UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA
INSTITUTO DE ARTES
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ARTES
TATIANA RITA DA SILVA
DO CÂNONE À CRIAÇÃO:
A SIMBOLOGIA USADA NA REPRESENTAÇÃO DO FARAÓ AKHENATON
SÃO PAULO
2006
2
TATIANA RITA DA SILVA
DO CÂNONE À CRIAÇÃO:
A SIMBOLOGIA USADA NA REPRESENTAÇÃO DO FARAÓ AKHENATON
Dissertação apresentada ao Instituto de
Artes da Universidade Estadual Paulista
“Júlio de Mesquita Filho”, campus de São
Paulo, para a obtenção do título de Mestre
em Artes (Área de concentração: Artes
Visuais e Linha de pesquisa: Abordagens
teóricas, históricas e culturais da Arte).
Orientador: Prof. º Dr. José Leonardo do Nascimento
SÃO PAULO
2006
3
SILVA, T. R. Do Cânone à Criação: A simbologia usada na representação do Faraó
Akhenaton. 130 p. Dissertação (Mestrado). Instituto de Artes, Universidade Estadual
Paulista, São Paulo, 2006.
Área de conhecimento da titulação do Mestrado, conforme tabela CAPES
8030000-6 ARTES
8030100-2 FUNDAMENTOS E CRÍTICA DAS ARTES
8030102-9 HISTÓRIA DA ARTE
4
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Biblioteca do IA – São Paulo – UNESP
Silva, Tatiana Rita da
Do Cânone à Criação: A Simbologia usada na
representação do Faraó Akhenaton / São Paulo, 2006
130 f. : il.
Dissertação de Mestrado – Instituto de Artes de São
Paulo – Universidade Estadual Paulista.
1. Egito Antigo 2. Arte Egípcia 3. História da Arte
4. Akhenaton 5. Comunicação Visual I. Título
5
TATIANA RITA DA SILVA
DO CÂNONE À CRIAÇÃO:
A SIMBOLOGIA USADA NA REPRESENTAÇÃO DO FARAÓ AKHENATON
BANCA EXAMINADORA
DISSERTAÇÃO PARA OBTENÇÃO DO GRAU DE MESTRE EM ARTES.
ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: ARTES VISUAIS
Presidente e Orientador: Prof. Dr. José Leonardo do Nascimento
Examinador: Prof. Dr. Milton Terumitsu Sogabe
Examinador: Prof. Dr. Francisco Cabral Alambert Júnior
CONCEITO FINAL: APROVADA
São Paulo, 25 de maio de 2006.
6
SUMÁRIO
RESUMO................................................................................................................ 7
ABSTRACT ........................................................................................................... 8
LISTA DE FIGURAS ............................................................................................ 9
LISTA DE IMAGENS DA ANÁLISE (do capítulo III) ...................................... 14
INTRODUÇÃO .................................................................................................... 17
CAPÍTULO I: Pensamento sobre o real ............................................................... 22
1. Akhenaton, observador dos cânones ......................................................................... 23
2. A mudança de conceitos ........................................................................................ 35
CAPÍTULO II: Poder e religião ditando novas regras ......................................... 48
1. Olhar inovado ...................................................................................................... 49
2. Conseqüências de uma veneração ............................................................................ 62
CAPÍTULO III: Akhenaton e o seu registro .......................................................
1. Comunicação Visual .............................................................................................
2. Comunicação canônica ..........................................................................................
3. Uma flexibilização canônica? .................................................................................
4. Análise da história de Akhenaton ............................................................................
69
70
71
72
73
CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................ 106
BIBLIOGRAFIA ............................................................................................... 111
ANEXOS ........................................................................................................... 119
7
RESUMO
Este trabalho baseia-se em duas questões: como a organização de comunicação visual
influiu em um período histórico e como estudo da modificação do estilo egípcio foi importante
para o entendimento do governo de um faraó.
Será analisada a representação do faraó Akhenaton, imperador religioso que trabalhou o
estilo simbólico usado no Egito Antigo, e que a partir das mudanças de sua própria religião,
influenciou a comunicação visual da época, que se baseava em cânones estritos. A análise
apresentará uma comparação entre os cânones antigos e as inovações estilísticas realizadas pelo
faraó.
Palavras-chaves: Egito Antigo, Arte Egípcia, História da Arte, Akhenaton, Comunicação
Visual.
8
ABSTRACT
This work is based on two questions: as the organization of visual communication
influenced in a historical period and as the modification study of the Egyptian style was
important for the agreement of the one Pharaoh government.
The representation of Pharaoh Akhenaton will be analyzed, religious emperor who
worked the used symbolic style in Ancient Egypt, and that from the changes of its proper
religion, he influenced the visual communication of the time, that if based on strict canons. The
analysis will present a comparison between old canons and the stylistics innovations carried
through by Pharaoh.
Keywords: Ancient Egypt, Egyptian Art, History of Art, Akhenaten, Visual Communication
9
LISTA DE FIGURAS
10
Figura 1 página: 25
Amenófis III com características de Osíris
Procedência: Karnak – Reinado de Amenófis III, 1390 – 1353 a.C.
Quartzo: 52.5 x 21.2 x 26.2 cm
Gift of Miss Anna D. Slocum. Museum of Fine Arts, Boston
Fonte: <http://www.mfa.org/egypt/amarna>
_____________________________________________________________________________________
Figura 2 página: 27
Rainha Tii usando uma coroa da deusa Hathor
Procedência: Medinet El Gurob – Reinado de Akhenaton, 1353 – 1336 a.C.
Madeira, prata, ouro, linho e vidro: 22.5 x 7.6 x 7.9 cm.
Ägyptisches Museum und Papyrussammlung, Berlin
Fonte: <http://www.mfa.org/egypt/amarna>
_____________________________________________________________________________________
Figura 3 página: 29
Esquema de orientação.
Fonte: BAINES, 1996, v. I, p. 60.
_____________________________________________________________________________________
Figura 4 página: 30
Detalhe de um monumento colossal ao sul – desenho.
Procedência: Tebas
Fonte: NÉRET, 2001, p. 80.
_____________________________________________________________________________________
Figura 5 página: 31
Esquema de móveis e materiais.
Fonte: BAINES, 1996, v. I, p. 60.
_____________________________________________________________________________________
Figura 6 página: 32
Esquema de pessoas.
Fonte: BAINES, 1996, v. I, p. 60.
_____________________________________________________________________________________
11
Figura 7 página: 33
Esquema de relevo.
Fonte: BAINES, 1996, v. I, p. 60.
_____________________________________________________________________________________
Figura 8 página: 37
Fragmento do sarcófago de Akhenaton com relevo da cabeça de Nefertiti.
Procedência: Tumba real em Tell El Amarna
Granito: 14.7 x 8.4 x 5.5 cm
Ägyptisches Museum und Papyrussammlung, Berlin
Fonte: <http://www.mfa.org/egypt/amarna>
_____________________________________________________________________________________
Figura 9 página: 40
Figura de Amon-Rá na forma humana.
Pintura em papiro
Fonte: OS GRANDES FARAÓS, 2004, no. 3, p. 26.
_____________________________________________________________________________________
Figura 10 página: 41
Esquema de Aton.
Fonte: <http://www.mfa.org/egypt/amarna>
_____________________________________________________________________________________
Figura 11 página: 43
Foto do pequeno templo de Aton com uma coluna reconstruída.
Amarna – Egito
Fonte: <http://www.mfa.org/egypt/amarna>
_____________________________________________________________________________________
Figura 12 página: 45
Esquema de Akh ou Ankh.
Fonte: CLARK, 1991, v. II, p. 118.
_____________________________________________________________________________________
12
Figura 13 página: 47
Torso real – Nefertiti ou uma de suas filhas.
Procedência: Department of Egyptian Antiquities – Reinado de Akhenaton, 1353- 1336 a.C.
Quartzo: 29.4 x 13 x 12.6 cm
Louvre Museum, Paris
Fonte: <http://www.mfa.org/egypt/amarna>
_____________________________________________________________________________________
Figura 14 página: 51
O Faraó Tutmósis III.
Procedência: Karnak – XVIII Dinastia – 1428-1450 a.C.
Basalto cinza: altura 90 cm
Museu do Cairo
Fonte: MONDADORI, 1969, p. 95.
_____________________________________________________________________________________
Figura 15 página: 52
Cabeça de uma estátua colossal de Hatshepsut.
Procedência: Deir El Bahari
Calcário pintado: 1.22 m
Metropolitan Museum – Nova York
Fonte: DAUMAS, 1972, p. 98.
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Figura 16 página: 58
Estela inacabada da família real.
Procedência: Tell El Amarna
Calcário: 17.7 x 13.3 x 2.8 cm
Ägyptisches Museum und Papyrussammlung, Berlin
Fonte: <http://www.mfa.org/egypt/amarna>
_____________________________________________________________________________________
Figura 17 página: 60
Patos no pântano.
Procedência: Tell El Amarna – XVIII Dinastia; século XIV a.C.
Pintura a têmpera
Museu do Cairo
Fonte: MONDADORI, 1969, p. 115.
_____________________________________________________________________________________
13
Figura 18 página: 61
Estátua colossal de Amenófis IV/Akhenaton com a dupla coroa egípcia.
Procedência: Karnak
Arenito: 205 x 111 x 60 cm
Egyptian Museum, Cairo
Fonte: <http://www.mfa.org/egypt/amarna>
_____________________________________________________________________________________
Figura 19 página: 63
Busto pintado de Nefertiti.
Procedência: Tell El Amarna - XVIII Dinastia
Calcário pintado: 48 cm
Museu de Berlin.
Fonte: BAINES, 1996, v. II, p. 124.
_____________________________________________________________________________________
Figura 20 página: 68
Estátua de Tutankhamon.
Procedência: Túmulo de Tutankhamon no Vale dos Reis - Pós Amarna – XVIII Dinastia – 1361-1352
a.C.
Madeira estucada e pintada, olhos incrustados: altura 42 cm.
Museu do Cairo.
Fonte: MONDADORI, 1969, p. 118.
14
LISTA DE IMAGENS
DA ANÁLISE
CAPÍTULO III
15
IMAGEM N.º 01 – página 76
ESTÁTUA COLOSSAL DE AKHENATON
Procedência: Tell El Amarna – XVIII Dinastia
Arenito com traços policrômicos: 4 metros
Museu do Cairo, Egito
Fonte: MONDADORI, 1969, p. 106.
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IMAGEM N.º 02 – página 79
ESTÁTUA COLOSSAL DE AKHENATON
Procedência: Tell El Amarna – XVIII Dinastia
Arenito: 3.10 metros
Museu do Cairo, Egito
Fonte: DAUMAS, 1972, p. 352.
_____________________________________________________________________________
IMAGEM N.º 03 – página 82
AKHENATON COM UMA BANDEJA DE OFERENDA
Procedência: Tell El Amarna – XVIII Dinastia
Calcário colorido sobre base de alabastro: 40 cm
Museu do Cairo, Egito
Fonte: MONDADORI, 1969, p. 109.
_____________________________________________________________________________
IMAGEM N.º 04 – página 85
FARAÓ AKHENATON BEIJANDO PROVAVELMENTE SEU CO-REGENTE
Procedência: Tell El Amarna – XVIII Dinastia
Calcário inacabado: 42 cm
Museu do Cairo, Egito
Fonte: MONDADORI, 1969, p. 113.
_____________________________________________________________________________
IMAGEM N.º 05 – página 88
PERFIL DE AKHENATON
Procedência: Tell El Amarna – XVIII Dinastia
Calcário: 15.3 x 11.2 x 3.3 cm
Agyptisches Museum und Papyrussammlung, Berlin
Fonte: GORE, 2001, p. 54.
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16
IMAGEM N.º 06 – página 91
OFERENDA REAL A ATON
Procedência: Tell El Amarna – XVIII Dinastia
Relevo em calcário: 1.04 metros
Museu do Cairo, Egito
Fonte: DAUMAS, 1972, p. 353.
_____________________________________________________________________________
IMAGEM N.º 07 – página 95
O FARAÓ AKHENATON E SUA FAMÍLIA ADORANDO O DEUS ATON
Procedência: Tell El Amarna – XVIII Dinastia
Relevo em calcário com traços coloridos: 48 x 51 cm
Museu do Cairo, Egito
Fonte: MONDADORI, 1969, p. 108.
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IMAGEM N.º 08 – página 98
AKHENATON E SUA FAMÍLIA
Procedência: Tell El Amarna – XVIII Dinastia
Calcário pintado: 31 x 39 cm
Staatliche Museum, Berlin
Fonte: CULTURA EGÍPCIA ANTIGA, 2002, p. 44
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IMAGEM N.º 09 – página 101
AKHENATON COMO UMA ESFINGE
Procedência: Tell El Amarna – XVIII Dinastia
Calcário: 51 x 105.5 x 5.2 cm
Museum of Fine Arts, Boston
Fonte: <http://www.mfa.org/egypt/amarna>
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IMAGEM N.º 10 – página 104
ESBOÇO DO ROSTO DE AKHENATON
Procedência: Tell El Amarna – XVIII Dinastia
Calcário: 11.6 x 13.8 x 2.3 cm
Brooklyn Museum of Art, New York
Fonte: <http://www.mfa.org/egypt/amarna>
_____________________________________________________________________________
17
INTRODUÇÃO
18
O modelo de representação no Egito Antigo foi particular, a aplicação simbólica foi
tematizada conforme os mitos religiosos que foram canonizados e usados por um grande período
sem grandes alterações. A alteração mais visível e conhecida ocorreu no período da dinastia
XVIII, na qual o estilo egípcio ficou mais flexível, aceitando características naturalistas que
foram aplicadas nas esculturas, pinturas, objetos e monumentos.
Esse estilo egípcio (cânones) era padronizado e vários artesãos escolhidos para
representarem esse padrão, que não expressava o real, mas que objetivava o que os deuses
esperavam que os homens seguissem em vida. Os estilos depois de escolhidos não se alteravam,
é por isso que nos deparamos com a repetição de temas (cotidiano e religioso) em construções
bidimensionais (desenhos e relevos) nas paredes dos templos.
Olhando a arquitetura monumental e a arquitetura funerária, as pinturas, os objetos, as
esculturas e os papiros, percebe-se, em comum, a origem religiosa. O formato e os símbolos
eram primeiramente estudados para, então, serem usados na construção da mensagem religiosa
das obras. Essa mensagem visava fornecer o material de leitura para os vivos e para os mortos,
pois o povo egípcio acreditava que seus deuses observavam tudo que era realizado no aquém e
além túmulo. Assim, para se ter um diálogo com esse povo construía-se uma ordem visual
esquemática que ligasse esses dois mundos.
