#4
Saudações libertárias!
Já faz algum tempo que tenho vontade de publicar
um zine de colagens com conteúdo retirado de
outras publicações que ando lendo e dentro de
um mesmo contexto político. Selecionei a temática
“Poder e sociedade”, sem grandes aprofundamentos
nas áreas específicas, visando que o resultado fosse
um material de base para o leitor fazer as suas
considerações e pesquisas que julgue necessárias.
A pena de morte deveria ser um assunto mais
esclarecido do que de fato é. A maioria das pessoas
não faz idéia do que representa a pena capital, pois
não entendem o papel que o Estado representa na
sociedade, muito menos o que gera a criminalidade.
Quase que amortecidas, elas ainda saem repetindo
como um papagaio tudo que a mídia “informa”
através dos meios de comunicação de massa. A
grande questão está em compreender porque a
mídia desempenha esse papel de grande vilã e quais
os interesses que estão em questão.
Para entendermos mais a fundo tudo isso, publiquei
na íntegra o livreto lançado pela Anistia Internacional
em 1998 (5ª edição) chamado “A Questão da Pena
de Morte”, cujo o texto desmistifica as principais
questões acerca do problema da pena capital.
Faleremos um pouco sobre Mumia Abu-Jamal no
corredor da morte desde 1981, e atualmente sendo
julgado para receber a prisão perpétua ou a pena
capital nos próximos 180 dias.
Já o texto do Jaime Cubero complementa a discussão
com apontamentos sobre uma possível sociedade
sem Estado e com valores libertários impregnados
no seio social.
Complementando com a matéria sobre as drogas,
que esclarece as caracteristicas dos entorpecentes e
expõe quem são os principais interessados em lucrar
na “guerra” contra as drogas, que mentem e omitem
para a sociedade.
Compëndix Projetc. Politizine é uma experiência de
publicação digital e está totalmente aberta às críticas
e sugestões.
Boa leitura!
O Editor.
#5
http://anarcopunk.org/compendix
[email protected]
Capa da publicação original publicada em dezembro de 1998.
4
Foram utilizados nesta brochura trechos do livro CUANDO ES EL ESTADO EL QUE
MATA..., publicado em abril de 1989 pela Amnesty International Publications, e textos
de autoria dos advogados gaúchos Carlos Alceu Machado e Marco Túlio de Rose.
SEÇÃO BRASILEIRA DA ANISTIA INTERNACIONAL
Escritórios
SÃO PAULO
Rua Vicente Leporace nº 833
Campo Belo
CEP 04619-032
Telefone (011) 542-9819
Fax(011)5561-5995
PORTO ALEGRE
Rua Jacinto Gomes nº 573
Santana
CEP 90010-321
Telefax (051) 217-3220
SECÇÃO PORTUGUESA DA ANISTIA INTERNACIONAL
Escritório
Rua Fialho de Almeida, 13-1.
1070-Lisboa
Telefone (1)386 1652
5ª edição, revista, atualizada e ampliada
Impressa no Brasil, em dezembro de 1998
(C) Todos os direitos reservados. Autorizada a transcrição parcial, desde que citada a fonte.
5
Uma introdução
Matar ou não matar:
Eis a questão
Na discussão a respeito da conveniência ou não da instituição da pena de morte para
punir delinquentes que cometam delitos atrozes, há uma pergunta que necessita
ser feita aos que defendem o castigo capital: qual a reação adequada quando um
crime hediondo é perpetrado pelo próprio Estado?
Sabemos todos os que têm conhecimento da realidade internacional, que em
inúmeros países o nível de violação dos direitos humanos chega às raias da
insanidade. Indivíduos que nunca propugnaram pela violência são sumariamente
executados pelas forças de segurança tão-só pela divulgação de suas ideias;
políticos oposicionistas que jamais advogaram o uso da força são detidos, torturados
e mortos sem qualquer julgamento; pessoas que se destacam nas lutas pacíficas
pela melhoria das condições de vida de suas comunidades são sequestradas à luz
do dia e desaparecem para sempre.
Na maioria absoluta dos casos a responsabilidade do Estado, conquanto notória,
não é judicialmente apurada. Somente vez por outra, por descuido do poder ou
pela alteração do quadro institucional de um país, a verdade vem à tona e o crime
oficial é aclarado. Mas, e aí, quando o fato se torna público ou não mais pode ser
ocultado, o que fazer? Eliminar o funcionário “zeloso” que sob ordens praticou a
atrocidade? Enforcar seus superiores? Decapitar o governante? Destruir o Estado,
para que não repita o ato? Ou nesses casos é suficiente indenizar a família da
vitima com trinta moedas e esquecer o passado, como normalmente se faz?
Não há porque exterminar o delinquente, seja ele o cidadão ou o Estado. Como
afirmou corretamente Cesare Beccaria, famoso penalista italiano, não é a crueldade
da pena que inibe o criminoso, mas sim a crença de que ela será infalivelmente
aplicada. Confiando-se que todos os delitos serão punidos de forma honesta, a
criminalidade - inclusive a do “colarinho branco”, que indiretamente ceifa mais vidas
do que a marginal - diminuirá.
6
A pena de morte, utilizada como meio de proteçâo da sociedade comprovadamente
desnecessária; usada como método de vingança é embrutecedora e reacionária.
Um simples exame da história da pena capital demonstra o esforço que o homem
vem fazendo há séculos para erradicá-la seja através da diminuição gradativa do
número de delitos puníveis com a morte seja através da tentativa de suavizar os
processos de execução.
Do “olho por olho, dente por dente”, da Lei de Talião, saltamos para as fogueiras da
Idade Média. Das mutilações e torturas que precediam o enforcamento dos plebeus
franceses, alcançamos a guilhotina instituída pela revolução burguesa de 1789.
Do garrote vil espanhol, que aos poucos quebrava a espinha dos condenados,
atingimos o pelotão de fuzilamento. Da cadeira elétrica, que descarrega dois mil
volts sobre o corpo do sentenciado durante períodos alternados, chegamos até a
injeçâo letal aplicada aos norte-americanos penalizados com a morte.
A pena capital tem progredido - se assim se pode dizer - não-só no concernente às
formas pelas quais ela é posta em prática, mas também em relação à natureza dos
delitos e ao tipo dos criminosos passíveis de condenação à morte. Se atualmente em
algumas poucas nações mulheres adúlteras ainda são apedrejadas até que a vida
se lhes acabe, na maioria apenas homicidas cruéis são levados ao patíbulo. Se no
alvorecer do primeiro milénio os cristãos eram jogados aos leões para divertimento
dos cidadãos de Roma, e se dava fim aos desequilibrados mentais por serem
julgados endemoniados, hoje a maior parte dos ordenamentos penais existentes
no mundo veda a aplicação da pena de morte a prisioneiros de consciência, a
menores, a anciãos, a mulheres grávidas ou que acabem de dar à luz, a pessoas
mentalmente enfermas
O empenho que o ser humano vem fazendo a centenas e centenas de anos para
aprimorar o Direito, justificando sua condição de animal inteligente, é comprovado
claramente pela contínua e definitiva restrição que as normas legais vigentes vêm
fazendo à vingança pessoal ou estatal.
Carlos Alceu Machado
Diretor da Anistia Internacional - Seção Brasileira
to utilizado quando a
ui
m
o
ic
lít
po
to
en
m
gu
ar
“A pena de morte é um
ima idéia de como
ín
m
a
m
tê
o
nã
e
qu
s
r pessoa
criminalidade.”
violência é discutida po
resolver o problema da
Bryan Stevenson
7
Parte 1
A discussão sobre a pena de morte
Os debates parlamentares e as discussões públicas podem ajudar os legisladores
e a opinião pública a conhecerem melhor a lógica e a realidade da pena de morte,
assim como a força dos argumentos contrários a ela. Ao analisar a derrota de
uma moção que visava restabelecer a pena capital na Inglaterra, em 1983 na
Câmara dos Comuns, jornalistas noticiaram que vários membros do parlamento
britânico “mudaram de opinião porque nunca antes tinham ouvido argumentos
fundamentados contra a pena de morte”. Um deputado que acabara de ser eleito
disse aos jornalistas que havia mudado seu modo de pensar, favorável à pena
capital. “Só quando alguém toma parte numa discussão é que os argumentos contra
a pena de morte tornam-se extremamente óbvios”, declarou. Outro parlamentar
admitiu que a maioria dos seus eleitores era a favor da pena de morte, mas afirmou
que eles “não parecem ter pensado a fundo sobre a questão, pois ficam muito
impressionados sempre que ouvem a argumentação dos abolicionistas”.
Segundo conhecido pensador italiano, o Estado não pode se colocar no mesmo
plano do indivíduo. O indivíduo age por raiva, por paixão, por interesse, por defesa.
O Estado responde meditadamente, reflexivamente, racionalmente. Ele também
tem o direito de se defender, mas sendo muito mais forte do que o indivíduo - pois
detém o privilégio e o beneficio do monopólio da força - não tem necessidade de
matar em defesa própria.
Também do ponto de vista religioso existe, hoje em dia, no Ocidente, uma clara
tendência das corporações mais representativas de se posicionarem contra a pena
capital. Em recente manifestação, o Papa João Paulo II afirmou: “A Santa Sé, com
empenho humanitário, recomenda clemência e até perdão àqueles condenados à
morte, especialmente aos condenados por razões políticas”.
8
A Anisitia Internacional, ao divulgar a presente obra, pretende contribuir para o
debate da questão, mostrando alguns aspectos que vêm sendo significativamente
omitidos sobre a pena de morte. Vale lembrar, porém, que a posição defendida
pela organizaçâo não deve, de modo algum, ser confundida com uma apologia
da impunidade. Absolutamente. A Anistia é contra a pena de morte pelas razões
sucintamente expostas nesta publicação, que comprovam de forma eloquente
que tal punição não passa de uma falsa solução para o problema da violência. A
pena capital é o mais cruel, desumano e degradante dos castigos e a luta por sua
erradicação, em todo o mundo, está intimamente ligada aos princípios que inspiram
a estrita obser-vância dos direitos humanos.
Em todas as partes, a experiência mostra que as execuções embrutecem os que
delas participam. Em nenhum lugar demonstrou-se que a pena capital reduziu a
violência de forma eficaz. Nos países onde a pena de morte é aplicada, os pobres
e os membros de minorias raciais ou étnicas são as suas principais vítimas. Com
frequência ela é utilizada como instrumento de repressão política É um castigo
irrevogável, que inevitavelmente dá lugar à execução ocasional de pessoas
completamente inocentes.
Quando as nações do mundo reuniram-se há mais de cinco décadas para criar
as Nações Unidas, não foi necessário lembrar o que pode acontecer quando um
Estado pensa inexistirem limites sobre o que ele pode fazer a um ser humano. Em
dezembro de 1948, quando a Assembleia Geral da ONU aprovou por unanimidade
a Declaração Universal dos Direitos Humanos, ainda estava sendo revelada toda
a brutalidade, todo o terror imposto por alguns Estados durante a Segunda Guerra
Mundial, e as sequelas que ela havia deixado em milhões de pessoas em todo o
planeta.
A Declaração Universal é um compromisso entre as nações para estimular os
direitos fundamentais como base da liberdade, da justiça e da paz. Os direitos que o
documento proclama são inerentes a toda pessoa humana. Não são privilégios que
os Estados podem conceder por boa conduta e, portanto, não podem ser cassados
por mau comportamento.
Uma vez que um Estado aplica a pena de morte, por qualquer razão, torna-se
mais fácil para outros Estados utilizá-la com certa aparência de legitimidade por
quaisquer outros motivos. Se é possível justificar a pena de morte para um delito sem dúvida serão encontradas desculpas para aplicá-la em outros casos, de
acordo com a opinião que prevaleça em uma sociedade ou entre governantes. A
ideia de que o Estado possa legitimar um castigo tão cruel como a morte entra em
conflito com a própria concepção dos direitos humanos. A importância dos direitos
humanos se apoia precisamente no fato de que certos métodos nunca podem ser
usados para proteger a sociedade, já que seu uso infringe os mesmos valores
9
que fazem com que a sociedade mereça ser protegi-da. Quando se esquece essa
distinção essencial entre os meios apropriados e inapropriados em nome de algum
“bem superior”, todos os direitos são vulneráveis e todos os indivíduos encontramse ameaçados
Numerosos Estados já reconheceram que a pena de morte é incompatível com o
respeito pelos direitos humanos. A própria ONU declarou-se a favor da abolição
da pena capital. Atualmente, 57 países não penalizam qualquer tipo de delito com
a morte. Outros 15 somente a mantêm para casos excepcionais, como certos
crimes praticados em tempos de guerra. Outros 26 países e territórios podem ser
considerados abolicionistas de fato, posto que não levam a cabo execuções. Por
conseguinte, 98 países - mais de 50% do total - já aboliram a pena de morte ou não
a aplicam na prática (dados de 1997).
Desde 1989, mais de vinte países e territórios aboliram a pena de morte para
delitos comuns ou para todos os delitos, afirmando com isso seu respeito pela vida
e pela dignidade do ser humano. Todavia, ainda existem demasiados governos
que acreditam que podem resolver seus problemas sociais ou políticos executando
alguns ou, em certos casos, centenas de presos.
sassinatos, ao
as
s
do
do
ita
ed
em
pr
s
l senão o mai
“O que é a pena capita
r mais calculado que
po
o,
os
in
im
cr
o
at
um
rar-se nenh
morte teria que
de
na
qual não pode compa
pe
a
,
ia
nc
lê
va
ui
uvesse uma eq
a da data na qual lhe
seja? Pois, para que ho
tim
ví
a
su
o
ad
is
av
se
e que tives
to a mantivesse
en
om
castigar um deliquent
m
e
ss
de
ir
rt
pa
a
rrível, e que
ntrável na vida real.”
infligiria uma morte ho
co
en
é
o
nã
ro
st
on
m
l
eses. Ta
Albert Camus
sob guarda durante m
10
Cadeira Elétrica
11
Parte 2
A lógica da pena de morte
A defesa da pena de morte baseia-se na convicção de que as execuções
correspondem a necessidades importantes da sociedade, que não poderiam
ser satisfeitas de outra forma. O argumento utilizado é de que a pena capital é
necessária, pelo menos provisoriamente, para o bem da sociedade.
Ocorre que, em primeiro lugar, jamais se pode justificar a violação de direitos
humanos fundamentais. Não se pode justificar a tortura alegando-se que em
algumas situações ela poderia ser útil. O Direito Internacional estabelece claramente
que uma pena cruel, desumana ou degradante é sempre proibida, inclusive em
situações excepcionais que ponham em perigo a vida de uma nação.
Em segundo lugar, apesar da experiência derivada de séculos de vigência da pena
de morte e de numerosos estudos científicos acerca da relação entre este castigo
e as taxas de criminalidade, até hoje inexistem provas convincentes de que ela
proteja eficazmente a sociedade da delinquência ou satisfaça as exigências de
justiça.
Normalmente, a pena de morte é apresentada como medida eficiente e apropri-ada
para impedir e castigar o crime, mas numerosos estudos, realizados em diversos
países e com metodologias diferentes, não puderam demonstrar que a pena capital
dissuada mais fortemente do que outros métodos punitivos.
Os países que já aboliram a pena de morte ou não a aplicam na prática possuem
diferentes culturas, tradições e sistemas sócio-políticos; têm níveis diferenciados de
desenvolvimento económico e muitos deles enfrentam graves problemas sociais.
Apesar disso, não se tem conhecimento de que qualquer um deles tenha sofrido
prejuízos de ordem social ou política que pudessem estar claramente relacionados
com a abolição da pena de morte, sendo raríssimo que uma sociedade restaure tal
castigo após tê-lo abolido.
12
Aqueles que acreditam que a pena de morte é uma poderosa medida preventiva
estão atribuindo um poder excessivo à essa ameaça legal, à capacidade de tal
castigo controlar comportamentos anti-sociais e à racionalidade do criminoso.
