PERCEPÇÃO E MOTIVAÇÕES DO CONSUMIDOR ORGANIZACIONAL SOBRE O USO DE BIODIESEL COMO UM PRODUTO ECOLÓGICO [email protected] APRESENTACAO ORAL-Estrutura, Evolução e Dinâmica dos Sistemas Agroalimentares e Cadeias Agroindustriais GISELE TRINDADE MOLINARI; NATÁLIA CARRÃO WINCKLER. UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL, PORTO ALEGRE - RS BRASIL. Percepção e motivações do consumidor organizacional sobre o uso de biodiesel como um produto ecológico Grupo de Pesquisa: Estrutura, Evolução e Dinâmica dos Sistemas Agroalimentares e Cadeias Agroindustriais Resumo O desenvolvimento de fontes alternativas na produção de energia, que sejam renováveis e que causem menor dano ao meio ambiente, é emergente. Os biocombustíveis, tal como o biodiesel, está em conformidade com este apelo, de forma que se tem buscado desenvolvêlo dentro de um paradigma de sustentabilidade. Nesse contexto, o presente estudo tem por objetivo discutir a percepção do consumidor organizacional sobre o biodiesel como um produto ecológico e as suas motivações para utilizá-lo. A pesquisa aplicou-se aos principais atores envolvidos na compra e uso do biodiesel no município de Passo FundoRS, abrangendo três diferentes segmentos de transportes (coletivo urbano, rodoviário de passageiros, e rodoviário de cargas). Diante disso, identificou-se que, apesar de considerarem o biodiesel um produto ecológico, as motivações de uso dos consumidores se relacionam às questões de comercialização com distribuidoras de combustíveis e a exigência legal de adição ao diesel comum. Os consumidores não têm clareza sobre custo, eficiência e benefícios do uso deste biocombustível e aguardam esclarecimentos de outros atores da cadeia produtiva. Palavras-chave: biodiesel; consumidor organizacional; produtos ecológicos. Abstract The development of alternative sources of energy production, which are renewable and less damaging to the environment is emerging. Biofuels such as biodiesel, is in accordance with this appeal, so it has sought to develop it into a paradigm of sustainability. In this context, this study aims to discuss the organizational consumer's perception about biodiesel as an environmentally friendly product, and their motivations for using it. The research 1 Campo Grande, 25 a 28 de julho de 2010, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural was applied to the principal actors involved in the purchase and use of biodiesel in Passo Fundo-RS, covering three different transport segments (collective urban, road passenger and road freight). Thus, it was identified that, despite consider biodiesel an ecological product, the motivations of consumers for use it is related to issues of marketing with fuel distributors and legal requirements for addition to diesel. Consumers do not have clarity on cost, efficiency and benefits of using this biofuel, and expect clarifications of other actors of the production chain. Key Words: biodiesel; customer organizational; green products; 1. INTRODUÇÃO Dentre as fontes de energia utilizadas pela humanidade, podem-se citar as fontes convencionais e as alternativas. A energia convencional caracteriza-se por baixo custo, pode causar grande impacto ambiental e possui tecnologia difundida, enquanto a energia alternativa tem o intuito de agredir menos o meio ambiente. Ainda, distinguem-se entre fontes de energia que são renováveis e as não renováveis. As fontes de energias não renováveis encontram-se na natureza em quantidades limitadas e, conforme a sua utilização, tendem a se extinguir. Este tipo inclui a energia nuclear e os combustíveis fósseis, como petróleo, carvão mineral e gás natural, os quais produzem resíduos que são nocivos ao meio ambiente. Já a energia renovável, tal como a energia solar, eólica, biomassa (bioenergia), é extraída de fontes naturais e capazes de se regenerar, além de sua produção gerar menor impacto ambiental. Atualmente, muito tem se discutido a respeito de sistemas sustentáveis de produção que coordenem as questões econômicas, sociais e ambientais. Em conformidade com essas questões, o Protocolo de Kyoto, assinado oficialmente em 1997, visa comprometer as nações industrializadas