SILVA, Letícia Anna da; GIRARDI, Maria Fernanda Gugelmin. A responsabilidade civil por abandono afetivo dos
filhos no direito brasileiro. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 630-653, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
2236-5044
A RESPONSABILIDADE CIVIL POR ABANDONO AFETIVO DOS
FILHOS NO DIREITO BRASILEIRO
Letícia Anna da Silva1
Maria Fernanda Gugelmin Girardi2
SUMÁRIO
Introdução; 1 Família e princípios basilares do direito de família; 1.1 Princípio da
dignidade da pessoa humana; 1.2 Princípio da solidariedade familiar; 1.3 Princípio
da afetividade; 1.4 Princípio da convivência familiar; 1.5 Princípio do melhor
interesse da criança e do adolescente; 2 O afeto como dever familiar; 3 Do poder
familiar; 4 Do abandono afetivo; 4.1 O abandono afetivo na legislação brasileira; 5
Do dano moral; 5.1 O dano moral decorrente do abandono afetivo; 6 Da
responsabilidade civil; 6.1 Responsabilidade civil em razão ao abandono afetivo do
menor; Considerações finais; Referências.
RESUMO
O presente artigo científico tem como objeto a responsabilidade civil dos pais por
abandono afetivo do filho no direito brasileiro. O objetivo geral do estudo é verificar,
com base na doutrina e na jurisprudência pátria, se a ausência de afeto dos
genitores em relação aos seus filhos enseja dano moral e, por conseguinte, o direito
a indenização mediante reparação civil. As seguintes indagações constituem o
problema deste estudo: o afeto é de fato um dever jurídico dos pais? O abandono
afetivo configura dano moral? Há possibilidade de reparação do dano moral causado
ao filho menor? A indenização seria uma forma de reparar a dor sofrida pelo filho?
Trata-se de um tema recente, ainda em projeto de lei e bastante controvertido no
ordenamento jurídico brasileiro. Para alcançar o objetivo proposto, a abordagem do
assunto inicia-se a partir do estudo da família e dos seus princípios basilares,
seguindo-se para uma análise do abandono afetivo, do dano moral e da sua
reparação através da responsabilidade civil, em razão dos danos causados ao
menor pelo descumprimento dos deveres jurídicos. Para a elaboração deste artigo
foi utilizado o método indutivo aprimorado com as técnicas do referente, da
categoria, dos conceitos operacionais e da pesquisa bibliográfica. Ao final, observouse, com base no posicionamento de Tribunais de Justiça pátrios, a possibilidade
jurídica da responsabilidade civil paterna oriunda do abandono afetivo do filho.
1
Acadêmica do 9º período do Curso de Direito da Universidade do Vale do Itajaí, Campus Balneário
Camboriú (SC). [email protected].
2
Professora Mestre do Curso de Direito da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI.
[email protected].
630
SILVA, Letícia Anna da; GIRARDI, Maria Fernanda Gugelmin. A responsabilidade civil por abandono afetivo dos
filhos no direito brasileiro. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 630-653, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
2236-5044
Palavras-chave: Convivência
Responsabilidade Civil.
Familiar.
Abandono
Afetivo.
Dano
Moral.
INTRODUÇÃO
O abandono afetivo por parte de um dos genitores em relação ao filho é ato
flagrante de descumprimento do princípio da convivência familiar e da afetividade,
amparados pelo atual Direito de Família pátrio.
Mesmo com o divórcio ou dissolução da união estável, ou ainda, inexistindo
qualquer vínculo conjugal, ambos os pais, continuam com a obrigação de participar
da vida do filho, cooperando para o seu desenvolvimento, amparando-o no que for
preciso e, sobretudo, dando amor e carinho.
Sob esse aspecto, percebe-se a necessidade de responsabilizar os pais que
descumprem os encargos do poder familiar, acarretando lesões psicológicas e
afetuosas irreversíveis ao filho menor, que se encontra em um estágio de
desenvolvimento, inteiramente dependente do vínculo afetivo.
O presente artigo científico, portanto, tem como objeto a responsabilidade
civil dos genitores por abandono afetivo dos filhos, tendo em vista que não é dado
aos genitores o direito de causar danos aos seus filhos.