Esquecem-se que a perspectiva de prazer ou ganho imediato ultrapassa largamente
todos os riscos remotos, incluindo o da morte. Um marginal em confronto com a
polícia, por exemplo, enfrenta um risco de morte imediata muito maior do que o
risco de uma execução legal.
Algumas estatísticas demonstram a ineficácia da aplicação da pena capital na
prevenção dos crimes:
* Canadá: O índice de homicídios por 100.000 habitantes caiu de 3,09 em 1975 um
ano antes da abolição da pena de morte para o crime de assassinato, para 2,41 em
1980. Em 1993, 17 anos depois da abolição da pena capital, o índice era de 2,19
por 100.000 habitantes, cerca de 27% inferior ao de 1975.
* E.U.A.: Estatísticas do FBI revelaram que, entre 1976 e 1986, a taxa agregada de
homicídios era de 10,6 para cada 100.000 habitantes nos estados que executavam
criminosos; de 6,6 para cada 100.000 habitantes nos estados que previam a pena
de morte mas não a aplicavam na prática, e de apenas 5,3 para cada 100.000
habitantes nos estados em que a pena capital não estava prevista em lei. Pesquisas
de 1983 demonstraram que, nos estados que adotaram a pena de morte, as taxas
de homicídio eram maiores que nos estados abolicionistas. A Flórida teve, de 1976
a 1978, uma das mais baixas taxas de homicídios da sua história. Em 1979, com a
reintrodução da pena, essas taxas aumentaram brutalmente, havendo uma elevação
de 28% em 1980; em 1984, os índices ainda eram superiores aos do período em
que não ocorreram execuções. Na Geórgia ocorreu o mesmo, pois no ano que se
seguiu à retomada das execuções, houve um aumento de 20% nos homicídios (no
mesmo ano, a taxa nacional elevou-se apenas 5%). Em 1990, oito das 20 maiores
cidades do pais quebraram seus recordes de criminalidade, entre elas Washington,
Dallas e Nova Iorque. O Texas, apesar de ser o campeão de execuções, é o estado
norte-americano onde acontece o maior número de homicídios. Nos últimos 30
anos, dezenas de pesquisadores analisaram tais estatísticas para tentar descobrir
se a pena de morte reduz a criminalidade. Revisando esses estudos, a Suprema
Corte norte americana não pode concluir que a pena capital previna o crime violento.
Isso em um país onde tal punição é aplicada há cerca de 150 anos.
* Inglaterra: Deputados britânicos que em 1990 rejeitaram uma moção que visava
restabelecer a pena de morte, ressaltaram que as evidências estatísticas sobre
13
o efeito dissuasório da pena capital no combate ao crime eram extremamente
contraditórias. Segundo eles, de acordo com o anuário demográfico das Nações
Unidas, a Inglaterra tinha uma das mais baixas taxas de homicídio do mundo,
correspondente a 0,7 para cada cem mil habitantes. Tal taxa era alta nos EUA
(8,5/100.000) e muito baixa no Japão (0,8/100.000), embora ambos os países
castigassem o homicídio com a morte.
Um exame sério dos argumentos apresentados em favor da pena de morte revela
que ela é inaceitável, desnecessária e até mesmo perigosa, na medida em que um
delinquente pode optar por eliminar também as testemunhas do seu crime para
que ele não seja descoberto.
Em suma, todos os dados estatísticos disponíveis indicam que, onde a taxa de
homicídios está se elevando, a abolição da pena de morte não acentua o aumento.
Onde está diminuindo, a abolição não interrompe este descenso. Onde a taxa é
estável, a ausência da pena capital não a eleva. Estes fatos falam por si só.
As alegações para manter ou implantar a pena de morte também baseiam-se em
argumentos fundados num pretenso “bom senso” e em “impressões” pessoais
sobre seu poder preventivo. Em alguns casos, chega-se às raias do absurdo. Um
legislador inglês, por exemplo declarou: “Estou absolutamente convencido de que
o medo da morte violenta é um desencorajador eficaz e nenhuma estatística ou
argumento me provará que não é”. Essa insistência acaba por trair os verdadeiros
mecanismos psicológicos subjacentes às reivindicações pró-pena de morte quais
sejam, sentimentos de raiva e de vingança - emoções que alimentam a violência e
conduzem ao crime violento e ao terrorismo.
Segundo Erich Fromm, a vingança é um tipo de violência incluído na categoria das
reativas. Como o mal já foi feito, a violência teria a função irracional de desfazer o que
na realidade existe. Segundo o psicanalista, para quem se julga impotente e para
restaurar a auto-estima, a saída é geralmente esse tipo de reação. O sentimento
de vingança é característico das classes mais atrasadas, pobres econômica e
culturalmente, que também desenvolvem sentimentos racistas e nacionalistas.
No estado de Nova Iorque (EUA), nos anos de 1907 a 1963, no mês subsequente a
uma execução, ocorriam em média dois homicídios adicionais, demonstrando que
as execuções legais transmitem à sociedade a inequívoca mensagem de que a
vida deixa de ser sagrada quando se considera útil toma-la, e de que a violência é
legítima quando considerada justificada, por razões pragmáticas, por aqueles que
detêm o poder legal de matar.
É evidente que aquele que mata deve receber uma punição severa, de modo a
exprimir a condenação social pelo assassinato. Porém, seria o uso da pena capital
a forma mais correta de afirmar o valor da vida? É difícil imaginar como tal castigo,
oficializado, possa promover o respeito pelo ser humano.
14
A dissuasão
O argumento utilizado com mais frequência em favor da pena de morte é o da
dissuasão. Ou seja, é necessário matar o criminoso para dissuadir outras pessoas
de cometerem o mesmo tipo de delito.
À primeira vista, parece um argumento aceitável. O que poderia deter com maior
eficácia aqueles que têm a intenção de matar ou de cometer outros crimes graves,
senão a ameaça do mais terrível dos castigos - a morte? Ocorre que as provas
empíricas não apoiam esse raciocínio. Mais: sua lógica se baseia em suposições
discutíveis.
Não é correto pensar-se que todos - ou a maioria - aqueles que comentem delitos
tão sérios como o assassinato o fazem depois de calcular racionalmente suas
consequências. Na maior parte das vezes os assassinatos são perpetrados em
momentos em que sentimentos ou emoções, levados a um alto grau de intensidade,
sobrepõem-se à lucidez e à razão. Também podem ser praticados sob a influência
do álcool ou de drogas, ou em situações de pânico, como quando o ladrão é
surpreendido roubando. Algumas pessoas que cometem delitos violentos sofrem
de fortes instabilidades emocionais ou são doentes mentais. Em nenhum desses
casos pode-se aguardar que o medo da pena de morte sirva de dissuasão.
a
morte varia conforme
de
na
pe
da
te
an
di
o
ic
do públ
quilidade social.”
an
tr
É sabido que a atitude
or
en
m
ou
or
ai
m
situação de
Norberto Bobbio
15
Por outro lado, os assassinos, em uma grande proporção, estão tão tensos no instante
do crime que ficam insensíveis às consequências que ele lhes acarretará. Outros,
por sua vez, conseguem convencer-se de que poderão escapar da condenação.
Este último ponto destaca outra debilidade da argumentação da dissuasão, visto que
os delinquentes que planejam cometer crimes graves podem decidir seguir adiante
apesar do risco, pensando que jamais serão descobertos. A chave da dissuasão,
nesses casos, é aumentar a probalidade de que os criminosos sejam descobertos,
detidos e condenados. A pena de morte pode inclusive ser contraproducente, ao
distrair a atenção das autoridades e da opinião pública acerca dos esforços que se
fazem necessários para melhorar as condições da luta contra a delinquência.
O argumento da dissuasão não está corroborado por fatos. Se a pena de morte
realmente dissuadisse os criminosos em potencial com maior eficiência que outras
penas, seria de se esperar um aumento das taxas de criminalidade nos países que
abolem a pena de morte e uma diminuição da mesma taxa nos países em que a
pena capital é adotada. No entanto, sucessivos estudos e pesquisas realizados em
todo o mundo, por organizações oficiais e particulares, não puderam estabelecer,
até hoje, nenhuma relação dessa natureza entre a pena de morte e os índices de
delinquência.
Estudos científicos realizados em torno da pena de morte jamais demonstraram
que essa punição dissuade mais do que outros castigos. O último estudo acerca
da relação entre a pena capital e os índices de homicídios, elaborado pela ONU em
1988, concluiu que não se pode chegar a uma demonstração científica de que as
execuções tenham um maior poder dissuasório do que a prisão perpétua.
A incapacitacão
Segundo o argumento da incapacitacão, um preso deve morrer (e portanto ficar “incapacitado”) a fim de que a sociedade assegure-se de que ele nunca mais voltará
a delinquir.
Uma vez morta, obviamente uma pessoa fica incapacitada para sempre. Inobstante, não se pode condenar alguém à morte baseado unicamente no inegável fato de
que os mortos não agem. Uma política desse tipo está fundamentada na errônea
suposição de que o Estado pode determinar, com absoluta precisão quais são os
presos que reincidirão ou não (se não fosse assim, o Estado deveria estar ciente de
que se arriscaria a incluir entre os executados um número considerável de presos
16
que não reincidiriam). O argumento da incapacitação através da morte igualmente
supõe que é impossível encontrar qualquer outro meio eficaz de impedir a reincidência. Nenhuma dessas hipóteses está respaldada pelos fatos.
É possível prevenir-se a reincidência internando-se os réus em prisões ou outras
instituições semelhantes. Este método já é empregado no caso de indivíduos de
conduta anti-social compulsiva ou loucos violentos, pois os princípios humanitários
proclamados nas legislações nacionais e no Direito Internacional proíbem a execução de enfermos mentais - Assim, se os Estados descobriram que o encarceramento é um meio eficiente para incapacitar doentes mentais com tendências
homicidas, por que não é possível utilizar esse mesmo método para incapacitar os
réus qualificados como normais?
Os que defendem o argumento da incapacitação acenam com casos de apenados
perigosos postos em liberdade condicional que voltaram a delinquir. Acontece que a
resposta a esta questão não é a execução dos presos, mas sim um aprimoramento
dos procedimentos judiciais que antecedem a soltura dos prisioneiros sob o regime
de liberdade vigiada. Há meios bastante eficazes para se proteger a sociedade,
como o cumprimento obrigatório de longas penas de prisão antes da concessão de
liberdade condicional. O apoio à pena capital cai substancialmente quando a opinião pública toma conhecimento desta alternativa.
O internato, que aparta os delinquentes da sociedade, tem uma grande vantagem
sobre a pena de morte como meio de incapacitação: eventuais erros judiciais, possíveis em qualquer sistema, podem ser corrigidos, pelo menos em parte. A pena de
morte, ao contrário não só tira a vida de delinquentes que poderiam ser reabilitados, como também de pessoas inocentes condenadas injustamente.
Apenas na Inglaterra, na última década, ocorreram pelo menos três casos gra-ves
de erro judiciário: os “Três de Bridgewater” (condenados como supostos au-tores
do assassinato de um menino, foram libertados em 1997), os “Seis de Birmigham”
(condenados como supostos autores da morte de 21 pessoas em um atentado a
bomba, foram soltos em 1991) e os “Quatro de Guildford” (condenados como supostos autores de um ataque terrorista a outro bar, onde morreram 5 pessoas, foram
liberados em 1989). Como tais erros seriam reparados caso os réus tivessem sido
condenados à morte?
17
A retribuição
Diferentemente dos argumentos da dissuasão e da incapacitação, o do castigo merecido (retribuição) sustenta que alguns criminosos devem morrer não para impedir
a delinquência, mas como uma exigência de justiça. A execução é considerada o
pagamento pelo mal cometido; ao matar o delinquente, a sociedade demonstra sua
repulsa pelo crime perpetrado.
A crença de que alguns criminosos merecem morrer decorre da profunda aversão
que os cidadãos comuns sentem pelos crimes atrozes, crimes tão ofensivos que a
morte parece ser a única resposta justa.
Este é um raciocínio emocionalmente poderoso, mas também um argumento que,
se considerado válido, abalaria os alicerces sobre os quais se estrutura o edifício
dos direitos humanos. Se uma pessoa que comete um ato terrível “merece” a crueldade da morte, por que não poderiam outras, por razões similares, “merecerem”
ser torturadas, presas sem julgamento ou simplesmente abatidas a tiros? A essência dos direitos humanos fundamentais é que eles são inalienáveis e deles não
se pode privar o mais “inferior” dos indivíduos. Os direitos humanos são aplicáveis
tanto às piores quanto às melhores pessoas e, precisamente por isso, protegem a
todos.
O argumento da retribuição se reduz, com frequência, a não mais que um desejo
de vingança, mascarado por um princípio de justiça. O desejo de vingança pode
ser compreendido, mas deve-se resistir a ele. Se os ordenamentos penais não
determinam que se queime a casa de um incendiário, que se viole um estuprador
ou que se torture um torturador, não é porque tolerem tais delitos, mas porque as
sociedades entendem que elas devem construir-se sobre um conjunto de valores
diferentes daqueles que condenam. Uma execução não pode servir como manifestação de censura a um assassinato, pois ela mesma consiste em matar. Tal ato,
por parte do Estado, reflete idêntica disposição do criminoso de empregar a violência física contra sua vítima.
enado, caindo com
nd
co
do
co
on
tr
do
se
parardo o
“Quando vi a cabeça se
m a razão, mas com to
co
o
nã
e
i,
nd
ee
pr
m
co
de justificar tal ato.”
sinistro ruído no cesto,
po
ia
or
te
a
um
nh
ne
e
meu ser, qu
Leon Tolstoi
18
Estritamente relacionado com a ideia de que algumas pessoas “merecem” morrer,
encontra-se a concepção de que o Estado é capaz de determinar com absoluta
precisão quem são essas pessoas; a experiência revela, no entanto, que nenhum
sistema de justiça é capaz - nem se poderia conceber que fosse - de decidir de
maneira justa coerente e infalível quem deve viver e quem deve morrer.
Todos os sistemas judiciais são vulneráveis a discriminação e ao erro. A capacidade
técnica da polícia, a maior ou menor severidade dos juizes e jurados, a habilidade
dos advogados, interpretações diferentes da lei e a opinião pública predominante
são fatores que influem decisivamente em inquéritos e processos, desde a detenção do criminoso até o exercício da prerrogativa de graça, pela qual os governantes
podem comutar a pena de morte em prisão perpétua.
Mesmo os que defendem ardentemente a morte como castigo merecido, seguidamente exigem que a pena seja utilizada com moderação, temendo que, caso contrário, embote a sensibilidade moral da população e perca seu efeito aterrorizante.
Entendimento dessa natureza sugere um caráter de sacrifício no uso da pena capital, posto que sendo impossível levar até as suas últimas consequências a lógica
da retribuição, se executa - na realidade se sacrifica - um número simbólico de
presos para satisfazer a exigência popular.
Observando-se, na prática, a aplicação da pena de morte, nota-se que o que constantemente define quem vai ser executado e quem vai ser perdoado não é somente a natureza do crime, mas principalmente os antecedentes étnicos, a raça,
a classe social, o poder económico ou as opiniões políticas e religiosas do processado. A pena de morte é aplicada no mais das vezes de forma desproporcional
contra os pobres, os desvalidos, os marginalizados ou contra aquelas pessoas que
os governos repressivos consideram oportuno eliminar.
rie de transições
sé
a
um
do
si
m
te
o
an
ogresso hum
após outra passa, de
“A história inteira do pr
ão
iç
itu
st
in
a
um
ou
e
stum
através da qual um co
ndição de injustiça
co
à
,
al
ci
so
ia
nc
tê
is
ssária à ex
ada.”
presumidamente nece
universalmente conden
John Stuart Mill
19
Parte 3
A realidade da pena de morte
A violência política
Atentados com explosivos, sequestros, assassinatos de funcionários públicos,
sabotagens em aviões e outros atos de violência por razões políticas, com frequência
resultam na morte e na mutilação não só das pessoas-alvo, como também de
outras que ocasionalmente se encontram no local do ataque. É compreensível,
assim, que esses atos provoquem uma forte reação da sociedade e tenham como
resultado a exigência da aplicação da pena de morte aos terroristas. Entretanto,
como os responsáveis pela luta contra esses delitos têm repetido várias vezes, as
execuções têm tanta possibilidade de diminuir como de au-mentar o terrorismo.
