cada passo do
paradigma podem ser múltiplos, uns mais aptos para umas pessoas
ou outras, para um tempo ou outro. Sem a referência unificadora do
paradigma, podemos cair em mero mecanicismo repetitivo, impessoal
e infrutífero.
Com estas Contribuições, propõe-se um caminho, isto é,
um paradigma que, a partir do contexto da própria história,
13
procura chegar à ação que o serviço e o seguimento de Jesus
exigem nos nossos dias.
Elas pretendem assumir a pedagogia que surge da es­
piritualidade inaciana tal como configurada na vida e nos documentos de Santo Inácio, como a Autobiografia, as Constituições, o
Diário espiritual, as cartas e, sobretudo, os Exercícios Espirituais, que
inspiram todos os outros escritos.
Estas anotações estão destinadas, em primeiro lugar, aos próprios delegados ou secretários de educação das diversas províncias e
países da América Latina, aos reitores, responsáveis e colaboradores
de cada um dos colégios e instituições de educação formal em que
trabalha a Companhia de Jesus e a quantos prestam seu serviço nas
obras de educação e promoção social inspiradas na experiência de
Santo Inácio. Pensamos que podem ser aplicáveis na organização e
realização de eventos de formação de adultos, educadores, funcionários, pais de família e ex-alunos.
É certo, como sublinha o documento Paradigma inaciano, que
a “pedagogia inaciana está inspirada pela fé. Mas mesmo aqueles
que não compartilham esta fé podem encontrar experiências válidas
neste documento, porque a pedagogia inspirada por Santo Inácio é
profundamente humana e conseqüentemente universal”.
Como os documentos anteriores, também este deverá ficar sujeito à adaptação e à avaliação posteriores, baseadas na experiência
que recolhermos em sua aplicação concreta. Nisto temos de levar
em consideração particularmente, como já dissemos, a Autobiografia
de Santo Inácio, as Constituições e os demais documentos, como a
Ratio studiorum, com que se desenvolve e expressa a espiritualidade
inaciana e o modo de proceder no serviço educativo ao longo da
história.
14
O
I
paradigma
pedagógico inaciano
A espiritualidade inaciana é essencialmente humanizadora.
O padre mestre Inácio concebe o processo de “santificação” vinculado ao processo simultâneo de aperfeiçoamento humano.
Pe. Peter Hans Kolvenbach, falando do humanismo cristão de
Inácio e da tradição da educação jesuítica desde o século XVI, diz:
“Esta forma de entender a relação de Deus com o mundo implica
que fé em Deus e afirmação de tudo o que é verdadeiramente humano são inseparáveis uma da outra... Fé e promoção do humano
caminham de mãos dadas”.
O processo de conversão-santificação e o processo pedagógico
aparecem assim unidos.
O paradigma (caminho) da pedagogia inaciana é a estratégia
que escolhem os educadores e educandos:
1) para redescobrir sua própria realidade pessoal e “ordená-la”
(EE n. 1), melhorando-a progressivamente até a plenitude;
2) para ressituar-se na realidade do mundo que os cerca, sendo
o “instrumento apto nas mãos de Deus”, e trans­formá-lo.
O paradigma é uma mediação entre os “sujeitos” e o “mundo”,
um instrumento para a melhor interpretação da realidade e para a
mudança, um processo (psicossocial) que, inspirado na espiritualidade
inaciana, a encarna em nossa pedagogia.
15
Este processo do paradigma pedagógico inaciano, cons­
ciente e dinâmico, realiza-se em cinco etapas, sucessivas e
simultâneas, porque cada uma delas se integra com as demais,
de tal forma que se afetam e interagem durante todo seu desenvolvimento.
Sua aplicação não se refere exclusivamente ao procedimento educativo no âmbito da aula e da relação educador-educando; é necessário aplicá-lo também a todo o conjunto
institucional que o sustenta, pois do contrário poderia correr-se o risco de contradizer institucionalmente o que se pretende
alcançar. Toda a instituição educa.
As cinco etapas ou passos do paradigma são:
1)
2)
3)
4)
5)
situar a realidade em seu contexto;
experimentar vivencialmente;
refletir sobre essa experiência;
agir conseqüentemente;
avaliar a ação e o processo desenvolvido.
Contextualizar a realidade
Trata-se de colocar o tema, o fato e seus protagonistas em
sua realidade, em suas circunstâncias.
A contextualização consiste em situar o sujeito — e aquele
aspecto da realidade que se quer experimentar, conhecer, apropriar e
transformar — em sua circunstância. O ponto de partida para Santo
Inácio é, precisamente, situar-se na vera historia, isto é, enfrentar a
realidade.
Tal contexto supõe ver os condicionamentos sociais, econômicos, políticos e culturais que podem distorcer a percepção e a
compreensão da realidade, o dinamismo da fé e a situação pessoal
do indivíduo.
16
A contextualização poder ser feita no local (in situ) ou “a
distância”. É evidente que a melhor forma de contextualizar é
a ação no local, recompondo os fatos, vendo os protagonistas
e circunstanciando o tema.
Assim procedem os juízes quando fazem a reconstituição
de um acidente ou de um delito, presumível ou real. Isso foi
o que fez Santo Inácio quando viajou à Terra Santa, e ali, no
próprio lugar, contemplou os fatos e as palavras de Jesus, observando até os mínimos detalhes, por exemplo, como eram e
em que direção estavam as pegadas de Jesus.
Mas nem sempre se pode contextualizar no mesmo lugar
onde aconteceram ou acontecem os fatos, onde atuaram ou
atuam os protagonistas.
Por isso, Santo Inácio propõe e pede ao exercitante a outra
alternativa: contextualizar a distância.
A distância física, inclusive a mudança de ambiente e de lugar
para fazer os Exercícios (quando estes não são feitos na vida diária),
não dispensa o exercitante de contextualizar. Santo Inácio pede,
como primeiro passo da contemplação, que se faça “a composição
de lugar” e nele se situem os protagonistas, os fatos (o que fazem),
suas palavras (o que falam) etc.
Se o mestre não leva os alunos aos bairros de periferia, às
indústrias, às instituições e lugares cujos protagonistas e fatos nos
interessam, pode fazê-lo alternativamente na aula.
A composição de lugar, a contextualização será, então, um
exercício intencional e consciente que trará realismo e iluminará o
sentido original dos fatos, seus protagonistas e seus temas.
Trata-se, por conseguinte, de um exercício em que se destacam
as linguagens que ativam a imaginação e a capacidade de reconstruir e visualizar o lugar e as circunstâncias em que se produziram
ou se produzem os fatos e em que atuaram ou atuam seus protagonistas.
17
Desde o começo, as comunidades cristãs viveram este dinamismo de assumir e interpretar seu próprio contexto histórico
e só assim puderam prestar seu serviço. Este é o significado
sempre novo da encarnação: “E o Verbo se fez carne e habitou
entre nós”. Assim, o seguimento de Jesus é histórico e ocorre
numa situação concreta.
O contexto latino-americano em que vive atualmente a
comunidade pode ser descrito, por exemplo, da seguinte forma:
nossas sociedades se defrontam atualmente com um processo
pluriforme, complexo, antagônico, pluricultural e se­cularizante.
Perante grupos humanos extraordinariamente ricos, milhões de
homens padecem fome, miséria, violência. Apesar do esforço
para preservar o direito e a paz, a vida se vê ameaçada porque o homem parece ter-se convertido no maior predador do
homem e do planeta.
Também se constata, cada vez mais, uma forte des­personalização,
na qual o homem já não é mais um ser em si mesmo, mas um número a mais nas grandes sociedades. A Igreja, durante séculos centro
dominante de inspiração, é vista atual­mente como uma instituição
à margem, sua voz, uma a mais entre outras e, por conseguinte, já
não mais a única e definitiva.
Inácio visualizou um mundo semelhante, mas seu olhar sobre a
realidade não o levou à desesperança, senão à descoberta de como
Deus atua na história dos homens e dos povos.
O processo pedagógico de Santo Inácio começa por enfrentar a
realidade, descobrir as causas do mal e da injustiça e deixar-se levar
pela força do “Espírito de vida”.
Assim também quando se trata do indivíduo: Inácio, antes de
começar a acompanhar uma pessoa nos Exercícios Espiri­tuais, percebia o quão importante para ela era estar aberta aos movimentos do
Espírito, se queria obter algum fruto do processo que se dispunha
a iniciar.
18
Baseado neste conhecimento prévio, Inácio fazia uma idéia
sobre a aptidão do exercitante para começar a experiência:
tiraria ela proveito dos Exercícios completos ou seria preferível
uma experiência abreviada?
Da mesma forma, a atenção pessoal, característica distintiva da educação jesuíta, requer que o professor conheça a vida,
os sentimentos, as inquietudes, os interesses de seus alunos,
o contexto concreto em que se realiza o ensinar e o aprender.
Para isso, o docente deve ser capaz de reconhecer os diferentes
ritmos e os diversos estilos de aprendizagem de seus estudantes
e seus diferentes tipos de inteligência. Deve ser capaz de classificar os tipos de noções propostas no programa de sua matéria
ou disciplina, seja por seu grau de complexidade ou abstração,
seja por sua posição dentro de determinada taxionomia, ou por
sua natureza em si: noções que podem ser descobertas pelo
aluno, reveladas, ou que precisam ser ensinadas pelo docente.
Situar o aprender e o ensinar em seu contexto também significa
que o professor preste atenção e aproveite as diferentes vias de
acesso à aprendizagem: a sensação, a emoção, o sentimento,
a intuição e a razão. Com esses dados, o docente saberá quais
experiências devem ser programadas para se obter um maior
proveito acadêmico, tanto quantitativo como qualitativo.
Tratando-se da instituição, é preciso contextualizá-la de forma
semelhante para, em dado momento, descobrir nela as possíveis
influências dos condicionamentos sociais: na sua estruturação, nos
estilos de gestão e no tipo e qualidade das relações interpessoais
de todos os membros da comunidade educativa; por outro lado,
deve-se saber de que maneira a instituição educativa interfere ou
pode interferir na realidade social mais ampla.
19
Experimentar
Embora esta expressão seja muito rica e, no uso comum,
englobe múltiplos significados1, dentro do paradigma assume
um sentido preciso que é necessário explicar.
Confrontando o próprio contexto — a vera historia —,
Santo Inácio convida quem faz os Exercícios (no nosso caso,
alunos e professores, toda a comunidade educativa) a “sentir
internamente” o que vê, olha, contempla. Isso leva a experimentar, a sentir tristeza, vergonha, confusão diante do mal; ao
gozo, impulso para entender onde e por que se experimenta
isso; ao desejo de seguir adiante; ao ânimo de encontrar saída
para tal situação ou resposta diante de tanto bem recebido.
A experiência, neste sentido, é a abertura radical do sujeito
a toda a realidade. É toda forma de percepção, tanto interna
como externa. A experiência é a notícia informe e prévia, carente
ainda de qualquer significado que possa emergir.
Deixa de ser experiência no momento em que é entendida, quando a pessoa responde à pergunta que a leva a sentir,
a imaginar, a pesquisar. Neste estágio do paradigma, o sujeito
está diante de si mesmo enquanto mero receptor de dados,
de suas próprias operações sensíveis e afetivas. Estritamente
falando, a pessoa não sabe o que significa o que está sentindo,
percebendo, registrando.
A experiência é conditio sine qua non de todo conhecimento
humano. Suas vertentes são as que comumente denominamos
“sentidos”: ver, ouvir, cheirar, saborear, tocar, além do próprio sentir
interno de si mesmo, surgido dessas mesmas sensações externas, da
memória, da imaginação, da afetividade.
1. Usamos a palavra experiência para exprimir sabedoria, familiaridade com determinado campo da vida, anos de trabalho acumulados em um ofício; assim, dizemos: a
experiência é a mãe da ciência; a voz da experiência; à luz da experiência; depois de
uma longa experiência; com 50 anos de experiência etc.
20
Por conseguinte, a tarefa educativa fundamental neste
nível de consciência consiste em desenvolver na pessoa a capacidade de escutar, de estar atento a perceber a realidade e
os fenômenos que estão acontecendo.
Refletir
Este terceiro elemento do paradigma é o que mais apropriadamente recolhe a atividade intelectual. É o lugar em que
se dá a apropriação e, por conseguinte, sua humanização.
Nos Exercícios, este passo é designado como “refletir”. Com
este exercício ou passo, motiva-se o perguntar-se o que se viveu
na experiência, qual seu significado, que relação tem com cada
uma das dimensões de nossa vida e da própria situação.
A psicologia do pensamento e/ou da inteligência oferece,
atualmente, muitas teorias sobre a reflexão. O tema está cada
dia mais desenvolvido e continua sendo debatido e investigado.
A pedagogia, servindo-se da psicologia como ciência auxiliar, já
incorporou algumas dessas teorias, com diferentes resultados.
Conscientes disso e levando em consideração que Santo
Inácio faz o exercitante passar por diversos modos e tipos de
reflexão, decidimos referir-nos somente a duas manifestações
básicas da reflexão inaciana, para facilitar a compreensão do pa­
radigma e evitar debates de teorias e correntes psicológicas.
Entre os processos de reflexão, distinguimos duas operações
fundamentais: entender e julgar.
Entender
Entender é descobrir o significado da experiência, estabelecer as relações entre os dados vistos, ouvidos, tocados,
cheirados etc. É o clarão que ilumina o que se apresentava em
penumbra na percepção sensível.
21
Entender é o que permite ao sujeito conceitualizar, formular
hipóteses, conjeturas, elaborar teorias, definições, suposições.
Partindo da experiência como pressuposto indispensável e
impulsionado pelo dinamismo intencional de sua consciência,
o sujeito penetra em um nível superior no processo do conhecimento: o da intelecção.
Entender é um ponto de chegada para as perguntas que surgem
da experiência, mas é um ponto de partida para a reflexão que procura
a verificação, a certeza de que se entendeu corretamente.
A pessoa entende quando pode responder às perguntas:
Que é isto? Por que é assim?
A inteligência humana se defronta ativamente com todo
conteúdo da experiência por meio da perplexidade, da admiração, do ímpeto, da intenção de decifrá-lo, codificá-lo,
entendê-lo. Para vislumbrar de maneira inteligente o que é
“entender”, é preciso estar dentro do processo de aprender,
ou, pelo menos, é necessário atualizar em si mesmo processos
prévios de aprender.
O entender requer:
a) autenticidade para reconhecer que a pessoa está diante
de algo que não entende;
b) atenção cuidadosa às ocasiões em que a pessoa mesma
entendeu ou não pode entender e
c) o uso repetido de experiências pessoais em que, no começo,
a pessoa está genuinamente intrigada e em seguida compreende.
A tarefa educativa fundamental para utilizar este nível de
consciência consiste em assumir os dinamismos de nosso processo
intelectivo: aprende-se a ser inteligente.
22
Julgar (verificar)
A segunda operação da mente humana contida no termo
“refletir” do paradigma é julgar. Emitir um juízo é verificar a
adequação entre o entendido e o experimentado, entre a hipótese formulada e os dados apresentados pelos sentidos.
Assim como a experiência estimula o inquirir e o inquirir
é a inteligência que coloca a si mesma em ação, o conceito
em que se formula o significado estimula a reflexão, que é a
exigência consciente da racionalidade; ela ordena e avalia, seja
para julgar e completar o processo, seja para duvidar e assim
renovar o inquirir.
