ISSN 2236-3335
Universidade Estadual de Feira de Santana
Revista
Graduando
ENTRE O SER E O SABER
Revista Acadêmica da Graduação em Letras
v. 2 n. 3 julho/dezembro 2011
Graduando
J
Feira de Santana
v. 2
n. 3
p. 1-135
ISSN 2236-3335
jul./dez. 2011
Graduando
ENTRE O SER E O SABER
Revista Acadêmica da Graduação em Letras
v..2
n..3
jul./dez. 2011
Institucional
R e i to r
Jos é C a rlos Ba rret o d e Sa ntana
V i ce -R e i t o r
G en iva l C o rrêa d e Sou za
P r ó - R e i t o r d e Gr a d u a çã o
Ru bens Eds on A lv es Pe re ira
P r ó - R e i t o r a d e P es q u is a e P ó s - G r a d u a çã o
M a rlu c e M a ria A ra ú jo A ss is
P r ó - R e i t o r a d e E x t en s ã o
M a ria H e le na d a Ro cha B esnos ik
P r ó - R e i t o r d e A d m i n is t r a çã o e F i n a n ça s
Ros s in e C e rqu e ira da C ruz
D i r e to r a d o D ep a r ta men to d e L e t r a s e A r t es
M áv is D ill Ka ipp e r
V i ce -D i r e to r a d o D ep a r ta m en to d e L e t r a s e A r tes
M a ria C ris t ina B raga M asc a ren has
Co o r d en a d o r a d o C o le g ia d o d e L e t r a s e A r tes
V a lé ria M a rta R ib e iro S oa re s
V i ce -Co o r d e n a d o r a d o Co l eg i a d o d e L e tr a s e A r tes
Ira n ild es A lm e ida d e O liv e ira
U NDE C\ CO DA E
C h ef e (U NDEC ): C onsu e lo P ene lu B it en cou rt
C oo rd . (C O DA E): V andso n d e O live ira Nasc im en to
D i r e tó r io A ca d êm i co d e L e t r a s e A r tes J o s é J e r ô n imo d e Mo r a is
U E FS/Rev is ta Graduando
A ven ida Tr ansnordest ina , S/ N, Ba irro No vo Hor izonte . Módu lo 2, MT 25b .
C EP 44 036 -9 00 – Fe ira d e Santana – Bah ia – Bras il. Te l.: 316 1 -8 000
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Expediente
C o mis são Ed ito r i a l
Me. A d ev a ldo P ereira A rag ão
Ma . An d réia Ca ricch io Café Ga llo
Me. Antônio Gabriel Evangelista de Souza
D ra . Ca rla Lu z ia Ca rn eiro Bo rg es
D r a . C e li na Má r c ia d e S ou za Abb ad e
D r. Cid Seixas Fraga Filho
Me . C l ed so n J os é Po n c e Mo r a is
D r. Ed son D ia s Ferreira
Me. Eds on O liv eira da Silva
E sp . E liza b et e Ba s tos d a Silva
D ra . E lv ya Sh irley R ib eiro P ereira
Me. Fab rício do s Sa n tos B ra nd ão
D r. Fran cisco Ferreira d e L ima
D r . Hu mb e rt o L u iz L i ma d e O l i ve i r a
D ra. Jolanta Rekawek
D ra . J os an e Mo reira d e O liv eira
Me. Ju ra ci Dó rea Fa lcão
Me. Nigel Alan Hunter
Ma . N e l mi ra Mo r e i ra d a S i lva
D r a . Ma r i a d a Co n c e i ção R e is T e ix e i ra
D r a . N o r ma Lú c ia F e rna nd e s d e A l me id a
D ra . P a lmira V irg in ia B ah ia H ein e A lv a rez
D ra . R ita d e Cáss ia R ib eiro d e Q u eiroz
D ra . Su an i d e A lmeid a V as con celo s
Ma . Va l é r i a Ma r ta R i be i r o So a r es
C o n se lh o Ed ito r i a l
D an ilo Cerqu eira A lmeid a
Josenilce Rodrigues de Oliveira Barreto
J u lia na Pa ch eco O liv eira N ev es
Welling to n Go mes d e J esu s
R ev i são
Me. A d ev a ldo P ereira A rag ão
E sp. Adilson Silva de Jesus
A line d a Silva Sa nt os
A na Cla ra T eix eira Leão A lmeid a
A na lid ia d os San t os B ran dã o
D an ilo Cerqu eira A lmeid a
D ina meire Oliv eira Carn eiro R io s
Ma . Ed na R ib e i r o Ma r qu e s A mo r i m
E na Ca ro lin e L élis Xa vier
Érika Ramos de Lima
Ma . Ma r i a C r is t ina B r aga Ma s ca r en ha s
D r a . Ma r i an a Fa gu nd es d e Ol i v e i ra
Geisa dos Santos Silv a
J u lia na Pa ch eco O liv eira N ev es
Me. Nigel Alan Hunter
Ma . N orma So eli R eis Men ez es
Ma. Silvania Cápua Carvalho
Welling to n Go mes d e J esu s
P r o je to Gr á f i co
C ap a
Conselho E ditorial
D an ilo Cerqu eira A lmeid a
E d i to r aç ão
I m ag em d e C ap a
D an ilo Cerqu eira A lmeid a
Ma ria A rab ela Sa mpa io Ca mpo s
R ev i s ão F i n a l
W eb D e s i g n
Conselho E ditorial
D an ilo Cerqu eira A lmeid a
I mp r e s s ão
T i r ag em
I mp ren sa Un iv ers itá ria — UE FS
30 0 ex emp la res
Sumário
EDITORIAL
Conselho Editorial ................................................................................. página 7
EDUCAÇÃO
A ( I N) E X C L US Ã O D OS S UR D OS N A E D U C AÇ Ã O D O
CAMPO:
SENSIBILIZANDO
PROFESSORES
E
C O M P AR T I L H AN D O S A BE R E S
G r a c i e l y C ân d id o M a c êd o . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . p á g in a 1 1
P R ÁT I C AS DE E N S I N O N A S A L A DE A U L A E E N S I N O
D A L Í N G UA P O R T U G UE S A
A n n a C a r o l i n a M a ch a d o M en d e s , D a n i e l l e E v a n g e l i s t a B a t i s t a , F e r n an d a
d o s S an t o s A l m e i d a , J a m i l e d e J e s u s An u n c i aç ã o , P o l l y a n a S o u z a
C e r q u e i r a , T a i j a r a S a n to s d o s S a n t o s . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . p á g i n a 27
I N TE R C U L T UR A LI D A DE E M O S A N D U ÍC HE
M A R I CO T A : C O MP A R T I LH A N D O S A BE R E S
A
DA
G r a c i e l y C ân d id o M a c êd o , L u z i an e A m a r a l d e J e su s . . . . . . . . . . . . . . . . . . p ág i n a 4 3
LINGUÍSTICA
E D I Ç Ã O S E MI D I P L O M ÁT I C A E A N ÁL IS E D O D IS C UR S O
D E U M A U T O DE DE F L O R A ME NT O D O S É C U L O X X
J
Ivanete Martins de Jesus ................................................................. página 57
O V O C A B U L ÁR I O F A R M AC O L Ó G IC O P R E S E N TE
J O R N A L F OL H A D O N OR TE D A DÉ C AD A D E 1 9 4 0
NO
G l e i d e C o n c e i ç ão d e J e su s , J o s e n i l c e R o d r i g u e s d e O l i v e i r a B a r r e t o ,
L i d i a n e F e r r e i r a S i l v a , R o s an a M a r i a C a r n e i r o R i o s , V i v i a n e M a ce d o d e
Jesus .................................................................................................... página 67
D E TE R M I N A - M E O U DE V OR O - TE : U MA C O N S I DE R AÇ Ã O
S O BR E ( A F AL T A DE ) CR I TÉ R I OS A D OT A D O S P AR A A
D E F I N I Ç Ã O DE S U JE IT O I N DE TE R M I NAD O E O R AÇ Ã O
S E M S U JE I TO E M LI V R O S D I DÁ T I CO S
Laudelino Santos Oliveira .................................................................. página 79
LITERATURA
LITERATURA
C A Ç A D OR
E
MUNDIVIDÊNCIA
NO
CONTO
O
D a n i l o C er q u e i r a A l m e i d a . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . p á g i n a 9 5
A X I F OP A G I A DO A M O R E D O C IÚ M E E M C A M ÕE S E
D A V I D M O UR Ã O F E R R E IR A
R a f a e l S a n to s S i l v a . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . p ág i n a 1 0 7
L A E S P A Ñ A DE G U E R R A E N E L C UE NT O M U Y LE J OS
D E M AD RI D
A r a b e l l e N o g u e i r a A l v e s . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . p ág i n a 1 2 1
M U R I L O R U BI Ã O : U M A R E S E NH A C R Í T IC A D O CO N T O O
P IR O TÉ C NI C O Z AC A RI AS
F l á v i a R o d r i g u e s d o s S a n to s , G r a c i e l y C ân d i d o M a c êd o . . . . . . . . . . . . p á g i n a 1 27
N O R M AS P AR A E N V IO DE AR TI G OS E R E S E NH AS
C o n s e l h o E d i t o r i a l . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . P á g i n a 1 34
J
ISSN 2236-3335
Editorial
A Rev is t a Gra dua ndo chega à s ua t ercei ra edi çã o. Qua nta
conqui s ta , priv i l égi o e t ra ba l ho! L embra - nos es t e moment o a
prudênci a de Mi chel F ouca ul t a o i ni ci a r o seu t ext o A Ordem
do Discurso , quando di zia : “Há em mui t os , j ulgo, um des ej o s emel ha nt e de nã o t er que começa r, um des ej o s emel hant e de s e
encont ra r, de i medi a to, do out ro l a do do discurs o , s em t er de
v er do la do de quem es t á de fora a qui l o que el e pode t er de
s i ngul a r, de t emív el ( . . . ) . A es t e querer t ã o comum a i ns t i t ui çã o
res ponde de ma nei ra i rôni ca , porque faz com que os começos
s ej a m s ol enes , porque os a col he num rodei o de a t ençã o e s i l ênci o, e l hes i mpõe, pa ra que v ej am à di s tânci a , formas ri t ua l i za das ”.
O t ext o de Fouca ul t nos cha ma at ençã o pa ra duas i dei as
i nqui et a nt es no di s curs o. A primei ra referente a o la do do di scurs o e a s egunda s obre impos i çã o e di s tânci a . E ent ã o nos
pergunt amos : de que la do do di s curs o es t á a Rev i s ta Gra dua ndo? Dos dois l a dos e do mesmo l ado concomi t a nt ement e. Confus o? N ã o.
A Gra dua ndo é o própri o es t uda nt e de L et ra s que cri ou
uma ma nei ra de propor, di s cut i r e ampl ia r conheci ment o pel o
v i és da ci ênci a e do t ext o. É como s e o curs o de L et ras ma nt i v ess e um l ongo e frut uos o diá l ogo cons i go mes mo. B us ca ndo
de forma const a nt e e comedi da a s ua i dent i da de, a pres enta ndo
um s ímbol o de res is t ênci a e, porque não, de poder, j á que l i damos com a pa l av ra.
Apres enta mos a 3ª edi ção porque a noss a mot iv a çã o é
es t a r s empre pert o e coopera ndo, el i mi nando a di s t ânci a ent re
rev i s ta e s eu( s ) públ i co( s ) , fa t o que s eria a ca usa de uma
gra nde i ncoerênci a . Coopera r s i gni fi ca que somos e a gimos enqua nt o curs o e pa ra o curs o. N es s e s ent i do, e pri nci pa l ment e
nes t e t empo, nã o há qua l quer forma de impor o res ul ta do da
própri a conquis t a. É méri t o cuj o crédi t o é col et i v o, percebi do
em cert as a ções , e obt i do, na da ma is na da menos ― mera for-
J
ça de express ã o ―, por mã os que es crevera m, ment es que
a va l i a ra m e ol hos que l era m ( e l eem) . Compreender ess as reuni ões de pes s oa s em t orno de i dei a s ou proj et os , i ndi v i dua i s e
col et i v os , que s e des cobrem ca da v ez ma is comuns e comungáv ei s , é, no univ ers o educa ci ona l , t er ci ênci a de que a Rev is t a promov eu um es pa ço l egí t i mo de i nexa urível re fl exã o a ca dêmi ca na UEF S. Ass i m, ta l como o exercí ci o pra t i ca do pa ra ev i t a r a i nérci a , a Gra dua ndo preci s a s er mant ida pa ra s e t orna r
ca da v ez ma is v i s ív el e l i da .
Al guma s modi fi ca ções ma rcam noss a t ercei ra edi çã o. Uma
del a s é a muda nça no regi s t ro da peri odi ci da de. Agora v amos
i dent i fi ca r ca da edi çã o a t rav és do vol ume, corres pondent e ao
a no. D es ta forma , apres enta mos a edi çã o at ua l com o v ol ume 2
( doi s ) e número 3 ( t rês ) da Gra dua ndo. Há muda nças t ambém
nos nomes da comis sã o edi t oria l e do consel ho edi t ori a l , que,
s egundo defi ni çã o da ABN T 6 021 , dev em s er t roca dos ent re s i .
Ass i m, o corpo de profi s s i ona i s enca rrega do de ava l i a r os t ra ba l hos s erá i dent i fi ca do, a pa rt i r de a gora , por comis sã o edi tori a l , e a a dmi ni s t ra çã o do peri ódi co s erá ca rgo do a gora renomea do cons el ho edi t oria l . Out ra a ção i mport ant e é a ca pa des s a edi çã o, fei t a s obre a fot o de uma es t udant e da gra dua çã o,
es col hi da por vot a çã o a bert a dent re as suges t ões env i a da s
pel os gra dua ndos di a nt e da a pres ent a çã o do t ema “Gra dua ndo:
ent re o s er e o sa ber, ent re o s emi á ri do e o s ertã o”. Ess a é
ma is uma da s a ções da Gra dua ndo pa ra aproxi ma r a rev i s ta e
os es tudant es , t ornado -os pa rt e da el aboraçã o da rev is t a em
s eus det a lhes ; a l ém di s so, é a a pos ta da rev i s ta em out ros el ement os a l ém do t ext o, a pos ta ndo na a rt e ( s ej a el a repres ent a da por des enho, des i gn, pi nt ura ou fot ografi a ) como pa rt e do
curs o de l et ras .
Acredi t a mos que ess a t ercei ra edi çã o confi rme o a poi o e
a a desã o dos gra dua ndos em L et ras da UEF S à sua Rev i s ta ,
a ss i m como t odos os col a bora dores que t êm a credi t ado na s eri eda de e qua l i da de do referi do peri ódi co di s cent e. Porque o
SER s e ( re) cons t roi a o pa ss o que s e ( re) conhece.
J
Cons el ho edi t ori a l
EDUCAÇÃO
ISSN 2236-3335
A IN(EX)CLUSÃO DOS SURDOS NA
EDUCAÇÃO DO CAMPO: SENSIBILIZANDO
P R O F E S S O R E S E C O M PA R T I L H A N D O S A B E R E S
G rac iely Cândido Macêdo
Licenc iatura e m Le tras Ve rnáculas
[email protected]
Profa. Dra. C arla Luzia Carne iro Borge s (Orientadora/UEFS )
D ep arta ment o de Le tras e A rtes (D LA )
[email protected] om.br
Res umo : At ua lment e, a t emá t i ca da i ncl usã o s oci a l de a l unos
s urdos em es col a s regul a res é ba st a nt e discut i da . Mas , em s e
t ra t a ndo de es col as do campo regul a res , i sso pouco a cont ece.
Cl a ss es mul t i ss eri a da s sã o rea l i da des ness as es col as , que com
ca pa ci ta çã o ou nã o t êm de a col her a l unos surdos . No enta nt o,
a col her es tas cri a nça s não s i gni fi ca di zer que es t a rã o i nt egrada s propria ment e, j á que os profes sores não pos s uem ca pa ci t a çã o em L í ngua B ra s i l ei ra de Si na is (L IB RAS) , as s im como a
pres ença do i nt érpret e nã o é uma rea l i da de. N es t e a rt i go, pret ende- s e a pres ent a r res ul ta dos fi na i s do proj et o “L í ngua portugues a : prá t i ca s ocia l na comuni ca çã o ent re surdos e ouv i nt es ”.
Pa l a v ras - chav e: Educa çã o do Ca mpo. Surdo. In cl us ã o/
excl us ã o.
Abs t ra ct : N owa da ys t he i ss ue of s oci a l i nclus i on of dea f s t udent s i n regula r s chool s i s wi del y deba t ed. B ut when i t comes
t o regul a r count rys i de s chool s , l i t t l e i s di scus s ed. Mul t i gra de
cl a s s es i n t hos e s chool s a re rea l i t i es t ha t , wi t h t ra i ni ng or do
not hav e t o a ccommoda t e dea f s t udent s . Howev er, wel come
t hes e chi l dren does not mean t ha t wi l l be i nt egra t ed properl y,
s i nce t ea chers hav e no t ra i ni ng i n B razi l i a n Si gn L a nguage
( LB S) , a s wel l a s t he pres ence of t he i nt erpret er i s not a rea -
J
Graduando, Feira de Santana, v. 2, n. 3, p. 11-25, jul./dez. 2011
12
l i t y. Thi s a rt i cl e a ims t o pres ent t he fi na l resul t s of the proj ect
"Port ugues e L a nguage: s ocia l pra ct i ce i n communi ca t i on between dea f a nd l i s t eners ".
K eywords: Rura l Educa t i on. D ea f. Incl us i on/excl us i on.
INTRO DUÇÃO
[ … ] a i n c lu s ã o é c o mp r e en d id a , s i mp l e s m en t e , c o mo u m
p r o c e s so q u e s i r v a à s o c i a l i z a ç ã o d a a l t e r i d a d e d e f i c i e n t e ― q u e é su p o s t a co mo e x c l u íd a , s e p a r ad a , g u e t i z ad a , e t c . ― n a e s c o l a r e g u l a r . É n e s s e s e n t i d o q u e
f r e q ü en t e men t e a c o n t e ce a q u i l o q u e p o d e s e r ch am a d o d e i n c lu s ã o e x c l u d en t e o u d e i n t eg r a ç ão s o c i a l
p e r v e r s a , i s t o é , a i l u s ã o d e s e r co mo o s d em a i s , o
p a r e ce r c o mo o s d em a i s , o q u e r e s u l t a n u m a p r e ss ã o
e t n o c ên t r i c a d e t e r q u e s e r f o r ç o s am en t e , c o m o o s
d em a i s . ( S K L I A R , 2 0 0 1 , p . 1 9 ) .
A Pol í t i ca de Incl usã o, na v i sã o ouv i nt i s ta [ 1 ] , é a mel hor
a l t erna t iv a pa ra a educa çã o dos s urdos . N o ent a nto, pa ra os
s urdos , ess a nã o é uma v erdade, j á que nã o ba s ta a penas
t ent a r i nt egra r surdos e ouv i nt es no a mbi ente es col a r. É preci s o, porém, a ument a r o número de recurs os v i sua is a fim de
fa ci l i t a r a a ces s ibi l i da de dess es s uj ei t os à vi da s oci a l , nã o s ó
na s es cola s, mas t ambém em res ta urant es , igrej a s , órgã os públ i cos , ent re out ros a mbi ent es de i nt era çã o humana .
Incl ui r os surdos em cl a ss es regul a res impl i ca uma educa çã o bi l í ngue. Mas, em s e t ratando das classes mult isseriadas [ 2 ]
da s es col as do campo de Ria chã o do J a cuí pe, Ba hi a , es ta real i da de nã o a cont ece, v is t o que es sa s es col as s impl esment e a col hem os a l unos surdos, porém os profes s ores a i nda não
pos suem nenhuma ca pa ci ta çã o em L í ngua B ras i l ei ra de Si na i s
( L IB RAS) , e ta mpouco há pres ença de i nt érpret es nas sa l as de
a ul a . E mesmo s e t iv ess e a pa rt i ci pa çã o de a mbos , a i ncl us ão/
i nt egra çã o nã o s eria ga ra nt i da de fa t o, v is t o que nã o há a a l -
J
Graduando, Feira de Santana, v. 2, n. 3, p. 11-25, jul./dez. 2011
13
fa bet i za ção des s es a l unos em sua l í ngua mat erna no cont exto
de ens i no das es cola s do ca mpo de Ria chão do Ja cuí pe, o que
di fi cul t a , port ant o, a comuni ca çã o/i nt era çã o e a aprendi za gem
da L í ngua Port uguesa , na moda l i da de es cri ta .
Com o des env ol v iment o do proj et o de pesqui s a “L í ngua
Port uguesa : prá t i ca s oci a l na comuni ca çã o ent re s urdos e ouv i nt es ”, foi pos s ív el perceber que mui to a i nda preci s a s er fei t o
na s es cola s do campo de Ri a chã o do J a cuí pe. Se os s urdos j á
s ã o excl uí dos da s oci eda de por a pres enta rem a pena s uma di fer ença l i nguís t i ca em rela çã o a os ouv i nt es , ima gi nem como dev e s e s ent i r um s urdo que res i de na zona rura l , nã o é
“compreendi do” por fami l i a res, col egas e profes s or, já que não
conhecem a L IB RAS.
N ão obs ta nt e, não ba st a a penas conhecer a l í ngua de s i na i s , pois os surdos, fi l hos de pa i s ouv i nt es que nã o conhecem a L IB RAS, comuni ca m - s e por “s i na is cas ei ros ” [ 3 ] . Independent e do gra u l i nguí s t i co, ess es s urdos compa rt i l ham das mes mas pecul i a ri da des e a pres ent am em s eu i nt eri or fa t ores i dent i t á ri os e cul t ura i s própri os . F oi emba sa ndo - se por es s es pres s upos t os que s e procurou s ens i bi l i za r e compa rt i l ha r s a beres
com os profes sores da s es col as pesqui sa da s , mos t ra ndo os
s urdos do pont o de v i s ta cul t ura l . Ass i m, a s urdez nã o fi cou
res t ri t a a o di s curs o da defi c i ênci a , ma s s im a o da di ferença .
N ess a pers pect iv a , Ra ngel e St umpf ( 20 04 ) a fi rmam:
O s u r d o v i s t o c o mo u m a d i f e r en ç a p r o p õ e o r e sg a t e
d o s u j e i t o s u r d o c o m o p e s so a c o m p l e t a . T a l c o n ce p ç ã o é c o n t r á r i a à p e r c ep ç ão co n se n su a l e eq u i v o ca d a
d e q u e a s u r d e z tr a n s f o r m a o su j e i t o s u r d o em u m
d e s a j u s t a d o . E s s e e s t e r e ó t i p o é u m a f a l s a r e p r e s en t a ç ã o d e u m a d a d a r e a l i d a d e , s e g u n d o a p ed a g o g i a d a
d i f e r e n ç a . ( R AN G EL ; S T UM P F , 2 0 0 4 , p . 8 6 ) .
Se a i nt enção das es cola s de Ria chã o do Ja cuí pe era a
de i ncl ui r os a l unos s urdos a fi m de nã o dei xá - l os excl uí dos ,
a pós a s ens i bi l i za çã o da t emá t i ca da s urdez por i nt ermédi o do
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proj et o de pes qui sa a pres enta do, es pera - se que es col as e
profes s ores procurem mei os de mel hor as s is t i r es s es s urdos .
Ca so cont rá ri o, mesmo s em sa ber, es ta rão excl ui ndo - os do
â mbi to es col a r, por não cons egui rem l ev a r em cons i dera çã o as
pecul i a ri da des l i nguí s t i ca s des s es a l unos .
O BJETIVO S DA PESQ UISA
O proj et o de pes quis a “L í ngua Port uguesa : prá t i ca s oci a l
na comuni ca çã o ent re s urdos e ouv i nt es ” cons t i t ui u- s e de est udos a cerca da a prendi za gem da l í ngua portuguesa es cri t a , no
que concerne à comuni ca çã o ent re s urdos e ouv i nt es . Comuni ca çã o, ness e cont ext o, ent endi da como medi a dora pa ra uma
i ns erçã o s oci ocul t ura l .
O es tudo bas eou- s e na concepção do ens ino de l í ngua
port uguesa pa ra s urdos ( Sa l l es , 2004 ) , reconhecendo a import â nci a da l ei t ura /es cri t a como mei o de comuni ca çã o ent re s urdos e ouv i nt es ; bas eou -s e também nos Es t udos Surdos em
Educa çã o ( Skl i a r, 20 0 5) , foca l i za ndo, a pa rt ir da di fe rença , as
i dent i da des, as l í nguas , os proj et os educa ciona i s , a hi st óri a , a
a rt e, a s comuni da des e as cul t ura s surdas . N o que t a nge ao
obj et i v o pri nci pa l , des ta cou -s e a importâ ncia de s e di s cut i r a
l ei t ura /es cri t a como mei o de comuni ca ção ent re s urdos e ouv i nt es, em duas es col as do ca mpo do muni cípi o de Ri a chã o do
J a cuí pe, v is t o que es sa s prát i ca s pos s i bi l i ta m que o a l uno s urdo v iv enci e out ra experi ênci a de comuni ca ção huma na , no que
s e refere à s nova s ma nei ras de s e expres sa r e de v er o
mundo.
Se o ens i no do port uguês es cri t o pa ra cri ança s s urda s ,
a t é hoj e, é bas ea do no ens i no do port uguês pa ra cri a nças ouv i nt es, de que ma nei ra a es col a ha bi l i t a seus a l unos s urdos
como l ei t ores , propi ci a ndo que a l í ngua port ugues a es cri t a , enqua nt o prát i ca s oci a l , cons t i tua - s e com o mesmo va l or pa ra
s urdos e ouv i nt es ? Qua i s a s prá t i cas pedagógi ca s que es tã o
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s endo ut i l i za das pa ra que o a l uno s urdo t enha um mel hor des empenho em s eu a prendi za do?
N a t enta t iv a de responder a ess es ques t ionament os , o
proj et o propos t o a tuava em pa rceri a com o Proj et o Conhecer,
Ana l i sa r e Tra ns forma r ( Proj et o CAT) , l ocado na Univ ers i da de
Es ta dua l de F ei ra de Sa nt ana ( UEFS) , que int egra o Programa
de Educa çã o do Ca mpo do Mov iment o de Orga ni za çã o Comuni t á ri a ( MOC) , com o i ntui t o de des crev er o funci onament o das
prá t i cas com l ei t ura e es cri t a num cont ext o de conheci ment o
da rea l i da de do ca mpo, a fim de i nt erv i r pa ra a t rans forma çã o.
O es t udo propos to, cont udo, procurou compreender o s uj e i t o s urdo e s ua s es t ra t égi as de a prendi za gem no us o do
port uguês es cri t o como forma de a l a rga mento da comuni ca çã o
ent re s urdos e ouv i nt es . Es t es , a pes a r de fal a rem o port uguês
como pri mei ra l í ngua , ou s ej a , como l í ngua ma t erna , t ambém
fi cam à ma rgem do proces s o educa ci ona l , uma v ez que a pres ent am di fi cul da des no port uguês es cri t o. Por cont a di ss o, es pera -s e que os modos de l er/es crev er de ca da grupo t ra gam
s emel ha nças qua nt o à funçã o s oci a l da l ei t ura e da es cri t a , em
s eu poder de t ra ns forma çã o s oci ocul t ura l .
REFERENCIAL TEÓRICO
Os s urdos s ã o int erpret a dos a pa rt i r de t emá t i ca s como:
l i ngua gem, i dent i da de e cul t ura , rev el ando -se pont os de v is t a
di fer ent es s obre a surdez, porém a l guns col oca m o s uj ei t o
s urdo como defi ci ent e. É preci s o ress a l ta r que a s urdez nã o é
nenhum obs tá cul o pa ra a prendi za gem de uma l i nguagem es cri t a . A l í ngua , ness e cont ext o, é um i ns t rument o de comuni ca çã o
e t ra ns forma çã o, e com um bom des envol v iment o do a prendi za do da l í ngua port ugues a , a comuni ca çã o ent re s urdos e ouv i nt es s erá fa ci l i t a da .
Concordo com Skl i a r ( 200 5) qua ndo el e enfoca a s urdez
como di ferença , porém como s i gni fi ca çã o [ 4 ] pol í t i ca e nã o s e
ref ere, port a nt o, a os di s curs os s obre a defi ci ênc i a . Pa ra fras e-
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a ndo Skl i a r, Sá ( 200 2, p. 1 1 ) enfa t i za que o reconheci ment o pol í t i co da s urdez, enqua nt o di ferença , pode se “t ra duzi r em ações que cons i derem os di rei t os dos s urdos enqua nt o ci da dã os e o reconheci ment o dos múl t i pl os recort es de s uas i dent i da des , l í ngua , cogni çã o, gênero, i da de, comuni da de, cul t ura
et c. ”
N o que s e refere à l í ngua, é vá l i do ress a l ta r que, hi s t orica ment e, a l í ngua de s i na i s é cons i derada apena s uma mí mi ca
ges t ua l . Os s urdos foram es t i gma t i za dos pel o fa t o de a pres ent a rem ca na l l i nguís t i co v i s ua l e comuni ca çã o a t rav és de ges t os
ou s i na i s , di ferent e dos ouv i nt es que di spõem da l i ngua gem
ora l .
As di s cus sões s obre a l i ngua gem de um modo gera l , quas e s empre, sã o emba sa da s no ca rá t er v erba l , uma v ez que é
es sa ca ra ct erí s t i ca que di st i ngue a l i nguagem humana dos s i st emas de comuni ca ção a ni ma l . Ent ret ant o, é i mporta nt e des ta ca r que a l i nguagem ges tua l é tã o compl exa qua nt o a v erba l ,
t endo em v i s ta que a l í ngua de s i na i s, s egundo a F EN EIS ―
F edera ção Na ci ona l de Educa çã o e Int egra ção dos Surdos [ 5 ] ) , é
compos t a de t odos os component es pert i nent es às l í ngua s ora i s . Al ém di ss o, as l í ngua s de s i na is , as s im como as ora is , apres ent am v a ria ções , v i s t o que na pri mei ra há muda nça s nos
s i na is a depender das comuni da des onde sã o us ados .
Pa ra Gol dfel d ( 20 02) , o t ermo l i ngua gem t em um s ent i do
mui t o a mpl o. Segundo a a ut ora , l i ngua gem “é t udo que env olv e
s i gni fi ca çã o, que t em um v a l or s emi ót i co e nã o s e rest ri nge
a penas a uma forma de comuni ca çã o. É pela l i ngua gem que s e
cons t i t ui o pensa mento do i ndiv í duo. ” ( GOLD FELD , 200 2, p. 1 8) .
Ges uel i ( 1 99 8) , por s ua v ez, ress a l ta que, a tra v és da l i ngua gem, é:
[ p o s s í v e l ] f a z e r a l e i t u r a d o mu n d o e co n se q u e n te me n t e a l e i t u r a d a p a l a v r a , m e smo p o r q u e
u m a n ã o a c o n t ec e s e m a o u t r a . E s s a s f o r m a s
d e l e i t u r a c o n s t i t u em - s e mu t u am en t e e t êm co -
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mo b a s e a l i n g u a g em q u e s e d á p e l a i n t e r a ç ão
social . (GESUELI, 1998, p. 117).
N o ca so da cri a nça s urda , a aut ora a fi rma que a s i gni fi ca çã o s e dá pel a l í ngua de s i na is e, porta nt o, t orna - s e de funda ment a l i mport ânci a pa ra o proces so de cons t rução da es cri ta.
Conforme a s duas concepções de l i ngua gem a borda das ,
bem como o s eu pa pel , ent endo que a l í ngua de s i na is poss i bi l i t a rá a i nt era çã o do i ndiv í duo com o mei o e s erá medi a dora da
s i gni fi ca çã o do mundo. N es sa propos i ção, s e o i ndi v í duo é um
s er s oci a l que fa z us o da l i nguagem pa ra i ntera gi r com o mei o
que o cerca , entã o, a cons equênci a dis s o, cons i s t i rá na const ruçã o de s ua i dent i da de. E, em s e t ra t ando dos i ndiv í duos
s urdos , a l í ngua de s i na i s ass ume gra nde rel ev â nci a no proces s o de cons t ruçã o da i dent i da de s urda .
Perl i n ( 1 9 9 8) , com ba s e em Ha l l ( 1 9 97 ) , ut i l i za a concepçã o
de i dent i da de pós - moderna pa ra s i t ua r o s uj ei t o s urdo, a qua l ,
no pont o de v i s t a des t a a ut ora , s eri a i dent i da des pl ura i s , múl t i pl a s . Ta l expl i ca çã o dev e- s e a o fa t o de exi s t i rem, s egundo
Perl i n, ci nco ca t egori a s de i dent i da des s urda s que i dent i fi ca m
os s uj ei t os s urdos : 1 ) i dent i da de s urda : a quela que cri a um es pa ço cul t ura l v i s ua l dent ro de um es pa ço cul t ura l di v ers o, ou
s ej a , recri a a cul t ura v i sua l , de ma nei ra a rei v i ndi ca r à hi s t óri a
a a l t eri da de s urda ; 2) i dent i da des s urdas hí bri da s : a quel a que
os s urdos que na s cera m ouv i nt es , com o t empo, t orna ram - s e
s urdos ; 3 ) i dent i da des s urda s de t ra ns i çã o: a quel a formada por
s urdos que v i v era m s ob o domí ni o da cul t ura ouv i nt e e, pos t eri orment e, pa s sa ram pa ra a comuni da de s urda ; 4 ) i dent i da de
s urda i ncompl eta : a quel a que os s urdos nega m a i dent i da de
s urda pel o fa t o de v i v er s ob o domí ni o da cul t ura ouv i nt e; 5)
i dent i da des s urdas fl ut uant es [ 6 ] : forma da s por s urdos que reconhecem ou nã o a s ua s ubj et i v i dade, porém d es prezam a cul t ura s urda e nã o t êm o compromis so com a comuni dade. Com
a ca ra ct eri za çã o des t as i dent i da des , perc ebe - s e a pres ença
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nã o homogênea e mul t i fa cet a da das i dent i dades des ta na t ureza .
É a t rav és do us o da l í ngua de s i na i s e com a i nt era çã o
ent re s urdo - surdo que há o fort a l eci ment o da i dent i da de s urda
e, cons equent ement e, o s urgi ment o de uma comuni da de s urda
que, na v i sã o de Tes ke ( 20 0 5) , é:
[ . . . ] u m co mp l e x o d e r e l a ç õ e s e i n te r l i g a ç õ e s so c i a i s ,
q u e d i f e r e m d e o u t r a s c o mu n id a d e s o n d e e x i s t e a
p o s s i b i l i d a d e d a co m u n i c a ç ão o r a l , p o i s a s p e s s o a s
s u r d a s n e ce s s i t a m d a l í n g u a d e s i n a i s e d a s e xp e r i ê n c i a s v i s u a i s p a r a r e a l i z a r em u m a c o mu n i c a ç ã o s a t i s f a tória com outras pessoas. (TESKE, 2005, p. 148).
O referi do a utor menci ona a i nda que o s i s tema de rel a ções fa mi l ia res s urdas di fere de uma s oci eda de ouv i nt e. Segundo el e, “é o pa rent es co cul t ura l , e nã o o fa mi l i a r cons anguí neo, que forma uma rel a çã o s oci a l surda a ut ênt i ca , a nã o s er
que t oda fa mí l i a s ej a s urda . ” ( TESKE, 200 5, 148) .
Cons i dero importa nt e que os pa is ouv i nt es que nã o conhecem a L IB RAS, a o des cobri rem que a cria nça é s urda , t enham oportuni dades de a prendê - l a , as s im, a primei ra l í ngua
des sa cri a nça s eri a as s egura da . Ca s o cont rá ri o, es sa s cri ança s t erã o poucas pos s i bi l i dades de conta t o com a comuni da de
s urda, v is t o que é por mei o do conta t o com out ros surdos,
nes sa s comuni da des , que s urgem, por exempl o, as a ss oci ações de s urdos , poss i bi l i t a ndo uma ma i or int era t i v ida de ent re
el es , a ss i m como, di s cus sões a res pei t o do bem es t a r de t odos , t a is como: cul t ura , educa çã o e t ra ba l ho e i ni ci a t i vas que
os a j uda rã o na bus ca de s eus di rei t os pera nt e a s oci eda de.
A i dent i dade s urda , por s ua v ez, cont ri bui pa ra cons t ruçã o de uma cul t ura s urda . Pa ra Skl i a r ( 2005) , o concei t o de
cul t ura t em de est a r l i ga do a t rav és de uma l ei t ura mul t i cul t ura l .
D ess e modo, fi ca cl a ro que a concepçã o de cul t ura nã o pode
es t a r res t ri ta s oment e à ques tã o da l í ngua , t a mpouco defi ni da
como um conj unt o de crença s e t ra di ções de um grupo det er-
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mi na do, mas que dev e s er percebi da como uma noção ba st a nt e compl exa.
Cons i dero que i dent i fi ca r a exis t ênci a de uma cul t ura surda nã o é uma ma nei ra de s egrega r os s urdos e os ouv i nt es . É
not óri o que os s urdos pa rt i ci pam da cul t ura ouv i nt e, mas é
preci s o a cei t á- l os com s ua s pecul i a ri da des que nã o s e resumem apenas a s ua l í ngua , embora es ta s ej a um t ra ço ma rca nt e, pri nci pa l , pa ra que s e i dent i fi que uma cul t ura . Porém, pa ra
a l guns a utores , “ass umi r a exi s t ência de uma ‘ cul tura s urda’ ,
t a nt o no i nt eri or da comuni dade s urda quant o no i nt eri or do
ca mpo de pes quis as uni v ers i t á ri o, i mpl i ca t ambém as sumi r uma
s epa ra çã o ent re s urdos e ouv i nt es . ” ( SAN TANA; BERGAMO,
200 5, p. 574 ) .