Justifica-se a escolha do tema, no sentido de que o assunto explanado é
recente, trata-se dos Projetos de Lei nº700/2007 e nº 4.294/2008 e, embora inexista
um número pertinente de entendimento jurisprudencial acerca do assunto, a
reparação civil mediante o abandono afetivo vem ganhando espaço nas decisões
dos magistrados e na doutrina, sendo relevante a análise de seus atributos.
Têm se, assim, que o objetivo geral deste trabalho é verificar, com base na
legislação e doutrinas pátrias, o instituto do abandono afetivo como possível
ensejador da reparação civil. O problema central desta pesquisa reside nas
seguintes indagações: o afeto é de fato um dever jurídico dos pais? O abandono
afetivo configura dano moral? Há possibilidade de reparação do dano moral causado
ao filho menor? A indenização seria uma forma de reparar a dor sofrida pelo filho?
Todavia, será necessário explanar a respeito da família e dos seus princípios
norteadores, do poder familiar, bem como, ponderar sobre o abandono afetivo e o
dano moral, para assim, tratar da responsabilidade civil como meio de reparação aos
danos causados ao filho menor, findando o objetivo.
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SILVA, Letícia Anna da; GIRARDI, Maria Fernanda Gugelmin. A responsabilidade civil por abandono afetivo dos
filhos no direito brasileiro. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 630-653, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
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Para a elaboração da presente pesquisa, foi utilizado o método
investigatório indutivo3, operacionalizado com as técnicas do referente4, da
categoria5, dos conceitos operacionais6 e da pesquisa bibliográfica7.
1 FAMÍLIA E PRINCÍPIOS BASILARES DO DIREITO DE FAMÍLIA
Conceituar família é um grande desafio no mundo atual. Com as constantes
modificações na sociedade, este instituto, por sua vez, também evoluiu de maneira
considerável. Já afirmava Sílvio de Salvo Venosa8 que “entre os vários organismos
sociais e jurídicos, o conceito a compreensão e a extensão da família são os que
mais se alteraram no curso dos tempos”.
Presentemente, a conceituação de família vai além daquela compreendida
por pai, mãe e filho. Para Maria Helena Diniz9, “família é o grupo fechado de
pessoas, composto dos pais e filhos, e, para efeitos limitados, de outros parentes,
unidos pela convivência e afeto numa mesma economia e sob a mesma direção”.
No entendimento de Fábio Ulhoa Coelho10, é possível identificar também o
afeto como sendo condição essencial para a constituição de uma base familiar:
Para o direito, família é o conjunto de duas ou mais pessoas
vinculadas por relações específicas, tais as de conjugalidade,
ascendência e descendência, fraternidade e outras. No passado,
3
“[...] pesquisar e identificar as partes de um fenômeno e colecioná-las de modo a ter uma percepção
ou conclusão geral [...]”. PASOLD, Cesar Luis. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática.
11 ed. Florianópolis: Milleniuum, 2008. p. 86.
4
“[...] explicitação prévia do(s) motivo(s), do(s) objetivo(s) e do produto desejado, delimitando o
alcance temático e de abordagem para a atividade intelectual, especialmente para uma pesquisa.”
PASOLD, Cesar Luis. Metodologia da pesquisa jurídica: Teoria e prática. p. 53.
5
“[...] palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou à expressão de uma ideia.” PASOLD,
Cesar Luis. Metodologia da pesquisa jurídica: Teoria e prática. p. 25.
6
“[...] uma definição para uma palavra ou expressão, com o desejo de que tal definição seja aceita
para os efeitos das ideias que expomos [...]”. PASOLD, Cesar Luis. Metodologia da pesquisa
jurídica: Teoria e prática. p. 37.
7
“Técnica de investigação em livros, repertórios jurisprudenciais e coletâneas legais”. PASOLD,
Cesar Luis. Metodologia da pesquisa jurídica: Teoria e prática. p. 209.
8
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2012. v.6. p.3.
9
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. 26. ed. São Paulo:
Saraiva, 2011. v.5. p.31.
10
COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil, família, sucessões. 4. ed. rev. e atual. São Paulo:
Saraiva, 2011. v. 5. p.26.