a reduzir a emissão de dióxido de carbono (CO2) e outros gases causadores do aquecimento global. Em virtude da preocupação mundial com as mudanças climáticas e com o meio ambiente, estabeleceu-se para os países participantes a meta de redução em 5,2% para as emissões até o período de 2008 a 2012 comparativamente aos níveis de 1990. A queima de combustíveis fósseis é a principal causa das emissões de gases que provocam o efeito estufa. Os combustíveis fósseis são feitos a partir de fontes esgotáveis como o petróleo, que se concentra principalmente no Oriente Médio, região de constantes conflitos políticos e onde estão cerca de 80% das reservas comprovadas no mundo. Por isso, há um cenário de incerteza sobre a oferta desta fonte de energia e instabilidade no preço, o que leva vários países a buscarem reduzir a dependência de importações deste produto. Nesse sentido, é oportuno o desenvolvimento de fontes alternativas na produção de energia, que sejam renováveis e, logo, não agridam o meio ambiente. O Brasil possui uma matriz energética com 46% de fontes renováveis, de modo que, no mundo, utiliza-se somente 15%. Este dado é significativo, o que confere destaque ao país, principalmente devido ao estímulo à agroenergia, que representa mais da metade das fontes renováveis (MAPA, 2009). 2 Campo Grande, 25 a 28 de julho de 2010, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural Assim, o presente estudo trata do biodiesel, combustível obtido a partir de biomassa, portanto uma fonte de energia renovável, que utiliza como matéria-prima óleos de origem vegetal, gordura animal, ou resíduos industriais e domésticos, assim pertencendo ao contexto da agroenergia. Desde o seu lançamento, há um apelo da mídia nacional e do governo que destacam o biodiesel como um produto ecológico, cuja adição ao diesel comum se justifica pelas vantagens comparadas aos combustíveis fósseis, como os impactos ambientais reduzidos e as políticas públicas de incentivo à produção (PADULA et al., 2007). No entanto, não há garantias de que o biodiesel tenha sido adotado pelo mercado como um produto comercial de sucesso, pois é necessário que os agentes envolvidos na sua produção, comercialização e consumo avaliem as alternativas disponíveis e tomem decisões (SLUSZZ, 2007). Dessa forma, este trabalho tem por objetivo discutir a percepção do cliente organizacional sobre o biodiesel como um produto ecológico e a sua motivação para utilizá-lo em sua frota. 1.1 Biodiesel Parente (2003, p. 13) denomina biodiesel da seguinte maneira: É um combustível renovável, biodegradável e ambientalmente correto, sucedâneo ao óleo diesel mineral, constituído de uma mistura de ésteres metílicos ou etílicos de ácidos graxos, obtidos da reação de transesterificação de qualquer triglicerídeo com um álcool de cadeia curta, metanol ou etanol, respectivamente. Um material produzido pela Petrobras (2007) também define o biodiesel, afirmando suas características de energia renovável, combustível ecológico e com diversidade de matérias-primas, além de ser um produto natural e biodegradável que gera menor emissão de monóxido de carbono e outros poluentes. Ainda, este biocombustível substitui total ou parcialmente o óleo diesel em motores de combustão, tais como de caminhões, ônibus e outros veículos, ou em motores estacionários, os que são utilizados para geração de energia elétrica. Várias são as matérias-prima que podem ser utilizadas na produção de biodiesel segundo IICA (2007) e Parente (2003), quais sejam óleos e gorduras de animais (provenientes dos matadouros frigoríficos, curtumes, obtidos pela extração com água e vapor), óleos e gorduras vegetais (originados a partir das agriculturas temporárias e perenes, obtidos por meio de extração mecânica, solvente ou mista), óleos residuais de frituras (da cocção comercial e industrial, obtidos com acumulações e coletas) e matérias graxas de esgotos (com origem nas águas residuais das cidades e de certas indústrias e o processo de obtenção está em fase de pesquisa e desenvolvimento). O processo de obtenção do biodiesel a partir de transesterificação é apresentado na Figura 1, sendo este o método de obtenção incentivado pelo governo brasileiro (SILVA; FREITAS, 2008). Para a produção do biodiesel são necessários matéria-prima, etanol ou metanol e catalisadores. A glicerina, identificada na figura, consiste em um subproduto desse processo, ao passar pela purificação está apta a ser comercializada, contribuindo para a eficiência econômica do processo de produção de biodiesel. 