Como observou um catedrático de criminologia canadense, “os que pensam
realmente que o restabelecimento da pena de morte porá fim ou reduzirá o número
de atos terroristas são extremamente ingénuos. Os castigos normais, incluindo a
pena capital, não impressionam os terroristas ou outros delinquentes políticos, que
agem por motivação ideológica e estão propensos a fazer sacrifícios em prol de
sua causa (...) Além disso, as atividades terroristas estão cheias de perigos, e o
terrorista corre todo tipo de riscos mortais sem ficar intimidado com a perspectiva
da morte imediata. Pode-se conceber, desta forma, que vá ser dissuadido pelo
risco escasso e remoto de ser condenado à morte?”
As execuções por crimes políticos violentos podem redundar em uma maior
publicidade para os atos de terrorismo, atraindo uma grande atenção da opinião
pública para as ideias dos terroristas. Essas execuções também podem criar
mártires, cuja memória se torne um fator de coesão dos militantes das organizações
clandestinas. Para alguns homens e mulheres convencidos da legitimidade dos
seus atos, a perspectiva de sofrer a pena de morte pode até servir como incentivo.
Longe de pôr fim à violência, as execuções são utilizadas como justificativa para
novos atos de violência. Exemplo: as autoridades britânicas que governavam a
20
Palestina enforcaram vários membros da organização sionista “Irgun” durante a
década de 40, depois de condenados por atentados a dinamite e por outros atos de
violência Menahem Begin, antigo dirigente do “Irgun” e mais tarde primeiro-ministro
de Israel, disse posteriormente que as execuções haviam “inflamado” seu grupo
que em represália enforcou vários soldados ingleses. Menahem Begin afirmou que
o enforcamento dos seus companheiros “resultou na adesão de novos membros à
causa e nos tornou mais eficazes e dedicados (...) Vocês (britânicos) não estavam
condenando à morte nossos terroristas; estavam condenando a muitos de sua
própria gente, e nós é que decidíamos a quantos.”
A opinião pública
Uma razão que por vezes é dada para manter ou implantar a pena de morte - citada
inclusive por governantes que dizem ser pessoalmente contra a pena capital - é que
a opinião pública a exige. Mostram pesquisas que aparentemente comprovam um
forte apoio popular à pena de morte para alegar que seria inclusive antidemocrático
aboli-la ou deixar de institui-la.
A primeira resposta a este argumento é que o respeito pelos direitos humanos
nunca deve depender da opinião pública. A tortura não seria admissível mesmo
que tivesse apoio na opinião pública.
Em segundo lugar, a opinião pública sobre a pena de morte amiúde se baseia
numa compreensão incompleta dos elementos a ela pertinentes, e o resultado das
enquetes pode variar de acordo com a forma pela qual as perguntas são feitas.
Incumbe aos políticos que tratam do tema não somente escutar a opinião pública,
mas também assegurar-se de que ela está inteiramente informada.
Algumas investigações sugerem que o posicionamento das pessoas em relação à
pena de morte pode mudar radicalmente depois de terem um melhor conhecimento
dos fatos. Em um estudo realizado entre habitantes de uma cidade universitária
norte-americana, comprovou-se que a maioria deles pouco sabia sobre os efeitos da
pena de morte, e que o apoio ao castigo diminuiu acentuadamente após as pessoas
terem se defrontado com as informações. Pediu-se a alguns dos entrevistados
que lessem um ensaio que trazia dados e argumentos sobre os efeitos da pena
de morte. Antes de lê-lo, 51 % das pessoas disseram que eram a favor da pena
capital, enquanto que 29% estavam contra e 20% mostravam-se indecisos.
21
Depois de lerem a obra, o apoio à pena de morte baixou para 38%, a oposição
subiu para 42% e os demais 20% permaneceram indecisos. A outros membros do
grupo pesquisado, pediu-se que lessem um ensaio sobre assunto não relacionado
com a pena capital; constatou-se que nesse agrupamento as opiniões acerca da
pena de morte praticamente não mudaram.
Algumas pesquisas repetidas ao longo dos anos têm indicado que, apesar da
decisão de abolir a pena de morte ser inicialmente contrária à opinião pública sua
revogação e bem aceita com o passar do tempo. Na Alemanha, por exemplo, o
apoio da população à pena capital tem diminuído constantemente desde a sua
extinção. Em 1950, um ano depois da abolição, 55% das pessoas consultadas
disseram que eram a favor e 30% contra a pena de morte. Quando se procedeu
a outra enquete, em 1973, somente 30% defenderam o castigo. A percentagem
baixou para 26% em 1980, para 24% em 1983 e para 22% em 1986, ano em que
55% dos entrevistados se pronunciaram contra a pena de morte. Em 36 anos, uma
completa inversão dos resultados obtidos anteriormente.
O custo econômico
Por vezes, tenta-se justificar a pena de morte com a alegação de que é mais barato
matar alguns presos do que mante-los na prisão. Tal argumentação, além de torpe,
por pretender avaliar a vida em moedas (não se pode perder de vista a grosseria
e a falta de ética em fundamentar sobre bases financeiras a eliminação de vidas
humanas), é falsa.
Estudos realizados no Canadá e nos Estados Unidos mostram que nesses países a
imposição da pena de morte é mais cara para o Estado do que a reclusão perpétua
do preso. Um levantamento realizado no estado de Nova Iorque comprovou que, em
média, um processo que possa redundar na aplicação da pena capital, somente na
sua primeira fase custa aos contribuintes aproximadamente um milhão e oitocentos
mil dólares - mais do que o dobro da quantia que se supõe necessária para manter
uma pessoa presa por toda a vida.
Inúmeros profissionais ligados à área jurídica, em todo o mundo, também se opõem à
pena de morte porque acreditam que a enorme concentração de recursos humanos
e financeiros, em uma quantidade de casos relativamente pequena, desvia tais
recursos valiosos de outros setores do Judiciário.
22
No Brasil, quem tiver um mínimo compromisso com a verdade, admitirá que nossas
prisões, longe de parecerem “hotéis”, como propalam alguns, são verdadeiros
infernos, centros de ensinamento de delinquência, às voltas com graves problemas
de superlotação, de assistência médica e psicológica, de alimentação, de
reeducação, todos rarissimas vezes enfrentados pelos governos. Uma possível
alternativa para minorá-los, seria proporcionar trabalho decente aos detentos nas
próprias penitenciárias, a fim de que eles pudessem se auto-sustentar.
,
o é a crueldade da pena
nã
os
lit
de
s
ao
os
ei
fr
.”
“Um dos maiores
mas sua infalibilidade
Cesare Beccaria
23
Parte 4
A pena de morte na prática
A pena de morte não é uma questão abstrata. A decisão de aplicá-la significa que
homens e mulheres serão selecionados para morrer. É a realidade da sua aplicação,
e não meras teorias, o que destaca a necessidade de aboli-la.
A pena capital, como já se viu, não proporciona nenhuma proteção, nenhum benefício
à sociedade. Quando tal castigo excepcional, extremamente cruel e irrevogável, é
empregado por sistemas falíveis, sujeitos a erros humanos, tem-se como resultado
não o aprimoramento da justiça, mas sim sua perversão, como veremos a seguir.
A discriminação
Seria surpreendente que a imposição de um castigo tão terrível e definitivo não
recaísse principalmente sobre as camadas menos favorecidas de uma sociedade:
os pobres e os membros das minorias raciais, políticas, religiosas ou étnicas. Em
todo o mundo, a pena de morte é aplicada de maneira desproporcional contra os
despossuídos de toda sorte, que comprovadamente não teriam que se defrontar
com ela caso fizessem parte das camadas mais favorecidas. Isso acontece porque
são incapazes de se defender eficazmente em um processo penal (por falta de
conhecimentos, de amizades influentes ou de dinheiro) ou porque o sistema judicial
reflete de alguma forma os preconceitos e as intolerâncias que a sociedade ou seus
governantes têm contra eles. Também existem provas contundentes de que os
criminosos têm mais possibilidades de serem condenados à morte se suas vitimas
integram as classes mais abastadas da sociedade.
Tomando como exemplo os Estados Unidos, país pródigo em estatísticas e
execuções, constata-se o seguinte quadro discriminatório:
24
* De 1976 a 1991, das mais de 150 pessoas executadas, somente uma era um
branco condenado pelo assassinato de um negro. É que se a vitima é branca e o
réu é negro, a chance do acusado ser condenado à morte é quatro vezes mais alta
do que quando acontece o contrário.
* Das mais de 16.000 pessoas executadas, apenas 30 eram brancos condenados
pelo assassinato de negros. Por outro lado, embora constituíssem apenas 12% da
população do país em 1991, 48% dos condenados à morte eram negros.
* Pesquisa realizada no estado da Geórgia demonstrou que quando a vítima é
branca e o réu é negro, chega a 22% a possibilidade do acusado ser condenado à
morte, todavia, quando a vítima é negra e o réu é branco, essa probabilidade é zero.
No mesmo estado descobriu-se, durante a década de setenta, que os assassinos
de pessoas brancas foram executados numa proporção onze vezes maior do que
os assassinos de pessoas negras.
* Um estudo realizado no estado do Texas revelou que em cada grupo de 4 pessoas
defendidas por advogados indicados pelo Estado (réus sem condições de pagar
advogados), em processos onde a pena capital poderia ser aplicada, 3 eram
condenadas à morte; por outro lado, em cada grupo de 3 pessoas defendidas por
advogados particulares, somente 1 era condenada à morte.
* Na década de 70, cerca de 65% dos condenados que aguardavam execução eram
trabalhadores não qualificados, sendo que 60% deles estavam desempregados no
momento em que cometeram os crimes.
Nos E U.A., como em qualquer outro país, o réu, para escapar da cadeira elétrica,
da forca ou do pelotão de fuzilamento, deve ter dinheiro para patrocinar uma boa
defesa ou possuir ligações amistosas com a classe ou raça dominante. Não por
outras razões, um governador do estado de Ohio comentou: “Durante a minha
experiência como governante, descobri que as pessoas presas no “corredor da
morte” tinham uma coisa em comum - não tinham dinheiro”. E um juiz da Suprema
Corte norte-americana completou: “Pode-se procurar, em vão, nos anais da nossa
justiça, a execução de qualquer membro das camadas ricas da sociedade.”
25
Todos os estudos mostram que os crimes, especialmente os violentos, são
resultados das condições sócio-econômicas e da evolução dos valores morais
de uma sociedade em dado momento, independentemente da existência ou não
da pena capital. Por exemplo, nos E.U.A., nos anos da Depressão, os homicidios
aumentaram apesar das frequentes execuções. Um estudo realizado na Califórnia
em 1981, parecia à primeira vista contradizer essa afirmação, mostrando um aumento
dos assassinatos em 237% após a suspensão da pena de morte; na verdade,
ocorreu aumento ainda maior (899%) de crimes não puníveis com a morte, indicando
que a elevação nada tinha a ver com as execuções, dependendo de fatores mais
complexos (a criminalidade é mais acentuada nas áreas de crescimento urbano
rápido, associado à pobreza; notou-se também uma correlação entre o aumento do
número de homicídios e a disseminação de armas de fogo)
Ainda nos Estados Unidos, aonde acontecem mais de 20.000 homicídios por ano,
cerca de 4.000 pessoas são condenadas, 250 das quais à morte. Quase metade
dessas sentenças acaba sendo comutada nos processos de apelação, mas o
público imagina que o pequeno número de presos encarcerados no “corredor da
morte” é o responsável pela totalidade dos crimes hediondos cometidos no país.
Contudo, o fato é que os crimes hediondos punidos com a morte muitas vezes não
podem ser distinguidos daqueles cometidos por centenas de outros criminosos,
cujas vidas foram poupadas. Em alguns casos, duas pessoas envolvidas de forma
idêntica em um mesmo assassinato recebem punições diversas: uma é enviada à
prisão e outra à cadeira elétrica.
edida, uma confissão
m
a
ss
ne
e,
or
rr
te
de
símbolo
do.
A pena de morte é um
de debilidade do Esta
Os riscos
Mesmo que os efeitos da discriminação racial e da desigualdade económica
pudessem ser eliminados, permaneceriam outras causas que possibilitariam
erros em qualquer sistema judicial concebido e administrado por seres humanos,
naturalmente falíveis. As decisões arbitrárias que privam indivíduos de sua liberdade
são inaceitáveis e devem ser corrigidas, mas á decisão arbitrária que tira a vida de
uma pessoa é simplesmente intolerável e não tem remédio.
26
A deliberação sobre quem vai viver ou morrer pode estar viciada por fatores
não diretamente relacionados com culpabilidade ou inocência, como pressões
econômicas e da comunidade, interpretações diferentes da lei ou opiniões parciais
de juizes e jurados. A descoberta de um erro técnico cometido pela policia ou pelas
autoridades judiciárias pode dar lugar à anulação de uma sentença; a incompetência
de um advogado ou uma prova importante não obtida a tempo pode conduzir a
uma execução. A falibilidade humana torna impossível que a pena de morte seja
aplicada de maneira imparcial e coerente.
Uma investigação realizada nos Estados Unidos, em 1987, apresentou provas de
que 350 pessoas condenadas à morte entre 1900 e 1985 eram inocentes Na maior
parte dos casos, o surgimento de novas provas teve como resultado a absolvição,
o indulto ou a retirada das acusações. Alguns presos escaparam da morte por
minutos, mas 23 deles foram executados.
Um relatório do Congresso dos EUA, elaborado pelo subcomitê da Câmara sobre
Direitos Civis e Constitucionais, publicado em outubro de 1993, trazia os nomes de
48 homens condenados à morte que, desde 1972, haviam saído em liberdade dos
“corredores da morte” norte-americanos, após sua inocência ter sido demonstrada.
O relatório detalhou numerosas deficiências inerentes ao sistema de justiça penal
e concluiu que: “A julgar pela experiência anterior, um número importante de
condenados à morte são inocentes, existindo um grande risco de que alguns deles
sejam executados”.
Quando os recursos judiciais são esgotados, a pena capital ainda pode ser comutada
em pena de prisão mediante o exercício do “direito de graça”. Derivado de uma
antiga prerrogativa atribuida aos reis e imperadores, que tinham poder de vida e de
morte sobre seus súditos, o “direito de graça” é utilizado apenas pela autoridade
máxima do país, e, embora se constitua em mais um obstáculo à pena de morte,
não raras vezes é usado de modo arbitrário: a sorte de um prisioneiro é determinada
pela vontade de uma só pessoa, sujeita ás influências de um partido político, de
amizades ou de outros fatores que nada têm a ver com as circunstâncias jurídicas
que originaram a condenação à morte.
A existência de um princípio básico de justiça penal, que diz que ninguém pode ser
condenado a uma pena mais grave do que aquela prevista no momento em que o
crime ocorreu, conquanto consista num grande avanço do Direito põe em relevo o
risco que corre uma sociedade ao adotar a pena capital. Ademais, com a constante
mudança dos costumes, um delito hoje castigado com a morte pode amanhã já
não o ser. Desta forma, alguém que na atualidade pague com a vida por um certo
tipo de delito, fica impossibilitado de, no futuro, favorecer-se com uma eventual lei
nova, mais branda, que não puna o mesmo crime com a pena capital.
27
A inaplicabilidade da pena de morte aos adolescente, anciãos, doentes mentais,
mulheres gravidas ou que acabem de dar a luz, constante em quase todas legislações
penais, embora também consista em um enorme progresso do Dreito, torna injusta
a aplicação de tal castigo aos indivíduos não protegidos por essas normas legais,
dentro da regra geral que todos são iguais perante a lei.