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SILVA, Letícia Anna da; GIRARDI, Maria Fernanda Gugelmin. A responsabilidade civil por abandono afetivo dos
filhos no direito brasileiro. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
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definia-se em função de fatores biológicos, que, aos poucos, foram
substituídos por vínculos de afeição.
Nos dias atuais, portanto, o que identifica a família não é nem o enlace
matrimonial nem a diferença de sexo do par ou o aliciamento de caráter sexual. O
artefato distintivo da família é a presença de um vínculo afetivo, motivando
obrigação mútua.11
Percebe-se assim, que o ideal a ser obtido em todas as relações familiares,
independentemente de qual seja a espécie de família, é a harmonia, por intermédio
da afeição.12 No entanto, ausentes os pressupostos para um bom entrosamento
familiar, a família passa a necessitar do direito.
O complexo de normas que regulará as relações familiares é o direito de
família.
13
Porém, por mais cautelosa que seja a legislação, surgem sempre novos
fatos e costumes que fogem aos seus ditames e somente com embasamento
principiológico e doutrinário será plausível preencher as lacunas.
1.1 Princípio da dignidade da pessoa humana
Dentre os princípios constitucionais que compreendem o direito de família,
está o da Dignidade da Pessoa Humana. Conferido como princípio fundamental pela
Constituição da República Federativa do Brasil14, no seu artigo 1º, inciso III, constitui
base da comunidade familiar, garantindo e tendo por parâmetro a afetividade, o
integral desenvolvimento e a efetivação de todos os seus membros, sobretudo da
criança e do adolescente.15
Para Pablo Stolze Gagliano16, a dignidade humana “somente é preservada
na medida em que se garante o respeito à dimensão existencial do indivíduo, não
11
DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 9. ed. rev., atual e ampl. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2013. p.40.
12
MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil: direito de família. 38. ed. rev. e atual.
São Paulo: Saraiva, 2007. v.2. p.8.
13
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p.17.
14
Doravante será denominada apenas por Constituição Federal de 1988.
15
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p.37.
16
GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo curso de direito civil: direito de família – as famílias em
perspectiva constitucional. São Paulo: Saraiva, 2011. v.5. p.76.
633
SILVA, Letícia Anna da; GIRARDI, Maria Fernanda Gugelmin. A responsabilidade civil por abandono afetivo dos
filhos no direito brasileiro. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
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apenas em sua esfera pessoal, mas principalmente, no âmbito das suas relações
sociais”.
Compreende-se, portanto, que o respeito a este princípio fundante do
Estado Democrático do Direito somente será íntegro e digno quando observado
também nas relações familiares.
Nesse aspecto, Maria Berenice Dias17, assegura:
A dignidade da pessoa humana encontra na família o solo apropriado
para florescer. A ordem constitucional dá-lhe especial proteção
independentemente de sua origem. A multiplicação das entidades
familiares preserva e desenvolve as qualidades mais relevantes entre
os familiares - o afeto, a solidariedade, a união, o respeito, a
confiança, o amor, o projeto de vida comum -, permitindo o pleno
desenvolvimento pessoal e social de cada partícipe com base em
ideais pluralistas, solidaristas, democráticos e humanistas.
Deste modo, é direito de toda entidade familiar, a proteção de sua dignidade,
independente de qual seja a sua espécie. Almejando-se banir qualquer tipo de
discriminação e, por conseguinte, construindo uma sociedade mais livre, justa e
solidária.
1.2 Princípio da solidariedade familiar
Embora a solidariedade social esteja perfilhada como objetivo fundamental
da República Federativa do Brasil, no seu artigo 3º, inciso I, da Constituição Federal
de 1988, repercute também nas relações familiares.
Esse princípio além de traduzir a afetividade indispensável que une os
membros da família, consolida uma exclusiva forma de responsabilidade social
aplicada às entidades familiares.18
Conforme entende Pablo Stolze Gagliano19, “a solidariedade, portanto,
culmina por determinar o amparo, a assistência material e moral recíproca, entre
todos os familiares”.
17
DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p. 66.
18
GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo curso de direito civil: direito de família – as famílias em
perspectiva constitucional. p. 93.
19
GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo curso de direito civil: direito de família – as famílias em
perspectiva constitucional. p. 93.