3 Campo Grande, 25 a 28 de julho de 2010, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural Figura 1: Processo de obtenção do biodiesel a partir do método de transesterificação. Fonte: MAPA (2007) Com relação ao custo do biodiesel, pode-se dizer que é elevado, devido à produção que ainda é pequena e questões de aperfeiçoamento do processo. Desse modo, os incentivos governamentais são relevantes para se conquistar escala de produção e difusão de tecnologias. 1.2 A adoção do biodiesel no Brasil O Plano Nacional de Agroenergia do Brasil elaborado pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), lançado em 2006, conceitua agroenergia como a energia proveniente de quatro cadeias produtivas, as quais são o etanol e co-geração de energia advinda da cana-de-açúcar, o biodiesel de fontes lipídicas (animais e vegetais), a biomassa florestal e seus resíduos, e os dejetos agropecuários e da agroindústria (IICA, 2007). Os produtos dessas quatro cadeias podem ser visualizados na Figura 2. 4 Campo Grande, 25 a 28 de julho de 2010, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural Figura 2: Matriz da agroenergia. Fonte: IICA (2007) A crescente preocupação com o meio ambiente, bem como a sustentabilidade do consumo energético, abre espaço para o desenvolvimento da agroenergia. Atualmente, o etanol é a principal bionergia utilizada no mundo, aplicado na indústria química, na fabricação de bebidas e como carburante. O Brasil e os Estados Unidos são os maiores produtores e consumidores do etanol, correspondendo a 70% sua produção e consumo mundial, a seguir, destacam-se a China, União Européia e Índia, que utilizam o etanol misturado à gasolina. No caso do biodiesel, a União Européia (Alemanha, França e Itália) é que lidera quanto à produção e consumo, devido aos subsídios para produção de matérias-primas, às isenções de impostos e às legislações determinando o uso de biodiesel como oxigenador do óleo de petróleo, que incentivam o setor de biodiesel. O Brasil é o maior exportador de etanol, enquanto que praticamente inexiste comércio mundial para o biodiesel (MAPA, 2007). O biodiesel já apresenta participação relevante na matriz de combustíveis, apesar de seu estágio incipiente de pesquisa e desenvolvimento. Na década de 1920 encontram-se as primeiras referências de uso de óleos vegetais no Brasil. Em seguida, no Instituto Nacional de Tecnologia, Instituto de Óleos do Ministério da Agricultura e Instituto de Tecnologia Industrial de Minas Gerais foram desenvolvidas pesquisas, sendo que neste último, realizaram-se estudos sobre uso de óleos de ouricuri, mamona e algodão em motores diesel de 6 cilindros no ano de 1950 (IICA, 2007). Contudo, foi a partir dos anos 70, em meio as crises internacionais do petróleo que se retomaram os estudos sobre óleo vegetais a fim de desenvolver novas fontes de energia. Em 1985, foi afirmado que os óleos vegetais seriam o substituto ao diesel mais adequado tecnicamente, em razão de não necessitar grandes mudanças nos motores e por ter alto rendimento energético. Todavia, naquela época, os custos de produzir energia com base em oleaginosas eram desfavoráveis em relação ao petróleo, de certa forma desestimulando a possibilidade de substituição do petróleo por essa nova fonte. Mesmo assim, nos anos 80, a empresa cearense Produtora de Sistemas Energéticos (Proeg) conquistou a primeira patente brasileira de biodiesel. 