O fa t o de os s urdos fa zerem pa rt e de um grupo mi nori tá ri o, não s i gni fi ca dizer que a cul t ura ouv i nt e t em de domina r a
cul t ura s urda . Ent endo es ta cul t ura como s endo di ferent es formas de s ent i r, ent ender e repres enta r a rea l ida de. E no âmbi t o
es col a r, é i mport a nt e dest a ca r, ta mbém, a neces s i dade do respei t o à cul t ura surda , a fi m de a cei t a r os va lores mora is e ét i cos que guia m os comport ament os dos a l unos s urdos .
N o que t a nge a o ens i no de uma s egunda l í ngua , nes s e
ca s o o port uguês , de a cordo com a cons t ruçã o met odol ógi ca
a pres enta da por Sa l l es ( 200 2) , é preci s o dot a r os fa la nt es do
port uguês do conheciment o de L IB RAS “pa ra s ens i bi l i za r os
que v enham a ens i na r port uguês como s egunda l í ngua a fa l a nt es da L IB RAS de que a a quis i çã o de uma l í ngua nat ura l s e
proces sa de a cordo com mét odos própri os . ” ( SAL ES, 200 2, p.
33) .
N í di a de Sá es cla rece que “a ma i or pa rt e da s pol êmi cas
s obre a educa çã o dos s urdos s empre s e des envol v eu no âmbi t o dos ouv i nt es , ou, mel hor di zendo: qua ndo es t as s e des env olv em ent re os s urdos , el a s nã o s ão di fundida s ou cons i dera da s ” (SÁ, 2002, p. 1 2) . E cont i nua : “Soment e uma profunda dis cus sã o nas es col as , na s univ ers i da des, nas comuni da des , et c. ,
poderá permi t i r, num fut uro próxi mo, uma educa çã o s i gni fi ca t i -
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v a pa ra a s di ferenças . ” ( SÁ, 200 2, p. 1 2) . Percebe - s e ent ã o, em
rel a çã o ao hi s t óri co da educa çã o dos s urdos , que há um fra ca ss o que não é do s urdo, e s i m da comuni da de ouv i nt e que,
em s ua s uprema ci a , s empre defi ni u os rumos da educa çã o de
s urdos a t rav és de prát i ca s el a bora das dis t ant es da comuni da de s urda .
RESULTADOS
A i ns erçã o de um profes sor surdo de L IB RAS da i ns t i tui çã o e de um i nt érpret e, no grupo de pes qui sa L IN SP
( L i ngua gem, Soci edade e Produçã o do Conheci ment o) , cont ri bui u pa ra efet i va çã o do meu conheci ment o a cerca da s urdez e
da L IB RAS, a l ém da soci a l i za çã o do mes mo pa ra os dema i s i nt egra nt es da equi pe [ 7 ] , como ta mbém pa ra profes s ores, a l unos
( e a l guns fami l i a res ) da s duas es col as do ca mpo em que a
pes qui sa foi des envol v i da .
Inv es t i ga r o us o da l í ngua port ugues a , na moda l i dade escri t a , como forma de a la rgament o da comuni ca çã o ent re s urdos e ouv i nt es em Ria chão do Ja cuí pe cont ri bui u pa ra a v eri fi ca çã o da necess i dade de prá t i ca s que deem conta de uma aprendi za gem com i gua l da de, pa ra a ca pa ci t a çã o de profess ores
em L IB RAS e a cont ra ta çã o de i nt érpret es , poi s é di fí ci l o profes s or fazer o us o de out ras v ia s de ens i no s e nã o pos s ui o
dev i do conheci ment o da s pecul i a ri da des l i nguí s t i cas dos s urdos , s em perder de v is t a o fa t o de a t ua r em s a la mul t is s eria da ,
que é out ro probl ema.
N ess as es cola s, o aprendi zado da l í ngua port uguesa escri t a nã o s e cons t i t ui com o mesmo v a l or pa ra a l unos s urdos e
ouv i nt es , uma v ez que o at o de l er e es crev er va i mui t o a l ém
de uma mera decodi fi ca çã o: é uma prá t i ca s oci a l . Por fa l t a de
ca pa ci ta çã o, as prát i ca s pedagógi cas ut i l i zada s pel os profes s ores não cont empl am um mel hor des empenho no a prendi za do
dos a l unos s urdos , a t é porque ess es i ndiv í duos nã o foram a l fa bet i za dos em s ua l í ngua ma t erna ― a L í ngua Port uguesa .
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Cons i dera r a l í ngua numa pers pect iv a de prá t i ca s oci a l e
o s urdo do pont o de v i s ta cul t ura l é reconhecer o fa t o de a
s urdez nã o s er nenhum obs tá cul o pa ra aprendi za gem de uma
l i ngua gem es cri ta , ness e ca s o, a l í ngua portuguesa . Va l e l embra r que os s urdos a pres ent am a pena s uma di fer ença l i nguí s t i ca ― comuni cam- s e por s i na i s ― em rel açã o a os ouv i nt es .
L ogo, é i mpres ci ndív el que, em Ri a chã o do J a cuí pe ( as s im como em qua l quer l oca l i da de) , o a l uno surdo adqui ra i ni ci a lment e
a l í ngua de s i na is e s ó depois de a l fabet i zado pos sa a prender
uma l í ngua es cri ta como s egunda l í ngua, a fi m de fa ci l i t a r a comuni ca çã o com ouv i nt es que nã o conheçam a l í ngua de s i na i s ,
como ta mbém pa rt i ci pa r como membro a t i vo da soci eda de.
É pert i nent e ress a l ta r que o a mbi ent e pes qui s a do é um
a mbi ent e i nt ercul t ura l , uma v ez que os s urdos es t ão imers os
na cul t ura ouv i nt e. N o enta nt o, a rea l i za ção de uma ofi ci na sobre o conheci mento da surdez e da L IBRAS, rea l i za da em a çã o
i nt erv ent iv a , pôde s ens i bi l i za r os pa rt i ci pant es ( profess ores,
a l unos e fa mi l i a res ) de que os surdos, pa rti ndo do pont o de
v i s ta cul t ura l , pos s uem s oment e uma di ferença l i nguí s t i ca em
rel a çã o a os ouv i nt es . D ess a forma , houv e o reconheci ment o
dos s urdos como pes s oas di ferent es e nã o defi ci ent es , como
a credi t a o s enso comum.
N o que di z res pei t o à ques tã o i dent i t á ria e cul t ura l , v eri fi cou- s e a pres ença de i dent i da des s urda s e da cul t ura s urda .
A pa rt i r dos rel a t os de profess ores , a l unos e fa mi l i a res , percebeu- s e que os a l unos s urdos es t ão i ns eri dos na s “i dent i da des
s urdas fl ut ua nt es e emba ça da s ” ( PERL IN , 19 98) , ou s ej a , ess es
i ndi v í duos nã o ( re) conhecem de fa to a s ubj eti v i da de que l hes é
i nerent e, poi s nã o pos suem cont a t o com out ro s urdo pa ra descobri rem j untos o “mundo dos s urdos ”. Qua nt o ao a s pect o cul t ura l , v eri fi cou - s e o s i na l pess oa l ( nome de uma pess oa por
mei o de um s i na l ) que é da do por um s urdo. Com i ss o, percebeu- s e que os s urdos em ques tã o est ã o imers os na cul t ura
ouv i nt e, mas poss uem em s eu i nt eri or, mesmo que i ncons ci en-
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t ement e, a l í ngua de s i na i s ( nes t e ca s o, a L IB RAS, por mei o de
s i na is cas ei ros ) , ou s ej a , a i dent i da de surda e a cul t ura s urda .
Em uma da s es col as , s oment e a mã e de um dos a l unos
s urdos pôde est a r pres ent e, dev i do a o fa t o de a cri a nça es ta r
em repous o por conta de uma ci rurgi a ca rdí a ca que era de
i mportâ nci a v i t a l . Ma s o conta t o des sa mã e com os conheci ment os apres enta dos , como também com um s urdo ( o profess or- pes quis a dor) fez com el a ent endess e que o s eu fi l ho nã o
es t ava s ozi nho no mundo e que out ra s pess oas como el e exi s t i am e poderi am as cender - s e s oci a lment e. N a out ra es cola ,
ent ret a nt o, a a l una s urda pôde chega r a ess a concl us ão pess oa lment e, de modo a i nt era gi r com a equi pe e t roca r conheci ment os . Com i ss o, cons t a tou -s e a pres ença da L IB RAS nã o pa drão, ou s ej a , s i na is cas ei ros e/ou emergent es .
F oi a t rav és do cont at o com ess a a l una que pudemos
cons t at a r que o a prendi za do da l í ngua port uguesa s e dá de
ma nei ra merament e repres enta t i va , uma v ez que ela memori za
a l gumas s ent enças ou pa la v ras , cons egui ndo r es ponder a s a t iv i dades com o a uxí l i o de s ua profes s ora . Apes a r de es sa a l una t er s i do a l fa bet i zada , s egundo a sua profes s ora , com prá t i ca s que cont empl as s em o v i s ua l , o fa t o de nã o t er s i do a l fabet i za da em s ua l í ngua ma t erna fez com que el a s e t ornas s e
l et ra da na l í ngua port ugues a , e nã o a l fa bet i za da . Ess a s i t ua çã o
s ó fa z comprov a r que o a prendi za do da l í ngua de s i na i s primei rament e t orna - s e i ndi spensáv el , poi s , por i nt ermédi o da
mesma , é poss ív el fa zer uma l ei t ura do mundo a nt es mesmo
de s e pas sa r à l ei t ura da pa l av ra em l í ngua port uguesa .
As es cola s do campo de Ria chã o do Ja cuí pe es t ã o com
i nt eres s e no a prendi za do da L IB RAS, a fim de poder mel hora r
a comuni ca çã o com os a l unos s urdos e a primora r nov as prá t i ca s peda gógi cas pa ra o a uxí l i o no ens i no do port uguês. N o ent a nt o, s oment e com ess as v is i t as e obs ervações , nã o foi poss í v el fa zer propri ament e a col et a de produções es cri t as dos
a l unos surdos , j á que um dess es a l unos , por probl ema de sa úde/ci rúrgi co, nã o es tav a frequenta ndo a s aul a s , e a out ra por
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t er s i do a prova da pa ra a qui nt a s éri e ( s exto a no) nã o es t ava
ma is no âmbi t o do Proj et o CAT, t endo pa rt i ci pa do de nossa s
i nt erv enções a pedi do de s ua profes s ora anteri or.
Cont udo, no que concerne à di fusã o da s ens i bi l i za çã o da
s urdez e da L IB RAS, pude conta r com o Proj et o CAT, que deu
a oport uni da de da rea l i za çã o da ofi ci na “L etra mento, es col a e
t ra ns forma çã o soci ocul t ura l ” durant e o II Semi ná ri o Int ermuni ci pa l dos Coordena dores do CAT; com a pres ença de ma i s de
ci nquent a coordena dores nã o s ó do muni cípi o de Ri a chã o do
J a cuí pe, ma s também de Va l ent e, N ordest i na , Ichú, ent re out ros ; com a B i bl i ot eca Cent ra l J ul i et a Ca rt ea do da UEF S, por t er
a t endi do a l gumas de mi nhas s ol i ci t a ções de li v ros por i nt ermédi o de mi nha ori ent a dora , a profes s ora Carl a L uzi a Ca rnei ro
B orges , e com o N úcl eo de L ei t ura Mul t imei os da UEF S, por est a r dis post o a dis cut i r e a aprender s obre o “mundo” dos s urdos .
REFERÊNCIAS
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a s di ferenças . 3. ed. Port o Al egre, Media çã o, 200 5.
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NOTAS
[1]
T e r m o u t i l i z a d o p o r S k l i a r ( 2 0 0 5 ) . P a r a o a u t o r , o o u v i n t i s mo “ t r a t a - s e
d e u m c o n j u n t o d e r ep r e s en t a çõ e s d o s o u v in t e s , a p a r t i r d o q u a l o s u r d o e s t á o b r i g a d o a o l h a r - se e n a r r a r - s e c o mo s e f o s s e o u v i n t e ” ( S K L I AR , 2 0 0 5 , p . 1 5 ) .
[2]
C l a s s e s e m q u e h á v á r i a s s é r i e s j u n t a s , n e s s e c a s o , d a a l f a b e t i z a ç ão
a 4 ª s é r i e , e m u m ú n i co e s p a ço .
[3]
De acordo com Strobel (2008) , “s inais caseiros correspondem aos
g e s t o s o u c o n s t r u ç ã o s i m b ó l i c a i n v en t a d a s n o â m b i t o f a m i l i a r , é c o m u m
a c o n s t i t u i ç ã o d e u m s i s t e m a c o n v e n c i o n a l d e c o mu n i c a ç ão e n t r e m ã e o u v i n t e e c r i a n ç a - s u r d a ” ( S T R O B EL , 2 0 0 8 , p . 4 4 ) .
[4]
S k l i a r s i g n i f i c a a s u r d ez c o m b a s e e m q u a t r o n í v e i s d i f e r e n c i a d o s ,
p o r ém p o l i t i c a m en t e i n d ep en d en t e s : c o m o d i f e r en ç a p o l í t i c a , c o m o e x p er i ê n c i a v i s u a l , c a r a c t e r i z ad a p o r mú l t i p l a s i d en t i d a d es e , f i n a l me n t e , l o c a l i z a d a d e n t r o d o d i s cu r so d a d e f i c i ê n c i a ( S k l i a r , 2 0 0 5 ) .
[5]
A F E N E I S ( F e d er a ç ã o N a c i o n a l d e E d u c a ç ão e I n t e g r a ç ão d o s S u r d o s )
é u m a e n t i d ad e n ã o g o v e r n am en t a l , f i l i a d a à W o rl d F e d e r a t i o n o f t h e
D e a f . E l a p o s su i s u a m a t r i z n o R i o d e J a n e i r o e f i l i a i s e s p a l h a d a s p o r
d i v e r so s e s t a d o s b r a s i l e i r o s , a s a b e r , M i n a s G e r a i s , P e r n am b u co , R i o
Grande do Sul, S ão Paulo, Teófilo Otoni e Di strito Federal. Acesso a ela
p e l o s i t e : h t t p : / / www . f e n e i s . c o m . b r .
[6]
P e r l i n ( 2 0 0 5 , p . 6 5 ) e x p l i c a q u e “ f l u t u an t e ” é “ o t e r mo p r o p o s to p o r
M cL a r en ( 1 9 9 7 , p . 1 3 7 ) ” .
[7]
A professora Carla Luzia Carneiro Borges, o professor Marcíl io de
C a r v a l h o V a s co n c e l o s , o i n t ér p r e t e Gu s t a v o L e ão d e M e l l o C a r n e i r o , a
m e s t r an d a P a t r í c i a M ed e i r o s d e O l i v e i r a e a g r a d u a n d a L u z i a n e A m a r a l
de Jesus.
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ISSN 2236-3335
PRÁTICAS DE ENSINO NA SALA DE AULA
E ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA
Anna C arolina Machado Mendes
Licenc iatura e m Le tras Ve rnáculas
[email protected]
Danielle Evangelista Batista
Licenc iatura e m Le tras Ve rnáculas
rosaelle [email protected] om
Fe rnanda dos Santos Almeida
Licenc iatura e m Le tras Ve rnáculas
[email protected] om
Jamile de Jesus Anunciação
Licenc iatura e m Le tras Ve rnáculas
[email protected]
Pollyana Souza Ce rqueira
Licenc iatura e m Le tras Ve rnáculas
[email protected]
T ai ja ra Sa nt os do s Sa nt os
Licenc iatura e m Le tras Ve rnáculas
[email protected]
Res umo : O a rt i go com a t emá t i ca Práticas de e nsino na sala de
aula e o ensino de L íngua Portuguesa bus cou, a t ra v és d e um
es t udo qua l i t a t iv o, a na l i s a r a prá t i ca peda gógi ca dos profes s ores de uma es col a muni ci pa l de F ei ra de Sa nt a na , obs erv ando
o exercí ci o da s a ul a s de L í ngua Port uguesa e os recurs os t ra ba l hados em s a l a . Pa ra t a nt o, foca l i zamos o proces s o de ens i no e a prendi za gem pa ra a cons t rução de c i da dã os crí t i cos , em
cons onâ nci a a os as pect os que dev em s er a t ri buí dos a o profes s or de L í ngua Port ugues a , s endo es t e um mot i v ador na
cons t rução do conheci ment o de s eus a l unos .
Pa l av ras- chav e: Prá t i ca docent e. Ens i no da L í ngua Port ugues a.
Prá t i cas na sa l a de a ul a .
Abs t ra ct : The a rt i cl e ‘ Tea chi ng pra ct i ce i n t he cl a ss room a nd
t he t ea chi ng of Port ugues e’ s ought t o exa mine t he peda gogi ca l
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pra ct i ce of t ea chers i n a publ i c s chool i n F ei ra de Sa nt a na
t hrough a qua l i ta t i v e s t udy, obs erv i ng t he conduct o f
Port ugues e l a ngua ge cl a ss es a nd t he res ources us ed i n t he
cl a s s room. To t hi s end, we focus on t he proces s of t ea chi ng
a nd l ea rni ng for t he cr ea t i on of cri t i ca l c i t i zens , i n a ccorda nce
wi t h fea t ures t ha t s houl d be a t t ri but ed t o a t ea cher of
Port ugues e, t hi s bei ng a mot i va t or i n t he bui l di ng of knowl edge
of t hei r s t udents .
Keywords: Teaching practice. Teaching of Portuguese. Classroom
practi ce.
INTRO DUÇÃO
A D i dá t i ca como met odol ogi a de ens i no s us ci t a s empre a
i nv es t i ga ção das a t iv i da des educa t iva s pa ra que ha j a uma mel hor a borda gem de t ema s dent ro de a mbi ent es de i nt egra çã o
s oci a l , como por exempl o, a es col a . Temos como i ni cia t i va ,
nes t e t ra ba l ho, t ra zer a probl emá t i ca das Prát i ca s de Ens i no na
s a l a de a ula e ens i no da L íngua Port uguesa, ou s ej a, de que
forma s ão rea l i za das com o propós i to de gara nt i r o a prov ei t ament o dos cont eúdos por pa rt e dos a l unos .
A prá t i ca de ens ino de L í ngua Portuguesa t em a t enção
es peci a l nes t e t ra ba l ho, por s e t rat a r de um ca mpo onde o que
dev e s er a borda do na s a l a de a ul a s e t orna cruci a l pa ra o
proces s o de ens i no -a prendi za gem, pois qua ndo t ra t amos de
ens i no da gra má t i ca na t roca de conheciment os ent re a l uno profes s or, obs erva mos que os docent es deixa m a des ej a r no
que s e refere a o a l ca nce dos obj et iv os educa ci ona is des t e
component e curri cul a r. Ta i s docent es, mui tas v ezes , nã o di spõem dos recurs os necessá ri os pa ra o es t ímul o de ens i no da
di s ci pl i na dent ro do a mbi ent e es col a r e, consequent ement e, nã o
cons eguem a t ra i r a a t ençã o dos s eus a l unos .
Ass i m, Ri bei ro ( 19 92, p. 81 ) a fi rma que:
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A f a l t a d e d i m en s ão a f e t i v a d o s p r o f e s so r e s co m a
g r am á t i c a d i f i c u l t a a d e f e s a d o s e u e n s i n o e o e s fo r ç o p o r p a r t e d o a l u n o . N e s s e amb i e n t e co m p o u c a
e s t i mu l a ç ã o , c o m e s c a s so s r e cu r so s m a t er i a i s e o n d e
a s a t i v i d a d e s s ã o p o u co d i v er s i f i c a d a s e e x e r c i d a s d e
f o r m a a u to m a t i z ad a , d e s en c ad e i a - s e u m s e n t i m en t o d e
a v e r s ã o e r ep u l s a p e l a g r am á t i c a .
Out ro probl ema que pode s er a pont ado, pa ra o qua l mui t os profes s ores nã o s e a t enta m, é a fa l ta de s i gni fi ca ção do
t ra ba l ho des env olv i do em sa l a de a ula que, conforme Ba ss o
( 1 9 9 8, p. 19 ) , desva l ori za a prá t i ca docent e: “A rupt ura ent re
s i gni fi ca do e s ent i do t orna s eu t ra ba l ho a l iena do, compromet endo ou des ca ra ct eri za ndo a a t iv i da de docent e. ”
Ta i s refl exões t êm gra nde i mportâ nci a nã o s ó dent ro do
a mbi ent e es col a r, ma s na forma çã o cont i nua da do i ndiv í duo
que es t á i ns eri do numa soci eda de. Soci edade es t a que dev e
ofere cer, t ambém, condi ções que poss i bi l i t em a o a l uno ampl i a r
os s eus conheciment os mui t o a l ém do que l he é a pres enta do
em sa l a de a ula , como ress a l ta Ma rt i ns ( 19 97, p. 1 1 1 ) : “Ins eri dos
no cont ext o em que v iv emos e na rea l i dade ma ni fest a em noss o pa í s , dev emos cri a r condi ções pa ra que os a l unos s e t ornem ci da dã os que pens em e a t uem por s i mes mos ”.
D ess a forma , obs erv a - s e que o t ema em a nál i s e é de s uma importâ nci a pa ra t oda s oci eda de, em es peci a l , pa ra os fut uros profess ores i nt eress a dos em bus ca r a s mel hores a l t ernat i v as que proporci onem aos nos s os a l unos um ens i no de qua l i da de, vol t a do nã o só pa ra a cons t ruçã o do conheci ment o, mas
t a mbém pa ra a forma çã o de ci da dã os crí t i cos . Da da a s ua i mport â nci a, dev e -s e refl et i r a cerca da efi cá ci a das prá t i cas de
ens i no ut i l i za das na s es col as pel os docent es , v i s t o que es t es
podem ava l i a r o ní v el de a preens ã o de conheci ment os por pa rt e dos a l unos . D e a cordo com Ri bei ro ( 1 99 2, p. 84 ) , “A s i mpl i fi ca çã o do t ra ta ment o da do à gramá t i ca ― s uperfi ci a l i da de ―
t ra z como cons equência obs ervá v el a di fi culda de de i ncorporaçã o dos novos concei t os a o referenci a l t eóri co que o a l uno j á
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t em”. A defas agem do ens i no de gramát i ca , o qua l , por s er superfi ci a l e fragmenta do, mos t ra -s e s em s i gni fi ca ção pa ra os
a l unos e, as s im s endo, t orna - s e pa ra el es , difí ci l de a prender.
D i a nt e de t a nt os probl emas educa ci ona i s ; s urgi dos há
t a nt o t empo que chegam a s er s oci a lment e a cei t os , a s s ol uções pa recem dis t a nt es . N o ent a nt o, Vi ei ra et a l . ( 20 10 ) v eem
na abordagem t ra ns v ers a l uma boa a l t erna t iv a pa ra o ens i no
de L í ngua Port uguesa e a forma çã o de i ndiví duos pensa nt es e
ref l exi v os , uma v ez que os t ema s a bordados nas v a ria das dis ci pl i na s ― a exempl o de ét i ca, mei o ambi ent e, ori ent a çã o s exua l , ent re out ras ― t rat am de quest ões s oci ai s e, s endo a ss i m,
a proximam -s e da rea l i da de dos a l unos , o que fa vorece o env olv i mento des t es e ret ém s ua a t ençã o l ev ando -os , cons equent ement e, a refl et i r s obre o que est á s endo est uda do. Em
cont ra pa rt i da , os res ul ta dos da pes qui sa rea l i za da por Vi ei ra et
a l . ( 20 10 , p. 27 ) , ev i denci am o des prepa ro dos profes s ores de
L í ngua Port ugues a pa ra t ra ba l ha r t emas t ransv ersa i s em s a la
de a ul a :
N ã o p o d e r em o s f o r m a r c i d ad ã o s p en s a n t e s , c r í t i c o s e
r e f l e x i v o s , s e m in i s t r a r m o s au l a s d e l í n g u a m a t e r n a ,
q u e u s a m o t e x t o a p en a s c o m o p r e t e x t o p a r a o e n s i n o d e g r am á t i c a o u d e l e i t u r a e i n t e r p r e t a çõ e s s u p e r f i c i a i s . É n e c e s s á r i o p r im e i r o m u n i r o p r o f e s s o r d e
c o n h e c i me n to t é c n i co e d id á t i c o , d e co n s c i ê n c i a c r í t i c a e c i d ad ã .
D efenderemos a i dei a de que podemos , dentro da s a la de
a ul a , s us ci t a r uma mel hor a borda gem de di v ersa s t emá t i cas .
Tra t a remos, pri nci pa l ment e, das prá t i ca s que envol v em o ens ino da L í ngua Port uguesa ut i l i za ndo recurs os que prendam a
a t ençã o dos a l unos ga rant i ndo o s eu a prendi za do e que, ao
mesmo t empo, proporci onem a s at i s fa çã o dos profes s ores .
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METO DO LO GIA
A fi m de a l ca nça r o obj et i vo propos t o por nos sa pes qui s a , que t em cunho qua l i t at i v o, ut i l i zamos como i ns t rument os de
col et a de da dos a obs erv a çã o do a mbi ent e, o regi s t ro fot ográ fi co e a ent rev i st a .
N os s o ca mpo de i nv es t i ga ção é uma es cola muni ci pa l , l oca l i za da na ci da de de F ei ra de Sa nta na , que a qui v amos nos
di ri gi r pel a s i ni ci a i s E. J . P. A i ns t i t ui çã o é uma s ede conv eni ada ent re os pa dres j es uí ta s da AN I ( Ass oci a çã o N a ci ona l de
Ins t ruçã o) que oferecem o es pa ço onde es tá s i t ua da a es col a ,
e a mão de obra . A res pons abi l i da de pel o corpo de profes s ores , a merenda es col a r e o ma t eria l di dá t i co ut i l i za do fi ca sob a
res ponsa bi l i dade prefei t ura l oca l .
A v i s i t a à es cola foi rea l i za da em um dia , nos t urnos ma t ut i no e v es pert i no com dura çã o de s ei s hora s . Qua nt o a o espa ço fí s i co, a es cola pos s ui á rea ampla , arej a da , com sa l a s
bem proj eta das , um l oca l es col hi do pa ra o la zer da s cria nças ,
á rea v erde, bi bl i ot eca a berta pa ra us o dos a l unos no horá ri o
de a ula , cons ul t óri o ut i l i za do pela ps i copedagoga pa ra o a t endi ment o necess á ri o às cri a nças que exi gem uma at ençã o es pecia l , sa l a de i nformát i ca , di ret ori a e ca nt i na .
Pa ra col eta r as i nforma ções , foram rea l i za das ent rev is ta s
com oi t o s uj ei t os , s endo qua t ro a l unos , a coordena dora peda gógi ca , duas profess oras e a ps i copeda goga .
Os qua t ro a l unos s upra ci t a dos es tã o ma t ri cul a dos na 4 ª
s éri e ( 5º a no) do ens i no fundament a l e a present a m i da de ent re
nov e e onze a nos , s endo dois do s exo ma s cul i no e doi s do
s exo femi ni no. A est es fi zemos pergunt as que di zem res pei t o
t a nt o a o envol v iment o dos mesmos dura nte a s a ula s como
com a es col a em gera l :
1 . Gos tam de es tuda r? Por quê?
2. O que a cham ma is i nt eress ant e na es col a?
3. Qua l a rel a çã o ent re os a l unos e a profess ora ?
J
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4 . Gos tam das aul as ? ( das a t i v i da des s ol i ci tada s )
5. As a ul as s eguem uma rot i na ? Como é fei ta ?
6 . A profes s ora t ra ba l ha com t ext os ? Qua is ?
7 . O que a cha i nt eress ant e nas aul a s de L í ngua Portugues a?
8. O que poderi a s er a cres cent ado nas a ul a s pa ra que
el a s s e t ornas s em mel hor?
As profes soras poss uem i dade ent re v i nt e e qua renta a nos , t êm o ma gi s t éri o como s ua primei ra forma çã o e es t ão
curs a ndo o pri mei ro s emes t re de peda gogi a , a mbas di s põem de
experi ênci a docent e.
Ass i s t imos às a ul as nas t urmas do 5° a no e l ogo a pós
ent rev i s tamos as profess ora s . As pergunt as fei t a s foram à s
s egui nt es :
1 . Qua l é a sua forma çã o a ca dêmi ca ?
2. Em que s ua forma çã o a j uda na s prá t i cas de ens i no na
s a l a de a ula ?
3. A es col a t em um proj et o pol í t i co pedagógi co? J á t ev e
a ces so a el e?
4 . Qua nt os a l unos a t urma poss ui ?
5. As a ul as s eguem uma rot i na ? Como é fei ta ?
6 . Ut i l i za pl a no de a ula ? Como é fei t o?
7 . Como s eus pl a nos de a ul a cont ri buem pa ra a permanênci a dos a l unos na es cola ?
8. Qua i s sã o a s t écni cas que ma i s ut i l i za na s a ula s pa ra
que os a l unos mos t rem - s e ma is i nt eress a dos e poss am
a l ca nça r os obj et iv os de a prendi za gem propos t os pel os
PCNs ? Como sã o des env ol v i das as aul a s de l í ngua portugues a?
9 . Como ut i l i za r o conheci mento da l í ngua port uguesa na
s a l a de aul a de forma que os a l unos s e i nt eres s em pela s
prá t i cas grama t i ca i s?
A coordena dora poss ui forma çã o em peda gogi a e orga niza t odo o t ra ba l ho proj et a do prev i ament e pa ra mel hor rea l i za-
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çã o da s a t iv i dades es col a res, a el a foram fei t a s a s pergunta s
a ba i xo:
1 . Como é rea l i zado o Proj et o Pol í t i co Peda gógi co da es col a ?
2. O Proj et o é cons t ruí do de que forma? É cons t ruí do
com a pa rt i ci pa çã o dos profes s ores ?
3. Os profess ores t êm o di rei t o l i v re de opina r na cons t ruçã o do proj et o da es col a?
4 . Qua i s s ão as pri ori da des pa ut adas pa ra a rea l i za çã o
des t e proj et o? As neces s i da des dos a l unos ? As neces s ida des do corpo docent e?
5. Como o es pa ço da es col a é ut i l i zado de acordo com o
Proj et o Pol í t i co Peda gógi co?
6 . Que t i po de ori enta çã o é dada a os profes s ores pel a
coordena ção da es col a pa ra a cons t ruçã o dos pla nej ament os de aul a ?
A ps i copeda goga poss ui a forma çã o em peda gogia e es peci a l i za çã o a dequa da pa ra a funçã o que exerce na i nst i t ui çã o,
a el a foram fei t as os s egui nt es ques t i ona ment os :
1 . Exi s t em na es col a cri a nça s que preci sam de a t ençã o
di fer enci a da ?
2. Como é fei t o o a t endi ment o a es s es est uda nt es ?
3. Exi s t e um l oca l na es col a pa ra o a t endiment o des t es
es t udant es ?
4 . Qua is os recurs os ut i l i za dos pa ra rea l i za r um t ra ba l ho
de qua l i dade com os a l unos ?
A PRÁTI CA D OCEN T E E O EN SIN O D A LÍ N GUA PORT UGUESA
A prá t i ca docent e v em a s er o des env olv i ment o do conheci ment o e de out ra s ha bi l i da des por mei o da i nt era çã o ent re profes s or e a l uno.
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A es s e concei t o, a l guns a ut ores s oma m divers os out ros ,
t ent a ndo defi ni r um t ra ba l ho, cuj a ampl i t ude é ca pa z de i ncorpora r a t odos el es . Ga rci a (a pud Ri bei ro, 200 9 , p. 6 2) a credi t a
que “o ens i no é uma a t iv i dade i nt enci ona l , des env ol v i da num
cont ext o orga ni za do e i ns t i t uci ona l , a qua l pres s upõe uma i nt era çã o ent re forma dor e formando, obj et iv a a muda nça e cont ribui pa ra a profi s s i ona l i za çã o de s uj ei t os . ”
D e forma s emel ha nt e, L i bâ neo ( 19 90 , p. 17 ) , a fi rma que o
t ra ba l ho docent e é pa rt e i nt egra nt e do proces s o educa t iv o pel o qua l a s pess oa s recebem prepa ra ção pa ra que possa m pa rt i ci pa r at i vament e da s oci edade: “A educa çã o ― ou s eja , a
prá t i ca educa t iv a ― é um fenômeno soci a l e uni v ersa l , s endo
uma at i v i da de huma na necess á ria à exis t ênci a e funci onament o
de t odas as s oci eda des . ”
É pert i nent e di zer que a s prá t i cas docent es s ã o de gra nde rel ev ânci a pa ra o cres ci mento do ques t i ona ment o e pos i ci ona ment o do di s cent e. O a l uno pa ss a a i r à bus ca de cons t ruçã o de concei t os a pa rt i r dos s eus conheciment os e dos conheci ment os l a nçados prev i ament e pel o profes s or, e, t rabal ha ndo com t ema s t ra nsv ersa i s , o a l uno aprende t ambém, a
fa zer correl a ções de t emá t i ca s a borda da s na s a la de a ul a e
a ss unt os a pres ent a dos pel o cot i di a no. Ass i m a fi rma Vi ei ra et
a l . ( 20 1 0, p. 27 ) que:
O s p r o f e s s o r e s e a s e s c o l a s p r ec i s a m e n t en d e r q u e
a o s e t r a t a r d e u m a s s u n t o d en t r o d e u m a d i s c i p l i n a ,
pode-se lançar mão de outros assuntos/
c o n h e c i me n to s , p a s s a n d o d e u m a c o n ce p ç ã o f r ag me n t á r i a p a r a u m a c o n ce p ç ã o m a i s a mp l a d o co n h e c i me n t o , e m q u e s e a p o n t a à c o n s t r u ç ã o d e u m a e s co l a
p a r t i c i p a t i v a e d e c i s i v a p a r a a f o r m aç ã o d o su j e i t o
social.
Ass i m s endo, é neces sá ri o um mel hor reconheci ment o
da s prá t i cas peda gógi ca s do profess or, i ncent i v a r que o docent e s ej a dent ro da s a l a de a ula um “l eque” de nov i da des pa -
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ra que o a l uno rea l i ze bem no ambi ent e soci a l fora da es col a o
que el e a prende de forma cont ext ua l i za da dent ro da mesma .
Obs erv ando os as pect os da s prá t i ca s docent es rel a ci ona da s à
l í ngua port uguesa es ta cont extua l i za çã o s e t orna a i nda ma is
i mporta nt e, pois , Vi ei ra et a l . ( 20 10 , p. 27 ) a pont a que os
p r o f e s s o r e s d e L í n g u a P o r t u g u e s a , f o c an d o o s t e m a s
t r a n s v er s a i s em a u l a s d e l e i t u r a , t r a z em u m a n e c es s i d a d e p a r a q u e o e x e r c í c i o d a c i d ad a n i a o c o r r a d es d e
a infância, pois a expectativa é que o aluno possa
p en s a r o t e x t o p a r a a v i d a .
Em cons onâ nci a a os a s pect os que dev em s er a t ri buí dos
a o profes sor de l í ngua port uguesa e à s prát i ca s docent es em
gera l surgem os PCNs ( Pa râmet ros Curri cul a res N a ci ona i s ) , responsáv ei s por t ra zer es ta cont ext ua l i za çã o pa ra a v i da do di scent e, que dev e a prender a pa rt i ci pa r a t iva ment e do que acont ece no mundo, a prender a ques t i ona r e a refl et i r de forma
a ut ônoma o que l he é ofereci do como a prendi za do.
Os PCNs desde a déca da de 1 980 a pont am que a ma i or
di fi cul da de de aprendi zagem dos a l unos es tá na forma com ess es s ã o a l fa bet i za dos e, pos t eri orment e, nas s éri es que s e s eguem el es nã o cons eguem fa zer o us o corret o da l i ngua gem.
Es t e proces so a cont ece, pri nci pa lment e, porque o docent e não
l ev a em cons i dera çã o os conheci ment os prév i os dos a l unos
pa ra que s ej am t ra ba l hados o nív el es t rutura l e de i nt erpret a çã o da l í ngua . Por i ss o, os PCN de L í ngua Port uguesa ( 19 97 , p.
1 5) a fi rmam que, “[ . .. ] as cri a nças s a bia m muit o ma i s do que s e
poderi a s upor a t é entã o, que el as nã o ent ra vam na es col a
compl et ament e des i nforma das , que poss uí am um conheci mento
prév i o”.
Ass i m, ent ra ndo em cena no cont ext o es cola r, a a prendi za gem no model o cons t rut iv i s ta que defende que, “o conheci ment o não é concebi do como uma cópi a do rea l , i ncorpora do
di ret a ment e pel o s uj ei t o, press upõe s im uma a t i v i da de, por pa r-
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t e de quem a prende que orga ni za e i nt egra os nov os conheci ment os a os j á exi s t ent es ” (W EISZ; SANCHEZ, 200 2, p. 58) , ou
s ej a , o dis cent e pa ss ou a s er o cons t rut or e a primora dor dos
s eus conheci ment os .
É not óri o que a pa rt i r das muda nça s exi gidas pa ra mel hor
rea l i za çã o da s prá t i cas pedagógi cas , a l gumas i dei a s v êm a
conv ergi r, pois é necess á ri o empenho dos profes s ores e também pa rt i ci pa çã o a t i va dos a l unos , s endo que a i nda ent ra no
proces s o o i nt eress e dos fa mi l i a res , di ret ores , coordena dores
peda gógi cos e de t odos que fazem a es col a funci ona r. Conforme Thoma zi e As i nel l i ( 20 09 , p. 1 82) , “a a çã o de pla nej a r ul t rapa ss a o pl a neja ment o propria ment e di t o, pois i mpl i ca as rel a ções de poder que s e es ta bel ecem ent re os a t ores da i ns t i t ui çã o es col a r. ” E cont i nua a di zer que, “o planej a ment o ao mesmo t empo refl et e e i nt erfere nas rela ções ent re: di reçã o, s uperv i sã o, profes s ores , a l ém de a l unos e de sua s fa mí l i as ”.