634
SILVA, Letícia Anna da; GIRARDI, Maria Fernanda Gugelmin. A responsabilidade civil por abandono afetivo dos
filhos no direito brasileiro. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 630-653, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
2236-5044
Maria Berenice Dias20 esclarece que o princípio da solidariedade familiar,
“ao gerar deveres recíprocos entre os integrantes do grupo familiar, safa-se o Estado
do encargo de prover toda a gama de direitos que são assegurados
constitucionalmente ao cidadão”.
É o que se verifica no artigo 227 da Constituição Federal de 198821, do qual
se extrai:
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à
criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o
direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à
profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à
convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de
toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência,
crueldade e opressão.
Percebe-se, portanto, que a solidariedade familiar é o dever que os parentes
possuem uns com os outros de mútua assistência, especialmente, quando se trata
de crianças e adolescentes, os quais merecem proteção integral, em razão de
encontrar-se em processo de desenvolvimento fisiopsíquico.
1.3 Princípio da afetividade
O princípio da afetividade, peculiar ao direito de família, pode ser apontado
atualmente, como o principal fundamento das relações familiares. Segundo Flávio
Tartuce22, “mesmo não constando a expressão afeto do Texto Maior como sendo um
direito fundamental, pode-se afirmar que ele decorre da valorização constante da
dignidade humana”.
Maria Berenice Dias23 entende que, “os laços de afeto e de solidariedade
derivam da convivência familiar, não do sangue. Assim, a posse de estado de filho
nada mais é do que o reconhecimento jurídico do afeto, com o claro objetivo de
garantir a felicidade”.
20
DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p. 69.
21
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Promulgada em 05 de Outubro de 1988.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em 02
de maio de 2013.
22
TARTUCE, Flávio. Direito civil: direito de família. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011. v. 5. p. 50.
23
DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p. 73.
635
SILVA, Letícia Anna da; GIRARDI, Maria Fernanda Gugelmin. A responsabilidade civil por abandono afetivo dos
filhos no direito brasileiro. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 630-653, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
2236-5044
Nesta mesma perspectiva, Paulo Luiz Netto Lôbo24, é mais crítico ao
assegurar:
O modelo tradicional e o modelo científico partem de um equívoco de
base: a família atual não é mais, exclusivamente, a biológica. A
origem biológica era indispensável à família patriarcal, para cumprir
suas funções tradicionais. Contudo, o modelo patriarcal desapareceu
nas relações sociais brasileiras, após a urbanização crescente e a
emancipação feminina, na segunda metade deste século. No âmbito
jurídico, encerrou definitivamente seu ciclo após o advento da
Constituição de 1988. O modelo científico é inadequado, pois a
certeza absoluta da origem genética não é suficiente para
fundamentar a filiação, uma vez que outros são os valores que
passaram a dominar esse campo das relações humanas.
Deste modo, a afetividade entrou nas ponderações dos juristas, buscando
explicar as relações familiares contemporâneas, já que a comunhão de afeto é
incombinável com o padrão único, matrimonializado, da família.25
O princípio da afetividade, por fazer parte do novo direito de família é,
portanto, elemento norteador para a formação familiar nos dias atuais, o qual busca
aproximar as pessoas mediante a afetividade, e não somente pelo vínculo
sanguíneo.
1.4 Princípio da convivência familiar
Pelo princípio da convivência familiar, como o próprio nome pressupõe, os
pais e filhos devem permanecer unidos.26 Pablo Stolze Gagliano27 explica que “o
afastamento definitivo dos filhos da sua família natural é medida de exceção, apenas
recomendável em situações justificadas por interesse superior”.
Almeja-se então, que os filhos não sejam privados da convivência familiar,
independentemente de qual situação encontram-se os pais, divorciados ou não.
24
LÔBO, Paulo Luiz Netto. Princípio Jurídico da afetividade na filiação. Disponível em:
<http://www.ibdfam.org.br/artigos/detalhe/130>. Acesso em 02 de maio de 2013.
25
DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p. 74.
26
GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo curso de direito civil: direito de família – as famílias em
perspectiva constitucional. p. 102.
27
GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo curso de direito civil: direito de família – as famílias em
perspectiva constitucional. p. 102.