Mediante o juízo, a pessoa tem acesso ao âmbito da verdade, da objetividade, dos valores conhecidos como tais. Um
juízo verdadeiro oferece à verificação dos outros o conteúdo do
que afirma ou nega independentemente do sujeito no qual se
gerou esse conhecimento.
Com o juízo completa-se o processo do conhecer humano, porque não é suficiente a combinação das operações dos
sentidos (experimentar) e do entender.
Pelo juízo pode se descobrir e valorizar a distinção entre
o fato e a ficção, a lógica e o sofisma; o juízo permite valorizar
a contribuição da filosofia e do mito, da história e da lenda
para o conhecimento racional ou para o conhecimento simbólico; ele possibilita compreender e diferenciar a astronomia
e a astrologia, a química e a alquimia, a medicina profissional
e a popular.
Com o juízo emerge um nível de consciência superior ao do
entender: o da reflexão crítica. O sujeito tem acesso a ele quando pode
responder à pergunta: é realmente assim? A resposta, o juízo, exprimese em sua forma mais lacônica pela expressão: sim ou não.
Contudo, não se pode colocar o conhecer humano no
julgar excluindo o experimentar e o entender. Fazer juízos
23
independentemente de toda experiência é deixar de lado os
fatos e esquecer-se do contexto e da realidade.
A formação crítica na educação consiste, portanto, em
aprender a respeitar as exigências da verificação: zelar pelo
cumprimento das condições para que uma intelecção possa
se constituir numa realidade afirmada.
Ação
O processo que descrevemos ficaria limitado se terminasse
no entendimento, na verificação e no juízo crítico sobre a matéria
ou experiência estudada. A contribuição decisiva da pedagogia
inaciana consiste em desafiar a pessoa a dar um passo além: assumir uma postura pessoal diante da verdade descoberta, revelada
ou construída e agir coerentemente com ela.
A ação é entendida como a manifestação operativa de uma
decisão livremente assumida para a transformação da pessoa
e da realidade institucional e social em que vive.
Dentro do paradigma, esta definição da ação como sua
quarta etapa é operacionalizada em dois momentos:
A decisão
Embora o processo do conhecer humano, ingrediente
substancial e constitutivo do paradigma inaciano, fique plenamente realizado com o juízo, o dinamismo da consciência não
termina aí. A afirmação ou negação que constitui o juízo como
expressão da reflexão crítica é o suporte de um nível posterior de
consciência: diante da verdade o sujeito se revela, emerge como
pessoa responsável e livre. Revela-se uma criação original.
A pessoa é convidada a tomar uma decisão sobre o que
fazer com a verdade conquistada durante seu processo pessoal
24
de aprendizagem. Em função disso, pondera diversas alternativas
de ação, escolhe o que quer realizar e move sua vontade para
afeiçoar-se livremente com aquela alternativa que percebe como
a mais apropriada para atingir o fim que pretende.
Inacianamente, para decidir com retidão é necessário deliberar, isto é, ponderar as razões a favor ou contra cada uma das
alternativas e os movimentos ou moções que se experimentam
em cada uma delas. Depois dessa deliberação, aquele que se
exercita deve optar e, em seguida, submeter sua escolha à confirmação. As meditações das Duas Bandeiras (nn. 135 ss.), dos
Três Binários (nn. 149 ss.), dos Três Graus de Humildade (nn.
164 ss.) e as regras de eleição nos diversos tempos espirituais
(nn. 169 ss.) são, neste momento, a referência necessária para
compreender a riqueza desta etapa do paradigma.
Livremente o sujeito faz de si mesmo o que ele é; nunca
nesta vida está terminada sua obra, sempre se encontra em
processo, sempre se trata de uma realização precária, da qual
se pode escorregar, cair, ficando em pedaços.
Neste estágio, o dinamismo da consciência se manifesta
não tanto pelo desejo de conhecer, e de conhecer corretamente,
mas como o eros do espírito humano que abraça a realidade
humana para transformá-la porque a ama.
Este é o estágio da decisão autêntica, escopo e fim dos
exercícios inacianos.
A partir de uma perspectiva humana, o estágio da escolha explicita os imperativos éticos da pessoa, sua dimensão axi­ológica.
Partindo de uma perspectiva cristã, encontramo-nos dian­te
da tarefa de procurar e encontrar a vontade de Deus.
Em ambos os casos, trata-se de libertar nossa liberdade
para escolher autenticamente; para o cristão, é a vida no Espírito. O discernimento é a metodologia elaborada por Inácio
para realizar este projeto.
25
Decidir é transcender a reflexão crítica, a verdade descoberta, pelo bem amado, pelo valor. Decidir é operacionalizar o
autêntico ser do homem: “ser para os outros”. Decidir é assumir
a visão do mundo que resulta da experiência de ser amado por
Deus — Fé —, para transformar a realidade com critérios de
justiça, em prol da implantação do Reino.
Neste nível, a tarefa educativa fundamental é o desenvolvimento da liberdade e da responsabilidade.
A operacionalização
Logo depois vem a concretização da escolha, pesquisando
e procurando os meios, modos e tempos que permitam efetivamente agir, assumindo valores, atitudes e condutas consistentes e conseqüentes com sua opção, uma vez que “o amor
se demonstra mais nas obras do que nas palavras”.
Para isso, todas as experiências de aprendizagem propostas
pela escola, na sala de aula ou fora dela, devem ser previstas de
tal modo que possibilitem, além do gosto por aprender ativa e
reflexivamente, canalizar as forças motivacionais que surgem
perante a conquista da aprendizagem (a conquista da verdade),
elementos básicos que movem o homem para o compromisso
e para a ação. Inacianamente falando, o compromisso e a ação
desejada, livremente escolhida pelo indivíduo, deve estar orien­
tada pelo magis: o melhor serviço a Deus e a nossos irmãos.
Avaliação
Por avaliação se entende uma revisão da totalidade do
pro­cesso pedagógico seguido ao longo de cada um dos passos
do paradigma para verificar e ponderar em que medida se realizaram fiel e eficientemente e em que grau se obtiveram os
objetivos perseguidos, em termos de mudança e transformação
pessoal, institucional e social.
26
A avaliação, por conseguinte, leva em consideração necessariamente dois aspectos:
1) revisão de processos e
2) ponderação e pertinência dos resultados.
Revisão de processos
Revisar os processos é voltar a fixar a atenção e focalizar
o pensamento nos próprios processos em que se está envolvido, como também nos conteúdos trabalhados, nas atividades
realizadas e nos meios utilizados em cada um dos passos do
paradigma, para constatar sua idoneidade, sua articulação e sua
eficiência, a fim de, conseqüentemente, reforçá-los, melhorálos ou mudá-los.
Esta revisão de processos pode, e deveria, ser efetuada de
duas formas complementares entre si.
Uma é a avaliação que se realiza ao final de um processo,
unidades ou subunidades de trabalho, para ver retrospectivamente e ponderar a inter-relação dinâmica de processos, conteúdos e atividades em cada um dos participantes em relação
à eficiência e eficácia para atingir os fins e procurar elementos
que melhorem esses processos.
Outra é essa própria avaliação realizada não em momentos
terminais ou quase terminais, mas diacronicamente ao longo
de seu desenvolvimento, com a finalidade de poder melhorá-la
e readaptá-la, em seu próprio desenvolvimento, às condições
do sujeito. Esta avaliação formativa reassume assim vários
aspectos:
—Processo de diagnóstico: este aspecto assume a dinâmica de identificar, esclarecer, definir e concretizar o
ponto de partida do sujeito (pessoa ou instituição) que
está no processo do paradigma, para poder ajustar este
processo à sua situação específica, tornando-o o mais
27
proveitoso para o fim que se pretende. Este aspecto do
diagnóstico, na etapa inicial do paradigma, pode contribuir com muitos dos elementos a ser contemplados e
le­vados em consideração na contex­tua­lização; e ao longo
do paradigma funciona como o atualizador da con­tex­
tualização, além de ajudar a reformular e a organizar os
outros passos do paradigma.
—Processo de melhoramento: com as contribuições do
constante diagnóstico, o processo formativo está sempre
em permanente adaptação para responder às necessidades pessoais de cada um, melhorando qualitativamente
toda a dinâmica com os ajustes adequados.
—Processo de ajuda pessoal: levando em consideração
que com o acompanhamento de diagnóstico das poten­
cialidades e condicionamentos específicos de cada sujeito, sejam individuais, sociais ou institucionais, e podendo
adequar o processo do paradigma a cada necessidade
específica, o processo se converte em uma dinâmica
constante de ajuda pessoal.
Ponderação e pertinência dos resultados
Além da dinâmica contínua que deve ser promovida na
revisão — avaliação dos processos —, é necessário também,
periodicamente e em determinados momentos, fazer cortes
para analisar o que vai ficando como passado, ponderar os
objetivos conseguidos no período que terminou e examinar a
pertinência dos resultados.
Ponderação dos objetivos alcançados
Todo o processo da pedagogia inaciana está orientado para
obter determinados objetivos, concretizados e manifestados de
alguma forma nas Características. Assim, é importante exami28
nar detidamente se os processos promovem e atingem esses
objetivos, que, em última análise, têm de configurar a pessoa
comprometida na sua fé com a justiça e o ser para os outros.
Além de confirmar a realização dos objetivos, devem ser
analisados todos os elementos que contribuíram para isso, para
detectar as causas e fatores que se tornaram impedimentos ou
limitações, no caso de os objetivos não terem sido atingidos. Se tudo
parece positivo, a avaliação reconfirmará e reforçará os processos
e elementos que mais contribuíram para alcançar o objetivo; em
caso negativo, cria a ocasião de mudanças para corrigir tu­do o
que se perceber necessário para tal efeito e para intro­du­zir novos
elementos destinados a superar os resultados anteriores.
Pertinência dos resultados
A avaliação tem de analisar e examinar se os objetivos
conseguidos respondem ou estão dentro das orientações para
os fins últimos pretendidos. Assim, a pertinência não faz referência somente à possibilidade de se ter atingido ou não os
objetivos, mas também pode e deve questionar sua validade,
tendo como ponto de referência os fins últimos.
Em uma sociedade pressionada pelo dinamismo da constante mudança, o tempo transcorrido entre o planejamento
e sua realização pode dar-se tanto em âmbito pessoal como
institucional ou social. As mudanças de contexto, por exemplo,
podem afetar muito profundamente qualquer planejamento,
processo ou estratégia. Ações e recursos úteis em determinado
contexto podem não o ser em outro.
Como se pode compreender, a avaliação questiona todas as
etapas do paradigma; mas não fica no mero questionamento. A
avaliação examina os resultados do processo, procura as causas
e suas possíveis superações ou remédios e, por conseguinte,
reabre o caminho para seguir avançando.
29
Hoje em dia a tecnologia educativa deu valiosas contribuições aos enfoques da avaliação. Existe muita coisa que se pode
aproveitar, contanto que se faça uso dela com sentido crítico.
Indicadores de que o processo e seus resultados estão na
linha do que fundamenta e orienta a própria vida e a da instituição educativa são, por exemplo, a paz e a alegria, a audácia
e a criatividade, o aumento de esperança, o consenso com que
toda a comunidade assume uma decisão.
30
Os
II
sujeitos
do paradigma
Nos Exercícios Espirituais de Santo Inácio, como em sua
pedagogia, todos aprendem: exercitantes e diretor, alunos e
mestre. Mas para que essa aprendizagem seja possível, são
exigidas certas condições de cada um.
Em primeiro lugar, são exigidas atitudes fundamentais como:
a) Generosidade, abertura e disponibilidade: “Com grande
â­nimo e liberalidade” (EE 5); continuar “com todas as
suas forças” (EE 16).
b) Que se procure sinceramente a mudança (“organizar sua
vida”) e, se o desejo não for total, ao menos estar com
“desejo de desejo”, “movendo-se, empenhando todas
as suas forças para agir ao contrário” (agere contra) (cf.
anotações 12 e 16).
c) Que o mestre e alunos (diretor e exercitantes) mantenham
o diálogo como uma atitude recíproca de mútuo respeito
e estima, “pressupondo que todo bom cristão há de estar
mais disposto a salvar a proposição do próximo do que
a condená--la” (EE 22).
O mestre deve partir da realidade concreta de cada aluno
— educação personalizada (Inácio recomenda ao diretor de
Exercícios Espirituais [anotações 6 a 10; 18, 19, 20] que considere
31
a hipótese de situações em que ao começar se pode encontrar
o exercitante). E, em cada caso, deve colocar em questão o
processo pedagógico conforme sua realidade, segundo suas
necessidades e potencialidades (EE 76).
O educador inaciano, inspirado no modo como Deus olha
os homens e neles aposta (Meditação da Encarnação), tem fé
no homem (efeito pigmaleão) e sabe que, apesar das limitações
de cada aluna e aluno, todos poderão chegar a níveis progressivos de maturidade e plenitude. A partir da fé nos alunos e
em seu potencial de mudança, torna-se um profissional da
esperança.
O aluno é ator e sujeito da educação. O mestre é facilitador
e companhia que respeita o processo de cada um. A pedagogia
inaciana é ativa e participativa. Inácio não dá conteúdos que
o exercitante tenha de aprender; o exercitante aprende o que
descobre e experimenta em seus exercícios. A pedagogia inaciana considera que a ação é constitutiva do conhecimento. Na
espiritualidade inaciana, os sujeitos da educação não são só o
aluno e o mestre, mas todos os membros da comunidade.
A parte dez das Constituições contribui com pautas inspiradoras para a pedagogia quando descreve como a comunidade
assume a co-responsabilidade da vida e o crescimento de todos,
e o modo como o superior deve animá-los e governá-los.
32
O
III
paradigma inaciano
em âmbito institucional1
Introdução
Nesta parte de nosso documento pretende-se aplicar o esquema básico do paradigma inaciano à mudança que queremos
conseguir em cada um de nossos colégios. Este propósito é congruente com nossa finalidade apostólica reformulada na Congregação Geral XXXII, nos seus decretos 2º e 4º, e também com os
objetivos da estratégia geral para aplicar o paradigma.
Para fazer esta aplicação, apoiamo-nos basicamente em
dois princípios:
1º)O processo de extensão social do carisma inaciano como
aparece nas Constituições da Companhia de Jesus2.
1. Embora neste capítulo apresentemos a aplicação do paradigma especificamente
aos colégios, é evidente que o campo de ação desta proposta é muito mais amplo e
ela pode ser adaptada a todas as instituições educativas como as universidades, obras
de educação popular, escolas técnicas etc. Acreditamos que mesmo a formação dos
jesuítas pode aproveitar frutuosamente muito do que aqui se sugere.
2. Vergara A. Jesús. El estilo ignaciano como propulsor de una universidad de inspiración cristiana. Ed. ITESO, Guadalajara, México, 1985.
33
2º)A procura da excelência educativa, como a expressão
con­temporânea experimentada com êxito do magis
inaciano3.
Conforme esses dois princípios fundamentais, estru­turamos
o desenvolvimento do presente capítulo nos seguintes itens:
—O fim externo (objetivo) de nossos colégios.
—A estratégia da mudança: organizar a transformação dos
processos educativos.
—A formação das pessoas responsáveis pela mudança.
O objetivo externo de nossos colégios
Conforme o esquema das Constituições, o primeiro passo
para constituir ou transformar uma instituição é estabelecer com a
maior clareza o fim último, o objetivo externo de tal instituição.