Sa be- s e que pa ra muda r é neces sá ri o recons t rui r a prá t i ca peda gógi ca . Es ta muda nça , com cert eza , é gra da t iva , ou
s ej a , a cont ecerá a os poucos , e, pri nci pa l ment e, pa ra que el a
a cont eça , o profess or, dent ro da s a la de aul a , dev e fa zer a
s ua pa rt e, mos t ra r a os s eus a l unos a t ra v és de recurs os que
prendam a s ua a t ençã o que es t uda r e, pri nci pa l ment e, es tuda r
a L í ngua Port ugues a , s e torna mui t o ma is i nt eres s ant e qua ndo
o conheci mento é compa rt i l ha do e cons t ruí do em cons onâ nci a,
l ev a ndo em cons i dera ção o mundo l á fora que t ra z as s ua s
i nt erfe rênci a s no ambi ent e es col a r.
TEORIA E PRÁTICA: UMA PROPOSTA DE ENSINO
A a prendi za gem é um proces so que ocorre de forma i nt era t i va . Pa ra Pia get ( a pud Abi b, 20 03) , o própri o s uj ei t o é
quem fa z a orga ni za çã o do conheci ment o, acomoda ndo e a ss i mi l a ndo, i s t o é, a pess oa orga ni za as i dei as a prendi da s a pa rt i r
da s es t ruturas que já pos sui . Vygot s ky ( 1 9 89 ) enfa t i za o pa pel
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s oci a l como s endo um fa t or i mport a nt e pa ra que o s uj ei t o a dqui ra conheciment o. D ess a forma , a es col a, a t rav és da fi gura
do profes s or, i rá fa zer as i nt erv enções neces sá ri a s pa ra que
o i ndi v í duo const rua os conheci ment os .
Como forma de conhecermos as prát i ca s na s a l a de a ul a
e ma i s es peci fi ca ment e o ens i no de L í ngua Port uguesa , opta mos por fa zer ent rev i st as , como já foi di to, nã o a penas com
a s profess oras , ma s com a l guns a l unos ( que s erã o referi dos ,
a qui , como: A1 , A2, A3 e A4 ) e a coordenadora peda gógi ca de
uma es cola da rede muni ci pa l de ens i no, a fi m de confronta r
a s i deia s pos ta s pel os mes mos e a pont a r formas que cont ri bua m pa ra o proces s o de ens i no - a prendi za gem dos a l unos .
As profess oras ent rev is t a das rel a ta ram que o curs o de
peda gogia nã o fornece mui t os mét odos que a s a j udem na prá t i ca em s a la de a ula e o que a prenderam foi no curs o de ma gi s t éri o “. . . N o curs o de peda gogi a é ma i s teori a . A prá t i ca na
s a l a de a ula é i ndi v i dua lment e, pel o menos por enqua nt o que
es t ou no 1 º s emes t re”. El as col oca ram o curs o de peda gogia
como nã o s endo a l go út i l pa ra suas prá t i ca s, j á que nã o v eem
como a pl i ca r as t eoria s es t uda das .
N o ent ant o, Ga dot t i ( 20 01 , p. 253) que des crev e a pos i çã o
de Pa ul o F rei re, chama a a t ençã o pa ra a neces s i dade de uma
reori ent a çã o const a nt e da s t eori as educa ciona i s a pa rt i r da
ref l exã o da prá t i ca . El e di z que “educa dor e educa ndo a prendem j unt os numa rel a çã o di nâmi ca, na qua l a prá t i ca é ori ent a da pel a t eori a , que reori enta es sa prá t i ca , num process o de
cons t ant e a perfei çoament o”. Por i ss o, pa ra que ha j a uma prá t ica pa uta da na t eori a é neces sá ri a uma forma çã o s ól i da pa ra
que o profes sor s e aprofunde e v eja a s a la de a ul a como um
a mbi ent e em que s e fa z es col ha s t eóri cas impres ci ndí v eis . Ai nda s obre t eoria e prá t i ca , F rei t as ( 19 88, p. 1 19 ) di z que: “Teori a
e mét odos sã o fundamenta i s , mas perdem s ua ra zã o qua ndo
des v i ncul a do da prá t i ca e t eori a , poi s t oda prá t i ca educa t iv a
i mpl i ca uma t eori a educa t i va ( a inda que não cons ci ent e) ”.
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D ess e modo, é importa nt e que o profes s or tenha a consci ênc i a de qua i s t eoria s gui am s ua prá t i ca, porque os a j uda rã o
a fa zer a s es col has adequadas a ca da cont ext o.
O pl a no de a ul a é o mei o pel o qua l o profess or t em a oport uni dade de orga ni za r e post eri orment e por em prá t i ca s uas
i dei a s , l eva ndo em cons i dera ção a rea l i da de de s eus a l unos ,
mas es s e i ns t rument o dev e s er a j us ta do conforme o proj et o
pol í t i co peda gógi co da es col a na qua l es tá i ns eri do.
A coordenadora rel a tou que há reuni ã o uma v ez por s ema na , na qua l s ã o la nçadas propos t as , i deia s et c. , de como
t ra ba l ha r em s a la de a ula , sobre um det ermi na do t ema e os
profes s ores di zem s e conv ém, s e est ã o de a cordo com a real i da de de s ua t urma , “( . . . ) at é porque el es serã o quem es t a rã o
em ma i or cont at o com os a l unos , ent ã o s a berã o como a rruma r
a sa l a de forma di ferent e ou rea l i za r uma ati v i da de de a cordo
com a neces s i da de da t urma. ”
Pergunt amos às profes s ora s s e conhecem o proj et o pol í t i co peda gógi co da es col a , mas el as di ss eram que “a i nda nã o”.
Cont udo, rel a ta ra m que os pl anos sã o fei t os pel os profes s ores ,
uma v ez por s ema na , s endo es t es ori ent ados pel a coordenadora peda gógi ca como j á foi menci ona do: “Um dia da s ema na
os profess ores s e reúnem pa ra fa zer o pla nej ament o com a
ori ent a çã o da coordena dora ”. D i ss eram t ambém, l eva r em cons i dera ção o mei o no qua l s eus a l unos es tã o i ns eri dos , i nt roduzi ndo, s empre, aos s eus pl a nos o us o de “t ecnol ogi a s i ndependent es e dependent es , ca rt a zes , t el ev i s ão. . . ”
Ca be a o profess or cria r es t ra t égia s que proporci onem o
a prendi za do e que es t e s ej a pra zeroso. Os j ogos e bri ncadei ra s s ã o el ement os importa nt es pa ra que haj a a propria çã o do
conheci ment o. N o ent ant o, os a l unos rel a ta ram que a profess ora nã o ut i l i za j ogos na s a ul as “gos t o de es t uda r, ma s a cho que
a s a ula s s eri am ma is i nt eres sa nt es s e a profes s ora ut i l i za ss e
j ogos ( . .. ) dei xa ss e de s er i gnora nt e, porque el a gri ta mui t o”
A3. “Gos t a ria que el a fi zess e ma i s bri nca dei ra s ” A4 . O que
cont ra di z a fa l a das profess ora s ci ta das ant eri orment e.
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O us o de j ogos peda gógi cos é um dos recurs os que o
profes s or dev e ut i l i za r como es t ra t égi a no proces s o de ens i no
e a prendi za gem, pois el es cont ri buem e enri quecem o des env olv i mento i nt el ect ua l e s oci a l do educa ndo. D e a cordo com
Morat ori ( 20 03, p. 11 ) , “o j ogo s e apres enta como uma a t iv i da de
di nâ mi ca s at i s fa zendo uma neces s i da de da cri a nça , propi ci a ndo
um ambi ent e fa voráv el e que l ev e s eu i nt eres s e pel o des a fi o
da s regra s i mpos ta s por uma s i t ua çã o ima gi ná ri a . ”
Qua nto à forma de cons t rui r o conheci mento, a s profess oras di s s eram que os conheci ment os de L í ngua Port ugues a
s ã o fei t os “a t ra v és de t ext os ora i s e es cri t os como rev is t as ,
j orna i s , mús i ca s et c. ” Apes a r de A3 di zer que na s a ul as de
L í ngua Portuguesa a profess ora t ra ba l ha com di t ados: “El a fazi a di t a do”. Sobre i s so, o PCN de l í ngua port uguesa ( 200 1 , p.
39 ) a ponta que:
O e n s i n o d e l í n g u a p o r tu g u e s a , p e lo q u e s e p o d e o b s e r v a r em su a s p r á t i c a s h ab i t u a i s , t e n d e a t r a t a r es s a
f a l a d a e s o b r e a l i n g u ag em co mo s e f o s s e u m co n t e ú d o em s i , n ã o co m o u m m e i o p a r a m e l h o r a r a q u a l i d a d e d a p r o d u ç ã o l i n g u í s t i c a . É o c a s o , p o r e x emp l o ,
d a g r a m á t i c a q u e , e n s i n a d a d e f o r m a d e s co n t e x tu a l i z a d a , t o r n o u - s e emb l e m á t i c a d e u m co n t eú d o e s t r it a m en t e e s co l a r , d o t i p o q u e s ó s e r v e p a r a i r b em à
prova e passar de ano [.. .]
At i v i da des env olv endo di ferent es t i pos de gêneros t ext ua i s a uxi l i am ba s ta nt e, porque a j udam os a l unos a compreender
que exi s t em di ferent es t i pos de t ext os , os qua i s s erão cons t ruí dos a pa rt i r de uma da da s i t ua çã o. Fá v ero e Andra de
( 2000 , p. 82) fa zem uma col oca çã o a es s e res pei t o, el es di zem
que: “A a pl i ca ção de a t i v i da des de obs erv açã o que env olv e a
orga ni za çã o de t ext os fa l ados e es cri t os permi t e que os a l unos cheguem à percepçã o de como efet i v ament e s e rea l i zam,
s e cons t roem e s e formul am ess es t ext os es cri t os e ora is ”.
Is t o é rat i fi ca do pel o PCN de L í ngua Port ugues a ( 199 8, p. 83)
qua ndo di z que:
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T o d a ed u c a ç ão co m p r o m e t i d a co m o e x e r c í c i o d a c i d a d an i a p r e c i s a c r i a r c o n d i ç õ e s p ar a q u e o a l u n o
p o s s a d e s en v o l v e r su a c o mp e t ên c i a d i s c u r s i v a . [ . . . ]
U m d o s a s p e c t o s d a c o mp e t ên c i a d i s c u r s i v a é o s u j e i t o s e r c ap a z d e u t i l i z a r a l í n g u a d e mo d o v a r i a d o ,
p a r a p r o d u z i r d i f e r e n t e s e f e i t o s d e s e n t i d o e a d eq u a r
o texto a diferentes situações de interlocução oral e
escrita.
É i mporta nt e que o ens i no de l í ngua port ugues a s ej a fei t o de forma cont ext ua l i za da pa ra que os a l unos a prenda m os
cont eúdos de forma que pos sam refl et i r sobre os mesmos e
v ej am ut i l i dade pa ra ta l t a refa . Segundo Wei s z e Sanchez
( 200 2, p. 60 ) “o profes s or dev e cri a r s i tua ções que permi ta m
a os a l unos v iv enci a r os us os s ocia i s que s e fa z da es cri t a , a s
ca ra ct erí s t i ca s dos di ferent es gêneros t extua i s , a l i ngua gem
a dequa da a di ferent es cont ext os comuni ca t ivos ”.
O proces so de ens i no- a prendi za gem dev e v i a bi l i za r a
produçã o do conheci mento. Sendo as s im, o profes sor preci sa
propi ci a r mei os que fa ça m com que os a l unos s e s i ntam mot iv ados pel a bus ca dess e conheciment o, dei xa ndo de s er s uj ei t os pa ss i vos e torna ndo -s e suj ei t os at i v os nes s e proces s o.
CO NSIDERA ÇÕES FINA IS
Es t e es tudo procurou compreender como, de fa t o, é e
como dev e s er a prá t i ca docent e. A pes quis a rev el ou a i nsa t i s fa çã o das profes soras ent rev is t adas com a forma ção em
Peda gogia ( em a ndament o) , as mes mas quei xa ram -s e da pouca
ut i l i da de prá t i ca dos conheci mentos que o curs o proporci ona ,
uma v ez que est e dev eri a es ta bel ecer um el o ent re a t eoria e
a prá t i ca de ens i no. Es t e da do a ponta uma pos s ív el defi ci ênci a
nos curs os de l i cenci a t ura .
N o rel at o de um dos a l unos ent rev is t a dos, obs erva -s e
a l go comum nas es cola s bras i l ei ra s: a fa l ta de profi s s i ona l i smo
de mui t os profes sores , expres sa , nest e ca so, por gri t os , i nto-
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l erâ nci a e a gress i v i da de, comporta mento que v em a s er refl exo
da decl a ra da má forma çã o dess es profess ores , as soci a da à já
ci t a da fa l t a de a fet i v i da de com o ens i no de L í ngua Portuguesa ,
é rev el a da pela predomi nâ nci a das a t i v i da des ma ça nt es des cri t a s pel os a l unos .
Com ba s e nes s es rel a t os , pode- s e concl ui r que a prá t i ca
docent e, mui t as v ezes, apres enta uma qua l i da de mui t o a quém
da necess á ria pa ra o des env ol v iment o das compet ênci as i mpres ci ndí v eis a os a l unos. Em v is ta dis s o, há a necess i da de de
muda nças na forma çã o docent e, v i sa ndo uma mel hor prepa ra çã o de profis s i ona i s pa ra o exercí ci o da profi s s ão, a fi m de
que es t es s eja m ca pa zes não s ó de forma r indi v í duos pens a nt es e compet ent es , mas , ta mbém, de cont ri bui r pa ra a mel hori a
do ens i no do B ras i l .
Ai nda nas res pos ta s dos a l unos encont ramos s ol uções
pa ra um obj et iv o s ecundá ri o des t e es tudo, o qua l di z respei t o
à ut i l i za çã o de recursos ma i s di nâmi cos que des pert em ma i or
i nt eres s e e pa rt i ci pa çã o dos a l unos na cons truçã o dos conheci ment os .
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ISSN 2236-3335
A I N T E R C U LT U R A L I D A D E E M O S A N D U Í C H E
D A M A R I C O TA : C O M PA R T I L H A N D O S A B E R E S
G rac iely Cândido Macêdo
Licenc iatura e m Le tras Ve rnáculas
[email protected]
Luziane Amaral de Jesus
Licenc iatura e m Le tras c om Espanhol
[email protected] om.br
Profa. Dra. C arla Luzia Carne iro Borge s (Orientadora/UEFS )
D ep arta ment o de Le tras e A rtes (D LA )
[email protected] om.br
Res umo : Es t e a rt i go a borda , brev ement e, a i nt ercul t ura l i da de no
cont ext o da Educa çã o do Ca mpo é res ul t ado de uma prá t i ca
i nt erv ent iv a prov eni ent e do proj et o de pes quis a “Modos de l e r/
es crev er: i nt erfa ce l ei t ura e cul t ura em R i achã o do J a cuí pe”.
As ma rca s que v ersa m s obre os a s pect os i nt ercul t ura i s fora m
s endo rev el a das a pa rt i r de i nfer ênci a s durant e a l ei t ura prot ocol a da , pa ra a l unos de cl a ss es bi ss eri a da s e mul t i s s eri a da s, da
hi s t óri a O Sanduíche da Maricota , de Av el i no Gu edes . Pôde -s e
v eri fi ca r que o us o dos conheci ment os cul t ura i s dos educa ndos , em s eu proces so de a prendi za gem e cons t rução de s ent i do, cont ri bui u de ma nei ra i nci s i v a pa ra a cons t ruçã o de s ua s
i nt erpret a ções t ext ua is .
Pa l av ras- chav e: Int ercul t ura l i da de. Cons t rução d e s ent i do. Educa çã o do Campo.
Res umen : Es t e a rt í cul o c i ent í fi co des cri be, b rev ement e, el
a borda j e i nt ercul t ura l en e l cont ext o d e Educa ci ón del Ca mpo;
es el res ul t a do de una prá ct i ca de i nt erv enci ón que ha s urgi do
del proyect o d e i nv es t i ga ci ón ci ent í fi ca nombra do de "Modos de
l eer/es cri bi r: i nt er fa ce l ect ura y cu l t ura e n Ri a chã o do
J a cuí pe". La s ma rcas que s e ocupa n de l os as pect os
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i nt ercul t ura l es ha n s i do rev el a das a pa rti r d e i nfer enci a s
dura nt e l a l ect ura de l a hi s t ori a “El Sá ndwich de l a Ma ri cot a ”
cuyo a ut or es Av el i no Guedes , l o cua l s e l a pres ent ó a l os
a l umnos de l a s a ul a s que pos een dos o má s a ños j unt os en e l
mi smo es pa ci o. Se puede v eri fi ca r que e l us o de l os
conoci mi ent os cul t ura l es de l os es t udi a nt es , en s u proces o de
a prendi za j e y cons t rucci ón de s ent i do, l o que cont ri buyó pa ra
cons t rui r, efect i va ment e, s us i nt erpreta ci ones t ext ua l es.
Pa l a bra s cl a v e : Aborda j e i nt ercul t ura l . Cons t rucci ón de s ent i do.
Educa ci ón del Campo.
INTRO DUÇÃO
O pres ent e a rt i go é frut o de uma a t i v i da de i nt erv ent iv a
rea l i za da em duas es col a s do ca mpo de Ri a chã o do J a cuí pe [ 1 ] .
Vi ncul a da a o proj et o “Modos de l er/es crev er: i nt erfa ce l ei t ura
e cul t ura em Ri a chão do J a cuí pe”, a i nt ervençã o cons i s t i u na
na rra çã o da hi s t óri a O Sanduíche da Maricota , d e Av el i no Guedes , cont a da por mei o da m et odol ogia de pa usa prot ocol a da,
ou s e j a , há pergunt a s “da s cont a doras de h i s t óri a ” e, em cont ra pa rt i da , os a l unos res pondem - nas de a cordo com s uas concepções /conheci mentos já exi s t ent es .
O proj et o em ques t ã o é um produt o das di s cuss ões foment adas nos g rupos d e p es quis a L i nguagem, Soci eda de e
Produçã o de conheci ment o ― L IN SP/UEF S e N úcl eo de Es t udos em L í ngua , Cul t ura e Ens i no ― L IN CE/UFB A. Seu obj et i v o
pri nci pa l é di s cut i r s obre l ei t ura , cul t ura , l i ngua gem e p rodução
de conheci ment o no â mbi t o da s prá t i cas s oci a i s de l ei t ura e
es cri t a da s es col as da zona rura l j a cui pense e i nt egra nt es do
Proj et o Conhecer, Ana l i sa r e Tra ns forma r ( Proj et o CAT) , s edi a do na Univ ers i dade Est a dua l de F ei ra de Sa nta na .
N o que di z res pei t o à i nt erv ençã o, v imos que era nec es s á ri o da r ênfa s e à a t i v i da de de prá t i ca na rea l i da de concret a ,
como mei o de proporci ona r s a beres a os di s cent es da s es col a s
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do campo ( F REIRE, 1 9 82) . Por i s s o, opt amos pel a h i s t ória s upraci t a da por pos s ui r como pers ona gem pri nci pa l uma ga l i nha, a
Ma ri cota , um dos a ni ma is ma i s pres ent es na zona rura l , ou s ej a , que fa z pa rt e do cont ext o s oci ocul t ura l dos educa ndos j a cui pens es , pa ra que os mesmos s e s ent i ssem à v ont a de no
moment o de opi na r s obre o “des t i no” do l a nche da prot agoni sta.
N o ent a nt o, p ercebemos que nã o s e t ra ta va s oment e de
fa zer uma l e i t ura com a pa rt i ci pa çã o dos a l unos . F omos a l ém:
nós e os a l unos i nt ercambi amos conheci ment os . El es , por s ua
v ez, a prenderam com a s medi a dora s da hi s t óri a , bem como
es t as a prendera m com a quel es , por mei o de u m proces s o comuni ca t iv o em que s e pa rt i l hav am os s a beres /as cul t ura s , que
s e ent recruza vam em um emba t e de i de i as e a rgument os que
i a m emergi ndo dura nt e t odo o proces so. D est a forma , cons t ruí mos uma “nova ” hi s t óri a , nã o ma i s a de Avel i no Guedes , ma s
um s a nduí che com a “ca ra ” d e R i a chã o do J a cuí pe, rechea do
de fa ri nha , fei j ã o, i có, enfi m, um “sa nduba ” i nt ercul t ura l .
REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
Cont ext ua l i za remos , p ri mei rament e, a Educa çã o do Ca mpo
j a cui pens e pa ra ent ã o re fl et i rmos s obre a “i nt ercul t ura l i da de”
em O Sanduíche da Maricota . N o refer i do muni cí pi o, há cl a ss es
bi s s eri adas e mul t i s s eri a da s. Es t a s s e t ra t am d e cl a s s es em
que há t rês ou ma i s s éri es em uma úni ca s a l a de a ul a , a o pa s s o que a quel a s corres pondem a um úni co a mbi ent e es col a r em
que há dua s s éri es j unt as . Es s e fenômeno ocorre t a mbém em
out ras es cola s da zona rura l do s emiá ri do bai a no.
N o enta nt o, a s i ns t i t ui ções es cola res onde des env ol v emos os
proj et os [ 2 ] s ã o as s es sora da s pel o Proj et o CAT, que, j unt ament e
com o Mov iment o de Orga ni za çã o Comuni t á ria ( MOC) [ 3 ] , t em s ua a t ua çã o v ol ta da pa ra a cons t ruçã o de uma pol í t i ca públ i ca de
Educa çã o do Ca mpo. A met odol ogi a do Proj et o CAT é des env olv i da com bas e na s concepções de Pa ulo F rei re e bus ca fa-
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zer com que o s uj ei t o conheça a s ua rea l ida de, a na l i s e - a e,
pos t eri orment e, cons t rua conheci ment os a part i r del a , pa ra , as s i m, cri a r formas de t ra ns formá - la . Os t rês v erbos ( conhecer,
a na l is a r e t ra ns forma r) , no i nfi ni t i vo, repres ent am a s t rês et apa s da met odol ogi a , e, a t ua l ment e, há a qua rta et a pa : av a l i a r.
D e cert a ma nei ra , nos s a a t i v i da de i nt erv ent iva , de ma nei ra
ma is s uci nt a , porém nã o menos s i gni fi ca t i va, t ev e o pa pel d e
t ra nsport a r os a l unos pa ra out ra s rea l i da des . Ao pa ss o que
conhecí a mos com ma i s a fi nco s ua rea l i da de, os a l unos t a mbém
conheci a m a noss a . Vamos v er d e que forma i s s o a cont eceu,
ma is a dia nt e.
N o ent a nt o, pa ra cont i nua rmos nos sa “conv ers a ” e ent endermos ma is es t e proces s o, a l guma s pergunta s nort ea rã o noss o a rt i go pa ra ( re) s i gni fi ca r a nos sa prá t i ca i nt erv ent iv a, a s a ber: em que a s pect o s e pode a fi rma r que a a borda gem i nt ercul t ura l f ez -s e pres ent e na nos sa prá t i ca ? O di s cent e pode
compreender a l e i t ura da pa l av ra s e nã o há uma a mpla l ei t ura
de mundo? Como es s e proc ess o de compreens ã o da l ei t ura
t a nt o da pa l av ra qua nt o de mundo s e dá ? Em qua is a spect os
e/ou cont ext os a cul t ura do di s cent e i nt erfere em s eu modo
de l er e es crev er enqua nto s uj ei t o a t i v o, crí t i co e refl exi v o? E
a t é que pont o o docent e r es pei ta e l i da com a cul t ura do a l uno, s em desmerecê - l a ou mi ni mi zá - la ?
J á percebemos que o Proj et o CAT pr ess upõe uma “nov a
es col a ”, um “nov o profes s or” e “nov os a l unos ”, p ropondo que
a es col a , em conj unt o com a l unos e fa mi l i a res , exerça o pa pel
de cons t rutora de conheci ment os e s i rva pa ra que a comunida de rura l encont re o s eu des env olv i ment o. Ent ã o, percebe - s e
que a es col a pa rt e da rea l i da de l oca l , das comuni da des, do di a gnós t i co da s pot enci a l i da des , de ma nei ra que os a l unos a prendam a pes qui sa r, a na l is a r os da dos da p es quis a e a a gi r
na comuni dade a pa rt i r dos conheci ment os a dqui ri dos . D es t e
pont o em di a nt e, os a l unos vã o a l a rgando s eus hori zont es pa ra conhecerem out ras rea l i da des (MOURA, 200 5) .
E por fa l a r em rea l i da des , em que moment o percebe - s e a
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a borda gem i nt ercul t ura l em noss a prá t i ca i nterv ent iv a ? K ramsch ( a pud Sa nt os, 20 04 , p. 1 1 0 ) a fi rma que o t ermo intercultural
pode s i gni f i ca r “o proc ess o de comuni ca çã o ent re pes s oa s que
fa l a m a mesma l í ngua e compa rt i l ham um mes mo t e rri t óri o, mas
que pa rt i ci pam de di ferent es grupos cul t ura i s , como ét ni cos ,
s oci a i s, de gênero, s exua is , et c. ” Port a nt o, es t a s erá a pos t ura
a dota da nes t e a rt i go, ou s ej a , uma a borda gem i nt ercul t ura l pa ra d i s cut i r a s i nt era ções comuni ca t iva s ent re a s “na rra dora s
da hi s t óri a ”, os a l unos e, por fi m, os docent es regent es da s
cl a s s es .
F rei re ( 1 9 82, p. 1 1 ) def ende que o a t o de l er “ s e a nt eci pa
e s e a l onga na i nt el i gênci a do mundo” e “a l ei t ura do mundo
precede a l ei t ura da pa l av ra ”. D i a nt e de t a l def esa , nã o s e pode perder de v i s t a a i mportâ nci a da l ei t ura de mundo pa ra que
o a l uno compreenda a l ei t ura da pa l av ra , l ev ando em cont a a
l ei t ura de mundo, ou s ej a , os fa t ores s oci a i s, hi s t óri cos e cul t ura i s do s uj ei t o em s eu process o de cons t ruçã o de s ent i do.
Segundo Sa nt os ( 2004 ) , a cul t ura engl oba uma t e i a compl exa de s i gni fi ca dos . Es t es s ã o i nt erpret a dos pe l os el ement os
que fa zem pa rt e de uma mesma rea l i da de s oci a l , os qua i s a
modi fi cam e s ã o modi fi ca dos por el a . E es s e c onj unt o de s i gni fi ca dos i ncl ui a s t ra di ções , os v a l ores , a s crença s , a s a t i t udes
e os concei t os , a ss i m como os obj et os e t oda a v i da ma t eri a l .
D ev e- s e cons i dera r, ent ret a nt o, que a cul t ura nã o exi s t e s em
uma rea l i da de s oci a l que l he s i rva de a mbi ent e, poi s nã o é es t á t i ca nem i nt ei ra ment e homogênea e pura , mas cons t rói - s e e
renova -s e de ma nei ra homogênea a t rav és dos fl uxos i nt ernos
de muda nça e do conta t o com out ra s cul t uras .
N ão s e pode es quecer, cont udo, do l et rament o, que es t á
l i ga do à ca pa ci da de de da r s i gni fi ca do, de c ri a r um ret ra t o de
mundo. Ma i s do que o s i mpl es a t o de deci fra r e t ra ns crev er
pa l av ras , o l et ra ment o va i mui t o ma i s a l ém, é uma prá t i ca s oci a l . L et rament o, pa ra Soa res ( 20 00 , p. 39 ) , é: “ Res ul t a do da a çã o de ens i na r e a prender a s prá t i cas s oci ai s de l ei t ura e es cri t a . O estado ou condição que a dqui re um grupo s oci a l ou
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um i ndi v í duo como cons equênci a de t er - s e a propri ado da es cri t a e de s ua s prá t i cas s oci a i s ” [ gri fo da a utora ] .
Ass i m, a l ei t ura , a es cri t a e a cul t ura , a part i r da s concepções a pres ent a da s , ca mi nham ent rel a ça da s . D ev e - s e cons i dera r que, des de qua ndo s e i ni c i a a es cri t a d e um t ext o, nel e
j á v em pres ent e a cul t ura do es cri t or ( l ei t ura de mundo e da
pa l av ra ) e, pos t eri orment e, o l ei t or i mpri me no t ext o a s ua cul t ura e, a pa rt i r da í , est e t ext o j á nã o é ma i s o mesmo.
CO NSTRU INDO SA BERES E PA RTILHA NDO EXPERIÊNCIA S
L ev a ndo -s e em cons i dera çã o o cont ext o em que a l unos
j a cui pens es da zona rura l es t ã o i ns eri dos , é n ot óri o que s uas
i nt erpret a ções ou produções t ext ua is s ã o ba s ea das no s eu
conheci ment o de mundo, ou s ej a , em s ua cul t ura . L ogo, s uas
i nt erpret a ções , em s e t ra t a ndo do l i v ro i n fa ntoj uv eni l O Sanduíche da Maricota , nã o poderi a m s er di f erentes . As l ei t uras da
hi s t óri a a cont eceram em t rês es col as : a pri mei ra na mul t i ss eri a da e a s s egui nt es na s bis s eria das .
N a pri mei ra es col a, a s cri a nça s poss uí am ent re c i nco e
doze a nos . A l ei t ura da hi s t óri a fez com que os a l unos , a ss i m
como o pro fes sor, i nt era gi ss em de ma nei ra s i gni fi ca t i va , des de
a s i nferênci as a pa rt i r do t í t ul o a t é o des fecho.
O t í t ul o nã o ca us ou di v ergência s de i nt erpret a çã o, j á que
a ma i ori a da s res pos t as a pont ou pa ra a pres ença de uma f i gura femi ni na, o que s e deu pel a obs erv a çã o da ma rca do f emi ni no ( t ermi na çã o em - a ) . As pri mei ra s res pos t as ev i denci a ra m
que Ma ri cot a s eri a uma mul her, a t é mes mo por cont a da comi da que es t ava s endo en foca da : s a nduí che. Após i nferênci a s
nos sas , do t i po “Quem s eri a Ma ri cota ? Será qu e a Ma ri cot a é
mesmo uma mul her? O que ma i s el a poderi a s er? Um a ni ma l ?
Qua l ?”, os a l unos d i s s eram que Ma ri cot a s eri a uma ga l i nha. O
que s e quer d es ta ca r, port a nto, é a pos i ção dos a l unos , que
t ra duz a cul t ura , no que s e refer e a o pa pel da mul her na s oc i eda de em gera l .
N o que t a nge a os i ngredi ent es do s a nduí che, da dos por
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ca da a ni ma l que chegav a à ca s a da ga l i nha Ma ri cota , percebeu
- s e i númera s i nt erpret a ções . A pergunt a nort ea dora que deu
i ní ci o a es sa et a pa foi : D e que s erá fei t o o s a nduí che da Ma ri cot a ?
A pri ncí pi o, hav i a um t ermo menos conheci do, a “qui rera ”.
N o ent a nt o, com a nos sa expl i ca çã o foi fá ci l ent ender do que
s e t ra t av a, poi s é comum na regi ã o o há bi t o d e cri a r ga l i nhas .
Ent ã o, ba s t ou expl i ca r que qui rera era mi l ho qu ebra do que s e
dá aos pi nt os , e l ogo houv e ent endi mento por pa rt e de t odos .
A s egunda fra s e da hi s t ória , “Mas qua ndo i a comer, a
ca mpa i nha t ocou” gerou es t ra nha mento por pa rt e da ma i ori a
dos a l unos . A pa rt i r da í , uma l embrança v eio à t ona : s oment e
dua s cr i a nça s t i nham a ces so à t e l ev is ã o, poi s hav i a pouco
t empo que a regi ã o es t av a recebendo energi a el ét ri ca . L ogo, a
i nt erv ençã o do prof ess or da t urma foi ba s tant e rel ev a nt e, uma
v ez que expl i cou pa ra os s eus a l unos o que é e pa ra que
s erv e uma campa i nha .
A fi m de es cl a recer compl et ament e s obre a ca mpa i nha ,
fez- s e compa ra ção do forma t o da mes ma com a de um i nt errupt or da s a l a , a i nda que a es col a funci onas s e com a energi a
s ol a r. E, pa ra fort a l ecer a i nda ma i s o ent endi ment o das cri a nça s , ut i l i zou - s e o s om d e uma ca mpa i nha prov eni ent e de um
cel ul a r. Ess a pa rt e da h i s t ória nos ma rcou profundament e, v i s t o que s empre res i di mos na zona urba na e, p or i s s o, s empre
t i v emos a ces s o a a pa rel hos e meca ni smos el et rôni cos /
el ét r i cos . Nã o i ma gi návamos que es t e el ement o ca us a ri a t amanho es t ra nha mento nas cri ança s.
Em cont ra pa rt i da , o fa t o de o bode Sera fi m p edi r à ga l i nha Ma ri cot a pa ra col oca r ca pim no s a nduí che nã o ca us ou nenhum es t ra nhament o: a s res pos t as fora m unâ nimes , qua ndo
pergunt a do qua l i ngredi ent e o bode queri a . Mas d ess a v ez fora m as cri a nça s que, a o res sa l t a rem que o bode poderi a comer i có, ca us a ram - nos es t ra nha mento. E, ma is uma v ez, o
profes s or fez uma i nt erv ençã o, nã o pa ra expl i ca r à s cri a nça s ,
mas pa ra nos expl i ca r que i có é uma pl a nta t í pi ca da regi ã o,
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gera l ment e cons umi da por ani ma i s rumi na nt es.
Em rel a çã o à s a rdi nha s ol i ci t a da pel o ga t o K im, os a l unos
nã o cons egui ram compreender i ni ci a l ment e o porquê de um ga t o gos t a r de s a rdi nha . É comum a s cri a nça s c om a ces s o à t el ev i s ão fa zerem a a ss oci a çã o do pei xe como a l i ment o do ga t o,
j á que exi s t em des enhos a ni ma dos que t ra zem es s e enfoque,
a exempl o de “Manda - chuv a e s ua t urma ”, ma s no cont ext o
j a cui pens e fi cou mui t o ma i s c l a ro a pont a r l a ga rt i xa , pa ss a ri nho,
pã o, pei xe ( nã o s a rdi nha , em es pecí fi co) , l ei t e e fei j ã o do que
opt a r pela sa rdi nha .
O cã o J oã o querer comer os s o é a c ei t áv el , p oi s mesmo
a s cri a nça s nã o pos s ui ndo i ma gens o ri unda s da t el ev i sã o, a
exempl o do ca chorro Pl ut o, do des enho a nima do Mi ckey Mous e, é da cul t ura de mui t a s pes soas ( i ndependent e de s er de
zona rura l ) a l i ment a rem os cã es com os s os , mes mo que de
ga l i nhas ou de ca rnes bov i nas .
Apesa r de a bel ha nã o comer mel , ma s a l i ment a r - s e do
néct a r da s fl ores pa ra a s s im produzi - l o, a s c r i a nças t a mbém
nã o a pres ent a ra m di f i cul da des no ent endi ment o. O mesmo ocorreu com o ma ca co e com o ra t o Al ei xo, v i s t o que j á s e
confi gurou o fa t o de o ma ca co gos ta r d e ba nanas , e o ra t o,
quei j o.
D i ferent e de mui t as cri a nças da ci da de, que p oderi a m f i ca r em dúv i da s e pe rgunta do o que uma rapos a gos t a de comer, a s cri a nça s da zona rura l j a cui pens e l ogo i nforma ra m que
a ga l i nha era a comi da p referi da des s e a ni ma l . N o que di z r es pei t o à ga l i nha Ma ri cota , a s cri a nças coment a ram que s a nduí che nã o era comi da de ga l i nha , mas s i m mi lho, out ro a s pect o
da i nt erpret a ção que é da do a pa rt i r da l e i tura de mundo, da
cul t ura .
Ao fi na l da hi s t óri a , fi zera m - s e out ras i nfer ênci a s em rel a çã o à s comi das de out ros a ni ma i s . D es t e modo, a s cri a nça s
puderam re fl et i r a cerca da a l i ment a çã o de out ros a ni ma i s , t í pi cos de sua rea l i da de ou nã o.
N as es col as bi s s eri a da s , o proces s o s e deu qua s e da
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mesma ma nei ra , excet o na cons t ruçã o do s a nduí che, poi s os
meni nos e a s meni nas des t a comuni da de, onde s e encont ra a
es col a da s out ra s dua s t urmas bi s s eria das com a s qua i s t ra ba l hamos , j á t i nham a energi a el ét ri ca , t i nham/ass i s t i am t el ev i s ã o, port ant o, nã o es t ra nha ra m a noçã o de ca mpa i nha .
Os pri mei ros i ngredi ent es ci t a dos foram: pr es unt o, quei j o,
t oma t e, ov o, a l fa ce, coent ro, ketchup , ma i ones e, pã o, ca rne, ou
s ej a , a “pri mei ra ” es t rut ura de um s a nduí che pa ra depoi s os
a l unos cons t ruí rem o própri o s a nduí che a pa rt i r dos a l i mentos
ma is encont ra dos em s ua regi ã o: a rroz, ma ca rrã o, fei j ã o, bei j u.
Um fa t o curi os o é que, na s es col a s da zona rura l j a cui pens e,
qua ndo s e fez a opçã o por es t es i ngredi ent es ( a rroz, ma ca rrã o, fei j ã o, be i j u) , a pri nc í pi o houv e um es t ranhament o da pa rt e
dos a l unos . El es nã o a cei t a ram a poss i bi l i da de d e t roca no pri mei ro moment o, ma s , a pós perceber em que os prof ess ores
nã o es t ava m des cons t rui ndo s eu s a nduí che, s ent i ra m - s e à
v onta de pa ra col oca rem t odos os i ngredi ent es pos s ív ei s da
regi ã o.