636
SILVA, Letícia Anna da; GIRARDI, Maria Fernanda Gugelmin. A responsabilidade civil por abandono afetivo dos
filhos no direito brasileiro. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 630-653, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
2236-5044
Paulo Lôbo28 leciona que, “a convivência familiar é a relação diuturna e
duradoura entrelaçada pelas pessoas que compõem o grupo familiar, em virtude de
laços de parentesco ou não, no ambiente comum”.
Destarte, nada impede que o direito à convivência possa ser estendido a
outros integrantes da família, com os quais o menor mantém vínculos de
afetividade.29 Como, por exemplo, avós, tios e irmãos.
1.5 Princípio do melhor interesse da criança e do adolescente
O princípio do melhor interesse da criança e do adolescente também tem
suas raízes na alteração das estruturas familiares nas últimas décadas, através da
qual, como mencionado anteriormente, despojou-se de sua função econômica para
ser um centro de companheirismo e afetividade.30
Conforme entende Rodrigo da Cunha Pereira31, “diante deste quadro, o
menor ganha destaque especial no ambiente familiar, em razão de ainda não ter
alcançado maturidade suficiente para conduzir a própria vida sozinho”.
Seguindo este entendimento, Maria Berenice Dias32 também pontua que, “a
maior vulnerabilidade e fragilidade dos cidadãos até os 18 anos, como pessoas em
desenvolvimento, os faz destinatários de um tratamento especial”.
Daí a consagração constitucional do princípio do melhor interesse da criança
e do adolescente, previsto no artigo 227 da Constituição Federal de 198833, como
também nos artigos 4º e 5º do Estatuto da Criança e do Adolescente34.
28
LÔBO, Paulo. Direito Civil: Famílias. 4.ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 74.
29
GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo curso de direito civil: direito de família – as famílias em
perspectiva constitucional. p. 103.
30
PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Princípios fundamentais norteadores para o direito de família.
Belo Horizonte: Del Rey, 2005. p. 126.
31
PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Princípios fundamentais norteadores para o direito de família. p.
127.
32
DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p. 74.
33
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Promulgada em 05 de Outubro de 1988.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em 02
de maio de 2013.
34
BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente. Lei Federal nº 8069, de 13 de julho de 1990.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8069.htm>. Acesso em 02 de maio de
2013.
637
SILVA, Letícia Anna da; GIRARDI, Maria Fernanda Gugelmin. A responsabilidade civil por abandono afetivo dos
filhos no direito brasileiro. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 630-653, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
2236-5044
Logo, este princípio, como elucida Maria Helena Diniz35, “permite o integral
desenvolvimento da personalidade do menor e é diretriz solucionadora das questões
conflitivas advindas da separação judicial ou divórcio dos genitores”.
Em outras palavras, o princípio do melhor interesse da criança e do
adolescente visa, exclusivamente, garantir o cumprimento dos direitos do menor,
seja através dos pais, familiares, pela sociedade ou pelo Estado, assegurando-lhe o
seu desenvolvimento pleno e sadio.
2 O AFETO COMO DEVER FAMILIAR
O afeto, como visto anteriormente ao abordar o princípio da afetividade, é
hoje o gerador das entidades familiares, afastando-se inteiramente a ideia da família
patriarcal. Maria Berenice Dias36 aclara que, “a família e o casamento adquiriram
novo perfil, voltados muito mais a realizar os interesses afetivos e existenciais de
seus integrantes”.
Cumpre observar que o afeto não se confunde necessariamente com o
amor, como pontua Flávio Tartuce37, “afeto quer dizer inteiração ou ligação entre
pessoas, podendo ter carga positiva ou negativa. O afeto positivo é o amor; o
negativo é o ódio. Obviamente, ambas as cargas estão presentes nas relações
familiares”.
Nessa direção, Ana Surany Martins Costa38 conceitua a afetividade como o
“conjunto de fenômenos psíquicos que se manifestam sob a forma de emoções,
sentimentos e paixões, acompanhados sempre da impressão de dor ou prazer, de
satisfação ou insatisfação, de agrado ou desagrado, de alegria ou tristeza”.
Pois bem, o afeto nada mais é do que a afeição de uma pessoa em relação
à outra, suscitando os mais variados sentimentos e emoções.
35
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p.37-38.
36
DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p. 74.