Apesar de “canônica”, havia exceções: nas primeiras dinastias, os desenhos e as
esculturas, no lugar de expressarem o ideal, manifestavam um estilo naturalista. Representava-se
o cotidiano e o movimento natural das figuras. Mas conforme a sociedade organizava as cidades
e escolhia seus deuses, surgia um processo de representar mais o poder do que o cotidiano, e a
divinização e os cultos acabaram influenciando na canonização das obras.
19
Nessa pesquisa, o enfoque incidirá na representação do faraó da dinastia XVIII,
Akhenaton (1353 - 1335 a.C. - data mais aceita), que exerceu o poder no período denominado
Amarniano, conhecido como Império Novo. O faraó Amenófis IV (Akhenaton) implantou o
monoteísmo, fazendo seu povo venerar apenas o deus Aton (Sol). Os cultos mudaram e antigos
símbolos foram alterados. O cuidado e a criação de construções, esculturas, jóias e pinturas
deram origem a um período que poderíamos considerar como um momento particular da Arte
Egípcia, pois diminuiu-se a repetição de símbolos e uma nova comunicação visual teve origem.
Apesar dessa mudança, não houve uma grande ruptura com os cânones antigos, abriramse as portas para o ato da criação e da estética, mas alguns símbolos continuaram os mesmos,
sendo mais detalhados.
Essa mudança teve início antes de Akhenaton ascender ao poder. Esboçou-se lentamente
durante as dinastias XVI e XVII, assim chamadas de Pré-Amarna. Após a morte do faraó,
também houve um período de transição entre o Monoteísmo e o Politeísmo, em que os cânones
antigos regressaram (Pós-Amarna), e na metade da dinastia XIX esse processo de transição
completou-se. A volta da representação tradicional deveu-se ao retorno da religião politeísta e de
seus deuses, e assim permaneceu inalterada até a chegada do período Greco-Romano.
A partir do curto esboço acima, conclui-se que do nosso ponto de vista contemporâneo, a
Arte encontra-se mais bem realizada no período amarniano, isso não quer dizer que não houve
Arte nos outros períodos, mas que a criação e a comunicação visual foram mais bem entendidas
por Akhenaton. Para os antigos egípcios, o que nós consideramos como Arte era apenas um
ofício de representação para os deuses, mesmo no período amarniano a perspectiva continuou a
mesma, porém houve um cuidado artístico novo.
20
Dessa maneira, será feito aqui um estudo sobre as convenções clássicas e as convenções
amarnianas, baseado na leitura visual da representação de Akhenaton e da transição de um estilo
canônico para um estilo que será chamado, neste trabalho, de “criação”.
O capítulo I apresenta o objeto de estudo, ou seja, Akhenaton. Através de sua história,
serão conhecidos o seu pensamento e a sua busca pela exibição de narrativas realísticas. Depois,
com a discussão sobre alguns conceitos próprios ao estilo egípcio, veremos como o faraó
organizou suas idéias e construiu seu poder.
No capítulo II, analisaremos o reinado e o início do projeto de modificação das
representações visuais, na qual a religião foi essencial. E por fim, falaremos das conseqüências
dessa idéia voltada para revelar o real e para indicar um novo caminho religioso por meio da
imagem.
No capítulo III, consideraremos 10 imagens do faraó Akhenaton. Primeiramente,
dissertaremos sobre alguns conceitos de comunicação visual e de comunicação dos cânones.
Falaremos, em seguida, sobre a liberação da criação artística durante a dinastia XVIII,
analisando as 10 imagens escolhidas da representação do faraó. A análise terá como
fundamentação teórica as obras de Rudolf Arnheim, João Gomes Filho e Fayga Perla Ostrower.
Este trabalho voltará seu foco para a história de Akhenaton, para a análise da
comunicação visual, contando, para isso, com uma leitura visual. A obra de arte egípcia, do
período indicado, será relatada, analisada e confrontada com as mudanças ocorridas no reinado
do faraó. Pergunto se a comunicação organizada por ele constituiu-se ou não num momento de
abolição ou não dos rígidos cânones artísticos do Egito Antigo.
21
A análise (e o contato com objeto) será feita através de imagens (fotos e desenhos). A
metodologia será fundamentada em livros de análise perceptual. A parte histórica, também, será
baseada em livros, periódicos, dissertações, teses e vídeos.
22
CAPÍTULO I
Pensamento sobre o real
23
Akhenaton foi o faraó das mudanças históricas. Essas transformações ocorreram no
âmbito da religião, em que o faraó aprendeu tudo sobre os mitos e sobre o reino em que viveu, e
depois organizou um movimento no qual a realidade de suas conclusões foram representadas
visualmente.
Seu período de existência na história data da dinastia XVIII, que iniciou o Império
Novo e que se estendeu de 1550 a 1307 a.C.. Seu reinado foi de 1353 à 1335 a.C., segundo
Baines (1996, p. 9).
1. Akhenaton, observador dos cânones
Filho do faraó Amenófis III e de Tii, esposa real, Akhenaton nasceu com o nome de
Amenófis IV (essa mudança será tratada mais à frente), e não era o herdeiro do trono. O
herdeiro, o seu irmão Tutmósis, faleceu ainda jovem. Com a morte do irmão, ele tornou-se o
sucessor do faraó.
A educação de Amenófis IV foi igual à de todo príncipe egípcio. Ministrada por
educadores da Corte, na “Casa de Formação” (BRUNNER-TRAUT, 2000, p. 11), teve como
educadores principais um oficial-sacerdote chamado Ay e um sábio-arquiteto denominado
Amenhotep. Esses influíram os pensamentos do jovem príncipe no que respeita à sua visão
religiosa e arquitetônica.
24
O ensino rigoroso e sábio ajudou no aprendizado do jovem Amenófis IV. O
conhecimento sobre a religião de Amon 1 e os conceitos sobre organização arquitetônica
desvelavam ao olhar do jovem um reino em que o poder era divinizado e representado por
grandes monumentos e narrações cotidianas estampadas nas paredes dos palácios e nos papiros.
O relacionamento de Amenófis IV com seu pai Amenófis III (Figura 1), também, fazia
parte de sua educação palaciana. Havia um relacionamento próximo, e o filho via como o seu pai
se relacionava com os problemas internos e externos do reino, com as guerras, com o povo e com
a religião politeísta. Tendo um pai religioso que construía estátuas para deuses a fim de obter
cura de doenças, o jovem começou a tirar suas próprias conclusões sobre o conceito de poder e
apreendeu tudo o que estava ao seu alcance no reino de Tebas.
Como um bom observador atento de seu momento, Amenófis IV deparou-se com uma
dissensão havida entre seu pai e os sacerdotes de Amon. Embora o poder religioso quisesse
ultrapassar o poder do faraó, a distribuição de riquezas para os religiosos evitava um conflito
entre o sumo sacerdote e o soberano.
O que Amenófis IV aprendeu com isso? Aprendeu a pensar em maneiras de manter o
poder de forma não brutal, sem guerras e sem sangue. Essa pretensão, tanto dentro do reino
como fora, guiou o pai e o filho para um pensamento comum: manter o reino e seus cultos
religiosos em harmonia, evitando a veneração isolada realizada por sacerdotes em salões
fechados, impedindo uma divisão entre o governo e o clero.
1
Amon foi considerado o rei dos deuses, sendo senhor dos templos de Luxor e Karnak. Seu nome, muitas vezes,
vem associado ao do deus Sol (Rá), formando o nome Amon-Rá. Ele normalmente é representado por um homem
vestido com a túnica real, e na cabeça há duas plumas altas voltadas para o lado direito. Este deus pode se
manifestar também sob a forma de um carneiro ou de um ganso. O nome Amon pode ser traduzido como “O
Oculto”.
25
FIGURA 1
Amenófis III com características de Osíris
Procedência: Karnak – Reinado de Amenófis III, 1390 – 1353 a.C.
Quartzo: 52.5 x 21.2 x 26.2 cm
Gift of Miss Anna D. Slocum. Museum of Fine Arts, Boston
Fonte: <http://www.mfa.org/egypt/amarna>
26
E assim, seguiram os dois soberanos. Com mais ou menos 15 anos, Amenófis IV tornase co-regente contando com a ajuda de sua mãe Tii (Figura 2) nos primeiros anos do governo,
esboçava os rumos de seu futuro (JACQ, 1978, p. 45). Reinando junto com Amenófis III, o
trabalho dele deveria continuar a obra do pai, voltando-se para a religião em primeiro lugar.
Amenófis IV, mesmo antes de ser co-regente, conviveu com um ambiente que já tinha
uma história sólida no Egito Antigo. A civilização egípcia foi sempre reconhecida por sua
organização religiosa e social. Sabe-se que o povo vivia em torno do poder do faraó. Assim, a
vida cotidiana, sendo palaciana, camponesa ou citadina apoiava-se nas decisões do governante.
Todas as conquistas alcançadas por esse povo eram conhecidas por Amenófis IV e são
conhecidas por nós; sabe-se sobre a agricultura e o rio Nilo; sobre o desenvolvimento da escrita,
a medicina e o comércio; sobre o trabalho manual feito nos metais, pedras preciosas e
especiarias, e para finalizar, conhece-se sua arquitetura, escultura e pintura. Para o jovem
soberano, observar e entender esse meio era a forma de organizar seus julgamentos como futuro
soberano. A sua missão seria vincular essas características com a religião.
A observação do co-regente foi a melhor forma de ensino que ele poderia ter. A cultura2
de seu povo proporcionou-lhe uma análise de como organizar os problemas que encontrou
enquanto acompanhava o comando de seu pai.
A religião politeísta do Egito Antigo forneceu a Amenófis IV conceitos que futuramente
fariam parte da mudança simbólica amarniana. Observando a comunicação visual tradicional,
encontramos certos detalhes: o poder do faraó era representado através de construções
monumentais que mostravam a posição social do soberano, assim comunicava aos deuses tudo o
que ocorria em vida. Além dos rituais religiosos, em que a vida após a morte era venerada, todo
2
Neste trecho o sentido da palavra refere-se ao meio cultural de sua época, isto é, desde costumes diários até os
mais importantes rituais religiosos.
27
FIGURA 2
Rainha Tii usando uma coroa da deusa Hathor
Procedência: Medinet El Gurob – Reinado de Akhenaton, 1353 – 1336 a.C.
Madeira, prata, ouro, linho e vidro: 22.5 x 7.6 x 7.9 cm
Ägyptisches Museum und Papyrussammlung, Berlin
Fonte: <http://www.mfa.org/egypt/amarna>
28
tipo de artefatos religiosos eram elaborados para os vivos e para os mortos. Por meio do trabalho
manual, eternizava-se o contato dos homens com os deuses.
Outra característica com a qual, provavelmente, Amenófis IV observou, foi o estilo
egípcio de representação. As obras executadas há séculos antes de seu nascimento, já tinham
normas para serem confeccionadas, e os princípios da elaboração ainda eram os mesmos na
dinastia XVIII, baseados em regras segundo o ideal escolhido pelos faraós anteriores. A seguir,
há um relato sobre o estilo egípcio:
O estilo egípcio incorporou uma série de leis bastante rigorosas, e todo artista tinha que
aprendê-las desde muito jovem. As estátuas sentadas deviam ter as mãos sobre os
joelhos; os homens eram sempre pintados com a pele mais escura do que as mulheres; a
aparência de cada deus egípcio era rigorosamente estabelecida: Hórus, o deus-céu, tinha
que ser apresentado como um falcão ou com uma cabeça de falcão; Anúbis, o deus dos
ritos funerais, como um chacal ou com uma cabeça de chacal. Todo artista precisava
aprender também a arte da bela escrita. Tinha que recortar na pedra, de maneira clara e
precisa, as imagens e os símbolos dos hieróglifos. Mas, assim que dominasse todas
essas regras dava-se por encerrada a sua aprendizagem. Ninguém queria coisas
diferentes, ninguém lhe pedia que fosse “original”. Pelo contrário, era provavelmente
considerado o melhor artista aquele que pudesse fazer suas estátuas o mais parecidas
com os belos monumentos do passado. Por isso aconteceu que, no transcurso de três mil
anos ou mais, a arte egípcia mudou muito pouco. Tudo o que era considerado bom e
belo na época das pirâmides era tido como igualmente perfeito mil anos depois. É certo
que surgiram novas modas, e novos temas foram pedidos aos artistas, mas a maneira de
representar o homem e a natureza permaneceu essencialmente imutável (GOMBRICH,
1999, P. 65).
Esse conjunto de regras ou cânones 3 , que formavam o estilo egípcio, determinava como
deveriam ser feitas as obras para manter a continuidade de um pensamento idealista de
representação. A idealização das figuras tinha a função de mostrar o poder hierárquico no Egito
Antigo. A representação da realeza era totalmente canônica, já a representação de camadas
sociais inferiores dirigia-se mais livremente para o naturalismo (OSTROWER, 1989, p. 321).
3
Cânone ou cânon é um conjunto de normas especiais, regras, modelos e padrões que deveriam ser repetidos nas
obras executadas.
29
Agora vejamos algumas convenções de representação básicas do cânone egípcio, que
Amenófis IV provavelmente conheceu:
Orientação: Na pintura as figuras geralmente são viradas para a direita, voltadas para a
esquerda algumas delas podem perder sua orientação lógica (Figura 3). Ex.: mãos que seguram
cetros, parecem ficar tortas se for trocada a orientação. Os olhos e o torso nunca estão de perfil,
já os membros superiores e inferiores são colocados de perfil “deformando” a lógica da
observação natural da figura. As estátuas são esculpidas como “um todo”, deixando os membros
“colados” ao corpo (Figura 4).
FIGURA 3
Esquema de orientação.
Fonte: BAINES, 1996, v. I, p. 60.
30
FIGURA 4
Detalhe de um monumento colossal ao sul – desenho.
Procedência: Tebas
Fonte: NÉRET, 2001, p. 80.
31
Móveis e materiais: Não há muita clareza na representação, pois no desenho não havia
tridimensionalidade, assim quando o objeto era representado fazia-se uma planta baixa e depois
um perfil da lateral (Figura 5), ficando dois desenhos para representar um único objeto.
FIGURA 5
Esquema de móveis e materiais.
Fonte: BAINES, 1996, v. I, p. 60.
32
Pessoas: Para representar duas ou mais pessoas organizava-se uma relação de posição
social, quem fosse “mais importante” seria representado maior e à direita do subseqüente (Figura
6).
