O QUE DIZEM PESQUISAS RECENTES SOBRE O USO DO LABORATÓRIO DIDÁTICO NO ENSINO DE FÍSICA? Neila Salete Rupolo,1 Iône Inês Pinsson Slongo2 RESUMO: O presente trabalho foi motivado pela vasta literatura em circulação que aponta contribuições e equívocos em relação à utilização do laboratório didático no ensino de Física. Neste sentido, o presente estudo teve o objetivo de analisar a produção acadêmica recente que versa sobre o laboratório didático no ensino de Física e, neste percurso, explicitar objetivos e limitações apontadas pelas pesquisas. Foram analisados o 31 artigos que versam sobre o laboratório didático no ensino de Física, apresentados na modalidade de Comunicações Orais, nas seis edições do Encontro Brasileiro de Pesquisa em Educação em Ciências – ENPEC, entre 1997 e 2007. Utilizando a análise de conteúdo proposta por Bardin (2002), foi possível explicitar o modo como esses estudos consideram o papel desempenhado pelo laboratório didático no processo de ensinar e aprender Física, como também, as principais críticas feitas com relação à sua utilização. Palavras-chave: Comunicações orais ENPEC; Laboratório didático; Ensino de Física. INTRODUÇÃO: Os professores que ensinam Física atualmente tiveram sua formação universitária num momento histórico em que era enfatizada a relevância das atividades experimentais para o ensino. Esse fato criou uma espécie de ativismo experimental que mobilizou os professores para construir seus próprios materiais quando não havia materiais convencionais nas escolas. Isso foi positivo, porém, não suficiente para garantir uma efetiva aprendizagem de conceitos de Física. Muitas vezes os alunos têm dificuldades para relacionar a ciência estudada no laboratório didático com a ciência das aulas teórica e, ambas às suas concepções iniciais. No momento presente, é necessário superar o debate acerca da relevância do laboratório didático e retomar o debate - que não é novo - sobre as funções que o laboratório didático precisa desempenhar para justificar o seu espaço. O estudo aqui relatado é parte de um estudo mais amplo que teve o objetivo de explicitar e analisar, por meio de pesquisa bibliográfica em artigos completos publicados nas atas do Encontro Nacional de Pesquisa em Educação em Ciências (ENPEC), o que dizem essas pesquisas sobre o uso dos laboratórios didáticos no ensino de Física. Neste artigo relata-se particularmente as funções atribuídas por essas pesquisas aos laboratórios didáticos no ensino de Física, como também, as críticas que essas pesquisas apontam com relação à sua utilização inadequada. É importante destacar que o ENPEC é um evento bianual que ocorre sistematicamente desde 1997. O evento é um dos mais relevantes na área e tem o objetivo de promover a disseminação de resultados de pesquisa na área da Educação em Ciências. Portanto, o presente estudo investigou mais de uma década de produção científica sobre o tema. 1 Mestre em Educação, professora do curso de Física e Líder do Grupo de Pesquisa Educação em Ciências e Matemática da UNOCHAPRCÓ (alien@unochapecó.edu.br). 2 Doutora em Educação, professora do curso de Pedagogia e Ciências Biológicas e Líder do Grupo de Pesquisa Ensino e Formação de Professores da UNOCHAPRCÓ ([email protected]). METODOLOGIA: O objetivo maior deste estudo foi de analisar a produção acadêmica recente sobre o laboratório didático de Física e, neste percurso, explicitar os pressupostos pedagógicos e epistemológicos que orientam tais pesquisas. Especificamente para esse recorte, o objetivo foi identificar as funções atribuídas por essas pesquisas aos laboratórios didáticos no ensino de Física, como também, as críticas que essas pesquisas apontam com relação à sua utilização inadequada. Foram tomados como objeto de análise 31 artigos publicados nas Atas das seis edições do ENPEC, na modalidade de comunicações orais. O critério primeiro para a seleção dos artigos foi sua identificação nas atas do ENPEC. Foi tomado como foco os trabalhos que abordam o laboratório didático, conforme definição proposta por Pinho-Alves (2000): “[...] o laboratório didático que faz parte do ensino formal, de uso nas escolas direcionado e dirigido pelo professor a sua classe. [...]”