BRASIL
A CONSTRUÇÃO DE UMA POLÍTICA PÚBLICA DE
PROMOÇÃO DA SAÚDE NO CONTEXTO ESCOLAR:
UM RELATO DA EXPERIÊNCIA BRASILEIRA
Clélia Maria de Sousa Ferreira Parreira, Educadora, Assessora Técnica do Projeto
de Promoção da Saúde, da Secretaria de Políticas de Saúde do Ministério da Saúde
A adoção do conceito de promoção da saúde, como elemento redirecionador das políticas
do Ministério da Saúde, impõe a necessidade de se sistematizar, em conformidade com os princípios do Sistema Único de Saúde, propostas intersetoriais que provoquem ou reforcem o desenvolvimento de ações com os mais diferentes setores.
O setor educacional, no entanto, dada a sua capilaridade e a sua abrangência é, potencialmente, um aliado importante para a concretização de ações de promoção da saúde voltadas
para o fortalecimento das capacidades dos indivíduos para a tomada de decisões favoráveis à
sua saúde e de sua comunidade, para a criação de ambientes saudáveis e para a consolidação
de uma política intersetorial voltada para a qualidade de vida, pautada no respeito ao indivíduo e tendo como foco a construção de uma nova cultura da saúde.
Para tanto, é importante implementar estratégias integradas de aproximação com o sistema educacional, suas unidades de ensino e suas representações políticas, sem deixar de considerar como essencial a formação e qualificação docentes, posto que a expectativa que se tem é
a de que estas estratégias fomentem à adoção de hábitos de vida mais saudáveis e promovam
as mudanças individuais e organizacionais necessárias.
O Ministério da Saúde do Brasil compreende, por um lado, que o período escolar é fundamental para se trabalhar a saúde na perspectiva de sua promoção, desenvolver ações voltadas para a prevenção de doenças e para o fortalecimento dos fatores de proteção. As crianças,
jovens e adultos que se encontram nas escolas vivem momentos em que os hábitos e as atitudes estão sendo criados e, a depender da idade ou da abordagem, estão sendo revistos. Por
outro lado, ele reconhece que além da escola ter uma função pedagógica que lhe é específica
ela tem uma função social e política voltada para a transformação da sociedade.
Transformação que está intrinsecamente relacionada ao exercício da cidadania e ao acesso às
oportunidades de desenvolvimento e de aprendizagem, razões que justificam o investimento
do MS em ações voltadas para a comunidade escolar como uma das formas de dar concretude
às propostas de promoção da saúde no País.
No Brasil, de acordo com o Censo Escolar 20011, existem 451.062 escolas no País. É um
quantitativo expressivo de alunos matriculados e a grande concentração delas está no âmbito
1 Fonte: Censo Escolar, do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais.
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do ensino fundamental, ensino médio e educação de jovens e adultos, cujos estudantes encontram-se em idades privilegiadas para a formação de valores e hábitos favoráveis à saúde. Nesta
rede de escolas, no entanto, destaca-se o predomínio de escolas públicas. Das 177.880 escolas
do ensino fundamental, 159.228 são da rede pública de ensino. O mesmo ocorre no ensino
médio, onde das 20.220 escolas, 13.916 são públicas; e com a educação de jovens e adultos em
que das 30.554, 28.481 são públicas. Este quadro, sugere que uma ação direcionada para esta
rede pública de ensino, terá uma abrangência excepcional, tanto do ponto de vista geográfico
quanto populacional. De acordo com os dados preliminares do Censo Escolar 2002, foram
registradas 89.776.363 matrículas nas diferentes escolas e níveis de ensino, sendo que
70.467.992 delas foram efetivadas no ensino fundamental, 8.783.737 no ensino médio e
3.792.738 na educação de jovens e adultos. É um público que demanda ações educativas em
saúde e merece o desenvolvimento de ações integradas e coesas para que se alcance sucesso e
impacto.
De acordo com dados da Área Técnica de Saúde do Adolescente e do Jovem da Secretaria
de Políticas de Saúde do MS, mais da metade da população mundial tem menos de 25 anos de
idade sendo que no caso brasileiro, a população entre 10 e 24 anos representa um terço da
população geral, o que significa mais de 51 milhões de jovens. A situação da juventude brasileira merece atenção especial uma vez que já se dispõe de dados que apontam para o crescimento do número de mortes decorrentes da violência2, do aumento do desemprego3, da gravidez precoce4, do número de casos de doenças sexualmente transmissíveis5, do envolvimento
desta população com drogas e seu tráfico. Somente para se ter uma idéia do impacto da violência neste grupo populacional, a depender da Região, mais de 70% desses jovens morrem
vítimas de causas externas (homicídio, agressão, acidente de trânsito e suicídio) e o número
destes jovens que já teve algum tipo de relação com drogas e, por esta razão, encontra-se em
algum tipo de medida sócio-educativa, é expressivo.