FIGURA 6
Esquema de pessoas.
Fonte: BAINES, 1996, v. I, p. 60.
33
Relevo: Relevos e pinturas tinham desenhos e proporções preliminares. Também
poderiam ser colocados em quadriculados para facilitar a cópia (Figura 7). Depois de marcados
com o tamanho escolhido, fazia-se o entalhe ou finalizava-se a pintura.
FIGURA 7
Esquema de relevo.
Fonte: BAINES, 1996, v. I, p. 60.
34
O ambiente cultural e o convívio com os cânones guiaram o aprendizado de Amenófis
IV. Tinha-se em mente como era o reino que ele estava comandando. Sabendo de tudo isso,
começou um processo de análise, no qual suas conclusões o levaram a crer que o rumo que o
Egito levava não era correto e que o problema encontrava-se na religião que guiava tudo na terra
do rio Nilo. Mesmo tendo um panteão de deuses e cidades, o poder dos sacerdotes de Amon
dificultava o poder da figura principal que era o faraó, prejudicando sua comunicação com o
povo. Amenófis IV sempre foi muito religioso e aprendeu com o pai os cuidados que a religião
deveria ter e o respeito pelas hierarquias. Somente os cultos isolados não ajudariam no
desenvolvimento da civilização. Esse pensamento de Amenófis IV foi bem expresso nesse trecho
comentado por Jacq (1978, p.26):
Certamente, o jovem Akhenaton apaixonava-se mais pela experiência espiritual de seu
mestre do que por sua habilidade política; sensível às palavras do velho sábio, o futuro
rei habituou-se a dominar as dificuldades cotidianas e a elevar seu pensamento para
além das aparências. Aprendeu também que a arte é uma das mais belas expressões do
sagrado, porque permite que todos contemplem os esplendores divinos.
Fica evidente que para Amenófis IV o que precisava ser organizado na religião não era
o culto, mas a forma de adoração dos deuses por todos os egípcios. Os cânones eram os “pontoschaves” a serem considerados. Além de seu pai Amenófis III, Amenhotep foi um guia nessa
percepção da relação entre poder, religião e transformação histórica. Em outra passagem
encontram-se indícios da influência de Amenhotep:
Este detalhe se reveste de importância, pois o jovem Akhenaton, cujas tendências
místicas deviam ser facilmente demonstráveis, lucrou com o ensinamento rigoroso de
um mestre espiritual ao mesmo tempo caloroso e severo. Amenhotep não gostava dos
sonhadores e dos visionários; para ele, um homem de Deus era também um homem de
ação. Ensinou ao seu discípulo as regras inflexíveis do ofício de rei, fez com que
percebesse seus deveres sagrados. “Não te limites à satisfação pessoal”, diz o mestre ao
discípulo; “é o Egito que te cria rei, tua vida está oferecida ao Egito” (JACQ, 1978, p.
26).
35
Como foi dito, Amenhotep foi um grande mestre para Amenófis IV, mas a idéia de
mudança no estilo egípcio tradicional pode ter vindo de seu pai, pois o faraó já pensava em
reorganizar a forma de veneração do deus de Tebas, Amon:
Antecedendo a seu filho Akhenaton nesse caminho, Amenófis III era apaixonado pela
elaboração duma religião universalista que os sacerdotes de Tebas, muito nacionalistas,
não podiam aceitar. Uma religião em que Amon não tivesse o papel principal condenálos-ia fatalmente a uma decadência política e material (JACQ, 1978, p. 43).
E foi a partir daí que Amenófis IV iniciou a sua mudança de conceitos religiosos,
consolidando uma comunicação religiosa entre deuses e homens que durou aproximadamente
dezessete anos e teve como símbolo principal o Sol.
2. A mudança de conceitos
Amenófis IV comparou a visão religiosa de seu pai com o poder dos sacerdotes de
Amon. A busca por uma religião universal que englobasse até povos asiáticos, fez com que o
jovem, que já estava no poder, usasse seu conteúdo místico, isto é, suas próprias crenças para
encontrar alguma característica racional que representasse essa busca por algo que fosse único.
36
Nessa investida, ele viu que a entidade que poderia representar a mudança que o Egito
precisava seria um deus chamado Aton. Abaixo, tem-se um trecho que explica bem essa
entidade:
Para expressar por meio de palavra a imensa força vital do Sol, os egípcios diziam Rá;
pronunciavam os diversos nomes do deus de Heliópolis, rezavam a Amon-Rá e a outras
personagens nas quais se manifestava o Senhor da Luz, mas que assumiam corpo
humano e se ornavam com atributos individuais para se oferecerem em adoração aos
homens. Mas diziam Aton quando se falava do astro como de um dado positivo da
experiência. Por volta do século XV a.C. manifestou-se no seio da religião egípcia uma
forte tendência a favor do culto solar. Dessa época restam-nos inúmeros hinos
dedicados a Amon, o deus do Império, mas que, na realidade, se dirigem ao deus solar
Rá-Harakte, cuja obra criadora exalta em hipérboles magníficas. Nessas composições,
nas quais se manifesta robusto amor à natureza, as alusões mitológicas cedem lugar a
figuras que referem a ação providencial do deus-Sol: É ele que cria e vivifica tudo que
existe, sua solicitude se estende a todos os viventes; é ele que assegura a conservação e
o bem-estar não só aos homens, mas também aos animais e às plantas. (SPALDING,
1973, p. 37)
A entidade solar já era conhecida no Egito Antigo, mas a sua função foi moldada por
Amenófis IV, pois Aton, o Disco Solar, e o deus que tinha nome desconhecido, se manifestavam
como “Luz no disco” (TRAUNECKER, 1995, p. 112). A diferença encontrava-se na luz desse
objeto. O deus se manifestava no disco iluminado (figura 8). Assim, tem-se a representação do
divino na luz e do terrestre no Disco Solar.
Nada mais racional para representar a religião do que um símbolo 4 que existe na
natureza e tem uma função real: dar vida a todos os seres vivos que necessitam de sua luz e
calor. Se for procurado, no dicionário, o significado da palavra Sol, serão encontradas afirmações
como:
4
O símbolo se refere ao objeto por força de uma lei (Pierce). Os símbolos são objetos materiais que representam
noções abstratas (Schaff) (EPSTEIN, 1986, p. 76).
37
FIGURA 8
Fragmento do sarcófago de Akhenaton com relevo da cabeça de Nefertiti.
Procedência: Tumba real em Tell El Amarna
Granito: 14.7 x 8.4 x 5.5 cm
Ägyptisches Museum und Papyrussammlung, Berlin
Fonte: <http://www.mfa.org/egypt/amarna>
38
Do Lat. Sole.
s.m.,
. A luz e o calor deste astro (Sol);
. Grande resplendor.
fig.,
. Pessoa de grande talento;
. Gênio, brilho, alegria, felicidade e dia.
Do Lat. Solum, só
Adv., ant.,
. Somente;
. Apenas;
. Unicamente.
(Fonte: LÍNGUA PORTUGUESA ON-LINE, Jul. 2005)
Observemos esses três grupos de significados inerentes ao princípio que Amenófis IV
atribuiu a Aton. O resplendor, a felicidade do dia e a unicidade, estes são ideais com que se
depara a temática racional do faraó. Ele buscou um símbolo que representasse tudo que fosse
compacto e que alcançasse todos os seres iluminados pelo Sol.
Com isso, o reinado do faraó começou a ser organizado de forma que a expressão
simbólica destinava-se a transmitir princípios sagrados (JACQ, 1978, p. 27). Esses princípios
encontram-se no novo templo que Amenófis IV construiu em Tebas, logo no início de seu
reinado. O templo para Aton se localizava voltado para o oriente para receber os primeiros raios
solares. O culto a Amon não foi interrompido, mas alterações materiais, como essa citada acima,
39
começaram a acentuar a importância do novo deus, que inicialmente foi representado com
cabeça de falcão e corpo humano (Figura 9). Depois de mais ou menos dois anos, o faraó
determinou não representar mais Aton com características antropomórficas 5 , mas com a forma
esférica e convexa com a margem em relevo (Figura 10), em que uma cobra, Uraeus 6 ,
simbolizava a vida. Essa forma tinha raios solares, e suas terminações, em formato de mãos,
traziam vida ao rei (BRUNNER-TRAUT, 2000, p. 14).
Com esse novo reinado, a cultura do povo modificava-se. Como sabemos, a religião, a
arte e o poder eram um só princípio no Egito Antigo, assim, com a alteração de cada uma destas
categorias, alterava-se a totalidade do meio cultural. Um exemplo disso, foi a celebração da
“Festa do Sed”, na qual os faraós celebravam, através de ritos, seus trinta anos de governo e
renovavam suas forças para continuarem governando.
Amenófis IV comemorou essa festa com, mais ou menos, quatro anos no poder,
querendo, assim, renovar suas forças para as mudanças mais radicais que estavam por vir. O
faraó conhecia os significados dos ritos e com essa atitude instituiu uma nova fase a seu reinado.
Mais ou menos no quinto ano de reinado, o faraó simbolizou seu poder e seu deus,
abandonando a capital religiosa, que era Karnak, e foi habitar uma nova área entre Mênfis e
Karnak, no lado oriental do rio Nilo. Esse lugar foi escolhido, pois sua localização era perfeita
para ver o nascimento do Sol entre duas colinas, um lugar que não pertencia a nenhum deus e
ficava, quase que exatamente, entre as duas cidades mais importantes do Egito, simbolizando
entre elas uma união espiritual.
5
Com semelhança ao homem, atributos humanos.
Uraeus é forma grecizada do termo egípcio uraios, que significa “basilisco” (sic!), através do latim. Designa a
deusa de diversos nomes que, personificando o Olho ardente de Rá e simbolizando a natureza ígnea das coroas,
tomava o aspecto de uma serpente fêmea ardendo de furor. A uraeus, com o pescoço dilatado, figurava na fronte do
faraó; aparecia nos frisos dos templos, e nos hipogeus reais cuspia fogo contra os inimigos (SPALDING, 1973, p.
83).
6
40
FIGURA 9
Figura de Amon-Rá na forma humana.
Pintura em papiro
Fonte: OS GRANDES FARAÓS, 2004, no. 3, p. 26.
41
FIGURA 10
Esquema de Aton.
Fonte: <http://www.mfa.org/egypt/amarna>
42
Hoje, essa cidade chama-se Tell El Amarna 7 , mas seu nome original escolhido por
Amenófis IV foi Akhetaton (Akhet-Aton=Horizonte de Aton). Esse nome deve ter sido escolhido
pelo fato de que se podia ver dali com mais perfeição o nascer do Sol. A cidade foi construída
rapidamente e o material foi retirado das pedreiras do deserto oriental. No sexto ano de reinado,
a cidade já estava pronta e o faraó celebrou as festividades prolongando-as além do necessário,
demarcando suas terras com estelas. Os limites foram assinalados, indicando que o rei nunca
sairia daquela região (Figura 11).
Amenófis IV quis mostrar a seu povo que aquela cidade nasceu não de uma fantasia,
mas da exigência do próprio deus, que desejava uma cidade em que houvesse a “origem” de uma
nova fase. Abaixo há um relato do faraó sobre a cidade de Akhetaton:
Eu farei Akhetaton (Amarna) para o Aton meu pai,
Neste local;
Não lho farei nem mais para o sul,
Nem mais para o norte,
Nem mais a leste,
Nem mais a oeste.
Não ultrapassarei os limites,
Nem ao sul, nem ao norte;
Não construirei a oeste,
Mas ao oriente, onde aparece o Sol,
Na localidade que cercou de montanhas a seu gosto;
Se a rainha me dissesse
Que existe alhures
Um lugar mais bonito para Akhetaton,
Eu não lhe daria ouvidos.
Se os conselheiros ou qualquer outra pessoa
Me dissessem o mesmo,
Eu não lhes daria ouvidos.
Caso se trate duma localidade ao norte ou ao sul,
A oeste ou a leste,
Jamais diria que eu iria abandonar Akhetaton,
Que eu iria construir outra Akhetaton
Num lugar mais favorável.
7
Tell El Amarna é o nome árabe dado à cidade de Akhetaton, por isso que se encontra, freqüentemente, a
denominação “período amarniano” dada ao reinado de Akhenaton por causa desse nome.
43
FIGURA 11
Foto do pequeno templo de Aton com uma coluna reconstruída.
Amarna – Egito
Fonte: <http://www.mfa.org/egypt/amarna>
44
Isto é Akhetaton para Aton.
Foi ele que a quis,
A fim de com ela se regozijar para sempre e eternamente (JACQ, 1978, p. 84).
O fato de simbolizar a nova fase de seu reino demonstra que Akhenaton tinha em mente
uma intenção de propagar todos esses acontecimentos. Suas mudanças foram significativas e,
além de mostrar os resultados, fazia um vínculo com seu novo deus, em que a justificativa de
suas ações vinham dessa entidade. A manipulação desses símbolos, sendo eles objetos, desenhos
ou cidades, fica melhor entendida se atentarmos para uma justificativa do significado da palavra
símbolo relatado por Epstein (1986, p. 68):
Um símbolo nunca é completamente ‘esclarecido’ explicitamente, isto é, sempre há um
resíduo implícito. Em todo símbolo ou toda relação simbólica deve haver alguma forma
de semelhança. Os símbolos são sistemas de representação com um grau de iconicidade
fraco, porém jamais nulo, pois eles refletem sempre um objeto ‘simbolizado’.
A iconicidade ou semelhança que existe entre o símbolo e a coisa simbolizada não é
porém “literal”, mas fruto de uma maneira comum de refletir e que subsiste nas duas
coisas.
O grau de iconicidade do símbolo é, portanto, semelhante àquele que existe entre uma
metáfora e o significado por ela transposto.
A importância simbólica foi tamanha, no reinado de Akhenaton, que acabou se
espalhando para mais templos de Aton fora de Akhetaton, em Heliópolis, Mênfis e na Núbia, e
em outras construções espalhadas pelo Egito. Mas Amenófis IV não visitou essas construções,
pois como foi relatado em algumas inscrições em pedra, Akhetaton foi construída para ele morar,
sendo o sítio que Aton estabeleceu para o rei permanecer.
Com esse caminho percorrido, com a construção da nova cidade e com os princípios
simbólicos definidos, passamos agora a tratar de mais uma modificação feita pelo faraó: a troca
de seu nome de Amenófis IV, que continuava a dinastia, para o nome de Akhenaton.