A crueldade
A pena de morte supõe que o Estado vai levar a cabo exatamente o mesmo ato que
a lei pune mais severamente. Praticamente todos os ordenamentos jurídicos que
prevêem a pena capital, a reservam para o homicídio deliberado e premeditado mas
inexiste forma mais premeditada e deliberada de dar morte a um ser humano que
mediante uma execução, um verdadeiro assassinato a sangue frio. E. assim como
não é possível criar um processo que imponha a pena capital livre de arbitrariedades,
discriminações ou erros, tampouco è possível encontrar uma maneira de executar
uma pessoa que não seja cruel, desumana e degradante.
Uma execução, como a tortura física, implica em uma agressão programada contra
o preso, e não em um ato de legítima defesa da sociedade, como querem alguns. A
legítima defesa constitui-se sempre em uma reação frente a uma ameaça iminente,
enquanto uma execução consiste em matar de forma planejada.
,
a foram assassinados
gr
so
e
o
id
ar
m
jo
cu
ssoa
Um mal não se
...
“Mesmo sendo uma pe
te
or
m
de
na
pe
a
ra
ente cont
sou firme e decididam
justiça nunca progride
A
.
ia
ál
es
pr
re
em
o
ad
pratic
o legalizado não
at
in
repara com outro mal,
ss
sa
as
O
o.
an
m
ser hu
tirando-se a vida de um
dos valores morais.”
contribui para reforço
thert King - EUA
Lu
tin
ar
M
de
a
úv
vi
,
ng
Ki
Kerta Scott
28
A crueldade da pena de morte não se limita ao momento da execução. Seu horror
singular, que não pode ser abrandado pela utilização de métodos de matar mais
“humanos”, está no fato de que a partir do instante em que se dita a sentença, o
condenado se vê obrigado a contemplar a perspectiva de que, em algum determinado
momento, irão busca-lo para tirar-lhe a vida. Estudos já realizados acerca do
tema mostram que as relações do preso com sua família e amigos começam a se
deteriorar acentuadamente ante a expectativa de uma separação permanente, e que
a perda de contato com o mundo exterior e as condições de isolamento em que se
encontram os condenados à morte também produzem sentimentos generalizados
de abandono, que conduzem a um estado denominado “morte da personalidade”,
caracterizado por uma forte depressão, apatia, perda do sentido da realidade e
degeneração da saúde física e mental.
A aflição sofrida pela família de uma vitima de assassinato é inimaginável, mas a
agonia dos familiares de um preso executado é igualmente terrível. As famílias das
vitimas que pedem perdão pela vida dos assassinos merecem respeito, como igual
respeito merecem aqueles parentes que, perturbados pela dor e pelo sofrimento,
pedem vingança. Porém, a argumentação sobre a pena de morte não deve basearse em emoções, mas sim na razão. Se não é possível impedir-se que uma pessoa
imponha sofrimentos a outra, pode-se e deve-se impedir que o Estado o faça, pois
a evolução da Justiça, ao longo dos séculos, foi no sentido de superar a vingança
particular.
Fazer justiça, como já se disse, não significa repetir um ato que a própria sociedade
condena. Modificar a legislação penal, para introduzir penas mais duras para
aqueles que praticam os chamados crimes hediondos e dificultar sua libertação
condicional, bem como criar formas de amparo às famílias das vítimas, talvez seja
uma forma adequada e humana de se enfrentar o problema.
a
anto não me provarem
qu
en
te
or
m
de
na
pe
humanos.”
“Pedirei a abolição da
infalibilidade dos juízos
Marquês de Lafayette
29
Parte 5
A questão brasileira
A instituição da pena de morte no Brasil para crimes comuns configuraria bem mais
que um problema para os defensores dos direitos humanos. Seria uma autêntica
tragédia nacional.
Em 1988, o País introduziu dispositivo que faz parte do cerne imutável da sua
Constituição, pelo qual a pena capital só é possível em tempos de guerra. O fato
dessa disposição conter-se em uma cláusula chamada pétrea implica, como a
maioria dos juristas brasileiros corretamente entende, na impossibilidade jurídica,
mesmo através de plebiscito, da Carta Magna ser emendada para acolher a pena
de morte.
Por outro lado, pouco tempo após a promulgação da Lei Maior de 1988, os mesmos
legisladores constituintes, na condição de membros do Parlamento, ratificaram o
Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, pelo qual torna-se muito difícil a
reintrodução da pena capital no Direito brasileiro.
Essa situação, contudo, não deve implicar no afrouxamento da vigilância por parte
daqueles que professam a causa dos direitos humanos. É preciso estar atento às
propostas que volta e meia surgem para legalizar o assassinato oficial no Brasil.
O quarto de século do “milagre brasileiro” criou uma forma de partilha compartimentada
e exclusiva do cenário social. Ricos e pobres, tal qual brâmanes e párias, moram
em locais distintos, educam-se em escolas diversas, divertem-se separadamente,
enfim dividem o ambiente urbano e rural de maneira absolutamente divorciada,
como se fossem cidadãos de duas nações, uma desenvolvidíssima e pequena,
a outra atrasadíssima e enorme. Este panorama, potencializado pelo gradativo
desaparecimento da classe média, é a realidade evidenciável do cotidiano nacional,
que faz do Brasil um dos campeões mundiais em violência.
30
Realidade que a profunda crise econômica dos países latino-americanos
transformou de triste em trágica. A estagnação econômica gerando o desemprego,
que conjuntamente com o êxodo rural, filho de injusta distribuição fundiária, contribui
para colocar os salários em patamares irrisórios e aqueles que vivem dele abaixo
da linha da miséria. Se isso não fosse suficiente, o colapso dos serviços públicos
de educação, saúde, saneamento e financiamento habitacional consegue o auge
de agravar o calamitoso quadro.
A reação da maioria do povo a esta cena de discriminação e descaso pelo qual
ela é, sem dúvida, a menos responsável, é naturalmente de revolta. Detentora de
pouquíssima consciência capaz de transformar sua inconformidade em oposição
consequente (único traço de afinidade que tem com o lado rico da cidadania), o
caminho da marginalidade é aquele naturalmente trilhado.
Por conta disto, sucedem-se os furtos, os roubos à mão armada, os estupros,
as depredações, os assassinatos. Os guetos não mais contêm as crianças e os
adolescentes destes filhos ilegítimos do “milagre”, que se espalham nas cida-des
como uma autêntica horda bárbara, mais temível ainda pelo fato de serem os seus
integrantes, muitas vezes, menores de 15 anos de idade (estatísticas das Nações
Unidas comprovam que os índices de homicídio são muito maiores nos países
onde a desigualdade social é intensa, e não nos países mais po-bres).
A elite social brasileira não enfrenta esta situação influenciando uma política que
confira reais oportunidades aos seus compatriotas desafortunados. Faz disso,
como sempre fez, um caso de polícia. E como a polícia não tem hoje condições
de reprimir, nos limites da lei, insatisfação deste porte, a lógica da exclusão, que
comandou o relacionamento entre patrícios e plebeus, transformou-se na estratégia
do extermínio.
Multiplicam-se as execuções extrajudiciais. Os esquadrões de assassinos
profissionais atuam em todas as regiões do país, sendo o preço dos seus “serviços”
de conhecimento público e notório. Os exterminadores de crianças e adolescentes
são recrutados no seio das próprias corporações policiais e sua monstruosa atuação
é de conhecimento internacional, tanto quanto a sua impunidade.
Tudo isso passa com a cumplicidade tácita e, às vezes (por exemplo, em
programas de rádio e televisão de grande audiência), expressa da maioria dos
nossos privilegiados. Os exterminadores são, hipocritamente, justificados pela
incompetência estatal. Os autores dos massacres do Carandiru e da Candelária
receberam telegramas de cumprimento oriundos das mais diversas regiões do
País.
31
Sabemos todos do caráter universalmente discriminatório da pena capital. Não
seria nada diferente nestes tristes trópicos. Apenas que aqui, sob a alegação da
incompetência e da morosidade do Judiciário, o segmento bem situado da sociedade,
patrocinador dos esquadrões de extermínio, tomaria a si as responsabilidades do
carrasco. O estado de guerra civil não declarado ficaria institucionalizado.
Uma história política brasileira bem ilustra o que aqui se quer dizer. No auge da
ditadura militar, ministros do general-presidente Costa e Silva discutiam uma lei
que lhe conferiria tremendos poderes. Contra ela postou-se Pedro Aleixo, ilustre
advogado que ocupava a vice-presidência. Um áulico do general interpelou o
vice-presidente, procurando intimidá-lo, com a capciosa pergunta se o mesmo
não confiava na prudência do general. A resposta, lapidar, foi de que não havia
nenhuma dúvida sobre os escrúpulos presidenciais, mas muitas a propósito das
boas intenções do guarda da esquina, quando ambos tivessem o usufruto daquelas
prerrogativas que a lei facultava.
Uma vez introduzida a pena de morte, os esquadrões de extermínio agiriam sob a
proteção de um, por assim dizer, “habeas-corpus” legal. A lógica da exclusão teria
sua “solução final” consagrada em texto de lei. Os pretos, pobres e meninos de rua
receberiam a resposta de sua ousadia. Os avanços liberais de 1988 encontrariam
um dique. As onipresentes tendências autoritárias da velha sociedade escravagista
sairiam do subterrâneo. Contra a eventual censura, em nome da legalidade, que a
multiplicação dos Carandirus e das Candelárias causasse, possivelmente ouviríamos
uma paráfrase do título da bela novela de Horace Maecoy: “Mas a própria lei não
condena à morte?”
ter o direito de matar
ra
pa
to
ei
rf
pe
te
an
st
é ba
mente nocivo.”
“Nenhum ser humano
ira
te
in
o
m
co
a
er
id
ns
aquele que co
Gandhi
32
Câmera de gás
33
Parte 6
Tratados internacionais abolicionistas
Uma das mais importantes novidades registradas nos últimos anos em relação
ao tema foi a adoção de tratados internacionais mediante os quais os Estados
se comprometem a não recorrer à pena capital. Em 1996, eram três os tratados
vigentes nesse sentido:
* O Segundo Protocolo Facultativo do Pacto Internacional de Direitos Civis e
Políticos, relativo à abolição da pena de morte, que já foi ratificado por 29 Estados.
Outros 4 o assinaram, indicando sua intenção de tornarem-se Estados-partes no
futuro.
* O Sexto Protocolo do Convênio Europeu para a Proteção dos Direitos Humanos,
referente à abolição da pena de morte, que já foi ratificado por 24 Estados europeus
e assinado por outros 6.
• O Protocolo da Convenção Americana de Direitos Humanos para abolir a pena de
morte, que foi ratificado por 4 Estados americanos e assinado por outros 3.
34
35
ESTADOS-PARTES E SIGNATÁRIOS
Posição em 31 de dezembro de 1996
36
NÚMERO DE PAÍSES ABOLICIONISTAS AO FINAL DE CADA ANO
1980 a 1996
37
O QUE É A ANISTIA INTERNACIONAL?
DE ONDE VÊM OS RECURSOS PARA FINANCIAR
AS ATIVIDADES DA ANISTIA INTERNACIONAL?
A Anístia Internacional é um movimento mundial
de pessoas que procuram assegurar, pelos meios
mais práticos, um respeito maior a alguns direitos
fundamentais proclamados na Declaração Universal
dos Direitos Humanos.
A Anistia Intemadonal depende das contribuições
individuais dos seus membros e simpatizantes. A
independência econômica é tão vital para o seu
trabalho quanto a independência política. A quase
totalidade dos recursos financeiros do movimento
provém de pequenas doações e de campanhas locais
para arrecadação de fundos.
Pedimos a libertação dos prisioneiros de consciência.
São assim chamadas as pessoas que foram presas, em
qualquer parte do mundo, por suas crenças, cor, sexo,
origem étnica, idioma ou religião, e que não usaram nem
defenderam o uso da violência. Pedimos julgamentos
justos e rápidos para todos os presos políticos. Nos
opomos à tortura e às execuções, sem exceção.
A
ANISTIA
POLÍTICOS?
INTERNACIONAL
TEM
RECONHECIMENTO INTERNACIONAL
Em 1977, a Anistia Internacional recebeu o Prêmio
Nobel da Paz pela sua contribuição em assegurar
bases sólidas em favor da liberdade e da justiça e,
portanto, em prol da paz no mundo. Por ocasião do
30º aniversário da Declaração Universal dos Direitos
Humanos, em 1978, a Anistia Internacional recebeu o
Prémio dos Direitos Humanos das Nações Unidas por
notáveis realizações no campo dos direitos humanos.
FINS
A Anistia Internacional é independente e imparcial, não
apoia nem se opõe a qualquer governo ou sistema
político. Desde que o movimento nasceu, há quase
40 anos, temos mantido a nossa independência frente
a qualquer governo, facção política, ideologia ou
religião. Nosso único objetivo é defender os direitos
humanos.
NÃO ESTAMOS SOZINHOS
O rápido crescimento do movimento pelos direitos
humanos tem gerado uma excepcional atividade
mundial no setor.
QUEM APOIA A ANISTIA INTERNACIONAL?
Contamos com mais de 1.000.000 membros e
simpatizantes em mais de 150 países e territórios.
Nosso movimento é aberto a todos aqueles que
apoiam nossos objetivos. Os membros fazem parte
das mais diversas camadas sociais e refletem um
leque variado de pontos de vista.
Existem hoje milhares de grupos nacionais
independentes e outras organizações que promovem
os direitos humanos.
Jornalistas, advogados, políticos e sindicalistas do
mundo todo tem desempenhado um papel relevante
na divulgação dos direitos humanos, aumentando a
pressão exercida sobre as autoridades e fazendo com
que a balança pese a favor dos direitos humanos. O
processo tem sido lento, mas hoje em dia, 50 anos
após a adoçáo da Declaração Universal dos Direitos
Humanos, já cabe aos governos zelar pelo cumprimento
das normas que eles mesmo estabeleceram. A
pressão da opinião pública é fundamental para que
isso aconteça.
O QUE FAZ A ANISTIA INTERNACIONAL?
Coletamos dados e recebemos denúncias sobre
violações dos direitos humanos em todo o mundo. Se
as informações estiverem corretas e se encaixarem
no nosso mandato, contatamos com os governos
violadores exigindo que suas autoridades respeitem
os direitos das vítimas.
Com frequência, esse trabalho se desdobra em
grandes campanhas mundiais, das quais participa
uma grande quantidade de membros e simpatizantes.
Vários prisioneiros hoje em liberdade nos disseram
que foi precisamente o apoio da opinião pública
mundial que lhes deu conforto na prisão, devolveulhes a liberdade ou sal-vou-lhes a vida.
38
POR QUE
LUTAMOS?
PORQUE APESAR DE
TODOS OS SERES HUMANOS
NASCEREM LIVRES E IGUAIS,
INDEPENDENTEMENTE DE SUA
RAÇA, SEXO, RELIGIÃO, IDIOMA
OU OPINIÃO POLÍTICA.
TODOS OS SERES HUMANOS
TEREM DIREITO A QUE SEUS
DIREITOS SEJAM GARANTIDOS E
RESPEITADOS PELA LEI.
TODOS OS SERES HUMANOS
TEREM DIREITO A VIDA. A
INTEGRIDADE FÍSICA E A
LIBERDADE,
TODOS OS DIAS, EM TODOS OS CONTINENTES,
ESSES DIREITOS ESTÃO SENDO VIOLADOS E A
CADA VEZ QUE ISSO OCORRE SOMOS NÓS - TODA
A HUMANIDADE - QUE ESTAMOS SENDO
ULTRAJADOS!
JUNTE-SE A NÓS!
39
40
RAZÃO, PAIXÃO
E ANARQUISMO
por Jaime Cubero
Texto extraído da revista de cultura libertária “Libertárias”
no 4 de 1998.