. Assim sendo, os artigos estudados versam sobre o laboratório didático de Física ou às atividades a ele associadas, desenvolvidas na educação formal Básica e Superior. A identificação dos textos foi feita a partir do título e resumo dos artigos. Sempre que esses elementos se mostraram insuficientes, o texto como um todo foi considerado. Utilizando os critérios estabelecidos, os 31 artigos foram selecionados, dos quais buscou-se explicitar, para o propósito desse relato, as funções do laboratório didático e críticas ao laboratório didático. A análise qualitativa deu-se a partir dos descritores e algumas categorias que foram sendo construídas durante o estudo, levando-se em conta a sintonia ou dicotomia que os artigos evidenciaram em relação ao referencial teórico utilizado, as recorrências, as lacunas e as surpresas. RESULTADOS E DISCUSSÕES: O estudo dos 31 artigos evidenciou que os mesmos, apesar de atenderem aos critérios utilizados para a seleção, possuem perspectivas diferentes. Assim, para o que se propõe nesse relato, são utilizados 19 dos 31 artigos previamente selecionados. Os 19 artigos desse grupo têm em comum o foco no ensino experimental de Física. Esses artigos apresentam relatos de atividades e discutem as perspectivas teóricas epistemológicas e/ou pedagógicas que norteiam as ações educativas a ele relacionadas. Pôde-se constar a partir desse estudo que os trabalhos que envolvem, de alguma maneira, o laboratório didático ocupam um espaço crescente ao longo do tempo. É significativo afirmar que o número de trabalhos apresentado sobre o tema no VI ENPEC (7 trabalhos ) é sete vezes maior que o apresentado no I ENPEC (1trabalho). Nesse grupo, de 19 artigos que têm como foco o ensino experimental de Física, 16 apresentam pressupostos pedagógico/educacionais. Esses chamam a atenção para as funções que o laboratório didático necessita desempenhar. Com relação às funções atribuídas ao laboratório didático,16 artigos analisados destacam, de forma recorrente, que o uso adequado do laboratório didático significa uma possibilidade de ` compreensão da atividade do cientista` por parte do alunos (62,5%); que o laboratório didático tem também a função de `ensinar conteúdos/conceitos de Física` ( 62,5 %) e, que ele representa uma possibilidade de `conhecer e tratar as idéias prévias dos alunos (50,0%). Quanto a função de promover a 'compreensão da atividade do cientista' por parte dos alunos, verificamos que 62,5 % das pesquisas apontam que o laboratório didático promove o desenvolvimento de atitudes criativas, críticas e investigativas e ao mesmo tempo, difunde a idéia de que estas atitudes são típicas do fazer científico. É importante dizer, no entanto, que nesse tipo de atividade os autores veiculam uma imagem onde "(...) o estudante não se limita a imitar o "cientista" de forma caricatural e artificial, mas através do desenvolvimento e do desafio de checar suas próprias hipóteses" (PINHO-ALVES, 2002). Rosa et all (2007, p. 266) dizem que "O desenvolvimento de atividades experimentais, fortemente associadas ao método experimental, vem tomando a conotação de saber específico, deslocando o referencial de atividades vinculadas aos conteúdos discutidos em sala de aula, para o status de elemento do saber. "No caso dos trabalhos publicados na secção de comunicações orais do ENPEC, 62,5 % não têm essa conotação. As atividades ou discussões propostas não são centradas nos métodos e procedimentos do laboratório didático e veiculam a imagem de uma Ciência que tem história, é construída por humanos e possui limites. A função de `ensinar conteúdos/conceitos de Física, também aparece em 62,5 % do artigos, porém, os pesquisadores não vêem nas atividades experimentais em si uma estratégia para melhorar a aprendizagem de conceitos de Física , mas deixam evidente a importância de se desenvolver ações educativas pautadas em pressupostos que considerem quem aprende, como sujeito do seu conhecimento (DELIZOICOV, 2000) onde os professores têm a função de transformar as atividades experimentais em objetos para ensinar Física. Em relação à função de identificar e tratar as idéias