CO NSIDERA ÇÕES FINA IS
Sem dúv i da , a i nt ercul t ura l i dade pe rpas sou t oda a l ei t ura
da hi s t óri a . Al ém di s s o, promov eu a i nt era ção e a prendi zagem
de nov os s a beres s obre a v i da e s obre o mundo pres ent e nas
ent rel i nha s da s na rra ções de ca da hi s t óri a. O ent us i asmo e a
pa rt i ci pa çã o da s c ri a nças no moment o de cont a r e ouv i r a s
hi s t óri as rev el ou o qua nt o es sa prá t i ca de l ei t ura cont ri bui pa ra
a uxi l i á- l os em s eu proces s o de refl exã o, a prendi za gem e const ruçã o da cri t i ci da de.
Adema i s , mos t rou -nos a i mport â ncia de s e a s s umi r uma
pos t ura d i a l ógi ca com os a l unos . Is s o fez com que es t es es t i v ess em s empre di s pos t os a pa rt i ci pa r, a ques t i ona r qua ndo
nã o ent endi a m e, qua ndo p ercebi a m que nos f a l t a vam a l guma s
de s uas i nforma ções , pront ament e, com ou s em i nt erv ençã o do
profes s or, a rt i cul av am um modo de nos expl i ca r o que queri a m
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di zer com um det ermi nado t ermo. E, a s s im, cons t ruímos um nov o s a nduí che da Ma ri cot a , por mei o da s i nt era ções e t roca s de
experi ênci a s cul t ura i s ent re F ei ra de Sa nt a na e Ri a chã o do J a cuí pe, uma l ei t ura i nt ercul t ura l da s prá t i ca s cot i di a nas da c i dade e do campo.
REFERÊNCIAS
F REIRE, Pa ul o. A i mport ânci a do a t o de l er : t rês a rt i gos que s e
compl et am. Sã o Pa ul o: Cort ez/Aut ores As soci a dos , 1 9 82.
GUED ES, Av el i no. O s a nduí che da Ma ri cot a . I l us t ra ções do a ut or. 7 . ed. Sã o Pa ul o: Moderna , 19 9 5.
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MOURA, Abda l a zi z de. F i l os ofia e Pri ncí pi os da PEAD S ( PE) e do
CAT ( BA) . In: B APTISTA, F ra nci s ca Ma ri a Ca rnei ro; B APTISTA,
N a i dis on de Qui nt el l a ( orgs ) . Educa ção Rura l : s us t ent a bi l i da de do
ca mpo. F ei ra de Sa nta na : Ed. MOC/UEFS/SERTA, 20 0 5.
SAN TOS, Edl ei s e Mendes Ol i v ei ra . Aborda gem Comuni ca t i va Int ercul t ura l ( ACIN ) : uma propos t a pa ra ens i na r e a prender l í ngua
no di á l ogo de cul t uras . Campi nas , SP: [ s. n. ] , 2004 .
SOARES, Ma gda . L et rament o: um t ema em t rês gêneros . 2. ed.
2ª rei mpr. B el o Hori zont e: Aut ênt i ca , 200 0.
NOTAS
[1]
“Riachão do Jacuípe é um município brasi leiro do Estado da B ahia. A
c i d a d e f i c a s i t u ad a à s m a r g en s d o r i o J a c u íp e e t e m u m a e c o n o m i a v o l t a d a p a r a a p e c u á r i a e a g r i c u l t u r a , d e s t a c a n d o - s e o r e b an h o b o v i n o e
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s u í n o e a e x t r a ç ã o d a f i b r a d e s i s a l p a r a e x p o r t aç ã o ” . C i d a d e d e R i a c h ão d o J a c u í p e B a h i a . S i t e : h t t p : / / www . b ah i a e m fo co . c o m / p o r t a l /
mu n i c i p i o s - d a - b ah i a / r i a c h ao - d o - j a c u i p e . A c e s so e m : 1 0 a g o 2 0 1 0 .
[2]
E x i s t em m a i s d o i s p r o j e t o s s e n d o d e s en v o l v i d o s n e s s a s d u a s e s c o l a s
d o c a m p o d e R i a c h ão d o J a c u í p e . O p r i m e i r o é o “ M o d o s d e l e r /
e s c r ev e r : p r á t i c a s d e p ro d u ç ão d e c o n h e c im en to s e t r a n s f o rm a ç ão
s o c i o cu l t u r a l ” d a P r o f a . D r a . C a r l a L u z i a C a r n e i r o B o r g e s ; o o u t r o é o
“ L í n g u a P o r t u g u e s a : p r á t i c a s o c i a l n a c o mu n i c a ç ã o e n t r e s u r d o s e
o u v i n t e s ” d a g r a d u an d a G r a c i e l y C ân d i d o M a c êd o .
[3]
O M o v i m en to d e O r g a n i z aç ã o C o mu n i t á r i a ( M O C ) é u m a o r g a n i z aç ã o
n ã o g o v e r n a me n t a l , s e d i a d a e m F e i r a d e S a n t a n a ― B A , q u e b u s c a c o n t r i b u i r p a r a o d e s e n v o l v i m en t o i n t e g r a l , p a r t i c i p a t i v o e e c o l o g i c a me n te
s u s t e n t áv e l d o s e m i á r i d o b a i a n o e d e s e n v o l v e a ç õ e s e s t r a t é g i c a s n a s
á r e a s d e e d u c a ç ão d o c a mp o [ . . . ] . < h t t p : / / w ww . mo c . o r g . b r / > . A c e s s o
em: 10 de agosto de 2010.
J
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A NEXO
O Sanduíche da Mar icota (Ave l ino Guedes)
A ga l inha Ma r icota prepa rou um s a nduích e: pã o, m i lho , quir era e ovo.
Ma s qua ndo ia com er , a ca mpa inha tocou.
E ra o bode S era f im, que o lhou o s a nduí che e exc la mou :
― V ixe ! F a lta a í um ca p im .
A í ch egou o K im, o ga to, cumpr i mentou a ga l inha , e vendo
o s a nduí che, pa lp i tou:
― F a lta a s a rd inha .
J oã o, o cã o, ve io com o s eu j e ito de bom moço .
E educa do , s uger iu :
― C o loquem n e le um bom os s o.
S empr e zumb indo e a g ita da , chegou a a be lha I s a bel .
O lhou o es qu is i to r eche io :
― M e lhora s e pus er me l .
Da j a ne la , ouv indo o pa po, mu ito me t ido a ba ca na , f a lou ,
conv enc ido o ma ca co :
― C la ro que f a l ta ba na na !
― Ba na na ? S a rdinha ? Me l?
E ra o ra to A le ixo.
― M i lho? O ss o? C a pim? A rgh ! ! !
― V ocês es quecera m o que ij o !
A b r inca de ira a ca bou qua ndo a ra pos a C e l ina o lhou bem
pa ra a Ma r ico ta e f a lou:
― F a lta ga l inha !
Ma r ico ta f icou bra va :
― F ora da qu i m inha gen te !
J ogou f ora o s a nduích e e com eçou nova men te : pã o , m i lho ,
qu ir era e ovo. C omo era pra te r s ido .
― Q uem qu is e r que f a ça o s eu com r eche io pr ef er ido .
Fonte:
O
sanduíche
da
Maricota.
<http://
alfabetizacaoecia.blogspot.com.br/20 -09/04/sanduiche-dama r ico ta .htm l >. A ces s o em: 3 0 ma r . 20 12.
J
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LINGUÍSTICA
ISSN 2236-3335
EDIÇÃO SEMIDIPLOMÁTICA E ANÁLISE DO
DISC URS O DE U M A U TO DE D E F LO RAM EN TO
DO SÉCULO XX
I va ne te Ma rt in s de Je s us [1]
Licenc iatura e m Le tras Ve rnáculas
v o ne_de jes us @h ot mai l.co m
P rof a. Dra. Rit a de Cá ssi a R ibe iro de Q uei ro z [2] (orient ado ra/ UE FS )
D ep arta ment o de Le tras e A rtes (D LA )
[email protected]
Res umo : At ra v és da edi çã o s emi di pl omá t i ca de document os j urí di cos s obre a ut os de defl ora ment o, t orna -s e poss ív el a pres erva çã o da memóri a e o res ga t e hi s tóri co. N o pres ent e t ra bal ho, a t rav és da aná l i s e do di s curs o j udi ci a l , foi poss ív el fa zer
um es t udo s obre a condi ção da mul her no iní ci o do s écul o 20 ,
que v iv i a s ob a prot eçã o pa t ri a rca l e dev eria perma necer v i rgem a t é s e cas a r. Ca so cont rá ri o, t eri a que prov a r a s ua hones t i dade pera nt e a Jus t i ça , a fim de “repa rar o ma l ”.
Pa l av ras- chav e: Edi çã o s emi di pl omá t i ca . D i s curs o. F i l ol ogi a .
Abs t ra ct : B y s emi di pl oma t i c edi t i on of l ega l documents on defl ora t i on i t i s poss i bl e to pres erv e t he memory and to redeem
hi s t ory. In t hi s pa per, by j udi ci a l di s cours e ana l i s i s i t was poss i bl e t o s t udy the women condi t i on i n t he begi nni ng of t he 20 t h
cent ury. W omen l i v ed under pa t ria rcha l protect i on a nd s houl d
rema i n v i rgi n unt i l s he ma rria ge. Otherwi s e, s he shoul d prov e
her hones t y i n order t o "repa i r t he ha rm".
K eywords: Semi di pl oma t i c edi t i on. D is cours e. Phi l ol ogy.
INTRO DUÇÃO
Tra t a- s e da edi çã o s emi di pl omá t i ca e a ná l i s e do di s curso
de um process o- cri me, o a ut o de defl orament o da menor Ma ri a
J
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D i as dos Sa nt os . O documento foi l a v ra do em 1 904 , na ci da de
de F ei ra de Sa nta na , t endo como a cusa do Edua rdo Tert ul i ano
de Al mei da . O referi do document o poss ui 1 9 fól i os ( rect o e
v ers o) ; pert ence a o Cent ro de D ocument a çã o e Pesqui sa ―
CED OC/UEF S e i nt egra o corpus do proj et o “Es t udo hi s t óri co,
fi l ol ógi co e a rt ís t i co de document os ma nuscri t os ba ia nos dos
s écul os XVIII a o XX”, s ob a coordena çã o da Profes s ora D out ora Ri ta de Cá ss i a Ri bei ro de Quei roz. B us cou - s e a pres erv açã o da memóri a do documento, por mei o de s ua edi çã o e a ná l i s e do di s curs o j urí di co emprega do na época . Tomou -s e como
pa râmet ro os a s pect os l i nguís t i co - fi l ol ógi cos do t ext o.
A fi l ol ogi a , ci ênci a a nt i ga que es tuda a l i nguagem e cul t ura do homem des de o s écul o III a . C. , é de fundamenta l i mport â nci a na hi s tóri a da huma ni da de, poi s a fi l ol ogi a como ci ênci a
pos s ibi l i t ou um gra nde benefí ci o à s oci edade: a pres erv a çã o e
cons erva ção de font es ma nus cri t as importa nt es pa ra ent ender
e perpet ua r a cul t ura .
A l i ngua gem es cri t a const i t ui u -s e como uma das font es
ma is i mport ant es pa ra os pesqui sa dores, como os fi l ól ogos ,
poi s permi t i u a di fusã o ma is ampl a e duradoura de cul t ura s ,
rel i gi ões , i deol ogia s, comérci o, enfi m, o que repres ent a a forma çã o huma na em um det ermi na do t empo e s oci eda de.
Os t ext os ma nus cri t os s ã o importa nt es no tra ba l ho fi l ol ógi co, poi s sã o font es i nes t i máv ei s de pes quis as e des cobert as .
Por ta l mot iv o, dev e- s e t er o cui da do de pres erva çã o e t ra ns cri çã o dess es document os, pa ra que s e obtenha uma i nforma çã o dura doura e a ut ênt i ca .
Por mei o dos document os j urí di cos , t êm - se a bunda nt es
font es i nforma t iva s dos div ersos s egment os s ocia i s , as qua is
pos s ibi l i t a m ao pes qui sa dor da r v oz a o pass a do que t a lv ez já
es t i v es s e esqueci do. Apres enta -s e, como exempl o, o a ut o de
defl ora ment o da menor Ma ri a D i as dos Santos , no qua l vá ri as
pers onagens dã o v oz a o process o - crime.
N ess as vozes , encont ra -s e uma ques tã o em comum: o
defl ora ment o ou desv i rgi na ment o de Ma ri a D ia s dos Sa ntos ,
J
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a os dezoi to a nos , decl a ra da de cl as s e soci a l ba i xa , l av ra dora ,
a qua l , por v i v er i ns eri da num cont ext o soci a l de pa t ri a rca l i smo, em que a mul her é s ubmis sa e dev e -s e ma nt er v i rgem a t é
o ma t ri môni o, fora expos t a a um process o -cri me, com pedi do
de “repa ra ção do ma l ”, medi ant e o cas amento.
SO BRE A A NÁ LISE DO DISCU RSO
A a ná l i s e do di s curs o é um método l i nguis ti ca ment e i mport a nt e pa ra o es t udo de muda nça s que ocorrem s ocia l ment e.
Medi a nt e o di s curs o, o homem a ge de a cordo com os s eus
i nt eres s es , s obrepondo -s e às dema i s es péci es de a ni ma i s , e
ni s s o cons is t e a di ferenci a çã o e s uperi ori da de do homem: a
l i ngua gem como método di s curs i vo de a çã o e rea çã o frent e a
uma rea l i dade. N o dis curso, es tã o i ns eri das vá ri as l i ngua gens,
como a es cri t a , fa l a da , v is ua l , ges t ua l , corpora l et c. E, nes sa s
formas de l i ngua gem, encont ra -s e a pos s ibi l i da de do es t udo
s oci a l em v is t a da prá t i ca di s curs i va .
Por mei o dos ev ent os di s curs i vos , podemos ent ender os
proces s os de muda nça s que ocorrem em uma det ermi na da s oci eda de. As s im, medi a nt e a s di v ers as forma s de di s curs o o
homem a ge s obre o mundo, es ta bel ece regras , div ul ga i deol ogi a s , cri a e t rans forma o que já era pré - est a bel eci do. Aquel e
que det ém o dis curs o det ém o poder, el e pode ma ni pul a r e repres ent a r o mundo à sua forma . L ogo, o di scurs o é a l go pres ent e no homem t a nto na sua forma de conv iv er, como de v er
o mundo e agi r sobre ta l . Com i ss o, o dis curs o poss ui a l t a s i gni fi ca ção na es t rutura s oci a l , em qua l quer prá t i ca , s ej a pol í t i ca,
i deol ógi ca , rel i gi osa , cul tura l ou j urí di ca . Acerca da prá t i ca di scurs i va Fa i rcl ough (200 1 , p. 9 1 ) expõe que:
O d i s c u r s o co n t r i b u i p a r a a c o n s t i t u i ç ã o d e t o d a s a s
d i m en sõ e s d a e s t r u t u r a s o c i a l q u e , d i r e t a o u i n d i r et a m en t e , o mo l d a m e o r e s t r i n g em : s u a s p r ó p r i a s n o r m a s e c o n v en çõ e s , c o mo t a mb ém r e l a ç õ e s , i d en t i d a d e s e i n s t i t u i çõ e s q u e l h e s ã o s u b j a c en t e s . O d i s c u r s o
J
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é u m a p r á t i c a , n ã o a p e n a s d e r e p r e s e n t a ç ão d o mu n d o , m a s d e s i g n i f i c a ç ã o d o mu n d o , co n s t i t u i n d o e
construindo o mundo em significado.
N o aut o de defl orament o de Ma ria D ia s dos Sa nt os , percebe- s e um di s curs o que bus ca domi na r uma cl as s e cons i dera da s uba l t erna, e i nferi ori za da , no t empo em ques t ão, à qua l
pert ence a s mul heres e, pri nci pa l ment e, negra s e/ou mul a tas e
pobres . Ess a força domi na nt e s e fez pres ent e na rel i gi ã o, pol í t i ca e s oci eda de, propa ga ndo e impondo um di s curs o referent e
à s ubmis sã o femi ni na a o poder pa t ria rca l , s endo que es t e poder pa t ri a rca l es tav a v i ncula do a uma força ma i or: o Es ta do,
em consonânci a com a Medi ci na e, ma j ori t a ri ament e, a J us t i ça .
A Jus t i ça é res ponsá v el por pres i di r a s l ei s cri a das pel o
própri o homem, em uma det ermi na da s oci eda de, es ta ndo i ncumbi da de proceder à s av eri gua ções do cert o e errado, do
cul pa do ou i nocent e, l a nça ndo, enfi m, o seu v eredi ct o fi na l .
Ass i m, o di s curs o j urí di co es tá a rt i cul a do a uma forma de poder domi na nt e, pel a qua l o homem é mol dado e, cons equent ement e, puni do, ca s o t ra ns gri da a l gum precei to l ega l . N o enta nt o, a s l ei s cri a da s pel o própri o homem t endem a prej udi ca r not a dament e, em funçã o da s di ferença s , as mi nori as , s ej a em
ques t ões de cl as s e, et nia , gênero et c.
A CO NDIÇÃ O FEMININA
A s oci eda de bras i l ei ra pas sav a por processos de t ra nsforma çã o no i ní ci o do s écul o XX, t ant o a ní v el pol í t i co, qua nt o
s oci a l e econômi co. Ess as muda nças ocorrera m com o fi m do
i mpéri o e, em decorrência di ss o, o s urgimento do regi me republ i ca no, como t ambém a pa ss agem do t ra ba l ho es crav o ao t raba l ho as sa l a ria do e l i v re. Com ta i s t rans forma ções , est a bel eceu
- s e uma nov a ordem s oci a l , a burgues i a.
Com um novo regi me pol í t i co no B ra s i l , a repúbl i ca col oca
como pont o importa nt e “a di s ci pl i na ri za ção” des s es nov os t ra-
J
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ba l hadores as sa l a ri ados , numa cont í nua v i gi lâ nci a à ordem s oci a l . N ess a pol í t i ca de “dis ci pl i na ri za çã o” da soci eda de operá ri a ,
s urge a pol í t i ca s exua l , com a t enções vol t a da s ao l a do s exua l
do i ndiv í duo. Em rela çã o à pol í t i ca do s exo, a fi rma a pes qui sa dora Ma rt ha de Abreu ( 1 989 , p. 27 ) que:
O s e x o p a s so u a s e r u m g r an d e n eg ó c i o d o e s t a d o ,
u m a s s u n t o d e in t e r e s s e d e to d o o c o r p o so c i a l e m
f u n ç ão d a s e x i g ê n c i a s e d e f i n i ç õ e s m éd i c a s s o b r e a
n o r m a l i d a d e . N e s s e s e n t i d o , o s e s t u d o s d o s d e sv i o s e
d o s p r o ce s s o s p a t o ló g i co s s e x u a i s p a s s a r a m a t e r
i m p o r t â n c i a c o mo f o r m a d e o r i e n t a r e g a r a n t i r a n o r m a l i d a d e d a s g e r a çõ e s f u tu r a s .
Es s e cont rol e s exua l era vol t a do v eement ement e pa ra a
mul her da época , uma v ez que es ta dev i a ma nt er - s e v i rgem
a t é o ca sament o, s ob v i gi l â nci a e prot eçã o fa mi l i a r, as s im nã o
hav eri a des ordem soci a l , ma rgi na l i za çã o e v i ol ênci a . Cont udo,
na v is ã o dos gra ndes j uri s ta s da época , o ca mi nho pa ra o
des env ol v iment o e civ i l i za çã o do B ras i l es ta va na gua rda da
honra s exua l femi ni na .
Uma v ez que s e t i nha o cont rol e s obre a mul her, t a mbém
hav i a o cont rol e s obre a famí l i a , a qua l era a repres enta çã o do
“pequeno Es t a do”, s endo o ma ri do o poder pa t ri a rca l , ou es t â nci a ma i or, enqua nt o a mul her, na s ua obedi ênci a e l i mi t a çã o
de poder, t a nt o fami l i a r qua nt o s oci a l , s eri a a força mora l i zant e
des sa pequena i ns t i t ui çã o, o la r. Es sa v i sã o cons erv a dora s oci a l a cerca da condi çã o femi ni na era genera l i za da , das cl ass es
ma is a l ta s às cl a ss es ma i s ba i xa s .
N a pol í t i ca mora l i za nt e, por mei o do cont rol e s exua l , a
mul her dev eri a cont er s ua l i bi do, a fi m de obt er uma conduta
mora l ; pa ra is s o era neces sá ri o res i st i r à s inv est i das ma s cul ina s . E, qua ndo ocorria a l guma mul her s er des v i rgi na da e l eva r
o cas o à res ol ução da J us t i ça , aquel a dev eri a ma nt er um dis curs o conv i ncent e de que era hones ta e fora v í t i ma do poder
mas cul i no, por força ou pel a a rt e da s eduçã o. Essa s edução
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gera l ment e era s egui da por promessa de ca sa mento, porém
nã o poderia pa rt i r de qua l quer homem, mas de um conheci do
ou noi v o; ca s o cont rá ri o, a mul her pas sa ri a de v í t i ma a cul pada , e s eri a des mora l i zada , por ceder t ão fa ci l ment e às i nv es t ida s de um homem.
Sob t a l a s pect o, Ma ria D ia s dos Sa nt os cons egui u, com
êxi t o, um di s curs o conv i ncent e frent e à J us t iça , a cerca de sua
hones t i da de e compromi ss o de cas ament o que j á t i nha com o
ent ã o a cusa do Edua rdo Tert ul i a no. Seu dis curs o foi confi rmado
pel a s t es t emunhas e a nexa do à s cons t a ta ções dos peri t os no
proces s o que confi rmou o defl orament o. Com is so, o noiv o,
a cusa do por s eduzi r Ma ri a e a ba ndoná - l a em s egui da , a cei t ou
ca sa r -s e com a menor, de forma que, com acei t a çã o do cas ament o, a quel e fi cou l iv re de uma puni çã o s ev era da L ei , conforme o a rt i go 267 , do Códi go Pena l de 1890 , s obre cri me de
defl ora ment o. Ass i m, cons ta , em Ca ul fi el d ( 2000 , p. 7 4 ) , que,
no Códi go Pena l de 1 890 , as ofensa s s exua i s era m cri mes cont ra “a s egura nça da honra e hones t i da de da s famí l i a s ”, e os
cri mes ca ra ct eri za dos pel o “emprego de s eduçã o, engano ou
fra ude” era m pa gos de um a qua t ro a nos de pri s ã o.
Com is s o, o process o- cri me, com denúncia s obre a to de
defl ora ment o, foi a rquiv a do, porque “nenhum es peci a l i st a bras i l ei ro a credi ta va que o fa to de s e da r a o homem o di rei t o de
es col her ent re o ca sa ment o e a pri sã o contra ri av a o pri ncí pi o
do l i v re- a rbí t ri o no ca sa ment o”, poi s “o casa mento el i mi nava a
neces s i dade de puni ção porque repa rava os da nos ca usa dos à
mul her, à s ua famí l i a e à s oci eda de”, ( CAUL F IELD , 2000 , p. 82) .
O que nã o ent ra va em dis cuss ão eram o l i vre a rbí t ri o da
mul her em querer um ca sament o a pós t anta rej ei çã o e const ra ngiment o médi co e j urí di co, os s eus des ej os s exua i s , a na l is a dos , em rela çã o a o do homem, como i gual i t á ri os em funçã o
de s er, da mesma forma que es t e, um s er huma no, i ndependent e de gênero, ra ça , cl a ss e s oci a l ; e a sua pos i çã o enqua nt o
pes s oa a utônoma s ocia l ment e. O que prev al ec i a , no i ní ci o do
s écul o XX, era apenas um dis curso domi nant e de mora l i za çã o
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s oci a l , por mei o da repress ão à a ut onomia e a o l i v re a rbí t ri o
s oci a l e s exua l femi ni nos .
Port a nto, o document o em es t udo ev i denci a o refl exo de
uma s oci eda de, numa época em que a mul her nã o t i nha
a ut onomia e, j uri di cament e, rei nv i ndi cav a s ua honra , de forma
cons t rangedora , pel o t emor à s di fa ma ções e des mora l i za çã o
s oci a l .
CO NSIDERA ÇÕES FINA IS
Ass i m, a o est uda r e edi t a r o a ut o de defl ora ment o de
Ma ria D i as dos Sa nt os , a quel a pess oa do pass a do corpori fi cou s e out ra v ez em nos sa memória , pel a s ua expos i ção em um
document o j urí di co, bus cando da j us t i ça a repa ra çã o de um
“des v i o s oci a l ”, ao qua l foi s ubmet i da pel o noi v o. A a t i t ude de
Ma ria , pedi ndo repa ra çã o à J us t i ça , dev e -s e à repres sã o s ocia l
da época , 1904 , à fi gura femi ni na , s endo que a mul her dev eria
ma nt er - s e “cas ta e pura ” a t é o cas ament o a fi m de não fi ca r à
mercê da s ma zela s s ocia i s . D es ta forma , a mul her dev eri a t orna r-s e um s er des prov i do de l i bi do e s ens ua li da de e mant er - s e
t ot a lment e v í t i ma do poder ma s cul i no, s ej a pel a força , s eja pel o
enga no ou s eduçã o. A s ua hones t i da de t eri a que t ra ns pa recer
i ma cula da di a nt e da L ei , t ant o pel o s eu depoi ment o como das
t es t emunhas a rrol a da s pa ra es cl a reciment os e a v eri gua ções.
Edi t a r s emi di pl oma t i ca ment e um document o ma nus cri t o é
a l t ament e rel eva nt e pa ra conhecer a his t óri a , a cul t ura de uma
s oci eda de, pois os ma nus cri t os sã o font es div ers as de
pes qui sa s, e conheci mento. Fa z - s e necessá ri o o res ga t e da
hi s t óri a por mei o da edi çã o fi el des t es ma nus cri t os , t ra zendo o
t ext o em s ua í nt egra, pres erva ndo a a ut ent i ci da de da
i nforma çã o.
REFERÊNCIAS
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QUEIROZ, Ri t a de Cás s ia Ri bei ro de. Ma nuscri t os ba i a nos dos
s écul os XVII I a o XX: L i v ro de nota s de escri t ura s . Sa lv ador:
Qua rt et o Edi t ora , 2007 .
J
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NOTAS
[1]
B o l s i s t a d e I n i c i a ç ã o C i e n t í f i c a P R OB I C - U E F S .
[2]
D o u to r a em F i l o l o g i a e L í n g u a P o r tu g u e s a p e l a U n i v e r s i d ad e d e S ã o
P a u l o ― U S P . P r o f e s s o r a T i t u l a r d a U n i v e r s i d ad e E s t a d u a l d e F e i r a d e
S a n t a n a ― U E F S , a t u a n d o n o e n s i n o d e g r ad u a çã o e p ó s - g r a d u a ç ão
( P r o g r a m a d e P ó s - g r a d u a ç ão em L i t e r a t u r a e D i v e r s i d ad e C u l t u r a l e D e s e n h o , C u l t u r a e I n t er a t i v i d a d e ) . C o o r d en ad o r a d o s p r o j e to s d e p e sq u i s a : “ D o cu m en t a ç ã o d e F e i r a d e S an t a n a : u m t r a b a l h o l i n g ü í s t i c o f i l o l ó g i co ” , “ E s t u d o h i s t ó r i co , f i l o l ó g i c o e a r t í s t i c o d e d o cu me n to s m a n u s c r i t o s b a i a n o s d o s s é cu l o s X V I I I ao X X ( F i n an c i a me n to F AP E S B ― F u n d a ç ã o d e A mp a r o à P e sq u i s a d o E s t a d o d a B a h i a ― 2 0 0 4 a 2 0 0 7 ) ” e
“ E d i ç ã o c r í t i c a d e au t o r e s b a i a n o s ” ( F i n a n c i a m en t o F A P E SB ― F u n d a ç ã o
d e A mp a r o à P e sq u i s a d o E s t a d o d a B ah i a ― 2 0 0 8 a 2 0 10 ) . L í d er d o s
G r u p o s d e P e s q u i s a : G r u p o d e E d i ç ão d e T e x to s ― G E T e N ú c l e o d e
E s t u d o s d o M an u sc r i t o ― N E M a/ U E F S ( D i r e t ó r i o d o s G r u p o s d e P e sq u i s a
― CNPq).
J
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ISSN 2236-3335
O V O C A B U L Á R I O FA R M A C O L Ó G I C O
PRESENTE NO JORNAL FOLHA DO NORTE
DA DÉCADA DE 1940
Gleide Conceição de Jesus
Licenc iatura e m Le tras Ve rnáculas
[email protected]
Jose nilce Rodrigue s de Oliveira Barreto
Licenc iatura e m Le tras Ve rnáculas
nilce11.barre [email protected] om
L idiane Ferreira Silva
Licenc iatura e m Le tras Ve rnáculas
[email protected]
Rosana Maria Carneiro Rios
Licenc iatura e m Le tras Ve rnáculas
[email protected]
Viviane Macedo de Jesus
Licenc iatura e m Le tras Ve rnáculas
[email protected]
Res umo : Obj et i va -s e com es t e a rt i go a na l i sa r a l guma s l exi as
pert encent es a o v ocabul á ri o fa rma col ógi co pres ent e na s eçã o
de a núnci os publ i ci t á ri os do j orna l F olha do Norte , da década
de 1 94 0, bem como a pres ent a r a l í ngua como uni da de v iv a ,
que es tá s uj ei t a a i nov a ções l exi ca i s a t odo o t empo, a l ém de
fa zer um l eva nt amento s is t ema t i za do do l éxi co pert encent e à
á rea de medi ca ment os e pa t ol ogi as no j orna l s upra ci ta do, v eri fi ca ndo a s ua ut i l i za çã o na época .
Pa l av ras- Cha v e: L éxi co. Vocabul á ri o fa rma col ógi co. J orna l Fo l h a d o No r t e . Dé c ad a d e 19 4 0 .
Abs t ra ct : The purpos e of t hi s pa per i s t o ana l yze s ome l exi a s
t ha t bel ong t o the pha rma cologi ca l voca bula ry pres ent i n t he
a dv ert i s ement s s ect i on of t he newspa per j orna l ‘F ol ha do
N ort e’ i n t he 1 940s , as wel l a s pres ent i ng the l a nguage a s a
l i v i ng uni t , whi ch i s under t he i nfl uence t o l exi ca l i nnova t i ons a l l
t he t i me, bes i des ma ki ng a s ys t ema t i c s urvey of t he l exi con
J
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whi ch i s pa rt of t he rea l i t y of t he medi ci ne a nd pa t hol ogy i n
t he a forement i oned news pa per, checki ng i t s us e i n t he epoch.
K eywords: L exi con. Pha rma cologi ca l vocabul a ry. N ews paper
‘ F ol ha do N ort e’ . D ecade of t he 1 940 .
1 INTRO DU ÇÃO
D es de os pri mórdi os da huma ni dade o s er humano s ent i u
a neces s i da de de “da r nome” às coi s as à s ua v ol ta . Ini ci a l ment e i s s o era fei t o no perí odo das cav ernas em que os s eres
pri mi t i v os des env olv eram a ca pa ci da de de comuni ca çã o a t rav és das i ns cri ções rupes t res , a s qua i s s e apres ent ava m como
“es quema s ” que t i nham a fi na l i da de de av i sa r a os out ros a cerca das bel ezas e dos ri s cos que exis t i am a l ém da s ua morada .
Ao des env olver a fa la, o homem pass ou a fazer os regis t ros hist óri cos a t rav és da mnemôni ca , ou s eja , as pess oa s
dest a época t i nham que memori za r t odas as coi sas /fa tos ocorri dos , a fim de conserva r a s ua cult ura , vi st o que a es crit a a inda nã o hav ia surgido. A part i r do momento em que a quela a pa receu, a humani da de começou a fazer os regi st ros his tóri co cul t ura is a t rav és dos papi ros e, pos t eriorment e, dos pergaminhos , como forma de pres erva r por ma i s t empo a s ua cul tura.
Porém, qua ndo est es começa ra m a s er dani fi ca dos pela
t ra ça ou pel as a ções do t empo, t a i s como a poei ra , a umi da de,
o ca l or e pel a i nt erv ençã o de t ercei ros , s urgi u a neces s i da de
de um mei o que v i es s e recupera r e/ou cons erva r es s es ma nus cri t os; s urgem entã o a s edi ções t ext ua i s .
2 A F I LO L O G I A E A E D I Ç Ã O DI P L O M Á TI C A DO S A N Ú N C I O S
P U B LI C I T Á RI O S D O J O R N A L F O L HA D O N O R T E D A D É C A D A
DE 1940
A F i l ol ogi a s urge “[ . . . ] como a ci ênci a hi s t óri ca que t em
por obj et o o conheci ment o das ci v i l i za ções pa ss a da s a t rav és
dos document os es cri t os que ela s nos deixa ram: es t es nos
J
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permi t em compreender e expl i ca r as s oci eda des a nt i ga s ” (D UB OIS, 1 99 3, p. 29 3) . At rav és des sa afi rma çã o, podemos
di zer que es ta ci ênci a não apenas est uda, ma s t ambém ana l i sa
a s l í nguas a t rav és dos document os es cri t os , v i s to que es t es
s ã o i ndi cadores i mport a nt es de como é ou foi o modus vivendi
de uma comuni da de l i nguís t i ca . Al ém do ma is , a quel es apres ent a m como as quest ões s oci a i s , pol í t i ca s , econômi cas , hi s tóri ca s
e cul t ura i s es tã o i mbri cadas no process o de forma çã o do l éxi co de um det ermi nado pov o.
Ai nda em rel a ção à F i l ol ogi a, é i mport a nt e res s a l ta r que
es t a á rea do conheci ment o s ó ga nhou status de ci ênci a , a
pa rt i r do s écul o XIX, com os est udos hi s tóri co - compa ra t i vos
da s l í ngua s româ ni cas fei t os pel o l i ngui s ta a lemã o F ri edri ch D i ez. Pa rt i ndo-s e di ss o, Auerba ch ( 197 2, p. 1 1 ) des crev e a F i l ol ogi a como “[ . . . ] o conj unt o das a t iv i da des que s e ocupa m met odi ca ment e da l i ngua gem do Homem e das obra s de a rt e es cri t a s nes sa l i ngua gem [ . .. ] ”, a ss im es t uda r a l ingua gem pres ent e
em um t ext o exi ge do edi t or o conheci ment o da l í ngua em que
o document o foi es cri t o e pa ra i s so é neces s á ri o o es t udo
cont í nuo da s l í nguas .
Uma das t a refas da F i l ol ogi a é res gat a r os document os . E
pa ra a l ca nça r es s e obj et i v o ut i l i za mos nes t e t ra ba l ho a Edi çã o
D i pl omá t i ca , em que procuramos mant er o t ext o o ma is fi dedi gno pos s ív el , ou s ej a , foi res pei ta da a forma ori gi na l do document o. Al ém dis s o, é i mporta nt e des t a ca r que es t a edi çã o foi
fe i t a como forma de fa ci l i t a r a l ei t ura dos anúnci os publ i ci t á ri os
do j orna l F olha do Norte , v i st o que, mui t os del es s e encont ram
em est a do de det eri ora ção ( ras ga dos , mancha dos , i l egív ei s a
ol ho nu) , mesmo j á t endo s i do di gi ta l i za dos .
Pa ra a edi çã o dos a núnci os publ i ci t á ri os fora m res pei ta dos a l guns cri t éri os como:

numera çã o do t ext o l i nha por l i nha , i ndi ca ndo a numera ção de ci nco em ci nco;
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 i ndi ca r as ras uras , a crés ci mos e s upress ões a t rav és
dos s egui nt es opera dores :
( ( † ) ) ra s ura i l egív el ;
[ † ] es cri t o nã o i dent i fi ca do;
( . . . ) l ei t ura i mposs í v el por da no do s uport e;
( ) ra s ura ou mancha .
3 O CORPUS
O corpus des t e t ra ba l ho é compos to por 27 a núnci os publ i ci t á ri os compreendi dos ent re os mes es de j a nei ro a dezembro de 1 9 40 a 194 7 pert encent es a t rês univ ers os da á rea de
s a úde, a sa ber, o fa rma col ógi co, o dos t ermos da B i ol ogia e da
Medi ci na e o da s Pa t ol ogi as , est es , pres entes no j orna l F olha
do Norte . O referi do j orna l t ev e s ua primei ra edi çã o em 1 7 de
s et embro de 190 9 e é uma i mport a nt e font e de pes quis a s obre
a hi st óri a da ci da de de F ei ra de Sant a na e de s ua i dent i da de,
a ss i m como ba s e pa ra os es t udos s obre o l éxi co i nerent es a os
ca mpos do sa ber ci t a dos a nt eri orment e.
O nos s o obj et o de es tudo s e encont ra di s poní v el no Mus eu Ca sa do Sertã o, l oca l i za do na Univ ersi da de Es t adua l de
F ei ra de Sa nta na – UEFS, na ci da de de F ei ra de Sa nta na -Ba hi a .
4 O LÉXICO
A l í ngua é uma uni dade v iv a que es t á em cons t ant e ev ol uçã o. Sendo as l í nguas uni da des v iv as , é óbv i o que ela s pos s uam o s eu própri o l éxi co, ass i m B i derma n ( 19 9 8, p. 1 1 ) defende
a i dei a de que a “[ . .. ] gera çã o do l éxi co se proces sou e s e
proces sa a t rav és de a t os s ucess iv os de cogni çã o da rea l i da de
e de ca t egori za ção da experi ênci a, cri s t a l i za da em s i gnos l i nguí s t i cos : as pa lav ras [ . . . ] ”. Confi rma ndo o pos i ci onament o de
B i derma n, Sauss ure ( 19 70 , p. 80 ) a pres enta o s i gno l i nguí s t i co
como ent i da de de dua s fa ces , que “[ . . . ] une nã o uma cois a e
J
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uma pa l av ra , mas um concei t o e uma ima gem a cús t i ca ”, ou s ej a , o s i gno l i nguís t i co é cons t i t uí do de dua s formas : uma que é
o s i gni fi ca do, repres ent ado pel o s eu equiv a l ent e no mundo ext eri or, e uma s i gni fi ca ção, que é a i dei a ou noçã o que el a bora mos, em noss a ment e, do obj et o repres ent a do.