37
TARTUCE, Flávio. O princípio da afetividade no direito de família. Disponível em:
<http://www.ibdfam.org.br/artigos/detalhe/859>. Acesso em 08 de maio de 2013.
38
COSTA, Ana Surany Martins. Filiação socioafetiva: uma nova dimensão afetiva das relações
parentais. Disponível em : <http://www.ibdfam.org.br/artigos/detalhe/381>. Acesso em 08 de maio
de 2013.
638
SILVA, Letícia Anna da; GIRARDI, Maria Fernanda Gugelmin. A responsabilidade civil por abandono afetivo dos
filhos no direito brasileiro. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 630-653, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
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Muito embora a Constituição Federal de 1988 tenha enlaçado o afeto na
esfera da sua proteção, a terminologia afeto não se encontra no texto
constitucional.39 Os laços afetivos são vislumbrados, portanto, como dever jurídico
dos pais através do direito a dignidade humana e da convivência familiar como
prioridade absoluta da criança e do adolescente.
Deste modo, o afeto é um dever jurídico dos pais, previsto implicitamente no
artigo 227 da Constituição Federal de 198840, o qual impõe aos pais, a sociedade e
o Estado, proteger o menor em desenvolvimento, com total primazia, cabendo a este
o direito à dignidade e à convivência familiar.
Posto isto, compreende-se que o foco da família atual é o afeto. Além dos
recursos materiais, a criança e o adolescente carecem de muito apreço e amor, para
sua criação e educação. A falta de afetividade nas relações familiares suscita
consequências irreversíveis na formação do caráter do menor, por isso a
necessidade de atribuir aos genitores o dever de ter seus filhos em sua companhia,
dando-os o carinho adequado.
3 DO PODER FAMILIAR
Com as constantes transformações das estruturas familiares, por óbvio,
houve-se a necessidade de adaptar o conceito de poder familiar à nova realidade.
No entanto, nenhuma legislação atual, como também a Constituição Federal de
1988 e o Código Civil Brasileiro, definiram expressamente o significado de tal
instituto.
Atualmente, segundo Maria Helena Diniz41, o poder familiar pode ser
concebido como um conjunto de direitos e deveres, quanto à pessoa e bens do filho
menor ainda dependente, desempenhado por ambos os pais de forma igualitária,
com a finalidade de desempenhar as incumbências que a norma jurídica lhes impõe,
sempre ponderando o interesse e a proteção dos filhos.
39
DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p. 72.
40
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Promulgada em 05 de Outubro de 1988.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em 02
de maio de 2013.
41
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p.588.
639
SILVA, Letícia Anna da; GIRARDI, Maria Fernanda Gugelmin. A responsabilidade civil por abandono afetivo dos
filhos no direito brasileiro. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 630-653, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
2236-5044
Carlos Roberto Gonçalves42, por sua vez, apresenta um conceito mais
sintético “poder familiar é o conjunto de direitos e deveres atribuídos aos pais, no
tocante à pessoa e aos bens dos filhos menores”.
Quanto às obrigações dos pais à pessoa dos filhos,
o Código Civil
Brasileiro, no seu artigo 1.63443, elenca sete hipóteses:
I - dirigir-lhes a criação e educação; II - tê-los em sua companhia e
guarda; III - conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para
casarem; IV - nomear-lhes tutor; V - representá-los, até aos
dezesseis anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após essa idade,
nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento; VI reclamá-los de quem ilegalmente os detenha; e VII - exigir
obediência, respeito e serviços próprios de sua idade e condição.
A Constituição Federal de 1988 também impõe no seu art. 22944, o dever
dos progenitores em assistir, criar e educar os filhos menores, e em compensação,
os filhos maiores ficam com a obrigação de apoiar os pais na velhice, carência e
doença. O Estatuto da Criança e do Adolescente não fica distante desse ditame,
determinando no art. 2245 que “aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e
educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes a obrigação
de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais”.
Quanto às atribuições antevistas no Código Civil, citadas anteriormente, é
relevante para o objetivo deste trabalho, tratar dos dois primeiros incisos, quais
sejam, o dever de dirigir a criação e educação dos filhos menores e tê-los em sua
companhia e guarda.