Uma estratégia direccionada para esta população que pretende ter
alcance significativo precisa estar associada à escola, onde grande parte
dela se encontra
Neste sentido, foi assinada a Portaria Interministerial 766/GM, de 17 de maio de 2001, cujo
objetivo é a elaboração dos Parâmetros Curriculares Nacionais em Ação para os temas transversais Saúde e Orientação Sexual. Com esta pactuação, os Ministérios da Saúde e da Educação
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2 De acordo com os dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM, do Ministério da Saúde, 16.133 jovens entre 10
e 19 anos morrem por causas externas. Destas, destacam-se as agressões (6.865), os acidentes de transporte (3.847), os afogamentos (1.743), os eventos indeterminados (1.515) e os suicídios (698).
3 A taxa de desemprego entre jovens é superior a 13%, enquanto a média brasileira é de 7,5%.
4 Segundo dados do DATASUS, em 1993 haviam sido feitos 2.856.255 partos, dos quais 26.505 em meninas de 10 a 14 anos e
611.608 em jovens entre 15 e 19 anos. Estes números aumentam significativamente com o passar dos anos e, de acordo com a
mesma fonte, em 2000 dos 2.504.654 partos realizados, 32.486 foram de meninas entre 10 e 14 anos e 646.801 em jovens entre
15 e 19 anos.
5 Segundo o Boletim Epidemiológico (Ano XIII, nº 1 – Dez/99 a Jun/00) no total geral de infectados no Brasil, 24.261 estão entre
os 10 e os 24 anos. Os casos de AIDS nesta população já apontam para um índice de 11,7% do total dos casos para os jovens e
16,2% para as jovens nesta faixa etária.
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deram um passo importante para a implementação de uma ação integrada que terá, de início,
o alcance de 2.779 municípios que já aderiram ao Programa Parâmetros Curriculares
Nacionais em Ação. O Programa6 conta com uma Rede Nacional de Formadores composta de
167 consultores contratados, que atuam nos 301 pólos de formação constituídos. Os números
que expressam a abrangência da execução do Programa apontam para 20.815 coordenadores
de grupos e para 384.109 professores distribuídos em todo o território nacional.
Para a implementação desta estratégia de ação intersetorial, estão sendo agregadas as instâncias políticas de ambos os setores – saúde e educação – na elaboração, execução e avaliação
desta iniciativa conjunta (Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Educação, da União
Nacional dos Secretários Municipais de Educação, do Conselho Nacional de Secretários
Estaduais de Saúde, do Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde) e da
Organização Pan-Americana de Saúde no Brasil.
A elaboração coletiva dos Parâmetros Curriculares Nacionais em Ação Saúde é um marco e
uma concretização de um desejo de que se possa pensar a educação e a saúde sob uma ótica
mais integradora. A expectativa que temos, ao elaborarmos os Parâmetros é a de participarmos
da formação continuada dos professores, contribuindo para a construção de uma nova cultura da saúde, na qual a educação e a saúde tenham sentidos e significados mais integrais e que
resultem na elaboração de projetos de vidas mais saudáveis.
No entanto, os Parâmetros, para que possam ser trabalhados em sala de aula, precisam
desencadear uma reflexão sobre as práticas de saúde dos próprios professores, alunos, funcionários e comunidade escolar. Afinal, as sugestões contidas nos Parâmetros, mais do que orientações metodológicas, são contribuições para que o professor possa dar sentido às questões de
saúde que o rodeiam. É no cotidiano escolar e na escola, como espaço privilegiado de formação, que as relações - sejam com o conhecimento, com os grupos de alunos, de pais, de professores e com a comunidade – acontecem.
Na perspectiva da promoção da saúde, os processos educativos têm como principais eixos
a construção de vidas mais saudáveis e a criação de ambientes favoráveis à saúde, o que significa conceber a educação como processo. Processo este que trata o conhecimento como algo
que é construído e apropriado e não meramente como algo a ser transmitido. Conhecimento,
por sua vez, que é fruto da interação e cooperação entre sujeitos que são diferentes, que trazem
experiências, interesses, desejos, motivações, valores e crenças que são únicas, singulares, mas
que são, ao mesmo tempo, plurais, e por isso diversas. Um conhecimento que é incompleto e
histórico.