D ess a forma , “[ . . . ] es t uda r o l éxi co de uma l í ngua é env ereda r pel a his t ória , cost umes , há bi t os e est rut ura de um pov o,
pa rt i ndo- s e de s ua l exi as [ . . . ] ” (ABBAD E, 200 6 , p. 21 3) . Ass i m,
t orna -s e i ndi spensáv el que a s l exia s s ej am cons erv a da s e i ss o
s erá fei t o a pa rt i r do moment o em que es ta s s ej am es t uda das ,
des cri t as e a na l i sa das .
Ai nda em rel a çã o ao l éxi co, Sa nt os ( 20 09 , p. 1 1 ) di z que
[ . . . ] d e v e - s e e s tu d a r o l é x i c o d e u m a l í n g u a , l e v an d o
e m co n t a o f a t o d e s e r a l i n g u ag em u m f a t o s o c i a l
por excelência e, desse modo, resultante dos contatos
s o c i a i s q u e s e e s t a b e l e c em a o l o n g o d o t e mp o e r e v e l a d o r a d o s h á b i t o s , c o s tu m e s , e n f i m , d o mo d u s v i v en d i , d o s a s p e c t o s s o c i a i s e c u l t u r a i s , d e u m a d a d a
c o mu n i d ad e , d o s p o v o s , d e mo d o g e r a l .
Com i s so, es t uda r a l í ngua a t rav és do l éxi co cons ta nt e
nos a núnci os publ i ci t á ri os é uma das formas que s e t em de
conhecer a cul t ura , o ca mpo l exi ca l fa rma cológi co, pa t ol ógi co e
es pecí fi co da medi ci na do perí odo em ques tão, as s im como obs erva r o ní v el de conheci ment o pert encent e à quel e det ermi nado grupo, i ncl ui ndo a própri a l i ngua gem ut i l i zada por el e.
Port a nto, a pres entamos nest e t ra ba l ho um es t udo l exi ca l
do v oca bulá ri o fa rma col ógi co, pa tol ógi co e de t ermos es pecí fi cos da medi ci na a pa rt i r do j orna l F olha do Norte da déca da de
1 94 0, o qua l t erá como ponto de pa rt i da o el enca ment o da s
l exi a s em ma croca mpos , os qua is foram s ubdi v i di dos em a l guns
mi crocampos , a sa ber, ma crocampo dos remédi os → mi crocampo da s Pí l ula s , mi crocampo dos l í qui dos, dos pa s tos os e mi croca mpo dos component es quími cos ; ma croca mpo dos t ermos
es pecí fi cos da Medi ci na → mi crocampo da s Pa t ol ogi as e mi cro-
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ca mpo da Ana tomia . Em s egui da , há a a pres ent a çã o do cont ext o em que a l exi a a na l is a da apa rece, es ta é des ta ca da no
fra gment o com um s ubl i nha do pa ra mos t ra r o mei o l i nguí s t i co
em que a encont ra mos .
4.1 MACROCA MPO DO S REMÉDIO S
Microcampo: Pílulas
PÍLULAS CARTERS Indi ca do pa ra : Aj uda na ci rcul a çã o da bí l i s produzi da pel o fí gado a uxi l i ando na di ges t ã o.
Cont ext o : “[ . . . ] Na da há como as famos as pí l ul a s CARTERS pa ra
o fí ga do, pa ra uma a cçã o cert a [. . . ] Peça as pí l ul as CARTERS
pa ra o fí ga do [ . .. ] ”. ( F OLHA D O NORTE, 194 2, p. 2) .
PÍLULAS DO ABBADE MOSSIndi ca do pa ra : Comba t er a s mol és t i as do fí ga do, es t ôma go e
i nt es t i no.
Cont ext o : “[ . . . ] As Pí l ul as do Abbade Mos s , formul adas excl us i v ament e pa ra comba t er a s mol és t ia s do fíga do, es t ôma go e
i nt es t i nos, fa zem des a ppa recer em pouco tempo o ma u est a r
do fí ga do, a dys peps ia e a pris ã o de v ent re [ . . . ] ”. ( F OLHA DO
N ORTE, 194 0, s . p. ) .
Microcampo: Remédios líquidos
XAROPE TOSSIndi ca do pa ra : Gri pe e res fri a dos .
Cont ext o : “[ . . . ] Aj uda a comba t er a t oss e e res fri a dos/ Toss s ó
pode fa zer bem”. ( FOLHA D O NORTE, 1 94 1 , p. 2) .
VINHO CREO SO TA DO Indi ca do pa ra : fraqueza orgâ ni ca .
Cont ext o : “Vi nho Creos ota do é um poderoso fort i f i ca nt e que s e
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recommenda a t odos a quel l es que a t ra v es sa m um perí odo de
fra queza orgâ ni ca [ . . . ] ”. ( FOL HA DO NORTE, 1 941 , p. 2) .
SANGUENOLIndi ca do pa ra : Adqui ri r peso.
Cont ext o : “[ . . . ] SAN GUEN OL- É o úni co fort ifi ca nt e no mundo
com 8 el ement os toni cos : Phos phoro, Ca l ci o, Ars enia t o, Vanada t o, et c [ . . . ] ”. (F OL HA D O N ORTE, 1940 , p. 1 ) .
ELIXIR DE NOGUEIRA Indi ca do pa ra : F eri das , Ma ncha s, Úl ceras , Da rt hros , Eczemas ,
Es pi nha s, Rheuma t is mo, Es crophula s s yphi l i t i ca s .
Cont ext o : “[ . . . ] Nã o s e i l uda : é o El i xi r de N oguei ra . O s eu Remedi o/O grande depura t iv o de sa ngue que nos sos av ós j á us ava m”. (F OL HA D O N ORTE, 194 0, p. 3) .
VA NA DIO LIndi ca do pa ra : F ra queza , pa l i dez, ma greza e fa s t i o.
Cont ext o : “MAGROS E FRACOS Vana di ol é indi ca do nos ca sos
de fra queza , pa l i dez, magreza e fa s t i o, porque em s ua fórmul a
ent ra m s ubs tâ nci as t a is como Va nada t o de s ódi o, L i ci t i na , Gl i cerofos fa t o, peps i na , noz de col a , et c. [ . . . ] ”. (F OL HA D O NORTE,
1 94 3, p. 1 ) .
MENAGOLIndi ca do pa ra : Regul a r o i nt es t i no.
Cont ext o : “Senhoras ! /Se a Na t ureza F a l ha / Mena gol R E G UL A ! ” .
( F OL HA DO N ORTE, 1 946 , s . p. ) .
Microcampo: Remédios past osos
PO MA DA MINA NCORA Indi ca do pa ra : F eri da s , Quei ma dura s , Úl ceras de Ba úru, F a gedeni ca s , Ca nceros as , D oenças da pel e, Cabeça , Infl a ma ções
dos ol hos , Ros t o, et c.
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Cont ext o : “Poma da Mi na ncora cura t oda s a s F eri das , quei ma dura s , Úl ceras de Ba úru, F a gedeni ca s , Ca nceros as , doença s da
pel e, ca beça , i nfl a ma ções dos ol hos , ros to, et c. [ . . . ] ”. ( F OLHA DO
N ORTE, 194 0, p. 1 ) .
PARASITINAIndi ca do pa ra : Cont ra s a rda s , fri ei ras , cocei ra s e pi ca da s de
i ns et os .
Cont ext o : “[ . . . ] Com Pa ras i t i na /fi ca rá compl et a ment e a l iv i ado e
l i v re do t orment o que o a fl i nge! / Pa ras i t i na é fá ci l de a pl i ca r e
pode s er us ado s em cons t ra ngi ment o. Nã o cont ém enxofre,
nã o ma ncha a pel e e a roupa , nem dei xa chei ro des a gra dáv el .
[ . . . ] ”. ( F OL HA D O N ORTE, 194 6 , s . p. ) .
Microcampo: component es químicos
L ICITIN A: s . f. L i pídi o que cont ém á ci do gl i cerofos fóri co, a bunda nt e na gema do ovo e no t eci do nerv os o, produzi da pel o
orga ni smo e que es t imul a a nut ri çã o.
Cont ext o : “[ . . . ] porque em s ua fórmula ent ram s ubs tã nci as t a i s
como v a na da t o de s ódi o, l i ci t i na , gl i cerofos fa to [ . . . ] ”. ( F OL HA D O
N ORTE, 194 3, p. 1 ) .
GL ICEROF OSFATO : s .m. ( gl í cero+fos fa t o) Quím. Sa l do á ci do gl i cerofos fóri co.
Cont ext o : “[ . . . ] porque em s ua fórmula ent ram s ubs tâ nci as t a i s
como va na da to de s ódi o, l i ci t i na, gl i cerofosfa t o , peps i na [ . . . ] ”.
( F OL HA DO N ORTE, 1 943, p. 1 ) .
4.2 MA CRO CA MPO: TERMO S ESPECÍFICOS DA MEDICINA E
DA BIO LO GIA
Microcampo: Pat ologias
CÓL ICAS UTERINAS : s . f. ( col i +i ca ) . Medi ci na . [ . . . ] dor a bdomi na l
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i nt ens a ca us a da por uma doença ut eri na ou pel a mens t rua çã o.
Cont ext o : “A mul her nã o s ofrerá dores. Al i vi a col i cas ut eri na s
em 2 hora s [. . . ] ”. ( FOL HA D O NORTE, 1 94 1 , p. 3) .
CEGUEIRA: s . f. ( cego+ei ra ) . 1 F a l ta de v is t a; es t a do do que é
cego; i nca pa ci da de de v er; a bl eps ia . [ . . . ] .
Cont ext o : “[ . . . ] Produz dores nos Oss os, Reuma t is mos , Ceguei ra , Queda do ca bel o, Anemi a , Abortos e fa z os i ndiv í duos i di ot a s . [ .. . ] ”. ( FOLHA D O NORTE, 1 94 2, p. 2) .
D YSPEPSIA : s . f. ( gr dyspeps ia ) . Med Má di gest ã o, di fi cul da de na
di ges t ão.
Cont ext o : “[ . . . ] fa zem desa ppa recer em pouco t empo o ma u est a r do fí gado a dyspeps ia e a pri s ão de vent re”. ( F OL HA DO
N ORTE, 194 0, p. 1 ) .
IN SÔN IA: s . f. ( l a t ins onmia ) . 1 Fa l t a de s ono. 2 D i fi cul dade de
dormi r.
Cont ext o : “[ . . . ] pes s oa s nerv osa s i rri t áv ei s e s uj ei t as a i nsôni a ,
um t ra t ament o rá pi do e pos i t i v o, res ta urando a norma l i da de do
s i s t ema nerv os o. (F OL HA D O N ORTE, 194 5, s . p. ) .
CÂIMB RAS : s . f. ( frâ nci co * kramp, v ia fr. ) . 1 Medi ci na . Cont ra ção
i nv ol untá ri a e dol orosa de um mús cul o ou grupo de mús cul os.
[...].
Cont ext o : “[ . . . ] OL EO ELECTRICO no t ra t ament o de dores reumá t i ca s , ca imbras , nev ra l gi as e dores ou t orcedura s de mús cul os e t endões [ . . . ] ”. ( FOL HA DO N ORTE, 1 94 1, p. 3) .
ESPINHAS : s . f. ( l a t s pi na ) . 4 Medi ci na . B orbul ha que nas ce na
pel e; a cne. [ . . . ] .
Cont ext o : “[ . . . ] Emprega do com êxi t o nas F eri da s , Ma ncha s , ul cera s , Da rt hros , Eczema s , Es pi nhas , Rheumat i s mo, Es crophula s
Syphi l i t i ca s [ . . . ] ”. ( FOL HA D O NORTE, 1 940 , p. 3) .
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Microcampo: A natomia
PELE : s . f. ( la t . pel l e) . 1 Membra na que rev est e ext eri orment e o
corpo do homem e o de mui t os a nima is . 2 Epiderme.
Cont ext o : “[ . . . ] A s í fi l i s a t a ca t odo o orga ni smo. O fí ga do, o B aço, o Cora çã o, o es tôma go, os Pul mões e a Pel e. [ . . . ] ”. ( F OL HA
D O NORTE, 194 2, p. 2) .
CORAÇÃO: s. m. ( de um der. do l a t . cor) . 1 Ana t omi a . Órgão oco
e mus cul os o, cent ro mot or da ci rcul a çã o do s a ngue.
Cont ext o: “[ . . . ] A s í fi l i s a t a ca t odo o orga ni smo. O fí ga do, o B aço, o Cora çã o , o es tôma go, os Pul mões e a Pel e. [ . . . ] ”. ( F OL HA
D O NORTE, 194 2, p. 2) .
TEND ÃO: s .m. ( la t . t endone) . Ana t omi a . F ei xe de fi bras que gera l ment e une os mús cul os aos os s os , em forma de cordão, por
v ezes redondo, e ma is frequent ement e a cha ta do, de cor bra nca bri l ha nt e. [ .. . ] .
Cont ext o : “[ . . . ] OL EO ELECTRICO no t ra t ament o de dores reumá t i ca s , ca imbras , nev ra l gi as e dores ou t orcedura s de mús cul os e t endões [ . . . ] . ” ( FOL HA DO N ORTE, 1 94 1, p. 3) .
5 CO NSIDERA ÇÕES FINA IS
A edi çã o de document os é um dos i ns t rument os que pos s i bi l i t a a s ua cons erva çã o, fa ci l i t a ndo a l ei t ura dos mes mos por
pes qui sa dores de div ersa s á rea s do sa ber, a l ém de t razer à
t ona i nforma ções de v a l or i nes t imáv el s obre a s oci eda de de
ent ã o, proporci ona das a pa rt i r da edi çã o di pl omá t i ca . Es t e t ra ba l ho repres enta a penas um pouco do cont eúdo l i nguí s t i co cul t ura l que o j orna l F olha do Norte cont ém, v i s to que nos det i v emos a penas aos a núnci os publ i ci t á ri os rel a ci ona dos à á rea
da s a úde, mas exis t em mui t os out ros a spect os importa nt es pa ra s erem es t uda dos e/ou expl orados .
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At rav és da s edi ções rea l i za da s, pudemos cons t at a r nest e
t ra ba l ho a l gumas a l t era ções gra femát i ca s na es cri t a da época
em rel a ção à cont emporanei da de como, por exempl o, a l exi a
“Mi nâ ncora ”, que na a t ua l i da de ga nhou o acent o ci rcunfl exo;
“cér ebro” t ambém ganhou o a cent o agudo, o que na década
de 1 9 40 era i dent i fi ca do em cont ext os a l t erna dos, ou s ej a , ora
a pa reci a com a cento, ora nã o, is t o nos mos t ra como era comum a fa l ta de conv enções ortográ fi cas . Al ém des t es exempl os , ta mbém podemos ci t a r out ras l exi as que s ofreram a l t era ções na es cri ta , ta i s como: “cól i ca s ”, “reuma ti s mo”, “s í fi l i s ” ( que
dent ro do própri o cont exto j á a pres ent ava muda nça s ) , e out ra s
que nã o a na l i sa mos , mas que percebemos est a s a l t era ções como “pess oa ”, que a pres entav a a cent o ci rcunfl exo; “a cção” com
“c” e “ç” e out ros , s endo que a ma i oria das l exi a s perma neceu
i gua l .
Port a nto, fazer um es t udo do univ ers o fa rma col ógi co a
pa rt i r da edi çã o dos a núnci os publ i ci t á ri os pos s i bi l i t a nã o s ó
uma pos t eri or v ei cula çã o del e nos mei os a ca dêmi cos como
t a mbém a cons erva çã o da memória cul t ura l e l i nguí s t i ca do pov o que v iv eu dura nt e a déca da de 1940 .
REFERÊNCIAS
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AUERBACH, Eri ch. Int roduçã o a os es t udos l it erá ri os . Tra dução
de J os é Pa ul o Pa es . Sã o Pa ul o: Cul t ri x, 19 72.
B IDERMAN , Ma ri a Thereza Cama rgo. As ci ênci a s do l éxi co. In:
OL IVEIRA, Ana Ma ria Pi nt o Pi res de; ISQUERD O, Apa reci da N e-
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MICHAEL IS. Moderno di ci oná ri o da l í ngua port uguesa . Sã o Pa ul o: Compa nhi a Mel horament os , 19 98.
SAN TOS, Rosa B orges dos . L éxi co e cul t ura . In: QUEIROZ, Ri t a
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F ei ra de Sa nta na , 200 9 .
SAUSSURE, F erdi na nd de. Curs o de l i ngüí s t i ca gera l . 2. ed. São
Pa ul o: Cul t ri x, 19 70 .
J
Graduando, Feira de Santana, v. 2, n. 3, p. 67-78, jul./dez. 2011
ISSN 2236-3335
DETERMINA -ME OU DEVORO -TE: UMA
C O N S I D E R A Ç Ã O S O B R E ( A FA LTA D E )
C R I T É R I O S A D O TA D O S PA R A A D E F I N I Ç Ã O
DE SU JEI TO INDE TER MI NADO E ORAÇÃ O
SEM SU JEI TO EM LIVRO S DID ÁT ICO S
Laudelino Santos Oliveira
Licenc iatura e m Le tras c om Inglê s
lorde [email protected] om.br
P r of a. Ma. Ed na Ri be i ro M ar que s Am or im [1] (O rie nta d or a/U E FS )
D ep arta ment o de Le tras e A rtes (D LA )
[email protected]
Res umo : Um dos ma i ores probl ema s com o ens i no de gra má t i ca
em sa l a de a ul a em nos s o pa ís res ide na abs ol ut a fa l ta de coerênci a dos cri t éri os adot ados pa ra defi ni r os concei t os grama t i ca i s . Es s e cl i ma de i ncert eza é uma das pri nci pa i s ca usas
da s di fi cul da des encont radas pel os a l unos na a prendi za gem de
s i nt a xe. Ess e es tudo pret ende mos t ra r, a t rav és de uma cons i dera çã o dos concei t os ut i l i za dos pel os l i v ros di dá t i cos pa ra
defi ni r s uj ei t o i ndet ermi na do e ora çã o s em s uj ei t o, a urgent e
neces s i dade de rev is ão dos cri t éri os at ua lment e usa dos.
Pa l av ras –chav e: Gramá t i ca . Concei t os. Suj ei t o. L iv ro di dá t i co.
Abs t ra ct : One of t he bi gges t probl ems wi th t he t ea chi ng of
gra mma r i n t he cl a ss room i n our count ry l ies i n t he a bs ol ut e
l a ck of coherence i n t he cri t eri a a dopt ed t o defi ne gramma t i ca l
concept s . Thi s cl ima t e of uncerta i nt y i s one of t he ma i n
rea s ons for t he di ff i cul t i es encount ered by s t udents i n t he
l ea rni ng of s ynt a x. Thi s s t udy i nt ends t o s how, t hrough a
rev i ew of t he concepts us ed by cours e - books to defi ne the
undet ermi ned s ubj ect and t he cl aus e wi thout subj ect , t he
urgent neces s i ty for a rev is i on of t he current l y a dopt ed
cri t er i a .
K eywords: Gramma r. Concepts . Subj ect . Cours e - book.
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1 INTRO DU ÇÃO
A s i nta xe s empre foi uma dor de ca beça pa ra os a l unos
bra s i l ei ros . At iv i da des e ma i s a t i v ida des de aná l i s e s i ntá t i ca nã o
s e t em mos t rado efi ca zes em produzi r uma a prendi za gem efet i v a . A rea l i da de é que os a l unos sa em da es col a bás i ca s em
ent ender mesmo os pri ncí pi os grama t i ca is ma i s bá s i cos . Pa rt e
des sa cul pa cabe à i mpreci sã o com que os concei t os gra ma t i ca i s sã o defi ni dos , probl ema há mui t o a ponta do pel os l i ngui st a s . Há uma a bsol ut a fa l ta de cri t éri os na defi ni çã o de concei t os grama t i ca i s , o que gera um cl i ma de “deus - nos- a cuda ” na
hora da ava l i a ção de port uguês na es col a .
Pa rt e i nt egra nt e do ens i no de port uguês , o l i v ro di dá t i co
t em des empenhado a o l ongo da hi s tóri a da educa çã o bras i l ei ra
um pa pel s i ngul a r e cont rov ers o. D ura nt e mui t o t empo rei nou
a bs olut o na s s a la s de a ul a bras i l ei ra s como res erva do “ma i s
puro sa ber grama t i ca l ”, s endo, i ncl us i v e, em mui t os cas os , a
úni ca pl a ta forma de es t udo da l í ngua mat erna . N ão es tá l onge
a época em que uma t í pi ca a ul a de l í ngua port uguesa s e res umi a a o es t udo do l iv ro di dá t i co de port uguês: s ua l ei t ura , execuçã o e correçã o das a t i v i da des . Al i ás , pa ra s ermos bem real i s t a s, ess e há bi t o nã o foi “apos ent a do”, res i s t e a i nda
(infelizment e) como estratégia (pedagógica?!?) seguida
( rel i gi osa ment e) por a l guns profes sores .
A di fusã o dos a va nços da l i nguí s t i ca moderna , ent reta nt o,
prov ocou profunda s muda nças na met odologi a de ens i no de
l í ngua ma t erna no pa í s, que res ul t a ra m, ent re out ra s coi sas , na
queda do l iv ro di dát i co de s eu “pedes ta l ”. Es t udos publ i cados
rev el a ram a neces s i da de de profess ores dimi nuí rem s ua dependênci a em rel a çã o a o l i v ro di dá t i co. A l i nguí s t i ca t ext ua l v ei o a dvoga r um ens i no bas eado no t ext o, Es se campo de es t udos a fi rma que é a t rav és do t ext o que s e t orna poss í v el um
ens i no cont ext ua l i za do, uma v ez que, s endo ora l ou es cri t o, “é
preci s ament e o l uga r das correl a ções ” ( GERALD I, 19 97 , p. 22) ,
quer di zer, é no t ext o onde ocorre a i nt era çã o ent re um enun-
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ci a dor e um ouv int e/l ei t or, e o di á l ogo ent re di v ers os cont ext os s óci o - cul tura i s. Por reuni r essa s ca ra cterí s t i ca s , a credi ta s e hoj e “que s ó o es t udo da s regul a ri da des t ext ua is e dis curs i va s [ . . . ] pode cons t i t ui r o obj et o de um ens i no de l í ngua que
pret enda s er produt iv o e rel eva nt e” ( AN TUN ES, 200 3, p. 4 2) .
Is s o cons t i tui u um gol pe a o l i v ro di dát i co em duas frent es . Pri mei ro, a o s e defender o us o de t ext os a ut ênt i cos em sa l a de
a ul a , as porta s pa ra o us o de j orna i s , rev i s ta s , crôni cas , mús i ca s , poes i as e a fi ns durant e a s a ul as foram a bert as , t ornando
pos s ív el que aul a s i nt ei ra s s ej am da da s s em que os l i v ros di dá t i cos s ej am ao menos cons ul ta dos . O s egundo gol pe ocorreu
qua ndo a l i nguí st i ca s ubmet eu o l i v ro di dát i co a o es t udo e
cons t at ou a s s ua s defi ci ênci a s , como a dis t ânci a cul t ura l des t e
em rel a çã o a os s eus us uá ri os ― os a l unos ―, o us o do “nã o t ext o” [ 2 ] e fa l t a de coerênci a, ent re out ros fa t ores que, juntos,
concorrera m pa ra a “queda ” do l iv ro di dá t i co como “v i l ã o”.
Ora , s e o l iv ro di dá t i co nã o ocupa pos i ção cent ra l no
proces s o de ens i no -a prendi za gem, ta mbém nã o é uma ferra ment a da qua l neces sa ri ament e o profess or dev a pres ci ndi r.
Todav i a , como meca nis mo ut i l i záv el na educa çã o regul a r, es t e
recurs o dev e prima r pel a exa t i dão t eóri ca e es t a r em s i nt oni a
com os ava nços da l i nguí s t i ca , que é a ci ênci a da l í ngua . Os
es t udos s obre o l i v ro di dá t i co mov eram as edi t ora s a fazerem
gra ndes muda nça s nel e. E o l i v ro di dá t i co de fa t o t em ev oluí do.
Por es ta ra zã o é que s e faz necess á ri o s empre o debruça r - s e
s obre essa ferrament a pa ra i dent i fi ca r s eus pont os fort es , que
dev em s er a prov ei ta dos , e s uas i ncoerênci as , a s erem ev i ta da s e a ponta das . Is t o a ca ba rá por res ul t a r em um mel hor ens ino de port uguês a o mes mo t empo em que s e força rá um t ra ba l ho de rev is ã o cons t ant e do l i v ro di dá t i co, cul mi na ndo em
edi ções de s uperi or qua l i da de.
D ada a na t ureza des s e t ra ba l ho, a met odologi a a dota da
eri gi u - s e a pa rt i r do es t udo compa ra do entre l i v ros di dá t i cos .
Como o obj et i v o não é a mera compa ra ção qua l i ta t iv a ent re
l i v ros , ma s s i m a expos i ção da fa l t a de cri téri o ent re es t es , o
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t ra ba l ho de compa ra çã o nã o cons t i t ui um es t udo ext ens i vo e
det a l hado da s obra s es col hi das . Pela mesma ra zã o, l i mi tou -s e o
obj et o de es t udo à aná l i s e das defi ni ções adot a da s por a l guns
l i v ros pa ra os concei t os de s uj ei t o i ndet ermina do e de ora çã o
s em s uj ei t o, a t í t ul o de comprov a çã o do que s e pret ende mos t ra r. As obras compa radas foram os l i v ros Viva Português: Ensino Médio Volume 1 , de a ut ori a de Sí l v ia L . Andra de, El i za bet h
Campos e Pa ul a M. Ca rdos o, publ i ca do pel a edi t ora Át i ca ; e
Português L inguagens: volume 2 , de a ut ori a de W i l l i am R. Cerej a e Thereza M. Cocha r, da edi t ora Sa ra iva . O c ri t éri o pa ra adoçã o das obras a s erem a na l i sa das s e pa utou em um process o de amos t ra gem. As duas obra s fi guram ent re as opções
ofere ci das pa ra os profes s ores de L í ngua Port uguesa do Col égi o Es t adua l L uí s Edua rdo Ma ga l hã es , es cola regul a r da rede
es t a dua l de ens i no l oca l i za da à Rua D r. Anís i o Morei ra Alv es ,
S/N, Cent ro, no muni cí pi o de Sa nto Es t evã o, es t a do da Ba hi a .
2 DA NECESSIDA DE DA A DO ÇÃ O DE CO NCEITOS EXA TOS
PA RA O ENSINO DE GRA MÁ TICA
D es de que o mét odo de i nv es t i ga çã o ci ent í fi ca s e cons ol i dou como ferramenta de i nv es t i ga çã o e compreens ã o da rea l ida de, em s ubs t i t ui çã o às v erda des rev el a da s pel a rel i gi ã o, pel a
mi t ol ogi a e pel o s ens o comum, o “pa t rimôni o” t écni co e cul t ura l
huma no t êm-s e a cumul a do em v el oci da des ca da v ez ma i s impres s i ona nt es . Ess e rápi do a cúmul o de conheci ment o e o s ubs equent e des env olv iment o des t e s ó s ã o poss í v ei s em um ambi ent e onde a s t eori as “bas i l a res ” forneçam uma sus t enta ção
confi á v el pa ra que nov as t eoria s de conheciment o s e erga m a
pa rt i r des t as . Por out ro l a do, em um ambi ent e onde as t eoria s
e concei t os sã o obs curos , é de s e es pera r que i mpere a i ns egura nça, o que torna di fí ci l o aprofundamento do conheciment o.
É prerroga t i va bás i ca de toda á rea do conheci ment o huma no que s e defi na ci ent í fi ca , com o perdã o da redundâ nci a , a
a doção e emprego s is t emá t i co e i ncondi ci ona l do mét odo ci en-
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t í fi co na cons t ruçã o do conheci mento. Ass i m, a a doçã o de um
concei t o qua l quer exi ge a prév ia del i mi ta ção das regras que
conduzi rã o a es s e concei t o. Iss o é de ext rema i mport ânci a ,
poi s : “O nív el de ci ent i fi ci da de só é a dqui ri do, quando o conheci ment o a t ende a det ermi na do número de cri téri os forma i s e os
s eus enunci a dos obedecem a det ermi na da s lei s de const ruçã o
de propos i ções . ( MATEUS , 197 3, p. 144 , apud HAUY, 199 4, p. 6 ) .
Ai nda ma is , Ma rt i net ( 197 2, p. 30 ) a fi rma :
Q u a lq u e r d e sc r i ç ão s e r á a ce i t á v e l s e fo r co er en t e , i s t o
é , s e b a s e a r - s e n u m p o n to d e v i s t a d e t e rm in ad o . Um a
v ez a d o t ad o t a l p o n to d e v i s t a , r e te r - se - ão ce r t o s
t r a ço s , d i t o s p e r t in en t e s , en q u an to s e a f a s t a r ão o u tr o s
p o r n ão -p e r t in en t e s . T o d a a c i ê n c i a p r e s su p õ e a e s c o lh a d e u m p o n to d e v i s t a p r ó p r i o . ( G r i f o d o au to r ) .
Pode- s e i nferi r, a pa rt i r do que j á foi di t o, que, pa ra um
concei t o s er reconheci dament e e genui na ment e ci ent í fi co, el e
preci s a , a nt es de qua l quer coi s a, pa uta r -s e em cri t éri os coerent es , l ógi cos e es pecí fi cos . Um concei t o, que os ci l a ent re um
embas ament o ora em det ermi na dos a s pect os, ora em out ros , é
defi ci ent e, e às v ezes at é cont ra di tóri o, o que o i nv ia bi l i za ria
de s er a dota do como ci ent í fi co. É i nconcebí v el i magi na r uma
ci ênc i a cuj as defi ni ções de concei t os funda ment a i s nã o sa t i s fa ça m a cri t éri os ci ent í fi cos . A ci ênci a t ra ba l ha com teorias científi cas e não com dogmas . Vê- s e, entã o, que a ques t ã o da neces s i dade de s e t ra ba l ha r com concei t os cient i fi cament e coerent es no ens i no de gramá t i ca nã o é a l go de pouca ou nenhuma i mport â ncia , a o cont rá ri o, dev e s er obj et o de profundo es t udo, pos t o que es t á di ret ament e l i ga do à própri a a cei t a bi l i da de
da t eori a grama t i ca l a dot a da como s endo ci ent i fi ca ment e v á l i da .
3 A C E R C A D O S C O NC E I TO S D E I N DE T E R M I N A Ç Ã O D O S U J E I T O
O ens i no médi o é cons i dera do como fa s e de cons ol i da çã o
dos a prendi za dos e sa beres a dqui ri dos ao l ongo do ens i no
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fundament a l . Pa rt i ndo, port ant o, da premis sa de que o a l unado
j á conhece concei t os grama t i ca is bás i cos , os l iv ros di dát i cos
de ens i no médi o nã o s e prol ongam em expl ica ções ext ens iv as ,
opt a ndo por defi ni ções ma i s s int ét i ca s e obj et i v as . O fa t o de
es sa s defi ni ções es ta rem s i nt et i za da s nã o cons t i t ui um probl ema em s i , des de que es sa s defi ni ções est ej a m exat as e nã o
permi t am i nt erpreta ções equiv oca das por pa rt e dos a l unos .
Vej a mos s e é i s so o que ocorre.
3 . 1 A S D E F I NI Ç Õ E S : D E T E R M I N A N D O O S U J E I T O I N D E T E R M I N A D O
O l i v ro de a ut oria de Andrade, Campos e Ca rdoso ( 20 10 )
a pres enta um qua dro com t i pos de s uj ei t o. Após des crev er os
concei t os de s uj ei t o s impl es , compos t o e des i nenci a l , el e diz
que o s uj ei t o i ndet ermi na do ocorre qua ndo “nã o é poss ív el i dent i fi ca r quem pra t i cou a a çã o v erba l ” ( Ibi d. , p. 1 7 9 ) . A s egui r,
o l i v ro i ndi ca a s duas forma s (a penas dua s ) na s qua is o s uj ei t o
i ndet ermi na do s e a pres enta . A primei ra , com o v erbo na 3ª
pes s oa do pl ura l , como em ” Colocaram o alpinista ferido em
uma maca ”; e a s egunda , com o v erbo na 3ª pes soa do s i ngul a r, s egui do do í ndi ce de i ndet ermi na çã o do s uj ei t o, s e, como
em ” Falou-se do alpinista ferido ”.
N o l i v ro de a ut ori a de Cerej a e Ma ga l hã es ( 20 10 ) , os t i pos
de s uj ei t o s ã o a pres ent ados por t ópi cos em s epa ra do, ut i l i za ndo- s e exempl os de ora ções ext ra í da s de t ext os já t ra ba l ha dos
no l i v ro. Lá o s uj ei t o i ndet ermi nado é defi ni do como “ aquel e
que nã o é nomea do na ora çã o, ou por nã o se querer nomeá - l o
ou por s e des conhecer quem pra t i ca a a çã o” ( Ibi d. , p. 37 5 376 ) . As s im como no cas o de Andra de, Campos e Ca rdoso ( op.
ci t . ) , Cerej a e Ma ga l hã es ( op. ci t . ) a pres entam dois procedi ment os pa ra a i dent i fi ca çã o do s uj ei t o i ndet ermi na do. O pri mei ro
s eri a col oca ndo -s e o v erbo ( ou o a uxi l ia r, s e houv er l ocuçã o
v erba l ) na 3ª pess oa do pl ura l , s em referênci a a s eres det ermi na dos ; e o s egundo s eri a emprega ndo -s e a pa rt í cula s e j unt o à 3ª pess oa do s i ngul a r dos v erbos i nt rans i t i vos , t rans i t iv os
i ndi ret os e de l i ga çã o .
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Conforme s e pode obs erva r, embora t enham s i do us a da s
pa l av ras di ferent es , a s dua s obras a dotam a mesma concepçã o, em cons onâ nci a com a Gra má t i ca Tradi ci ona l , de que o
sujeito indeterminado é um recurso utilizado para a não explicitação do agente da oração . Essa concepçã o, que s e bas ei a na
i dei a de sujeito é igual a quem pratica a ação , cons t i t ui a penas
o pri mei ro dos probl emas a pont a dos em rela çã o aos cri t éri os
a dota dos pa ra defi ni çã o de s uj ei t o i ndet ermina do, conforme o
próxi mo i t em há de mos t ra r.
3.2 ACERCA DOS PRO BLEMAS CO M A S DEFINIÇÕ ES DE
SU JEITO INDETERMINA DO
Como já i ndi ca do no i t em a nt eri or, a própri a concepçã o
de s uj ei t o i ndet ermi na do a pres ent a do nas gramá t i ca s e a dot a do
pel os l i v ros di dá t i cos j á é probl emá t i ca . Isso ocorre porque o
concei t o de suj ei t o como a gent e da a ção, t ra ns pa rent e nos
doi s l iv ros es tudados , mos t ra -s e frági l di a nte de a l guns fa t os
obs erv áv ei s . Por exempl o, Souza ( 2007 , p. 23) aponta o cas o
do v erbo saber na ora ção “ Sabem que i s s o ocorreu. ” Ora , t odos s a bem que o fa to de a l guém sa ber que a l go ocorreu nã o
o t orna a gent e da quela a çã o. Al guma s pessoa s podem l er em
uma rev i s ta e sa ber que o na ci ona l i st a s érv i o Gav i l o Pri nci p
a ss as s i nou o a rqui duque F ra nci s co F erdi na ndo da Áus t ri a , ma s
i s s o nã o as t orna agent es des sa a çã o ( o as sa ss i na to) que ocorreu no a no de 19 14 , em Sa ra j evo, nos B á lca s , há quas e 1 00
a nos ( ! ! ! ) . Como a fi rma Souza ( Ibi d. , p. 23) , “O v erbo sa ber é
um v erbo de ev ent o cogni t iv o e o s uj ei t o de s a ber é experi enci a dor e não a gent e”. ( gri fo nos s o) . Apes a r di s s o, a Gramá t i ca
Tra di ci ona l , dora va nt e GT, cl as s i fi ca o s uj ei t o des s a ora çã o como i ndet ermi na do.
O probl ema , que começa com a concei t ua ção, pers is t e na
expl a na çã o dos cri t éri os de ident i fi ca çã o dess e t i po de suj ei t o.
Is s o ocorre por conta de defi ni ções va ga s , i mpreci sa s ou i ncompl et as . Por exemplo, Andra de, Campos e Ca rdos o ( 20 10 )
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menci onam a pena s que uma da s forma s de s e i dent i fi ca r o suj e i t o i ndet ermi na do é que el e pode ocorrer qua ndo o v erbo es t á na 3ª pess oa do s i ngul a r, s egui do do í ndice de i ndet ermi naçã o do suj ei t o se . Ocorre que o l iv ro não menci ona que há ca s os em que se exercerá a funçã o s i ntá t i ca de pronome a pas s i va dor e nã o de í ndi ce de i ndet ermi na çã o do s uj ei t o. Is so poderi a s er j us t i fi cá v el s e o l i v ro menci ona ss e es s a pos s i bi l i da de
a o a borda r o concei t o de suj ei t o a gent e e pa ci ent e, o que nã o
a cont ece. A expl i ca çã o a dota da a bri ri a uma brecha , ent ã o, pa ra
a cei t a r a s egui nt e ora çã o como t endo s uj ei t o i ndet ermi nado:
Debateu-se a questão das cotas a tarde inteira . N o perí odo
ci t a do, o v erbo encont ra - s e na 3ª pess oa do s i ngula r e es tá
s egui do do pronome se , o qua l , ha ja v i st a a omis sã o da referênci a à poss i bi l i da de de se a pa recer na oraçã o como pronome
a pas s iva dor, pode s er t oma do como í ndi ce de i ndet ermi na ção
do s uj ei t o pel o a l uno. Ent reta nt o, s a bemos que s e t ra t a de uma
ora çã o com s uj ei t o s impl es (a ques t ão da s cot a s ) , embora na
v oz pas s iv a s i nt ét i ca. A impreci sã o, nes s e ca s o, poderi a l eva r
a o equív oco por pa rt e dos a l unos .
