Aula de Filosofia Arthur Meucci © Liberdade Individual Ao contrário dos demais semestres o texto que segue não será usado para elaborar um fichamento. A leitura deste deve gerar um trabalho explicativo sobre seu conteúdo. Isto ocorrerá com o aperfeiçoamento de uma técnica chamada “leitura estrutural”, técnica esta imprescindível para a compreensão dos textos e discursos filosóficos. Como vocês puderam perceber durante o ano, os textos de filosofia possuem estruturas diferentes do texto jornalístico e literário. Ele envolve um grau maior de abstração e complexidade, o que torna a leitura difícil. Ao contrário de um texto de livro didático, o texto filosófico não explica diretamente os conceitos utilizados. Para entendê-los é preciso compreender todo o contexto da discussão. Há também uma lógica interna do texto que precisa ser aprendida para saber quais os procedimentos o autor utiliza para expor e justificar suas idéias. Tudo isso faz com que o texto possa se auto explicar. Para facilitar sua leitura, além de encontrar as idéias centrais do texto (como no fichamento), você pode responder o “guia de leitura” no final. Responder as perguntas pode ajudá-lo a explicar a discussão que o autor esta propondo. Não se limite em responder as perguntas! Jonh Staurt Mill (1806-1873), On liberty Assim como o princípio da liberdade individual não está inserido na doutrina do livre 1 2 comércio, assim também não o é na maior parte das questões que surgem a respeito dos 3 limites dessa doutrina, como, por exemplo, sobre qual soma de controle público é admissível 4 para prevenir a fraude por adulteração; até onde precauções sanitárias, ou disposições para 5 proteger os trabalhadores empregados em ocupações perigosas, devem ser impostas pelos 6 empregadores. Tais questões envolvem considerações sobre a liberdade somente na medida 1 7 que deixar o povo entregue a si mesmo é sempre melhor, coeteris paribus , do que o 8 controlar. Mas em principio é incontestável que possam ser legitimamente controladas em 9 vista de tais fins. De outro lado, há questões relativas à interferência no comércio que 2 10 constituem, essencialmente, questões de liberdade, tais como a lei do Estado do Maine já 11 referida, a proibição da importação de ópio na China, a restrição da venda de venenos, casos, 12 todos, em suma, nos quais a finalidade da interferência é impossibilitar ou dificultar que se 13 obtenha uma certa mercadoria. Essas interferências são impugnáveis, como infrações, não da 14 liberdade do produtor ou do vendedor, mas da liberdade do comprador. 1 Do latim, “tudo o mais permanece constante”. Tal termo é empregado para dizer que uma tese pode ser comprovada mantido um determinado conjunto de variáveis. 2 O Estado americano do Maine, 13º Estado a pedir sua independência em 1820. Em 1846 Maine ficou conhecida por ter instaurado uma lei que proibia a venda e o uso de bebidas alcoólicas. Foi a primeira lei de proibição e perseguição de bebidas alcoólicas, em toda história, que se teve noticia. O portador de bebida era preso por tempo indeterminado, além de ser exposto publicamente ao escárnio. Nota de Tradução. Espaço Ética (www.espacoetica.com.br) [email protected] Aula de Filosofia Arthur Meucci © 15 Um desses exemplos, o da venda de venenos, abre uma questão nova – os limites 16 convenientes daquilo que se pode chamar “as funções de polícia”. Trata-se de saber até que 17 ponto a liberdade pode ser legitimamente invadida para fins de prevenção do crime ou de 18 acidentes. É uma das funções inquestionáveis do governo tomar precauções contra o crime 19 antes da sua prática, tanto quanto a de investigá-lo e puni-lo depois. A função preventiva do 20 governo, entretanto, presta-se muito mais a abusos, em prejuízo da liberdade, que a função 21 repressiva; pois dificilmente se encontra aspecto da legítima liberdade de ação de um ser 22 humano que não possa ser concebido, em demasia, como um aumento de facilidades para uma 23 ou outra forma de delinqüência. Todavia, se uma autoridade pública, ou mesmo um particular, 24 vê alguém evidentemente preparando-se para cometer um crime, nem um nem outro são 25 obrigados a conservar-se inativos até que ele seja cometido, mas podem interferir para 26 impedi-lo. Se jamais comprassem ou utilizassem venenos para propósitos outros que o de 27 assassinar, justificar-se-ia proibir a sua fabricação e venda. Eles podem, contudo, ser 28 necessários não só para fins inocentes, como também para fins úteis, e não é possível impor 29 restrições num caso sem operarem no outro. De outro lado, é função própria da autoridade 30 pública a prevenção de acidentes. Se alguém foi visto, por um agente da autoridade ou outra pessoa qualquer, tentando 31 32 atravessar uma ponte sabidamente perigosa, e não houvesse tempo de adverti-lo do perigo, 33 essas pessoas podiam agarrá-lo e trazê-lo para trás sem lhe infringir realmente a liberdade: 34 pois a liberdade consiste em fazer o que se deseja, e ele não deseja cair no rio. Não obstante, 35 quando não há certeza, mas apenas perigo de um mal, ninguém, a não ser a própria pessoa, 36 pode julgar da suficiência do motivo que pode levá-la a correr o risco. Nesse caso, portanto - a 37 menos que se trate de uma criança, ou de um tresvariado, ou de alguém num estado de 38 excitação ou de absorção incompatível com o pleno uso da faculdade reflexiva -, deve-se 39 apenas, penso, adverti-la do perigo, e não impedi-la à força de se expor a tal mal. (MILL, John Stuart. On Liberty. London: Penguin classics, 1982. p. 169-171) Guia de leitura: 1) O que o autor entende por liberdade? 2) O que ele entende por liberdade individual? 3) Na linha 6, o que são “Tais questões”? 4) Linha 8-9, explique em que medida pode-se controlar o povo? 5) Em que medida a interferência no comércio compromete a liberdade? 6) Explique a posição de Mill referente à questão do álcool, ópio e veneno. 7) Por que a questão do veneno abre uma nova discussão? 8) Por que as ações preventivas do governo são, na maioria das vezes, abusivas e não preventivas? 9) Explique em que medida o governo pode proibir uma ação. 10) Explique os argumentos favoráveis e contrários, utilizados por Mill, para impedir uma pessoa que pretende passar numa ponte perigosa. 11) Quais as teses principais defendidas pelo autor? 12) Como ele as defende? Espaço Ética (www.espacoetica.com.br) [email protected]