RESPOSTA FISIOLÓGICA DE Myracrodruon urundeuva E Luetzelburgia auriculata À SALINIDADE J. A. Silva1; F. P. Nogueira Filho2; M. C. Bessa3; M. S. Pereira4; A. M. E. Bezerra5; C. F. Lacerda6 RESUMO: A salinização dos solos é um dos fenômenos crescentes em todo o mundo e vem tornando-se um dos principais problemas inerentes à agricultura irrigada, tornando-se necessária, a busca por plantas capazes de resistirem ou se adaptarem a esses níveis elevados de sais no solo. O objetivo deste trabalho foi avaliar, em casa de vegetação, a transpiração (E), condutância estomática (gs), fotossíntese líquida (A) e o índice relativo de clorofila (IRC) de plantas M. urundeuva e L. auriculata submetidas a estresse salino provocado pelo substrato extraído direto de áreas salinizadas, apresentando 5 níveis de salinidade, para condutividades elétrica de 1,2, 2,7, 4,7, 6,7 e 8,4 dS m-1, respectivamente, em experimento montado em blocos com parcelas subdivididas. O estresse salino provocado pelo solo salinizado causou diminuição em todas as variáveis analisadas, tendo a L. auriculata apresentado maior sensibilidade ao aumento nos níveis de sais no solo. A L. auriculata apresentou maior E, gs e A quando comparado com a M. urundeuva. PALAVRAS-CHAVE: salinidade, semi-árido, espécies nativas. PHYSIOLOGICAL RESPONSE OF Myracrodruon urundeuva AND Luetzelburgia auriculata TO SALINITY ABSTRACT: The soil salinity is a growing phenomena in the world and has become one of the main problems inherent to irrigated agriculture, making necessary the search for plants that can resist or adapt to these high levels of salts in the soil. The objective of this study was to evaluate, in a greenhouse, transpiration (E), stomatal conductance (gs), net photosynthesis (A) and relative chlorophyll index (CRI) of plants M. urundeuva and L. auriculata subjected to salt stress caused by the substrate extracted directly from salinized areas, with five levels of salinity for electrical conductivities of 1.2, 2.7, 4.7, 6.7 and 8.4 dS m-1, respectively, in experiment in blocks with split plots. Salt stress caused by saline soil caused a decrease in all variables, with L. auriculata made more sensitive to increased levels of salts in the soil. L. auriculata had a higher E, gs and A compared to M. urundeuva. KEYWORDS: salinity, semi-arid, native species 1 Bolsista ATP – B/CNPq, UFC. CEP: 60.455-760, Fortaleza, CE. [email protected] 2 Bolsista de Iniciação Científica/PIBIC, UFC. 3 Mestranda em Engenharia Agrícola/DENA/UFC. 4 Bolsista DTI – C/CNPq, UFC. 5 Prof. Dr. do Depto. de Fitotecnia/CCA/UFC. 6 Prof. Dr. Depto de Eng. Agrícola/DENA/CCA/UFC, bolsista de produtividade do CNPq. (85) 9948-1142. J. A. Silva et al. INTRODUÇÃO O aumento no teor de sais no solo vem tornando-se um dos principais problemas inerentes à agricultura, principalmente nos perímetros irrigados (Silva, 2011). Devido a este problema, a estimativa da FAO adverte que aproximadamente 50% dos 250 milhões de hectares irrigados no mundo já apresentem problemas de salinização e que 10 milhões de hectares são abandonados anualmente (Lima Junior & Silva, 2010). As atividades florestais poderiam possibilitar a utilização dessas áreas afetadas por sais e certamente teriam reflexos diretos sobre a oferta de produtos de origem florestal e na pressão sobre a vegetação nativa, além de promoverem a recuperação dos solos degradados pela salinidade (Silva et al., 2000). No entanto, o êxito dos reflorestamentos é dependente, entre outros fatores, da escolha de plantas capazes de resistirem às condições adversas do meio (Barbosa, 1994). São muitos os efeitos negativos da salinidade que estão diretamente relacionados ao crescimento e rendimento das plantas (Lima Junior & Silva, 2010), sendo comum a inibição do crescimento por redução no potencial