Caio Mário da Silva Pereira46, acredita que a orientação da criação e
educação, está ligada com o fato de escolher ensino adequado para o filho
42
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. 6. ed. rev. e atual. São
Paulo: Saraiva, 2009. v.6. p.372.
43
BRASIL. Código Civil Brasileiro. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm >. Acesso em 02 de maio de 2013.
44
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em 04 de maio de
2013.
45
BRASIL. Lei Federal nº 8069, de 13 de julho de 1990. Estatuto da Criança e do Adolescente.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8069.htm>. Acesso em 02 de maio de
2013.
46
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil: direito de família. 16. ed. Rio de
Janeiro: Forense, 2006. v.5. p.426.
640
SILVA, Letícia Anna da; GIRARDI, Maria Fernanda Gugelmin. A responsabilidade civil por abandono afetivo dos
filhos no direito brasileiro. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 630-653, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
2236-5044
frequentar, transmitindo a direção espiritual que lhe achar conveniente e nortear a
profissão que deverá seguir.
Conforme elucida Maria Helena Diniz47, dirigir-lhes a criação e educação
“provendo-os de meios materiais para a sua subsistência e instrução de acordo com
seus recursos e sua posição social, preparando-os para a vida, tornando-os úteis à
sociedade, assegurando-lhes todos os direitos inerentes à pessoa humana”.
Com a mesma importância, deverá ser atendido o dever dos pais terem seus
filhos em sua companhia e guarda, pois somente com a convivência ficará possível
proporcionar o ideal desenvolvimento do menor. Segundo Maria Helena Diniz48, o
direito de guarda abrange o de vigilância, pois os pais são civilmente responsáveis
pelos atos dos filhos que se encontram sob seus cuidados.
Destarte, qualquer descumprimento ou abuso de tais deveres, poderá
acarretar a suspensão, perda ou extinção do poder familiar. Hilma da Silva Costa
Venez49 nota ainda que, “os genitores que no decorrer do tempo dedica ao filho
apenas à prestação de assistência material, limitando-se ao pagamento de pensão
alimentícia, podem incorrer na prática do abandono afetivo”. Abandono este, que é
ato flagrante de descumprimento do princípio da convivência familiar e da
afetividade.
4 DO ABANDONO AFETIVO
Averiguou-se nos itens anteriores que é dever dos pais participar ativamente
na criação e educação dos seus filhos, ou seja, de acordo com a legislação pátria
não basta apenas o pagamento de pensão alimentícia, é direito do filho a
convivência familiar.
Maria Berenice Dias50 aponta que “a falta de convívio dos pais com os filhos,
em face do rompimento do elo de afetividade pode gerar severas sequelas
47
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p.519.
48
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p.608.
49
VENEZ, Hilma da Silva Costa. Possibilidade de indenização em face do abandono afetivo.
Disponível
em
<http://jus.com.br/revista/texto/23326/possibilidade-de-indenizacao-em-face-doabandono-afetivo>. Acesso em 04 de maio de 2013.
50
DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p. 470.
641
SILVA, Letícia Anna da; GIRARDI, Maria Fernanda Gugelmin. A responsabilidade civil por abandono afetivo dos
filhos no direito brasileiro. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 630-653, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
2236-5044
psicológicas e comprometer seu desenvolvimento saudável”. Esta ausência de
convivência é hoje denominada de abandono afetivo.
Para Rodrigo de Cunha Pereira51, o abandono afetivo deve ser entendido
como “uma lesão extrapatrimonial a um interesse jurídico tutelado, causada por
omissão do pai ou da mãe, no cumprimento do exercício do poder familiar, o que
configura um ilícito, sendo, portanto, fato gerador de obrigação indenizatória”.
Luciane Dias de Oliveira52 leciona que o abandono afetivo é “oriundo de uma
negligência paternal e acaba por gerar uma violência moral e sentimental, ferindo as
garantias e individuais das crianças de serem acolhidas num seio familiar e
amparadas em suas diversas necessidades”.
Dentro
desse contexto
o
abandono
afetivo
enquadra-se
como
o
descumprimento das responsabilidades concernentes aos pais, essencialmente no
que diz respeito ao encargo em amparar o menor, provocando assim, o afastamento
da convivência familiar.