No entanto, a educação e a saúde, como campos de conhecimentos e de práticas, têm sido
consideradas a partir de suas especificidades, o que tem feito com que a educação seja associada à escola e aos processos de aprendizagem; e a saúde, por sua vez, seja mais identificada com
os serviços de saúde e aos processos de adoecimento. Tal concepção vem fazendo com que as
ações educativas sejam incorporadas às práticas em saúde exclusivamente do ponto de vista
instrumental de modificar comportamentos individuais e a saúde seja vista apenas como a
prestação de assistência aos educandos, sobretudo àqueles que apresentam alguma limitação
ou deficiência na sua aprendizagem escolar.
6 Fonte: Secretaria de Educação Fundamental, Ministério da Educação, Fevereiro/ 2002, dados referentes a 2001.
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Se vista de uma forma mais ampliada, a relação entre saúde e educação vai além de ações
pontuais, passando a estabelecer um outro ponto de interseção, o que permite uma maior integração dos saberes acumulados por tais campos, posto que os processos educativos, assim como
os processos de saúde e doença, incluem, igualmente, tanto conscientização e autonomia quanto
a necessidade do desenvolvimento de ações coletivas e de fomento à participação. Ambas perspectivas, de educação e de saúde, vêm sendo revistas no sentido de diminuir a fragmentação presente tanto na abordagem quanto na produção do conhecimento e no desenvolvimento das práticas sobretudo as que envolvem as ações educativas no contexto da promoção da saúde.
Assim como a aprendizagem, a saúde envolve movimentos e mobilização de recursos
internos e externos e para que o professor seja capaz de organizar e estimular situações de
aprendizagem e gerar a progressão desses processos, ele terá, certamente, que mobilizar também seus recursos internos e externos. Quando se propõe a reflexão sobre a concepção de
saúde que cada um tem, pensamos que isso, para ser efetivo, precisaria implicar em uma reflexão sobre a saúde dos próprios professores, seja individualmente ou coletivamente. O estresse diário dos docentes, o esforço repetitivo que o cotidiano exige, o enfrentamento de situações dramáticas e de sofrimento, parecem não ser objeto de discussão e de reflexão no ambiente
escolar. A busca do equilíbrio e da superação dos sentimentos gerados pelas dificuldades e
situações estressantes, sejam as aflições ou os dilemas éticos colocados pela própria profissão,
aparecem de forma isolada, retirando a possibilidade do grupo rever a própria dinâmica escolar, resultando na procura individualizada de ajuda nos consultórios médicos ou nos grupos de
apoio. Se pensamos um escola promotora de saúde, precisamos incluir, necessariamente, esta
idéia de saúde, de estar saudável, que parece não estar associada ao bem-estar docente. Por isso,
levantar como esta concepção foi sendo construída ao longo das histórias de vida de cada um,
significa repensar esta mesma construção tanto no grupo de professores quanto avançar na
discussão coletiva sobre a construção de vidas mais saudáveis.
Para se promover saúde não é suficiente informar. Para que isso aconteça é necessário uma
relação dialogal, uma comunicação emancipadora, onde os sujeitos sejam envolvidos numa
ação educativa, formativa e criativa, levando em conta a necessária reconstrução do saber da
escola e a formação continuada dos docentes. Se por um lado, promover saúde implica ou
requer ter paz, educação, alimentação, renda, ecossistema saudável, recursos sustentáveis, justiça e eqüidade, por outro lado, desenvolver ações de promoção da saúde no contexto escolar
passa pelo respeito às possibilidades e limites do corpo, do intelecto e das emoções, da participação social e do estabelecimento de alianças.
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Hoje, sabe-se mais sobre ensino-aprendizagem da mesma forma que se sabe mais sobre
saúde e doença do que na época em que os programas de saúde eram verticais e obrigatórios
pelo currículo, período em que as ações de saúde no contexto escolar estavam dirigidas basicamente para a higiene pessoal. Em que pese a importância dessas ações, hoje a saúde deixa de
ser uma ação isolada ou um conteúdo específico e passa a ser um tema transversal, dada a sua
urgência e importância social.