45
Desde o início, deste trabalho, chamamos o faraó de Amenófis IV, pois era seu nome
“de batismo”. Toda a trajetória relatada, até então, ocorreu no período em que seu nome era
Amenófis 8 . Agora, chegamos a mais uma modificação simbólica que fecha o relato sobre os
novos conceitos trabalhados pelo faraó e que solidificou o vínculo com seu deus Aton 9 .
Antes de fundar Akhetaton, Amenófis IV substituiu seu nome, que significava “Amon
está em paz”, para Akhenaton, que pode ser traduzido como o “Bem amado de Aton” ou “Brilho
de Aton” (BRUNNER-TRAUT, 2000, p. 18). Essa mudança ocorreu para, também, simbolizar a
ligação do deus com seu representante na Terra. Seria uma espécie de passagem para um novo
conceito, que foi reestruturado para comandar um Egito iluminado e abençoado pelo deus solar.
Para entendermos a composição do nome atentamos para a palavra akh, que na língua
egípcia significa a eternidade (JULIEN, 1993, p. 38) e é representada como uma cruz dominada
por um anel que fica preso nas mãos das divindades, sendo um emblema de vida (Figura 12). A
vida vem da luz e, assim, Akhenaton (akh-aton) é o que faz brilhar o deus Aton.
FIGURA 12
Esquema de Akh ou Ankh.
Fonte: CLARK, 1991, v. II, p. 118.
8
Amenófis é uma transcrição grega duma palavra egípcia que se faz por intermédio de Amenhotep; subindo ao
trono, o esposo de Nefertiti passou a fazer parte oficialmente da grande dinastia dos Amenhotep, sendo que este
nome significava “Amon está satisfeito” ou “O Príncipe oculto está em plenitude”, conforme outra interpretação
(JACQ, 1978, p. 28).
9
O novo nome de Amenófis IV, que marca a primeira virada de sua revolução religiosa, é: “Viva Rá-Horakhti (uma
das formas do princípio solar) que se regozija no horizonte brilhante em seu nome de Luz que pertence a Aton”.
Mais dois nomes completam a personalidade simbólica do rei: “Viva Rá aquele que pertence ao horizonte brilhante,
que se regozija no horizonte brilhante em seu nome, ou seja, Rá que veio no disco (ou: na qualidade de Aton)” e
“Belo de formas como Rá, o filho único de Rá” (JACQ, 1978, p. 28).
46
Com essa ação, morreu o nome Amenófis IV e começou um não-retorno aos cânones e
ao poder de Amon. Ele modificou a natureza real dos deuses e foi através da troca de nome que
ficou claro a vontade de mudar seus conceitos e pensamentos sobre seu povo.
Ao povo foi, então, anunciado que por intermédio dos ideais solares, criariam-se formas
luminosas (Figura 13), que captariam a luz celeste, banhariam a Terra e guiariam o futuro do
Egito. Depois dessa fase de construção simbólica, agora, Akhenaton passa a colocar em prática
seus conceitos religiosos juntamente com o seu poder faraônico.
47
FIGURA 13
Torso real – Nefertiti ou uma de suas filhas.
Procedência: Department of Egyptian Antiquities – Reinado de Akhenaton, 1353- 1336 a.C.
Quartzo: 29.4 x 13 x 12.6 cm
Louvre Museum, Paris
Fonte: <http://www.mfa.org/egypt/amarna>
48
CAPÍTULO II
Poder e religião ditando novas regras
49
Akhenaton, como todo faraó egípcio, com seu olhar inovador estabeleceu em sua coregência e regência a execução de obras, nas quais, a religiosidade estava sempre presente. Foi
através da exposição de seus pensamentos, traduzidos em obras e poesias, que ele divulgou seu
deus único e venerou-o de uma forma particular. Sua veneração pode ter sido obsessiva, fazendo
com que o governante deixasse algumas obrigações sociais de lado, causando conflitos de ideais
com o povo e levando o rumo de sua obra ao fim.
1. Olhar inovado
O reinado de Akhenaton foi organizado de uma forma tão clara quanto a luz de seu deus
Aton. Essa organização nada tinha a diferenciar dos outros faraós, nesse caso, o faraó usou muito
mais seus poderes além do que conhecemos de outros soberanos. O olhar inovador antecedeu à
morte de seu antecessor Amenófis III. Sabe-se que esse soberano reinou junto ao seu filho até
mais ou menos o nono ano de poder de Akhenaton.
Num trecho, Casson (1983, p. 134) explica como essa nova estrutura de representação
começou a se fundir no reinado de Amenófis III e Akhenaton:
No tempo de Amenófis III, novas idéias estavam sendo introduzidas na religião, na
literatura e na arte. Um conhecimento cada vez maior das culturas estrangeiras,
resultante das conquistas do Egito sob Tutmósis III, uma geração antes, além da
presença de muitos estrangeiros na capital em Tebas, determinou certa erosão da
mentalidade conservadora e restrita dos egípcios.
50
Nesse trecho fica claro que as inovações foram o resultado dos empreendimentos de
grandes faraós como Tutmósis III 10 (Figura 14), que ficou conhecido pelas suas conquistas
territoriais, e que se dedicou a representar seu poder econômico com grandes obras. Foi um dos
precursores desse pensamento “sinalizador”, em que através de monumentos e esculturas, eram
mostrados os passos do governante. Isso não quer dizer que antes de Tutmósis III isso não
ocorresse, mas antes de sua ascensão, ele co-reinou com sua tia Hatshepsut 11 (Figura 15) por
mais ou menos 20 anos e, nesse período, presenciou um reinado calmo e que perdeu muito
território para a Ásia (BAINES, 1996, p. 43). Esse fato moldou sua mentalidade e projetou-a a
seus sucessores (Amenófis II, Tutmósis IV e, então, Amenófis III), que queriam mostrar para o
mundo que a nação egípcia tinha um legado de conquistas a ser preservado e respeitado.
Seguindo os ideais de grandes faraós, Akhenaton apresenta exemplos baseados no
conceito solar, em que o que é iluminado é divinizado. Antes de Akhetaton, o faraó construiu
obras públicas nas quais o público já podia ver seus ideais. A cidade de Tebas já era vista como
uma “cidade do esplendor de Aton” (JACQ, 1978, p. 52), e o pequeno templo de Aton já tinha
grande referência se comparado aos grandes templos de Amon.
A representação do deus solar foi modificada e, com isso, iniciou-se uma nova
simbologia explorada por Akhenaton. Porém, o que foi realmente novo foi a identificação do
faraó com o deus. Aton foi colocado como um rei-deus representado pelo próprio faraó.
10
Filho de Tutmósis II, Tutmósis III reinou entre 1479 e 1425 a.C.
Hatshepsut reinou entre 1473 e 1458 a.C. no sétimo ano do reinado de Tutmósis III, ela se proclama “rei”
feminino (na ideologia egípcia não havia lugar para uma rainha reinante) e ficou reinando junto ao sobrinho até a
morte, apaziguando as guerras e conquistas do país (BAINES, 1996, p. 43).
11
51
FIGURA 14
O Faraó Tutmósis III.
Procedência: Karnak – XVIII Dinastia – 1428-1450 a.C.
Balsato cinza: altura 90 cm
Museu do Cairo
Fonte: MONDADORI, 1969, p. 95.
52
FIGURA 15
Cabeça de uma estátua colossal de Hatshepsut.
Procedência: Deir El Bahari
Calcário pintado: 1.22 m
Metropolitan Museum – Nova York
Fonte: DAUMAS, 1972, p. 98.
53
O símbolo desse referencial é construído da seguinte forma: um Disco Solar onde em
torno dele se enrola uma serpente 12 e no pescoço dela está enrolado o símbolo da vida (akh).
Nisso, encontramos argumentos para identificar o olhar que Akhenaton traduziu. O seu
meio social e religioso formou uma mente única, em que através de um símbolo unificado, que
englobava todas as suas idéias, foi determinada sua mudança conhecida como “estilo
amarniano”. Jacq (1978, p. 52) conclui esse relato citado acima:
Um templo estranho, um deus que afirma seu poder, um simbolismo que nasce:
mas o rei não pára nisto. Com efeito, Amenófis IV se faz representar sob a forma de
estátuas colossais assexuadas com o rosto estranhamente deformado. Vemos nisto já os
inícios de um estilo artístico que rompe com os cânones tradicionais e que deita as
raízes duma nova visão do mundo.
Seu olhar pairou sobre o real, onde tudo que o deus Sol iluminava era apresentado a
todos. A comunicação aberta e realista foi o impulso para suas obras conhecidas hoje e que
falaremos mais adiante.
Mas não foram só obras monumentais que Akhenaton construiu, dedicou-se também à
poesia, visando registrar suas façanhas, seus desejos e além dos documentos oficiais, em seus
poemas encontram-se os registros de seu percurso como faraó.
Akhenaton se intitulou como “Aquele que faz conhecer o nome de Aton” (JACQ, 1978,
p. 139) e sua missão era expandir a beleza de Aton de forma que tudo fosse conhecido por todos.
Assim, o culto de Aton era respeitado e, através dele, o rei poderia complementar sua divulgação
a seu deus e manter a religiosidade de sua nação. No Egito Antigo, acreditava-se que o fato de
pronunciar o nome do morto restituía-lhe a vida. Acreditava-se, igualmente, que a adoração do
deus fixava-se um contato com ele e mantinha a nação protegida.
12
No Egito, a serpente não lembra o mal; ela está ligada à idéia das metamorfoses incessantes por que o homem
profano passa e que o homem indicado controla (JACQ, 1978, p. 52).
54
Assim, com o uso da língua, houve uma organização baseada nessa fase de “mostrar o
real”, lembremos que os documentos egípcios e a literatura egípcia eram escritos em uma língua
na qual ninguém mais falava. Akhenaton determinou que seus documentos fossem escritos na
língua corrente, neo-egípcia (BRUNNER-TRAUT, 2000, p. 27) que era mais usada pelo povo,
seria uma forma coloquial da escrita. Notamos que o faraó foi um homem ligado aos fatos
cotidianos e que sua visão de realismo alcançou também essa forma de comunicação.
Na parte literária, a religião e os seus conceitos foram representados de forma direta e
poética. Pode-se citar como exemplo o “Canto de Louvor a Aton”, reproduzido quase
literalmente no Salmo 104 da Bíblia. Mas, também, é baseado em outros hinos voltados a Amon,
pois exalta a criação. A particularidade desse canto é que ele, mesmo sendo religioso, mostra o
lado real de um mundo natural. Akhenaton diminuiu a conotação mítica e essa característica é
muito forte em outros hinos feitos por ele (anexados no final do trabalho). Abaixo, há uma
transcrição de um trecho do “Canto de Louvor a Aton” e trechos do Salmo 104 da Bíblia:
Tu surges belo no horizonte do céu, ó Aton vivo, que deste início à vida.
Quando te ergues no horizonte oriental iluminas a terra toda com tua beleza.
Tu és belo, grande e resplandecente sobre todo o país.
Teus raios iluminam as terras até o limite do que tu criaste...
Quando tu vais em paz no horizonte ocidental, a terra fica na escuridão como morta...
Na aurora tu reapareces no horizonte, resplandeces como o Aton do dia, eliminas as
trevas e lança teus raios.
As duas terras estão em festa...
Tu, deus único, nenhum outro existe além de ti.
Tu criaste a terra segundo o teu desejo, quando estavas só.
Homens, gado, todos os animais selvagens, tudo o que há sobre a terra e anda sobre os
pés, tudo o que está no céu e voa com as asas.
E os países estrangeiros, a Núbia, a Síria e o Egito, tu colocaste cada homem em seu
lugar, proveste as suas necessidades, cada um (deles) tem o seu alimento...
Os teus raios trazem a vida para todas a plantas e quando resplandeces, elas vivem...
(SCHNEIDER, 2001, p.41)
***
55
Nos barrancos, tu fazes jorrar as fontes,
Elas caminham pelo meio das montanhas;
Elas dessedentam todos os animais dos campos,
Os onagros matam nelas sua sede;
O pássaro dos céus permanece ao pé delas,
Debaixo da folhagem ele eleva a voz.
De teus quartos elevados, tu dessedentas as montanhas,
A terra sacia-se com o fruto de tuas obras,
Tu fazes crescer a erva para o gado,
E as plantas para uso dos humanos. (...)
.............................................................................................................................................
Ele (Javé) fez a lua para marcar os tempos,
O Sol conhece seu pôr-se.
Tu colocas a treva, é a noite,
Todos os animais das florestas nelas se mexem.
Os leõzinhos rugem atrás da presa
E reclamam de Deus a sua comida.
Quando o Sol se levanta, eles se retiram
E vão deitar-se em seu esconderijo;
O homem sai para a sua obra,
Para o seu trabalho até à noite.
Como são numerosas tuas obras, Javé!
Todas tu fizestes com sabedoria,
A terra está cheia de tua riqueza...
.............................................................................................................................................
Tu escondes a tua face, eles se espantam,
Tu retiras o teu sopor, eles expiram,
Ao seu pó eles retornam.
Tu envias o teu sopro, eles são criados,
Tu renovas a face da terra. 13
(JACQ, 1978, p. 180)
Lendo a poesia de Akhenaton vemos como a realidade foi colocada e divulgada de
forma direta, transmitindo a mensagem segundo a qual o deus único abre-se para todos na
natureza. Dessa maneira, entendemos porque o salmista se baseou nesse princípio e compôs esse
13
Tradução da “Bíblia de Jerusalém”, edição francesa de 1974.
56
salmo: a espiritualidade amarniana. Com isso, podemos concluir que o pensamento de
Akhenaton tornou-se imortal.
Nas suas poesias, Akhenaton deixava claro seu poder e que ele era o único que conhecia
o princípio criador da vida, em outro trecho de suas poesias acha-se escrito quase um resumo
daquilo que o faraó realmente se intitulava:
Nenhum dos que tu engendras te vê,
Tu resides em meu coração.
Não há outrem que te conheça,
Exceto teu filho Akhenaton
Que tu tornas ciente dos teus projetos
E do teu poder.
(JACQ, 1978, p. 136)
Se sua poesia e o trabalho com as palavras eram tão intensos e reais, o que se pode falar
das suas obras voltadas a Aton? Seu princípio de construção foi direcionado a reverenciar seu
deus. Assim, como sua poesia, seu intuito era comunicar a todos, sem exceção, os novos
princípios que o Egito estava seguindo com seu reinado.
Para conquistar seu deus, Akhenaton começou a organizar sua “revolução amarniana”,
com algumas alterações no estilo de construção visual egípcio, para melhor adorar ao deus solar.