E
m primeiro lugar, algumas definições sobre o que é ANARQUISMO. É necessário
clarear alguns conceitos como anarquia, poder, governo e socialismo. Anarquia
significa ausência de poder ou de autoridade constituída. Há uma diferença sutil no
discurso, mas importante na realidade, entre poder político e poder social. O primeiro
exerce o poder de coação: uma ou mais pessoas têm o poder de obrigar outras a fazer o que
não desejam. Ocupam os governos do Estado, o KRATOS, o poder político no sentido grego,
qualquer que seja a sua forma, teocracia, aristocracia, monarquia, oligarquia, democracia, em
todas as suas instâncias. É contra esta poder hipertrofiado nos Estados Nacionais modernos que
os anarquistas lutam hoje. Os anarquistas sabem e todos os estudos históricos o demonstram
que o exercício deste poder sempre corrompe seus detentores, que acabam exercendo-o em
benefício próprio, de uma forma ou de outra, em diferentes graus, sempre em detrimento do
povo.
O outro poder, o poder social, é participado, exercido por todos nas decisões coletivas: o poder
de uma assembléia de tomar decisões. Exemplo de proporções enormes foi o poder que tinha
a CNT espanhola, com milhões de afiliados, durante a Guerra Civil, de decidir pela organização
autogestionária e pelas experiências práticas do anarquismo durante a revolução. É o poder que
é exercido por todos em qualquer prática autogestionária, nas decisões realmente coletivas.
41
O termo Governo tem o sentido de autoridade
diretora e o sentido restrito é o de governo
político, centralizador do KRATOS social.
Mas por extensão, tem o sentido de gestão,
organização, ordenamento. A expressão
“desgoverno” (avião ou carro desgovernado)
tem o sentido de desorganização e é análoga
ao sentido pejorativo de anarquia. A proposta
anarquista é pela organização e, neste
sentido, pelo autogoverno, como sinônimo
de autogestão.
O anarquismo não é uma doutrina rígida,
com artigos de fé, tábuas da lei, com profetas,
com excomunhões, processos de heresia e
sanções. É antes um conjunto de doutrinas e
princípios cujos postulados cujos postulados
básicos são convergentes, e que está sempre
aberto a novas contribuições. Estes postulados
básicos formam um fundo comum que, no
amplo universo das múltiplas e alternativas
atividades libertárias, são o anarquismo
propriamente dito.
Não há expressão mais aviltada do que o
O sentido de justiça e eqüidade, a revolta
termo SOCIALISMO. Assim como para a
contra a exploração econômica do homem
imensa maioria das pessoas é inconcebível
pelo homem e o combate ao Estado – com a
as sociedades humanas se organizarem sem
consciência plena de que é a instituição que
Estado, tal a desinformação, para a maioria
garante o regime de exploração e privilégio
das pessoas, socialismo passou a ser sinônimo
como fonte geradora de opressão e violência
de estatização. Intelectuais das mais variadas
sobre o indivíduo e a coletividade – têm a
tendências, nas universidades, na imprensa
liberdade como um dos mais altos valores
escrita e em todos os meios de comunicação
humanos; liberdade e autonomia plenas a
repetem a mesma pregação. Tudo o que se
partir do indivíduo para a associação livre
refere a socialismo passa pelo
fundada na solidariedade e no
O anarquismo combate
Estado.
apoio mútuo.
todas as formas de
autoritarismo, combate
todo o poder de coação,
tudo o que restringe,
limita, sufoca e as�xia o
potencial criativo do ser
humano.
Quando dizemos que o
anarquismo é antes de tudo
sinônimo
de
socialismo,
temos que dar um mínimo de
clareza ao nosso conceito de
socialismo: daí a expressão
socialismo libertário. Socializar
é tornar a propriedade e os instrumentos
de trabalho, enfim toda a riqueza e o que a
produz, disponível à sociedade, acabando
com a exploração do homem sobre o
homem. Mas, para o socialismo libertário, não
basta socializar os bens materiais: é preciso
socializar o saber, a informação e todos os
bens culturais. Mas, o que é fundamental,
jamais haverá socialismo se não se fizer a
socialização do poder – a primeira coisa a
ser socializada é o poder, que começa com a
autogestão das lutas. Destruir o poder político
e fortalecer o poder social, eis o que significa
autogestão, a real igualdade e liberdade em
todo o processo de transformação.
O anarquismo combate todas
as formas de autoritarismo,
combate todo o poder de
coação, tudo o que restringe,
limita, sufoca e asfixia o
potencial criativo do ser
humano.
Todo o ser humano tem necessidade de
desenvolver seu físico e sua mente em graus
e formas indeterminadas; todo o ser humano
tem o direito de satisfazer livremente essa
necessidade de desenvolvimento; todos
os seres humanos podem satisfazer essas
necessidades por meio da cooperação e
da vida associativa voluntariamente aceita.
Cada indivíduo nasce com determinadas
condições de desenvolvimento. Pelo fato
de nascer com aquelas condições tem
necessidades – em termos políticos, tem
o direito – de se desenvolver livremente.
Sejam quais forem suas condições, ele terá
a tendência de expandir integralmente. Ele
42
terá o desejo de conhecer, saber, exercitarse, gozar, sentir, pensar e agir com inteira
liberdade. Esta necessidade é inerente ao
próprio ser. Se o crescimento físico fosse
limitado por qualquer meio artificial, tal fato
seria qualificado de monstruoso. Também
a limitação do desenvolvimento de sua
sensibilidade, do seu desenvolvimento
intelectual, moral e afetivo, anulando o seu
potencial criativo seria lógico considerar-se
uma monstruosidade. No capitalismo esse
absurdo se dá em todas as instâncias da vida
social e ninguém considera isso um absurdo,
somente os anarquistas.
se estudo pertence à ontologia2. Apenas
alguns conceitos para nos situarmos como
anarquistas. As vias de nosso conhecimento
são a sensibilidade, a intelectualidade e a
afetividade. Temos portanto uma intuição
sensível, uma intuição intelectual e uma
intuição páthica (do grego παθος = afeto,
paixão). Há uma interatuação entre elas.
Podemos racionalizar um sentimento de
simpatia ou de antipatia3, como podemos,
através de uma dedução lógica, provocar a
nossa santa fúria.
Quase todos colocam os valores numa escala
hierárquica: uns num grau mais elevado que
outros4. O filósofo alemão MAX SCHELER
(1874-1928) apresenta a seguinte ordem, que
não é aceita por todos:
A descentralização, a autonomia e o
federalismo são as vias pelas quais o
anarquismo propões a construção de uma nova
sociedade. A descentralização Ser anarquista é antes de
Valores religiosos (santo e
máxima é o indivíduo. De
tudo uma atitude ética. profano)
plena liberdade e autonomia
Ante a iniqüidade, um
Valores éticos (justo e injusto)
individuais para a organização
ímpeto de justiça leva
Valores estéticos (belo e feio)
segundo os interesses e as
o anarquista a romper Valores lógicos (verdade e
necessidades, para as instâncias
mais complexas até a completa racional e afetivamente falsidade)
malha social, os princípios
com o sistema vigente. Valores vitais (forte e fraco)
não se alteram. Começando Romper com a autoridade Valores utilitários (conveniente
pelo indivíduo como unidade
e inconveniente)
é a�rmar a própria
celular da sociedade até o
mais amplo tecido social, o independência humana.
Há variáveis, subordinação
princípio da autonomia está
dos valores, que se refletem de pessoa para
presente. Os interesses específicos de cada
pessoa ou até na mesma pessoa conforme
instância não ultrapassam a própria esfera
o momento, mas sempre, na maioria das
e não sofrem nenhuma interferência. Os
circunstâncias que a vida oferece, um
interesses comuns de diferentes níveis e
prevalece sobre os outros5. Para o anarquista
setores – profissionais, de produção de bens,
todos os valores se subordinam aos valores
planejamento, geográficos1, etc. – resolveméticos, porque todos os atos humanos são
se pelas federações que as necessidades
passíveis de juízo ético.
práticas indicarão. A união de interesses com
objetivos comuns, sem quebra da autonomia,
O que é ser anarquista? Ser anarquista é antes
é a característica básica do federalismo. Assim,
de tudo uma atitude ética. Ante a iniqüidade,
as uniões locais se organizam em nacionais
um ímpeto de justiça leva o anarquista
até confederações internacionais.
a romper racional e afetivamente com o
sistema vigente. Romper com a autoridade é
Em todos os atos, ante todos os fatos, o ser
afirmar a própria independência humana. Ser
humano analisa, estima, aceita ou repudia
anarquista é procurar realizar no quotidiano
o que se dá, o que acontece, formulando
a plenitude do ato humano, e o ato humano
um juízo de valor. O tema é castíssimo e
43
só o é quando livre, fundado na vontade, no
conhecimento dos fins e no poder de realizálo. Contra toda a desmoralização do ato
humano, a luta anarquista não tem limite. Ser
anarquista é lutar pela liberdade de todos,
tendo a consciência de que pela liberdade
de todos, tendo a consciênciaq de que a
liberdade dos outros aumenta a própria e
não a limita.
acrescentando ao título a expressão “Em
plena anarquia”. A autora considera que o
amor livre na atual sociedade seria desastroso,
uma desmoralização. Seria irrealizável. Uma
sociedade plenamente livre e igualitária,
perfeitamente justa teria como base de
todas as liberdades a união livre dos sexos.
Considera que só a comunidade assumindo a
subsistência das mulheres e crianças resolveria
o problema da dissolução das uniões. Só uma
sociedade anarquista possibilitaria a escolha
livre. Para a autora, a maioria considera o amor
livre uma variedade de prazeres sensuais.
Pura ignorância do que significa liberdade7.
As paixões humanas6 sempre foram objeto
de estudo dos anarquistas. Apenas para
ilustrar, vamos citar as teses apresentadas no
2o Certâmen Socialista, realizado no dia 10 de
novembro de 1889 no palácio de Belas Artes
de Barcelona.
Já Anselmo Lorenzo, em seu trabalho, faz uma
incursão nas civilizações antigas rasteando as
diferentes formas e costumes que envolvem
a união dos sexos. Desde povos que viviam
na mais absoluta promiscuidade, aos que
adotaram a poligamia e a poliandria, até
a monogamia e os padrões que regem o
casamento na atual sociedade, para concluir
que não se tem direito algum de se afirmar
que o conceito atual de casamento e família
seja original, legítimo e unicamente natural.
Havendo liberdade e igualdade os indivíduos
e a sociedade se organizarão e praticarão a
forma que mais lhes convier.
Proposta do Círculo Operário de Barcelona:
“Supondo uma sociedade verdadeiramente
livre ou anarquista e sendo a instrução
elevada ao grau máximo concebível, podem
ser causas de desarmonia social as chamadas
paixões humanas?” Foram apresentados
seis trabalhos escritos sobre tal questão.
No primeiro, apresentado por Teobaldo
Nieva, é destacado o papel das paixões
no desenvolvimento físico e mental da
humanidade e como as religiões, as correntes
filosóficas, os poderes político e econômico
têm sufocado esta energia criadora. O autor
se estende na crítica às religiões, a todas as
formas autoritárias e repressivas e conclui
que, apesar de tudo, elas continuam a ser
seiva vivificante da vida. As paixões são
definidas e, ao contrário dos pecados capitais
que são sete (orgulho, avareza, luxuria, etc.), as
paixões são infinitas: o amor sexual, a paixão
pelo belo, pela arte, pelo bem comum, etc.
E, na sua essência, as paixões são benéficas,
libertam. O desequilíbrio e as injustiças que o
capitalismo e o autoritarismo provocam são
as causas dos desvios e das práticas viciosas.
Proposta do Centro de Amigos de Reus:
“Benefícios ou prejuízos que a humanidade
obteria adotando o amor livre”. Foram
apresentados dois trabalhos, o primeiro
de Soledad Gustavo. O trabalho começa
44
A expressão amor livre, hoje eivada de
conotações perjorativas, se confunde com
a amizade colorida dos anos 70, por isso
preferimos a expressão amor libertário8.
Simplesmente a união de dois seres que se
amam, sem injunção de espécie alguma. Sem
interferência do Estado, da Igreja, da família,
dos fatores econômicos, etc. sem preconceitos
de espécie alguma. O amor sexual é como
uma florescência da vida9. Suas pr4áticas
são tão diversas, tão diferentes seus graus de
desenvolvimento, como imenso é o campo da
afetividade. Impossível reduzir o amor a uma
definição concreta. Impossível determinálo por condições particulares fixas. Nada
mais variável. O amor sexual se apresenta
sempre impregnado do sabor particular de
cada associação humana; sujeito e normas,
formalismos e rituais que variam com o
organismo social. O amor sexual desprovido
de ritualismos ridículos, fórmulas jurídicas,
só será possível quando a sociedade tiver
superado as contradições que a impedem
de resolver os problemas que afetam as
necessidades básicas das pessoas.
Que vão desde o espaço físico das comunidades até a ecologia
de grandes regiões.
1
Axiologia (do grego axios = valor, valia + logos = teoria) é
o termo atualmente utilizado para designar a teoria do valor,
que investiga a natureza, a essência e os diversos aspectos que
o valor pode tomar na especulação humana.
2
Timologia (do grego tumh’ = Avaliação + logos = teoria) é a
disciplina que estuda o valor da avaliação, o valor extrínseco
de alguma coisa. Ambas são disciplinas regionais da Ontologia.
Dizemos que alguém faz valer algo, isto é, dá-lhe um valor,
valoriza.
A história do movimento anarquista é
pontilhada de extremos de paixão e lucidez10,
de amor e de heroísmo, que seria impossível
registrá-los todos aqui.
Há no ser humano um desejo inerente de ir
além, de ter uma vida diferente da que vive.
Há assim um ímpeto utópico. O desejo de
alcançar uma realidade que ainda não existe.
Há as utopias de evasão, que expressam um
desejo de afastamento da realidade vivida,
que denominamos fuga da realidade, e há
utopias de superação, que condensam o
desejo de alcançar estágios superiores ainda
não vividos. Para que o homem alcance uma
superação constante de si mesmo (o que seria
a efetivação de uma revolução permanente
não só em si, como também em seu meio) é
necessário uma dose de utopia, porque sem o
desejo de tornar tópicos os valores mais altos
é impossível estimular a criação11. Os que
julgam que o ímpeto utópico é uma fraqueza,
resultado de uma deficiência humana, pouco
sabem de psicologia.
Há uma frase do grande anarquista MAX STIRNER, que tem
servido de lemas para muitos anarquistas individualistas “…
No limiar de nossa época não está gravada a antiga inscrição
apolínea conhecete-te a ti mesmo mas sim a nova inscrição
faze valer a ti mesmo.
No plano psicológico, nossos sentidos realizam sempre uma
escolha entre diversos estímulos, recebendo apenas aqueles
que correspondem aos esquemas sensório-motores e aos
esquemas noéticos, intelectuais ou afetivos, racionais ou
emocionais. Também no plano sociológico, os processos são
os mesmos, desde as escolhas realizadas pelos indivíduos,
que seguem normas afetivas, como na estruturação dos
grupos sociais. O valor está presente em todos os atos que
praticamos.
3
Exemplos práticos da aceitação e predominância de alguns
valores sobre os outros: valores mercantis e utilitários da
nossa época (padrão desde a pré-infância); “Lei do Gerson”;
ter em oposição ao ser.
4
É preciso muito sonho, muito desejo, muita
crença nas possibilidades de cada um e na de
todos para que possamos superar obstáculos,
vencer dificuldades, construir possibilidades
remotas, tornar em ato o que parecia um
sonho impossível.
Todas as eras da Humanidade conheceram suas escalas de
valores, ora predominando uns, ora outros. A classificação
de SCHELLER pode ser ampliada, como muitos fazem, ou
até mesmo INVERTIDA. Para os socialistas autoritários,
os marxistas, no ápice encontram-se os valores; para os
anarquistas os valores éticos prevalecem sobre os demais; para
os fascistas são os valores vitais e utilitários que predominam,
para os cristãos, socialistas ou não, os religiosos.
5
A história do anarquismo é, como dissemos,
pontilhada por estes atos de lucidez, paixão,
heroísmo e amor que sempre foram e serão
muito gratificantes para os que viveram tais
momentos de plenitude libertária.
Todo o potencial criativo do ser humano é despertado
por um impulso apaixonado, nas infinitas variáveis de sua
manifestação. O último livro publicado de ROBERTO FREIRE,
“Tesudos de Todo o Mundo: Uni-vos” é rico de exemplos deste
aspecto.