A saúde, na sua inteireza, assim como os demais temas transversais apontados pelos
Parâmetros Curriculares Nacionais - a pluralidade cultural, a ética, a orientação sexual, a cidadania, o meio ambiente, o trabalho e o consumo - lida com as condições concretas dos sujeitos e das comunidades e, exatamente por isso, são complementares e interdependentes. Neste
sentido, é impossível discutí-los como se fossem conceitos isolados. No cotidiano escolar estes
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temas emergem nas situações concretas de violência, de preconceito, nos momentos de tomada de decisões, nas interações e na organização dos rituais e das festas, nos impasses entre pessoas e grupos, nos conteúdos dos textos e materiais de estudo e de trabalho.
O sentido do trabalho escolar está em lidar com os valores, as crenças, os mitos e as representações que se tem sobre a própria relação do saber-fazer-ser educador e educando. Por isso
é importante organizar e estimular situações de aprendizagem nas quais a saúde possa ser compreendida como direito de cidadania e um pressuposto ético, valorizando as ações voltadas
para a sua promoção. Uma promoção da saúde entendida como sendo determinada por muitos fatores que não se limitam aos fatores biológicos e que podem estar interagindo de diversas maneiras. Têm momentos em que nos angustiamos e por isso nos sentimos fracos para
lidar com as dificuldades, com as limitações. Existem momentos em que, ainda que estejamos
acometidos por alguma doença, temos força para reagir e continuar em frente, positivamente.
Isso demonstra as múltiplas faces dessa condição de estar saudável ou estar doente e se o professor lida com as questões de saúde e doença reconhecendo tal complexidade, ele irá lidar com
as questões de saúde e de doença de uma maneira diferenciada.
Promover saúde é tocar nas diferentes dimensões humanas, é considerar a afetividade, a
amorosidade e a capacidade criadora e a busca da felicidade como igualmente relevantes e
como indissociáveis das demais dimensões. Por isso, a promoção da saúde é vivencial e é colada ao sentido de viver e aos saberes acumulados tanto pela ciência quanto pelas tradições culturais locais e universais.
Criar momentos de debates sobre fatores desfavoráveis à saúde presentes nas realidades
dos alunos e da comunidade escolar, mobilizando projetos, ações, com relação à saúde individual e coletiva, considerando a saúde sob seus diferentes aspectos, é possível quando se favorece o desencadear do desejo de conhecer e utilizar os recursos da própria localidade voltados
para a promoção da saúde e para a atenção à doença. Os serviços que podem contribuir para
esta promoção não se limitam aos serviços de saúde. Dispomos de uma rede de apoio que, nas
mais diferentes formas e instâncias, são fundamentais nesta promoção. São os conselhos de
saúde, de direitos da mulher, de cidadania, de defesa da criança e do adolescente, tutelares,
associações de moradores, de pescadores, de domésticas, de professores, grêmios estudantis,
movimentos ligados a partidos políticos ou às igrejas e tantos outros. São inúmeras as formas
e os nomes que compõem tais redes e elas serão potencializadas quanto mais as ações forem
intersetoriais.
No entanto, mobilizar recursos, no nosso entendimento, significa não somente envolver
estas redes ou os setores governamentais e não-governamentais em ações institucionais no
campo da saúde. Significa participar, a partir dos diferentes espaços que dispomos, da construção de um projeto que tem como horizonte a qualidade de vida de todos e de cada um.
Tanto para o educando quanto para o educador o exercício de troca, de diálogo, de embates,
de compartilhamento de saberes e fazeres, da crítica da realidade, possibilitará a construção da
autonomia, da solidariedade e da cooperação cidadã e se manifestará na redefinição dos eixos
temáticos para as diferentes áreas e na eleição das abordagens e dos conteúdos. Esta mobilização de recursos, que em um primeiro momento tem o local como ponto de partida, vai sendo
alargada e alcançando dimensões mais amplas e incorporando outras redes do município, do
estado, da região, do país, do continente, tomando, na perspectiva mais global, uma dimensão
planetária.
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REDE DE ESCOLAS PROMOTORAS DE SAÚDE
NO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO:
UMA AÇÃO LOCAL FORTALECIDA PELA RLEPS
Carlos dos Santos Silva, Médico. Mestre em Pediatria. Gerente do Programa de Saúde Escolar
da Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro.