Sem entrar no contexto particular de cada colégio, considerado instituição educativa, o fim último de todo colégio é o
da educação: “A atividade educativa não teria sentido se não
fosse por seus objetivos em relação à sociedade em que se
encontra inscrita. É o objetivo externo da educação o que dá
significado a toda instituição educativa”4.
Isto, válido para toda empresa que educa, é duplamente
válido para nossos colégios, que pretendem formar “homens
e mulheres para os demais”. Por isso, o fim último de nossos
colégios é o objetivo apostólico da Companhia de Jesus, o que
pode parecer evidente. Contudo, na atividade cotidiana de nossos colégios é uma evidência que parece ter sido esquecida.
Assim, para alguns, deixando de lado a verdadeira finalidade, parece que importa mais organizar as atividades do colégio
3. Schmelkes Sylvia. Hacia una mejor calidad de nuestras escuelas. Ed. CEE, México,
1993.
4. Id., ibid.
34
de tal forma que os alunos sejam capazes de passar por uma
prova, cumprir os pré-requisitos exigidos para passar ao grau
ou nível seguinte, cumprir com as normas e os regulamentos
da escola ou com a normatividade oficial do governo. Ao agir
assim, muitas vezes acontece de educarmos mais para a escola
do que para a vida, de servirmos melhor ao esquema educativo
oficial do que à sociedade como um todo.
Também foi um erro oneroso e repetido em nossos colégios que, ao estabelecer os objetivos da educação, se costume
pedir à escola coisas tão ambiciosas e que não dependem dela,
que o trabalho educativo resulta sempre deficitário diante de
tais pretensões.
Por exemplo, pede-se à educação que atinja objetivos
como:
— Criar identidade nacional.
— Propiciar mobilidade social.
— Melhorar as oportunidades de emprego para seus formandos.
— Formar cidadãos democráticos.
— Estender a cultura universal.
— Aumentar os níveis de aprovação em vestibulares dos
que passam por suas salas de aula.
— Oferecer a capacitação exigida pelo esquema de produção à mão-de-obra que este necessita para gerar
riqueza etc.
Se bem é verdade que a educação é um fato social que
promove, por definição, todos esses resultados, também é certo,
e muitas vezes isso é esquecido, que a escola não é a única
responsável pela realização de todos esses objetivos. Existem
contextos em que a escola difícilmente pode conseguir algo
diferente do que se transmite de maneira informal no sistema
social.
35
É indiscutível, no entanto, que a educação é o ingrediente
sem o qual um processo de desenvolvimento carece da qualidade necessária para construir os sujeitos agentes ativos de
sua própria transformação e a de seu universo social, político
e cultural.
Sem entrar no debate sobre a utilidade da escola e as
funções da educação, propomos como o objetivo externo da
tarefa educativa em nossos colégios: “Promover a formação
das pessoas que constituem a comunidade educativa, para
que possam contribuir ao melhoramento da qualidade de vida
atual e futura de toda a sociedade mediante a transformação
da realidade social em justiça, amor e verdade”.
Melhorar a qualidade de vida de nossos educandos é
contribuir para que cheguem a ser homens e mulheres livres
para o serviço dos outros.
A experiência do contexto
Estratégia da mudança: organizar a transformação dos processos educativos
Também nossas instituições (colégios) são sujeitos do paradigma pedagógico inaciano. Por meio dele poderão entrar no
processo pedagógico e no de conversão e mudança.
O ponto de partida da mudança é o
reconhecimento de que existem problemas
No desenvolvimento de suas atividades, a organização,
como ente social flexível e dinâmico, influenciado pelo meio
interno e externo, vai gestando em seu interior diversas situações
que criam barreiras ao cumprimento dos objetivos, limitam a
realização de certas tarefas, distorcem as metas, ou aparecem
novos desafios e projeções que devem ser assumidas.
36
Para enfrentar tais situações, devem ir sendo criadas as
condições necessárias para um planejamento permanente e
sistemático, que inclui os processos de implementação e avalia­
ção, tanto da organização em seu conjunto como das diferentes
subestruturas e instâncias pedagógicas.
Neste sentido, os centros educativos promovem um processo permanente, sistemático e recorrente de diagnóstico-reflexãoação-avaliação, construindo paulatinamente uma estratégia
de investigação caracterizada por um processo contínuo de
auto-reflexão e auto-ajuda da organização e das estruturas e
instâncias pedagógicas e administrativas.
A partir da perspectiva da pedagogia inaciana, o ponto de
partida do processo é a experiência. Isto, aplicado à situação
institucional, nos leva ao reconhecimento dos problemas. O pior
inimigo de um processo de transformação de nossos colégios é a
autocomplacência. Com freqüência, nossos colégios, no contexto
local e nacional, aparecem entre os melhores, se não for o melhor
da cidade em que se encontra. E, infelizmente, isso acaba sendo
um obstáculo para a procura da mudança e da excelência.
Mas se somos sinceros, e se nos deixamos questionar
pela experiência do que Deus nos pede, não podemos deixar
de reconhecer e enumerar muitos problemas reais de nossos
colégios.
A mudança implica resolver esses problemas e resolvêlos pela raiz; para isso é necessário encontrar suas causas e
com­batê-las. E tanto detectar as causas como combatê-las é
tarefa de todos os que constituem a comunidade educativa.
Por isso, porque se trata de entender as situações de um modo
novo e diferente, e de começar a viver valores novos por todos,
estamos diante de uma nova cultura, diante de uma mudança
cultural.
Não é este o momento de enumerar os problemas que
são comuns a nossos colégios, mas sim de insistir em que cada
37
colégio deve analisar seus próprios problemas e suas causas.
Isso requer informação. Informação sobre si mesmo, sua situa­
ção na sociedade e sua função real. O colégio deve conceber a
si mesmo como gerador de informação e também como usuário dessa mesma informação. Não poucos de nossos colégios
iniciaram frutiferamente seu processo de mudança com um
diagnóstico, ou autodiagnóstico, que recolhia, sistematizava e
compartilhava essa informação.
Mas o principal deste primeiro passo é que se trata dos
problemas de cada colégio em seu contexto peculiar e concreto,
descobertos e reconhecidos pelas pessoas que trabalham neles,
que o constituem, e também pela comunidade a que serve.
A reflexão — a organização dos processos
Embora, no ponto de partida, seja necessária a participação
de todos os que formam a comunidade educativa, é ao entrar
nesta parte do processo que se torna indispensável explicitar
uma questão fundamental: Quem é o sujeito da mudança? Em
outras palavras: Quem são os responsáveis pelo processo de
transformação?
Para responder a essa pergunta, acudimos a um princípio
fundamental da procura da excelência humana: os critérios
para qualificá-la estão centrados na satisfação do beneficiário.
Mas quem são os beneficiários da educação?
Congruentemente com o objetivo externo que assumimos
para nossa tarefa educativa, e resumindo o máximo possível,
os be­ne­ficiários da educação, numa gradação de círculos concêntricos do mais imediato para o mediato, são:
—
—
—
—
38
o aluno de hoje;
esse mesmo aluno, amanhã;
o professor atual;
o professor que o receberá na série seguinte;
—
—
—
—
—
os pais de família;
a pessoa ou empresa que o contrate;
a universidade que o receba como membro;
a comunidade em que o aluno vive;
a sociedade para cuja transformação contribuirá econômica, política e culturalmente.
Desta forma, um processo que procura a excelência educativa integral deve estar orientado para servir de forma cada
vez melhor a seus destinatários.
Para conseguir isso, está demonstrado praticamente que
os resultados de uma organização dependem das pessoas que
trabalham nela. Se quiserem melhorar estes resultados, todos
têm de participar no planejamento e na execução dos processos
que os tornem possíveis.
Outrossim, a verdadeira participação se dá quando existem
comunidades. A comunidade zela pelo objetivo comum, não
pelos objetivos individuais. A comunidade complementa-se,
forma-se e reforça-se.
Suposto este ponto de partida, as comunidades organizadas devem identificar um problema, conhecer suas causas,
projetar soluções, acompanhar sua aplicação prática, avaliar,
evitar que tornem a se apresentar situações que conduzam
ao processo anterior, e procurar novas formas para conseguir
níveis de resultados ainda melhores.
A excelência humana é induzida e gerada pela equipe
docente; contudo, a comunidade educativa não está formada
só de mestres. Dela participam os alunos, os pais de família,
os funcionários, os administradores e a comunidade como
um todo. É necessário incorporar esses membros aos esforços
coletivos para melhorar a qualidade.
39
As condições para a qualidade — o papel do reitor:
a excelência requer liderança
No processo de transformação de nossos colégios, o papel
do reitor é fundamental; ele é um elemento-chave no processo
de procura da excelência. Se não estiver envolvido e comprometido com o propósito de conseguir a excelência, de transformar
o colégio, é muito difícil que este melhore.
Mas o papel do reitor em um processo de busca da qualidade é muito diverso do que usualmente se espera dele ao
nomeá-lo para esse posto no momento atual.
O reitor deve converter-se em um líder que motiva e estimula um processo de melhoramento contínuo. Para ele, as
pessoas devem ser o mais importante. Isto significa que deve
pensar nas necessidades dos beneficiários e, para satisfazêlas, procurar conseguir que o educador, qualquer que seja sua
função no colégio, se sinta orgulhoso de seu trabalho.
O reitor deve se certificar de que o processo de procura
da excelência seja, ao mesmo tempo, um processo de formação
no trabalho e esteja acompanhado dos elementos formativos
indispensáveis para conseguir que possam realizar-se as mudanças propostas. Ele tem, no seu papel de animador, duas
responsabilidades: a de manutenção e a de melhoramento. A
primeira implica estabelecer regras claras e assegurar que se
cumpram. A segunda, à qual deve dedicar pelo menos a metade do seu tempo, implica melhorar os níveis dos resultados
atingidos.
A elaboração de um projeto
O processo de transformação de um colégio para melhorar
a qualidade parte do reconhecimento de um problema, que deve
ser motivo de preocupação para o seu reitor. Esta preocupação
pelo problema deve gerar idéias de como resolvê-lo.
40
Estas idéias devem se concentrar em um plano que oriente
a procura da excelência, o que implica várias condições:
— ser elaborado em equipe;
— começar por estabilizar os processos atuais (no início,
o reitor deve propiciar que a equipe no seu conjunto
reafirme e exprima de forma clara os comportamentos
mínimos esperados dos docentes e demais membros da
comunidade educativa);
— planejar os resultados esperados;
— privilegiar os processos que prevêem o problema;
— diminuir as variações (um dos preceitos importantes da
procura da excelência é reduzir a zero o envio de partes
defeituosas ao departamento seguinte. A solução não
está em identificar as partes defeituosas e fazer com
que voltem ao lugar de origem, mas em evitar produzilas. Na escola, a solução que damos ao atraso escolar é
a repetência, recomeçar: reprovamos o aluno; o custo
disto — econômico, social e afetivo — é enorme);
— minimizar as resistências.
O plano global do colégio tem de ser apoiado por programas mais precisos, que surgem de mecanismos como os
círculos de qualidade, a formação de equipes interdisciplinares:
pequenas equipes de pessoas unidas pela afinidade de áreas
de trabalho e interesses, das quais podem participar alunos e
pais de família.
O passo para a ação
Todo o trabalho que foi descrito até aqui resultaria estéril
sem a ação. Para Sto. Inácio, o amor está nas obras e não nas
palavras. E o paradigma inaciano coloca a ação como o passo
decisivo do processo.
41
Esta ação, como um processo pessoal, recolhe os elementos centrais do paradigma (experiência, intelecção e reflexão
crítica) e os leva até sua plena realização. A práxis assume a
verdade percebida na experiência, formulada como hipótese na
intelecção e verificada no juízo, e a faz realidade de maneira
livre e responsável.
É claro que tanto a pessoa como a instituição podem
abdicar desta responsabilidade e deixar de agir ou agir incongruentemente com a verdade afirmada. Esta é a face obscura
do processo humano de autoconstrução, do desenvolvimento
humano, da história da salvação.
Mas aqui falamos da ação que, na procura do bem humano,
assume a verdade como valor, a conserva, a eleva a realidade
transformada e transformadora, e assim a plenifica.
Em nossa mais legítima tradição, esta práxis é a que consegue instaurare omnia in Christo.
A participação da comunidade
A melhor forma de levar em consideração o destinatário é
fazê-lo participar do processo. Se os pais de família e a comunidade são beneficiários do trabalho do colégio, é importante
conseguir sua maior participação.
Devemos intensificar os vínculos que existem entre o colégio e a comunidade, e entre os docentes e pais de família.
A aula pode ser um excelente ponto de partida para começar a propiciar a participação dos pais. O mestre pode fazêlo levando em consideração a realidade comunitária na aula,
conseguindo que os pais participem na criação de ambientes
mais propícios para a educação e a aprendizagem; dialogando
com as famílias dos alunos; encontrando maneiras de a comunidade se tornar mestra.
42
A experiência tem demonstrado que os esforços por conseguir a maior participação dos pais e da comunidade se traduzem
em melhores níveis de aprendizagem dos alunos.
Ao mesmo tempo que os pais aprendem, os mestres também se enriquecem.
Algumas implicações da ação na procura da qualidade
A primeira implicação é que temos de aprender a criticar e
a fazer sugestões, a nos abrir às críticas dos demais e a intentar
pôr em prática as idéias de outros.
Outra implicação é que nos enriqueceremos mais quanto
mais entendamos que somos diferentes uns dos outros; e respeitemos e aproveitemos essas diferenças.
O consenso é pré-requisito de um movimento para a
excelência: temos de estar todos de acordo, aquilo que nos
propomos fazer é bom e é possível.
Não estamos verdadeiramente agindo para conseguir a
excelência se não nos preocupamos todos os dias, em cada um
de nossos colégios, a partir do trabalho docente, em oferecer
aprendizagens relevantes para nossos alunos. Assim se traduz,
no caso do trabalho em sala de aula, ter como referência nossos
beneficiários.
Tampouco estamos agindo para obter a excelência desejada
se não nos preocupamos, de forma contínua e cotidiana, em
discernir, na experiência de Deus, como estamos promovendo
a justiça na aula. Isto significa dar mais aos que menos têm.
Nossa meta deve ser que nenhum aluno aprenda menos
do que nós colocamos como objetivos. Para isto, devemos crer
em nossos alunos. Eles nos darão razão.
Por último, temos a obrigação de compartilhar nossos sucessos e nossa forma de atingi-los, não só com outros colégios
jesuítas, mas com nossos colegas de outras escolas da cidade
e com as autoridades educativas.
43
Bonum est diffusivum sui!
A avaliação
A avaliação é uma parte constitutiva da ação. Ela tem duas
componentes: o seguimento e a própria avaliação.
Um dos passos mais importantes na procura da excelência
é o seguimento dos processos, o que significa verificar se estes
estão mudando.
O seguimento também deve ser feito em grupo.
Quando já se pode esperar resultados temos de avaliar.
Avaliamos, fundamentalmente, para verificar se nossos processos reformulados funcionam. A avaliação, por si só, não pode
melhorar a qualidade. São os processos aperfeiçoados que a
melhoram.
A excelência é assunto para prestar contas
A história de nossos colégios na maioria dos países da
América Latina, nos últimos 25 anos, nos permite explicar e
ainda justificar muitas de nossas deficiências.
Em alguns países, o mero fato de mantê-los funcionando com
pouco apoio, com a diminuição e o envelhecimento dos jesuítas,
bastaria para explicar o sentimento de abandono que prevalece
em alguns deles, e sublinha o mérito desse trabalho.
