Curadora Educacional
Stela Barbieri
Escola de Comunicações e Artes - USP
Departamento de Artes Plásticas
Maria Christina de Souza Lima Rizzi
Entrevista com Iveta Maria Borges Ávila Fernandes1.
Pesquisadora: Amélia Natalina Constante Garcia2.
Projeto educativo em espaços expográficos: construção de história e conhecimento
A arte é um rio cujas águas profundas irrigam a humanidade com um saber
outro que não o estritamente intelectual e que diz respeito à interioridade de
cada ser. A vida humana se confunde, em suas origens, com as
manifestações artísticas: os primeiros registros que se tem de vida
inteligente sobre a terra são justamente as manifestações artísticas do
homem primitivo.
Ana Mae Barbosa
Durante anos lemos sobre pessoas que lutam incansavelmente pela democratização dos saberes, da arte, da
cultura e, consequentemente, pela cidadania plena dos indivíduos.
Essas pessoas nos provocam e nos transformam com suas idéias e seus ideais. Firma-se entre aquele que lê e
aquele que escreve uma parceria invisível e fruidora que alarga ações de cumplicidade entre o espectador, o
texto e o autor. Assim, pouco a pouco, nos grudamos nas palavras e nos sentidos que elas nos trazem e
mergulhamos nas mudanças que, inevitavelmente, se seguem, de diferentes maneiras. Desde a forma de
pensar, sentir, olhar, perceber e entender o nosso contexto, até a forma de estar no mundo.
Certo dia, quando já acoplados a muitos textos e outros tantos autores, nos deparamos com um deles.
Percebemos que estamos ali, frente a frente com os nossos cúmplices, com os quais construímos nosso
conhecimento.
Uma dessas pessoas é a Professora Iveta. Uma arte educadora que esteve sempre à frente de seu tempo e
que, por diversas vezes, ocupou lugares em que lhe foi possível democratizar o acesso à cultura, à educação e
à arte.
1
Doutora pela FEUSP, mestre em Artes e Especialista em Arte Educação pela ECA/USP e em Interpretação e Técnica
Pianística com o Maestro e compositor Souza Lima e Iniciação Musical na Escola Superior de Música Santa Marcelina.
2
Mestre em Artes Visuais pela UNESP - Júlio Mesquita Filho (2008), Campus de São Paulo, possui Graduação em Educação
Artística pela Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Jales (1986), Graduação em Pedagogia pela Faculdade de
Educação Antonio Augusto Reis Neves - Barretos (1989), Especialização em Didática Construtivista pela Faculdade Dom
Bosco de Monte Aprazível (1991). Especialização em Formação de Formadores em Educação de Jovens e Adultos- Educação
Continuada pela Universidade de Brasília-UnB (2004). Atualmente atua como Analista Pedagógico do Serviço Social da
Indústria SESI-SP, responsável pela formação continuada dos professores de Arte e pelo Material Didático da rede escolar
SESI-SP. Contato: [email protected].
Trabalho desenvolvido na disciplina CAP 5083 sob orientação da
Profª. Drª. Maria Christina de Souza Lima Rizzi - Coordenadora da Licenciatura em Artes Plásticas e Docente do Programa de
Pós-Graduação em Artes Visuais, ECA-USP.
1º. Semestre de 2010
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Stela Barbieri
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Departamento de Artes Plásticas
Maria Christina de Souza Lima Rizzi
Iveta despertou-me para a crença de que a arte, além de poder ser apreciada nos museus, galerias ou
exposições, que são instituições que abrigam e compartilham “tesouros”, também é possível ser compartilhada,
em igual importância e sentidos, nas ruas, nos shows, nos espetáculos de dança, nos circos, cinemas, praças,
em manifestações culturais, religiosas, entre tantos outros lugares e formas diferentes.
Por meio de seus textos fui percebendo a importância da educação e da escola para todos os indivíduos. A
educação, por intermédio da escola, propicia o exercício da cidadania plena, por estar num dos lugares que
abriga o conhecimento, pois, no processo de ensino-aprendizagem, entre professor e aluno, “desinterdita” o
conhecimento. Ao fazê-lo, proporciona à sociedade o desenvolvimento artístico e cultural de qualidade e o
entendimento de significados, por parte dessa sociedade, pois o que determina uma sociedade artisticamente
desenvolvida é sua capacidade de entendimento das produções artísticas e culturais e seu livre acesso a elas.
Acredito que tenha sido esse o desejo da Professora Iveta, quando em 1998, como responsável do Projeto
Educação Pública na 24ª Bienal de São Paulo, promove a articulação Escola-Bienal e participa ativamente como
uma das idealizadoras do projeto e espaço educativo dessa edição da Bienal de São Paulo, promovendo
espaços e ações para arte-educadores. Em princípio, o público esperado era da cidade de São Paulo e das
cidades do Interior, depois acabou por abranger arte-educadores de outros estados e de outros países,
conforme palavras da própria Iveta: “[...] a sala educação acabou atendendo muitos estados do Brasil [...] a
gente chegou à maior parte do Brasil com a sala educação e vários outros países que tinham passado na
Bienal”.
Na 24ª Bienal de Arte da cidade de São Paulo a professora Iveta foi uma das arte-educadoras que mais
influenciaram na elaboração e desenvolvimento do projeto educativo. No planejamento e ação, suas ideias e,
como ela mesma conta, “seus sonhos” foram estudados e aprovados pelos então responsáveis pela Bienal.