prévias dos estudantes, 50,0 % das pesquisas apontam nessa direção, o que é coerente com o proposto por Pinho-Alves, (2000), quando diz que as atividades experimentais devam se constituir em objetos didáticos de orientação construtivistas. Interpreta-se aqui, orientação construtivista no sentido lato entendendo, nesse caso que, quem aprende tem como ponto de partida para aprender, o conhecimento que já possui. Nessa direção, Pinho-Alves, (2000, p.180) argumenta que “[...] o papel dessa atividade é oferecer a oportunidade ao estudante de conscientizar-se de que seus conhecimentos anteriores são fontes que ele dispõe para construir expectativas teóricas sobre um evento científico”. Em (2002, p.4), o mesmo autor é mais enfático quando assevera que, “Uma das principais razões que justificam o laboratório didático certamente é o "tratamento" das idéias prévias.” As atividades do laboratório didático têm essa característica de facilitar o envolvimento de todos. Nesse envolvimento emergem as falas que permitem ao professor avaliar em que nível de complexidade um conceito ou fenômeno pode ser discutido com cada grupo. Permitem também encontrar o exemplo adequado para em cada situação fazer os estudantes perceberem a insuficiência de seus conceitos e a necessidade de ampliá-los para explicar uma nova situação. Outra constatação importante dessa pesquisa é o fato de 81,25 % dos 16 artigos apresentarem crítica, ou citarem críticas de outros autores com relação à forma como as atividades são conduzidas no laboratório didático. Essas críticas são direcionadas ao tipo de atividade verificacionista que divulga uma imagem empirista da ciência, a ênfase que é dada às atividades com roteiros estruturados, à ausência de clareza epistemológica dos professores ou também, à veiculação de imagens distorcidas sobre o trabalho dos cientistas. Outros autores fazem uma revisão bibliográfica e trazem contribuições de pesquisadores do Brasil ou exterior sobre a dificuldade de inferir os resultados de aprendizagens a partir do laboratório didático. Apesar das críticas apresentadas, todos os artigos apontam que o laboratório didático tem seu espaço e seus méritos, contudo, é necessário planejar e conduzir de maneira adequada as atividades. Nesse caso, e nesse momento, entende-seque a maneira adequada é coerente com o proposto por Pinho-Alves (2000) quando diz que as atividades experimentais devem se constituir em objetos de mediação que, "[...] ocorre no espaço entre a experiência do cotidiano e a experimentação do cientista […]". CONSIDERAÇÕES FINAIS: A análise dos artigos apresentados nas seis edições do ENPEC entre 1997 e 2007 sobre o tema laboratório didático demonstra que os pesquisadores estão sintonizados com o propósito do evento que é divulgar e debater as questões relativas a educação em ciências. Todas as pesquisas, de alguma maneira, apontam as contribuições e fazem críticas que, se consideradas, poderão qualificar as ações educativas relacionada ao laboratório didático e, consequentemente qualificar a educação em Física. Esse trabalho traz contribuições importantes para a docência na educação superior uma vez que o ensino experimental de Física está presente nos cursos que formam professores de Física e Biologia. As constatações feitas nesta pesquisa, certamente influenciarão os rumos do ensino experimental de Física na UNOCHAPECÖ e por extensão o ensino de Física nas escolas de educação básica da região. REFERÊNCIAS: DELIZOICOV, Demétrio; ANGOTTI, José André; PERNAMBUCO, Marta Maria. Ensino de ciências: fundamentos e métodos. São Paulo: Cortez, 2002. 364 p. PINHO-ALVES, J., Regras da Transposição Didática aplicadas ao laboratório didático. Caderno Catarinense de Ensino de Física. UFSC. Florianópolis. V. 17. no. ,. p. 174-188. Agosto. 2000. PINHO-ALVES, José. Atividade Experimental: uma alternativa na concepção construtivista. In: VIII Encontro de Pesquisa em Ensino de Física, 2002, Aguas de Lindóia. Atas do VIII EPEF. São Paulo : SBF, 2002. ROSA ET ALL.atividades Experimentais nas Séries Iniciais:Relato de uma Investigação. In:Revista Electrónica de Ensenanza de las Ciências, LOCAL, Vol. 2 Nº 2, pp.263-274