Contudo, essa longa crise propiciou também situações
injustificáveis: o isolamento dessas instituições, a falta de continuidade dos projetos, a criação de feudos que não prestam
contas a ninguém.
É necessário, como parte dessa ação transformadora, dar-se conta da necessidade que temos — como sistema educativo
latino-americano jesuíta, como rede de colégios em cada um
44
desses países, como colégio em particular e como educadores
— de prestar contas, a nossos beneficiários da forma como
trabalhamos e dos resultados de nosso trabalho.
Especialmente quando somos convocados a renovar o
serviço que podemos prestar à educação mediante a pedagogia
inaciana, secularmente valiosa para o nosso continente.
Nossa obrigação, conforme o objetivo externo que assumimos, é prestar contas dos resultados do nosso trabalho
a todos os nossos beneficiários: alunos, pais, empregadores,
universidades e à comunidade em geral.
Não devemos esperar que nos peçam contas para prestá-las; temos também de educar nossos beneficiários para que as
peçam, mais ainda, as exijam. A exigência é o motor principal
da excelência.
E para nós, jesuítas, que trabalhamos na educação, prestar
contas é uma conseqüência fundamental do serviço da fé, cuja
exigência natural é a promoção da justiça.
A formação das pessoas
responsáveis pela mudança
Introdução
As instituições estão constituídas por pessoas. Nosso compromisso de transformar os colégios de acordo com o fim apostólico
da Companhia não será operativo se não dedicarmos o melhor de
nosso esforço à tarefa de formar colaboradores no estilo inaciano,
entendido como “um modo comum” de agir fundado numa experiência profunda, que é a dos Exercícios Espirituais.
Esta proposta não só se inspira nos Exercícios Espirituais,
como também pretende ser uma expressão contemporânea e
adaptada à nossa cultura das operações e normas metodoló45
gicas que conduzem à experiência fundamental dos Exercícios
propostos por Inácio; e pode oferecer uma resposta válida ao
desafio que formula o Padre Geral na sua alocução em Villa
Cavalleti, em 29 de abril de 1993:
“Desvincular a experiência espiritual específica de Inácio
de Loyola dos desafios culturais, sociais e religiosos da Europa
do Renascimento e da Reforma, para encarná-la no humanismo
social que cor­responde aos desafios de nossos tempos.
Esta proposta de formação não substitui nem elimina a
necessária capacitação profissional, nossa e de nossos colaboradores, em todas as modernas ciências da educação: ao
contrário, a supõe e a integra.”
Trata-se mais de uma metodologia que pode ser incorporada ao trabalho educativo ordinário, que pode estar presente
no cotidiano da comunidade educativa, inspirar a partir da
base a formulação de critérios e metas na busca da excelência
educativa em nossas instituições, a partir da formação de seus
recursos humanos.
Os cinco passos do estilo inaciano na formação (transformação) de um educador livre
Preparar-se e dispor-se
A tarefa educativa é exigente. Requer o cumprimento de
condições materiais e externas, como tempo, dedicação pes­
soal, paciência diante dos fracassos ou limitações. E isso não
só para quem começa, mas para quem, ano a ano, defronta
com um “voltar a começar”.
O educador deve enfrentar cotidianamente a necessidade
de preparar-se, de descobrir suas próprias ignorâncias, suas
noções obsoletas, de enfrentar a si mesmo. E diante de tudo
isso, o ativismo nos envolve, o servilismo ao dinheiro evita
pagar o preço devido para procurar sensatamente as raízes
46
transcendentes do homem. Não é fácil para o educador aceitarse como educando.
Além disso, o educador deve aceitar incondicionalmente
os outros — alunos e colegas no ensino —, deve preparar-se e
dispor-se para compreender idéias, sentimentos e motivações
deles e para estabelecer autêntico diálogo com todos.
Para o educador cristão, essa aceitação se torna ainda mais
incondicional, porque na fé se sabe que Deus ama aos homens
não por serem bons ou por méritos próprios, mas simplesmente
porque são homens.
A aceitação dos outros não consiste em ignorar seus defeitos ou fingir não vê-los, ou tratar de justificá-los. Quando se
negam os defeitos de uma pessoa, então propriamente não se
aceita essa pessoa.
Confrontar-se e libertar-se...
A história humana, desde suas origens, está penetrada do
bem e do mal, da verdade e da mentira, da luz e das trevas.
No homem existe uma luta irreconciliável entre a tendência
para a vida e a tendência para a morte, entre a autenticidade
e a inautenticidade, em termos modernos.
Santo Inácio distinguiu com genial clareza duas formas
diferentes e inconciliáveis de atrair o homem: o bem e o mal. A
esta distinção denominou “discernimento espiritual”. As regras
que deixou escritas sobre esta matéria nos Exercícios Espiri­tuais
representam uma genial contribuição às ciências modernas da
introspecção.
Representações cotidianas do drama que isto gera são: a
inibição e a repressão pessoal, os desvios na procura da verdade,
o egoísmo ameaçador diante de qualquer ordem social concreta,
a decadência de comunidades, sociedades, civilizações, o fechamento das pessoas, os preconceitos de classe. Tudo isto, na
47
América Latina, se apresenta como marginalização extrema para
muitos destituídos do ter, do poder, do saber; como exploração
generalizada; como sistemas socioeconômicos profundamente
injustos; como estruturas de pecado.
Esse drama leva facilmente à dúvida, à incredulidade e
ao desespero. A isso se acrescenta um ateísmo não confesso
abertamente. Ao negar toda possibilidade de encontro direto
com Deus, se destrói a esperança na eficácia do bem — por
ser bem — sobre o mal. Chega-se a crer que o mal é vencido
com o mal.
O cristianismo não pode viver no desespero, ele acredita que
a mensagem de Salvação liberta. A libertação se conquista em
meio a uma luta constante contra o mal. As bem-aventuranças
recobram seu poder real na prática da vida cotidiana. Devemos
aprender a viver na luta irredutível entre o bem e o mal.
Nesse confronto, temos de fazer um inventário autocrítico
não só dos recursos materiais como também das forças espirituais. A experiência imediata da injustiça e do pecado nos levará,
por um caminho de autenticidade, a descobrir mais e mais a
justiça e o amor, até termos uma experiência de plenitude que
nos liberte definitivamente.
para ter e assumir uma experiência profunda e transcendente
(no encontro com Deus ou na procura da verdade e da justiça)
A prática no caminho do bem, da verdade, da justiça não
pode perdurar por longo tempo em meio ao conflito e à dificuldade. Somente podemos suportar a carga se chegamos a ter
uma grande experiência da força de Deus e desses ideais.
Só a aceitação incondicional dos outros, especialmente do
pobre por ser pobre, e o amor por eles conduzem a experiências
autênticas de justiça e verdade.
48
Cedo ou tarde, Deus se manifesta a quem o procura na oração ou na ação. Quase sempre essa experiência se apresenta de
repente, inesperadamente. Sem saber como, a pessoa, confiando
em Deus, aceita finalmente o que lhe parecia inconciliá­vel: o
sentido da dor, da culpa e da morte, de uma parte e da outra,
a experiência de um Deus que nos supera.
Na experiência transcendente é estabelecida uma relação
imediata de comunhão com Deus. Desse contato, o homem sai
fortalecido e plenamente libertado. Supera toda ideologia, toda
dificuldade, toda dor, toda culpa e, em último termo, a morte.
Desse amor incondicional, sentido no fundo da existência,
brota um conhecimento novo e criador que descobre e desfruta
cada vez mais a vida, que permite ser mais profundo e real,
mais crítico e objetivo.
Brota também uma resposta cada vez mais generosa e
incondicional a Deus.
O homem dos Exercícios Espirituais é totalmente livre dian­
te de tudo o que não seja o próprio Deus. Sua independência
o mantém livre diante do dinheiro, do poder, do prestígio, da
competência, do orgulho. Só o amor lhe é suficiente.
Pela qual se descobrem as orientações fundamentais que
orientam e organizam a vida...
Para o educador que não professa a fé em Jesus Cristo, mas
que teve uma experiência transcendente, o amor supremo é o
do semelhante, ao qual chega pelo reconhecimento concreto
dos outros.
Esse amor o guia, revela novos conhecimentos e tinerários. O itinerário de vida fica marcado pela aceitação amorosa
49
e incondicional dos outros e se abre a um futuro totalmente
novo. O homem livre começa a não dispor mais de si mesmo,
mas a servir aos outros.
Deus, ao se dar imediatamente aos homens, assinaloulhes suas preferências. O cristão, ao assumir esta experiência,
está disposto a abandonar seus próprios planos para seguir os
de Deus.
A lei da Encarnação cumpre-se no cristão pelo seguimento de Jesus: Deus não vem de cima impondo seus planos. O
Verbo torna-se carne para obedecer aqui embaixo a vontade
de seu Pai.
O mesmo seguimento de Jesus se faz diferente em cada
cristão.
Para o educador cristão, o amor pelos pobres e a sede de
justiça são divinos. O critério para compartir e comungar com
os pobres não é propriamente a solidariedade humana, mas o
agápe de Deus que se apodera de nossa capacidade de amar.
Não se ama a Deus a não ser amando o irmão, mas o
homem não ama verdadeiramente seu irmão a não ser que o
ame com o amor Daquele que nos amou primeiro.
Assim entendemos a opção preferencial pelos oprimidos.
para o bem de todos (fazendo a história da Salvação)
As orientações fundamentais são canais pelos quais transita
a pessoa livre. Mas são as ações, a práxis, que ope­racionalizam
tais orientações, que transformam nossa liberdade potencial
em liberdade efetiva.
Numa autêntica vocação de educador, a verdade, a justiça, o bem vão se apoderando de todo o homem em todos os
50
domínios de sua atividade. O educador está imerso em seu
mundo e nesse subsolo se fixa para produzir frutos.
O homem dos Exercícios Espirituais termina fazendo uma
petição final: reconhecer tanto bem recebido para poder em
tudo amar e servir a Deus; e assim o Senhor se vai apoderando
do homem dos Exercícios até invadi-lo em todo seu espaço e
enchê-lo de transparência. Deus entra em todo o homem e em
todo seu horizonte.
O encontro com Deus não se dá somente na contemplação
retirada, mas também no coração do mundo, em toda vinculação e ação do homem com seu mundo.
O homem dos Exercícios se entrega ao amor e ao Serviço
em tudo. Esta é a conclusão, se assim se pode chamá-la, dos
Exercícios na Contemplação para Alcançar o Amor; e é, ao mesmo tempo, o fim último da educação inaciana: a formação de
homens e mulheres para os outros, pessoas altamente qualificadas, plenamente conscientes e amorosamente comprometidas
com o bem de todos.
51
52
Anexo 1
Notas
ao
paradigma inaciano
1. A partir da perspectiva
do carisma inaciano
O pressuposto fundamental de Inácio, a convicção central
de toda sua vida e de seu projeto apostólico é que Deus age
diretamente em sua criatura, na pessoa; e que, por conseguinte, o ser humano é capaz de experimentar diretamente em si
mesmo a ação de Deus (cf. Rahner, K., Palavras de Inácio de
Loyola a um jesuíta de hoje, e a Anotação 15 dos E). A partir
desta convicção, os Exercícios são um instrumento para propiciar, facilitar, conduzir esse encontro da pessoa com Deus
(cf. ibid.).
A educação, para Inácio, é um instrumento apostólico na
medida em que sirva para que o homem se liberte e se entregue
à ação do Espírito. Não no sentido de instrumento de manipulação com o qual se submete os educandos a determinado
projeto de dominação.
A experiência de Deus, do “Deus sempre maior”, é o que
dá origem ao magis como característica da espiritualidade e,
por conseguinte, da educação inaciana. Magis como a qualidade da resposta do homem livre a um Deus que se revela
progressivamente como aquele que nos amou primeiro e a nós
53
se entrega cada vez mais. Não como critério de competência
nem de exaltação pessoal entre companheiros.
Finalmente, a imitação, o seguimento de Cristo neste processo educativo, é vista como o processo de libertação do mesmo
Jesus, enquanto homem, e de seu autêntico desenvolvimento
humano (cf. Características, nn. 21, 37, 38, 39).
2. Fé, justiça e discernimento
no paradigma inaciano
Todo esquema incorre no risco de, ao simplificar excessivamente a realidade e apresentá-la de maneira estática,
distorcê--la e privá-la de sua riqueza existencial.
Contudo, tem a vantagem de ajudar-nos a entender essa
mesma realidade, de colocar-nos no caminho de sua apropriação
e, inclusive, de seu dinamismo intrínseco.
Com este propósito, são oferecidas as reflexões seguintes
sobre a situação e o papel que tem o paradigma na redefinição
do próprio fim que propõe a Companhia de Jesus a partir da
32ª Congregação Geral: o serviço da fé e a promoção da justiça
que esta fé implica.
A fé, antes de ser expressa em conteúdos, verdades afir­
máveis e afirmadas, se apresenta como um impulso na pessoa.
Esse dinamismo irrompe a partir da experiência religiosa fundamental: sentir internamente que somos amados por Deus.
Esta é a graça, o presente de Deus a todo ser humano.
Dessa experiência, dessa forma inicial de se apaixonar, resulta
determinada maneira de ver, de contemplar o mundo, da maneira
de Deus: “e Deus viu que tudo era bom”. Ou como o exprime o
princípio e fundamento: “e todas as outras coisas sobre a face da
terra para ajudá-lo a conseguir seu fim último”.
A justiça, como conseqüência da fé, entendida assim, é a
vontade de transformar a realidade para que realmente seja o
54
que Deus quer: para restituir a cada pessoa e a cada coisa o que
é propriamente seu, sua função salvífica, sua condição de ser
meio adequado para atingir o último fim para que o homem
viva e viva em plenitude; vistas assim as coisas, entende-se por
que a justiça é o mínimo de caridade que pode ser exigido nas
relações entre pessoas: menos do que isso é pecado. Mas acima
da justiça existe muito ainda por construir.
Assim também adquire sua justa dimensão a forma como Inácio entende o amor: está mais nas obras do que nas palavras.
Pois bem, o nexo entre a fé (experiência de Deus que ama)
e a justiça (minha resposta à pergunta diante do crucificado:
“que devo fazer por Cristo?”) passa por uma mediação que nas
palavras de Inácio é o discernimento espiritual. É o trabalho
da pessoa que quer viver no Espírito: o esforço permanente de
vasculhar nas suas moções (movimentos dos espíritos) o que
Deus quer dele. É uma tarefa de reflexão na fé para escolher a
ação que mais conduz à justiça e à implementação do Reino.
Assim, pois, sem querer reduzir indevidamente o dinamismo
desses termos, podemos afirmar que, no paradigma inaciano, o
lugar privilegiado da fé é a experiência; o da justiça é por excelência
a ação; e o lugar próprio do discernimento é a reflexão.
3. A partir da
antropologia filosófica
Entendemos por antropologia filosófica a reflexão séria
e sistemática, conforme o método transcendental, sobre tudo
aquilo que está implícito ao se falar de pessoa humana, de ser
humano, como estruturas constitutivas de seu agir enquanto
homem. E, uma vez que na perspectiva inaciana o foco de
atenção é o Homem Cristo Jesus, a quem pedimos em cada
meditação “conhecimento interno... para que mais o amemos
e sigamos” (EE 104), a antropologia a que nos referimos aqui
é uma antropologia filosófica cristã.
