CENTRO DE FORMAÇÃO DR. RUI GRÁCIO ASSOCIAÇÃO DE ESCOLAS DE LAGOS, ALJEZUR E VILA DO BISPO DISLEXIA – ABORDAGENS METODOLÓGICAS EM INGLATERRA E EM PORTUGAL Modalidade: Curso de Formação Nº de Horas: 15 Formadora (Portugal): Sílvia Sezília Maio de 2015 Ler é uma habilidade que nos permite aceder ao código escrito e cuja aparente simplicidade esconde processos cognitivos de grande complexidade. A aquisição da leitura não constitui uma aprendizagem natural e espontânea como sucede com a linguagem oral. Ela implica uma aprendizagem/ensino explícitos. A incapacidade de corresponder a um ou mais processos implicados na atividade leitora resulta na dificuldade ou impossibilidade de descodificar a mensagem escrita. Grande parte da informação veiculada em contexto escolar apresenta-se codificada num sistema alfabético que cada aluno deverá descodificar, processar e integrar. Neste sentido, ler é imprescindível para aprender. O entendimento da leitura como ato catalisador do sucesso pessoal e social torna a aquisição da lectoescrita, dentro do conjunto das aprendizagens que a criança faz quando inicia a escolarização, aquela que mais determina o seu percurso educativo. « O âmbito do domínio da leitura não se limita a um simples conhecimento disciplinar (…). O domínio da leitura é, de facto, um meio de apropriação e de construção de conhecimento nas diversas áreas do saber e (…) o não acesso a este poderoso meio de participação social conduz directa e vertiginosamente ao risco de exclusão» (Sim-Sim, 2002, p.14) «A retenção e o insucesso escolar vão alimentar-se da incapacidade de superar as dificuldades sentidas pelos maus leitores que acabam sempre por ser penalizados no seu percurso escolar e, consequentemente na aquisição de conhecimentos». (Sim-Sim, 2006, p.16) «A leitura é, sem dúvida, um instrumento de aquisição do saber, uma forma de comunicar, de partilhar informações, sentimentos e valores e é, em última instância, agente e promotora do desenvolvimento humano». (Carvalho, 2011, p. 14) PROCESSOS COGNITIVOS IMPLICADOS NA LEITURA DE PALAVRAS ROTA VISUAL Palavra escrita Representação visual na memória a longo prazo Associação Grafema-Fonema 9 Palavra falada Recodificação Fonológica ROTA FONOLÓGICA 7 Ramos, 2007 CONCEITO DE DISLEXIA «Dislexia é uma incapacidade específica de aprendizagem, de origem neurobiológica. É caracterizada por dificuldades na correção e/ou fluência na leitura de palavras e por baixa competência leitora e ortográfica. Estas dificuldades resultam de um Défice Fonológico, inesperado, em relação às outras capacidades cognitivas e às condições educativas. Secundariamente podem surgir dificuldades na compreensão leitora, experiência de leitura reduzida que podem impedir o desenvolvimento do vocabulário e dos conhecimentos gerais». Definição adotada pela Associação Internacional de Dislexia em 2003 TIPOS DE DISLEXIA DISLEXIA ADQUIRIDA DISLEXIA EVOLUTIVA/DESENVOLVIMENTO (perda da habilidade para ler) Fonológica (dificuldade no uso do procedimento subléxico por lesão cerebral) Superficial (dificuldade no uso do procedimento do léxico por lesão cerebral) Profunda (dificuldade no uso de ambos os procedimentos por lesão cerebral) (Cruz, 2009) (défice grave na aprendizagem da leitura) Fonológica (dificuldade na aquisição do procedimento subléxico por problemas fonológicos, percetivo-visuais e neurobiológicos) Superficial (dificuldade na aquisição do procedimento léxico por problemas fonológicos, percetivo-visuais e neurobiológicos Mista (dificuldade na aquisição de ambos os procedimentos por problemas fonológicos, percetivo-visuais e neurobiológicos DISLEXIA FONOLÓGICA A via fonológica /indireta encontra-se alterada (défice na aplicação das regras de correspondência entre grafemas e fonemas, ou seja, na via sublexical). A leitura é efetuada mediante a via lexical/direta (reconhecimento global das palavras). ROTA Capacidade de aceder à leitura de palavras regulares e irregulares (desde que familiares). Erros frequentes: Palavras desconhecidas, pouco familiares e pseudopalavras; DISLEXIA FONOLÓGICA Grafemas compostos como “ch”, “gu”, “qu”(guitarra gitarra/ gu-itarra); Sílabas inversas (VC) e complexas (CCV, CCVC, CCVCC); Inversões: alteração da posição relativa das letras (e.g. confusão /loba/ /bola/); Omissões: omissão de letras mediais ou finais de uma palavra (e.g. /livro/ /bonecas/ /boneca/); Adições: adição de letras inexistentes numa palavra (e.g. /mesa/ /livo/ ou /mensa/); Substituições: troca de letras (e.g. /v/ e /f/); Rotações: rotação de letras (e.g. /b/ por /p/ ou /b/ por /q/). (Casas, 1988 in Cruz, 2009) DISLEXIA SUPERFICIAL A via lexical/direta encontra-se alterada (défice no reconhecimento global das palavras, na precisão percetivo-visual e na discriminação visual). A leitura é efetuada mediante a via fonológica (sublexical/indireta) ROTA Reconhecimento das palavras é efetuado mediante o som; Incapacidade de reconhecer uma palavra como um todo; Capacidade de ler pseudo-palavras; Acesso ao léxico é guiado pelo som e não pela