5 Campo Grande, 25 a 28 de julho de 2010, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural O maior desafio situa-se na escolha das oleaginosas mais adequadas à produção que permitam aproveitar as potencialidades regionais. No Brasil, as principais matérias-primas utilizadas são a soja, milho, girassol, amendoim, algodão, canola, mamona, babaçu, palma (dendê) e macaúba. Em cada semente de oleaginosa existe uma porção de óleo vegetal, sendo que a soja é o grão de oferta mais abundante para o atendimento da produção de biodiesel no país (representa 90% da produção brasileira de óleos vegetais). Embora esta não seja a oleaginosa com melhor rendimento em óleo, sendo o seu teor de 18%, há outras oleaginosas com alto grau de óleo, como girassol (38 a 48%), amendoim (40 a 43%), canola (40 a 48%), mamona (45 a 50%), babaçu (66%) e palma/dendê (22%) (MAPA, 2007). O incentivo à produção é feito em diversas instituições no país, como a Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (USP/ESALQ), que abriga o Pólo Nacional de Biocombustíveis e tem por finalidade analisar as variedades possíveis de ser aplicadas na fabricação de combustíveis renováveis (MAPA, 2007). Ainda, em cada região do país está sendo avaliado o desenvolvimento das oleaginosas. Na região Norte: dendê, babaçu, soja e gordura animal; Nordeste: babaçu, soja, mamona, dendê, algodão, coco, gordura animal e óleo de peixe; Sul: soja, canola, girassol, algodão, gordura animal e óleos de peixe; e Sudeste: soja, mamona, algodão, girassol, gordura animal e óleos de peixes. A lei n.11.097 de 2005 instituiu a introdução do biodiesel na matriz energética brasileira, sendo o governo federal através do Ministério das Minas e Energia (MME) e da Agência Nacional de Petróleo, responsáveis por definir as capacidades produtivas na indústria de biodiesel conforme Zonin (2008). Esta última, inclusive teve seu nome alterado para Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Bicombustíveis (ANP). De acordo com Dal Zot (2006), o biodiesel situa-se em fase introdutória e experimental, logo, sua comercialização será por meio de misturas ao diesel, utilizando-se a nomenclatura BX para identificar a concentração de biodiesel, em que B5 (5%), B20 (20%), B100 (100%) por exemplo. O Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel (PNPB), lançado em 2004, veio promover a produção de biodiesel no sentido de alinhar as políticas de cunho social, através da geração de emprego e renda tanto na produção industrial quanto no cultivo das matérias-primas, e as políticas ambientais, além dos aspectos econômicos. Com o Decreto n. 5.448/05 e a Lei do Biodiesel, n. 11.097/05, estabeleceu-se os percentuais mínimos de adição de biodiesel ao óleo diesel, 2% a partir de 2008 e 5% em 2013. Porém, em setembro de 2005 o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) antecipou para janeiro de 2006 a obrigatoriedade do uso do B2, mas restrita ao biodiesel portador do Selo Combustível Social. O conceito de “Combustível Social” foi introduzido pelo Decreto n. 5.457 de 2005, que estabeleceu redução nas alíquotas de contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS incidentes na produção e na comercialização do biodiesel, com níveis diferenciados de incentivos fiscais, a fim de estimular a inclusão social e a participação da agricultura familiar, de modo que para obter o benefício a indústria deve comprovar a aquisição de percentuais mínimos de matéria-prima dos agricultores familiares, especificar os valores a serem pagos e prazos no contrato, além de garantir assistência e capacitação técnica. 6 Campo Grande, 25 a 28 de julho de 2010, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural Quanto aos incentivos que não sob o aspecto tributário, os agricultores familiares têm acesso ao crédito do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF) e assistência técnica prestada pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) em convênio com entidades públicas e privadas, ou pelas empresas portadoras do Selo Combustível Social. Também, as indústrias podem contar com linhas de financiamento pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que possui um Programa de Apoio Financeiro a Investimentos em Biodiesel no âmbito do PNPB. E a comercialização do biodiesel deve obedecer às especificações técnicas estabelecidas pela ANP tanto nos leilões públicos quanto nas negociações diretas com os agentes privados. Assim, a cadeia produtiva do biodiesel brasileira, conforme Rathmann (2007), conta com seis atores principais: inicialmente, o produtor rural de oleaginosas que entrega seu produto à esmagadora de grãos, responsável por extrair o óleo, que por sua vez, o repassa para a usina de transesterificação. O resultado do processo realizado por esta é o biodiesel, então, entregue à refinaria ou à distribuidora autorizada que efetuarão a mistura do biodiesel ao óleo diesel e, finalmente o produto aí gerado chega aos postos comercializados, onde será disponibilizado aos consumidores finais. 