O ca s o do l iv ro de a ut oria de Cerej a e Ma ga l hã es ( 20 10 ) ,
a ss i m como Andra de, Campos e Ca rdos o ( 20 10 ) , peca por i gnora r ou nã o fa zer menção a out ras s i t ua ções nas qua i s há
ocorrênci a de ora ção com s uj ei t o i ndet ermi na do. Enumera r - s eá a qui , a pa rt i r de ent ã o, a l guns cas os de s uj e i t o i ndet ermi na do
que os doi s l i v ros a na l i s ados i gnoram.
Al guns gra má t i cos, como Cega l la ( 19 94 ) , apont am a ocorrênci a de s uj ei t o i ndet ermi na do em ora ções com o v erbo no
i nfi ni t i v o i mpess oa l , qua ndo nã o a ss oci a do a um s uj ei t o que s e
pode deduzi r do cont ext o. Es s e é o ca so do enunci a do de
F erna ndo Pess oa “ Navegar é preciso, viver não é preciso ” ( Ibi d, p. 9 6 , gri fo noss o) . Os v erbos em des ta que, que s e
encont ram no i nfi ni t i v o e s ã o us a dos com o v a l or de s ubs t ant i v o, exempl i fi ca m o ca so ma i s comum dess e t i po de s uj ei t o
i ndet ermi na do e neut ro, não abordado por nenhuma da s duas
obra s a na l i sa das , a fi na l , alguém nav ega e alguém v i v e.
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Qua ndo no gerúndi o, a forma v erba l t ambém pode, embora ma i s ra ra ment e, i ndi ca r a i ndet ermi na çã o do s uj ei t o. Um exempl o dess e cas o s eria Apenas trabalhando não se fica rico .
Apenas trabalhando , que t em va l or a dv erbia l moda l , express a
t a mbém um s uj ei t o i ndet ermi na do. O t exto a pres ent a a i dei a de
que a l guém que qui s er a penas t ra ba l ha r hones t ament e nunca
fi ca rá ri co. F i ca s ubent endi do que o enunci a dor s e refere a
a l guém, embora el e genera l i ze ou nã o det ermi ne es s e a l guém.
Al guns gra má t i cos, como L i ma ( 1 9 67 , p. 227 ), a i nda apont a m como ca sos de i ndet ermi na çã o do suj ei t o a s ora ções em
que s ão us a dos os pronomes i ndefi ni dos , como no cas o Tudo
nos interessa. N ess e cas o, há uma s i t ua çã o ma i s compl exa,
poi s o s i nta gma nomi na l encont ra - s e preenchi do por um pronome i ndefi ni do ( t udo) . Cont udo, por s erem esv azi a dos de s ent ido, ou poss uí rem s ent i do mui t o va go, a l guns gramá t i cos j us t i fi ca m a i ndet ermi na ção do suj ei t o qua ndo na ocorrênci a de pronomes i ndefi ni dos .
F a l ta de cla reza e i mpreci sã o nas defi ni ções adot adas e
a s omi ss ões de cas os de suj ei t o i ndet ermi na do const i t uem os
probl emas ma is preocupa nt es dos l iv ros es tuda dos . Como demons t ra do, a forma v aga como os concei t os s ã o a borda dos
pode conduzi r o a l uno a o erro na a va l i a çã o. Os l iv ros também
peca m pel o excess o de s impl i ci da de na expl i ci t a çã o da s regras ,
dei xa ndo de fora do es copo das ora ções com s uj ei t o i ndet ermi na do um gra nde número de rea l i za ções que poderi a m fa ci l ment e s er reconheci da s como t a is .
4 ACERCA DO S CO NCEITOS DE O RAÇÃO SEM SU JEITO
A aná l i s e dos concei t os de ora çã o s em s uj eit o a pres ent a dos nos l iv ros di dá t i cos a borda dos a pres ent ou a recorrênci a
dos mes mos probl ema s i dent i fi ca dos na a borda gem dos concei t os de s uj ei t o i ndet ermi na do: i mpreci s ã o e fa l t a de cri t éri os
nos concei t os a dot ados .
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4.1 “O SU JEITO SU MIU!” ― AS DEFINIÇÕES DE ORAÇÃ O
SEM SUJEITO
Em s ua abordagem de ora çã o s em suj ei t o, Andra de, Campos e Ca rdoso ( 20 10 , p. 179 ) s eguem o mesmo es quema apres ent a do no i t em 2. 1 , a s aber, a defi ni çã o a pres ent a da de forma
ba s ta nt e s uci nt a em um qua dro. É di gno de not a que, a o t enta r
defi ni r o que é ora çã o s em s uj ei t o, as a utora s não t enham us a do uma defi ni çã o de bas e s emâ nt i ca , mas t enham t enta do
uma concei t ua çã o ba s ea da em as pect os ma i s forma i s da l í ngua , como s e pode v er na defi ni çã o a dota da , que di z: Oração
sem sujeito : é a que tem o verbo impessoal . Em s egui da , s ão
a pres enta dos os pri nci pa i s v erbos i mpess oa is que, s egundo os
a ut ores, s eria m: 1 ) hav er , no s ent i do de “exi s t i r”; 2) hav er e
fa zer , i ndi ca ndo t empo decorri do; 3) s e r, i ndica ndo t empo; e 4 )
v erbos que i ndi cam fenômenos nat ura is .
Cerej a e Ma ga l hã es ( 20 10 ) , por out ro l a do, preferem a
t ra di ci ona l e j á “consa grada ” fórmula da defini çã o s ob a spect o
s emâ nt i co. El es a fi rmam: “Ora çã o s em s uj ei t o é a quela em que
a decl a ra çã o express a pel o predi ca do nã o é a t ri buí da a nenhum s er” ( Ibi d. , p. 376 - 377 ) . A s egui r, a pres ent am os cri t éri os
pa ra i dent i fi ca çã o de ora çã o s em s uj ei t o. Também ness e ca s o
os a ut ores opt am por a pont a r os v erbos impes s oa i s como refer ênci a pa ra i dent i fi ca çã o de ora çã o s em suj ei t o. Segundo os
a ut ores, sã o impes s oa i s : 1 ) os que i ndi cam fenômenos da natureza ; 2) o v erbo haver , com o s ent i do de “exi s t i r”; 3) os v erbos fazer, haver e i r , qua ndo i ndi cam t empo decorri do; e 4 ) o
v erbo ser , na indi ca ção de t empo em gera l .
4.2 ACERCA DOS PRO BLEMAS CO M A S DEFINIÇÕ ES DE
O R A Ç Ã O S E M S U J E I TO
Ass i m como no cas o das noções de s uj ei t o i ndet ermi nado, o probl ema com o concei t o de ora çã o s em s uj ei t o j á começa a pa rt i r da própria defi ni çã o. Cerej a e Ma ga l hã es ( 20 10 ,
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377 ) , por exempl o, a fi rmam que na s ora ções s em s uj ei t o a qui l o
que é di t o nã o s e apl i ca a nenhum s er. Iss o é probl emá t i co
por doi s mot iv os . Primei ro porque, s egundo os a utores ,
“predi ca do é o t ermo da ora çã o [ . .. ] que contém uma a fi rma çã o
a res pei t o do s uj ei t o” ( Ibi d. , p. 26 5) . Ora , s e i s s o é v erdade, a
s ent ença a ponta da pel os própri os a ut ores , “ Escureceu cedo
hoje ”, i mpl i ca ria di zer que, embora o predi cado s empre a pont e
pa ra um s uj ei t o, há cas os em que i ss o não ocorre. Só s e pode
concl ui r, ent ã o: ou uma da s defi ni ções adot ada s ( a defi ni çã o de
predi ca do ou a defi ni çã o de ora çã o s em s uj ei t o) é fa l s a ou ta l v ez a mbas as s eja m.
O out ro probl ema com ess a defi ni çã o pode s er a ponta do
em out ro exempl o da do pel os própri os a ut ores , “ Havia pessoas
descontentes na fila do banco. ” ( Op. ci t . , 377 ) . Se t oma rmos
por bas e a defi ni çã o us a da , que apl i ca cri t éri os s emâ nt i cos , e
s ubst i t ui rmos o v erbo haver por existir , como em “ Existiam
pessoas descontentes na fila do banco” , a i nda hav erá uma ora çã o s em s uj ei t o, poi s a s dua s ora ções sã o s ema nt i ca ment e
i gua i s . Todav i a , o que t orna a pri mei ra ora ção s em s uj ei t o, enqua nt o a s egunda nã o, é a rel a çã o de predi ca çã o ( o v erbo existiam concorda , ou t em uma rel a ção de predi ca çã o com pessoas ) , e nã o o a s pect o s emâ nt i co.
Al guns v erbos t i dos como impess oa i s ta mbém a pres ent am
out ro probl ema pa ra a s defi ni ções de ora ção s em s uj ei t o. Ta nt o Cerej a e Ma ga l hã es ( 20 1 0 ) , qua nt o Andra de, Campos e Ca rdos o ( 20 10 ) , a pont am os v erbos que i ndi cam fenômenos da nat ureza como exempl os de v erbos impess oa i s . Acont ece que
nenhum dos aut ores pa rece l ev a r em cont a a poss i bi l i da de da
ocorrênci a de enunci a dos como Amanheci sozinho. D es necess á ri o di zer que ess a ora çã o pos sui suj ei t o des i nenci a l ( eu) e
nã o s e t ra t a de ora çã o s em suj ei t o. É v erda de que uma l i st a
exa ust i va de s i t ua ções em que det ermi na do v erbo ocorre com
ou s em suj ei t o nã o s eri a mui t o di dát i ca . Entret a nt o, a cl as s i fi ca çã o de um v erbo como i mpes s oa l ― nesse ca s o, ama nhecer
― permi t i ri a o erro de cl a ss i fi ca çã o por pa rt e do a l uno.
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5 CO NSIDERA ÇÕES FINA IS
N a mi t ol ogia grega , o heroi Édi po s e depa rou com a Es fi nge enqua nt o es t ava a cami nho de Tebas . A Es fi nge era um
mons t ro que propunha eni gma s a os v ia j a ntes que pass av am
pel a es t ra da que conduzi a a Tebas . Cas o o v i a j a nt e fa l ha ss e
em expl i ca r o eni gma propos t o, a Es fi nge o dev ora va . Eni gma s
s ã o propos i ções const ruí das com o obj et iv o de ocul t a r ou di fi cul t a r a i dent i fi ca ção do s eu s ent i do v erda dei ro. Encont ram -s e
em ordem di ret ament e i nv ers a a os t eoremas e a xi omas ci ent í fi cos , que primam pel a cl a reza e a us ênci a de a mbi gui da de. Os
concei t os grama t i ca i s a dota dos pel os l iv ros di dá t i cos , no ent a nt o, conforme os exempl os cons i derados , a proximam -s e muit o ma is dos eni gmas propost os pel a Es fi nge do que dos concei t os pa uta dos em cri t éri os ci ent í fi cos . Ami úde, o resul t a do
t em s i do os a l unos de ens i no médi o s erem “dev orados ” por
es t e “mons t ro v oraz”, a obs curi dade dos concei t os grama t i ca i s ,
a o fra ca ss a rem em des env olv er compet ência s pa ra efet ua r uma a ná l i s e s i ntá t i ca.
Es sa fa l ha dos l i v ros di dá t i cos é refl exo de um probl ema
crôni co que a fet a t oda a Gramá t i ca Tradi ci ona l : a fa l ta de cri t éri os cl a ros e es pecí fi cos em s ua fundament a çã o. Gramá t i cos
a dota m l iv rement e e s em nenhum cont rol e cri t éri os ora morfol ógi cos , ora s i nt á t i cos , ou ora s emâ nt i cos , pa ra defi ni r concei t os gra ma t i ca is . O resul t a do “é um s amba do cri oul o doi do” que
s e ba s eia numa concepçã o s impl i s ta das rel ações ent re os a spect os forma i s e s emâ nt i cos da l í ngua. A fim de s e a l ca nça r
uma t eori a grama t i ca l que rea lment e s e a pres ent e como ferrament a efi ca z de ens i no, é necess á ri o o reconheci ment o da neces s i dade e o s ubs equent e emprego de um ri gor met odol ógi co
na s defi ni ções adot adas . Tudo i ss o pa ss a por uma cl a ra del i mi t a çã o e compreensã o da compl exi da de das re l a ções ent re os
a s pect os forma i s e s emâ nt i cos ( PERIN I , 19 85) .
O ens i no da dis ci pl i na de Português na s a la de a ul a t em
ev ol uí do em mui t os a s pectos . Mas os problemas com a t eori a
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gra ma t i ca l t ra di ci ona l a i nda pers i s t em i ns i s t ent ement e. A neces s i da de de muda nça s já foi a pont ada pel os es t udi os os . O des afi o é a pont a r concei t os que sa t i s fa çam a mbos os cri t éri os de
exa t i dão ci ent í fi ca qua nto à a pl i ca bi l i da de em s a la de a ula . Ou
enca ramos es s e d es a fi o, ou nos s os a l unos cont i nua rã o por
um bom t empo a j azer dev orados , v í t i ma s da nos sa impreci sa
gra má t i ca cons ta nt e nos l iv ros di dá t i cos e tra ba l ha da em sa l a
de a ul a .
REFERÊNCIAS
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( Mes t ra do em L i nguís t i ca ) , Pós - Gradua çã o em Es t udos L i nguí s t i cos ,
NOTAS
[1]
Professora Assistente da Universidade Estadual de Feira de Santana
e M e s t r e em L e t r a s/ Á r e a d e A n á l i s e d o D i s cu r so p e l a U n i v e r s i d ad e F e deral da Bahia.
[2]
C o mo a p o n t a d o p o r B u n z e n ( 2 0 0 6 ) , a p r o d u ç ã o d e t e x t o d u r an t e mu i t o t e mp o s e b a s e o u n o p r o c e s s o d e i m i t a ç ã o d o s b o n s a u t o r e s o u n a
p r em i s s a d e m e r o “ e x e r c í c i o d a c r i a t i v i d a d e ” , o q u e v a i c o n t r a a n a t u r ez a p r i m á r i a e f u n ç ão b á s i c a d o t e x t o , q u e é a c o mu n i c a ç ão . U m t e x t o
q u e n ão c o mu n i c a é u m “ n ão - t e x to ” .
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LITERATURA
ISSN 2236-3335
L I T E R AT U R A E M U N D I V I D Ê N C I A N O C O N T O
O CAÇADOR
[1]
Danilo Ce rqueira Almeida
Licenc iatura e m Le tras Ve rnáculas
ce [email protected] om.br
Res umo : o a rt i go bus ca mos t ra r o conheci ment o univ ersa l proporci ona do pel a l i ngua gem l i t erá ri a em um cont o do es cri t or
port uguês Mi guel Torga . At rav és da crí t i ca l i terá ri a e t eori a s obre o cont o, dia l oga - s e com o t ext o da na rrat i v a O caçador no
s ent i do de demons t ra r como o t ext o l i t erá ri o a pres enta a a borda gem mundiv i dent e de uma v eross í mi l rea l i da de a o a pres enta r,
de ma nei ra úni ca e es pecí fi ca , a s pect os fi cci ona i s , est ét i cos e
cos mogôni cos .
Pa l av ras- chav e: Mi guel Torga. L i t era t ura . O caçador . Mundiv i dênci a . F i cção.
Abs t ra ct : The a rt i cl e a ims t o s how t he uni v ersa l knowl edge
prov i ded by l i t era ry l angua ge i n a s t ory by t he Port ugues e
wri t er Mi guel Torga . Through l i t era ry cri t i ci sm and short st ory
t heory, t he na rra t iv e ‘O ca ça dor’ i s di s cus s ed i n order t o
demons t ra t e how t he l i t era ry t ext pres ent s a worl dv i ew
concerni ng a pl a us i bl e rea l i t y, i n a uni que a nd s peci fi c wa y,
t hrough i ts fi ct i ona l , a es t het i c a nd cos mogonic a s pects .
Keywords: Miguel Torga. Literature. ‘O caçador’. Worldview.
Fiction.
INTRO DUÇÃO
O cont o O caçador, es cri t o pel o port uguês Mi guel Torga ,
s us ci ta , a t rav és da s pá gi na s de l i t era t ura, a i mersã o num
uni v erso que a pres ent a as rel a ções ent re homem - na t ureza e
uni v ersa l - pa rt i cul a r como i ndi ss oci áv ei s à est ét i ca l i t erá ri a pre-
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s ent e no l i v ro Novos contos da montanha , obra a qua l o cont o
i nt egra . Os el ement os pres ent es na na rra t iva est ã o a l i ados ao
pecul i a r t el uri s mo que emerge dos dema i s cont os do es cri t or.
Ao di a l oga r, nes s e s ent i do, s obre a na rrat i va de Mi guel Torga ,
ps eudônimo de Adol fo Correi a Rocha ( 1 907 - 19 9 5) , pret endemos
s er ma i s cl a ri v ident es quando a porta mos noss as i nt erpreta ções
e fa t os do cont o a os comentá ri os de crí t i cos l i t erá ri os s obre
es sa forma s ob a qua l o t exto s e apres enta . O pres ent e t ra ba l ho pret ende cont ri bui r pa ra os es t udos l i t erá ri os expondo a
t ei a de s i gni fi ca ções que ess a ma ni fes ta ção a rt í s t i ca engendra ,
numa cri a çã o, a i nt egra çã o huma no - ambi ental , no que di z respei t o a o enredo e rea l i da de fi cci ona l , a pres ent a da s no t ext o do
es cri t or de Trás - os -mont es .
J ul i o Cortá za r, es cri t or e crí t i co l i t erá ri o bel ga de pa i s
a rgent i nos , a fi rma , a pa rt i r da compa ra çã o ent re o cont o e a
fot ogra fi a , que um conto não dev e v a l er s oment e pel a própria
ma t éria t ext ua l , ma s que o cont i s ta ou o fot ógra fo “[ . . . ] s eja m
ca pa zes de a t ua r no es pect ador como uma es péci e de abertura , de f erment o que proj et e a i nt el i gênci a e a s ens i bi l i da de em
di reçã o a a l go que v a i mui t o a l ém do a rgument o v i s ua l ou l i t erá ri o cont i do na foto ou no conto. ” (CORTÁZAR, 1974, p. 151 -152).
Pa ra o es cri t or e crí t i co l i t erá ri o, o cont o excepci ona l a rqui t et a e a rt i cul a , s ob a pseudo-arbitrariedade do es cri t or, uma
cons i s t ência exi s t enci a l t a l no aut or e, pos t eri orment e no l ei t or,
que a rrola i nca l culá v eis “noções , ent rev i s ões , s ent i ment os e
a t é i dei as que l he fl ut uava m v i rt ua lment e na memória ou na
s ens i bi l i dade” ( Ibi d. , p. 1 54 ) . Ao es crev er sobre o cont o, Ci d
Sei xas , profes sor univ ers i t á ri o, es cri t or e j orna l i s ta , o defi ne
num “cort e da rea l i dade, s el eçã o de a s pectos que, s endo pa rt i cul a res , a brem a s porta s pa ra do gera l , v al endo de s í mbol os
ou de uma cois a ma i or” ( SEIXAS, 200 3, p. 20 ) . N ota -s e, entã o,
a pa rt i r dos doi s comentá ri os , que o cont o tem t ra ços i ndefi ní v ei s de s í nt es e que i rra di am e s e comuni ca m com uma col et i v i da de a pa rt i r de um “dis t i nt o” fra gmento da rea l i da de.
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A LITE RA T U RA N O C O N TO E O U NIV E RS O D E U MA RE A LI DA D E
NA R RA DA
É i ndi spensáv el a o um t exto l i t erá ri o a pres ent a r, a o l ongo
da s l i nhas es cri t as , o recort e mi mét i co de mundo que i nst a ura
um univ erso chei o de a ções e s i gni fi ca ções. Em t ext os como o
cont o, t emas e forma s na rra t iv as s e a rt i culam pa ra proporci ona r s ent i dos que fa zem emergi r da l ei t ura o pra zer de i dent i fi ca ções i nerent es a as pect os cul t ura i s , a fet ivos , es t ét i cos , t écni cos . Ta is el ement os , dent re out ros , i ns t aura m o uni v ers o que
s e mos t ra i ndi v i dua lment e a os ol hos de ca da l ei t or. O “recort e
de mundo” i ns ta ura do no cont o recons t roi a ci da de de Pedra l v a, fregues i a do nort e port uguês , ma rca da pel a t ra di çã o e mora l cri s t ãs , pri nci pa l ment e no que di z respei t o à s rel a ções amoros as s em cons ent i ment o da fa mí l i a. O foco do cont o es t á em
det ermi na da pers ona gem, Ta fona , ca ça dor de oi t ent a e ci nco
a nos que, des de cri a nça , encont ra nas ma t as da Cumi ei ra sua
comunhã o exi s t encia l . A pers ona gem v i v e a us ent e da conv iv ênci a com a comuni da de de Pedra l va , embora casa do e com
fi l hos . Ta fona fa z da s ca ça da s di á ri as um ri t ua l de i nt egra çã o
na t ura l com t odos os organi smos da fl ores t a . N es s e ambi ent e,
a s ma ni fest a ções a nima is ― i ncl ui ndo -s e a í , i ndi s t i nt ament e, a s
huma nas ― i nfl uenci am e s ens i bi l i za m s uas a ções e deci s ões
nos moment os das ca ça da s .
Ent re os as pect os que ma is not abi l i zam o cont o, merece
des t a que a t ensã o. Ess e t ra ço es t ét i co é fundamenta l a es ta
expres sã o l i t erá ria . Ao des ta ca r os efei t os es s enci a is de um
cont o, J ul i o Cortá za r a ponta o es t ímul o em cont i nua r uma l ei t ura i ns ta urada pel a i nt ens i da de e t ensã o, pres ent es no es t i l o
t í pi co do cont is t a: “O que chamo de i nt ens i da de num cont o
cons i s t e na el i mi na çã o de t oda s as i déia s ou s i t ua ções i nt ermédi as , de t odos os rechei os ou fa s es de t ra ns i çã o que o roma nce permi t e e mesmo exi ge. ” ( CORTÁZAR, 1 974 , p. 1 57 ) .
A i nt ens i da de no cont o a dv i ri a , entã o, da s í nt es e di nâmi ca
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promov i da por uma es cri t a di ret a e esqui va , i nci s i va e dema rca t óri a , i ns t aura dora e nebul osa . O cont o O caçador t ens i ona
os encont ros amoros os ent re Ma t i l de e Av el i no, gera dores de
mui t os comentá ri os em Pedra lv a . Ess a rel a çã o ent re as dua s
pers onagens é a la rdeada pel o obs t i na do pers egui dor do ca sa l ,
Tra va ss os . Por mei o des t e, toda a ci da de coment a o rel a ci ona ment o, i ndi gna da com a s his t óri as dos encont ros furt i v os nos
ermos a rredores do l uga rej o. O enca deament o dos a cont eci ment os i ns ere, nos ambi ent es dos encont ros, Ta fona na hi st óri a do ca sa l e promov e o emba t e ent re v i sões e j uí zos s obre
os i ns t i nt os com os qua is s e confronta o ser huma no em s ua
rel a çã o com o out ro, com o a mbi ent e e com o conj unt o de ci rcuns t ânci a s gera das pel o conv ív i o s ocia l . Cort á za r aponta uma
ca ra ct erí s t i ca dos cont os a nt ol ógi cos : “[ . . . ] sã o a gl ut i na nt es de
uma rea l i da de i nfi ni t ament e ma i s v as t a que a do s eu mero a rgument o, e por is s o infl uí ra m em nós com uma força que nos
fa ri a s uspei t a r da modés t i a do s eu cont eúdo a pa rent e, da brev i dade do s eu t exto. ” ( CORTÁZAR, 1 974 p. 155) . O cont o em si
obv ia ment e nã o é um a cont eciment o que s e v a l ori ze pel o s eu
t eor de mero regi s t ro. É mui t o ma i s do que is s o, poi s t emos a
s ensa çã o de que exi st e cert a “v i ta l i da de” no a cont eci mento
contado . A v i sã o de mundo do a l hea do mora dor de Pedra l va
cont ra st a com as concepções de v i da da popul a ção res i dent e,
not a bi l i zado nas l i nha s do cont o em diá l ogos s obre os encont ros ent re Ma t i l de a Av el i no.
― E l a e o A v e l i n o p a r ec em c ã e s a c a i n ç a .
― E que mal há nisso? Maiores e vacinados, que t in h a q u e v er o m u n d o c o m o q u e o co r p o l h e s p ed i a ?
M a s o s p a i s , a q u i - d e l - r e i q u e o s en f o r c a v am s e o l h a s s e m s eq u e r u m p a r a o o u t r o , e a t e r r a i n t e i r a a p l a u d i a . A c o n t e c i a a i n d a q u e o T r av a s s o s , t o d o l á d a
m ã e d a r a p a r ig a , p u n h a em s e m e lh a n t e m a r t í r i o a
s o mb r a d e u m a p er s e g u i ç ã o . ( T O R G A , 1 9 9 6 , p . 6 0 ) .
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Há um nó mora l , um dos mot es do cont o. Adv ém da i ncapa ci da de de Ta fona ent ender o s i s t ema de preconcei t os do
pov o de Pedra l va e ― nã o menos i mport ante ― dess es ha bit a nt es do l oca l em compreender um homem cuj o modo de v i v er, v is ão de mundo, cot i di a no e a t i tudes es t ã o impregna dos
de um ca rát er es pontâ neo, no qua l as coi sa s sã o el uci da das
pel a s confl uênci as da na tureza . Es s es el ement os de compreens ã o, di l uí dos no enredo do cont o, põem em ev i dênci a o ca rát er
uni v ersa l das a ções huma nas , confl i t uosas ent re ra zã o e i ns t i nt o na es fera cul t ura l e col et iva . Pa ra l el ament e a es s e emba t e
podemos col oca r a rel a çã o ent re a rea l i da de e fi cçã o. Ta i s espel ha ment os podem s er encont ra dos em O caçador, t ext o l i t erá ri o que, dota do de cosmov i sã o [ 2 ] e mundiv idênci a [ 3 ] , s us ci ta a
cri a çã o de univ ers os fi cci ona i s com el ement os v eros s imi l hant es
que poss uem a ca pa ci da de de “repres ent a r rea l i da de”.
Segundo Ri ca rdo Pi gl i a , es cri t or a rgent i no, “o cont o moderno conta duas his t óri as como s e fos s em uma s ó” ( 2004 , p.
9 1 ) , s ofi smando o t ext o de forma a t orná - l o uma coes ã o eni gmá t i ca ent re dois a rgument os. A cons t ruçã o do cont o s e da ri a ,
ent ã o, com s ímbol os , exi s t i ndo uma rel a ção es s enci a l pa ra um
pa r de núcl eos s i gni fi ca t iv os . As persona gens Ta fona , Trava ss os , Mat i l de, Av el i no, Ca ta ri na , Pedra lva et c. t êm hi s t ória s ―
percepçã o v is ua l da s pers ona gens ― que nos chegam a t rav és
da l ei t ura do cont o (s omos l ei t ores ) . D e forma compl ementa r,
es t ã o i ns eri dos no univ ers o de caçador s ímbol os , es t i l o, forma,
mei o et c. que i nfl uem de ma nei ra v i ta l pa ra a l ei t ura , pois confer em à obra um pot enci a l de s i gni fi ca çã o dent ro de s i s t ema s
de va l ores que v i gora ram no es cri t or e que, no moment o da
l ei t ura , s ão i ns t aura dos ou “rei ns ta ura dos ” no l e i t or. Ci d Sei xa s
a ss ev era :
[ . . . ] a r e e s t r u t u r a ç ão d o r e a l n o co n to n ã o s e d á n u m a o r d em o n to l ó g i c a , c o mo p r e t en d e r ep r e s en t á - l a a
m ed i ç ã o c r o n o l ó g i c a , m a s s e g u n d o u m a s e q u ên c i a o n í r i c a , m e to n ím i c a , o n d e o r e f a z e r d a p a r t e r ep r e s en t a
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a m u d an ç a d o to d o . A co n s t i t u i ç ã o d e u m s i g n i f i c a d o
n o v o , e mb o r a p a r c i a l , c o n t ém a p e r c ep ç ã o d e u m s i g n i f i c a d o n ão d i t o . ( S E I X A S , 2 0 0 3 , p . 2 1 ) .
Ass i m, a t emá t i ca a pont a da no t ra ba l ho O caçador é toca da fundament a lment e a pa rt i r da ques tã o da s exua l i da de. L ev ant a da no conto, el a a pa rece como a l go a s er repri mi do pel o
códi go mora l da ci da de, mas v i s to por Ta fona como ma ni fes t açã o na t ura l do s er huma no. Pa ra ess e pens ament o a l hei o à ci v i l i za çã o, o homem s eri a como a nima l dota do de i ns t i nt os e orga ni za do soci a l ment e pela ra zã o, o qua l é pa rt e de uma cosmol ogi a cont empl a dora . N es sa mundiv i dênci a, bas ea da na es pont a nei da de exi st enci a l i nerent e a os s eres a ni ma dos e i na nima dos , o homem s e rel a ci ona com el a i ns ufl a ndo s i gni fi ca ção
de exi s t ênci a no conv ív i o com a na t ureza . O que ma is a proxi ma o homem das ma i s el ementa res a t iv i da des exis t enci a i s é a
neces s i dade i ncontornáv el de s a ci á - l as , poi s del a s dependem a
s obrev i v ência do i ndi v í duo e da es péci e, pa rte de t odo um s is t ema de v i da que gua rda uma ordem ma nt enedora de um j ogo
de forças modi fi ca doras , de a gent es na t urai s i nt era gi ndo sob
norma s que os códi gos humanos (s oci edade) , nã o ra ro, nã o
ent endem.
Todos os a cont eciment os “da ci dade” a pa recem, no t ext o,
a l hei os a Ta fona : roubos , casa mentos , fi l hos , i ns ul tos , mort es
es t ã o pos t os no cont o com um t eor ci v i l i za t óri o que cul mi na
em a fa s tament o da ordem na t ura l , do códi go i nt egra dor do homem com o cos mo. Iss o é det es táv el ao caça dor de rol as , l ebres e coel hos . Ta is a ni ma i s , pri nci pa l ment e l ebres e coel hos ,
i nt egra m a fei çã o de l i berda de e fecundi dade no cont o.
O c i o , a b r i s a d e s é me n q u e a g i t a v a t o d o s o s s e r e s
v i v o s d u r a n t e a l g u n s d i a s em c a d a an o , s a b i a - l h e à
f r e s c u r a d e u m a o n d a s a g r ad a . E n t ã o , o l e a v a e a r r u m a v a a a r m a , e o s s e u s o l h o s , d e c a ç ad o r a i n d a , s e g u i am a r e v o a d a d o c a s a l d e me l r o s , o t r a j e c t o d e u m
c o e l h o , a s p eg a d a s d a r a p o s a , m a s p a r a o s a c o mp a -
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n h a r em c o m o v i d o s n a q u e l a d ád i v a s e n s u a l e p r o cr i a dora. (TORGA, 1996, p. 60).
A ca ça é um ri t ua l à pa rt e no cont o, poi s s e rel a ci ona
met a fori cament e com o fa t o que é t oma do como es câ nda l o em
Pedra l va . Em t oda s as ocas i ões que s e encont ram, Av el i no e
Ma t i l de fa zem do encont ro um ri t ua l de a cas a l amento, s obre o
qua l Ta fona e Tra vas s os dua l i za m concepções di ferent es de
a t ua çã o. As s equênci a s na qua l Ma t i l de é segui da por Av el i no
e que os doi s sã o pers egui dos por Trava ss os s upõe uma
“ca ça da ”. Ta fona é um mero obs erva dor da caça(da) prot a goni za da pel a s t rês personagens . Percebe -s e s ua i s ençã o a t ra v és da própri a pers ona l i da de enqua nto mero a dmi ra dor da cena “engra ça da ”. O ca ça dor supri me a própria pres ença , como
fa z qua ndo a ss i s t e à “dádi va s ens ua l e procri a dora ” dos a ni ma is da fl orest a , mas s urge na fi gura de um ca çador a o ret i ra r
o Trav as s os do enca l ço dos ena mora dos , fecho do cont o.
O T a f o n a n em t e v e t e mp o d e p en s a r . P a r o u a r e s p i r a ç ã o e e n c o lh eu - s e q u an t o p ô d e a t r á s d o e s c o n d e r i j o .
...................................................................................................
A t r e m er e d e o lh o s e sg az e a d o s , o z e l o so co s c u v i l h e i r o n ão co n se g u i a p e r c eb e r . M a s o T a f o n a t i n h a - l h e
f r i a m en t e a e sp i n g a r d a en d i r e i t a d a a o p e i t o , e n i n g u é m
da aldeia confiava na alma sol itári a do caçador.
― A l t o , e n e m tu g i r n em mu g i r ! A q u e l a s c o i s a s q u e r e m - s e n a p az d o S en h o r . . . ( T O R G A , 1 9 9 6 , p . 6 2 - 6 3 ) .
Mas sa ud Moi s és a fi rma que o ambi ent e des cri t o nos cont os de Torga condensa a dis tâ nci a ent re homens e a ni ma i s no
ret ra t o de a fas ta mento da rea l i da de a pres enta da : “[ . . . ] a s a proxi ma ções ent re homens e a ni ma i s nã o t i ram o a utor s eu amor
i ncondi ci ona l pel a Huma ni da de. Pel o cont rá rio: a l i mi t a ção des s es pobres s eres es queci dos por D eus , pel a s a ut ori da des , é,
pa ra doxa lment e, um s i na l de gra ndeza . ” (MOISÉS, 1 994 , p. 149 ) .
Es sa es péci e de met oními a cont extua l , t rat o a t é cert o
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pont o zoomórfi co, es t á pres ent e em out ra obras de Mi guel
Torga , pri nci pa lment e nos contos que, as s im como O caçador ,
pos suem fort e a mbi ent a çã o campes ina . Ta mbém pres ent e em
Novos contos da Montanha , o cont o A caçada des crev e o moment o em que doi s ca ça dores , F i l i s mi no e Ma rt a , encont ra m - s e
pa ra ca ça r j unt os. Seus cã es , no momento do encont ro, rosna m um pa ra o out ro.
― Bons dias !
― Viva...
E n q u an t o o s d o i s s e c u mp r i m en t a v am a s s i m , o s cã e s
r o s n av am t a m b ém .
― O n d e é a c a ç a d a?
― Qualquer sítio serve...
O F e l i s m i n o c o n t r a i u - se p o r d en t r o . J á s a b i a q u e n ã o
e r a m a s p e r d i z e s q u e i n t e r e s s a v am a o v i s i t a n t e . O
b a n d i d o n ão l h e p e r d o a v a t ê - l o en f r en t a d o n a f e i r a d a
Vila e vinha vingar -se.
― P o d em o s en t ã o i r p o r a í f o r a . . . ― d i s s e , n u m t o m
d e sp r en d id o . ( T OR G A , 1 9 9 6 , p . 2 2 5 - 2 2 6 ) .
Ta l comporta ment o dos ani ma i s pode s er tra t a do como
norma l , nã o obs ta nt e s e percebess e que ent re os ca çadores
exi s t e uma t ensã o: um del es, Ma rta , bus ca a ss as s i na r o out ro
dura nt e a ca ça da , um subt erfúgi o pa ra i s entá - l o da mort e s ob
o a rgument o de a ci dent e. O a l vo, F i l i smi no, sa be di ss o e a cei ta
i r À caçada , t ambém di s pos t o a as sa ss i ná - l o ca s o o confronto
fos s e i nev i t áv el e expl í ci t o com o compa nhei ro. Os cã es , a ss i m,
a nt ropomorfi zam, em pens amento, a s pers ona gens , es t abel ecendo uma es péci e de t ra duçã o i nexpl i cáv el ent re ra zã o e i nst i nt o, medi a dos , nest e cas o, a t rav és do t ext o l i t erá ri o de Mi guel
Torga .
A PERSONAGEM QUE TEMATIZA O CONTO
O ma i or pa rá gra fo do cont o de Torga é des t i na do a cara ct eri za r Ta fona , referênci a des de o t í tul o at é a úl t i ma fa l a do
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cont o. Seu s i l ênci o a os recl ames da es posa Ca ta ri na pela a us ênci a e i nca pa ci da de de des crev er s eu dia de ca ça s ão l i cenci a dos pel o efei t o que a t erra causa no es píri t o do ca ça dor. O
t el úri co s eques t ra Ta fona da rea l i da de.
A l g u m a s h o r a s h av i a d e p e r f e i t a c o n s c i ên c i a , e m q u e
n en h u m p o r m en o r d a p a i s a g em l h e e s c ap a v a , a s p r ó p r i a s p ed r a s r e f e r en c i a d a s , a q u i d e g r a n i t o , a l i d e x i s t o . M a s , m e smo n e s s a s o c a s i õ e s , q u a l q u e r co i s a o
f a z i a s o n â mb u l o d o amb i e n t e . E r a t a n t a a b e l e z a d a
s o l i d ão co n t emp l a d a , d e s p e g av a - s e d a s s e r r a n i a s t a n t a c a l m a e t a n t a v i d a , o s h o r i z o n t e s p ed i a m - l h e u m a
c o n c en t r a ç ão t ã o f o r t e d e s e n t i d o s e u m a d i s p e r s ã o
tão absoluta deles, que os olhos como que lhe aband o n av a m o c o r p o e s e p e r d i a m n a i m e n s i d ão . S i mp l e s m en t e , e s s a d i l u i ç ã o co n t í n u a q u e s o f r i a n o s e i o d a
n a t u r e z a n ã o e x c lu í a u m a p o s s e s ec r e t a d e c a d a r e c a n t o d o s eu r e l e v o . U m a e s p é c i e d e p e r c ep ç ão i n t e r i o r , d e í n t i m a c o mu n h ã o d e a m a n t e a p a i x o n a d o , c a p a z
d e i d en t i f i c a r o p a n a s co d e A l c a r i a p e l o ch e i r o o u p e l o t a t o . ( T OR G A , 1 9 9 6 , p . 5 7 - 58 ) .