55
— A partir dessa antropologia, o constitutivo último da
pessoa é sua consciência entendida como presença do
sujeito a si mesmo mediante suas operações.
— Esta consciência não é ainda conhecimento nem se
identifica com o conhecer; o precede e é mais ampla
do que as operações cognitivas.
— Precisamente enquanto a consciência experiencial nos
permite esse contato direto com Deus a que Santo Inácio
chama moções e que se dá em nós sem que tenhamos
um conceito de Deus.
Em conformidade com essa antropologia, a formulação
tradicional da filosofia aristotélico-tomista do ser humano como
animal racional se substitui por uma nova maneira, dinâmica,
sistemática e existencial, de entender o homem. O ser humano está constituído por um conjunto dinâmico de operações
intencionais e conscientes estruturadas em quatro níveis: o da
expe­riência, o da intelecção, o do juízo e o da decisão, interrelacionados e recorrentes que produzem resultados cumulativos
e progressivos. Esta concepção nos permite explicar e delimitar
tecnicamente os elementos centrais do paradigma inaciano.
A partir da antropologia filosófica cristã fundamental,
podemos sustentar no seu significado próprio e no seu sentido
de transcendência plena a finalidade da educação inaciana. Em
paralelo com a formulação do propósito fundamental, do fim
dos exercícios: “Exercícios espirituais para vencer a si mesmo
e ordenar sua vida sem determinar-se por afeição alguma que
seja desordenada” (cf. EE n. 21).
Expressamos a finalidade última da educação inaciana na
sua máxima simplicidade: a educação inaciana procura libertar
a pessoa de todo atrelamento (ao ter, ao poder, ao saber, à honra
etc.) que limite seu ser autêntico-no-mundo, para que possa exprimir no Espírito sua própria palavra única e irrepetível como
projeto pessoal para o serviço dos demais.
Com palavras de Pedro Arrupe: “Formar homens e mulheres para os outros”.
56
Cartilha
do PPI
57
58
Apresentação da
Cartilha do PPI
“…vamos perdendo a fé na idéia ingênua de que toda a
educação, prescindindo da sua qualidade, empenho ou finalidade, conduz à virtude.
…se nossa educação aspira exercer influência ética na sociedade, devemos conseguir que … se desenvolva tanto no plano
moral como intelectual” (PPI, nn. 14 e 138). — Pe. Peter--Hans
Kolvenbach, SJ, em Villa Cavalletti (Roma, abril de 1993).
O Pe. Geral mostrava em sua carta de promulgação do
documento:
• a renovação prática eficaz deve visar à comunidade
educativa, especialmente aos professores;
• para serem eficientes, os professores precisariam familia­
rizar-se com os métodos pedagógicos que animam o
projeto de pedagogia inaciana;
• o que mais importa, porém, não é o número de leitores
a atingir, mas o grau de renovação que a leitura inspire
no processo de ensino e aprendizagem na sala de aula;
• …o mais firme apoio… para capacitarem os nossos professores na aplicação do paradigma pedagógico inaciano;
• …elaborar material suplementar para aplicação do presente documento;
59
• a redação final e definitiva será a que se efetuar quando
sua mensagem houver logrado interessar e inspirar nossos
professores e alunos.
Por isso, a equipe do CPPA elaborou esta Cartilha do PPI que:
Pretende ser um guia prático para:
• o professor poder preparar mais facilmente aulas, exercícios e avaliações para os alunos.
• o educador poder preparar as atividades e dinâmicas
com os alunos.
Supõe:
• a assimilação de “Características da Educação Jesuíta” e
do próprio PPI.
• o esforço de todos para buscarem novos métodos pedagógicos.
• uma futura versão, enriquecida com a experiência de
todos.
É apresentada seguindo o documento “Pedagogia inaciana.
Uma proposta prática”.
Rio de Janeiro, junho de 1995
Equipe
do
Centro Pedagógico Pedro Arrupe
Contextualização (PPI nn. 33 a 41)
O que se entende por “contextualização” do ensino e da
aprendizagem?
É a consideração dos diversos fatores que influem no
processo de ensino e aprendizagem:
• Conhecer o(s) aluno(s) quanto à(ao):
• pessoa: temperamento, caráter, gostos, dificuldades
60
•
•
•
•
vida, saúde…
família
ambiente: casa, bairro, nível socioeconômico
história educativa: colégios, notas, inclinações, tendências
• formação e vivência religiosa
• relacionamento com os outros, amizades…
• Conhecer a relação do(s) aluno(s) com o tema do estudo:
• conhecimento prévio que ele tem sobre o tema da programação
• aptidões e disposições do aluno para trabalhar o tema
• Situar a programação da disciplina de acordo com a:
• programação acadêmica da série
• programação vertical da disciplina entre as diversas séries
• programação comunitária e pastoral da série
• programação mais ampla do colégio
• os temas principais ou mais urgentes do debate local,
nacional e internacional
• Conhecer o clima educativo do colégio: normas, comportamentos etc.
• Conhecer a si mesmo ante:
• sua própria situação de vida e do educador
• os alunos, o processo educativo, o clima escolar, o contexto socioeconômico
Por que a “contextualização” é importante para o ensino e a
aprendizagem?
Porque:
• a experiência humana nunca se produz no vazio mas
num contexto concreto
• permite ao educador elaborar uma programação e instrumentos de trabalho mais adequados ao tipo de aluno que
lhe toca acompanhar e não a um aluno qualquer, ideal
61
O que não é a “contextualização” no sentido da pedagogia
inaciana?
A consideração isolada de um dos aspectos acima descritos,
esquecendo-se do seu conjunto.
Como se consegue a contextualização?
Da vida do aluno, por meio de:
• contato direto com o próprio aluno e sua família
• dossiê do aluno e do histórico escolar
• entrevistas ou reuniões com coordenador de série, ori­
en­tador educacional, agentes de pastoral e outros acompanhantes mais próximos
• atas dos conselhos de classe
Da juventude, por meio de:
• estudo das características psicoevolutivas da criança e
do adolescente
• conhecimento do mundo e das preferências dos jovens:
modas, rituais, roupas, músicas, poemas, literaturas,
ídolos, linguagem etc.
• contato espontâneo com os alunos nas entradas, saídas
e recreios
Do colégio, por meio de conhecimento de:
• Plano Diretor, programação e calendário do colégio
• orientações das diversas diretorias e coordenações
• comunicados e informativos
Da série, por meio de conhecimento e acompanhamento de:
• reuniões de equipes de série e de conselhos de classe
• programação acadêmica, religiosa e comunitária da série
• programação vertical da respectiva disciplina
• ambiente e relacionamento geral de alunos, famílias e
educadores
Da realidade ambiental, por meio do acompanhamento de:
• meios de comunicação falada, escrita e televisiva
62
Experiência (PPI nn. 42-46)
O que se entende por “experiência” no ensino
e aprendizagem?
É
• “saborear as coisas internamente”, como dizia Santo
Inácio
• o contato — direto ou mediato — do aluno com o objeto do conhecimento a ser descoberto ou construído
envolvendo todo o seu ser por meio de
•seus sentidos
•imaginação
•sentimentos
•vontade
Por que a “experiência” é importante para o ensino
e a aprendizagem?
Porque:
• é o desenvolvimento do aluno como construtor ou protagonista, e não mero ouvinte, do seu conhecimento
• sem ela o aluno não chega à ação comprometida, objetivo
final da educação inaciana
O que não é a “experiência” no sentido da pedagogia inaciana?
Não é:
• uma abordagem apenas intelectual do assunto de estudo
• levar o aluno apenas à atividade ou ao manuseio de
material didático no estudo
• uma etapa separável da etapa de “reflexão”
Como levar o aluno à “experiência” na aprendizagem?
no campo do entendimento:
• questionamento e debates com a classe para aguçar sua
curiosidade e motivá-la para trabalhar sobre o tema da
63
aprendizagem, objeto do conhecimento a ser descoberto
ou construído
• perguntas que levem os alunos a dar-se conta do que já
conhecem a respeito, confrontando com o que estudaram
previamente
• guias, fichas, roteiros, recursos audiovisuais etc. que
levem à pesquisa de conceitos, fatos, leis, personagens,
circunstâncias acerca do tema da aprendizagem
no campo dos sentimentos:
• levar o aluno a recolher e recordar os dados da própria
existência e a selecionar o que será relevante para o
objeto do conhecimento a ser procurado
• favorecer a experiência ou manipulação direta de fenômenos ou situações referentes ao tema da aprendizagem
• roteiro de perguntas e tempo de silêncio que propiciem
ao aluno “cair na conta” (identificar) de suas reações
afetivas ao tema de aprendizagem
• tempo de partilha entre os alunos sobre suas reações
afetivas
no campo da imaginação:
• simulação ou dramatização das situações
• exercícios diversos de:
•criatividade
•projeção de situações
•comunicação não verbal
•em laboratórios
Reflexão (PPI nn. 47-58)
O que se entende por “reflexão” no ensino e na
aprendizagem?
• É o empenho do aluno em indagar o significado, a importância e as implicações do que está trabalhando e
experimentando no tema de aprendizagem
64
Por que a “reflexão” é importante para o ensino
e a aprendizagem?
Porque permite ao aluno:
• consolidar e tornar próprio o trabalho realizado sobre o
tema de aprendizagem
• construir as crenças, os valores, as atitudes e as maneiras
de pensar, capacitando-o para a ação
• buscar significado do que aprendeu para a vida
Como levar o aluno à “reflexão” na aprendizagem?
Levando o aluno, com toda a liberdade, a:
• desenvolver a imaginação e a exercitar a vontade
• formular diversas perguntas (o quê, como, quando, por
quê etc.) sobrê o assunto em estudo
• decifrar suas reações (interesse, apatia, contentamento perplexidade, temor etc.) diante do tema da aprendizagem
• perguntar-se sobre as implicações, influências ou conseqüências do tema sobre ele mesmo e sobre a sociedade,
especialmente os pobres
O que não é a “reflexão” no sentido da pedagogia inaciana?
Não é:
• um mero exercício de interpretação do texto
• a elaboração “intuitiva” de juízo, sem conhecimento ou
estudo prévio
• separável das experiências intelectuais, afetivas e das
intuições
• a manipulação ou a doutrinação do professor querendo
impor aos alunos o seu ponto de vista
Quando o aluno faz a “reflexão” no processo
de aprendizagem?
Quando o aluno:
• vê com maior clareza a verdade que está estudando
• descobre as causas dos sentimentos ou reações que
experimenta
65
• penetra mais a fundo nas implicações do que estudou
• logra convicções pessoais sobre fatos, opiniões, verdades e compreende quem é e como deve ser em relação aos demais
Recursos e subsídios para despertar a “reflexão” do aluno
• perguntas, roteiros, guias, fichas do professor
• intercâmbio das reflexões individuais da classe
• debates, dramatizações, estudos de casos etc.
Ação (PPI nn. 59-62)
O que se entende por “ação” no ensino e na aprendizagem?
É a modificação que o aluno incorpora à sua pessoa, em
qualquer das dimensões de sua vida, e se dispõe a oferecer à
sociedade, a partir do tema trabalhado na aprendizagem.
Por que a “ação” é importante para o ensino
e a aprendizagem?
Porque:
• a prova mais contundente do amor é o que se faz, não
o que se diz
• a pedagogia inaciana visa formar homens e mulheres
de decisão, de ação, de compromisso, de atitudes e não
apenas de intelecção e de experiência
• a aprendizagem manifesta-se necessariamente na vida
do aluno
• a aprendizagem não pode ser um mero “passeio” sobre
o objeto do conhecimento
Como levar o aluno à “ação” na aprendizagem?
• possibilitando que o aluno elabore suas próprias conclusões daquilo que experimentou ou sobre o que refletiu
• confrontando sua realidade pessoal e social com o aprendido
66
• projetando novos “modelos” para as situações de aprendizagem
• perguntando ao aluno sobre:
• os valores, convicções e atitudes que o tema aprendido
assumirá ou rejeitará em sua vida
• o compromisso concreto que assumirá como serviço à
sociedade: casa, vizinhança, familiares, escola, igreja,
clube etc.
O que não é a “ação” no sentido da pedagogia inaciana?
Não é apenas:
• o crescimento pessoal do aluno
• a sua atitude de serviço aos outros
Mas
• o seu aprimoramento intelectual
• e o crescimento nas demais dimensões
Avaliação (PPI nn. 63-67)
O que se entende por “avaliação” no ensino
e na aprendizagem?
• É a tomada de consciência dos educadores e dos alunos
do progresso que estes realizam na aquisição de conhecimentos
• É uma avaliação: integral (de conhecimentos e atitudes)
mais diagnóstica que classificatória
Por que a “avaliação” é importante para o ensino
e a aprendizagem?
Porque:
• a pedagogia inaciana não quer propiciar a memorização
ou assimilação dos conhecimentos, mas quer formar
homens e mulheres de serviço aos demais
• permite detectar o estágio e o ritmo do aluno na busca
dos objetivos propostos para a aprendizagem
67
• permite reforçar ou corrigir os instrumentos de trabalho
utilizados
• unifica a dimensão acadêmica e todas as outras do processo formativo
• favorece a compreensão do acadêmico como experiência
de aprendizagem e não mera prestação de provas ou
exames
Como levar o aluno à “avaliação” na aprendizagem?
Tendo em conta a programação estabelecida, por meio de:
• contatos diários com os alunos sobre seu processo de
aprendizagem
• ficha, dossiê ou diário elaborado pelo aluno
• auto-avaliação (escrita ou oral) do aluno
• verificações (argüições, exercícios, provas), previstas ou
não, semanais ou mensais
• partilha em grupos ou com toda a classe
• reuniões dos educadores (ex.: conselhos de classe)
• tomadas de consciência pessoais e comunitárias
• instrumentos de auto e heterocontrole
O que não é “avaliação” no sentido da pedagogia inaciana?
Não é:
• um momento terminal do processo de aprendizagem
• para medir apenas a assimilação dos conteúdos, deixando
de lado as atitudes e o crescimento integral do aluno
• um tribunal de cobrança, de prestação de contas nem
de mero juízo do trabalho realizado pelo aluno
Vantagens do paradigma
pedagógico inaciano (PPI)
Quais as vantagens do PPI?
Vantagens para o aluno, que:
68
• se torna mais pessoal, ativo e crítico no processo de
ensino
• é valorizado no seu estilo, ritmo e preferência de aprendizagem
• relacionar com mais facilidade as matérias que estuda
• consegue maior plenitude e riqueza pessoal ao discernir
sobre suas experiências antes de passar à ação
• se acostuma a não estudar apenas para as provas
• descobre o prazer de estudar de modo habitual
• é estimulado a permanecer aberto ao crescimento para
a vida toda
• cresce na dimensão social, respeitando o outro e conhecendo a realidade ambiental
• tem maior possibilidade de “ser para os outros”
Vantagens para o professor, porque o PPI
• é um modelo prático para enriquecer a estrutura e o
conteúdo do curso
• sugere uma variedade de caminhos para o trabalho pessoal e coletivo
• permite conhecer o ritmo e o desempenho pessoal de
cada aluno
• facilita a condição ou o manejo da classe
• enriquece o professor no seu trabalho educativo
Vantagens para o colégio, porque:
• ultrapassando o aspecto meramente teórico do processo educacional, pode propiciar mudanças no modo de
pensar e agir dos alunos
• a inter-relação das cinco etapas situa-se no coração da
pedagogia e da espiritualidade inacianas
• assegura a inter-relação do professor, aluno e matéria
• atende aos ideais de formação de modo prático e sistemático
• conserva a tradicional inspiração pedagógica inaciana
permitindo incorporar as metodologias atuais
69
Aplicabilidade do paradigma
pedagógico inaciano
É fácil aplicar o PPI?