6
Notas:
45
tomou depois outros sentidos, mas mantém o conteúdo
conceitual de satisfação plena, ou seja de uma profunda alegria.
Não se trata de uma alegria qualquer, como certas alegrias
passageiras, que deixam atrás de si uma marca sombria, até
mesmo um rastro de tristeza. Trata-se do júbilo: uma das
mais belas manifestações da paixão humana. Essa alegria,
esse júbilo é sempre excitante e criador de energias. O júbilo
é predominantemente da intelectualidade e da afetividade
implica um gozo mais profundo das coisas que almejamos.
Para o anarquista, esta é a sua grande compensação.
Não podemos esquecer que são conceitos emitidos em
1889, há 106 anos, quando a total dependência da mulher
e dos filhos ao homem, em qualquer união conjugal, era
objeto das discussões e de acerbas críticas dos anarquistas.
Uma de suas trincheiras de propaganda. Hoje, em que pese
todos os avanços e conquistas, a situação não mudou muito.
A paternidade responsável e a solução para o problema das
dissoluções conjugais só se verifica em casos isolados.
7
Em uma palestra, na CASA DA SOMA, sobre amor livre,
abordamos o assunto, juntamente com ROBERTO FREIRE
e concluímos por essa conceituação. A expressão amor
libertário é do ROBERTO FREIRE, a quem considero, entre os
autores anarquistas que conheço, o maior e mais profundo na
abordagem do tema, em termos atuais.
8
Jaime Cubero (1926 – 1998)
Anarquista brasileiro
Nota Manuscrita de Jaime Cubero: EXTRATO DA
PALESTRA PROFERIDA NA UNIVERSIDADE FEDERAL DE
UBERLÂNDIA EM 01-12-94, a convite das professoras
Christina Lopreatto e Jacy Seixas que também são
sócias e colaboradoras do Centro de Cultura Social.
O amor sexualo permeia e influi no comportamento humano
e nas ações políticas porque é intrínseco à natureza humana e
está presente na história da humanidade.
9
Citemos, entre muitos, os nomes de Louise MICHEL e
de Emma GOLDMANN, os Mártires de Chicago, BAKUNIN,
entre tantos, tantos outros. Bakunin, por exemplo, nos dá a
seguinte definição de
revolucionário:
“…é
aquele que, junto à
inteligência, à energia,
à lealdade e ao espírito
de conspiração, possua
também a paixão
revolucionária e o diabo
no corpo.” É literalmente
impossível citar aqui os
exemplos de paixão por
uma causa e um ideal
que transcedem todas as
ideologias.
10
Originais preparados por JOSÉ CARLOS O. MOREL.
Os
antigos
denominavam jubileu
a indulgência plenária,
solene e geral, concebida
pelos papas aos católicos,
nos primórdios do
cristianismo, do temor
do castigo pelos pecados
cometidos, ao livraremse das culpas. O termo
11
46
por A.C.R - Anarquistas Contra o Racismo
Criciúma - SC
“As crianças negras tem o coeficiente de inteligencia inferior ao das crianças brancas”. “Os
judeus são avarentos”. “Os alemães pertencem à uma raça superior”. “A mulher é menos
inteligente que o homem”.
Todas essas afirmações tem muito em comum:
nelas se emitem conceitos falsos, julgam-se as
pessoas através do grupo a que pertencem e
cometem-se generalizações indevidas. Além
disso, são crenças apenas emocionais, sem
nenhuma base científica.
menos nítida a separação da espécie humana em
raças diferentes, tornando esse conceito muito
impreciso.
A espécie humana pode ser dividida
em raças?
A grande variedade genética da espécie humana
torna absurda a idéia de uma “raça humana pura”.
Sua existência não apenas é impossível como
seria altamente indesejável, pois a variedade
genética dentro de uma população é um
fator importante para haver êxito na luta pela
sobrevivência. Mais absurdo ainda do ponto de
vista biológico( para não falar no aspecto ético
e social ) é tendencia que alguns tem de conferir
certas características( positivas ou negativas )
a toda uma raça, classificando-a, por exemplo,
O mito da “raça pura”ou da “raça
superior”
As numerosas populações existentes no mundo
diferem umas das outras pela cor da pele, pelo
tipo de cabelo, pelos olhos, pelo nariz, pelos
lábios, pela estatura, etc. Essas e outras diferenças
levaram aos cientistas a dividir a espécie humana
em raças. Entretanto, com as migrações e o
desenvolvimento dos meios de transporte, a
mistura entre as populações tornou cada vez
47
problemas da sociedade.
como “muito inteligente” ou “inferior”. Neste
caso, ignora-se não apenas a grande diversidade
genética de nossa espécie, mas também a
influência do ambiente sobre diversas de suas
características.
O anti-semitismo serve ainda para mostrar que,
concentrando as tensões políticas sobre uma
vítima indefesa, aumenta-se a soliedariedade
de grupo em face de um inimigo em comum,
aumentando também a coesão social e
fortalecendo o poder do grupo dominante.
Algumas pessoas se servem da história para
demonstrar teorias de superioridade racial.
Argumentam elas que certas raças atingiram
maior grau de civilização que outras. Entretanto,
uam análise objetiva mostra que isso não é
verdadeiro, pois na realidade a supremacia
política e cultural não é privilégio de nenhum
grupo étnico. Ao longo da história, quase todos
os grupos étnicos conheceram fases de intenso
desenvolvimento e fases de decadência. Além
disso, qual é o critério para considerar um
grupo mais desenvolvido que o outro? Será
que o homem moderno, capaz de destruir toda
a humanidade com armas nucleares pode ser
considerado superior às civilizações indígenas,
que vivem em equilíbrio com a natureza?
O racismo traz gravíssimas dificuldades para
as sociedades onde existe. Além de problemas
sociais, como a violência, a degradação social, o
aumento de doenças entre o grupo discriminado,
etc., ele prejudica a sanidade mental não apenas
dos indivíduos desse grupo mas também dos
racistas.
Finalmente, como se todos esses problemas não
fossem o suficiente, o racismo estabelece um
círculo vicioso: a partir do momento em que uma
sociedade considera um grupo como inferior
e o trata com preconceito e discriminação,
segregando-o economicamente e não lhe
oferecendo condições adequadas de saúde e
educação, ela dificulta que suas potencialidades
floresçam. Isto por sua vez serve de argumento
aos racistas, que atribuem tais limitações a fatores
genéticos.
Como surge o racismo?
O preconceito racial é sempre adquirido através
da aprendizagem. Em geral, a pessoa é levada
desde criança a ter idéias e atitudes racistas, por
viverem numa sociedade em que predominam
valores racistas.
A solução para o racismo é fornecer uma boa
educação às crianças estimulando o contato e
a cooperação entre grupos étnicos diferentes e
eliminando a segregação racial que consiste no
confinamento de um determinado grupo étnico
em locais específicos (guetos).
Sob o ponto de vista histórico, o racismo serviu
frquentemente para justificar a dominação e
a exploração de um grupo por outro. Durante
a expansão colonial, por exemplo, os países da
Europa que conquistaram e exploraram parte
da Ásia, África e América obtinham vantagens
econômicas ao negarem direitos iguais aos povos
colonizados. Álem disso, considerando os povos
dominados seres inferiores, os dominadores
justificavam também o sofrimento que lhes
infligiam – a escravidão, por exemplo.
No caso do anti-semitismo na Alemanha nazista,
também houve motivos econômicos, já que os
nazistas prometiam a seus adeptos os bens e os
postos ocupados pelos judeus. Álem disso, os
judeus funcionaram como “bodes expiatórios”,
sendo responsabilizados por todas as dificuldades
econômicas e sociais pelas quais passava a
Alemanha na época. A luta racial funcionou
então para desviar a atenção dos verdadeiros
48
MANIFESTE-SE!
49
Mumia Abu-Jamal
Jamal foi levado a julgamento em Junho de 1982 e
condenado à morte em 3 de Julho. Sabo era já famoso
como o “recordista” em número de condenações
à morte (seis antigos promotores de Filadélfia
declararam, sob juramento, que nenhum réu poderia
esperar julgamento imparcial na Corte de Sabo). O
júri só foi formado após a remoção de onze negros
perfeitamente qualificados.
,
pseudônimo de Wesley Cook (24 de abril de 1954)
é um ex-integrante do Partido dos Panteras Negras
que se tornou jornalista na Filadélfia e ficou popular
com o seu programa de rádio “A voz dos sem-voz”.
Mumia Abu-Jamal foi condenado a morte por,
supostamente, matar um policial que espancava seu
irmão, no início dos anos 80.
O advogado de defesa declarou publicamente que
não havia entrevistado nenhuma das testemunhas,
e que não estava preparado para o julgamento.
Apesar disso, Sabo recusou a Jamal o direito de fazer
sua própria defesa. Segundo a promotoria, Jamal
teria confessado, no hospital, a autoria da morte de
Faulkner, mas um relatório assinado pelo policial Gary
Wakshul (que fez a guarda do réu), e não apresentado
ao júri, diz que “o negro nada comentou”. Quando a
defesa convocou Wakshul, a promotoria alegou que
ele estava de férias e fora de alcance, e o juiz não
aceitou esperar seu regresso; hoje se sabe que ele
estava em casa.
Em 27 de março de 2008, a Corte Federal de Apelações
dos EUA anulou essa sentença, convertendo-a
em prisão perpétua, além de conceder um novo
julgamento a Mumia. Jornalista e militante negro
anti-racista, Mumia foi preso em 9 de Dezembro de
1981, sob a acusação de ter assassinado o oficial de
polícia Daniel Faulkner, em Filadélfia. Ao longo de
20 anos de uma incessante batalha judicial, repleta
dos apelos por um julgamento justo por parte
de personalidades e milhares de manifestantes, e
apesar da constatação de inúmeras irregularidades
em seu processo, a data de sua execução foi várias
vezes marcada e depois suspensa. Por mais que as
autoridades tentem tratá-lo como um criminoso
comum, Jamal é atualmente, o único prisioneiro
político dos Estados Unidos condenado à morte,
embora não tenha sido o primeiro.
O médico de Jamal também negou ter ouvido qualquer
confissão. As supostas incongruências se acumulam,
seriam necessárias várias páginas para as descrever.A
promotoria não apresentou nenhuma prova material
de suas acusações. Em contrapartida, foi comprovada
a prática de intimidação de testemunhas. Veronica
Jones, que primeiro depôs contra Jamal e depois
mudou a história, declarou que fora obrigada a
mentir: policiais haviam ameaçado usar contra ela
antigas acusações de mau comportamento que
poderiam custar-lhe a guarda dos filhos. Quando
Verónica contou isso, foi imediatamente presa.
Segundo o relato de várias testemunhas, tudo
começou quando Jamal interveio para socorrer
seu jovem irmão, que estava sendo brutalmente
espancado por Faulkner. Havia um outro homem,
não identificado, no meio da briga. Houve muita
confusão, gritos e disparos. Quando outros policiais
chegaram ao local, Jamal estava ferido e Faulkner
morto. As mesmas testemunhas declararam ter visto
o homem não identificado – que não se parecia com
Jamal – fugir do local.
Mas o caráter político do julgamento pode ser
inferido dado que o FBI (polícia federal) apresentou,
como “prova” contra Jamal, um arquivo de mais de
600 páginas contendo um resumo de suas atividades
como militante do movimento negro. Foi preso
pela primeira vez, em 1968, aos 14 anos, durante o
protesto contra o racista George Wallace, então em
campanha presidencial. Aos 15 anos, participou do
movimento para rebatizar sua escola com o nome
Malcolm X e ajudou a criar o comitê do Partido dos
Panteras Negras (Black Panther) em Filadélfia.
Aqui começam as flagrantes irregularidades:
nenhuma perseguição ou busca foi feita na hora
pela polícia. A arma que foi encontrada com Jamal
não poderia ter disparado as balas que mataram o
policial. Nenhum exame de balística foi efetuado
para saber se a arma de Jamal tinha sido utilizada. E
mais: nenhuma das testemunhas que saíram em sua
defesa foi arrolada no processo. Uma delas declarou
que a polícia o ameaçou de prisão se testemunhasse.
Alguns asseguraram que a polícia os havia intimidado
para que eles mudassem seu testemunho. Para coroar
essa montanha de irregularidades, o juiz que presidiu
o processo, Albert Sabo, declarou publicamente sua
hostilidade em relação a Jamal, que em sua juventude
foi membro do movimento Black Panthers.
50
Mais tarde, tornou-se membro da redação central
do jornal do movimento. Nos anos 70, passou a fazer
parte de uma lista do FBI de pessoas que “ameaçam
a segurança dos Estados Unidos” (ou seja, um dos
que seriam imediatamente presos em casos de
“emergência nacional”). Jornalista graduado, Jamal
tornou-se locutor de rádios locais e de uma rede
nacional de emissoras negras. Além de entrevistar
gente como Bob Marley e Alex Haley, ficou conhecido
como “a voz dos que não têm voz”.
Denunciava a violência policial – em particular, as de
natureza racista – e os dramas diários da população
pobre. Foi várias vezes ameaçado por policiais e
autoridades, como o prefeito Frank Rizzo. Em 1994,
a rede Rádio Pública Nacional o contratou para fazer
comentários sobre a vida na prisão. O programa foi
cancelado antes de começar, sob forte pressão do The
New York Times, do senador Robert Dole (então, líder
da maioria no Senado) e da Ordem Fraternal (que
tentou, em 1995, proibir a publicação de seu livro
Live from Death Row – Ao Vivo do Corredor da Morte,
recentemente lançado no Brasil, editora Conrad).
Seguiu-se uma complexa e árdua batalha judicial e
política logo após a sua sentença de morte em julho
de 1982. A dimensão do caso, levou a que várias
entidades e personalidades clamassem por justiça, em
sua defesa, tais como : Congresso Nacional Africano,
Amnistia Internacional, Parlamento Europeu, Ordem
Nacional dos Advogados (dos Estados Unidos),
Coalizão Nacional pela Abolição da Pena de Morte,
Jacques Derrida, Stephen Jay Gould, Jesse Jackson,
Danielle Mitterrand, Salman Rushdie, arcebispo
Desmond Tutu, Elie Wiesel.
Exatamente por ter atingido tal dimensão, o seu
julgamento tornou-se exemplar. Caso ele escape à
execução, o estatuto da pena de morte terá sofrido
um duro golpe, e não apenas nos Estados Unidos
– que representam, hoje, no quadro da ONU, o
maior obstáculo político à abolição total da pena
de morte em todo o mundo. Em Abril, a Assembleia
anual da ONU para os Direitos Humanos aprovou
várias resoluções em que pede aos países membros
que eliminem a pena de morte, cuja aplicação está
em franco declínio no mundo. Em 1965, apenas
doze países haviam abolido a ‘‘pena capital’’. Hoje,
segundo a Amnistia Internacional, já somam 68,
além de 14 que limitaram seu uso apenas a crimes
hediondo e outros 23 que a eliminaram na prática
(não praticando qualquer execução por um período
de pelo menos dez anos). São 105 países contra 90
que ainda a mantêm em vigor – e a maioria destes 90
está discutindo a possibilidade de sua abolição total,
seja sob pressão política seja porque concluíram que
a pena máxima não diminui o índice de criminalidade.
Um pequeno punhado de países é responsável pela
maioria das sentenças de morte (Estados Unidos,
China, Congo, Irã).
www.anarcopunk.org/mumialivre
51
52
DENUNCIADENUNCIADENUNCIADENUNCIADENUNCIA
DENUNCIADENUNCIADENUNCIADENUNCIADENUNCIA
De Jornal do Brasil
http://www.jb.com.br/pais/noticias/2011/04/11/os-neonazistas-sao-bem-mais-quemeia-duzia-afirma-delegado/
Ana Cláudia Barros
A recente identificação de 25 gangues de skinheads pela Delegacia de Crimes Raciais e
Delitos de Intolerância (Decradi), em São Paulo, e a participação de movimentos de ultra
direita no ato de apoio ao deputado federal Jair Bolsonaro (PP-RJ) no último sábado (9),
na Avenida Paulista, colocam em debate a presença, cada vez mais evidente, de grupos
neonazistas no Brasil.