Ta fona s ó encont ra s ent i do pa ra os as sunt os da v i da por
mei o da mundi v i dência , metá fora da rea l i da de no pl a no t el úri co,
cuj a l i ngua gem nã o s e percebe pel o mi nús cul o a ces s o da do à
pa l av ra. A rel a çã o da l i t era t ura com o mundo l ei t or t a mbém é
met a fóri ca , pois s e i ns crev e por um códi go “comum” ― a s pal a v ra s ―, mas s e t orna l i ngua gem ci fra da pel a ca pa ci da de e
neces s i dade express iv a do es cri t or.
CONCLUSÃO
N o cont o O caçador t emos dis t â ncia s . A di s tâ nci a i nerent e a Pedra lv a, geográ fi ca e ca ra ct erís t i ca da obra de Torga ; a
di s t â ncia da personagem Ta fona em rel a çã o a o que a cont ece
no j á a fa s ta do v i l a rej o; e a di s t ânci a que surge a os ol hos do
l ei t or quando t odos es s es el ement os s e congl omera m numa
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na rra t iva de v oz col et iv a , na qua l na rrador e fa t o na rra do s e
mi s t uram at rav és do i dea l l i t erá ri o e da rea l i da de fi cci ona l . N ess es doi s úl t i mos a spect os , nã o a pena s duas hi s t ória s pa ra l el a s
s e encont ram numa , mas dua s v i sões de mundo s e des cobrem
fundi da s e imanent es a os ol hos do l ei t or a t ent o à v i da de s eu
própri o mei o enqua nt o t ext o uni v ers a l .
Ál va ro Gomes i ncl ui a obra campes i na de Torga numa t ôni ca de i nt egra çã o na qua l nã o s e pode des cons i dera r, em
qua l quer a ná l i s e s obre os contos , as formas do na t ura l ass oci a da a o ca rá t er huma no da s pers ona gens, compl et a ndo o pa i nel
v iv o e corrent e da na tureza :
U m h u m an i s mo e s s e n c i a l o u i m a n en t e q u e s u r p r e en d e
o H o mem n a s u a c i r c u n s t â n c i a o r i g i n á r i a ― e m f a c e
d a t e r r a ― n u m d i á l o g o su r d o co m a T r a n s ce n d ên c i a
o u o i n co g n o s c í v e l . H u m an i s mo e t e l u r i s mo c o n s t i t u e m ,
d e s s e mo d o , a s mo l a s m e s t r a s d a c o smo v i s ã o d e M i g u e l T o r g a . ( G OM E S , 1 9 9 6 , p . 2 4 0 ) .
Toda a i nt egra çã o ma ni fes t ada na cosmol ogi a do cont o
a pa rece conv ergi ndo pa ra um ent endiment o da s rel a ções ent re
os homens e a na t ureza , nã o a penas na a ção do homem s obre
a nat ureza , ma s a rel a çã o na t ura l ent re os homens . Percebe s e que há um conheci ment o de mundo t rans mut a do nas s upers t i ções de Ta fona e nos comentá ri os do na rra dor, a exempl o, res pect i vament e, da muda nça de rumo do ca ça dor, i nci ta da
pel a mens t rua çã o da v i zi nha e a percepçã o da queda de uma
pi nha ― um t í pi co pres ent e de núpci as . Es sa úl t i ma i ma gem
s i ngul a ri za a i dei a do cont o a t rav és da descri çã o do moment o
da ca ça da : “Tudo s e pas sav a s em a l egri a e s em eco, choque
a ba fa do, como o de uma pi nha a bert a a ca i r no mus go” ( TORGA, 1 99 6, p. 6 2) .
Crí t i ca e t eori a l i t erá ri a s fundamenta m que t ã o ev i dent e
qua nt o a t ensã o mi ni s t ra da pela s mi núci as s i gni fi ca t i va s é o
t ra ba l ho com o nã o di t o, no cont o ( PIGL IA, 20 04 ; CORTÁZAR,
1 974 ) . Os dois el ement os s e compl ementam no cont o e s e a fi r-
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mam a ca da pa lav ra l i da , a ca da s ent i do emergent e que gua rda
uma rel a ção com o que es t á no cont o a part i r da s l i nhas que
o ma t eri a l i za m e s e oferecem a o l ei t or no moment o da a preci açã o codi fi ca dora da s l et ra s , pa lav ras , fras es , perí odos , pa rágra fos . Enfim, o a l ém do es cri t o. A ext ensã o reduzi da em rel açã o à s dema i s forma s l i t erá ri as é condensa da pel a t ensã o e
pot enci a l i da de dos s í mbol os a ponto de s ugeri r e fomenta r ecl os ã o de s ent i dos dura nt e uma l ei t ura . Ci d Sei xas di z que a
es s ênci a de um cont o
n u n c a é d i t a , p o r q u e n ã o c ab e n o s l i m i t e s d e u m a s
p o u c a s f o lh a s d e p a p e l , e mb o r a , p a r a d o x a l m en t e , c a i b a , c o m p r i m i d a ― m e l h o r : a d o r me c i d a , o u en c a n ta d a
― n o s p a r c o s s i g n o s p o é t i c o s co n t i d o s n a s f o l h a s [ . . . ]
o c o n t o , á g i l , s e p r o j e t a n u m a o u t r a e l o q ü ên c i a ― a
do silêncio. (SEIXAS, 2003, p. 21 ).
É pos s ív el not a r que há uma corres pondênci a ent re o
mundo conta do no t ext o de Torga e a própri a pedra de t oque
da l i t era t ura . A ques t ão t ra ns cende a fi cçã o e emerge pa ra o
própri o di á l ogo ent re o l ei t or e obra , ent re o s er e o( s ) mundo
( s ) no exercí ci o de exi s t i r. A “s í nt es e v iva a o mes mo t empo
que uma v i da s i nt et i za da ” ( CORTÁZAR, 1 974 , p. 1 50 ) já é forma
l i t erá ri a e t em pa rt e e t odo na mundi v idênci a da l i t era t ura .
REFERÊNCIAS
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cronópi o . Tra dução J oã o Al exa ndre Ba rbosa e Da v i Arri guci
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GOMES, Álv a ro Ca rdos o. Mi guel Torga . In: A l i t era t ura port ugues a em pers pect iv a : s i mbol i smo e moderni s mo. São Pa ul o,
J
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106
SP: At la s , 1 994 . p. 147 - 1 50.
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port uguês. 4 . ed Sã o Pa ul o, SP: Cul t ri x, 19 90 . p. 239 - 244 .
MUND IVIDÊNCIA. In: D ICIONÁRIO el et rôni co Houa is s da l í ngua
port uguesa . V. 3.0 . Ri o de Ja nei ro: Obj et iv a, 200 9.
PIGL IA, Ri ca rdo; MACED O, J os é Ma rcos Ma ria ni de. Tes es s obre o cont o. In: F orma s brev es . Sã o Pa ulo: Ci a da s L et ra s,
2004 . p. 97 - 114 .
PIN HA. In: D ICIONÁRIO da l í ngua port ugues a. L i s boa : Pri beram
Informá t i ca , 199 8. D i s poní v el em <htt p://www.pri beram.pt /dl po/ > .
Aces s o em: 10 fev . 20 1 1 .
SEIXAS, Ci d. Cria çã o e Crí t i ca: Sobre o Cont o e o Poema . In:
Os ri s cos da ca bra - cega : recort es de crí t i ca l i t erá ri a . F ei ra de
Sa nta na : UEFS, 200 3. p. 17 - 22.
TORGA, Mi guel . N ov os cont os da monta nha . Ri o de Ja nei ro: Nov a F ront ei ra , 19 96 .
NOTAS
[1]
A r t i g o a p r e s en t a d o , i n i c i a l m en t e , c o mo a v a l i a ç ã o p a r c i a l d a D i s c i p l i n a
T ó p i co s E s p e c i a i s d a L i t e r a t u r a P o r t u g u e s a I , n a U E F S .
[2]
M a n e i r a s u b j e t i v a d e v er e en t en d e r o mu n d o , e s p . a s r e l a ç õ e s h u m a n a s e o s p ap é i s d o s i n d i v í d u o s e o s eu p r ó p r i o n a s o c i e d ad e , a s s i m
c o mo a s r e s p o s t a s a q u e s tõ e s f i l o s ó f i c a s b á s i c a s , c o mo a f i n a l i d ad e d a
e x i s t ê n c i a h u m an a , a e x i s t ê n c i a d e v i d a ap ó s a mo r t e e t c . ; v i s ã o d e
mu n d o .
[3]
P e r c ep ç ão , c o n ce p ç ã o d e mu n d o .
J
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ISSN 2236-3335
A X I F O PA G I A D O A M O R E D O C I Ú M E E M
C A M Õ E S E D AV I D M O U R Ã O F E R R E I R A
Rafael S antos Silva [1]
Licenc iatura e m Le tras c om Inglê s
[email protected]
A lessandra Leila Borges G ome s (Orientadora/U E FS )
D ep arta ment o de Le tras e A rtes (D LA )
[email protected]
Res umo : O obj et i v o dest e t ra ba l ho é a na l i sar com o a uxí l i o de
v á ria s dis ci pl i nas e a t rav és de um es t udo l i t erá ri o a s l ei t uras
que o ci úme, e cons equent ement e a perda , sofrem dura nt e perí odos di ferent es em doi s poemas de a ut ores port ugues es : L ui z de Ca mões , s eis cent i s ta , e Dav i d Mourã o Ferre i ra , cont emporâ neo. Os doi s t ext os es col hi dos foram Soneto XXXII I , do pri mei ro, e Elegia do ciúme do s egundo. Os emprés t i mos t eóri cos
fora m fei t os de ci ênci a s ta i s como Soci ol ogia , Ps i ca ná l is e, Ps icol ogi a , Ant ropologi a e o vas t o uni v ers o das di s ci pl i nas humana s . D efende -s e o ci úme como a cont rapa rte da pa i xã o, e as
s uas pot enci a l i dades pa t ol ógi ca s, a l ém das rel a ções e dos efei t os exi st ent es ent re os a ma nt es .
Pa l av ras- chav e: L i t era t ura port ugues a . Ci úme. Eros . Cont empora nei da de. Perda .
Abs t ra ct : Thi s work a ims t o a na l yze, wi t h the a i d of s ev era l
s ubj ect s a nd t hrough a l i t era ry obl i qui t y, t he rea di ngs of
j ea l ous y and l oss of s omethi ng i n t wo poems wri t t en by
Port ugues e a ut hors from di fferent peri ods : L uis de Camões , a
1 5 t h cent ury poet, a nd t he cont empora ry a ut hor ― D av i d
Mourã o F errei ra . The two t exts chos en were Soneto XXXIII , by
t he fi rs t one, a nd Elegia do ciúme , by t he s econd one.
Theoret i ca l l oans hav e been ta ken from s ci ences s uch as
Soci ol ogy, Psychol ogy, ps ychoa na l ys i s, Anthropol ogy a nd t he
J
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l a rge uni v ers e of huma n subj ect s . J ea l ousy i s cl a i med a s t he
count erpa rt of amour passion , a nd i t s pa thol ogi ca l pot ent ia l i t y,
a nd a l s o the rel a t i ons hi ps a nd effect s exi s t i ng a mong t he
l ov ers .
K eywords: Port ugues e l i t era t ure. J ea l ous y. Eros . Cont emporanei t y. Loss .
D u r a n t e to d a a v i d a , e u n ã o p o d i a s e q u e r c o n ceb e r
e m me u í n t i mo o u t r o am o r , e c h eg u e i a t a l p o n t o q u e ,
a g o r a , c h eg o a p en s a r p o r v ez e s q u e o a mo r
c o n s i s t e j u s t a me n t e n o d i r e i t o q u e o o b j e t o a ma d o
v o l u n t a r i a m en t e n o s c o n ce d e d e e x e r ce r t i r a n i a s o b r e
ele.
( D o s t o i e v s ky )
INTRO DUÇÃO
Mui t o s e fa l a s obre o amor e rel a t iva ment e pouco s obre
o ci úme. O que nã o s e percebe é que fa l a r de um quas e s empre nos i nci t a a t ra ta r do out ro e es sa rel açã o es tá l onge de
s er um pa ra s i t i smo, ela é de mut ua l is mo. A ma rgi na l i za çã o do
ci úme e a es t i gma t i za ção des t e como o responsáv el pel a des t rui çã o de “bel os cont os de fa das ” é a t i t ude r ecorrent e des de
mui t o t empo e herda da pel a “fi l os ofia comum da cont emporanei da de”. O ci úme, fada do regul a rment e às s uas rel a ções com
os el ementos de mort e e de degra da ção, Thanatos , é frequent ement e ci t a do, mas , mui to a pa rent ement e, a borda do em s eu
ní v el ma i s s uperfi ci a l . Na drama t urgia , na l i tera t ura e em di ferent es mei os que ret ra t am as rel a ções humana s nos é expost o
qua s e s empre o “cl i chê do ci úme”, pa rt i ndo de um pont o de
coerênci a , o s ent iment o de poss e, mas s e encerra ndo em um
ca pri cho do a ma nt e. O que ess e t raba l ho v isa mos t ra r, ut i l i za ndo- s e da l i t era t ura como mei o de conta t o i nterdi s ci pl i na r e auxi l i a do des de o i ní ci o por es t udos de ps i caná l i s e, ps i col ogia e
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ci ênc i as s ocia i s , é que ent re es s e pri ncí pi o e es s e fi m exi st e
um a bi smo a s er percorri do, ma peado e percebi do com ca ut el a .
Elegia do ciúme é um es cri t o de mui t o fôl ego na aborda gem des sa funçã o ps i col ógi ca . Sua es t rut ura nos a bre espa ços
pa ra pens a r a s i t ua ção do s uj ei t o em v is t a do a ma do e como,
de repent e, o ci úme pas sa de i mpres ci ndí v el pa ra a del i mi ta çã o
da s a ções bas ea das no a mor pa ra a l goz repres s iv o e doent i o
na evol uçã o e a ma dureciment o des t e. D av i d Mourã o a certa a o
pens a r na mort e como met á fora da t ra ns forma çã o de uma neces s i dade em uma ma l di çã o. Os es t í mul os de v i da e mort e, ou
pul s ões de Eros e Thanatos pa rt i ndo de uma l ei t ura freudi a na
do t ema , s e rel a ci ona m e s e compl ement am, t orna ndo ess e ema ra nha do de v í ncul os um compl exo eni gma a s er ent endi do.
Ambos os poema s ana l i sa dos nes t e t ra ba l ho re l a ci ona m di ret ament e amor e mort e, di feri ndo - s e apenas no pa pel que a mort e
des empenha pa ra ca da um dos eu - l í ri cos .
Pode- s e pensa r na pos s i bi l i dade de uma l ei t ura di a crôni ca
do s imbol i smo ca rrega do pel as pa lav ras - cha v e que nort ei am
es t e t ra ba l ho nos s eus momentos his t óri cos de produçã o, t ra ça ndo -s e, des ta forma , um pa ra l el o que nos a uxi l i e na compreens ã o de como ess es fa t ores de hi st ori ci da de i nfl uenci a ra m na
forma çã o des s es dis curs os . O que s e i ns i nua dura nt e es sas
l ei t ura s é que ca da época a ma de ma nei ra di fer ent e, mas que
a rel a çã o com o out ro s empre foi bas ea da na cons ol i da çã o da
exi s t ênci a do eu: t emos cons ci ênci a pl ena da neces s i da de de
out ro a l guém pa ra sermos . Pa rt i ndo -s e des ta premis sa , a cons equênci a da i nt erferênci a cronol ógi ca present e em cada uma
da s obras não pode s er a rbi t ra ria ment e i gnora da e o ma peament o des sa s i nfl uênci as nos aponta rá a t é onde Elegia do ciúme , de um poeta que v iv e a época em que o amor s e l i quefa z
e es corre pel os dedos , s e comport a como i nt erdi s curs o e rel ei t ura do Soneto XXXIII , da quel e que foi cons i dera do o ma i or
nome da poes ia port uguesa e que bas eou sua pers pect iv a na
ma nut ençã o do amor ima cul a do.
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DA CO MPLETU DE E DA TIRA NIA: A REA LIZAÇÃO DO A MO R,
O NA SCIMENTO DO CIÚ ME E OS ESTIGMA S DA MO RTE
Percebe- s e nas rel a ções i nt erpes soa is a l go ma is profundo
do que a mera i nt era çã o ent re i ndiv í duos: é a pa rt i r da exi s t ênci a do out ro, que um i ndi v í duo pa rece cons ol i da r s ua exi st ênci a e a fi rma r -s e como pa rt e de uma rea l i da de s uperi or e
ma is compl exa . Todos t emos uma es péci e de cons ci ênci a da
neces s i dade do out ro pa ra exi st i rmos e é com bas e nis s o que
a s rela ções s e aprofunda m e evol uem, não neces sa ri ament e
com denota ções pos i t iv as . Es s e di s curs o nã o é ori undo da s
ci ênc i as do comport ament o huma no, a o que pa rece j á s e encont ra no di s curs o rel i gi oso comum a vá ri as t radi ções . Prova
di s s o, t emos t rechos do Gênes is que t ra tam exa ta mente de
uma impos s i bi l i da de do v á cuo a fet i vo s er percebi do como na t ura l a o i ndi v í duo. N o ca pí t ul o doi s , no déci mo s ét i mo v ers í cul o
do l i v ro encont ra mos uma apol ogi a cla ra a es sa i dei a , a cons t a t a çã o de que a compreensã o do pa pel do out ro nã o é a l go
recent e:
O s e n h o r D eu s d i s s e : “ N ã o é b o m q u e o h o me m e s te j a
s ó ; v o u d a r - l h e u m a a j u d a q u e l h e s e j a a d eq u a d a . [ 2 ]
Segundo o ps i ca na l is t a Ant ôni o Mourão Cav a l ca nt e, “há
nes s e t ext o, uma primei ra i deia de que o homem preci sa do
out ro pa ra s er. N i nguém pode v iv er i s ola do. Ora , um bus ca no
out ro a cons ecuçã o de s eu exi s t i r” ( CAVALCAN TE, 1 994 , p. 23) .
O s exo e a repres enta çã o do out ro nes t e fenômeno des empenham um pa pel i ncomens urá v el no proces so de ci v i l i za çã o e
ev ol ução s oci a l da huma nida de des de o pri ncí pi o do us o da
ra zã o.
D a s mu i t a s t e n d ên c i a s , i n c l i n a ç õ e s e p r o p en sõ e s
‘ n a t u r a i s ’ d o s s e r e s h u m an o s , o d e s e j o s e x u a l f o i e
c o n t i n u a s en d o a m a i s ó b v i a , i n d u b i t á v e l e i n co n t e st a v e l m en t e s o c i a l . E l e s e e s t e n d e n a d i r e ç ão d e o u t r o
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s e r h u m a n o , e x i g e s u a p r e s en ç a e s e e s f o r ç a p a r a
t r a n s f o r m á - l a e m u n i ã o . E l e a n s e i a p o r co n v í v i o . T o r n a
q u a l q u er s e r h u m a n o ― a i n d a q u e r e a l i z ad o e , s o b
t o d o s o s o u t r o s a sp e c to s , a u t o - su f i c i e n t e ― i n co m p l e t o e i n s a t i s f e i t o , a m en o s q u e e s t e j a u n i d o a u m
o u t r o . ( B A UM A N , 2 0 0 4 , p . 2 7 ) .
É pa rt i ndo do press upos t o de que t emos cons ci ênci a de
que nã o cons egui rí a mos suporta r o a l heament o e a s ol i dã o, e
s em qua l quer i nt enção de ent ra r a fundo no univ ers o da ps icol ogi a ou qua l quer de s uas v ert ent es , que o ci úme a ca ba
s endo v is t o como o s ent iment o que a dv ém com a pers pect iv a
da perda do out ro, com a imi nênci a da s ol i dão.
Ci úme é t odo “s ent iment o dol oros o que as exi gênci a s de
um a mor i nqui et o, o des ej o de poss e da pess oa ama da , a s uspei t a ou a cert eza de sua i nfi del i da de fazem nas cer em a l guém” [ 3 ] . Es sa defi ni çã o a i nda é l i mi ta da, poi s s e dev e cons i dera r que ha j a “duas forma s de ci úme, uma norma l , a j uda ndo a
a va l i a r e res pei ta r s eu a mor, e out ra , defens i va , tort urando os
a ma nt es e enca mi nha ndo - os pa ra a des t rui ção do v í ncul o a moros o” (B YIN GTON , 200 5, p. 5) . Essa s fa cet as da repres enta ção
do ci úme i nt eress am a es sa pesqui sa com ma is urgênci a . Ent endê- l as a j uda -nos a defi ni r a qui l o que pode s er cons i derado
norma l e o que pode s er t i do por pa t ol ógico, concei t os que
s erã o fundament a is na l i da com o poema de D av i d Mourã o.
“O ci úme s egue o a mor como a sombra segue o homem” ( CAVALCAN TE, 19 94 , p. 23) . Est es dois s ent iment os s ão
i ndi s s ociá v eis , compl ementa res e t oma ndo -se um pouco ma is
de cui da do, podemos pens a r que s ão também s upl ement a res .
D i z-s e i ss o pel o s impl es fa t o de que o ci úme a di ci ona a o amor
o es t ado de a l erta que nã o é i nerent e a o apa i xona do.
O c i ú m e é u m a f u n ç ã o e s t r u tu r an t e q u e , q u an d o o p e r a n o r m a l m en t e , g u i a a f u n ç ão e s t r u tu r a n t e d o a mo r e
d e l i m i t a o s e u t e r r i t ó r io . N e s s e c a s o , o c i ú me é o
g u a r d i ã o é t i co d o a mo r . O c i ú m e e s c l a r e ce p a r a a
C o n s c i ên c i a a t é o n d e o amo r t em d i r e i t o s e d ev e r es e
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mo s t r a q u an d o e l e t r a n sg r i d e s u a s f r o n t e i r a s e t o r n a s e d e f en s i v o , o u s e j a , i n ad eq u ad o , p o s s e s s i v o e d e s t r u t i v o . ( B Y I N GT O N , 2 0 0 5 , p . 5 ) .
Sponv i l l e ( 1 99 5, p. 124 ) sa nci ona o el o que exi s t e ent re
a mor e ci úme. Cons i derando que “o a mor é des ej o, e o des ej o
é fa l t a ” e rel a ci ona ndo ess a i deia com a de que o ci úme “é o
medo de perder o obj et o a ma do, des ej o de cons erva r a cois a
que s ó queremos pa ra nós ” ( CAVALCAN TE, 1 9 94 , p. 23) ent endemos, a pri ncí pi o, em qua l ní v el s e est a bel ece es s e v í ncul o. A
pa i xão ( Eros ) é o “amor” que es got a , que t em como pa rt e de
s ua es s ência um i mpul s o de des t rui çã o e de a ut odes t rui ção
( B AUMAN, 2004 , p. 27 ) , a nt es que s e perca o a ma do, que a pris i ona e que ama na fa l t a . B auma n, embora s e ut i l i ze de t ermi nol ogi as di s t i nta s , ent ende a s duas fa cet as que podem s er i dent i fi ca da s numa rel a çã o a morosa : a de ani qui l a çã o e a de
perpet ua ção, a i nda que es ta cul mi ne em escra v i za çã o. A pres ença do out ro é o mot i vo s ufi ci ent e pa ra dis pa ra r o ga t i l ho de
ev ent os rel a ci ona dos a o des ej o.
E s s a p r e s en ç a é d e sd e s e mp r e u m a a f r o n t a e u m a
h u m i l h a ç ão . O d e s e jo é o í mp e to d e v i n g a r a a f r o n ta e
e v i t a r a h u m i l h a ç ão . É u m a c o mp u l s ã o a p r e en ch er a
l a c u n a q u e s e p a r a d a a l t e r i d a d e , n a me d i d a em q u e
e s t a a c en a e r e p e l e , e m q u e s e d u z c o m a p r o m es s a
d o i n e x p l o r ad o e i r r i t a p o r s u a o b s t i n a d a e ev a si v a
d i f e r e n ç a . ( B A UM AN , 2 0 0 4 , p . 1 2 ) .
Em cont ra pa rt i da , o ci úme é a pa rt e que s ofre com a
pers pect i va da a us ênci a e da perda. Em out ra s pa lav ras é o
ci úme equi l i brado com a s proporções do Eros quem l imi t a e
condi ci ona a s a úde do amor. A rel a çã o ent re amor e ci úme
nã o pode s er v is t a inicialmente como a nt a gôni ca uma v ez que
“o c i úme é, de cert o modo j us t o e ra zoáv el , poi s v is a a cons erva r uma coi sa que nos pert ence ou que j ul ga mos pert encer
- nos ” (BY ING TO N , 2 005 , p . 5 ) . Sendo a ss im, a ps i col ogi a a na l í t i ca
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pens a no ci úme como uma funçã o es t rut ura nt e norma l , que
cont ri bui como qua l quer out ra função pa ra a forma çã o e a nut ri çã o da Cons ci ênci a . A stigmatização que o ci úme s ofre é
cons equênci a de uma di s crimi na çã o “preconcei t uos a e mora l i s t a ” ( BY ING TO N , 20 05 , p . 3 ) cont ra a quel a s funções que a s oci eda de e a cul t ura oci denta l rot ul a ram de peri gos as e a mea ça dora s à ordem e a o bem es ta r do i ndiv í duo e cons equent ement e
da s oci eda de. Como resul t a do des s e process o de ma rgi na l i za çã o, es t as funções , ent re el as o ci úme, pas sa m a agi r na s ombra do inconsciente reprimido, convertendo -se em
“i na dequadas e des t rut iv as , e s ã o expres sas por defes as que
i nferni za m a v i da ” ( Idem) .
N o pa rá gra fo a cima , o t ermo “i ni ci a lment e” é a dota do porque o ci úme t a mbém pode ext ra pol a r os l i mi tes da sa úde e s ua
na t ureza de cons erv a çã o a l heia s e conv ert er em cons erv a çã o
própri a , encerra ndo-s e na a nula çã o e “dest rui çã o” do out ro.
Es s e s ent i ment o t em s eu a dv ento quando as confi gura ções do
rel a ci onament o t êm por bas e a pos s e, uma v ez que “a pes s oa
s ent e ci úme qua ndo i ma gi na que s eu pa rcei ro é uma pa rt e s ua ” [ 4 ] . Al ém do ma is, o processo de idealização pode cola bora r, e
a parent emente col abora na ma ioria das v ezes , com o des encadeament o da i nsegura nça, que por s ua vez, resul ta no ciúme. [ 5 ]
S upõe- s e que es s a ins egu ra nça te r ia po r ba s e o
p roc es s o d e idea l iza çã o . O a moros o c r ia r ia uma
ima g em do a ma do , nem s emp r e f unda men ta da no
r ea l. S e começa a nã o ex is t ir uma co r res pondênc ia
des s a idea l iza çã o , a des conf ia nça s e ins ta la . Na s c e o c iúme . (C AVA LCA NTE , 19 9 4 , p . 24 ) .
Al ém dis s o, a correspondência plena do amor t ambém pode di s pa ra r o ga t i l ho do ci úme, uma v ez que corres pondi do,
i ns t a ura -s e no amant e o medo de i ma gi na r -se em aba ndono ou
em perda.
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O poema Elegia do ciúme t raz em s ua compos i çã o i ndi ca t i v os de pat ol ogi a nas ma ni fes ta ções de ci úme: E se adormeço
novamente/vou, tão feliz!, sem azedume/ ― agradecer -te, sua-
vemente, /a tua morte que consente/tranquilidade ao meu ciúme” . Es sa es t rofe nos dá uma v is ã o do des es pero que conduz
a rel a çã o do eu - l í ri co com a a ma da , já morta . A i mpres sã o de
pa t ol ogia quant o a o ci úme s ent i do pel o primei ro é ra t i fi ca da pel a preferênci a de v ê - la mort a e i na ces s ív el aos out ros , e i ncl us i v e a s i mesmo em s i t ua ções não - oní ri cas , do que a o s eu l ado, e, a o mesmo t empo, t endo que l i da r com a pos s i bi l i da de de
s ofrer um a ba ndono.
Ma is uma v ez, s omos remet i dos à Sponv i l l e (1 9 9 5) em s ua
rel e i t ura do s is t ema pl a t ôni co em rel a çã o a o a mor: “ A tua morte, que me importa/se o meu desejo não morreu?”. É o des ej o
que i na ugura es s es ev ent os , e é o mesmo des ej o o que ma nt ém ama ndo- a : a fa l ta é o combus t ív el des s e a mor.
N ess e cas o o ci úme não é o el emento nortea dor, nã o a
pri ncí pi o. A fa l t a o é. O ci úme s ó s e a t iv a qua ndo é cons i dera da a i dei a de expor a pes s oa amada às pos s i bi l i dades de es col ha s que poderiam conduzi r ao a ba ndono do amant e. N ess e
ca s o, é mel hor v ê - la morta , é o preço que s e pa ga pela pa z
que es s e es t ado da amada o confere.
A t er ce i ra es t ro f e a nun ci a o qu e es t á p or v i r. O t om de
d es es p er o, es t a be l ec i do por pa l a v ra s como so br essalto e fur or , s a l i en t a dos p or l ívido , s ã o ra p i da me nt e a pl a ca dos pe l a
c ons c i ênc i a súb ita da i mpos s i bi l i da de dos p ens a men t os a nt er i o res [ 6 ] s er em r ea i s , ca us a da pe l a i n exi s t ên ci a ca rna l da a ma da . Is s o p rop or ci o na uma pa z, i ncômo da , ma s a l i v i a nt e, a o eu
l í ri co qu e con cl u i com mui t a v e emên ci a a qui l o qu e a i nda é t ema dos s eus t orm ent os : c om mais n ingu ém/r epa rti rás o te u
amor .
O s egundo poema foi es col hi do pa ra fi xa r uma rela çã o
com o primei ro por a l guns mot iv os . A na t ureza oní ri ca que a pa rece nos doi s t ext os é uma da s ca us as que fez com que
es t es foss em ent endi dos como s emel ha nt es pa ra o fi m de a na -
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l i s á - l os . A ques tã o es t rut ura l no t ocant e à orga ni za çã o do dis curs o t ambém é um el emento que aproxima as dua s obras .
O gra nde amor a t ri buí do a L ui z de Camões foi uma chi nes a com o nome de D i namene. A hi st óri a nos di z que es s a pers onagem da v i da camoni ana morreu dura nt e um naufrá gi o, de
uma emba rca çã o conheci da por Na u de Prat a , que s eguia da
Chi na a t é Goa de um modo um t a nto i nus i ta do. Vendo o s eu
ma nus cri t o ori gi na l de Os lusíadas amea ça do “repous a r” pa ra
s empre no fundo do ocea no dura nt e a t ra gédi a , o a ut or t ev e
de es col her aqui l o que prov av el ment e s eri a ma is fav oráv el de
s er sa l vo: aba ndona r D i namene e resga ta r a compi l a çã o da obra . D es de entã o, ess a fi gura pecul i a r apa rece na s obra s de
Camões , rat i fi ca ndo as ca ra ct erí st i ca s que impregna m o concei t o a moros o pres ent e nes t a .
O pl a t onis mo perde um pouco do fôl ego para a s ma rca s
do a mor cort ês e a nã o rea l i za çã o des s e a mor, “pl eni fi ca do
pel a a us ênci a e t ra ns fi gura do em sa uda de” ( B ORGES, p. 3) , do
moment o da mort e da ama da em di a nt e, t orna a poes i a camoni a na dedi cada à es t a fi gura um t a nt o i nt eres s ant e. Segundo
F a uri el ( 1 846 , p. 512 a pud ROUGEMON T, 1 94 5, p. 35) a o defi ni r
es s e t i po de amor, lo que se hace realidad ya no es amor , e
es t a a fi rma çã o defi ne mui t o bem a forma de amor que est á
cont i da em es peci a l nos poema s em a ná l is e.
A mort e é a gra nde repres ent ant e da imposs i bi l i da de nos
doi s ca s os . O que a fas ta uma obra da out ra em dado moment o
é a s i gni fi ca çã o que es sa condi çã o a dqui re pa ra os a ma nt es
que s obrev iv eram à perda dos s eus a ma dos . Em D av i d Mourã o,
o f i m da exis t ênci a t errena i mpl i ca no a l í v i o do c i úme s ent i do
pel o eu - l í ri co, o que es t a pes quis a prefere def i ni r dent ro do
ca mpo da ps iqui a t ria como pa t ol ógi co, j us tament e pel a rel a ção
que es t a es t rutura ment a l es ta bel ece com as pul s ões de mort e. Por out ro l a do, em Ca mões , o eu l í ri co rea ge nega t iv ament e
à mort e, e, di ferent ement e do primei ro cas o, enxerga - a como
um obs t á cul o pa ra a cons uma çã o ou a cont i nui da de do s eu
rel a ci onament o a moros o.
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Se a na l i s a rmos com o mí nimo de cui da do a s es t rut ura ções di s curs i va s de ambos os poema s , podemos encami nha r
a l gumas deduções que a pont em pa ra a exist ênci a de uma i nt ert ext ua l i dade fort e ent re os doi s t ext os . At ent a ndo pa ra a
pri mei ra es t rofe, percebemos que em amba s o eu - l í ri co s e encont ra em um es t a do de oni ri s mo, a mbos a inda cons ci ent es e
a t a dos a o s ens o de rea l i dade.
N o t ext o ca moni a no o eu - l í ri co pa rece nos apont a r pa ra o
fa t o de que o s eu rel a ci onament o com D i namene nunca foi rea l ment e cons umado enqua nt o es ta v i v ia . N os v ersos Em sonho
aquela alma me aparece/Que pra mim foi sonho nesta vida
( gri fos noss os ) ema na uma s ens a çã o de i rrea l i da de, de nã o fa t o, e as col oca ções da pa l av ra sonho nos doi s v ers os l i gam
s ema nt i cament e a a çã o ( de s onha r) à pess oa de quem s e fa l a
( uma es péci e de pers oni fi ca ção do s onho ― t ra ço a t ri buí do,
mui t o prov av elment e, pel a ca ra ct erí s t i ca de fa nt as i a repres ent a da na ama da ) .
As s egunda s est rofes s e enca rregam de a profunda r o
oni ri s mo t ra zi do na pri mei ra . Sã o na rra da s as rea ções do eu l í r i co dura nt e os encont ros que sã o o ei xo pri nci pa l des s e moment o. N os dois t ext os , a amada morta apres ent a um comport a ment o eva s iv o, fugi di o. Em Da v i d Mourã o, o eu - l í ri co a v is a
não vás fugir -me como outrora , enqua nt o em Camões o pedi do
é s emel ha nt e, mas merece a t ençã o, quando o eu - l í ri co confus o
confes s a que Corro para ela; e ela então parece/Que mas de
mim se alonga, compelida . Uma pa l av ra que des pert a a a t enção
e col oca em dúv ida a t é que pont o es t es dois t recho sã o rea l ment e s emel ha nt es é compelida . O di ci oná rio defi ne o v erbo
compelir como obrigar, forçar, coagir, constranger , o que nos
remet e a pensa r nas v ont a des das ama da s nos doi s poemas .
N o pri mei ro ela é quem pra t i ca a a çã o de fuga , a impress ã o
que s e t em é que nã o é cont ra a v ont a de des t a , ma s fa z di s s o uma es péci e de j ogo onde s eduz e s e va i . É pl a us í v el pens a r nes ta primeira interpretação . Se a cei t a , a bre -s e uma brecha pa ra que s e pens e que as duas ama da s s e encont ram em
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condi ções de deci sã o compl et ament e di ferentes : a primei ra t em
cont rol e s obre suas a ções e foge propos i t al ment e do ama nt e,
enqua nt o a s egunda , é força da a ma nt er ess a di s tâ nci a do ama do, por es ta rem em condi ções de exi s t ênci a des i gua i s . Is so
nos obri ga a pensa r na mort e como uma met á fora do enfra queci ment o i dea l i za ção do amor cort ês e da cons uma çã o des t e
a mor a t rav és da rel a çã o s exua l , como pa rece nos propor J orge de Sena em s eu poema A morte de Isolda. A s egunda poss i bi l i da de de i nt erpret a çã o é pens a r na fuga da a ma da como
um eufemi smo pa ra o a cont eciment o de s ua mort e. Essa poss i bi l i da de a pa rece at rav és de recurs os de l i ngua gem, com os
qua i s o a utor es t a bel ece uma s ua v i za ção dos t ermos com fi ns
mui t o prov av el ment e es t ét i cos . É va l i do s a li ent a r ta mbém em
a mbas s egunda s est rofes o es t a do i ni ci a l de a gi ta çã o do eu l í r i co, pel a ut i l i za çã o de v erbos como correr e turbar .
N as t ercei ras es t rofes há muda nça no ní vel di s curs iv o.
D ei xamos de t er um es boço da forma i ndi ret a de di s curs o e
pa ss amos pa ra uma es péci e de di s curs o di ret o. O eu - l í ri co as s ume a enuncia çã o e o s eu es t ado de es pí rit o s ugeri do na es t rofe a nt eri or de ca da poema ga nha forma s e t orna -s e express i va pel o uso de v erbos cui da dos ament e s el ec i onados e pont ua ções a l ocadas de ma nei ra recurs iv a e elabora da .