2. O CONSUMO DE PRODUTOS ECOLÓGICOS Há, atualmente, um chamado “movimento verde”, que vem desenvolvendo mercados baseados no consumo de produtos biodegradáveis ou que causem um impacto negativo reduzido sobre o meio ambiente. O movimento verde envolve populações que assumem o compromisso de consumir produtos ecológicos em prol da preocupação com o meio ambiente. Produtos ecológicos cumprem as mesmas funções de produtos equivalentes, mas tem atributos que provocam dano inferior ao meio ambiente em todo o seu ciclo de vida. Os atributos de um produto são os principais estímulos que influenciam o comprador a determinada compra, avaliando-os com base em seus valores, suas crenças ou experiências passadas (PETER; OLSON, 1996). O consumidor de produtos “verdes” é um consumidor ecológico, e as empresas que comercializam estes produtos possuem uma vantagem competitiva em relação aos concorrentes (BERTOLINI, POSSAMAI; BRANDALISE, 2009). Para atender aos consumidores de produtos ecológicos, o marketing deve estar em sintonia com as suas necessidades e com a promoção dos produtos. Conforme Calomarde (2000), o marketing ecológico concebe a ecologia como um componente básico da filosofia de marketing. Assim, os consumidores de produtos ecológicos aceitam argumentos que lhe são apresentados para evitar as conseqüências negativas da poluição ambiental. Dentre as opções de produtos no mercado, a escolha do produto passa pelos campos das ações de marketing, que geram um estímulo à compra, ou a identificação da necessidade de compra do produto, para satisfazer alguma necessidade da empresa ou dos clientes internos e externos. O marketing ecológico tem a finalidade de satisfazer o consumidor, a empresa, à sociedade e o entorno natural, mediante o desenvolvimento, o valor, a distribuição e a 7 Campo Grande, 25 a 28 de julho de 2010, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural promoção dos bens, serviços e idéias demandados, agindo de forma a conservar e melhorar o meio ambiente, contribuindo com o desenvolvimento sustentável da economia e da sociedade (CALOMARDE, 2000). Neste contexto, a consciência ecológica é fundamental para o consumidor de produtos ecológicos, pois ele seleciona produtos com o objetivo de preservação da natureza e de ações e motivações ambientais (BERTOLINI; POSSAMAI; BRANDALISE, 2009). Para Calomarde (2001) as estratégias ecológicas de marketing apelam para a perspectiva social do marketing. Vão além das políticas de vendas de empresas, consideram questões que afetam o consumidor como um todo, tratando de aspectos ecológicos como: 1. A limitação de recursos naturais, satisfazendo as necessidades humanas, estimulando ações não danosas ao meio ambiente; 2. Dar mais importância ao desenvolvimento sustentável do ecossistema do que à fabricação e consumo de produtos que se oponham a este desenvolvimento sustentável com os conhecimentos técnicos disponíveis; 3. Ajudar às ações que contribuam a evitar a devastação da natureza ou recuperem o equilíbrio deteriorado pela contaminação industrial; 4. Promover o desenho de produtos ecológicos, minimizando o envasado e desenvolvendo a reciclagem de resíduos de uso dos produtos. São produtos ecológicos os obtidos de maneira sustentável, como os alimentos orgânicos, os de produção integrada, os biodegradáveis, os reciclados, e os combustíveis vegetais, como o biodiesel, que provocam um menor impacto ao meio ambiente quando comparado às outras fontes de energia em todo o seu ciclo de vida. Ribeiro, Peixoto e Souza (2008, p.5) afirmam que o biodiesel é ecológico também “por apresentar características biodegradáveis, não tóxicas, por estar praticamente livre de enxofre e aromáticos e conter