O PPI pode:
• ser utilizado por qualquer professor, em disciplinas —
teóricas e práticas — de qualquer série do colégio
• ser usado também em atividades extraclasse, esportes,
programas de serviço social, convivências e outros
• ter suas etapas realizadas pelos alunos individualmente
ou em grupo
• começar a ser aplicado logo que os educadores se exercitem nas novas técnicas de ensino
• ter meios e instrumentos típicos para cada etapa ou
comuns a várias delas
O PPI não:
• exige o aumento de disciplinas ou da carga horária do
currículo
• pode ter sempre suas cinco etapas aplicadas numa ú­nica
aula
Relação educador — aluno
Por que o PPI valoriza tanto a relação entre
o professor e o aluno?
Porque:
• é condição sine qua non para uma educação de valores
• os professores estão mais próximo dos alunos e podem
influenciar mais pelo seu exemplo que pela sua competência e talento oratório
Qual deve ser a atitude do professor na pedagogia inaciana?
A atitude do professor deve ser:
70
• de atenção pessoal, apreço, respeito, serviço e de verdadeiro companheiro de aprendizagem
• não de informar
• mas criar condições para ajudar o aluno a progredir rumo
à verdade
Ficha do PPI
Por que foi elaborado o PPI?
Porque:
• o modelo educativo vigente tem sido deficiente como
modelo de ensino da Companhia de Jesus, enquanto é:
•mera transmissão de conhecimentos do professor para
o aluno
•composto de apenas duas fases: experiência e ação
•resultante mais da atividade do professor que do aluno
•insistente na capacidade de memorização do aluno
• a educação hoje oculta os valores humanistas, enquanto
é considerada:
•de modo muito utilitário
•com interesses egoístas
•com ênfase no êxito econômico
O que inclui o PPI?
Inclui
• o próprio documento “Paradigma inaciano. Uma proposta
prática”
• um programa de preparação dos educadores em nível
local e regional
Quem elaborou o PPI?
O Conselho Internacional de Educação Jesuíta, composto por:
• Secretário de Educação da Companhia de Jesus
• e seis jesuítas representando todas as partes do mundo
71
Como foi elaborado o PPI?
• O Conselho fez sete rascunhos, que foram enriquecidos
por sugestões de educadores jesuítas representando todas
as partes do mundo
Como foi promulgado o PPI?
• Pelo Superior Geral dos Jesuítas em 31 de julho de 1993
• Após um treinamento de 40 educadores de 26 países, durante 10 dias em Roma, com uma equipe de especialistas
O que é, afinal, o PPI?
• é uma ampliação e concretização da 10ª parte de “Características”
• é apenas parte de um projeto integral de renovação
pedagógica
• trata de alguns aspectos da pedagogia jesuíta referentes
ao ensino e à aprendizagem
Para que servirá o PPI?
O PPI servirá para:
• aplicar uma pedagogia para o serviço da fé e a promoção
da justiça, fundamento do humanismo cristão social,
núcleo da tarefa educativa jesuíta hoje
• ajudar a concretizar os princípios das “Características da
Educação Jesuíta”
•
ajudar os professores a desenvolver um trabalho:
•solidamente acadêmico
•formador de “homens para os outros”
•que trate dos valores inacianos no próprio currículo
escolar
Quem poderá utilizar o PPI?
72
• os estabelecimentos educativos jesuítas: escolas, colégios­ e universidades
• outros processos educativos que se inspiram na espi­
ritualidade de Santo Inácio de Loyola
Quais as objeções à aplicação do PPI?
As objeções decorrem de:
•
•
visão restrita de educação como unicamente:
•transmissão de cultura acumulada pela humanidade
•preparação para o trabalho
busca de soluções simples para os complexos problemas
atuais
• insegurança em face das instituições humanas essenciais
• exigências das administrações públicas às escolas
Traços típicos da pedagogia inaciana
De onde provém a pedagogia inaciana?
• É uma pedagogia inspirada na espiritualidade de Santo
Inácio de Loyola, especialmente no seu livro Exercícios
Espirituais
O que são os Exercícios Espirituais?
• a experiência de conversão profunda a Deus pela mudança de mentalidade e de vida que Santo Inácio realizou
• não são objeto de especulação intelectual ou de mera
devoção
• mas um manual bem estruturado para ajudar outros
cristãos — não exclusivamente padres ou religiosos — a
fazer o mesmo roteiro
Para que são os Exercícios Espirituais?
• Para ajudar as pessoas a se colocar numa situação tal
que possam buscar, discernir (= esclarecer as motivações
internas) e encontrar a vontade de Deus na ordenação da
73
própria vida e no serviço aos outros, e assim se realizar
plenamente como tais.
Qual a metodologia dos Exercícios?
O manual dos Exercícios propõe:
• pistas para a oração pessoal que comprometem o corpo,
a mente, o coração e a alma da pessoa, tais como:
•temas de meditação
•realidades para a contemplação
•cenas para a imaginação
•sentimentos para avaliar
•possibilidades a serem exploradas
•alternativas a ponderar diante de Deus
Quais os atores dos Exercícios?
A pessoa:
• considera na oração o conjunto da sua experiência pessoal
• reflete sobre essa experiência
• confronta-a com um orientador espiritual para evitar
ilusões
• elege os meios que favorecerão seu desenvolvimento
pleno como pessoa
O orientador:
• seleciona e adapta os exercícios que melhor ajudem o
exercitante
• ouve, encoraja, previne o exercitante
Quais os temas dos Exercícios Espirituais?
Os temas são o conjunto da experiência de vida da pessoa
considerada em oração e discernimento à luz da História da
Salvação, ou seja:
74
• a criação do mundo e o chamado dirigido por Deus a
cada pessoa
• a recusa das pessoas aos apelos de Deus
• a revelação de Deus na Encarnação de Jesus Cristo
• a história de Jesus como modelo de vida humana, sua
paixão, morte e ressurreição
Qual a dinâmica dos Exercícios?
A dinâmica vital é o encontro da pessoa com o Exercício
da Verdade.
A pessoa:
• considera na oração o conjunto da sua experiência pessoal
• reflete sobre essa experiência
• confronta essa caminhada com um orientador, para evitar
ilusões
• elege os modos que favorecerão o seu desenvolvimento
pleno como pessoa
O orientador seleciona e adapta os exercícios que melhor
ajudem o exercitante.
Então, o que não é a pedagogia inaciana?
A pedagogia inaciana
• não pode ser:
•mera metodologia
•um programa de doutrinação que abafe o espírito
•curso teórico especulativo, alheio à realidade
•não pretende apenas:
•acumular quantidades de informação
•preparar os alunos para uma profissão
O que pretende a pedagogia inaciana?
Pretende
• incluir a visão de pessoa e de mundo segundo as “Características”
75
•
•
76
formar
•o desenvolvimento integral da pessoa para a ação
•homens e mulheres para os outros
•líderes no serviço e imitação de Jesus Cristo
•pessoas competentes, conscientes e comprometidas na
compaixão
levar os alunos a
•respeitar a liberdade para as pessoas criarem uma vida
diferente
•partilhar o que são, mais do que o que têm
•perceber que sua maior riqueza é a compreensão dos
outros
•transformar o modo de verem a si mesmos, os outros,
as estruturas sociais
•mudar radicalmente o modo de pensar, agir e entender
a vida
•à excelência, que integra o lado acadêmico e os demais
aspectos
•ter Jesus Cristo como modelo de vida humana mesmo
para os sem fé
•promover, por isso, a educação na fé e na justiça
O Professor do
Colégio
Jesuíta como
educador
da fé
77
78
O
professor do
colégio jesuíta como
educador da fé
1. Introdução, Histórico e
finalidade do documento
1. Com a publicação das Características da educação da
Companhia de Jesus (Cecj), em 1986, iniciou-se um tempo de
estudo e reflexão com vistas à renovação da prática educativa
dos colégio jesuítas. Um das dificuldades mais encontradas
nesses esforços de renovação refere-se à identidade do educador num colégio da Companhia de Jesus. De acordo com as
Características, todos os que trabalham num centro educativo
da Companhia — e hoje são mais de 60 mil professores em
aproximadamente 700 instituições educativas, nos cinco continentes — participam de uma “missão apostólica da Igreja na
construção do Reino de Deus”, razão pela qual “ensinar num
colégio da companhia é um ministério” (Cecj, 93). Em diversas
reuniões com representantes de colégios jesuítas, constatouse que as dificuldades são tanto teóricas quanto práticas e se
referem, sobretudo, à missão plena do professor como colaborador de uma missão apostólica e, mais particularmente, como
educador da fé.
2. O objetivo deste documento é esclarecer os propósitos
da Companhia de Jesus ao manter colégios; explicar o que se
79
entende por educar na fé; explicitar objetivos, etapas, meios e
dificuldades no exercício deste ministério; e indicar a formação
necessária para o cumprimento de tal missão, a fim de poder
contar com a colaboração eficiente dos leigos no esforço de
concretização de seu projeto educativo.
3. Na elaboração do presente documento colaboraram a Conej
(Comissão Nacional de Educação dos Jesuítas), os Diretores e
Reitores dos colégios jesuítas do Brasil (em suas reuniões­anuais
de 1989 e 1990), o Pe. Martinho Lenz, SJ, como redator, além de
outras assessorias. Este documento é fruto da colaboração de
jesuítas e leigos. Desde 1990, a conej conta com a participação paritária de leigos e jesuítas, num total de oito membros,
representando as quatro províncias do Brasil.
4. Este documento é dirigido, em primeiro lugar, aos professores e técnicos em educação de nossos colégios. Mais amplamente, é oferecido a toda a comunidade educativa: jesuítas,
funcionários, alunos, pais e antigos alunos. Ele aponta para um
ideal elevado, uma utopia que, num colégio da Companhia de
Jesus, se constitui ao mesmo tempo meta e desafio.
2. A Educação formal como
campo de evangelização
5. A atual compreensão dos fins de um colégio católico recebeu
sua definição no Concílio Vaticano II, que projetou nova luz
sobre a missão da Igreja no mundo de hoje e, particularmente,
sobre a educação. Proclamou o direito inalienável a uma educação cristã, considerou os pais como os primeiros e principais
educadores dos próprios filhos e estimulou a participação de
toda a comunidade educativa na vida da escola e na sua renovação (Decreto Gravissimum educationis, sobre a Educação
Cristã). Em sua exortação apostólica sobre a Vocação e missão
dos leigos na igreja e no mundo (1989), o papa João Paulo II
lembra aos leigos sua responsabilidade, na missão da Igreja,
80
decorrente do batismo que os incluiu na Igreja-ministério, e
de sua participação na vida da Igreja-comunhão. Essa vocação
para o apostolado leigo dá-se por meio de uma variedade de
vocações e exige uma formação seria e integral para a vida
em comunidade e para o exercício firme e competente na
missão.
6. No documento de Medellín (l968), os bispos da América
Latina vêem a situação educacional como um drama e um
desafio. Após analisar as deficiências quantitativas e qualitativas, propõem a educação libertadora como resposta às nossas
necessidades: uma educação que coloque o educando como
sujeito do processo educativo e se oriente no sentido de criar
um novo homem, numa nova sociedade. Puebla (l979) aprofunda
e completa a proposta de educação libertadora com a noção
de educação evangelizadora, pois a educação deve contribuir
para a conversão do homem total e para sua abertura a Deus
e à comunhão fraterna. Pede que a educação católica prepare
agentes de transformação permanente e orgânica que a sociedade da América Latina requer.
7. A Igreja no Brasil assumiu essa proposta e lançou um texto
intitulado Para uma pastoral da educação, no qual conceitua
a pastoral da educação como “a presença e ação da Igreja,
procla­mando e construindo o Reino no e por meio do mundo
da educação” (n. 3.2).
8. Após o Concílio Vaticano II, a Companhia de Jesus lançou-se num processo de profunda renovação. Nas três Congregações
Gerais (CG) realizadas a partir daí (1965-1966; 1975 e 1983)
definiram-se, também no campo da educação, os rumos da
atualização apostólica desejada. Entre os documentos de maior
impacto desse período destacam-se o decreto nº 28 sobre o
Apostolado da Educação, da 31ª CG (1965-1966), que reafirma
a importância deste campo de trabalho e abre os colégios da
Companhia de Jesus a uma renovação pedagógica e pastoral;
o decreto nº 4, da 32ª CG (1975), que situa todo o apostolado
81
da Companhia de Jesus sob uma nova luz ou opção prioritária,
definida como “o serviço da fé e a promoção da justiça”; a alocução do Pe. Pedro Arrupe, então Superior Geral da Companhia,
denominada “Nossos Colégios Hoje e Amanhã” (1980), na qual
propõe critérios que identificam um colégio Jesuíta, traça o
perfil do aluno que queremos formar e da comunidade educativa necessária para essa missão; e, finalmente, o documento
Caracteristicas da educação da Companhia de Jesus (1986), novo
ordenamento do apostolado educacional da Companhia, visto
à luz do carisma espiritual de Santo Inácio de Loyola.
9. Uma constante em todos esses documentos é a afirmação de que hoje, cada vez mais, as mudanças ocorridas nos
colégios­ jesuítas fazem surgir um modelo inteiramente novo
de colaboração, participação e responsabilidade conjunta que
o Pe. Peter-Hans Kolvenbach, atual superior geral dos jesuítas,
assim descreve:
“…a atividade educativa das escolas jesuítas de hoje deve
ser confiada e desenvolvida por um grupo de homens e mulheres inspirados pela visão inaciana. Eles devem partilhar
essa visão, devem desenvolvê-la, concretizá-la e traduzi-la
no que se pode chamar de estilo educativo da escola” (alocução a um grupo de representantes de oito escolas jesuítas
do norte da Itália, em 13 de dezembro de 1986).
10. A consciência desse novo modelo de colaboração — jesuí­
tas e leigos — nos colégios da Companhia leva os responsáveis
pela orientação a expor claramente a todos os educadores os
objetivos da Companhia no que diz respeito à educação dos
alunos, para uma fé consciente e assumida, e ao papel do professor/educador nessa missão comum em nossas instituições
e­du­cativas. A concepção do professor como educador da fé
baseia-se no entendimento de que os fiéis leigos “têm por vocação e por missão anunciar o Evangelho: para essa obra foram
habilitados e nela empenhados pelos sacramentos da iniciação
cristãs e pelos dons do Espírito Santo” (Vocação e missão dos
82
leigos na igreja e no mundo, n. 33). Entende-se também que
os leigos têm uma forma própria de realizar seu apostolado e
que os sacerdotes e religiosos devem aprender, cada vez mais,
a colaborar no apostolado dos leigos.
3. situação e missão do professor
num colégio jesuíta
11. O ponto de partida é a consciência de quem somos, de
nossa realidade atual e de nossas potencialidades, daquilo que
podemos vir a ser se nos dispusermos a abraçar juntos esta
missão de educar na fé.