osmótico da solução do solo, toxicidade iônica e desequilíbrios nutricionais (Munns, 2002). Contudo, algumas plantas podem resistir ao excesso de sal no solo (Munns, 2002; Taiz & Zeiger, 2009). Um dos mecanismos comumente citados para tolerância à salinidade tem sido a capacidade das plantas em ajustar as relações hídricas em resposta ao estresse osmótico, acumulando íons potencialmente tóxicos no vacúolo e sintetizando solutos compatíveis no citosol, permitindo assim a manutenção da absorção de água e da turgescência celular mesmo em ambientes com elevados teores de sal (Taiz & Zeiger, 2009). A aroeira (Myracrodruon urundeuva) é uma espécie florestal de grande valor econômico, cuja madeira é muito utilizada em propriedades rurais por sua qualidade e resistência (Barbosa, 1994), podendo ser encontrada desde o Ceará até os estados do Paraná e Mato Grosso do Sul, sendo muito freqüente no Nordeste do país (Lorenzi, 1992). O pau-mocó [Luetzelburgia auriculata (Allemao) Ducke] é uma planta que, comumente, cresce em regiões de quebradas pedregosas e serrotes sertanejos principalmente do Ceará e Piauí, apresentando raízes tuberosas e feculentas e folhas verdes até na mais rigorosa seca (Braga, 1976). O objetivo deste trabalho foi estudar os efeitos do estresse salino provocado pelo substrato extraído de área salinizada sobre as trocas gasosas de plantas de aroeira e pau-macó. MATERIAL E MÉTODOS O experimento foi realizado no Núcleo de Ensino e Pesquisa em Agricultura Urbana (NEPAU) do Centro de Ciências Agrárias da Universidade Federal do Ceará, em Fortaleza, CE, em casa de vegetação, com duração de 90 dias, contados a partir da repicagem das mudas. O solo utilizado no experimento foi coletado em pontos diferentes do Perímetro Irrigado de Morada Nova, e medida a condutividade elétrica após uma série de análises realizadas em campo e laboratório, de onde se obteve cinco níveis de salinidade, para as seguintes condutividades elétricas: 1,2; 2,7; 4,7; 6,7; 8,4 dS m-1, respectivamente. Em seguida, esse solo foi peneirado e disposto em vasos com capacidade de 5 litros, os quais foram utilizados para cultivar as espécies nativas aroeira (Myracrodruon urundeuva) e pau-mocó (Luetzelburgia auriculata). J. A. Silva et al. As mudas utilizadas no experimento foram produzidas em bandejas de isopor de 128 células e 20 dias após a semeadura foram repicadas para os vasos contendo os solos com diferentes níveis de salinidade. Para reduzir o choque salino, especialmente nos tratamentos com maiores níveis de salinidade, colocou-se no leito de transplantio um volume padrão de areia lavada de rio e, para melhorar as condições de drenagem, foram colocados brita no fundo do vaso e dois drenos localizados nas laterais. Ao longo do estudo, as plantas foram irrigadas com água de poço, com salinidade inferior a 1,0 dS m-1, utilizando um sistema automático de irrigação localizada. O delineamento experimental utilizado foi em blocos ao acaso, no esquema de parcelas subdivididas, tendo na parcela, as duas espécies, e na subparcela, os cinco níveis de salinidade do solo, com cinco repetições e duas plantas por unidade experimental, totalizando 50 unidades por espécie. Aos 90 dias mediu-se a taxa de fotossíntese líquida (A) (mol m-2 s-1), a taxa de transpiração (E) (mmol m-2 s-1), e a condutância estomática (gs) (mol m-2 s-1), na primeira folha completamente madura a partir do ápice, com o auxílio de um analisador de gás no infravermelho (IRGA, LI-6400XT, Licor, USA), acoplado a uma fonte de radiação artificial com intensidade de aproximadamente 1.500 µmol m-1 s-1, medida entre 07:00 e 10:00 da manhã. Também foi medido o índece relativo de clorofila (IRC) utilizando-se um medidor portátil de clorofila tipo SPAD-502 (Minolta, Osaka, Japão), pela média de três medições feitas