Jacq (1978, p. 103) explica o início dessa obra construída pelo faraó:
Com efeito, é fácil reconhecer as obras de arte do período amarniano, cujo estilo
estranho, que às vezes foi julgado monstruoso, surpreende imediatamente o espectador.
O construtor Akhenaton criou uma arte original que correspondia à sua visão de homem
e do universo; viver numa capital nova implicava uma arte nova, em harmonia com a
sensibilidade duma civilização inédita.
57
A arte amarniana empregava curvas exageradas, volumes estranhos, figuras alongadas
e, às vezes, deformadas. Dos temas usados nas narrativas, em primeiro lugar, dá-se destaque à
família real. Ela é vista homenageando Aton, agradecendo-lhe benefícios e “canalizando” a vida
celestial para a vida da humanidade. Depois deparamos com o cotidiano do faraó e sua família
(figura 16). Há interação entre os representados, vê-se o sentimento como uma nova expressão,
pois a representação da família era visto como algo sagrado.
Akhenaton deixou de lado a característica antiga de representação de poder e se
apresentou como um homem simples como os outros homens. Mas, se o poder do faraó é
conhecido pela diferenciação do soberano para com os homens comuns, o que Akhenaton queria
comunicar? Ele sabia o que fazia, seu método de representar seu poder era através da abundância
das representações familiares. Isso faz parte de uma concepção metafísica do faraó; para ele a
continuidade de narrativas familiares (que seria um resumo da imagem harmoniosa ideal da
sociedade) revelaria as intenções reais do deus Aton. Segue, aqui, um exemplo:
Quando o rei e a rainha se abraçam na carruagem de aparato, ao passarem pelas ruas de
Amarna, eles propõem a seus súditos o símbolo mais puro da união mística, da
harmonia do casal que preside a todas as outras harmonias. É por isso que Aton abençoa
esta união, inundando o casal com seus raios. (JACQ, 1978, p. 106)
Outro tema é a representação da natureza. Muitos animais são representados livremente
nas pinturas. Mostra-se um “paraíso”, no qual independe do homem a felicidade dos mesmos. A
natureza testemunha a presença divina, assim, deveria ser apresentada na sua realidade e não
fazendo “cenário” para o cotidiano humano.
58
FIGURA 16
Estela inacabada da família real.
Procedência: Tell El Amarna
Calcário: 17.7 x 13.3 x 2.8 cm
Ägyptisches Museum und Papyrussammlung, Berlin
Fonte: <http://www.mfa.org/egypt/amarna>
59
Não foi apenas a natureza por si só que identificou a construção amarniana, mas o
símbolo em si. Um pássaro representava uma das leis de criação do mundo e não seria apenas o
“fornecedor de carne” (Figura 17).
Pode-se dizer que houve influência asiática nesse pensamento do faraó, isso porque
relatos históricos mostram que depois da pilhagem da cidade de Knossos e das cidades cretenses,
artífices e pensadores seguiram para outras terras, e alguns foram para o Egito. Na representação
da natureza amarniana são encontrados traços parecidos com os cretenses. Akhenaton tinha uma
mente aberta e absorvia outras correntes de pensamento.
Também, não se deve esquecer das obras voltadas diretamente a Aton, nelas tem-se, na
sua maioria, a representação do próprio faraó (figura 18), nas quais sua fisionomia diferenciada,
às vezes, é considerada monstruosa, mas que na verdade pode ser explicada em um trecho, no
qual Jacq (1978, p. 107) relata o que Arthur Weigall acha sobre o caso:
Arthur Weigall nos propõe uma primeira chave de interpretação, observando que o
estilo amarniano é, em parte, um retorno à época arcaica, aquela dos reis deuses do
Egito primitivo que eram os únicos depositários do poder divino. As “monstruosidades”
que nos chocam seriam uma adaptação amarniana do estilo despojado, às vezes
geométrico, do Antigo Império. A aproximação é engenhosa, tanto mais que esta
“correspondência” artística encontra um exato paralelo no domínio da religião solar.
As obras, que são retratos mais deformados e afastados dos cânones egípcios, trazem
traços asiáticos, não se sabe se o rei mandou colocar essas características ou não, mas nossos
olhos não conseguem olhar esse período com os mesmos olhos das outras dinastias. A
particularidade visual que liberava uma imagem mais real era mais simbólica, pois o rei do Egito
era uma personagem de uma nova forma de organização religiosa. Assim, quando se vê uma
estátua andrógina de Akhenaton deve-se pensar no fato simbólico que deveria comunicar e não
somente a realidade que o Sol iluminava. Com isso, deve-se tomar um pouco de cuidado quando
60
FIGURA 17
Patos no pântano.
Procedência: Tell El Amarna – XVIII Dinastia; século XIV a.C.
Pintura a têmpera
Museu do Cairo
Fonte: MONDADORI, 1969, p. 115.
61
FIGURA 18
Estátua colossal de Amenófis IV/Akhenaton com a dupla coroa egípcia.
Procedência: Karnak
Arenito: 205 x 111 x 60 cm
Egyptian Museum, Cairo
Fonte: <http://www.mfa.org/egypt/amarna>
62
analisarmos suas obras, pois ao mesmo tempo em que se representava a realidade, eram
colocados símbolos para representar o poder. Mais adiante, será visto essa questão.
2. Conseqüências de uma veneração
Além de Amenófis III, Akhenaton teve o apoio sua mãe Tii e de sua esposa, a
conhecida, Nefertiti 14 (Figura 19), em todo seu percurso como faraó. O apoio não foi só moral,
mas religiosamente sua família tinha ideais como os do faraó, queria buscar o poder, mas
também queria organizar uma nação num sentido particular e novo. Através dos princípios
solares, seus desejos pareciam procurar uma unicidade e paz para eles e seu povo.
O contato do faraó com a nação amarniana foi, provavelmente, intenso. Por meio de
documentos encontrados nas ruínas de Tell El Amarna, viu-se que havia um contato mais
fraternal, os cultos eram liberados para que todos pudessem ver e alguns templos eram abertos
para receberem a luz solar.
Akhenaton deveria viver em um ambiente familiar sem grandes problemas. Além de
suas 6 filhas e de concubinas, havia os funcionários reais, nos quais ele podia confiar. Nisso “a
grande família” vivia em uma cidade iluminada e abençoada pelo Sol. Num trecho comentado
14
“A bela que chegou” seria a tradução mais provável. Esta mulher cheia de mistérios foi a metade feminina do
poder de Akhenaton. Pelas pinturas e esculturas, nota-se que foi uma grande rainha e que seguiu seu marido até seu
desaparecimento. Sua múmia nunca foi encontrada.
63
FIGURA 19
Busto pintado de Nefertiti.
Procedência: Tell El Amarna - XVIII Dinastia
Calcário pintado: 48 cm
Museu de Berlin.
Fonte: BAINES, 1996, v. II, p. 124.
64
por Jacq (1978, p. 88) salientam-se características que demonstram que o ambiente amarniano
teve um período bom:
Julgando que a natureza exprimia o amor divino com o máximo de fidelidade, o
rei consagra à natureza um monumento interior onde ele concretiza a teologia expressa
nos textos sagrados. Numa extensão de mais ou menos oitocentos metros no eixo nortesul, o grande templo de Aton se erguia como a jóia da cidade nova. Era em torno dele
que se desenvolvia a vida da cidade, era ele que dava sentido à sociedade que
Akhenaton ia construindo aos poucos.
Como em qualquer história de nações, houve um período glorioso, mas houve o
esquecimento do princípio de poder. O “paraíso” construído pelo faraó se desorganizou e, fora
de controle, pode ter perdido seu ideal. Esse comentário é interessante por causa das
conseqüências da veneração de Aton. Quando Akhenaton começou a dar mais atenção a um
único deus e depois instituiu o monoteísmo, esqueceu-se de que um legado milenar ficou
diminuído, causando desordem junto aos sacerdotes e ao panteão egípcio.
Diferente do que se encontra em livros, Akhenaton não foi tão radical com os
seguidores do deus Amon, que reinavam em Tebas. Sua atitude como soberano foi dar ênfase ao
deus que ele instituiu como deus da criação, amor e luz. Ele tirou alguns poderes dos sacerdotes,
diminuiu as ofertas e trouxe a Akhetaton pessoas que tiveram novas atividades a cumprir na nova
cidade.
Falou-se muito do deus Amon, mas não podemos esquecer que o Egito Antigo tinha
muitos deuses e que os seguidores de Amon eram maioria, pois a simbologia desse deus voltavase à criação. Os sacerdotes eram muito poderosos e com a divinação e culto de Aton houve uma
competição com o faraó. Os bens materiais também pertenciam ao faraó, assim os religiosos
quase perderam tudo (poder e riquezas) e foram deixados “de lado” pela corte.
65
Aqueles que seguiram o faraó tiveram que se converter à religião solar e foram
incapazes de reagir a favor do deus Tebano. Os princípios de Amon eram parecidos com os de
Aton, nisso quem se converteu pode não ter encontrado problemas para venerar o deus do faraó.
À seguir há um relato do papiro de Leyde, que explica a simbologia de Amon:
“De aspecto misterioso, de aparência deslumbrante, Deus maravilhoso de formas
múltiplas, todos os deuses se valem dele para serem engrandecidos por sua Beleza,
porque ele é Deus. Ele próprio é Rá, quando se uniu a seu corpo. Ele é o grande que está
em Heliópolis, ele é Amon saído do oceano Primordial, ele guia a humanidade. Ele é o
Senhor Universal, princípio dos seres. Único é Amon, que se esconde dos homens. Ele
se furta aos deuses, ninguém conhece sua natureza, nenhum deus conhece seu
verdadeiro aspecto. Não tem nenhuma aparência que possa ser desenhada, ele é por
demais misterioso para que sua glória seja revelada, ele é por demais vasto para ser
perscrutado... Tudo o que sai da boca de Amon, os deuses a isso se conformam como se
fossem ordens...” (JACQ, 1978, p. 164).
Da mesma forma que Akhenaton não deu atenção à importância religiosa e histórica de
Amon, ele não se abalou com os problemas externos causados pelos Hititas contra os Mitanni, e
pelos Fenícios que também foram “desconsiderados” pelo faraó e não tiveram apoio quando
pediram que o soberano estabelecesse o fim dos conflitos.
Akhenaton se fechou numa espécie de “bolha”, na qual tudo que era exterior ao seu
império, era insignificante. As relações internacionais que seu pai tinha construído, acabaram se
desfazendo, causando dificuldades econômicas. As riquezas já não eram trocadas, as exportações
e importações estavam diminuindo e a necessidade básica do povo foi esquecida.
A religião ocupou a totalidade do pensamento do rei. Apenas a construção para Aton
estava organizada, sua meta consistia na edificação de grandes monumentos e na representação
de sua vida e de suas batalhas vencidas.
66
Quando Akhenaton mandou ajuda aos povos estrangeiros e impôs seu poder, já era tarde
e não houve grande êxito. As riquezas já eram poucas e o poder também. Sua atitude foi quase
como um pacificador, pode ter sido uma atitude voltada ao ideal solar:
Alexandre Moret parece-nos mais perto da verdade, quando indica que Akhenaton
desejava glorificar um deus Sol que seria um laço sagrado entre os egípcios e os outros
povos. Um deus agressivo, nacionalista e batalhador, mesmo em caso de vitória, não
teria sido um deus estritamente egípcio; um deus pacífico e tolerante, em compensação,
teria conquistado o coração de todos os homens, evitando conflito (JACQ, 1978, p.
159).
Com esses acontecimentos, o faraó começou a se voltar ainda mais para seu deus e o
culto de Amon ficou ainda mais fragilizado. O culto para Aton tornou-se mais evidente, irritando
os tebanos, começando uma intriga entre os seguidores desses deuses.
Os seguidores de Amon acusavam o faraó de ser o responsável pelo esquecimento do
povo, das obrigações sociais e da perda de riquezas do Egito; já Akhenaton acusava os
sacerdotes de serem materialistas e usarem Amon para expandir seu poderio.
Para mostrar que seu poder ainda estava forte, Akhenaton foi radical e deu ordens de
destruir estátuas de Amon ou de retirar o nome desse deus. Desde grandes monumentos até
pequenos objetos, todos foram mutilados. Essa atitude, naquele tempo, tinha um sentido
simbólico importante, pois retirar o nome de uma divindade ou de um soberano era aniquilar sua
história, saqueando tudo de Amon, só restaria o deus único do faraó.
Essa atitude atingiu a consciência popular, que mesmo estando na cidade do deus Aton,
tinham seus pequenos cultos internos liberados e agora não podiam cultuar seus deuses locais. A
revolta asiática não estava mais controlada por Akhenaton, o poder abalou-se e mesmo com a co-
67
regência de Semenkhkare 15 não houve uma organização como era antes. Semenkhkare foi
simbolizado como “alma de Akhenaton” e recebeu um dos nomes da rainha Nefertiti. Mas ele
morreu uns três anos depois, enfraquecendo o poder do faraó, que logo depois também
desaparece.
No lugar de Akhenaton, ficou seu segundo genro Tutankhaton 16 , o pequeno rapaz foi
chamado a Tebas pelos sacerdotes de Amon e foi instituído faraó com o nome de
Tutankhamon 17 (Figura 20). Assim, com essa “simples mudança de nome”, Amon vencia Aton e
a história de Akhenaton chegava ao fim.
Através de uma criança manipulada, os sacerdotes restabeleceram o politeísmo e o
poder de Amon. Akhetaton foi abandonada e, quando veio o poder Ramassida 18 já estava quase
tudo destruído. Assim retornam os cânones artísticos antigos.
A criação estilística trabalhada na obra de Akhenaton foi abolida, o culto de Aton
também e a história de seu reinado foi ofuscada para não ser repetida por outros faraós, pois para
os Ramassidas foi a experiência espiritual do faraó que causou o enfraquecimento do Egito.
Nessa trajetória de pouco mais de dezessete anos, viu-se que a idéia de cultuar, venerar
e comunicar novos princípios de um deus teve seus altos e baixos, mas o que restou para nós
como referência foi muito importante para conhecer um homem que trabalhou o monoteísmo.
Sua obra e seu ideal foram usados durante a História e, até hoje, pode-se fazer
referências a seus pensamentos com acontecimentos atuais. Através de obras que mostram sua
imagem, podemos achar características de sua narrativa.
15
Semenkhkare foi genro de Akhenaton e supõe-se que ele co-reinou por mais ou menos três anos
Tutankhaton significava “O símbolo vivo de Aton” (JACQ, 1978, p. 171).