Introdução
O município do Rio de Janeiro é uma cidade metrópole de referência como pólo cultural,
político e cientifico do Brasil, marcada pela diversidade sócio cultural e por contrastes econômicos das grandes metrópoles; tem cerca de 6 milhões de habitantes, entre os quais quase 2
milhões são de crianças e adolescentes na faixa etária de 0 e 19 anos. Possui uma rede municipal de educação que consta de 1.035 escolas e cerca de 700.000 alunos, da educação infantil e
ensino básico fundamental e uma rede municipal de saúde, que em gestão plena, possui cerca
de 116 unidades básicas de saúde e 25 hospitais.
Na década de 90, imprimiu-se ao Programa de Saúde Escolar deste município uma proposta de atenção integral à saúde da criança e do adolescente em idade escolar fundamentando sua organização numa perspectiva crítica e no escopo da política de saúde definida pela
Secretaria Municipal de Saúde.
Os objetivos deste Programa firmaram-se pela Macrofunção de Políticas Sociais da
Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro, que ratificou a importância da atuação integrada entre
os diversos setores do Governo, por articular o trabalho e a intervenção de órgãos e gestores
afinados na condução das políticas públicas como particularmente, as de Saúde, de Educação
e de Desenvolvimento Social.
Diferente de propostas verticais e modelos médico-terapêuticos, essencialmente assistenciais e medicalizantes, o gerenciamento do Programa de Saúde Escolar do município do Rio de
Janeiro se conduziu, nos últimos anos, na ótica da Iniciativa de Escolas Promotoras de Saúde
o que veio favorecer no espaço da escola, uma ação mais reflexiva e crítica do conceito de
Saúde, com prioridade para os investimentos na promoção de saúde como melhoria da qualidade de vida da comunidade escolar e com desenvolvimento de ações locais participativas.
Antecedentes
A observação dos antecedentes da formação de uma rede municipal de Escolas Promotoras
de Saúde no Rio de Janeiro aponta a importância estratégica de organização de uma Rede
Latino-americana de Escolas Promotoras de Saúde como ponto de incentivo ao desenvolvimento de trabalho de redes locais e municipais, como esta.
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A publicação, em 19951, de diretrizes de uma proposta de Saúde Escolar para o município
do Rio de Janeiro, que assinalavam três eixos básicos como: educação e saúde; desenvolvimento e aprendizagem; e participação popular; e propunham ações na escola por integração intersetorial e formação de grupos de trabalho regionais e locais, data das primeiras publicações
sobre Escolas Promotoras de Saúde pela OPAS2,3. A seleção das atividades desse Programa de
Saúde Escolar como representante do Brasil no vídeo da OPAS sobre Escolas Promotoras de
Saúde4 apresentado na 7a Reunião das Primeiras Damas da América Latina (Panamá - 1997) e
a participação de representação deste Programa na II Reunião da Rede Latino-americana de
Escolas Promotoras de Saúde (Cidade do México - 1998) foram medidas decisivas que consubstanciaram o processo de formação da rede municipal de Escolas Promotoras de Saúde no
Rio de Janeiro. A partir desses referenciais e antecedentes, o trabalho com a criação de Escolas
Promotoras de Saúde se baseou na perspectiva de incentivar a autonomia da ação local em que
um programa de saúde pudesse ser construído com os sujeitos para os quais suas atividades
estão voltadas e não apenas programado de forma vertical em que os indivíduos tornam-se
objetos passivos dessas atividades e/ou de outros saberes.
O projeto "Nessa Escola Eu Fico" (1999)5, foi o precursor da Rede Municipal de Escolas
Promotoras de Saúde com a proposta de integrar a Política de Saúde às Políticas Sociais,
aumentando o tempo de permanência da criança e do adolescente na escola e lutando pela
melhoria da qualidade dessa escola, estimulando na comunidade escolar a capacidade de pensar, atuar e de tomar decisões. Ao priorizar a auto-estima e a ação protagonista de crianças e
adolescentes tinha por objetivo desenvolver atividades complementares na escola para criar
ambientes saudáveis e um entorno social favorável ao desenvolvimento e aprendizagem nas
diferentes linguagens e atividades artísticas, esportivas e culturais dentro do contexto histórico e social da comunidade.
Escolas Promotoras de Saúde: Um projeto de rede
Deste modo, a partir de 2000, as ações do Programa se voltaram para a criação de Escolas
Promotoras de Saúde6 na rede municipal de educação presumindo uma proposta inclusiva, estimulando a participação de todos os atores envolvidos e a execução de projetos locais a partir das
demandas e prioridades da comunidade escolar de modo que a escola pudesse representar o pólo
de irradiação das ações de promoção de saúde na comunidade. Até 2002 foram trabalhadas 120
escolas (12% da rede escolar) e cerca de 111.600 alunos (16% do total de alunos).