nas três primeiras folhas completamente desenvolvida, a partir do ápice. Os resultados foram submetidos à análise de variância e de regressão, com o auxílio de planilhas do Excel e do software ASSISTAT/ 7.6 beta – UFCG (2011). RESULTADOS E DISCUSSÃO De acordo com a análise de variância (Tabela 1) observou-se que os fatores, espécies nativas e salinidade, isoladamente, apresentaram diferença estatística a 1% de significância para todas as variáveis estudas, com exceção do índice relativo de clorofila (IRC) para o fator espécie nativa. O pau-mocó foi superior à aroeira em média 30,5, 42,5 e 30,8% para transpiração (E), condutância estomática (gs) e fotossíntese líquida (A), respectivamente. A transpiração (Figura 1A) mostrou comportamento decrescente com o aumento nos níveis de sal, diminuindo em torno de 31% no maior nível de salinidade (8,4 dS m-1) quando comparado com o menor nível (1,2 dS m-1), considerando as duas espécies . Individualmente, o pau-mocó mostrou maior decréscimo quando compara com a aroeira, diminuindo 57% enquanto que a aroeira reduziu 24% no maior nível de salinidade em relação ao menor nível. Das variáveis analisadas somente a gs apresentou interação significativa para os fatores espécies x salinidade (Figura 1B). As duas espécies diminuíram a gs apresentando comportamento inverso ao aumento nos níveis de sal, com o pau-mocó se mostrando mais sensível ao aumento nos níveis de sal no solo, decrescendo 0,0462 unidades de gs para cada aumento de uma unidade da salinidade, enquanto que a aroeira diminuiu apenas 0,0203, como mostra o coeficiente angular das equações da Figura 1B. Essa diminuição nos valores de transpiração e condutância estomática sugerem que, como mecanismo de aclimatação ao estresse salino, as plantas fecharam os estômatos, reduzindo a quantidade de água transpirada, o que certamente atenuou o efeito tóxico do excesso de sais absorvidos (Taiz & Zeiger, 2004). J. A. Silva et al. A fotossíntese líquida (Figura 1C) diminuiu com aumento nos teores de sal no substrato, causando redução de 24,3 e 43,3% para aroeira e pau-mocó, respectivamente, no maior nível de salinidade em relação ao menor. Essa diminuição nas taxas fotossintéticas encontradas em função da salinidade mostra que o aumento dos níveis de sais proporcionou redução da condutância estomática, o que acarretou diminuição da pressão parcial de CO2 intercelular, interferindo negativamente na assimilação de CO2 por parte do aparelho fotossintético (Taiz & Zeiger, 2004). Embora tenha se mantido no segundo nível de salinidade, o índice relativo de clorofila (Figura 1D) também diminuiu com o aumento nos níveis de sal, decrescendo 5 e 17,4% para a aroeira e pau-mocó, respectivamente, no maior nível quando comparado com o menor. Dessa forma, verifica-se que, embora não tenha havido interação significativa para os fatores espécies x salinidade para E, A e IRC, viu-se um comportamento semelhante ao observando para gs, com o pau-mocó se mostrando mais sensível ao aumento nos níveis de sal, diminuindo 57, 43,3 e 17,4%, respectivamente, enquanto que a aroeira diminuiu 24, 24,3 e 5% para a mesma seqüência de variáveis. CONCLUSÕES O pau-mocó apresentou maior transpiração, condutância estomática e fotossíntese líquida quando comparado com a aroeira. O estresse salino causou diminuição na transpiração, condutância estomática, fotossíntese líquida e teor relativo de clorofila de plantas de aroeira e pau-mocó, tendo o pau-mocó apresentado maior sensibilidade ao aumento nos níveis de sais no solo. AGRADECIMENTOS Os autores agradecem ao CNPq e ao INCTSal pelo financiamento desta pesquisa e ao CNPq, à CAPES e à FUNCAP pela concessão das bolsas de estudo. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BARBOSA, Z. 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