12. A educação enfrenta hoje uma crise mundial. No Brasil,
como em grande parte do mundo capitalista, a educação formal
sofre o impacto de poderosos meios de comunicação so­cial,
sobretudo da televisão comercial, que veicula informações
e modela concepções, valores e desejos dos telespectadores,
potenciais consumidores das idéias difundidas e dos produtos
anunciados. Generaliza-se uma filosofia de vida voltada para o
privatismo, o narcisismo e a satisfação egoísta e imediata dos
sentidos. A escola interessa aos detentores desses meios e a
seus patrocinadores? Que escola interessa?
13. O professor vive a crise da educação e da escola, que tem
como reflexo a desvalorização de sua profissão. Muitos trocam
sua carreira por outra economicamente mais compensadora;
o afluxo de novos professores é reduzido. Os que continuam
na escola enfrentam o desafio de manter um bom nível de
ensino em meio a muitas dificuldades e lutas por melhores
salários e condições de trabalho. As organizações sindicais e
profissionais gastam grande parte de suas forças nesta luta por
sobrevivência e afirmação profissional. Se, por um lado, cresce
a cons­ciência da dignidade profissional, por outro, alonga-se o
dia de trabalho em três jornadas, assumidas por necessidade de
garantir um padrão de vida aceitável. A preparação das aulas,
freqüentemente, ocupa parte do tempo de lazer do professor,
83
diminuindo as horas disponíveis para a família. A existência de
problemas familiares pode complicar sua vida e refletir-se em
seu desempenho profissional. Apesar da escassez de recursos e
de tempo, o professor busca aperfeiçoar sua formação básica,
obtida no curso de magistério ou de graduação, por meio de
uma pós-graduação realizada simultaneamente ao seu trabalho
ou em período de férias.
14. Qual o perfil do professorado dos colégios jesuítas do Brasil?
Em muitos aspectos, é semelhante ao perfil do professor das demais escolas, sejam elas privadas, sejam estatais. Muitos, inclusive,
fazem parte dos quadros do magistério público, trabalhando numa
realidade, em geral, completamente diferente das escolas jesuítas.
Quanto ao aspecto religioso, muitos trazem consigo uma formação
cristã básica, que freqüentemente ficou numa primeira iniciação,
sem aprofundamento. Há os que vivem e expressam conscientemente sua adesão à fé e à Igreja, as quais constituem valores
significativos em sua vida. Estes participam, em geral, de atividades
pastorais ou de movimentos de Igreja, em que realimentam sua fé
e atualizam sua visão religiosa. Outros vivem afastados da prática
sacramental e, às vezes, passaram ou passam por uma crise de fé
ou mantêm-se indiferentes a assuntos religiosos. há críticas em
relação a aspectos institucionais e a pontos da doutrina na Igreja.
Todos sofrem, de certa forma, o impacto da secularização presente
na sociedade, processo pelo qual se dessacraliza o mundo, reduzse a influência da religião e afirma-se a autonomia das realidades
terrestres.
15. Até que ponto o caráter confessional da escola jesuíta terá
exercido alguma influência na decisão do professor de ingressar ou permanecer num colégio jesuíta? Não é fácil dizê-lo.
De qualquer modo, em algum momento lhe terá surgido esta
pergunta: Qual o meu compromisso com a proposta religiosa
da escola em que trabalho? Ou, de forma mais positiva: Como
posso colaborar com jesuítas e outros professores, meus colegas,
para educar na fé nossos alunos, segundo a proposta filosófica
da escola?
84
4. A educação da fé num colégio jesuíta
16. A fé é algo muito existencial, mas, ao mesmo tempo, ligado
à história e à revelação de Deus de por meio Jesus Cristo.
17. Assim, entendemos por fé o seguimento consciente, alegre
e convicto do caminho de Jesus Cristo, e a adesão a Ele dentro
de uma comunidade cristã que celebra essa fé e busca crescer
junto no compromisso.
18. De acordo com as Características da educação da Companhia
de Jesus (CECJ), podemos resumir os vários objetivos visados
em um processo de educação da fé nos seguintes itens.
19. a) Levar o aluno à descoberta progressiva de Deus, de Sua
presença e ação no mundo, a adquirir um senso de
admiração e de mistério ao estudar a criação de Deus
(CECJ, 24) e a dar uma resposta de fé a esse Deus que
nos ama (CECJ, 34).
20. b) Buscar formas e meios práticos de desmascarar o materialismo e o secularismo da vida moderna e de opor-se
ao ateísmo (CECJ, 35).
21. c) Ter Jesus Cristo como modelo de vida humana, buscando
orientar a própria vida seguindo a Jesus Cristo e sendo
como Ele, partilhando e promovendo Seus valores (CECJ,
62) e procurando ser um homem para os outros (CECJ,
70).
22. d) Desenvolver uma fé que promova a justiça (CECJ, 74) e
leve a uma preocupação especial pelos pobres, marginalizados e necessitados (CECJ, 85).
23. e) Cultivar a atitude inaciana de lealdade e serviço à Igreja, vista como Povo de Deus (CECJ, 94), e de fidelidade
aos ensinamentos da Igreja, especialmente na formação
moral e religiosa (CECJ, 95).
85
24. f) Incentivar e ajudar o estudante a escolher sua vocação
de serviço profissional e comunitário como resposta ao
chamado pessoal de Deus (CECJ, 66).
25. g) Fomentar a colaboração em atividades ecumênicas com
outras Igrejas e o diálogo religioso com outras crenças e
com todos os homens e mulheres de boa vontade (CECJ,
100).
26. h) Ajudar o aluno a tornar-se agente multiplicador de uma
visão cristã de fé e de serviço (CECJ, 111).
27. Cada um desses elementos está presente, de algum modo, em
todo o processo de educação da fé, embora com ênfases distintas
e graus de consciência e compromisso diferenciados. A consciência
e o compromisso visados são de natureza profundamente pessoal
e ao mesmo tempo de caráter grupal e social.
5. O sentido da fé que promove a justiça
28. A proposta é clara: em nome da fé, e com a força que a fé
comunica, queremos educar para a justiça.
29. O fundamento é constituído por uma fé autêntica, forte e
consciente na pessoa e na mensagem de Jesus de Nazaré, que
nos revela um Deus que é Pai e nos ensina a ser irmãos. Essa
fé tem como medida de autenticidade a prática da justiça nas
relações interpessoais e a ação decisiva por estruturas sociais
mais justas. Nem fé intimista, nem luta pela justiça desligada
da fé; fé e justiça são vistas como inseparáveis. Mais profundamente, existe a convicção de que o que confere firmeza e
garantia de continuidade ao compromisso com a justiça é uma
fé profunda e vivencial em Jesus Cristo.
30. Essa fé não apenas leva a uma visão crítica da realidade, com
a descoberta progressiva das causas da pobreza e da injustiça,
86
como também busca estabelecer contato real com o mundo
da injustiça e realizar ações que eduquem para a justiça e para
a caridade, olhando o mundo com o olhar misericordioso de
Deus.
31. A fé em Cristo deve nos conduzir a uma preocupação especial, como a dEle, pelos pobres, marginalizados e pelos que
são impedidos de viver uma vida plenamente humana. Nossos
alunos devem aprender a amar a todos como irmãos e irmãs na
sociedade humana, e a dar de si para construir uma sociedade
mais justa e melhor.
6. Etapas ou pedagogia da fé
32. A educação da fé tem por objetivo formar para o compromisso cristão na vida adulta. Isto supõe que na escola seja
elaborado e executado um projeto de pastoral, dinâmico e
e­vo­lutivo, destinado a orientar os jovens nas diversas etapas
de seu desenvolvimento. Ao falar de opção preferencial pelos
jovens, os bispos latino-americanos, em Puebla, ressaltam que
“a pastoral da juventude, na linha da evangelização, deve ser
um verdadeiro processo de educação na fé, que leva à própria
conversão e a um compromisso evangelizador” (n. 1193).
33. Num esquema simplificado, podemos distinguir quatro
etapas de evangelização: a sensibilização (pré-evangelização),
a conscientização (conversão), o aprofundamento (opção vo­
cacional) e o apostolado (ação, engajamento pastoral).
34. A sensibilização parte da sociabilidade do jovem e visa
despertar-lhe o desejo de realização pessoal e social, colocando-o em disposição de abertura ao Evangelho. Trata-se de
realizar uma educação humana básica, de construção pessoal
e de crescimento na comunicação interpessoal e de vivência
de coleguismo, tendo em vista criar o clima para a descoberta
do Reino de Deus.
87
35. Na etapa de conscientização surge, a partir de seu incon­
formismo, a tomada de consciência de si mesmo e do mundo em
que o jovem vive. Busca-se uma conscientização perso­nalizante
que leva à conversão, à descoberta de Deus e à consciência das
condições estruturais de nossa sociedade.
36. Com o aprofundamento, começa a dinâmica de buscar
um “mais”: mais sensibilização, mais conscientização, mais
compromisso. O jovem entra em estado de opção em face da
vocação e dos serviços distintos, atraído pelo exemplo e pela
palavra de Jesus Cristo.
37. Por fim, a etapa do apostolado busca realizar a opção
pela ação e pelo engajamento religioso e social. O grupo tem
consciência de ser comunidade e sente-se envolvido em uma
missão junto a seus irmãos. O jovem sente-se comprometido
com uma opção séria por Cristo e por seu projeto de Reino.
38. Nessas etapas se entrelaçam elementos de informação e
de formação religiosa. A informação religiosa, certamente necessária, não deve sobrepor-se a uma verdadeira formação. A
informação a respeito das várias religiões e das respostas que elas
oferecem às questões básicas sobre a vida humana — questões
como a vida após a morte e as exigências de uma vida eticamente responsável — deve ajudar a descobrir a originalidade e
a novidade da mensagem de Jesus Cristo e a aceitar o desafio
de viver o compromisso decorrente dessa descoberta.
39. Ao educador se pede uma atitude pedagógica que parta
do respeito profundo a cada pessoa, que use o diálogo como
método e que procure fazer do próprio aluno o sujeito do seu
crescimento pessoal — também na dimensão da fé.
7. Os AGENTES do SERVIÇO
de EDUCação da FÉ
40. A missão de educar na fé é responsabilidade de todo corpo docente de um colégio jesuíta, pois, “qualquer matéria do
88
programa pode ser um meio para chegar a Deus” (CECJ, 34).
Quem sente dificuldade em identificar-se com essa missão deve
buscar, no mínimo, a adoção de uma atitude de respeito para
com as convicções e os sentimentos dos outros e de abertura
positiva para os valores da fé e da transcendência.
41. Entretanto, cabe um papel especial ao setor de educação
religiosa e formação espiritual, pois a dimensão teológica é
“o fator integrativo do processo de descobrir a Deus e compreender o verdadeiro sentido da vida humana” (CECJ, 34).
À comunidade jesuíta e a outros religiosos que trabalham no
colégio cabe um papel importante e específico de inspiração,
estímulo e testemunho de vida (CECJ, 124). Mais amplamente,
os pais de alunos (CECJ, 132) e toda a comunidade escolar participam da responsabilidade nessa missão comum (CECJ, 118),
pelo exemplo e pelo apoio ao trabalho de educação religiosa
realizado no colégio.
8. MEIOS DE EXERCER A EDUCação da fé
42. O exemplo de vida e a disposição de partilhar as próprias
experiências constituem meio essencial e insubstituível para
a educação. A missão do professor o leva a envolver-se na vida
dos alunos, tendo “interesse pessoal no desenvolvimento intelectual, afetivo, moral e espiritual de cada um deles, ajudando-os a desenvolver um senso de auto-estima e a se tornarem
pessoas responsáveis dentro da comunidade” (CECJ, 43). É um
trabalho de paciência e dedicação, que procura reconhecer as
etapas evolutivas do desenvolvimento de cada aluno também
no aspecto espiritual (CECJ, 42).
43. No momento oportuno, essa missão incluirá a prática do
diálogo entre a fé e a ciência, buscando a compreensão de que
cada uma tem sua racionalidade, incluirá também o diálogo
entre fé e cultura (CECJ, 38). Esse diálogo pode valer-se da reflexão sobre situações-limite, como a doença e o luto, vitórias
ou derrotas de grande significado.
89
44. A educação da fé para os alunos cristãos inclui a iniciação às práticas religiosas, sempre ligadas a situações da vida.
Importante é que os alunos encontrem “um amigo e guia na
pessoa de Jesus Cristo e que possam experimentá-Lo por meio
da Escritura, dos sacramentos, da oração pessoal e comunitária,
no lazer, no trabalho e nas demais pessoas” (CECJ, 64). A prática
dos Exercícios Espirituais, em suas diferentes formas, é um meio
muito eficaz para conhecer, amar e seguir melhor a Jesus Cristo
segundo a inspiração inaciana e também para familiarizar-se
com essa espiritualidade (CECJ, 65). O uso pedagógico dos símbolos religiosos, explicados de modo compreensível ao aluno,
é outro meio para a descoberta e o envolvimento na prática
da fé. A celebração da Eucaristia, de modo adequado à idade
dos alunos, será fonte de vida e escola de formação cristã.
45. A educação jesuíta procura desenvolver a atenção pessoal
para cada aluno a fim de ajudá-lo a responder à descoberta
de Deus em sua vida pelo compromisso de servir dentro da
comunidade (CECJ, 63).
46. De acordo com uma pedagogia que parte da ação e a ela
conduz, também no campo religioso será importante proporcio­
nar aos estudantes experiências concretas de vida da Igreja e
de apostolado dos leigos, para o qual os professores leigos mais
engajados têm especial competência (CECJ, 103).
47. O dia-a-dia de uma escola oferece oportunidades freqüentes
para que o professor exerça sua missão de educador da fé não
só em situações de sala de aula, mas também no trato e convívio
informal. As ocasiões surgem, às vezes, de forma inesperada e
em disciplinas que aparentemente nada têm a ver com religião. O questionamento de dogmas positivistas no mundo da
ciência, a fé em nossa origem em um Deus Criador, a crítica
ao relativismo ético, o significado das conquistas técnicas ou
o exemplo de fé religiosa de cientistas de renome podem dar
ocasião a discussões muito proveitosas.
90
48. Todo o currículo e o conjunto da vida da escola devem
ajudar a testemunhar a fé e não servir de contratestemunho à
fé anunciada.
49. As atividades extraclasse e os encontros em grupos menores oferecem momentos propícios para aprofundar a educação
da fé. Neles a experiência religiosa tem condições de tocar as
fibras mais profundas do ser do aluno. Um colégio jesuíta não
receia trabalhar com grupos escolhidos de alunos que deram
sinais de querer algo mais na vida. Várias experiências estão em
andamento, seguindo etapas e dinâmicas próprias: Jornadas de
formação, Semana Santa Jovem, Retiros Espirituais, Grupos de
Magis, acampamentos, grupos e Comunidades de Vida Cristã
(CVX) e outras. A presença de professores com orientadores
religiosos nessas formas de convivência informal, bem como a
divulgação, a avaliação e o testemunho desses eventos em sa­la
de aula, pode ter um profundo significado pedagógico. Gru­pos
de jovens que têm essas experiências costumam exercer influência positiva sobre seus colegas, contribuindo para a criação
de um clima novo no colégio.
9. Os exercícios espirituais de Santo
Inácio como escola de fé
50. Os Exercícios Espirituais (EE) de Santo Inácio merecem um
destaque especial entre os meios de formação da fé. O livro dos
Exercícios Espirituais tem um valor pedagógico permanente
porque é fruto da experiência do próprio Inácio e foi escrito
para orientar outros na mesma experiência.
