Yves Klein. Anthropométrie de l'époque bleue. 1960 ...e afinal, o corpo fala? corporeal #01 Boletim eletrônico da viii jornada da ebp-sc Editorial Cinthia Busato Este é o primeiro, o Um, entre vários que pretendemos lançar até a nossa Jornada. “...e afinal, o corpo fala?”, é com essa pequena provocação, bem humorada, leve, que queremos seguir: um lugar de circulação de ideias, um “circuladô di vagações”, pois as ideias são para serem colocadas ao vento, circularem, ecoarem nos ouvidos que estão abertos para elas. Lacan, que muito se debateu com o conceito de pulsão tomado de Freud, no seu ultimíssimo ensino nos diz que elas “são, no corpo, o eco do fato de que há um dizer”1. Falar do corpo em psicanálise é falar de pulsão e seus destinos, deixando de lado a confusão que muito já se fez entre corpo e organismo biológico. O que cada um faz com o que recebe do Outro é o que lhe dará sua singularidade, seu estilo e seu corpo. Ao incidirem no corpo os significantes imprimem lalíngua. A relação com lalíngua é uma relação de criação, pois cada um terá sua linguagem própria, não apenas na forma de falar, mas também sua maneira de estar no mundo, andar, se movimentar. Judith Miller, no Editorial da Colofón n. 33, nos diz que ainda que a psicanálise peça uma formação sólida e controlada pelas Escolas, “ela não poderia cair num nepotismo, mesmo que seja ‘transferencial’, que sustenta que unicamente os que sabem podem falar adequadamente. Este nepotismo impede que se diga como e de que maneira uma primeira leitura toca, interessa, apaixona e ilumina, mesmo que seja de maneira provisória”. Por isso convidamos todos a mandarem sua contribuição, suas questões, impressões! Neste número, Gresiela Nunes da Rosa apresenta sua criação. Flávia Cera fala sobre a imagem de Yves Klein que narra a Jornada. E, por fim, apresentaremos nossas Comissões. Lembrando que a VIII Jornada da EBP-SC acontecerá nos dias 11 e 12 de outubro de 2013 no Hotel Floph. Receberemos como convidado o psicanalista José Fernando Velásquez (NEL/AMP) que apresentará o Seminário “Do sintoma na criança ao sintoma da criança”. Estão todos convidados! 1 Lacan, Jacques. O Seminário. Livro 23. O Sinthoma. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2007. E afinal, o corpo fala? Gresiela Nunes da Rosa O título da VIII Jornada da EBP-SC é uma pergunta. Perguntas geralmente têm a intenção de serem provocativas, de nos colocar na posição de querer respondê-las. No mínimo são convidativas. No entanto, quem faz a pergunta pode, inclusive, já ter sua resposta. O que não significa que, mesmo a tendo, não possa tomar certa distância do que já sabe, e surpreender-se com os possíveis lugares onde a pergunta pode levar-lhe. Em relação a esta pergunta que figura no título desta Jornada, antes de respondermos demasiado rápido, talvez seja prudente ver que outras perguntas podem partir daí. A mim me parece que a pergunta essencial a se fazer a partir desta primeira é: “de que corpo se fala?” Talvez também seja importante fazer perguntas no que diz respeito à fala. Ela está restrita ao sentido, está restrita à palavra? E depois ainda, qual é a relação possível entre o corpo e a palavra? Lembramos que podemos localizar em Lacan três estatutos do corpo1. 1- Corpo no registro do Imaginário: o corpo imaginário do espelho, que está sustentado no falo e reduzido a sua forma. 2- Corpo no registro do Simbólico: o corpo significantizado que a neurose pode produzir. Aquele em que o gozo fica contornado pelo significante e reduzido a uma significação, tanto no sintoma quanto no fantasma. corporeal #01 boletim eletrônico da viii jornada da ebp-sc 3- Corpo no registro do Real. Se trata da dimensão do acontecimento de corpo, em que se pode encontrar um gozo que não está localizado a partir de um significante e que por isso obtém uma satisfação fora do sentido. O gozo positivado. Tendo em vista estas três modalidades de corpo, lembramos que o trabalho analítico2 segue a direção de não deixar-se fascinar pela imagem, nem adormecer pelo significante. Analisar-se implica realizar uma crítica às identificações fálicas que é, em ultima instância, uma crítica ao imaginário. E como as ditas identificações se sustentam em significantes, então também se trata de uma crítica aos limites do simbólico. Para além destas críticas, a experiência analítica é uma experiência de corpo, corpo este que não se trata nem da dimensão imaginária, do espelho, nem simbólica, das significações, e sim da dimensão real na medida em que o corpo é sede de gozo. Uma última pergunta me coloca a trabalho: o conceito lacaniano de falasser não é uma indicação de que a fala e o corpo podem estar conjugados de maneiras diversas do que podemos imaginariamente entender como fala e corpo? 