17
Tutankhamon significava “O símbolo vivo de Amon” (JACQ, 1978, p 171).
18
Poder Ramassida é o período iniciado pelo faraó Ramsés II e seus sucessores, que trouxeram novamente a
organização canônica antiga.
16
68
FIGURA 20
Estátua de Tutankhamon.
Procedência: Túmulo de Tutankhamon no Vale dos Reis - Pós Amarna – XVIII Dinastia – 1361-1352 a.C.
Madeira estucada e pintada, olhos incrustados: altura 42 cm.
Museu do Cairo.
Fonte: MONDADORI, 1969, p. 118.
69
CAPÍTULO III
Akhenaton e o seu registro
70
Uma imagem pode dizer mais do que muitas palavras. Verificar um período histórico,
registrado em vários suportes, nos ensina e nos mostra conteúdos jamais imaginados. Ler as
imagens desses suportes também é uma forma de aprendizado. Os egípcios dominavam a técnica
representativa e fizeram um dos maiores registros de sua própria história. Se não houvesse esse
sistema de registro não teríamos como mostrar a história de Akhenaton.
1. Comunicação Visual
Podemos considerar um registro como uma forma de comunicação em que através de
alguma forma (escrita, desenhada, pintada, moldada ou esculpida) é colocada uma mensagem
para a posteridade. No Egito Antigo a temática era exatamente registrar sua história até para os
mortos e deuses. A linguagem egípcia foi feita para ser lida visualmente, passando um conteúdo
relativo ao seu mundo.
A história do Egito Antigo está impressa principalmente em símbolos que eram
facilmente entendidos pelo seu povo. Foi um conhecimento que eles souberam codificar, isto é,
eles tinham o domínio sígnico. Caramella (1998, p.71) faz um relato sobre comunicação e o
trabalho com os signos, e que poderíamos considerar como um pensamento seguido pelos
egípcios:
71
No entanto, toda associação é feita através de signos, dado que não podemos pensar sem
signos. Um signo ou representamen é aquilo que, sob certos aspectos, representa algo
para alguém, criando na mente dessa pessoa um outro signo equivalente, ou um signo
mais desenvolvido, denominado interpretante do primeiro signo. O signo representa
alguma coisa, seu objeto, não em todos os seus aspectos, mas em relação a alguma parte
ou caracteres.
Para Peirce, um signo é pois uma relação triádica, uma cooperação de e entre três
sujeitos: o signo, o objeto e o interpretante. Ação, essa, tri-relativa que não pode ser
resolvida entre pares. Essa cooperação de e entre três sujeitos e por ele denominada de
semiosis que, de resto é o próprio conceito de relação.
Concluímos que a comunicação visual relaciona a associação sígnica com o domínio que
o indivíduo tem ao observar as imagens, ele compila e organiza as formas que resultarão em
conteúdos compreendidos.
2. Comunicação canônica
Com o desenvolvimento da comunicação visual egípcia surgiu um recurso de estilização
das figuras usadas nas representações, principalmente humanas. A denominação mais conhecida
é Cânone por se tratar de regras fixas para a execução dessas obras estilizadas.
Ostrower (1989, p. 75) nos resume o estilo canônico:
A curiosidade maior era pelo fenômeno do recurso à estilização nas figuras humanas,
que são representadas com o rosto de perfil, o olho visto de frente (significando o olhar
mágico) e os ombros também vistos de frente, quadris e pernas novamente de perfil, o
polegar das duas mãos – e também o dedo grande do pé – colocados invariavelmente do
lado de fora (mais próximo ao espectador). Seria mais fácil desenhar assim? Os artistas
não viam direto ou não conseguiam desenhar melhor?
72
Há aqueles que aceitam a tese de que havia limitação no desenho egípcio por
incapacidade dos artesãos. Mas não era bem isso, a estilização ocorria para evidenciar altos
dignitários e deuses, já camponeses tinham características mais simples. Assim, temos uma
convenção determinada para elaborar as mensagens visuais que durou dezenas de séculos, e que
era compreendida por egípcios de diversas dinastias.
Deduzimos que além de entenderem e trabalharem a comunicação visual os egípcios
tiveram a capacidade de moldá-la e conservá-la por milhares de anos para benefício próprio. Eles
criaram um sistema de leitura que não pode ser considerado bizarro, pois a intenção da
mensagem é compreendida até por aqueles que não conhecem o sistema canônico. Eles apenas
idealizaram suas leis sociais por intermédio de símbolos.
3. Uma flexibilização canônica?
Ao lermos os dois capítulos anteriores verificamos que o período amarniano foi
representado com mais liberdade estilística. O faraó tinha consciência de que a mensagem visual
tinha um grande poder sobre seu povo, e se a mudança religiosa não fosse representada em obras
não teria o impacto que o poderoso almejava.
Liberdade estilística não quer dizer mudança total de conceitos, pois mudar um conceito é
recriá-lo, e assim surge a necessidade de mudar o meio. Akhenaton apenas organizou seu meio
73
com seus ideais, pois se houvesse uma mudança canônica o povo não entenderia as novas idéias.
Lembremos que o estilo egípcio durou séculos e que as regras serviam para ligar os vivos e os
mortos.
A liberdade consistia em apresentar o que já existia, porém com mais naturalidade,
mostrar o real não alteraria um cânone, só o apresentaria diferente, mas seu significado seria o
mesmo.
Ao observarmos obras do período amarniano conseguiremos encontrar subsídios que
comprovam que não houve mudanças drásticas.
Akhenaton trabalhou sua própria imagem para promover seu novo deus. Sua curta
história como faraó pode ser compreendida nessas peças. Mais a frente, analisaremos
visualmente 10 imagens com vários níveis de liberdade canônica em que o rei estará presente.
4. Análise da história de Akhenaton
Depois de muita teoria e exemplos sobre a influência de Amenófis IV, ou melhor,
Akhenaton, na história do Egito Antigo, vamos analisar 10 imagens do faraó. Cada imagem será
lida visualmente, comentada e concluída. A fundamentação teórica terá como base as obras
Gestalt do Objeto, de João Gomes Filho; Arte e Percepção Visual, de Rudolf Arnheim e
Universos da Arte, de Fayga Ostrower.
74
Estas obras falam sobre a forma do objeto e como observá-lo e entendê-lo no contexto
histórico e atual. São obras abrangentes que partem do princípio do reconhecimento do objeto e
do conteúdo prévio do observador, e assim, depois desse primeiro contato, começar uma leitura
visual comparativa.
Ostrower (1996, p. 61) comenta exatamente a intenção da análise proposta neste trabalho:
Ao apreciarmos uma obra de arte, procuramos entender o seu conteúdo expressivo a
partir da forma global da imagem. Como vimos, essa forma de espaço, forma
estruturada, é um dado objetivo para todos. É ela que contará os possíveis significados
da obra e, também, o leque de possíveis interpretações que serão dadas, de acordo com a
personalidade e a experiência de vida de cada um.
As 10 imagens apresentadas à seguir foram escolhidas através de um critério simples que
consiste na leitura visual com alta pregnância, isto é, mais clareza na composição da imagem.
Gomes Filho (2000, p. 104) explica melhor o que é pregnância da forma:
Pregnância da Forma: que é a lei básica de percepção visual: as forças de organização
da forma tendem a se dirigir tanto quanto o permitam as condições dadas, no sentido da
harmonia, da ordem e do equilíbrio visual.
Com isso, as imagens escolhidas da representação do faraó mostram conceitos básicos
que permitem uma leitura direta e precisa, em que as características históricas estudadas nos
capítulos anteriores serão encontradas e que levarão a uma conclusão sobre o que realmente
aconteceu no estilo egípcio no reinado de Akhenaton.
Agora vamos visualizar os pensamentos do Faraó Akhenaton...
75
IMAGEM N. º 01
ESTÁTUA COLOSSAL DE AKHENATON
Procedência: Tell El Amarna – XVIII Dinastia
Arenito com traços policrômicos: 4 metros
Museu do Cairo, Egito
Fonte: MONDADORI, 1969, p. 106.
76
77
Esta figura inicia nossa análise por sua total harmonia de execução. Originalmente a
simetria foi respeitada conforme os padrões canônicos anteriores ao reinado de Akhenaton. Se
colocarmos uma linha vertical, cortando ao meio a escultura, teremos uma simetria perfeita até
mesmo no cartucho com o nome do rei, localizado na cintura.
Hoje, a leitura visual desta peça está prejudicada pela falta do braço esquerdo da obra. Há
uma assimetria evidente na figura, mas depois compreende-se que o único detalhe assimétrico
encontra-se no cetro que ficava ao lado esquerdo e que quebrou-se.
A composição da massa trabalhada foi organizada para mostrar tanto o humano quanto o
soberano. No cânone egípcio antigo o poder era simbolizado pela grandeza da pedra esculpida e
pelos detalhes geometrizados, criando uma imagem artificial e ideal. Mesmo que a pessoa
“retratada” fosse gorda, ou baixa, ou com o rosto fino, sua composição não apresentaria essas
características reais.
Nesta primeira leitura encontramos uma mudança no estilo egípcio. A geometrização
permaneceu, mas o faraó foi representado com suas prováveis características físicas. Seu ventre
avantajado, rosto fino, lábios largos e olhar asiático foram trabalhados para retratar uma
onipotência serena junto com os símbolos de poder antigo. Os cartuchos em sua roupa e
acessórios foram espaçados para facilitar a leitura à qualquer pessoa que olhasse a estátua.
Conclui-se que nessa obra o intuito seria apresentar ao povo o verdadeiro perfil do faraó,
porém não descartou-se a grandeza canônica antiga para formatar a escultura. Essa peça resume
uma estabilidade no reinado egípcio, pois Akhenaton está “posando” com um olhar sério e
calmo. Nota-se o trabalho de divulgação das novas idéias realistas do soberano, diferenciando-se
das peças anteriores a dinastia XVIII, mas não rompeu a intenção original, isto é, mostrar um
novo rumo ao Egito.
78
IMAGEM N. º 02
ESTÁTUA COLOSSAL DE AKHENATON
Procedência: Tell El Amarna – XVIII Dinastia
Arenito: 3.10 metros
Museu do Cairo, Egito
Fonte: DAUMAS, 1972, p. 352.
79
80
Esta, também, é uma estátua grandiosa de Akhenaton que tem dimensões um pouco
menores que a figura anterior analisada.
O arenito trabalhado apresenta muitas falhas por causa da conservação da obra, falta o
nariz, a coroa e as pernas da estátua. Nesta peça, como na imagem 01, temos apenas a massa do
joelho para cima, sabe-se que provavelmente seria o corpo inteiro representado, mas
encontramos nas junções desses joelhos uma “quebra” na leitura visual.
Observando o faraó encontramos uma complexidade de massa, isto é, por causa da
deterioração (detalhes quebrados) a leitura fica prejudicada e precisa-se de um certo tempo para
compreender a imagem. Há harmonia, clareza, simetria e os cânones antigos continuam
presentes com a organização dos cartuchos nos braços, cintura, pulsos e colar. Mas a peça
diferencia-se da imagem 01 por um importante detalhe: A divisão em duas massas (a
“trabalhada” e a “lisa”).
O corpo apresenta-se inovado da cintura aos joelhos, não há roupa e a peça apresenta-se
no sexo feminino. Muitos pesquisadores aceitam a hipótese de androginismo, pois nos ideais da
religião atoniana o homem e a mulher são um só, assim o rei e a rainha estariam unidos nesta
imagem. Já outros acham que a peça poderia representar a rainha Nefertiti que tornou-se faraó
após a morte do marido.
Conclui-se que a mensagem visual pretendida pelo faraó visava em mostrar a
grandiosidade de seu poder junto com as novas idéias do deus solar. O conteúdo canônico
situado na parte de cima da escultura mostra a permanência dos conteúdos antigos na
composição, porém a parte debaixo é completamente nova; sai a geometrização e entra o
volume. A ousadia da representação feminina demonstra que as vontades de Akhenaton
começavam a dominar suas obras, porém não influenciavam completamente o trabalho visual.
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IMAGEM N.º 03
AKHENATON COM UMA BANDEJA DE OFERENDA
Procedência: Tell El Amarna – XVIII Dinastia
Calcário colorido sobre base de alabastro: 40 cm
Museu do Cairo, Egito
Fonte: MONDADORI, 1969, p. 109.
82
83
Aqui temos uma imagem comum para uma primeira leitura, o objeto está bem disposto
em sua base, seu volume foi distribuído uniformemente, há simetria na unidade trabalhada e
clareza nos detalhes.
Encontramos Akhenaton segurando uma bandeja. Os acessórios usados pelo jovem não
pertencem mais a obra, provavelmente foram roubados a parte frontal da coroa e a áspide (cobra
uraeus que adorna a coroa). Com esses acessórios teríamos uma escultura do faraó com seus
símbolos de realeza e com roupas cotidianas, ambos dialogando com a situação representada que
seria um cerimonial de oferendas.
Como sabe-se, os cânones egípcios determinavam, para uma estátua humana, que a cor
da pele seria clara para as mulheres e avermelhada para os homens. Nesta peça, o rei está com a
sua pintura clara (amarelo ocre), saindo do padrão antigo. Também temos uma diminuição na
base da composição, isto é, os pés de Akhenaton estão juntos e ocupando um espaço menor. A
posição junta para as pernas e pés era canônica para mulheres, e os homens tinham seus pés a
meio passo para dar equilíbrio a massa e mostrar que o faraó “estava um passo à frente de seu
povo”.
Seguindo o raciocínio da imagem 02, vemos que o tema “andrógino” se repete.
Akhenaton foi apresentado com vestimentas reais e comuns ao mesmo tempo, suas
características físicas ficaram mais evidentes, seu rosto, pés e barriga são reais, mostrando um rei
de estatura média. O peito está “tapado” com a bandeja à frente, mas dando a evidência de
possuir seios. A cor clara da pele com os pés juntos conclui a imagem de um “ser duplo”, pois
resume o poder unificado idealizado pelo rei. Encontramos símbolos de poder, de simplicidade,
de masculinidade e de feminilidade em uma só peça. Provavelmente Akhenaton pensou nessa
possibilidade de divulgar seu deus único em uma simples estátua de apenas 40 cm.
84
IMAGEM N.º 04
FARAÓ AKHENATON BEIJANDO PROVAVELMENTE SEU
CO-REGENTE
Procedência: Tell El Amarna – XVIII Dinastia
Calcário inacabado: 42 cm
Museu do Cairo, Egito
Fonte: MONDADORI, 1969, p. 113.