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1 Silva; Carlos dos Santos (Org.) Saúde Escolar numa Perspectiva Crítica. Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro, Rio
de Janeiro/RJ. 3a edição – 1999
2 Organização Pan-americana de Saúde (OPAS/OMS). Promoción y Educación de la Salud Escolar. Una Perspectiva Integral:
Marco Conceptual y Operativo. División de Promoción y Protección de la Salud.
3 Organização Pan-americana de Saúde (OPAS/OMS). Escuelas Promotoras de Salud. Modelo y Guía para la Acción. Washington
DC. 1996
4 OPAS. Vídeo Escolas Promotoras de Saúde. Washington D.C. 1998
5 Silva, Carlos S.; Rocha, Carlos A.S.;Soares, Marcela C. Nessa Escola Eu Fico. Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social do
Rio de Janeiro. Boletim ano 1 nº 1. 1999.
6 Silva, Carlos S. Escola Promotora de Saúde. Promoção de Saúde na Escola. Secretaria Municipal de Saúde. Prefeitura da Cidade
do Rio de Janeiro, 2a edição. RJ, 2000.
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O financiamento para criação dessa Rede vem de recursos do Sistema Único de Saúde
(SUS), com repasses do Ministério da Saúde para o município destinado a implementação de
programas de saúde coletiva; e da própria Secretaria Municipal de Saúde, com recursos do
tesouro municipal que subsidiou o Projeto através de Convênio com a Universidade Federal do
Rio de Janeiro.
Estratégias: Pesquisas, capacitação professional, avaliação
A partir de indicadores de saúde, dados epidemiológicos e da necessidade de identificar
fatores de risco e fatores de proteção à infância e adolescência, foram realizados estudos e pesquisas com objetivo de aferir uma investigação sobre as condições de saúde da comunidade
escolar e de sugerir soluções para minimizar os principais agravos.
Na pesquisa sobre "Saúde e Nutrição7"(1999), foram estudados eventos nos escolares
como: déficit nutricional de peso e estatura, anemia por deficiência de ferro e a obesidade;
marcando uma tendência de aumento da obesidade em crianças e adolescentes. Outra pesquisa, "Solta a Voz8" (1999), com 1.529 alunos, em amostra representativa da rede, a partir de 7
anos de idade, abordou temas como tabaco, álcool e outras drogas, sexualidade, aids, doenças
sexualmente transmissíveis, acidentes e situações agressivas, entre outros, apontando índices
como 12,3% de experimentação de tabaco, 56,2% de álcool, 2,4% de drogas ilícitas entre escolares e 10% deles referiram início de atividade sexual; eventos com maior freqüência antes dos
14 anos de idade.
A análise da relação dos escolares com seus principais núcleos de convivência, família,
escola e comunidade, sugere que em situações de dúvidas sobre esses temas os escolares procuram em 1a instância, a família (sobretudo, representada pela figura da mãe) e em escala bem
reduzida a escola (professora); enquanto os serviços de saúde praticamente não foram mencionados pelos alunos como fonte de informações e apoio nessas situações.
Os estudos contribuem para análise de como pensam e agem os alunos; podem nortear a
implementação de políticas públicas saudáveis; e possibilitam reforçar estratégias como: necessidade da escola trabalhar em parceria com os núcleos familiar e comunitário; e da necessidade de reorientação dos serviços de saúde na perspectiva de promoção de saúde para nova relação com a comunidade escolar.
Para o desenvolvimento dessa Rede outras estratégias foram fundamentais, como: elaboração, publicação e divulgação de materiais educativos (cartazes, folder, boletins, revistas e
vídeos) e a realização de oficinas, grupos de discussão com centros de estudos e seminários que
possibilitaram capacitação técnica de profissionais, sobretudo professores, e identificação de
atores chaves, além do processo de intercâmbio e troca de experiências entre as escolas.
Simultâneo às ações das equipes e desenhado a partir da avaliação do processo, o plano
avaliativo foi oportuno para análise constante e revisão permanente de sua execução. A abor7 Rugani, I. R. Castro et alii. II Pesquisa de Saúde e Nutrição em Escolares. Instituto de Nutrição Annes Dias Secretaria Municipal
de Saúde do Rio de Janeiro, RJ. Boletim nº 2- março 2000.