51. O objetivo dos Exercícios Espirituais é levar o exercitante a
buscar e encontrar os caminhos de Deus para a própria vida e
ordená-la de acordo com estes. O exemplo maior de busca da
vontade de Deus Pai foi do próprio Jesus Cristo, fiel até a morte.
O exercitante aprende a conhecê-Lo e a afeiçoar-se a Ele.
91
52. A visão inaciana de educação também fica mais clara para
quem passou pela experiência dos Exercícios, considerados por
muitos como o segredo dos jesuítas.
53. “Os Exercícios — dizem as Características — podem ser
feitos de vários modos, adaptados ao tempo e às possibilidades
de cada pessoa, adultos ou estudantes” (65). Assim, os Exercícios podem ser condensados em poucos dias, por volta de oito
ou trinta dias. Quem não pode afastar-se de suas atividades
cotidianas como o emprego, a família, ou outro motivo, tem a
possibilidade de fazer o “retiro na vida”, dedicando um tempo
diário à oração, segundo o método dos Exercícios de Santo
Inácio, sob o acompanhamento de uma pessoa experiente.
54. O retiro inaciano tem sido adaptado e dado com proveito a
adolescentes e jovens. Muitos encontram, por meio do discernimento praticado durante os Exercícios, grande certeza quanto
à própria vocação e profissão a seguir na vida, vista à luz da
fé, das circunstâncias da história de cada um e dos desafios de
nossa sociedade.
10. dificuldades e desafios
da educação da fé
55. Atualmente, não são poucas as dificuldades existentes para
um bom desempenho da missão de educar para a fé num
colégio da Companhia de Jesus. Essas dificuldades podem ser
vistas como desafios a nossa criatividade e a nosso espírito
apostólico.
56. Como realidade envolvente, temos o materialismo im­
perante em nossa sociedade, com a busca do lucro, a prática
do consumismo, a procura obsessiva do prazer e do poder como
ídolos máximos do nosso mundo capitalista. No campo religio­
92
so, temos a proliferação das seitas e a difusão do ocultismo, da
astrologia e das várias formas de espiritismo.
57. Quando a família não comunga com uma visão cristã, facilmente surge o conflito entre os valores familiares e os valores
propostos e praticados na escola.
58. Acrescem a isso algumas características freqüentemente
constatadas em alunos e famílias que procuram nossas escolas: auto-suficiência, escravização à moda e aos modismos,
superficialidade, falta de vivência religiosa profunda da família,
desajustes conjugais ou familiares, abuso de drogas.
59. O trabalho personalizado com cada aluno torna-se mais difícil, ou parcialmente viável, de acordo com o número de alunos
que o professor tem em cada turma e o número de turmas por
semestre ou por ano. Às vezes, há professores que dão pouca
importância ao trabalho religioso dos colegas, depreciam-no
ou até o destroem.
60. A própria situação funcional do professor, sua instabilidade
no emprego, problemas salariais, entre outros, reduzem seu
potencial de trabalho e sua disponibilidade. Mas há também
circunstâncias que podem ser vistas como favoráveis ao trabalho
religioso: a tendência de volta à busca do sagrado, a necessidade
de encontrar um sentido para a vida num mundo de incertezas
e em frustrações, a crise das ideologias, os gestos proféticos ou
exemplos de novos mártires no campo da fé e da justiça, os
casos negativos de vidas frustradas pelo vazio dos valores.
11. Formação religiosa
do educador da fé
61. A situação de grande parte dos docentes dos colégios jesuí­tas
do Brasil, diante das exigências da proposta e das dificuldades
reais existentes em seus colégios, é de preparação precária ou
insuficiente para a função que deles se espera.
93
62. Há uma questão inicial que é preciso salientar com toda
a clareza: o professor de um colégio jesuíta que não sente a
questão da fé e dos valores religiosos como uma necessidade
para si e para seus alunos, dificilmente conseguirá comungar
com a proposta da Companhia. O mínimo que se deve constatar
é uma posição de abertura em relação aos valores da fé e de
respeito pelo trabalho de colegas e pela posição da escola.
63. Um dos critérios para o ingresso de um professor num colégio da Companhia deveria ser a adesão à proposta filosófica
e religiosa da escola e a disposição de contribuir para a sua
implementação.
64. Tem-se ainda a questão da formação para a educação da fé.
Esta formação abrange dois campos: o teológica e o espiritual
(CECJ, 152). Os colégios da Companhia, separadamente ou em
conjunto, precisam organizar programas de formação teológica
e espiritual para todos os seus docentes, especialmente para os
da área de educação religiosa Nesses programas não podem
faltar estudos sobre temas como: experiência de Deus, Teologia
da Libertação, Teologia da Educação, carisma inaciano e missão
do leigo na Igreja.
65. A formação espiritual a ser oferecida a todos deveria ser
retomada com novo vigor, com nova expressão e novos métodos,
como pede a nova evangelização proposta pelo papa João Paulo
II para a América Latina, e com renovado ardor missionário, de
acordo com as Diretrizes da Ação Evangelizadora da Igreja no
Brasil, aproveitando a experiência dos colégios e valorizando
o método dos Exercícios espirituais, tanto em grupo como
individualmente (Exercícios na vida).
66. Assim como os leigos necessitam conhecer a espi­ritualidade
inaciana, também os jesuítas “necessitam compreender as experiências vividas, os desafios e as diversas maneiras com que
o Espírito de Deus move os leigos” (CECJ, 153), reconhecendo
assim a contribuição que estes oferecem à Igreja e ao colégio
da Companhia de Jesus. Além dos Exercícios em suas várias
94
formas, os colégios podem oferecer diversas oportunidades de
formação religiosa aos colaboradores leigos, como celebrações
litúrgicas (eucarísticas e/ou penitenciais), oficinas ou grupos
de oração, círculos bíblicos, orientação espiritual fornecida por
pessoas competentes, estágios de compromisso social e cursos
de teologia.
67. Os Grupos ou Comunidades de Vida Cristã (CVX), com longa
experiência, ajudam os leigos a desenvolverem sua vocação e
missão no mundo à luz da espiritualidade inaciana. Os colégios jesuítas estimulam os professores a formarem grupos de
Vida cristã que possam tornar-se verdadeiras CVX, designando
pessoas para seu acompanhamento.
68. Coerentes com sua proposta educativa, os colégios jesuítas
empenham-se em garantir aos professores as pessoas adequadas
para prestar-lhes a atenção pastoral de que necessitem.
69. Zelar pela própria formação continuada, básica ou avançada,
é um compromisso sagrado do professor, tanto no campo de
sua especialização profissional como na área da fé.
70. As províncias jesuítas estudam meios de destinar pessoas
e buscar recursos para preparar e executar programas de formação teológica e espiritual, além de profissional, para todos
os funcionários.
71. Por fim, para a comunidade jesuíta, propõe-se o desafio
de sua própria renovação e atualização no campo da fé e do
compromisso apostólico, que possa repercutir na animação
religiosa de todo o conjunto do colégio, na linha do carisma
espiritual de Inácio de Loyola.
12. Implicações e conseqüências
para o colégio jesuíta
72. A educação da fé é uma prioridade em um colégio da Companhia de Jesus. Sem uma ação decidida na dimensão pastoral,
um colégio jesuíta perde sua razão de ser. A educação, bem
95
entendida, não é fim em si, mas meio para uma vida sempre
mais plena (CECJ, 37). Essa vida mais plena só se compreende
e promove a partir de uma visão de fé consciente e engajada.
73. Um colégio jesuíta, como dizem as Características, “é um
instrumento apostólico a serviço da Igreja, servindo à sociedade humana” (CECJ, 92). Essa visão e tal prioridade impõem
exigências sérias para o colégio.
74. A primeira exigência diz respeito à necessidade de adequar
as estruturas do colégio ao exercício de sua missão. À medida
que o colégio reduz ou elimina suas contradições internas e
corrige as deficiências no seu funcionamento, tornando-se mais
eficaz, mais justo e humano, maiores são as possibilidades de
o próprio colégio dar credibilidade à sua proposta educativa e
reforçar o testemunho de seus professores. As necessidades de
adequação devem ser detectadas por uma oportuna avaliação
de desempenho.
75. A segunda exigência refere-se à necessidade de o colégio
definir e observar critérios de admissão e permanência de professores e funcionários. A maior parte dos professores de um
colégio jesuíta, escolhidos por tais critérios, deverá ser de boa
formação e vivência religiosa, ou estar se preparando para ela.
Professores de outras religiões mostrarão interesse em colaborar
com o colégio, em virtude de sua consciência, da dignidade e
da vocação humana, do compromisso com a comunidade e
com a transformação social.
76. Outra exigência de grande alcance é a criação e a execução, pelo colégio, de um plano de formação permanente do
seu corpo docente e funcional. Esse plano deverá abranger as
áreas de formação humana, profissional, pedagógica, espiritual
e sociopolítica. Além de incentivar cada professor ou funcionário ao estudo e à formação, o colégio deverá proporcionar
oportunidades de atualização e aperfeiçoamento nas diversas
áreas, alocando, quanto possível, recursos humanos e financeiros
96
para sua viabilização. Os programas de formação permanente
poderão traduzir-se em projetos não só de cada colégio, mas
das províncias, do país ou em níveis ainda mais amplos.
77. Será importante que essas iniciativas de formação permanente e educação da fé se articulem com a pastoral orgânica
das dioceses, as diretrizes da CNBB e os planos da Associação
de Educação Católica (AEC) e da Conferência dos Religiosos
do Brasil (CRB).
78. Por fim, será necessário que a comunidade jesuíta do colégio — padres, irmãos e estudantes — se encontre engajada
nesse processo de formação permanente e de animação da fé
de toda a comunidade educativa, ocupando o espaço que lhe
é próprio.
13. Conclusão
79. O presente documento pretende ser a ajuda a que professores e funcionários de um colégio jesuíta têm direito para que
possam avaliar a grandeza do desafio que é trabalhar numa
instituição de ensino da Companhia de Jesus, cumprir essa
missão e fazer o que estiver ao seu alcance para a realização
dessa proposta.
80. O aprofundamento dessa missão aumentará em cada um
de nós a consciência do sentido maior do nosso trabalho e de
todo nosso viver, para que possamos “em tudo amar e servir”
melhor a Deus e aos irmãos.
81. Na bibliografia anexa, encontram-se elementos de fundamentação e maiores explicações sobre os vários enfoques deste
texto. Também se encontra anexa uma explicação de alguns
termos usados nesta exposição.
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98
Bibliografia
Arrupe, Pe. Pedro. Nossos colégios hoje e amanhã. Coleção Ignatiana,
16, Ed. Loyola, 1980.
Celam — Conferência episcopal Latino-americana. A igreja na atual
transformação da América Latina à luz do concílio. Conclusões
de Medellín (1968). Ed. Vozes, 1977.
——— Evangelização no presente e no futuro da América Latina
(Documento de Puebla). Ed. Loyola, 1976. Tema educação nn.
1012-62.
Ciaej — Comissão Internacional para o Apostolado da Educação
Jesuíta. Características da educação da Companhia de Jesus. Ed.
Loyola, 1987.
CNBB — Conferência Nacional dos Bispos do Brasil. Diretrizes gerais
da ação pastoral da igreja no Brasil (1991-1994). Documento da
CNBB, 45, Ed. Paulinas, 1991.
——— Educação: exigências cristãs (texto para estudo). Ed. Paulinas,
1990.
——— Para uma pastoral da educação. Estudos da CNBB, 41, Ed.
Paulinas, 1986.
Codina, Pe. Gabriel. Fé e justiça nos colégios da Companhia de Jesus.
Coleção Ignatiana, 30, Ed. Loyola, 1987.
Congregação geral, 31ª Decreto 28, sobre o apostolado da educação. edição da Província Portuguesa, Lisboa, 1967. (Das outras
99
congregações gerais, ver: da 32ª CG, decreto 4º “Nossa missão
hoje: diaconia da fé e promoção da justiça”; da 33º CG, decreto
1º: “Companheiros de Jesus enviados ao mundo de hoje”, especialmente o nº 44).
Papa João Paulo II. Vocação e missão dos leigos na igreja e no mundo.
Exortação apostólica Christifideles laici. Ed. Loyola, 1989.
Sagrada Congregação para a Educação Católica. O leigo
católico testemunha da fé. Cadernos da Aec do Brasil, 16, 1982.
Thomas, Joseph. O segredo dos jesuítas: os Exercícios Espirituais. Ed.
Loyola, 1990.
Vários. Jornada latino-americana sobre as “Características da educação
da companhia de Jesus”. Ed. Loyola, 1989.
100
Explicação
de alguns
termos usados
no documento
1. Características da educação da Companhia de Jesus (CECJ):
novo ordenamento da educação nas instituições de ensino
da Companhia de jesus (especialmente de 1º e 2º graus),
que retrata a tradição da Ratio studiorum (ordenamento dos
estudos), publicada pela primeira vez em 1586.
2. Congregação Geral (CG): corpo legislativo constituído por
representantes de todas as províncias jesuítas do mundo;
órgão máximo de governo da Companhia de Jesus, que tem
entre suas atribuições escolher o Superior Geral e definir
orientações e normas para toda a companhia.
101
3. Igreja-comunhão: dimensão participativa da Igreja, fundamentada na filiação divina e na conseqüente fraternidade de
todos em Cristo, e que nos torna comprometidos uns com os
outros.
4. Igreja-ministério: a Igreja enquanto serviço ao povo de
Deus; tem origem em Cristo, cabeça da Igreja, e destina-se a
santificar, ensinar e governar o povo de Deus.
5. Leigo: o cristão fiel, batizado, membro do povo de Deus,
que não pertence ao clero. O leigo caracteriza-se pela sua
índole secular e pela vocação de levar o reino de Deus às
realidades econômicas, sociopolíticas e culturais, concorrendo “para a santificação do mundo a partir de dentro, como
fermento” (cf. constituição sobre a Igreja Lumen gentium,
Concílio Vaticano II nº 31).
6. Ministério: serviço ou função exercida na Igreja para o
bem dos demais. A maior parte dos ministérios não requer
102
uma ordenação especial (como no caso do sacerdócio ministerial), podendo ser exercido por cristãos capacitados e
delegados para isto.
7. Pastoral: ação da Igreja tendo em vista a difusão do evangelho entre as pessoas de diversos ambientes e estruturas
sociais.
8. Província: circunscrição administrativa da companhia de
jesus, que tem à frente um superior Provincial, nomeado
pelo superior geral. Há quatro províncias jesuítas no Brasil,
com sede respectivamente em Porto alegre (meridional), Rio
de Janeiro (centro-leste), Salvador (Bahiense) e Recife (Nordeste).
9. Secularismo: forma radical de secularização, cuja crítica chega a ponto de negar conteúdo real à transcendência
(negação de Deus). “Consiste numa visão autonomística do
103
homem e do mundo, a qual prescinde da dimensão do mistério, descuida-se dela e inclusive a nega. Este imanentismo
é uma redução da visão integral do mundo” (Sínodo extraordinário de 1985, relação Final, II, A, 1).
10. Secularização: processo histórico pelo qual o homem
toma consciência de sua autonomia e pela qual as pessoas, a
sociedade e a cultura se libertam da tutela e do controle da
magia (dessacralização), do mito (desmitificação) e das formas
populares de religiosidade.
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Coleção Ignatiana — 39 - Centro de Espiritualidade Inaciana