aproximadamente 11% m/m de oxigênio”. No caso de produtos comercializados entre empresas, business to business, ou B2B, em que empresas consumidoras buscam a matéria-prima, o produto ou o serviço necessário para seu funcionamento através de outras empresas, exige dos compradores organizacionais um comportamento diferente do comprador doméstico ou individual. O processo decisório das compras organizacionais implica em avaliar a necessidade, desenvolver critérios de escolha, solicitar a proposta, avaliar os fornecedores, selecioná-los e cumprir e monitorar o contrato com os mesmos (SHETH, 2001). A compra do biodiesel por consumidores organizacionais é recente, pode influenciar o funcionamento da sua cadeia produtiva, e é um exemplo de compra B2B. 3. METODOLOGIA Esta pesquisa buscou discutir a percepção do cliente organizacional sobre o biodiesel como um produto ecológico e a motivação para o seu uso. Trata-se de um estudo de caso de abordagem exploratória e qualitativa. 8 Campo Grande, 25 a 28 de julho de 2010, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural No atual contexto energético mundial, o biodiesel está em destaque por seus impactos ambientais, econômicos e sociais. Por isso, o estudo de caso é apropriado para estudá-lo, pois esta técnica permite a análise de acontecimentos contemporâneos sem manipulá-los (YIN, 2001). Como um estudo exploratório, busca-se definir objetivos e buscar informações sobre o assunto (CERVO; BERVIAN, 2002). Para atingir o objetivo desta pesquisa, baseou-se em Yin (2001), que afirma que as evidências para um estudo de caso podem vir de documentos, registros em arquivo e entrevistas. A pesquisa qualitativa permite captar o fenômeno de estudo a partir das pessoas envolvidas no mesmo, considerando os diversos pontos de vista relevantes (GODOY, 1995). Por isso, entrevistaram-se consumidores de biodiesel escolhidos através de amostra não-probabilística, por julgamento e conveniência, estando a seleção dos mesmos condicionada às opções do entrevistador (MALHOTRA, 2001). O mercado consumidor de biodiesel no Brasil, de acordo com Padula et al (2006), é formado por motoristas de caminhões, ônibus e fábricas de veículos automotores. Com base nesta informação, foram entrevistados 21 consumidores de biodiesel em três diferentes segmentos de transportes (coletivo urbano, rodoviário de passageiros, e rodoviário de cargas) do município de Passo Fundo-RS, dentre os quais, motoristas, mecânicos e gerentes de frota. Compreende-se que usos diferentes de um mesmo produto podem conduzir a percepções diferentes por parte dos consumidores, de acordo com Beulke e Mattuella (2007). Deste modo, julgou-se que os entrevistados são os principais atores nos quesitos compra e uso do biodiesel nas empresas de transportes, capacitados e capazes de expressar percepção e motivações para o uso deste produto. O instrumento de pesquisa foi o questionário semi-estruturado que permitiu um aprofundamento sobre o tema e a associação direta dos dados com o respondente (MATTAR, 1996). Os questionamentos feitos aos entrevistados foram a respeito da percepção do biodiesel como produto ecológico e as motivações para usá-lo. Realizou-se análise dos dados coletados nas entrevistas, que foram transcritas e categorizadas conforme a função (motorista, mecânico ou gerente de frota) e o segmento de atuação dos entrevistados. Assim, os dados coletados foram sistematizados e analisados. 4. DISCUSSÃO E CONSIDERAÇÕES FINAIS O biodiesel foi inserido na matriz energética brasileira a partir de uma imposição legal, sendo adicionado ao BX (DAL ZOT, 2006). Assim, os entrevistados consideraram que não houve uma escolha pela adoção do biocombustível em si, mas da quantidade que seria adicionada. Conforme relato dos gerentes de frota, cada uma das empresas entrevistadas adquire combustível de uma distribuidora (Texaco, BR e Ipiranga). Também, possuem contratos diferentes com estas distribuidoras e, conforme aumenta o número de veículos na frota das empresas, foi constatada maior a adição de biodiesel ao diesel comum adotada pela empresa, variando entre 3%, 5% e 100%. A empresa do segmento de transportes de cargas