8 Silva; Carlos S e Mendes, Sonia R. Solta a Voz: Saúde e Risco em Escolares. Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro. Rio
de Janeiro/RJ. 2002.
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Presentaciones de los países
dagem metodológica privilegiou a análise qualitativa das informações coletadas cuja essência
foi a percepção dos indivíduos participantes, das equipes técnicas, gerenciais e das escolas, e
dos usuários, que foi viabilizada por pesquisadores que entraram em contato e visitaram as
escolas participantes.
Escolas Promotoras de Saúde: De projeto à iniciativa
A elaboração do Projeto Escolas Promotoras de Saúde se revelou estratégico para sistematizar a promoção de saúde na escola na rede pública de educação do município do Rio de
Janeiro/Brasil. Contudo, alianças e parcerias foram fundamentais, como por exemplo: Instituto
de Nutrição Annes Dias, no campo da alimentação; Fórum 21 da Cidade, na construção de
ambientes saudáveis; Programa de Saúde do Adolescente, na proposta de ação protagonista
com investimentos em linguagem teatral e outras técnicas metodológicas na formação de
agentes jovens e de adolescentes multiplicadores; no acesso a métodos contraceptivos e na discussão de questões relacionadas à sexualidade como gravidez na adolescência, doenças sexualmente transmissíveis e aids. No plano das doenças crônicas com ambientes livres de tabaco e
de outras drogas; no Movimento "Agita Rio", com incentivo à prática de atividades físicas; com
Programa de Saúde Bucal nas ações de escovação; e com a Secretaria Municipal de Educação,
na formação de Núcleos de Adolescentes Multiplicadores nas escolas, gerenciados pelo Projeto
de Orientação Sexual e ao Uso Indevido de Drogas; entre outras.
Dessa forma, a atuação articulada de vários setores e programas de saúde, não restrita ao
Programa de Saúde Escolar, colaborou para que inúmeras iniciativas que envolvem diferentes
profissionais e instâncias da Secretaria Municipal de Saúde e da Secretaria Municipal de
Educação fossem dirigidas a subgrupos e/ou à totalidade da comunidade escolar, compreendendo hoje, ações incorporadas ao currículo e a prática pedagógica da escola. O que foi decisivo para universalização de algumas atividades para a rede de escolas como um todo, não
estando restritas apenas as escolas trabalhadas, o que amplia a proposta de Projeto de Escolas
Promotoras de Saúde à Iniciativa.
Ressalta-se que para os avanços no processo, o apoio político da Prefeitura da Cidade, a
integração com Universidades, Organizações Não Governamentais e outros segmentos da
sociedade civil são também fundamentais para almejar essa Incitativa à agenda política da
Cidade.
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Desafios a serem enfrentados
O acompanhamento do processo permitiu aos gestores, identificar importantes desafios
para consolidação de uma política de promoção de saúde na escola. Algumas questões se
impõem aos técnicos e à própria Iniciativa, como: garantir independência e autonomia da
escola na luta por melhores condições de vida da comunidade respeitando a iniciativa local;
garantir que ações e programas possam rever suas atividades de acordo com a necessidade
apresentada por cada comunidade envolvida; garantir estrutura básica de apoio e atendimento as demandas levantadas e identificadas como prioritárias pela comunidade escolar; garantir
a porta de entrada da comunidade escolar aos serviços de saúde e o principio de reorientação
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desses serviços com prioridade para a promoção de saúde; garantir o repasse regular de recursos necessários; e manter o princípio de inclusão de todos os atores no processo e controle da
melhoria de suas condições de saúde e vida no exercício de "empoderamento" da comunidade
escolar.
Antes que tais questões se estabeleçam como entraves é possível (re) pensar estratégias previstas e fortalecer os pilares de promoção de saúde tanto do ponto de vista técnico quanto político na gestão da Cidade para conferir às mudanças necessárias o curso de institucionalização
de uma Iniciativa e pretende-la na agenda política municipal, mas, sobretudo por iniciativa
própria da comunidade.
O desenvolvimento de ações locais sustentáveis é o grande desafio e exigiu nova estratégia
como realização de oficinas de trabalho para professores, identificados como atores chaves,
para elaboração e planejamento de projetos.
O trabalho realizado em parceria com o Centro de Promoção de Saúde (CEDAPS) através
de metodologia de "Construção Compartilhada de Soluções em Saúde" (PSBH9) gerou 45 projetos elaborados de acordo com as demandas da escola e a realidade local a partir da visão dos
próprios participantes. Todos são coordenados por professores e envolvem hoje, 37 das escolas
participantes. Ressalta-se que cerca de 30% desses projetos priorizaram a prevenção da violência, tema que se consolida como uma das demandas mais freqüentes e desafiantes dessas comunidades escolares.