85
86
A primeira característica que deparamos ao olhar essa peça é que ela não está finalizada.
A proporção e o movimento da ação estão definidos, assim percebemos que trata-se de uma
criança no colo de um adulto. Há uma pregnância forte nesta obra e mesmo com difusidade
conseguimos imaginar seu provável resultado.
Essa estátua tem características de construção antiga, pois a sua organização é canônica.
O rei está sentado no trono em uma posição rígida. Seu corpo segue o desenho do assento,
formando uma única massa. Ao olharmos para a criança encontramos o mesmo esquema usado
no faraó, o corpo segue uma linha e nos pés há um apoio que une o objeto a base.
A análise poderia terminar aqui e concluirmos que nesta figura não houve inovação na
comunicação visual. Mas não foi na parte visual que houve uma diferenciação canônica, mas sim
na mensagem da obra, a ação, o gesto de carinho demonstrado é explícito, esse tipo de atitude
não era representado com freqüência. “Canonicamente” demonstrações de afeto tinham uma
certa distância entre as partes envolvidas na cena.
Conclui-se que nesta peça o lado humano do faraó necessitava divulgação, e nada melhor
para simbolizar isso do que apresentar um gesto simples do cotidiano familiar. Aqui temos uma
criança que pode ser uma de suas filhas ou seu co-regente Sementhkare; não importando quem
seja, o que é relevante é o sentimento divulgado, o rei precisava registrar sua realidade, e nesta
obra trabalhou a imagem canônica para simbolizar uma idéia humana.
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IMAGEM N.º 05
PERFIL DE AKHENATON
Procedência: Tell El Amarna – XVIII Dinastia
Calcário: 15.3 x 11.2 x 3.3 cm
Agyptisches Museum und Papyrussammlung, Berlin
Fonte: GORE, 2001, p. 54.
88
89
Temos aqui um fragmento de um relevo em que representado está a face de um homem
de perfil. Esta placa, mesmo sendo uma parte do relevo, tem uma leitura rápida por possuir um
fator de fechamento bem definido. A sensação sensorial conduz nossos olhos a observar a figura
inteira e compreendermos facilmente sua forma.
Trata-se de um baixo relevo de Akhenaton em que a composição foi organizada com
conceitos canônicos. Podemos observar que o faraó encontra-se de perfil, seus olhos apresentam
a característica do estilo egípcio de permanecerem na posição frontal, e seu rosto volta-se para à
direita (como na maioria das representações egípcias antigas).
Esta peça é uma das mais diferenciadas do estilo amarniano. Ela destaca-se pelo seu
estilo natural, duas características físicas estão evidentes nela: uma linha de expressão acima dos
lábios e um prolongamento no pescoço, com uma leve curva. São pequenos detalhes que
deixaram a figura com mais realidade, aproximando o faraó da figura humana real.
Sabemos que as características físicas de Akhenaton, provavelmente, somam conteúdos
Africanos e Asiáticos, nisso, seus lábios e queixo estariam evidenciando esses traços estrangeiros
na composição do rosto.
Essa é a primeira imagem bidimensional dessa análise. Como já visto nas imagens
anteriores, não foi abolido o estilo antigo. Aqui, o rei é apresentado onipotente e com sua real
face.
Com as proporções liberadas, conclui-se que Akhenaton começara a expandir a idéia de
“iluminar” seus aspectos físicos para divulgar o princípio do real, que é revelado com a luz solar.
Se o rei era um exemplo de realidade revelada, seu povo veria Aton (Sol) como uma força além
da criação que recriaria, todos os dias, a vida a cada amanhecer.
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IMAGEM N.º 06
OFERENDA REAL A ATON
Procedência: Tell El Amarna – XVIII Dinastia
Relevo em calcário: 1.04 metros
Museu do Cairo, Egito
Fonte: DAUMAS, 1972, p. 353.
91
92
Neste relevo nos deparamos com muitas informações complexas que causam uma
profusão de elementos. A cena que vemos é de pessoas segurando objetos em uma só direção.
Neste ambiente encontram-se outros objetos como mesas, flores e símbolos gráficos por toda a
extensão bidimensional. Há, também, um disco à direita com linhas que terminam em mãos.
Na verdade esta gravura mostra um momento religioso voltado a Aton. Akhenaton e sua
família adoram o Disco Solar. Esta cena tem características canônicas e criações feitas à partir da
origem antiga.
O rei é representado maior do que as outras personagens, mas está abaixo do Sol, assim,
seu grau de importância é apenas menor do que a divindade solar. Aton encontra-se no canto
superior direito da cena e com uma talha profunda, destacando-se quando fazemos nossa
primeira leitura visual da peça.
Essa narrativa é curiosa por causa do grau de elementos trabalhados para simbolizar a
mensagem que o faraó pretendia difundir. Compreende-se que a base canônica está em toda
cena, os hieróglifos permanecem na sua função de completar o espaço com seus dizeres
sagrados, a ordenação dos móveis e objetos continuam trabalhados em perfil, como também o
faraó e sua família.
A curiosidade aparece nos novos elementos que dialogam com os antigos símbolos. O
Sol apresenta-se de frente, junto com a cobra uraeus. Essa frontalidade muda nos raios solares
que têm mãos de perfil, que abençoam a família real, e algumas seguram o símbolo da vida
(Ankh ou Akh).
Akhenaton aparece com suas curvas físicas, seu corpo tem o formato idêntico a suas
esculturas, mesmo estando de perfil o resto da massa corporal segue um tema natural. A
frontalidade do tronco está liberada e agora vemos uma barriga compondo, juntamente com as
93
pernas, um movimento natural. O tórax e as mãos seguem o padrão antigo, mas seu rosto
apresenta um queixo pontudo e olho asiático.
Conclui-se que neste relevo há indícios de que a intenção do faraó era apresentar suas
idéias religiosas de uma forma básica, e incluindo sua família ele pôde acrescentar aos símbolos
os novos conceitos “Atonianos”. Ele também apresentou o deus único, que tinha o faraó como
seu intermediário direto na Terra.
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IMAGEM N.º 07
O FARAÓ AKHENATON E SUA FAMÍLIA ADORANDO O
DEUS ATON
Procedência: Tell El Amarna – XVIII Dinastia
Relevo em calcário com traços coloridos: 48 x 51 cm
Museu do Cairo, Egito
Fonte: MONDADORI, 1969, p. 108.
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96
Nessa obra a profusão de elementos é muito elevada, necessitando uma leitura lenta dos
detalhes. Temos mais um relevo em que nos deparamos com pessoas levantando plantas em
direção ao Sol. Este trabalho tem traços de pintura e marcas da malha quadriculada usada para
desenhar o relevo. O tema parece ser o mesmo da imagem 06, mas quando paramos para
observá-lo um pouco mais encontramos detalhes diferentes.
Na verdade esta cena é parecida com a anterior, mas aqui temos a adoração a Aton e não
um ritual de oferenda real. Akhenaton está com a coroa real e a pele escura, já a rainha Nefertiti
está com a coroa da deusa Hathor e com a pele clara. Nas mãos dos dois há flores de papiro
sendo apresentadas à divindade.
Outra situação diferente nesta peça é a de que os raios de Aton aparecem sobrepostos aos
papiros que estão na mesa, do lado direito da figura. Esta característica estilística egípcia é rara,
porém a sua execução no período amarniano é aceitável, pois passa a sensação de “iluminação”
direta do objeto.
Na figura, Akhenaton não está com os cartuchos reais pelo corpo, sua imagem está mais
limpa, evidenciando seus seios e cintura. Fica clara a idéia de “androginismo” do faraó, pois sua
aparência é feminina e sua cor e estatura são masculinas.
Conclui-se que a cena apresentada mostra o cotidiano que Akhenaton desejava a cidade
de Akhetaton. A adoração teria uma conotação simples, uma rotina a ser seguida além dos
cultos. A apresentação do rei é mais serena e sua estatura em relação à rainha tem uma diferença
menor. Nisso, o faraó tentou enunciar nesse relevo um momento de mudanças mais radicais em
relação ao comportamento dos egípcios, em que a tentativa de união religiosa seria o tema
trabalhado.
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IMAGEM N.º 08
AKHENATON E SUA FAMÍLIA
Procedência: Tell El Amarna – XVIII Dinastia
Calcário pintado: 31 x 39 cm
Staatliche Museum, Berlin
Fonte: CULTURA EGÍPCIA ANTIGA, 2002, p. 44
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Este relevo apresenta uma segregação em que temos 3 núcleos, a pessoa da esquerda, a
pessoa da direita e o disco no centro superior. É uma peça harmoniosa com uma ordem que leva
ao equilíbrio quase simétrico. A cena mostra uma família sentada recebendo raios solares com
pequenas mãos no fim de cada raio.
Nesta estela temos Akhenaton à esquerda e Nefertiti à direita, com suas filhas sendo
abençoados por Aton. A imagem é limpa e seus detalhes estão distribuídos uniformemente,
deixando as personagens com mais destaque na leitura visual.
Os elementos canônicos foram retrabalhados e evidenciam uma novidade: o rei e a rainha
estão no mesmo nível visual. A cena mostra uma interação direta dos nobres, a representação
tem movimento; Akhenaton segura a filha, a beija e apóia sua cabeça; Nefertiti apóia a outra
filha no colo e ainda segura a sua mão. O Disco Solar e o seu uraeus são os únicos elementos da
cena que estão de frente. Aqui, os cânones e os elementos criados não ficaram segregados, na
realidade eles somaram uma nova realidade pregada pelo faraó, isto é, igualar a rainha a ele.
Esta estela é um exemplo de marketing pessoal. Sua leitura é muito clara, os atributos
físicos das personagens têm um grau de naturalidade muito elevado, e contém uma informação
importante que passa despercebida mesmo que fiquemos olhando por mais tempo a imagem: a
ação das filhas.
As três meninas apontam para lugares diferentes, a menina que está com o rei aponta para
a rainha, a que está no colo da mãe aponta para o pai e a filha menor, que está no ombro de
Nefertiti, além de olhar para Aton ainda o aponta.
Concluímos que, nesta situação, a mensagem de Akhenaton está atribuída a suas filhas.
Elas mostram os 3 Senhores da religião “atoniana”, esta tríade reflete o poder maior (Aton) e
seus representantes masculino (Akhenaton) e feminino (Nefertiti) na Terra.
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IMAGEM N.º 09
AKHENATON COMO UMA ESFINGE
Procedência: Tell El Amarna – XVIII Dinastia
Calcário: 51 x 105.5 x 5.2 cm
Museum of Fine Arts, Boston
Fonte: <http://www.mfa.org/egypt/amarna>
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Ao primeiro olhar temos uma segregação das duas formas destacadas neste relevo. O Sol
à esquerda está longe do “leão-humano” à direita. A aproximação das duas massas ocorre por
causa dos raios solares (linhas) que tocam ambas as formas. Mesmo distantes, elas mantém o
equilíbrio da peça, nossos olhos percorrem toda a ação.
Este relevo é bem simples, pois a sua execução é mais voltada ao cânone antigo. A
posição da esfinge, segurando uma oferenda de cartuchos a Aton, dá a sensação de inexistência
de criação, pois a cabeça de Akhenaton está posicionada como no estilo antigo e seu perfil está
mais geométrico, lembrando um leão.
Mas o Disco Solar e a mão da esfinge, recebendo a benção, mostram que a peça segue as
indicações criativas de Akhenaton, ele substitui as patas dianteiras por braços humanos,
deixando o leão apoiado pelos cotovelos.
Concluímos que o faraó não precisou abolir o estilo antigo para obter formas inovadoras.
Este relevo é uma prova de que o rei tinha seus costumes antigos presentes e se colocou como
um símbolo que já existia no panteão egípcio, mas estilizou o resultado da mensagem.
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IMAGEM N.º 10
ESBOÇO DO ROSTO DE AKHENATON
Procedência: Tell El Amarna – XVIII Dinastia
Calcário: 11.6 x 13.8 x 2.3 cm
Brooklyn Museum of Art, New York
Fonte: <http://www.mfa.org/egypt/amarna>
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Aqui temos um desenho de linhas rápidas em uma placa de pedra. Este fragmento
também contém o desenho de uma mão segurando algo, no lado direito da peça.
Na verdade temos um esboço de um relevo em que Akhenaton seria representado. Em
uma primeira leitura encontramos uma boa pregnância da forma. As linhas são bem definidas
proporcionando uma boa leitura da cena, há clareza mesmo com a irregularidade do suporte.
Com isso, temos uma obra com alto grau de minimidade, isto é, apenas o essencial e com
espontaneidade.
O ruído visual, isto é, a mão que aparece nesta imagem, contribuiu para equilibrar o
desenho, pois ocupou um lugar que ficaria vazio, mas originalmente poderia ser a mão de um
funcionário real abanando o faraó.
Esta última imagem é apenas uma curiosidade sobre o sistema de representação do faraó.
Temos um desenho sem trabalho algum e podemos ver a composição da face do rei. Tivemos
estátuas e relevos, e olhando um desenho finalizamos a compreensão da imagem do Faraó
Akhenaton, que usou sua própria imagem para divulgar seu ideal solar.
106
CONSIDERAÇÕES FINAIS
107
Akhenaton foi um faraó que reinou por 17 anos, através de seus estudos e convívio
familiar formatou-se em sua mente um reino ideal, em que sua busca consistia na imagem real.
O contato com os sacerdotes de Amon fez o faraó pensar sobre o futuro de seu reinado.
Ele não foi uma pessoa rebelde, não houve revolta, nem suas atitudes foram radicais. Como todo
faraó, ele impôs seu poder conforme a resposta de seu povo. Ele não foi o primeiro nem o último
a ter atitudes severas quando o controle do país apresentava sinais de fragilidade social ou
religiosa. Ele começou a reinar em um momento em que o grupo religioso de Amon
demonstrava uma influência exagerada no controle do panteão religioso egípcio, e o faraó não
gostava desse domínio.
A diferença de seu reinado foi a construção simbólica adotada, a intenção era unir os
grupos religiosos, pois todos os egípcios sabiam que o mundo fora criado por uma entidade única
e dela surgiram outras conforme as cidades cresciam.
Aton não foi um deus inventado, ele foi criado com os conceitos já existentes no mundo
egípcio, Amon e Aton eram divindades que correspondiam ao Sol, assim a substituição seria
simbólica e não conceitual. Apenas houve uma unificação de qualidades espirituais que
somariam e fariam parte da construção do período do reinado de Akhenaton.