Há uma gra nde di s pa ri dade ent re es sa s duas es t rofes . No
poema de Da v i d Mourã o, o eu - l í ri co j á nã o es t á dormi ndo, j á
nã o é ma is um ev ent o oní ri co, mas , em Ca mões , t oda a a gi t açã o s e dá a i nda dura nt e o sono.
A úl t i ma es t rofe de ca da poema encerra a percepçã o que
ca da eu -l í ri co t em do pa pel que a mort e desempenhou em s eus
rel a ci onament os e cons equent ement e na forma çã o de s ua s i dent i da des , uma v ez que es ta “s e forma por experi ênc i as de
a pego e des apego, uni ã o e s epa ra çã o” (B YINGTON , 200 5, p. 9 ) .
A mort e que l i bert a e a que res t ri nge, que tra nqui l i za e a que
des es pera , que a ss egura e a que des i l ude.
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CONCLUSÃO
O que s e percebe na s duas s i t ua ções cont i da s nos poemas é o a mor eri gi do e es ta bel eci do no proces s o de forma çã o
da cons ci ênci a s obre doi s pi la res dís pa res : no pri mei ro cas o,
em Da v i d Mourã o, t emos o a mor cons t ruí do s obre a funçã o
es t rut ura l do poder , enqua nt o no s egundo, na obra camonia na ,
no amor que s e pa rece com o que Sponv il l e ( 1 9 9 5) nos fa l a
qua nt o a o Eros , um amor na fa l ta , um des ej o.
O a mo r e o p o d e r s ã o a s d u a s p r i n c i p a i s f u n çõ e s e s t r u t u r an t e s n a c r i a t i v i d ad e e o r g an i z a ç ão d o A r q u é ti p o
C en t r a l , p o r q u e e l a s f a z em p a r t e d a e s s ê n c i a d o p r o c e s s o d e u n i ã o - s ep a r a ç ão d o s s í mb o l o s p a r a f o r m ar a
C o n s c i ên c i a . O a m o r p r o p i c i a a u n i ã o e o p o d e r p r o mo v e a se p a r a ç ão , f o r m a n d o a s s i m a p o l a r i d a d e b á s i c a d o d e s e n v o l v i m en to d o S e r . [ . . . ] o p o d e r p r o p i c i a o
f e c h am en t o d o S e r n a e n t r e g a p a r a o O u t r o d e v i d o à
s u a a u to - a f i r m a ç ão e à i mp o s i ç ã o d o se u p r ó p r i o d e s e j o s o b r e o d e se j o d o Ou t r o , p a r a a s s e g u r a r s u a
i n d ep en d ên c i a .
O que foi des cri t o a ci ma é s imi l a r a o comport a ment o que
encont ramos no eu- l í ri co do pri mei ro poema. Nã o há ent rega ,
há um fecha ment o egoí s ta , a ut opres erva t iv o, que culmi na na s
prefer ênci a s do s uj ei t o t ra t ado. Sã o as rel a ções com o Thanatos freudia no s ob uma pers pect i va erót i ca , a rel ei t ura do Eros
e L ogos de Pl a tã o e a ra t i fi ca çã o da defes a de J ung sobre a
i mposs i bi l i da de e co - ha bi t a çã o ent re a mor e poder num mes mo
moment o dos proces s os s ubj et i vos .
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NOTAS
[1]
B o l s i s t a d e I n i c i a ç ã o C i en t í f i c a
[2]
B í b l i a S a g r a d a . E d . P a s t o r a l - C a t e q u é t i c a . S ã o P a u lo : A v e - M a r i a , s / d . p .
50.
[3]
F E R R E I R A , A u r é l i o B u a r q u e D e H o l a n d a . D i c i o n á r i o Au r é l i o . 3 . e d . ,
2004.
[4]
“ S u p õ e - s e q u e e s s a i n s e g u r an ç a t e r i a p o r b a s e o p r o c e s s o d e i d e a l i z a ç ã o . O a m o r o so c r i a r i a u m a i m ag em d o a m a d o , n e m s e mp r e f u n d a m en t a d a n o r e a l . S e c o m eç a a n ã o e x i s t i r u m a c o r r e s p o n d ê n c i a d e s s a
i d e a l i z a ç ão , a d e s co n f i a ç a s e i n s t a l a . N a s c e o c i ú m e . ” ( C A V AL C A N T E ,
1994 , p. 24)
[5]
“ O n d e e s t i v e s t e? O n d e? Co m q u em? ”
[6]
F E R R E I R A , A u r é l i o B u a r q u e D e H o l a n d a . D i c i o n á r i o Au r é l i o . 3 . e d . ,
2004.
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ISSN 2236-3335
L A E S PA Ñ A D E G U E R R A E N E L C U E N T O
MUY LEJOS DE MADRID
Por Arabelle Nogueira Alves
Licenc iatura e n Le tras c on Español
[email protected]
F ERN ÁND EZ, J es ús Sa nt os . Muy l ej os de Ma dri d. In: Ca beza
ra pa da . Ba rcel ona : Edi t ori a l : Sei x B a rra l , 1 9 58.
Muy lejos de Madrid , cuent o del es cri t or es pa ñol J es ús
F erná ndez Sa nt os , es un rela t o con s ei s pá gi nas na rra do en
t ercera pers ona , que forma pa rt e de l a obra Cabeza Rapada ,
que nos t ras l a da a l a pri mera mi ta d del si gl o XX. El a ut or,
des de el cuento, refl ej a un poco la t ens i ón y el mi edo que
v iv í a l a soci eda d es pa ñola en l a Guerra Ci v i l ( 1 9 36 - 19 39 ) en
Es pa ña , confl i ct o bél i co ocurri do a nt es de l a 2ª Guerra Mundia l
que ha res ul ta do en l a ca í da del poder v i gent e y l a
cons ecuent e t oma del poder por el Genera l F ra nco, rel a t ando
l os hechos de a quel cot i di a no con deta l l e, pero t endi endo a
na rra rl os des de la pers pect i va y punt os de v i s ta del pers ona j e
pri nci pa l , el chi co, uno de l os hi j os de l a fami l i a que es t á
s i empre des pi ert o pres t a ndo l a a t enci ón a t odo l o que ocurre a
s u v uel t a .
El cuent o t ra t a de un ni ño que a l a hora de dormi r, a l as
noches , v eí a l a i l umi na ci ón de l os explos iv os y es cucha ba
di s pa ros de a rmas , de ahí s ent í a mi edo y no l ogra ba dormi r. Al
pri nci pi o de l a na rra ci ón, el chi co, en l a cama, l e pregunt a a s u
ma dre s i l a mi sma no es cucha ba l os rui dos y és t a decí a no
es cucha r na da y l e ordena ra a l ni ño que se pus i era qui et o y
durmi era . D es de que el ferroca rri l fue cort a do por el frent e en
l a regi ón, el pa dre del chi co s e ma nt uv o en una zona ,
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quedá ndos e en Ma dri d, a l ej a do de l a ma dre y de l os dos hi j os
que s e han queda do en un puebl o y des de ent onces as í ha n
perma neci do. La s noches pa sa ba n y j unt o a el l a v ení an l a s
t i ni ebl a s y el mi edo del ni ño que no cons eguí a comprender el
porqué de l os rui dos de l os di spa ros , la pres enci a de sol da dos
y es t e panorama de guerra .
D es pués de unos mes es , el pa dre ba j ó a des pedi rl es
promet i endo que pasa rí a a v is i t a rl os t odos los domi ngos . Pero
el l o no ha ocurri do, y ca ns a da de es pera r, la ma dre l e l l a ma un
dí a por t el éfono y regres a l l ora ndo. Es a cons t ant e fa l ta de
not i ci a ha ce que el ni ño l e pregunt e a su ma dre s egui das
v eces el mot iv o por el que s u pa dre no los v i s i ta , pero el
chi co nunca t ení a l a res pues t a , s u ma dre nunca l a decí a .
As i mismo, la s ga nas que t enía de regresa r a Ma dri d y l a propia
curi os i da d de ent era rs e de l o que pas a ba , no l e ha cí a des i s t i r
de s egui r pregunt ándol o a l a ma dre, s obre todo en l a s noches ,
cua ndo l a os curi da d l e t ra í a el mi edo y la t ris t eza , y la s eñora
con l a i ncert i dumbre de la s cosa s s eguía con l as mi smas
res pues ta s la cóni cas e hui di za s.
El cuent o s ugi ere l a preocupa ci ón del aut or de ret ra t a r l a
rea l i da d, pri nci pa l ment e en l o que res pecta a ens eña r a Espa ña
en l a Guerra Civ i l , podemos v is ua l i za r un ambi ent e de guerra
en va ri os t rechos, a sa ber: “N uev os dispa ros v i ni eron a
a congoj a rl e de nuev o, t ra yéndol e el recuerdo de s u pa dre. ” ( p.
81 ) ; “L os dí as pa sa ba n en proces i ón fugaz, como l os puebl os ,
l os t renes ca rga dos de s ol dados , l os nuevos j ef es de cont rol
que ca da ma ñana conocí an. ” ( p. 7 9 - 80 ) . Los fra gment os
a nt eri orment e t ra ns cri t os nos ha cen creer que el cuent o es de
cont eni do rea l i s t a, una v ez que expresa la rea l i da d hi s t óri ca y
pol í t i ca de un pa í s , porque a l l eerl o v i sua l i za mos l a pres enci a
de s ol dados y de t i ros.
En cuant o a la rea l i da d s oci a l , l as a ct i tudes de l os
pers ona j es nos da n pi s tas del s i gni fi ca do de l o que es v i v i r en
un pa ís en donde ha ecl os i ona do una guerra , el t recho
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s i gui ent e: “Igl es i as a sol a da s , fuent es que a ún des gra na ban
s ol i t a ri as s u fl ui r s i l enci os o, y por enci ma de t odas la s cosa s ,
el s i l enci o de l os hombres , s u ges t o hos ti l , des confi a do; el
mi edo de l a guerra . ”( p. 80 ) des cri be l a s a ct i t udes de l as
pers onas demost ra ndo des confia nza, s i l enci o y mi edo, t an
ca ra ct erí s t i cos de un pa norama de guerra .
Ademá s , podemos not a r l a pres enci a de dos mundos
a nt agóni cos. Por una pa rt e, v emos a un niño que s e s i ent e
i ncomoda do con l a rea l i da d a s u a l rededor y que perci be t odo
l o que s ucede, es t o es , s e da cuent a de que a l go s eri o puede
es t a r ocurri endo en s u pa í s . El chi co s e ma nt i ene des pi ert o
muchas noches , l o que l e ha ce cues t i ona r a s u ma dre y a su
herma no, cua ndo es t e no s e encuent ra dormi do, s obre l as
ca usa s y l a expl i ca ci ón de a quel es cena ri o de t error y a s u
ma dre l e pregunta pri nci pa lment e el porqué de l a a us encia de
s u pa dre y por qué no pueden regresa r a Ma dri d.
Por ot ra pa rt e, es t án l a ma dre y el herma no Ant oni o que
ev i t a n cues t i ona r l a s i t ua ci ón v i gent e. L a a ct it ud de l a ma dre, a
l o mej or, es una ma nera de ha cer de cuenta de que no ocurre
na da pa ra ev i ta r que l os hi j os s i ent a n mi edo o s e preocupen, o
t a l v ez el la mis ma preferi era cerra r l os oj os a nt e la s eri eda d
de l os s uces os en s u pa í s por no t ener cora j e a ret a rl os . En
el s i gui ent e t recho, podemos v er que l a rea cci ón de s u
herma no era i gua l a l a de s u madre: “La s di s puta s l e ha cí a n
des v ela rs e a media noche. Al za ndo l a ca beza a la a lmoha da ,
encont ra ba a l herma no des pi ert o ya. / ―¿qué pa sa , Ant oni o?/
―D uérmet e, a nda… /Si empre l a di chos a pa la bra . Pa recí a que s u
úni ca mis i ón en la fami l i a fuera dormi r et erna ment e. ” ( p. 81 ) ,
es t e fra gmento s ugi ere que l a a cci ón de dormi r cons i st í a en l a
mej or sol uci ón porque por a l gunos i ns ta nt es s e podrí a olv i da r
de l a v i da dura y s ufri da .
D e es t e modo, l a rea l i dad s oci a l s e nos pla nt ea por l a
ma nera como el a ut or nos cuent a l a his t oria . A l os l ect ores,
nos da a ent ender en el cuent o que la gent e s ufrí a mucho
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a nt e el ambi ent e hos t i l de l a guerra , v eí amos s epa ra r a l as
fa mi l i as por l os enci erros de l os pueblos y por l a i nt errupci ón
de l as ruta s ent re l as ci uda des. Ademá s , perci bi mos el
s ufri mi ent o en el s eno de l a fami l i a , des de la es pos a que s ufre
con l a a us enci a de s u ma ri do y sobre t odo el s ufri mi ent o del
chi co que t i ene que conv iv i r con l a a us enci a del pa dre y
conforma rs e con l as res pues t as no s a bi da s y no s eguras de
un pres ent e hos t i l y de un fut uro i nci ert o, de l os cua l es su
ma dre prefi ere hui r y ocul t a r l a rea l i da d, esca pá ndos e de es ta
a t rav és de l a omi s i ón de l os hechos .
En cambi o, el chi co, que es tá s i empre cues t i onando
repres ent a a quí el ot ro l a do, el l a do que s e ma nt i ene a t ent o y
que cues t i ona l a rea l i da d, l a rea l i da d domi na da por el s i l enci o
de l os hechos que no s e da n a conocer. El ni ño i nt enta
ent era rs e del porqué de l os a cont eci mi ent os , s e i nqui eta con la
s i t ua ci ón de t error en v i gor. Todo el l o podemos reconocer en
el s i gui ent e t recho: “ ― Mamá , ¿no oyes?/― D uérmet e ― La
v oz l l egó como un s us urro des de la ha bi t a ción cont i gua . / ―¿N o
oyes na da?/ ―Vas a des perta r a t u hermano. / ―¿Me dej a s que
v aya a hí ?/― N o. / ― Ven t ú a quí , ent onces ./ ― Es t a t e qui et o,
ya v erás cómo t e duermes . ” ( p. 79 ) .
A l o la rgo de l a hi s tori a , v emos s ent i r mi edo el ni ño con
l a l l ega da de l as noches , l o que nos ha ce pensa r que j unt o
con l a s t i ni ebla s de l a noche a cerca n tambi én el t error y el
mi edo que l e t i ene el chi co a l “hori zont e i l umi nado
s úbi t ament e” ( p. 7 9 ) y a l fuego de l os dis pa ros . El es cucha r l os
di s pa ros , el v er l a i l umi na ci ón de l as explos i ones y l a pres enci a
de l os s ol da dos ha cen que el ni ño perci ba que a l go ma l o
pueda est a r ocurri endo en su pa ís .
¿Y qué deci r del t í t ul o de es t e cuent o? En pri mer l uga r
que es ba s ta nt e s uges t i vo, ya que perci bimos en l a hi s t oria
que l a fami l i a v iv í a en Ma dri d, pero l a guerra hi zo s epa ra r a l
pa dre de l a ma dre y de sus dos hi j os , s i endo que a quel s i gui ó
en Ma dri d y es tos ret rocedi eron y s e a l ej a ron de es t a ci udad
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porque t ení a que a ca ta r l as órdenes de eva cua r. En s egundo
l uga r, Ma dri d a demás de repres ent a r l a propia ci uda d en l a que
res i dí a l a fami l i a a nt es de la guerra , t ambi én podrí a s i mbol i za r
el propi o hoga r, qui zá s fuera l a repres ent a ci ón de l a pa z que
exi s t í a a nt es de l a ecl os i ón de l a guerra y por úl t i mo, Ma dri d
podrí a s er el recuerdo de un pa ra ís o perdi do que s i gni fi ca ba el
pa sa do de una fa mi l i a fel i z y uni da .
As i mismo, a l o l a rgo de l a guerra , como era el e j érci t o
que s ust ent a ba el confl i ct o, mucha s rutas , f erroca rri l es ha n
s i do cort a dos como v emos en el s i gui ent e t recho del cuent o:
“D es de que el frent e cort ó el ferroca rri l , dej a ndo en la ot ra
zona a l pa dre, l os t res ― l a ma dre y l os dos hi j os ― i ba n
ret rocedi endo, a l ej ándos e más , a ca ta ndo l a s órdenes de
ev a cua r” ( p. 79 ) , s ugi ri endo que t ra s la da r por v ol unt ad propia
ent re puebl os y ci uda des no dependía s ol o de l a deci s i ón de
uno, pues t o que el pa í s v iv enci a ba una guerra en donde era l a
fuerza a rma da que coma nda ba l a perma nenci a o no de l a
gent e en l os s i t i os. D e a hí que el regres o a Ma dri d a ún pa recí a
t a rda r mucho a ocurri r o qui zá s no ocurri era nunca ; a l os
l ect ores , nos da es ta impres ión cua ndo l eemos el s i gui ent e
t recho: “ ― ¿N os v amos a Ma dri d? ¿Cuá ndo?/ ― D ent ro de
unos día s . Cua ndo pas e es t o./ ― ¿Y s i no pas a ?” ( p. 84 ) .
L o i nt eresa nt e y l o que va l e l a pena des t a ca r es que en
el cuent o podemos ha cer i nferenci a s y ha s ta mi smo us a rl o
como un document o que s i rv e de t es t imoni o de es t a fas e de l a
Hi s t ori a de Es paña , podemos reconocer en ca da persona j e
t a l v ez l os mi smos mi edos y des eos de pa z del puebl o es pa ñol
del i ni ci o del pas a do s i gl o que es t uv i eron pres ent es en l a
época de l a Guerra Civ i l . N ot amos una ci ert a a ngus t i a , a ns i eda d
y t ri s t eza en l os persona j es , s obre t odo en l a ma dre y en el
hi j o que es tá s i empre cues t i onando l as cos a s, a s í como
perci bi mos una neces i da d por pa rt e del ni ño de una res pues t a
de es pera nza a nt e el t emor v is ua l i za do en su a l rededor.
As í pues , el t ext o s e nos pla nt ea como una obra muy
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profunda , con mucha v a l i da d, coherent e con l a rea l i da d y con
l a s oci eda d de l a Es pa ña de l a Guerra Civ i l , pues s i rv e de
t es t i moni o de est os a ños . Además , l a recomenda mos pa ra l os
que es t udi a n o a preci a n l a l i t era t ura Es pa ñola y porque es una
obra que i ns t i ga l a curi os i da d del l ect or a ca da pá rra fo l eí do y
nos ha ce t ras l a da r a un t i empo y ent era rnos de una época a
l a que s ol o l os es pa ñol es de di cho momento ha n conoci do y
ha n v iv enci a do.
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MURILO RUBIÃO: UMA RESENHA CRÍTICA
DO CON TO O P IRO TÉ CNI CO ZA CARI AS
Por Flávia Rodrigue s dos Santos
Licenc iatura e m Le tras Ve rnáculas
flavinharodrigue [email protected] om
Por G rac iely Cândido Macêdo
Licenc iatura e m Le tras Ve rnáculas
[email protected] .br
SCHWARTZ, J orge ( org. ) . Muri l o Rubi ã o. Sel eçã o de t ext os , not a s , es t udo bi ográ fi co, hi s t óri co e crí t i co e exercí c i os de Jorge
Schwa rt z. Sã o Paul o: Abri l Educa çã o, 19 82. (Col eçã o L i t era t ura
Comenta da ) .
APRESENTAÇÃO
Tra t a- s e de uma res enha crí t i ca do cont o i nt i t ul a do O pirotécnico Zacarias , de Muri l o Rubiã o, publ i cado em 1 974 , a t ra v és do qua l o aut or ga nhou s úbi t a fama . A pa rt i r do expos t o,
bus camos apres enta r o univ ers o fa ntá s t i co pres ent e na obra ,
a fi m de mos t ra r os el ement os s obrena t ura i s que des i gnam pa ra es ta ca ra ct erí s t i ca . Al ém di ss o, fi zemos uma brev e compa ra çã o com o roma nce A morte e a morte de Quincas Berro
Dágua , de J orge Ama do, chama ndo à at ençã o pa ra a l guns
pont os comuns ent re amba s as obra s , como o di s curs o na rrat i v o, a i roni a e a mort e.
MURILO RUBIÃ O E O UNIV ERSO FA NTÁ STICO
Poucos fora m os a ut ores bras i l ei ros que a pres enta ram
des t a que na l i t era t ura fa ntá s t i ca . Muri l o Eugêni o Rubi ã o ( 19 16 1 9 9 1 ) , por s ua v ez, é o primei ro cont i st a do gênero fa nt ás t i co
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na l i t era t ura bra s i l ei ra . N es sa moda l i da de l i t erá ri a , ta mbém conheci da como rea l i smo fa ntá s t i co, a cons tant e ocorrênci a de
fa t os i nexpl i cáv ei s e/ou s urrea i s sã o ca ra cterí s t i ca s que produzem certa s ens a çã o de es t ra nhament o nas pes s oas .
Res sa l t a r o uni v ers o fa nt ás t i co pres ent e na obra de Muri l o Rubi ã o é de funda menta l i mportâ nci a pa ra a l i t e ra t ura bras i l ei ra . Ta l des ta que é pert i nent e nã o a penas pel o s eu ca rá t er
crí t i co di a nt e da s t ra ns forma ções que s e s ucedi am, como o
progres so na época , ma s t ambém por es t e a ut or s er o res ponsáv el pel a cons is t ênci a dess e gênero no B ras i l . N ess e s ent i do, es t udi os os de gra ndes des t aques na l i t era t ura bra s i l ei ra ,
como Bas t os ( 200 8) , rev ela m que a na l is a r a obra do a ut or a l ém
do “fa ntá s t i co” é des cobri r uma i nqui eta çã o com o des í gni o de
moderni za çã o na ci ona l .
O CO NTO O PIRO TÉCNICO ZACA RIAS E A SU A RELAÇÃO
COM A MORTE
Si t ua ções a bs urda s pres ent es no cont o O pirotécnico Zacarias , por exempl o, como a mort e do “pi rot écni co Za ca ria s ”,
rev el am no des enrol a r do enredo, que a pers onagem pri nci pa l
é o própri o na rrador: “uns a cham que es t ou v iv o ― a mort e
t i nha apenas uma s emel ha nça comi go. Out ros, ma is supers t i ci os os , a credi ta m que [ . . . ] o i ndiv í duo a quem a nda m chama ndo
Za ca ri as nã o pa ss a de uma a l ma pena da. ” ( RUBIÃO, 1982, p. 13) .
A na rra t iv a de O pirotécnico Zacarias s egue um fi o dis curs i v o que des ta ca refl exões de s i t ua ções de mort e e v i da ,
bem como de as sombrament o de pes s oa s que encont ram Zaca ri a s na rua . Com is so, el e enfa t i za a s ua mort e t enta ndo expl i ca r o ocorri do:
A ú n i ca p e s so a q u e p o d er i a d a r in fo r m a çõ e s c er t a s
s o b r e o a s su n to so u eu . [ . . . ] Em v e r d ad e mo r r i , o q u e
v em d e en co n tr o à v er s ão d o s q u e cr êem n a m in h a
mo r te . P o r o u tr o l a d o , t a mb ém n ão e s to u mo r to , p o i s
f a ç o tu d o o q u e an te s n ão f az i a e , d ev o d iz er , co m
m a i s ag r ad o d o q u e an t i g amen t e . ( R UB I Ã O , 1 9 8 2 , p . 1 4 ) .
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A pa rt i r des sa pa ss agem, é impos s ív el nã o not a r uma aproxi ma çã o com o romance A morte e a morte de Quincas
Berro Dágua , de J orge Ama do ( 19 1 2 - 200 1 ) . Ass i m como Muri l o
Rubi ã o, ess e a utor, especi fi ca ment e nes sa obra , ta mbém ca rrega cons i go uma crí t i ca ama rga do comporta mento do homem
por mei o de uma di mensã o a l egóri ca com a mort e.
Ta nt o o romance de J orge Ama do quant o o cont o de Muri l o Rubi ã o a bordam uma na rra t iv a i ns t i ga nt e e env olv ent e, mi st ura ndo s onho e rea l i da de; ra ci ona l i da de e loucura . As pers ona gens pri nci pa is de a mbas as obra s v iv em uma dua l i da de ent re a v i da e a mort e, dei xa ndo - nos de frent e com uma s i t ua çã o ext ra ordiná ri a e sobrenat ura l , mas mui to bem expl i ca da pel os na rra dores .
É s abi do ra t i fi ca r, no ent a nto, que há uma fort e pres ença
de i roni a , humor e ma l í ci a na s obras a bordada s . Apres ent a da s
de manei ra div ert i da , a s na rra t i vas fogem da rea l i da de, ent ra ndo no mundo do fant ás t i co a pa rt i r do moment o em que os
defunt os deci dem fa la r. N ess e s ent i do, pode - s e des t a ca r ta l
i roni a em um dos t rechos de O pirotécnico Zacarias : “J orgi nho
empa l i deceu, s ol t ou um gri t o s urdo, t omba ndo desma ia do, enqua nt o os s eus ami gos , a l guns a dmi rados por v erem um ca dá v er fa l a r, s e dis punham a ouv i r - me”. ( RUB IÃO, 1 9 82, p. 17 ) .
A mort e, por s ua v ez, no ima gi ná ri o s oci a l , a i nda que s ej a
uma cert eza i nexoráv el , é bas ta nt e nega t iva , pos s iv el ment e por
repres ent a r a ext i nção e o ca os da es péci e huma na . Ma s em
O pirotécnico Zacarias é t i da como pos i t iv a , fa t o que pode s er
cons t at a do qua ndo a pers ona gem pri nci pa l , t ambém na rra dor
da hi st óri a , profere:
S ó u m p en s amen to m e o p r i me : q u e aco n te c imen to s o
d e st i n o r e s er v a r á a u m mo r to se o s v iv o s r e sp i r a m
u m a v i d a ag o n i z an te? E a m in h a a n g ú s t i a c r e sc e a o
s e n t i r , n a su a p l en i tu d e , q u e a m i n h a c ap ac i d ad e d e
a m ar , d i s ce r n i r a s co i s a s , é b em s u p e r io r à d o s s er e s
q u e p o r m im p a s s am a s su s t ad o s . ( R UB I ÃO , 1 9 8 2 , p . 1 9 ) .
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A concepçã o da mort e como a l go fa voráv el t a mbém es tá
pres ent e no roma nce A morte e a morte de Quincas Berro Dágua . N o ent ant o, a o i nv és de s er v i st a pelo defunt o Qui ncas
B erro Dá gua , s e fa z pres ent e ent re s eus fami l i a res , que enca ra m es s e ocorri do como uma j us t i fi ca t i va à s oci eda de do comport ament o nega t iv o de Qui ncas dura nt e a sua v i da :
Q u a n d o u m h o m em m o r r e , e l e s e r e i n t eg r a em s u a
r e s p e i t a b i l i d ad e a m a i s a u t ên t i c a , m e sm o t en d o
c o m e t i d o l o u c u r a s e m s u a v i d a . A mo r t e ap a g a , c o m
s u a m ão d e au s ên c i a , a s m an ch a s d o p a s s a d o e a
m emó r i a d o mo r t o f u l g e co m o d i a m an t e . E s s a a t e s e
d a f a m í l i a , a p l a u d i d a p o r v i z i n h o s e am i g o s . ( A M AD O ,
2004, p. 12) .
É v á l i do ress a l ta r, t odav i a, a i mposs i bi l i da de de ana l i sa r
a s duas obra s em ques tã o s em enfa t i za r a pl uri ss i gni fi ca ção
da mort e, t endo em v i s ta o fa t o de es t a muda r de concepçã o
de a cordo com a cul t ura ; s endo, s obretudo , uma ques tã o
s oci a l . N o que di z res pei t o à l i t era t ura , por exempl o, é not óri o
perceber o s eu poder de des cons t rui r o s ent i do da mort e,
muda ndo da a cepçã o nat ura l pa ra o s obrenat ura l e/ou
fa nt ás t i co . Al ém di ss o, a t ri bui j uí zos de va l ores pos i t iv os ou
nega t iv os de uma da da s oci edade ao defunto, e es t e , torna- s e
es crav o des sa fa cul da de:
[ . . . ] o me u co r p o p o d e r i a , a o r o l a r p e l o b a r r a co a b a i x o ,
f icar escondido entre a vegetação, terra e
pedregu lhos . Se tal aconte cesse , j amais se r ia
d e s co b e r to n o s e u i mp r o v i s a d o t ú mu l o e o m eu n o m e
n ã o o cu p ar i a a s m a n c h e t e s d o s j o r n a i s . ( R U B I Ã O ,
1982, p. 17).
Em A morte e a morte de Quincas Berro Dágua , o j uí zo
de v a l or , a t ri buí do à persona gem pri nci pa l , é nega t i vo, t a lv ez
pel o fa t o de Qui ncas t er s i do uma v ergonha pa ra a famí l i a :
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E r a o c a d áv e r d e Qu i n c a s B e r r o D ág u a , c a c h a c e ir o ,
d eb o c h ad o e j o g ad o r , s e m f a m í l i a , s e m l a r , s e m f l o r e s
e s e m r ez a s . N ã o e r a J o aq u i m So a r e s d a C u n h a ,
c o r r e t o fu n c i o n á r i o d a M e s a d e R en d a s E s t a d u a l ,
a p o s en t ad o a p ó s v i n t e e c i n co a n o s d e b o n s e l ea i s
s e r v i ç o s , e s p o so mo d e l a r , a q u em t o d o s t i r a v am o
c h ap éu e a p e r t a v am a m ão . C o m o p o d e u m h o me m ,
a o s c i n q ü en t a a n o s , a b an d o n a r a f a m í l i a , a c a s a , o s
h á b i t o s d e t o d a u m a v i d a , o s c o n h ec i d o s a n t i g o s , p a r a
v a g ab u n d e a r p e l a s r u a s , b e b e r n o s b o t e q u i n s b a r a to s ,
f r e q ü en t a r o m er e t r í c i o , v i v er s u j o e b a r b ad o , mo r a r
e m i n f a me p o c i l g a , d o r m i r em u m c a t r e m i s e r á v e l ?
( A M AD O , 2 0 0 4 , p . 1 5 ) .
N o cont o, porta nt o, v a l e chama r à a t ençã o, t ambém, de
que o pers onagem Za ca ri as , mesmo a pós sua mort e, procura
res t a ura r cont at o com os s eus ami gos da quel a noi t e. Ta l
i nt eres s e bas eava -s e no fa t o dess es compa nhei ros s erem as
úni ca s t es t emunha s de s ua mort e. N o enta nt o, el e nã o os
encont ra . Apesa r di ss o, el e cont i nua a s ua t ra j et óri a t enta ndo
prova r que, mes mo mort o, cons egue t er s ent i ment os e fazer
a s mesma s cois as que fazi a qua ndo es tav a v iv o.
CO NSIDERA ÇÕES FINA IS
Em rel a ção à s obra s em ques tã o, pode - s e inferi r que os
el ement os a l egóri cos rev el am, por mei o do fa nt ás t i co, a v is ão
da condi çã o huma na, t razendo à t ona , i ncl us i v e, frus t ra ções e
a ngús t i as . O fa ntás t i co rubia no e ama dia no, cont udo, rompem
nã o s ó com os pri ncí pi os de causa l i da de, mas ta mbém de t empo, de es pa ço e do s er. Ass i m s endo, é i negá v el que o l ei t or
nã o s e depa re dia nt e de um fa t o i mposs í v el de s er expl i ca do
pel a s l ei s na tura is . D ess a forma , o fa ntá s t i co t ende a produzi r
ef ei t os di v ers os sobre o l ei t or, t a is como i ncert eza e/ou curi os i da de.
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REFERÊNCIAS
AMADO, J orge. A mort e e a mort e de Qui nca s B erro Dá gua .
9 0 . ed. Ri o de J anei ro: Record, 2004 .
B ASTOS, Hermenegi l do J os é. N ota s pa ra uma poét i ca /pol í t i ca
do es pect ro ( O fa ntá s t i co em Muri l o Rubiã o) . Rev i s ta da Anpol l ,
Sã o Pa ul o, 20 00 . D i s ponív el em: < ht t p: //www.a npol l . org. br/
r ev i s t a /i ndex. php/rev i s t a /a rt i cl e/d ownl oa d/57 8/589 > . Aces s o
em: 30 ma r. 20 12.
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N O R MA S P A R A E N V I O D E A R T I G O S E R E SE N H A S
Res enha s e a r t igos pa ra a p rec ia çã o , e la bo ra dos po r gra dua ndo (a ) ( s ) em Le t ra s da U E FS , dev e rã o s e r en ca min ha dos à com is s ã o
ed it o r ia l po r v ia e le t r ôn ica , a n exa dos a o e - ma i l, en t r e pa ra o ende r e ço r ev is ta g ra dua ndo@ gma il . com . S omen te s e rã o a ce it os t ra ba lhos
na s á r ea s de L ingu ís t ica , L it e ra tu ra , A r t es e E duca çã o , em f o rma to
e le t r ôn ico e in éd it os , ou s e ja , nã o pub l ica dos no f o rma to s o l ic it a do
em qua is que r ou t ros p e r iód icos . A s língua s na s qua is e le s pod e rã o
s e r es c r it os s erã o toda s a s ex is ten t es na g ra de cu r r icu la r do C urs o de G ra dua çã o em Le t ra s da U E F S ( Po r tuguês , Ing lês , F ra nc ês e
E s pa nho l) .
ORIE NTAÇÕE S GERA IS
O s t ra ba lh os , env ia dos à Rev is ta G ra dua ndo , d ig it a dos em
f o rma to W ord , d eve rã o de vem con te r a s egu in te f o rma ta çã o :
1 . F on te T im es New R oma n;
2 . Ta ma nho 12 ( t ít u lo , s ub t ít u lo (s e hou ve r ) , tóp ic o e co rpo do
t ex t o ) ;
3 . E s pa ça men to en t re l inha s 1 , 5 ; ma rgens es qu e rda e s upe r ior
de 3 cm , d ir e it a e inf e r io r de 2 cm ;
4 . O ta ma nho da f o n te da c it a çã o d eve s e r men or que o co rpo do tex to ( ta ma nho 1 0 ) e o es pa ça men to en t re a s l inha s
de ve s e r s imp les ;
5 . C it a çõ es com ma is de 3 l inha s d eve rã o s e r es c r ita s s em
a s pa s e te r rec uo d e 04 cm da ma rgem es que rda , a lém de
nã o a p res en ta r re cuo na ma rgem d ir e it a e t er es pa ça men to
s imp le s em re la çã o a o co rpo do t ex to ;
6 . C it a çõ es com a t é 3 l inha s d evem a pa re ce r re f e r enc ia da s
no co rpo do tex to e con t e r a s pa s ;
7 . Pa la v ra s es t ra ng e ira s e t ít u los d e ob ra s dev em s e r es c r it os em it á l ico ;
8 . O s ca s os om is s os s e rã o r es o lv idos pe la com is sã o ed it o r ia l .
O R I E N T A Ç Õ E S E SP E C Í F I C A S
R E SE N H A C R Í T I C A
S e rã o a ce it a s res enha s c r ít ica s com m ín imo de 0 4 e no má x imo 07 pá g ina s , inc lu indo re f e rên c ia s .
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A es t ru tu ra dev e con te r :
1 . T ít u lo e/ou s ub t ít u lo ;
2 . A p res en ta çã o e a va l ia çã o in ic ia l do ob je to da res enha ;
3 . Des cr iç ã o e a va l ia çã o de pa r tes do ob je t o da res enha ;
4 . Recomendaçã o/cons idera ção f ina l sobre o objeto da resenha ;
5 . Ref e rên c ia s .
Nome comp le to do a u to r na f o rma d ir e ta , a n t eced ido pe la pa la v ra «Po r» e a compa nha do , no pa rá g ra f o s egu in te , de um b rev e
cu r r íc u lo , s endo : cu rs o , ins t it u içã o e e - ma il. I nf o rma ções a d ic iona is
de vem s e r es c r it a s em no ta de roda pé .
ARTIGO
S e rã o a c e it os a r t igos com m ín imo d e 07 e no má x imo 10 pá g ina s , inc lu indo r ef e rênc ia s .A es t ru tu ra de ve con te r :
1 . T ít u lo e/ou s ub t ít u lo ;
2 . R es umo ;
3 . Pa la v ra s - cha v e ;
4 . In t roduçã o ;
5 . C o rpo do a r t igo ;
6 . C onc lus ã o/cons ide ra çõ es f ina is ;
7 . R ef e r ênc ia s .
Nome comp le to do ( s ) a u to r ( es ) na f o rma d ir e ta , a compa nha do
( s ) , no pa rá gra f o s egu in te , d e um b r eve cu r r ícu lo , s en do : nome da
in s t it u içã o , cu rs o e e - ma i l. Inf o rma çõ es a d ic iona is d evem s er es c r it a s em no ta de roda pé .
Res umo na l íngua do tex to d ev e a pr es en ta r , de f o rma conc is a , os ob j e t ivos , a me to do lo g ia e os r es u lta dos a lca nça dos , nã o
de vendo u lt ra pa s s a r 1 00 pa la v ra s n em con t e r c it a çõ es . A lém d is s o ,
de ve rá a p r es en ta r o res umo p r in c ipa l, es c r it o na l íngua do a r t igo , e
o r es umo s ecundá r io em um id ioma da p róp r ia es co lha (Po r tugu ês ,
E s pa nho l, F ra nc ês e ing lês ) . E m ca s o d e o a rt igo s er es c r it o em
l ín gua es tra ng e ira f ica o a r t icu l is ta ob r iga do a es c rev e r o res umo
s e cundá r io em L íngua Po r tugues a .
Pa la v ra s - cha ve como e lem en to ob r iga tó r io , f igur a ndo logo a ba ixo de ca da res umo ( na l íngua do a r t igo e es t r a nge ir a ) , cu jo núme ro de pa la v ra s nã o d ev e exc ede r a 5 e nã o s e r inf e r io r a 3 .
J
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Capa Graduando 3ED-V13