Estima-se, pois que esses Projetos cujos responsáveis recebem apoio para implementa-los,
possam subsidiar ações e decisões locais consolidando a inserção da promoção de saúde no
projeto político pedagógico dessas escolas qualificando-as como Escolas Promotoras de Saúde
de modo que apontem novos desafios, reclamem por mais investimentos e garantam uma participação mais efetiva dos atores locais no exercício do poder comunitário local.
Novos planos/Novos desafios: Um processo constante
Entende-se a Iniciativa Municipal de "Escolas Promotoras de Saúde" pelo compromisso e
a capacidade que a escola, a comunidade e os serviços de saúde têm de desenvolver parcerias e
otimizar recursos locais em ação integradora e articulada para o desenvolvimento de conhecimentos, habilidades para a vida, estímulo a atitudes saudáveis para a construção de ambientes
favoráveis à saúde.
De modo que essa Iniciativa possa contribuir para a construção de uma escola cidadã, que
se configure como um espaço de permanente interlocução com as demandas da sociedade possibilitando a reflexão crítica e um processo de desenvolvimento e aprendizagem capazes de formar o homem pleno em seus direitos e deveres, solidário com o outro e com a natureza e meio
ambiente em que convive.
A escuta e o acompanhamento do processo apontam outras demandas, novos desafios e
exigem novos planos, como por exemplo: a) dar ênfase à construção da paz estimulando rela-
9 CEDAPS. Rio de Janeiro. RJ. Problem Solving for Better Health (PSBH), programa internacional desenvolvido pela Dreyfus
Health Foundation, representada no Brasil pelo CEDAPS. Boletim Interação nov. 2002; 17.
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ções mais harmônicas e solidárias na comunidade escolar como plano de prevenção da violência, destaque das demandas da escola nas suas diferentes formas; b) melhorar o acesso da
comunidade escolar aos serviços de saúde, com Núcleos de Saúde Escolar nas unidades de
saúde e equipes capacitadas para defender a reorientação desses serviços para a promoção de
saúde; c) realizar novas pesquisas e estudos que possibilitem uma análise comparativa dos
dados, antes e depois das ações implementadas; d) estabelecer sistema de monitoramento dos
principais fatores de riscos e de proteção à saúde de crianças e adolescentes em idade escolar;
e) implementar programas de captação de recursos humanos, técnicos e representantes da
comunidade.
Todavia como a equidade, fator determinante da saúde, ainda não se faz presente frente a
acentuadas desigualdades sociais e econômicas com níveis de saúde e de educação muito
aquém do mínimo possível para cidadãos e a comunidade; e a pobreza e a vulnerabilidade
social propiciam a exclusão e não permitem oportunidades efetivas de melhoria da qualidade
de vida por políticas que não estão efetivamente comprometidas com a promoção da saúde, há
muito mais a fazer como: advogar pela promoção de saúde e buscar evidências de que a
Iniciativa de Escolas Promotoras de Saúde pode efetivamente contribuir para reverter esse quadro desfavorável e propiciar a interação com a família e a comunidade por espaços de convivência que sejam saudáveis, de apoio, informação, formação, acesso, diálogo, escuta e confiança, que garantam a aquisição de habilidades para a vida e a participação ativa do sujeito e
comunidade no controle das suas condições de saúde.
A Escola Promotora de Saúde no município do Rio de Janeiro pressupõe um trabalho na
ótica de inclusão e de participação em que a escola também possa representar o equipamento
social que protagonize a ação de mudança desse quadro desfavorável, o que não significa esperar que a escola sozinha possa reverter essa situação, mas que somada à ação de diferentes parceiros da área social possa representar o pólo irradiador desse conjunto de ações de uma rede
de atores comprometidos com mais justiça social e econômica, solidariedade e equidade, portanto comprometidos com a promoção de saúde e a melhoria da qualidade de vida da comunidade, do bairro, da cidade. Para que essa rede de Municipal de Escolas Promotoras de Saúde
possa contribuir efetivamente, para a construção de um Rio de Janeiro mais saudável.
MEMORIA
Tercera Reunión de la
Red Latinoamericana de
Escuelas Promotoras
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um relato da - Posturinha e sua Turma