possui mais de 300 veículos, seguida da empresa de transportes de passageiros 9 Campo Grande, 25 a 28 de julho de 2010, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural rodoviários, com mais de 100 veículos e da empresa de transporte coletivo urbano, com 15 veículos. A motivação pela adição de biodiesel ocorreu, para os gerentes, principalmente pela oferta de prazo de pagamento oferecido pelas distribuidoras de combustíveis, embora o preço do biodiesel esteja acima do esperado. Também foram citados pelos motoristas e mecânicos os benefícios para o meio ambiente, como a redução da poluição, bem como benefícios econômicos e sociais, tais como a geração de emprego e renda no meio rural, os incentivos e propagandas realizados pelo governo federal sobre o biocombustível, e o menor uso de combustível feito de petróleo, que na percepção dos consumidores é mais caro que a biomassa. O biodiesel é considerado um produto ecológico para todos os entrevistados, embora exija o uso de aditivos anticongelantes no inverno para todas as empresas e, especialmente na empresa de transporte de cargas, tenha reduzido sensivelmente o desempenho dos veículos e cause um descarte de peças com maior frequência nos veículos. Além disso, os entrevistados citam que há pouco benefício percebido para muito custo, poucas informações disponíveis, e que as montadoras de veículos deveriam orientar as empresas, em especial aos mecânicos e motoristas, sobre a manutenção e o desempenho real esperado do veículo que utiliza o biodiesel. Observa-se, portanto, que o consumo de biodiesel pelas empresas não está associada à consciência ecológica, como propõem Bertolini, Possamai e Brandalise (2009), mas, sim, à exigência governamental e aos critérios de preço de comercialização. Há valorização dos aspectos ecológicos presentes neste biocombustível pelo consumidor, porém eles estão implícitos no uso do combustível e são explorados pelo governo e pelas empresas como diferenciais competitivos. As informações acerca do biodiesel estão limitadas às divulgadas em jornais e revistas, o que gera insegurança no consumidor. Ainda assim, os motoristas e mecânicos aguardam um pronunciamento das empresas através de palestras, bem como de outros agentes da cadeia produtiva do biodiesel, como montadoras de veículos, sobre a necessidade e os benefícios de se usar este biocombustível. Em suma, pode-se questionar que o alinhamento das questões econômicas, sociais e ambientais identificadas em um ideal de sustentabilidade e propostas pelos programas do governo sobre o biodiesel, não estão sendo percebidas integralmente no que se refere ao elo dos consumidores organizacionais. Embora haja o reconhecimento do biodiesel como um produto ecológico, os elementos de custo e eficiência deste produto não estão bem claros para os consumidores organizacionais. Esta barreira pode estar vinculada ao fato de a oferta de biodiesel ainda ser pequena e, além disso, o setor deparar-se com problemas técnico-científicos que estão sendo conhecidos e solucionados conforme avançam as pesquisas referentes à inovação e desenvolvimento. Porém, mesmo que alguns aspectos sustentáveis sobre o biodiesel sejam questionáveis, é importante o prosseguimento do incentivo de órgãos públicos e privados na promoção dos biocombustíveis, pois é em virtude da identificação dos problemas, do cruzamento de informações e de pesquisas que produtos alternativos e úteis vão sendo desenvolvidos e se adequando às necessidades da sociedade como um todo. 10 Campo Grande, 25 a 28 de julho de 2010, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural REFERÊNCIAS BERTOLINI, G. R. F; POSSAMAI, O.; BRANDALISE, L. T. A percepção dos consumidores de produtos ecologicamente corretos: estudo de caso em pequena empresa. Revista da Micro e Pequena Empresa, v.3, n.1, 2009. BEULKE, R.; MATTUELLA, J. L. O preço e o valor percebido: uma abordagem mercadológica. Redes, v.12, n.2, 2007. CALOMARDE, J. V. Marketing ecológico. Madrid: Pirámide, 2000. CERVO, A. L.; BERVIAN, P. A. Metodologia Científica. 5 ed. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2002. 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