Mas há motivos reais para preocupação? Para o delegado Paulo César Jardim, da Primeira
Delegacia de Policia de Porto Alegre, a resposta é sim, sobretudo, diante da possibilidade
de conexão com outros tipos de criminosos. Responsável pelo comando do Grupo de
Combate ao Movimento Neonazista da Polícia do Rio Grande do Sul, Jardim destaca que
a quantidade de seguidores dos ideiais de Adolph Hitler é “bem maior do que a meia
dúzia que as pessoas pensam”.
Sem revelar pormenores, o delegado, que, no ano passado, alertou o senador Paulo Paim
(PT-RS) sobre possível ataque, expressa preocupação particular em relação à proximidade
com a Argentina, país escolhido por oficiais nazistas como refúgio após a Segunda Guerra
Mundial.
Sobre o perfil dos integrantes desses grupos, Jardim afirma que, em geral, são jovens
entre 17 e 30 anos, de classes sociais diversas, movidos pelo ódio a judeus, homossexuais
e negros. Ele destaca ainda que há diferenças entre os movimentos neonazistas do Sul e
os de São Paulo.
- De forma nazi mais pura, encontramos no Rio Grande do Sul. Em São Paulo, vemos
uma mescla. Há pessoas que se dizem neonazistas, mas são negras, mestiças. Estão meio
confusas na ideologia. Mas em São Paulo, as tribos são muito maiores.
Confira a entrevista.
< Como é o trabalho desenvolvido
pelo grupo de combate ao movimento
neonazista da Polícia do Rio Grande do
Sul e que tipo de informações já foram
levantadas?
de 10 anos. Temos inúmeras prisões. Mais de
35 pessoas já foram indiciadas em inquéritos
policiais e denunciadas por formação de
quadrilha, tentativa de homicídio. Alguns
estão na condição de foragido.
> Paulo César Jardim - É claro que não
posso te dizer a forma como estamos
trabalhando e o que conseguimos levantar,
porque é um trabalho de inteligência. Eles
são espertos do outro lado, são uma célula
do mal. Dá para ver com base em tudo que
estão propugnando por aí. Posso dizer
que estamos monitorando o movimento
neonazista no Rio Grande do Sul há mais
< Quando o senhor se refere às tentativas
de homicídio, está falando de crimes de
ódio contra negros e homossexuais?
53
> Contra negros, homossexuais e judeus.
Esse pessoal entende que negros, judeus
e homossexuais são sub-raça e há uma
necessidade de fazer uma“oxigenação social”,
eliminando o que consideram subespécie.
No final do ano passado, conseguimos abortar
cinco células que estavam no Rio Grande
do Sul. Era um grupo, eu diria, de tamanho
bastante preocupante.
> É bem maior do que essa meia dúzia que as
pessoas pensam. Só de indiciados, temos mais
de 35. O movimento não é só em Porto Alegre.
Ele se estende pelo Rio Grande do Sul, com
diversos segmentos… Se a senhora sabe que o
Rio Grande do Sul é fronteira com a Argentina,
país onde os oficiais nazistas, quando no final
da Segunda Guerra, se refugiaram…
< O que o senhor considera como “tamanho
bastante preocupante”?
> Quando nós encontramos bombas nas
células… Encontramos farto material de
< Há ligação entre movimentos neonazistas
propaganda, farto material de livros de
brasileiros e argentinos?
convencimento, além de munições. Quando
nós chegamos a constatação de que essas
> Só posso dizer que estamos preocupados
bombas são iguais àquelas que explodiram em
com a Argentina aqui perto.
São Paulo, durante a Parada Gay, onde houve
< A preocupação é referente a outros países
feridos e mortos.Chegamos à conclusão de
vizinhos também?
que a situação era preocupante. Nós temos
depoimentos que diziam qual era o objetivo
> É um movimento internacional, com mais
(do grupo). O objetivo era explodir Sinagogas e
de 60 anos, que prega o prazer pelo ódio.
agredir o movimento da passeata livre, aqui, no
Em algumas cartas que encontramos em
Rio Grande do Sul. Graças a Deus, conseguimos
células, em conversas entre eles, havia coisas
abortar isso. No final do ano
assim: “meu ódio continua
passado, desmontamos mais O objetivo era explodir
o mesmo”, “meu ódio
uma célula onde encontramos
Sinagogas e agredir o aumentou”, “meu ódio não
material de propaganda contra
movimento do Passe vai acabar nunca”, “o meu
o senador Paulo Paim (PT-RS).
ódio é sair do presídio e dar
Livre, aqui, no Rio
um tiro na cara de um judeu”.
< E como tem sido a atuação
Grande do Sul.
Eles falam isso com orgulho.
da polícia diante dessas
informações?
< Há razões para preocupação de fato?
> Continuamos com o trabalho de
monitoramento. Sabemos quem são, onde
andam, o que fazem. Esperamos que não façam
nada, que continuem com suas convicções,
mas fiquem nessa de proselitismo só, porque
a partir do momento que decidirem cometer
ilícito penal, temos todas as condições de agir.
Por isso, o monitoramento.
> Enquanto estivermos mantendo esse
controle que estamos mantendo, enquanto eles
souberem desse controle, acho que podemos
ter uma relativa tranquilidade. A preocupação
maior é quando eles se aproximam com outros
vínculos, tipo bandidos, marginais.
< Isso tem ocorrido?
Quando se fala em neonazistas, a primeira
referência são grupos europeus. Há quem diga
que os grupos daqui, do Brasil, são compostos
por meia dúzia, que tentam importar este
modelo. Acho que as pessoas estão muito
equivocadas.
> Essa é a nossa preocupação. Essa é a nossa
tensão maior.
< Qual o perfil dos integrantes dessas
células? Existe um definido?
> Temos uma faixa de idade que varia de 17, 18
anos até 25, 30 anos. Às vezes, um pouco mais,
porque muitos deles estão envelhecendo.
Vários deles têm conhecimento doutrinário.
< Quantos neonazistas o senhor estima que
há por aqui?
54
Alguns têm algum nível de conhecimento,
principalmente, em relação à simbologia.
Daí já parte para um estudo em função das
tatuagens que eles usam. Dependendo do tipo
da tatuagem, sei mais ou menos qual a filosofia
ou o que já fizeram, porque as tatuagens para
eles funcionam como medalhas.
de um lado, mas está lá, do outro”.
< Recentemente, foram descobertas 25
gangues de skinheads em São Paulo. Há uma
troca de informações entre as polícias?
> Sim. O pessoal de São Paulo e do Rio Grande
do Sul conversa muito. Eles vêm a Porto Alegre,
nós vamos a São Paulo. A senhora lembra
o seguinte: o Sul do Brasil é basicamente
originário de colonização alemã, italiana,
polonesa. Não esquece que já tivemos, no Rio
Grande do Sul, o partido nazista, funcionando
de forma oficial na década de 1930. Aqui,
também, nasceu o movimento integralista.
< A que classe social esses grupos pertencem
em geral?
> Temos alguns casos de pessoas bem
situadas socialmente, inclusive, com apoio
dos pais. Temos outros casos de pessoas
bastante simples, que eu diria que são os
mais grossos, truculentos. Tudo bem que
< Baseado nessas informações que vocês,
todos são truculentos. Dentro da doutrina
da polícia, trocam, o que se pode dizer
deles, não podem deixar, por exemplo, de
sobre o movimento neonazista no Brasil?
praticar arte marcial. Isso consta nos códigos
A concentração maior é, de fato, no Sul do
de conduta deles que eu tenho
País?
apreendido aqui. Eles têm que
Mas não tenho
exercitar alguma arte marcial dúvidas de que são
> De forma nazi mais pura,
para quando forem enfrentar o
encontramos no Rio Grande do
inimigo, possam ter condições grandes convardes. Só
Sul. Em São Paulo, vemos uma
de vencê-los. Mas não tenho atacam em grupo de
mescla. Há pessoas que se dizem
dúvidas de que são grandes quatro, cinco contra
neonazistas, mas são negras,
convardes. Só atacam em grupo um. Essa é a regra.
mestiças. Estão meio confusas na
de quatro, cinco contra um. Essa
ideologia. Se bem que há tribos
é a regra. Nunca há um ataque de
neonazi que realmente têm esse sentimento
um para um. Dois para um é muito raro. Dois
de ódio. Mas em São Paulo, as tribos são
para um acontece quando vão apunhalar,
muito maiores. Tem os hooligans também.
esfaquear por traição. Mas num ataque direto,
Aqui, tivemos uma tentativa do movimento
como normalmente funciona, são aqueles
neonazi de se infiltrar na torcida geral do
brutamontes contra um mais fraco. É a regra.
Grêmio. Eles foram expulsos da torcida. Não
tentariam na torcida do Internacional, porque
< Essas articulações entre células acontecem
historicamente é um clube de negros.
também pela internet?
< O senhor falou de uma aproximação com
a Argentina, que preocupava. Agora, e com
a Europa?
> Há fóruns, páginas neonazistas… Posso lhe
dizer uma coisa? Não acredite muito no que
está na internet. É um jogo de inteligência.
Para um lado e para o outro.
> Na Europa, o movimento neonazi é muito
forte em Portugal. Eu diria que se fosse me
preocupar em relação a Europa, Portugal seria
o País de maior relevância.
< O senhor está dizendo que eles plantam
pistas falsas para dificultar a ação da
polícia?
> Claro. Estamos num jogo de inteligência no
qual eles tentam nos enganar, nos ludibriar.
Como a minha avó dizia: “O passarinho canta
Maiores informações sobre luta anti-fascista:
www.anarcopunk.org/antifa
55
56
57
58
59
60
61
62
63
64
65
66
67
68
Experimentos libertários e
emergência de saberes anarquistas
no Brasil
de Rogério Humberto Zeferino Nascimento
Tese apresentada à Banca Examinadora da
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,
como exigência parcial para obtenção do título
de Doutor em Ciências Sociais – Política sob a
orientação do Prof. Dr. Edson Passetti.
Resumo
Os estudos contemporâneos em torno das várias
realizações dos anarquistas no Brasil, no período
da Primeira República, estão, no geral, matizados
por uma perspectiva disciplinar. Projetando sobre
o movimento anarquista uma demanda que lhe
é alheia, desconsideram aspectos significativos
deste movimento. Os olhares disciplinados,
estabelecidos no conjunto destas pesquisas,
são cegos para apreender comportamentos e
pensamentos refratários à disciplina. Ao contrário,
aqui evidencio o caráter indisciplinar das
iniciativas libertárias, focalizando-as como recusa
tanto da hierarquia nas relações sociais como de
um saber seccionado que outorga poder pastoral
ao especialista. Poder este tão bem estudado por
Foucault. A partir da análise de duas revistas e
dois jornais anarquistas, publicados no eixo RioSão Paulo entre os anos 1907 e 1915, sigo pistas
que informam sobre a desoneração das linhas
divisórias entre as áreas do conhecimento e, mais
além, entre vida e saber. Não há como deixar de
reconhecer aproximações com o nomadismo
de Deleuze. Indisciplina como desrespeito
às fronteiras; também como iconoclastia e
antropofagia, concebendo a existência enquanto
experimento. Por sua vez, produção e socialização
de conhecimento acontecem numa vibração
eminentemente coletiva. Neste processo, a
noção de autodidatismo, como aporte conceitual
explicativo, nada, ou quase nada, tem a dizer.
As relações configuram vida e saber, devendo
este, como afirma Max Stirner, morrer para se
transformar em vontade, esta que é a força de
oposição da pessoa. Stirner apresenta a educação
disciplinar como adestramento, um constante
cortar de asas, negando a singularidade do único.
A indisciplina, para Stirner, é saudável!
DOWNLOAD COMPLETO AQUI:
http://anarcopunk.org/biblioteca/wp-content/
uploads/2009/01/indisciplina-tese-rogerio.pdf
DOWNLOADCOMPLETODOWNLOADCOMPLETODONW
LOADCOMPLETODOWNLOADCOMPLETODOWNLOAD
Indisciplina:
69
Vigiar e Punir
de Michel Foucault
Resumo
“Que as punições em geral e a prisão se originem de
uma tecnologia política do corpo, talvez me tenha
ensinado mais pelo presente do que pela história.
Nos últimos anos, houve revoltas em prisões em
muitos lugares do mundo. Os objetivos que tinham,
suas palavras de ordem, seu desenrolar tinham
certamente qualquer coisa de paradoxal. Eram
revoltas contra toda uma miséria física que dura há
mais de um século: contra o frio, contra a sufocação
e o excesso de população, contra as paredes velhas,
contra a fome, contra os golpes. Mas eram também
revoltas contra as prisões modelos, contra os
tranqüilizantes, contra o isolamento, contra o serviço
médico ou educativo. Revoltas cujos objetivos
eram só materiais? Revoltas contraditórias contra a
decadência, e ao mesmo tempo contra o conforto;
contra os guardas, e ao mesmo tempo contra os
psiquiatras?”
DOWNLOAD COMPLETO AQUI:
http://anarcopunk.org/biblioteca/wp-content/
uploads/2009/01/foucault-vigiar-e-punirmichel-foucault.pdf
Jaime Cuberos
Resumo
“(…) Fizeram uma espécie de concurso: a primeira
classe que fosse toda com o uniforme completo
naquele dia não teria aula e poderia brincar, jogar
bola. Isso era para entusiasmar a meninada! Então
nós ganhamos. E claro, jogamos bola. Mas quando
íamos embora o professor disse: “Os outros –
eram duas classes de 4° ano – não conseguiram,
tiveram dificuldades e não vão nos acompanhar.
Vamos todos juntos lá, formar uma comissão e
falar com o diretor para liberar a outra classe, para
virem brincar com a gente também”. Solidário!
Quer dizer, são atitudes que demonstram, pelo
menos, um sentimento e uma prática em relação à
pedagogia que contraria totalmente… Olha, você
vai me desculpar, agora vou abrir um parênteses
aqui: eu, por exemplo, falando da minha vida e das
minhas experiências é que vou falando também
de anarquismo.”
DOWNLOAD COMPLETO AQUI:
http://anarcopunk.org/biblioteca/wp-content/
uploads/2009/01/entrevistas-jaime-cubero.
pdf
DOWNLOADCOMPLETODOWNLOADCOMPLETODONW
LOADCOMPLETODOWNLOADCOMPLETODOWNLOAD
Entrevistas:
70
As Matanças de Anarquistas na
Revolução Russa
de Juan Manuel Ferrario
O Mito do Partido, de Federação de Estudantes
Libertários, & outros escritos.
Resumo
“(…) A verdadeira história é escrita pelos povos, com
seu sacrifício, suasdores e sua coragem.
Estas páginas nos falam de uma porção da história
que pretenderam apagar, nosso desafio é recuperála do esquecimento, porque as injustiças de ontem
persistem e o caminho a seguir requer de memória
e reconhecimento para com aquelas mulheres e
homens que fizeram da solidariedade uma bandeira
digna e luminosa.
Bandeira que empunhamos com coragem e alegria
na luta pela emancipação integral dos indivíduos
e dos povos. Por uma sociedade sem exploradores
nem explorados, sem opressores nem oprimidos.”
DOWNLOAD COMPLETO AQUI:
http://anarcopunk.org/biblioteca/wp-content/
uploads/2009/01/as-matancas-de-anarquistasna-rev-russa.pdf
Mais à esquerda que o Castrismo
de Júnior Bellé
Tese apresentada à Banca Examinadora da
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,
como exigência parcial para obtenção do título
de Doutor em Ciências Sociais – Política sob a
orientação do Prof. Dr. Edson Passetti.
Resumo
Em 1º de janeiro de 2009 completa-se 50 anos
da Revolução Cubana. Neste mesmo dia, em
1959, Fidel Castro destrona Fulgencio Bastista e
torna-se o novo ditador da ilha. Este artigo trata
das histórias desta revolução e daqueles que
terminaram traídos por ela.