ortografia das palavras (dificuldade em palavras homófonas “coser” e “cozer” quando isoladas/fora de contexto); Erros de adição, omissão ou substituição e na discriminação visual das letras e.g. (/h/ e /n/, /n/ e /m/, /f/ e /t/). DISLEXIA MISTA Estão afetados os procedimentos de identificação e reconhecimento implicados nas rotas visual e fonológica . Erros: De base auditivo-fonológica; De base visuo-espacial; De significado (paraléxias): /praia/ /mar/, /carro/ /veículo/ (estabelecem-se associações de significado apoiando-se no contexto, recuperando palavras frequentes e de fácil pronunciação). Défices nos processos cognitivos e habilidades metalinguísticas envolvidas na leitura, determinam comprometimentos a nível da descodificação, do processamento e da automatização. Implicações em tarefas que envolvam a compreensão e interpretação de textos escritos (decorrente de dificuldades em proceder a uma leitura fluente e compreensiva). O elevado esforço implicado na descodificação correta das palavras, compromete significativamente a compreensão leitora. INTERVENÇÃO/REEDUCAÇÃO «As crianças com dislexia apresentam uma “disrupção” no sistema neurológico que dificulta o processamento fonológico e o consequente acesso ao sistema de análise das palavras e ao sistema de leitura automática». (Paula Teles, Dislexia: Como identificar? Como intervir?, 2004, p. 6) CONSCIÊNCIA FONOLÓGICA «A especificação do papel do processamento fonológico nas fases iniciais da aprendizagem da leitura é uma das mais notáveis histórias de sucesso científico da década passada». (Stanovich, citado por Viana, 2006, p.7) «A consciência fonológica e a aprendizagem da leitura parece ser uma relação recíproca e interactiva». (Sim-Sim, Silva e Nunes, 2008, p.53) CONSCIÊNCIA FONOLÓGICA Habilidade para tomar consciência e manipular sílabas e fonemas Habilidade metalinguística a que se atribui o fundamento da aquisição do princípio alfabético (correspondência grafo-fonémica) e da capacidade de proceder à fusão silábica para a leitura de palavras. «Da prática educacional, terapêutica e científica, extrai-se recorrentemente a mesma conclusão: dificuldades na aprendizagem da leitura e da escrita estão associadas ao fraco desempenho em tarefas que evocam a consciência fonológica dos falantes. O trabalho sobre a consciência fonológica na escola, realizado desde cedo e generalizado a toda a população infantil permitirá (…) promover o sucesso escolar, funcionando como medida de prevenção do insucesso na leitura e na escrita». (Freitas, Alves e Costa, 2007, p. 8) PRCF APRENDIZAGEM MULTISSENSORIAL Procedimentos suportados essencialmente por um programa fonológico (aprendizagem explícita de unidades básicas de sons, compostas por letras individuais ou por combinações de letras; Técnicas que fazem recurso da memória visual, auditiva, articulatória, táctil, grafomotora e rítmica. «A leitura e a escrita são actividades multissensoriais. As crianças têm que olhar para as letras impressas, dizer, ou subvocalizar, os sons, fazer os movimentos necessários à escrita e usar os conhecimentos linguísticos para aceder ao sentido das palavras. São utilizadas em simultâneo as diferentes vias de acesso ao cérebro; os neurónios estabelecem interligações entre si facilitando a aprendizagem e a memorização» Teles, 2004 BIBLIOGRAFIA Carvalho, Anabela de Oliveira Duarte da Cruz (2011). Aprendizagem da leitura – processos cognitivos, avaliação e intervenção. Viseu: PsicoSoma. Citoler, Silvia Defior e Sanz, Rolando Ortúzar (1999). A leitura: Avaliação e intervenção educativa. In Rafael Bautista (coordenação), Necessidades educativas especiais. Lisboa: Dinalivro. Cruz, Vitor (2009). Dificuldades de Aprendizagem Específicas. Lisboa: Lidel. Esteves, Sandrina (2013). Fluência na leitura – Da avaliação à intervenção. Viseu:PsicoSoma. Ferreira, Rosa Maria e Santos, Matilde Martins (2013). Dislexia – Atividades práticas de intervenção. Porto: Porto Editora. Freitas, M.J, Alves, D., Costa, T. (2007). O Conhecimento da Língua: Desenvolver a Consciência Fonológica. Lisboa: DGIDC – Ministério da Educação. Rios, Catarina (2013). Programa de promoção do desenvolvimento da consciência fonológica. Viseu: PsicoSoma. Santos, M. (coord.), Neves, J., Lima, M. e Carvalho, M. (2007). A Leitura em Portugal. Lisboa: Gabinete de Estatística e Planeamento da Educação – Ministério da Educação. Sim-Sim, Inês (coord.) (2006). Ler e ensinar a ler. Porto: Edições ASA. Sim-Sim (2007). Formar Leitores: A Inversão do Círculo in Viana, L. (coordenação) Leitura, Literatura Infantil e Ilustração. Braga: Bezerra Editora. Sim-Sim, I., Silva, A., Nunes, C. (2008). Linguagem e Comunicação no Jardim de Infância. Lisboa: DGIDC – Ministério da Educação. Sucena, A. e Castro, S. (2008). Aprender a Ler e Avaliar a Leitura. Coimbra: Edições Almedina. Teles, Paula (2004). Dislexia: Como Identificar? Como Intervir? In revista Portuguesa de Clínica Geral. Torres, M.ª Rivas Torres e Fernandéz, Pilar (2001). Dislexia, disortografia e disgrafia. Lisboa: McGraw-Hill.