Assim, teve início um trabalho pioneiro para os profissionais da educação de um modo geral. Começou, em
princípio, com a ideia de um espaço que atendesse e subsidiasse os arte-educadores da capital, das cidades
próximas e os profissionais do interior do estado. Esse era o projeto inicial. Depois, com o próprio movimento e
empenho dos professores, tanto os colaboradores, quanto os participantes, e a dedicação e incansável trabalho
com a área da educação, da professora Iveta, o leque naturalmente se abriu e houve um interesse e procura
muito grandes por esse espaço, o que possibilitou a integração entre as áreas da educação, os profissionais da
escola, que são os que subsidiam as participações de todos, professores, coordenadores, pedagogos, visitantes
e todos que estivessem participando da Bienal.
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Pós-Graduação em Artes Visuais, ECA-USP.
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Apesar do projeto, em princípio, estar voltado para as redes públicas, estadual e municipal de São Paulo, as
interligações que foram construídas abrangeram outros estados e outros países. Após o término da 24ª Bienal a
professora Iveta, na busca por um registro coerente e avaliativo de todo o processo do projeto educativo,
continuou, nos meses que se seguiram, a montar um histórico com a trajetória do educativo e os dados de
pesquisa alcançados. Nesta ocasião, doa este material de registro ao acervo da Bienal Internacional de Arte de
São Paulo, numa tentativa ímpar de registrar a história do educativo da 24ª Bienal.
Ao ouvi-la, em entrevista realizada num sábado de inverno, no mês de agosto de 2010, em sua acolhedora
casa, com “cheiro de música”, pude entender o quanto aquela educadora influenciou minhas práticas
pedagógicas a partir da 24ª Bienal de São Paulo, no espaço para formação de professores, onde fui uma das
professoras que trouxe do interior os alunos e os sonhos todos acoplados na alma.
Entre as suas memórias da 24ª Bienal, está, antes de tudo, a emoção de perceber que os arte-educadores
tinham muita sede de ocupar o espaço que ela havia pleiteado - “[...] a gente precisava ter uma sala educação
[...] ter conseguido, junto aos organizadores e a imensa quantidade de informação, parcerias com editoras,
professores voluntários, entre outras pessoas para essa edição da Bienal de São Paulo”.
Foi ao falar do como aconteceu a sua aproximação com a arte, da infância feliz das brincadeiras e dos cantos,
como ela mesma conta: - [...] tempo de criança, através da brincadeira cantada [...] a gente brincava e
cantava [...] as brincadeiras eram uma delícia: Margarida está no castelo, ela evoca uma imagem muito linda
[...] imagem poética muito bonita [...] entra no imaginário cantando [...], - o brilho em seus olhos é
perceptível, acompanhado ao brilho, uma luz clara e radiante, do conhecimento e da propriedade com que
relata seus sonhos e sua trajetória enquanto arte educadora.
A forma como conta sua história envolve a todos que participam da entrevista. É nítido e emocionante perceber
que na 24ª Bienal aconteceu uma ”overdose“ de arte e cultura com todos os que participavam, com todos que
vinham de e iam para seus locais de trabalho, abastecidos com as propostas que Iveta ousou sonhar e realizou
nesta Bienal.
Nessa Bienal, participei, vivenciei e aprendi na mesma proporção de emoções com que ela também vivenciou
as experiências estéticas que essa edição propiciou. Foi a minha primeira Bienal e ela se tornou uma das
maiores referências na minha formação, por meio dos catálogos, das experiências vividas, dos relatos de
experiências trocados no espaço dos educadores, das obras com que interagi e também aquelas que só
observei... Eram tantas reflexões diante delas que os olhos pousavam em cada detalhe, os meus e de todos os
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meus alunos que comigo viveram a experiência: as cidades grandes, distantes dos nossos lares, o ponto de
partida e de chegada para cada um de nós que viemos de lugares tão diferentes. Durante a entrevista, ao ouvila, retornam as lembranças... As dela e as minhas se fundem, não foi uma Bienal “rasa”, tudo se adequava ao
formato do que vivíamos à época. Hoje, a Bienal de São Paulo traz um modelo novo de curadoria, novas ideias
e novos espaços educativos, terreiros, artistas e pessoas, que se adaptam à forma que artística e socialmente
exige o presente. Como, incansavelmente, defendem muitos arte-educadores e Tourinho (2003) em especial “a
Arte não está em busca de soluções, e sim em busca de provocações”.
Uma mostra como a Bienal de São Paulo não necessita mais ser uma resposta aos debates no campo da arte.
No contexto atual se torna mais uma das possíveis respostas, dentre muitas. Iveta já sabia disso, viveu uma
trajetória toda, tem, em seus registros da 24ª Bienal, todas essas reflexões. Como o universo não para,
homens e mulheres brilhantes e comprometidos com a arte também não, e realizam nesta 29ª edição uma
Bienal sonhada há anos e já iniciada nas ideias e sonhos de Iveta, quando, em 1998, propôs um espaço
educativo dentro desse universo que é a Bienal de São Paulo. As experiências estéticas vivenciadas ao longo de
sua história de vida e formação continuada, suas ações pedagógicas como educadora, suas escritas
acadêmicas, seu olhar de inclusão educacional e artística é real e faz parte da sua essência, pois é
reconhecidamente sua paixão pela música e seu conhecimento que a forma e dá contornos a esta arte
educadora cujo semblante é de paz e movimentos, de artista.
Dedicatória à Professora Iveta Maria Borges Ávila Fernandes:
[...] a música pode, ao penetrar no homem, romper barreiras de todo tipo,
abrir canais de expressão e comunicação e induzir a modificações
significativas na mente e corpo.
GAINZA, V. H., 1998.
Trabalho desenvolvido na disciplina CAP 5083 sob orientação da
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