1 2 Salman, Silvia. “El cuerpo en la experiencia del análisis”. In: Colofón - Boletim de la FIBOL. Buenos Aires: Grama, 2013. p. 10-11. Idem. O que pode um corpo? Flávia Cera “Ninguém sabe o que pode um corpo”, dizia Spinoza em sua Ética. “Do que um corpo é capaz?”, perguntava-se Gilles Deleuze a respeito da teoria dos afetos do mesmo Spinoza. Como se vê, esta é uma questão que atravessa os séculos e, ao que parece, está longe de ser respondida de maneira definitiva. Isto se deve, precisamente, às infinitas possibilidades de um corpo vivo. Começar a responder esta questão, portanto, exige-nos, na esteira de Lacan e de Duchamp, um ato criador. “...e afinal, o corpo fala?” é o tema da VIII Jornada da EBP-SC que reabre a questão de Spinoza, tão caro a Lacan, dentro da psicanálise. Um corpo é capaz de falar? No final dos anos 1950, as artes debatem intensamente esta questão quando recolocam no centro da cena a relação corpo-mundo, sobretudo, com os happenings e as performances. Yves Klein, com suas Anthropometries, compostas pela imagem que narra nossa Jornada, mostrou-nos que um corpo é capaz de pintura: as modelos pintavam seus corpos com tinta azul e os imprimiam numa tela. São as marcas, as impressões dos corpos, produzidas pelos corpos mesmos, que contemplam os nossos corpos. A antropometria é usada frequentemente para transformar em índices as medidas ideais dos corpos, ou melhor, dizendo, dos organismos. Mas ela é, sobretudo, um instrumento científico que visa normativizar os corpos; é, enfim, uma medida biopolítica de controle e determinação. Yves Klein, ao nomear Anthropometries sua performance, subverte seu uso: ao invés das medidas precisas de um organismo, Klein imprime os contornos e marcas de corpos singulares que criam o quadro, que dá aos corpos outros destinos nos encontros contingentes com a arte; ele mostra que o corpo é a medida. Klein também cria uma série intitulada Cosmogonies, que não pode deixar de ser lida em relação às Anthropometries: os mundos são criados pelas marcas impressas dos/nos corpos. Encore, en corps. Lacan precisará que estas marcas são as do encontro do significante com o corpo. Será, então, a partir deste ato criador que um corpo pode falar? eixos temáticos e envio de trabalhos Convidamos todos a enviarem trabalhos para a VIII Jornada da EBP-SC ...e afinal, o corpo fala? O prazo final de envio é 23 de setembro de 2013. Os trabalhos devem conter até 7000 caracteres (com espaços) em fonte Times New Roman, espaçamento 1,5 e devem ser enviados para o endereço: [email protected] eixos temáticos: 1) O real que se agita no corpo 2) Corporificação do sintoma 3) Diferença, igualdade e diversidade sexual Comissões da viii jornada da ebp-sc Comissão Científica: Cinthia Busato, Laureci Nunes, Liège Goulart, Maria Teresa Wendhausen, Oscar Reymundo, Luis Francisco E. Camargo e Silvia Emilia Espósito (coordenadora). Comissão de Secretaria e Tesouraria: Tatiane Santana Fuggi, Denise Wendhausen, Cleci Mendonça e Luis Francisco E. Camargo (coordenador). Comissão de Acolhimento: Jussara Jovita, Vanina Fiorentino, Monique Bez e Laureci Nunes (coordenadora). Comissão de Divulgação: Gresiela Nunes da Rosa, Flávia Cera, Patrícia Boeing, Jussara Bado, Louise Lhullier e Cinthia Busato (coordenadora). VIII Jornada da EBP-SC ... e afinal, o corpo fala? Florianópolis, 11 e 12 de outubro de 2013 Convidado internacional: José Fernando Velásquez. Médico Psiquiatra especialista na clínica com crianças. Membro NEL/AMP Seminário: Do sintoma na criança ao sintoma da criança. Local: Hotel Floph. Rua Artista Bittencourt, 14. Centro Escola Brasileira de Psicanálise Inscrições e informações: (48) 3222-2962 ou www.ebpsc.com.br Seção Santa Catarina