“Uma mudança política que apenas coloque as
mesmas estruturas a serviço de um novo grupo
social, de um partido ou de um chefe não muda
para o trabalhador sua condição de explorado, e
para o cidadão sua condição de dominado.
Uma mudança como esta não é uma revolução
social, a menos que se entenda como tal uma
simples substituição de governantes através
de um golpe de Estado ou de uma insurreição
armada. E foi isso que aconteceu em Cuba: Bastista
foi substituído por Castro. E para consolidar sua
hegemonia e perpetuar-se no poder, Castro
serviu-se de um pretexto ideológico, a “revolução”
marxista, identificando esta com a sua pessoa e
vice-versa.” Mas não era isso que Octávio Alberola
pensava 50 anos atrás.
DOWNLOAD COMPLETO AQUI:
http://www.alquimidia.org/faisca/arquivosSGC/
junior_belle_revolucao_cubana.pdf
DOWNLOADCOMPLETODOWNLOADCOMPLETODONW
LOADCOMPLETODOWNLOADCOMPLETODOWNLOAD
REVOLUÇÃO CUBANA
71
O Libertário (jornal)
jan/fev 2011
Resumo
Edição Janeiro/Fevereiro 2011 do jornal O Libertário
Distribua a versão impressa de O Libertário e
contribua com o fortalecimento do Anarquismo em
nossa região.
Pacote distribuição 10 exemplares – 8 reais
Pacote distribuição 20 exemplares – 14 reais
Efetue depósito em:
Banco Bradesco
Agência: 0189
Conta Corrente: 0089120-7
Depois envie cópia do comprovante de depósito, ou
horário do depósito,
para nosso e-mail:
[email protected]
Informando também o endereço postal para envio
do pacote.
DOWNLOAD COMPLETO AQUI:
http://www.4shared.com/document/Cv_UlJwR/
OLibertarioJanFev2011.html
de Nicolas Walter
Resumo
O anarquismo é a ideologia dos anarquistas; os
anarquistas são os partidários da Anarquia; a
Anarquia (do grego anarkhia) é a ausência de
governo, a ausência de autoridade instituída,
a ausência de chefes permanentes numgrupo
humano.
Pode-se interpretar a Anarquia de modo negativo
ou positivo. Ela é amiúde condenada sob o
pretexto de que conduz ao caos, que a liberdade
depende da autoridade, que a sociedade depende
do Estado, que a ordem depende de outras ordens,
as regras de governantes e a lei de legisladores.
Ela pode, bem ao contrário, ser positivamente
esperada, pois permitiria à sociedade libertar-se
do jugo do Estado e à humanidade da autoridade,
ao mesmo tempo encorajando a espontaneidade,
a autogestão, o apoio mútuo e a liberdade
autêntica. O anarquismo é a teoria política do que
denominaremos anarquia positiva.
Uma antiga idéia
Comportamentos favoráveis à Anarquia existiram
durante mais de dois mil anos, e muito antes que
surgisse o Anarquismo. Escritores dissidentes da
Grécia e da Roma antigas, da China e da Índia
antigas condenaram a autoridade e reivindicaram
a Anarquia. Mais próximo de nós, autores como
William Godwin, em 1793, ou Max Stirner, em
1844, por exemplo, refletiram sobre a Anarquia.
Movimentos insurrecionais e comunidades
utópicas, no transcurso da história, aboliram
as formas tradicionais de governo sem adotar
novas, ao menos durante um tempo. Experiências
marcantes foram iniciadas na Europa e na América
nos séculos XVIII e XIX. Mas a evolução da teoria e
das práticas anarquistas no seio e uma ideologia
anarquista permanente dependiamde uma
estreita adequação entre as idéias e os atos.
DOWNLOAD COMPLETO AQUI:
http://www.alquimidia.org/faisca/
arquivosSGC/oquee_nicolaswalter.pdf
DOWNLOADCOMPLETODOWNLOADCOMPLETODONW
LOADCOMPLETODOWNLOADCOMPLETODOWNLOAD
O QUE É ANARQUISMO?
72
Escrito de Edgar Rodrigues, retirado do prefácio de “A doutrina anarquista
ao alcance de todos” de José Oiticica - Econômica Editorial
capacidade de recepção do ouvinte pelo
bloqueio do cérebro, produzindo dificuldades
à inteligência na escolha e decisão. Em 1925
o comerciante estava longe de transformar
as pessoas, principalmente a juventude, em
propagandistas itinerantes de seus produtos.
Mas em que pesem os anos decorridos, as
mudanças tecnológicas, políticas e sociais,
A Doutrina Anarquista ao Alcance de Todos,
de José Oiticica, ainda é uma mensagem
emancipadora, um convite à reflexão, ao
estudo do Anarquismo!
Não
podemos
ignorar
igualmente
que vivemos hoje novos processos de
exploração condicionadores e robotizadores
introduzidos pela tecnologia e a eletrônica.
O empilhamento das populações em
espigões de aço e/ou concreto armado, em
compartimentos estanques, implantados em
cidades altamente poluídas pelas indústrias,
a vigilância com ajuda dos computadores
e a substituição do braço operário pelos
robôs, isolando o homem, reduzindo-lhe
a sensibilidade, o sentido da solidariedade
humana, há cincoenta anos atrás praticamente
não existiam.
O anarquista não ignora que o ser humano,
encarado individualmente, traz ao nascer
disposições psíquicas que, no conjunto,
refletem as influências atávicas, hereditárias,
exercidas ao longo dos séculos transmitidas
de gerações a gerações, e que esses males
não desaparecem da noite para o dia, com
castigos e/ou pancadas no exterior do homem
quando o mal vêm do cérebro, é interno, nem
com a marginalização e a punição. Do meio
em que cresceu, do ambiente — dentro do
lar, em torno do lar e na escola — em que
vive os primeiros anos de vida, dependerá a
formação de seu caráter e este guiará os seus
Nesses anos distantes o homem não era
“fiscalizado” pelos computadores, hoje à
disposição dos Governantes, nas sedes da
polícia para codificá-lo, numerá-lo, escreverlhe a biografia com um apertar de botões e
nem o império das informações, detentor
e negociante dos Canais de Comunicações,
encarregados
de
divulgar
notícias
desportivas, comerciais, músicas, cigarros,
drogas milagrosas ilustradas com jovens
nuas, repetidamente até saturar pela fantasia
o poder de audição humana, reduzindo a
73
atos durante a sua existência.
o impulso do temperamento é demasiado
forte, quando a necessidade fala mais alto, a
injustiça grita primeiro, o indivíduo “infringe”
as leis estatais, estudadas, escritas, aprovadas
e decoradas por uns poucos para submeter
muitos à obediência, para consagrar a
espoliação do homem pelo homem. Tais atos
são qualificados de antissociais, quando eles
na realidade têm origem na opressão, na
desigualdade codificada e garantida pelos
Governantes, que detêm as riquezas naturais,
a ciência a tecnologia, e se transformaram em
sócios do trabalho assalariado, recebendo
sua parte em forma de imposto.
As forças atávicas, o temperamento, as
influências ambientais do meio que cercam
as crianças e lhes impõem formas de vida,
as pressões religiosas, políticas, económicas,
sociais e a educação determinarão a sua
personalidade, o seu comportamento
positivo, negativo, variável e/ou artificial.
O ser humano é fruto da sociedade em que
viveram seus antepassados, do meio onde
nasceu, dos padrões religiosos, políticos,
econômicos, sociais, culturais, opressivos
e repressivos predominantes com os quais
teve de conviver. Aí estão as manchetes dos
jornais, as notícias da imprensa falada e o que
Numa sociedade em que cada indivíduo
acontece nos bastidores, uma vez ou outra do
tenha a faculdade de se desenvolver livre e
conhecimento do público para mostrar aos
integralmente, enquanto educado dentro
jovens de hoje, o comportamento dos adultos
de padrões de liberdade responsável, como
do seu tempo, em cujas escolas aprendem a
elemento ativo, participante e usufrutuário,
explorar, a punir e a governar
E por mais violentas que estes atos certamente serão
os seus semelhantes. E não
reduzidos a um mínimo de
as
leis
sejam,
são
sempre
se diga que isto é fruto dos
desajustes psíquicos, dada
impotentes
para
prevenir
regimens capitalistas, porque
a ausência das causas que
e
evitar
os
delitos
e
os
nos “socialistas”, como a
hoje os determinam. Por
Rússia, os atos antissociais e crimes, (a pena de morte outro lado, está provado
de violência são frequentes, nunca impediu o crime, cientificamente, que dentro
em muitos casos até em
logo comprova nossas da atual sociedade, não existe
percentagens superiores aos
nenhum meio repressivo e/
afirmações).
regimens democráticos.
ou punitivo capaz de impedir
que os atentados à criatura
Logo, não é válida a concepção de que o poder
humana e à propriedade privada aconteçam. A
e o Governo evitam, pela sua existência, e com
violência imposta em nível de sociedade gera
suas punições, atos antissociais e violentos.
a violência individual cada vez em maiores
dimensões, e para punir os “infratores”, o
O
anarquismo
pode
perfeitamente
Governo procura soluções externas. E, no
demonstrar que estes são o resultado da
entanto, o mal tem de ser combatido nas suas
organização social baseada nas hierarquias e
origens, está intrinsecamente ligado ao meio
na desigualdade a todos os níveis. O roubo,
ambiente, às potencialidades hereditárias,
os atentados contra pessoas e contra os bens
à educação desigual a que o ser humano é
resultam na organização viciada que impede
submetido desde a infância!
uma imensa maioria de seres humanos,
como nós, de satisfazer as suas necessidades
O homem “infringe” códigos e leis elaboradas
físicas e psíquicas, materiais e emocionais!
pelo seu semelhante acreditando poder
Têm suas raízes na propriedade privada, suas
burlar a vigilância e escapar à penalidade
origens no “direito” de uns poucos estragarem
determinada para castigar seu ato. Comete
aquilo que milhões carecem, em geral os que
delitos anti-humanos e antissociais a todos
trabalham oito e mais horas diárias. E, quando
os níveis, porque sua vontade é insuficiente
74
o homem: diretamente pela força bruta, a
violência física e psicológica, e indiretamente,
transformando o produtor em assalariado,
reduzindo-lhe a subsistência, obrigando-o
assim a submeter-se incondicionalmente às
suas condições. O primeiro é originário do
poder, do privilégio político; o segundo é
proveniente do privilégio económico.
para impedir os motivos psicológicos que o
impulsionam a praticá-los! A insuficiência da
sua vontade resulta da educação recebida,
dos meios frequentados, faz parte dos seus
vícios orgânicos, dos arquétipos hereditários
e da deformação do caráter que lhe foi
imposto pela sociedade. E por mais violentas
que as leis sejam, são sempre impotentes
para prevenir e evitar os delitos e os crimes, (a
pena de morte nunca impediu o crime, logo
comprova nossas afirmações).
A opressão pode ser determinada também
por condicionamentos segregacionais e/ou
injetados na inteligência e nos sentimentos
por força da religião,
do conceito de pátria, na escola, na
Universidade e no
seio da família, em
doses homeopáticas. Mas da mesma
forma que essa
aceitação só existe
como resultado das
imposições materiais, também a mentira e as organizações fundadas para
propagar esse sentimento só viverão
enquanto forem consequência dos privilégios
políticos, econômicos, hierárquicos e sociais.
Ao contrário, a violência de cima ativa
a violência de baixo,
provoca-a, ajuda-a a
crescer.
Por isso, sua impotência reflete a
sua incompetência!
Nega a sua própria
validade! É a sua
autocondenação!
Quando a autoridade
irracional
pensa acabar com a
necessidade, a usurpação que ela mesma representa e defende,
contrariando o direito das pessoas e é impotente para cumprir sua pretendida missão,
declara-se falida na realidade!
No dia em que isso foi abolido, os meios para
defender e consolidar as classes, os privilégios,
ruirão por carência de utilidade. Para os
anarquistas, abolir a autoridade irracional,
dispensar os seus serviços e os do Governo do
homem sobre o homem, não significa destruir
as energias e as capacidades individuais e/
ou coletivas existentes na espécie humana,
pelo contrário, a sua intenção é desenvolvêlas, aperfeiçoá-las, usando como motor
de propulsão a liberdade responsável e a
solidariedade humana!
O Governo ou é dominação brutal, violenta,
autoritária de uns poucos sobre muitos, ou
é um mecanismo diplomático, criador de
cercas jurídicas para assegurar o domínio e
o privilégio daqueles que, por força, astúcia
ou herança, monopolizaram todos os meios
de vida: a ciência, a tecnologia, a eletrônica,
os canais de comunicação, a energia, o
maquinário, empórios imobiliários, o solo
e o subsoío, fontes de matérias-primas,
servindo-se deste potencial para manter o
povo dependente, seu assalariado.
O anarquista não pretende reduzir as energias
humanas, isto seria o mesmo que reduzir a
humanidade ao estado de uma massa de
átomos imóveis, sem ação nem movimentos,
Tais sistemas políticos empregam dois
métodos principais para dominar e punir
75
seria a destruição de todo organismo social, a
sua morte.
com amplas visões humanitaristas e
ecológicas, serão individualmente capazes
de se autodirigirem, de vencer os atavismos,
de arrancar de dentro de si mesmo o
“pequeno-reacionário” que cada um de
nós carrega no inconsciente coletivo e que
tanto dificulta o indivíduo de perceber
verdades incontestáveis! Que não tem
necessidades superiores ou inferiores às dos
seus semelhantes, nem precisa de líderes ou
chefes para construir uma Nova Sociedade
onde um homem vale um homem. Que do
livre concurso de todos mediante associações
espontâneas dos indivíduos, segundo suas
simpatias (afinidades de temperamento e/ou
emocionais) e carências de baixo para cima, a
partir de interesses e necessidades imediatas,
até chegar às mais afastadas e gerais. Nascerá
então uma organização social sempre sujeita
a modificações em razão da maior experiência
adquirida, já que o anarquista é um estudioso
permanente, um pesquisador em busca da
perfeição. Todos os dias abrem-se caminhos
novos para o aperfeiçoamento em benefício
da nova sociedade.
Ao contrário, sua meta é fazer de cada
indivíduo uma unidade átiva, capaz de dirigir
seus movimentos, gerir sua produção, de se
Autogovernar. O anarquista quer promover
abolição do monopólio da força e da influência
deformadoras, ou mais exatamente, substituir
todos os maquinismos capazes de alienar
o homem, de desmemoriá-lo e converter
a desigualdade social em instrumento do
pensamento, dos interesses de um pequeno
número de indivíduos, que canalizam e
absorvem energias usando-as exclusivamente
em proveito próprio, impedindo assim que
estas se convertam numa ordem social
generosa e boa para todos.
Em contraposição ao sistema que tem como
pilares de sustentação a autoridade irracional,
o Governo e o clero incapazes de tornar
o homem em irmão do homem, de uni-lo
voluntariamente, o anarquista trabalha pela
reconstituição de uma sociedade em que
cada ser possa ser solidariamente produtorconsumidor, na medida as forças, capacidades,
aptidões e necessidades; trabalha por uma
Educação Nova, capaz de converter os seres
humanos em irmãos convictos, conscientes
de que o bem-estar ou a infelicidade de um
dos seus membros, significa a alegria ou
tristeza de cada um e de todos.
Em Anarquia nada é estável, definitivo,
tudo evolui.
por Edgar Rodrigues
Os anarquistas firmam-se na falência
político-administrativa dos Governos
conhecidos até hoje, para proporem
uma nova ordem social resultante da
liberdade de relações entre indivíduos
livremente
associados,
sempre
dissolúveis, ligados por laços de
solidariedade humana.
Partindo deste ponto, a moral anarquista
pretende o desenvolvimento da vontade
individual, já, que só homens com vontade
própria, conscientes, de mentes arejadas,
76
Primitivo Raymundo Soares, mais conhecido como Florentino de Carvalho 1883-1947
cortesia de Rogério Nascimento - Pesquisador Anarquista e Doutor em Ciências Sociais – Política
77
Download

Zine #1 - ANARCOPUNK.ORG