Ostrower (1996, p. 321) escreveu sobre o estilo amarniano: “A interrupção estilística não
ultrapassou vinte anos”, porém, provavelmente, não ocorreu essa interrupção, nas imagens
analisadas, neste trabalho, ficou claro que todas elas tinham conteúdos canônicos. Vimos que as
mensagens partiam de um conceito existente e depois apareciam novos detalhes que estilizavam
as obras.
108
Se essa interrupção estilística tivesse ocorrido não veríamos Akhenaton com a dupla
coroa, nem com os cartuchos 19 reais, nem com a posição real (com os braços cruzados). As
imagens respondem por si.
Akhenaton partiu de um princípio de criação que pode ser explicado melhor nesse trecho
de Arnheim (1986, p. 41):
Toda experiência visual é inserida num contexto de espaço e tempo. Da mesma maneira
que a aparência dos objetos sofre influência dos objetos vizinhos no espaço, assim
também recebe influência do que viu antes. Mas admitir estas influências não é dizer
que tudo que rodeia um objeto automaticamente modifica sua forma e cor, ou leva o
argumento ao extremo de que a aparência de um objeto é apenas o produto de todas as
influências exercidas sobre ele. Tal visão aplicada às relações espaciais seria um
absurdo evidente, e todavia tem sido com freqüência aplicada a relações de tempo. O
que uma pessoa vê agora, segundo nos disseram, é somente o resultado do que viu no
passado.
A união que o faraó tanto almejava ocorria dentro de sua família. O convívio de
Akhenaton com Nefertiti e suas filhas era intenso e caloroso (temos registros desta afirmação na
imagem n.º 08). O soberano divulgou sua família, mostrando união, para exemplificar o
princípio Atoniano a seu povo.
Jacq (1978, p. 105) escreveu um trecho que confirma o parágrafo anterior:
“Tão verdadeiro que meu coração se compraz com a rainha e seus filhos”, diz uma
fórmula de juramento criada por Akhenaton. Ela resume maravilhosamente o gosto de
Akhenaton pela intimidade familiar e a doçura da vida conjugal; o que nos parece, hoje
em dia, ser lógico, naquela época constituía uma incrível renovação para a arte
faraônica.
Antes da época de Akhenaton, a família real era considerada como o modelo duma
dignidade sagrada donde estão excluídos familiaridade e sentimentalismo. Akhenaton
não nega seus antigos valores, mas ele metamorfoseia seu meio de expressão; posto que
a família é efetivamente sagrada, por que não mostrar o amor dum esposo por sua
esposa, dum pai por seus filhos?
19
Cartucho é uma moldura oval que os egípcios escreviam, dentro dela, os nomes dos reis.
109
Com essa divulgação o faraó queria construir uma sociedade aberta a esse tipo de visão
estilizada, que tinha seu rei como intercessor e símbolo vivo de Aton. As atitudes de Akhenaton
o transformaram no “símbolo vivo da vida” que era iluminado pelo deus único e que foi
escolhido para fazer um “marketing pessoal”, ou seja, divulgar uma nova ordem de
representação visual flexível.
Akhenaton reordenou o Egito e fez de Akhetaton o maior símbolo construído para Aton.
Sua história foi admirada por vários líderes através dos anos, entre eles, Juscelino Kubitschek 20 ,
que nos seus estudos em Diamantina – MG conheceu a história do faraó, e anos depois comparou
a história de Akhetaton com a construção de Brasília. Para JK, o rei construiu uma nova capital
para seguir um novo conceito, e ele, como presidente, estava construindo uma cidade para as
futuras gerações. Brasília, como Akhetaton, é um símbolo de poder e de inovação e virou até
livro: A Brasília Secreta, de Iara Kern e Ernani Pimentel; pesquisa que compara lugares e
prédios de Brasília com o Egito Antigo e faz uma outra comparação entre Akhenaton e JK.
Com o desaparecimento desse faraó sua obra foi excluída, sua cidade abandonada e seu
deus esquecido. A vida do Egito continuou como se os 17 anos de reinado de Akhenaton não
tivessem ocorrido. A liberdade canônica voltou ao seu formato de regras e o país voltou a adorar
Amon. Mas nem todos os registros foram destruídos, muitos objetos estão em museus, ao redor
do mundo, e alguns registros estão em tumbas de Tell El Amarna e em outras cidades egípcias.
Esse homem histórico ficou conhecido como louco, herético e fundador do monoteísmo,
mas sua contribuição foi na Arte, sua visão foi inovadora para seu tempo e concluímos que não
20
Juscelino Kubitschek de Oliveira, político brasileiro (Diamantina MG 1902 – Resende RJ 1976). Foi telegrafista
dos Correios de Belo Horizonte; formou-se em medicina; participou da frente de batalha na Revolução de 1932; foi
deputado federal; foi prefeito de Belo Horizonte (1940-1945) e em 1956 começou a governar o Brasil. Como
presidente construiu a nova capital do país, Brasília e ficou conhecido pelo slogan: “Era JK” e “50 anos em 5”. Seu
plano de metas previa ações de infra-estrutura, incentivos fiscais e busca de investimento externo para a
industrialização do país. (LASSANCE, 2003, p. 69)
110
houve uma ruptura do estilo egípcio, a abolição tão relatada em livros de Artes e História não se
confirma nas imagens em que o próprio faraó se representou, neste trabalho, não encontramos
indícios de ruptura em nenhuma de suas obras.
Como dito antes, “a imagem diz tudo”. Lendo visualmente todas as imagens encontramos
a resposta da pergunta feita na introdução deste trabalho: “Pergunto se a comunicação
organizada por ele (Akhenaton) constituiu-se ou não num momento de abolição ou não dos
rígidos cânones artísticos do Egito Antigo”.
Então, aqui, temos uma resposta direta sobre essa pesquisa: Ao lermos visualmente as
obras de Akhenaton (esculturas, relevos, desenhos e objetos) e lermos seus poemas
entenderemos que ele usou seus conteúdos antigos para formar uma simbologia de divulgação de
uma nova religião. Ele pegou os cânones restritos e os transformou em obras de arte naturalistas.
111
BIBLIOGRAFIA
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Grande Hino a Aton:
"Tu surges belo na terra de luz do paraíso
Ó Aton vivo, que dá vida.
Quando nasces ergues no horizonte oriental
Enches todas as terras com a tua beleza
Tu és belo, grande resplandecente,
Sublime sobre todas as terras o país;
Os teus raios abraçam e iluminam as terras
Até o limite de tudo o que criastes.
Sendo Rá alcanças os seus limites e os subjugas para teu filho amado.
Tu estás longe, mas os teus raios encontram-se sobre a terra,
Apesar de vê-lo seu caminho é oculto
Tu estás diante de nós, mas as pessoas não vêem o teu caminho.
Quando tu te pões na terra ocidental,
A terra fica na escuridão como morta.
Os que dormem encontram-se em suas casas,
As cabeças cobertas, um olho não vê o outro.
Se roubassem seus bens que se acham debaixo de suas cabeças,
Eles nem perceberiam.
Todos os leões saem de suas cavernas,
Todas as serpentes mordem.
A escuridão é uma tumba
Para eles claridade.
Jaz a terra em silêncio.
Seu criador repousa na sua terra de luz no horizonte.
Na aurora tu reapareces no horizonte.
E és irradiante como o disco solar do dia (Aton)
Tu eliminas as trevas e lanças teus raios.
As duas terras estão em festa.
As pessoas acordam e ficam de pé.
Tu as fizeste levantar.
Eles banham-se e vestem-se,
Os seus braços estão em adoração à sua feição.
A terra inteira se põe a trabalhar.
Todo animal goza de sua pastagem,
Árvores e relvas brotam e verdejam.
Os pássaros voam de seus ninhos,
Com as asas levantadas para teu ka
Todos os rebanhos ágeis estão sobre os seus pés,
Tudo que se levanta e voa, parte,
Tu nasces para eles.
Os barcos seguem para o norte, seguem para o sul também,
Todos os caminhos se abrem quando tu surges.
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Os peixes no rio arrojam-se diante a ti movem-se deslizando em tua direção,
Os teus raios chegam ao meio do mar.
Tu fazes crescer a semente na mulher,
Tu fazes o sêmem nos homens,
Tu fazes viver o filho no ventre da mãe,
Tu o acalentas para que não chore,
Tu o alimentas no ventre!
Dás a respiração, para alimentar tudo o que ele faz.
Quando sai do ventre para respirar, no dia de seu nascimento, abre-lhe a boca e Provês as suas
necessidades.
O pássaro fala dentro da casca do ovo;
Tu ali dentro lhe dás ar para viver.
Determinas um tempo para ele sair do ovo;
Quando ele sai do ovo, para piar, ao seu nascimento, já caminha em suas pernas.
Quão numerosas são as tuas obras!
Apesar de ocultas à vista, Ó Deus Único ao lado do qual não há outro!
Tu criaste a terra ao teu desejo, Quando tu estavas só,
Com os homens, as manadas, e as revoadas dos pássaros.
Tudo o que há sobre a terra e anda sobre seus pés,
Tudo aquilo que está no céu e que voa sobre suas asas.
Os países estrangeiros, da Síria, e Núbia, a Terra do Egito.
Tu colocaste todo homem em seu lugar,
Proveste as suas necessidades, cada um com o seu alimento,
É contada sua duração de vida .
Suas línguas diferem no falar, suas características também;
Suas peles são distintas, pois tu diferenciaste os povos.
Fizeste um Nilo no subterrâneo,
Tu o trazes quando queres, para dar sustento às pessoas,
Pois tu as criaste para ti.
Senhor de tudo, que trabalhas por eles,
Senhor de todas as terras, que brilha para eles,
Ó Aton do dia, grande em glória!
De todas as terras distantes, tu os mantêm vivos,
Fizeste um Nilo celestial, que desce para eles,
E que faz ondas nas montanhas como um mar,
E banha os seus campos com o que eles necessitam.
Quão perfeitos os teus planos, Ó senhor da eternidade!
Um Nilo do céu para os estrangeiros,
E para todas as criaturas no deserto que caminham sobre pernas,
Mas para o Egito, o Nilo que vem de Duat.
Os teus raios trazem a nutrição para todas as plantas;
Quando tu brilhas, elas vivem e prosperam para ti.
Tu fazes as estações para que se desenvolva tudo o que tu crias:
O inverno para refrescá-las, o ardor para que te degustem.
Tu fizeste o céu distante, para brilhar nele.
Para ver tudo que fazes, enquanto tu és Um,
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Nascido em sua forma de Aton vivo,
Brilhante e radiante, próximo e distante.
Tu fazes milhões de formas de ti, sozinho,
Povoados, vila, campos, estrada e rio.
Todos os olhos o contemplam acima deles,
Quando tu estás acima da terra como, Aton.
Quando tu vais e não há olho cuja visão tu criaste,
não para olhar para ti como só mais uma de suas criaturas.
Tu estás ainda em meu coração.
Não há nenhum outro que te conheça
Exceto teu filho, Nefer-kheperu-Rá Ua-en-Rá Akhenaten,
A quem ensinastes.
A terra passa a existir por tua mão como tu a criaste,
Quando tu alvoreces, eles vivem, quando tu te pões eles morrem;
Tu mesmo és vida - se vive de ti.
Os olhos vêem beleza, enquanto tu não te pões.
Deixa-se todo o trabalho quando tu descansas no Ocidente;
O teu alvorecer é um fortalecimento para o Rei,
E todos movem-se desde que fundastes a terra.
Tu os levantas para o teu filho que saiu do teu corpo
O rei que vive pela verdade (Ma’at), o Senhor das duas terras,
O Senhor dos Dois Países Nefer-kheperu-Rá
O único de Rá, o filho de Rá que vive pela verdade (Ma’at),
O Senhor das duas coroas Akhenaton, Sublime em sua vida
E da Grande Rainha a quem ele ama,
A Senhora das Duas Terras Nefer-neferu-Aton Nefertite,
Que vive e rejuvenesce por toda a eternidade"
Fonte: http://geocities.yahoo.com.br/soldeamarna/index.htm
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Pequeno Hino a Aton:
"Oh Aton vivente, Senhor da Eternidade, és esplêndido quando nasces!
És resplandecente, perfeito, poderoso.
Teu amor é grande, imenso.
Teus raios iluminam todos os rostos, teu brilho dá vida aos corações quando enches as Duas
Terras com teu amor.
Deus que se formou a si mesmo, que cria cada terra e as coisas que nela existem, homens,
rebanhos, animais e de todos os tipos de árvores que crescem sobre a terra.
Eles vivem enquanto tu brilhas sobre eles.
Tu és a mãe e o pai de tudo que criaste.
Quando nasces, seus olhos te contemplam.
Teus raios iluminam toda a terra.
Todo coração bate mais forte à tua vista, pois tu nasces como seu Senhor.
Quando te pões no horizonte do ocidente, eles repousam como se estivessem mortos.
Suas cabeças estão cobertas, suas narinas sem ar, até que voltas a brilhar na região oriental do
horizonte.
Então seus braços se erguem em adoração ao teu Ka; tu alimentas seus corações com tuas
benesses.
Quando resplandeces, todos os lugares ficam em festa.
Homens e mulheres cantam de alegria no pátio da Capela de Benben e em todos os templos da
cidade de Akhetaton, o Lugar da Verdade em que seu coração se regozija.
Nos seus interiores se oferecem alimentos.
Teu filho é santificado por suas preces, oh Aton vivo, quando apareces nas procissões.
Todas as criaturas que criaste pulam de alegria diante de ti.
Teu venerável filho regozija-se, oh Aton vivo, que surge no céu diariamente!
Seu venerável filho Wa en Ra.
O filho de Ra não para de exaltar tua perfeição. Neferkheperure, Wa en Ra.
Eu sou teu filho para te servir e exaltar teu nome.
Tua força e teu poder estão firmes em meu coração.
És o Aton Vivo e a tua emanação é eterna.
Tu criaste os céus longínquos para brilhar nele e vigiar toda a tua criação.
És o Uno mas existem milhões de partículas de vida em ti.
Para fazê-las viver, insuflas sopro de vida em suas narinas.
Ao ver seus raios, os botões se abrem em flores e as plantas que surgem do solo se fortalecem ao
teu nascer.
Ao ver os seus raios, todos os animais se erguem em suas patas, as aves saem de seus ninhos
agitando as suas asas alegremente e voam em louvor ao Aton Vivo, seu criador."
Fonte: http://geocities.yahoo.com.br/soldeamarna/index.htm
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a simbologia usada na representação do Faraó Akhenaton.