4.1 O abandono afetivo na legislação brasileira
Embora muitos doutrinadores e magistrados venham acolhendo a figura do
abandono afetivo pelo descumprimento dos pais dos seus deveres jurídicos, até o
presente momento, tal instituto não se encontra regulamentado expressamente na
legislação brasileira.
A caracterização do abandono afetivo como conduta ilícita foi proposta em
Projeto de Lei do Senado Federal n° 700 de 2007, pelo Senador Marcelo Crivella,
cuja ementa modifica os artigos 4°, 5°, 22, 24, 56, 58, 129 e 130; e acrescenta o
artigo 232-A53 ao Estatuto da Criança e do Adolescente antevendo pena de
detenção de um a seis meses para “quem deixar, sem justa causa, de prestar
51
PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Responsabilidade civil por abandono afetivo. apud. DIAS, Maria
Berenice. Manual de direito das famílias. p. 472.
52
OLIVEIRA, Luciane Dias de. Indenização civil por abandono afetivo de menor perante a lei
brasileira. Disponível em: <http://ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_juridica>.
Acesso em 04 de maio de 2013.
53
BRASIL.
Senado
Federal.
Projeto
de
Lei
nº
700/2007.
Disponível
em:
<http://www.senado.gov.br/atividade/materia/detalhes.asp?p_cod_mate=83516>. Acesso em 02 de
maio de 2013.
642
SILVA, Letícia Anna da; GIRARDI, Maria Fernanda Gugelmin. A responsabilidade civil por abandono afetivo dos
filhos no direito brasileiro. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 630-653, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
2236-5044
assistência moral ao filho menor de 18 anos, prejudicando-lhe o desenvolvimento
psicológico e social”.
Como justificativa do projeto, o autor54 ressalta:
Ninguém está em condições de duvidar que o abandono moral por
parte dos pais produz sérias e indeléveis consequências sobre a
formação psicológica e social dos filhos. Amor e afeto não se
impõem por lei! Nossa iniciativa não tem essa pretensão. Queremos,
tão-somente, esclarecer de uma vez por todas, que os pais têm o
DEVER de acompanhar a formação dos filhos, orientá-los nos
momentos mais importantes, prestar-lhes solidariedade e apoio nas
situações de sofrimento e, na medida do possível, fazerem-se
presentes quando o menor reclama espontaneamente a sua
companhia.
Assim, o abandono afetivo, se aprovado o Projeto de Lei, passará a ser
caracterizado como ato ilegal, podendo estabelecer reparação de danos ao pai ou a
mãe que descumpriu a proteção da dignidade e da convivência familiar dos seus
filhos.
Por outro lado, o abandono material já se encontra previsto no Código Civil
Brasileiro como hipótese de perda do poder familiar, nos termos do artigo 1638, II55:
“perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou a mãe que: deixar o filho em
abandono”. Porém, como bem destaca Claudete Carvalho Canezin56 o abandono
afetivo é pior que o abandono material. As carências financeiras podem ser sanadas
por familiares, amigos e até pelo Estado, no entanto o afeto negado pelo pai ao seu
filho não pode ser provido por ninguém.
5 DO DANO MORAL
54
BRASIL.
Senado
Federal.
Projeto
de
Lei
nº
700/2007.
Disponível
em:
<http://www.senado.gov.br/atividade/materia/detalhes.asp?p_cod_mate=83516>. Acesso em 02 de
maio de 2013.
55
BRASIL. Código Civil Brasileiro. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm >. Acesso em 04 de maio de 2013.
56
CANEZIN, Claudete de Carvalho. Da reparação do dano existencial ao filho decorrente do
abandono paterno-filial. apud. MACHADO. Gabriela Soares Linhares. Análise doutrinária e
jurisprudencial acerca do abandono afetivo na filiação e sua reparação. Disponível em:
<http://www.ibdfam.org.br/artigos/detalhe/861>. Acesso em 04 de maio de 2013.
643
SILVA, Letícia Anna da; GIRARDI, Maria Fernanda Gugelmin. A responsabilidade civil por abandono afetivo dos
filhos no direito brasileiro. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 630-653, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
2236-5044
Em um sentido mais amplo, Guilherme Couto de Castro57 esclarece que
“qualquer dano, não atingindo o patrimônio, é moral. A expressão seria, assim,
sinônima de dano não patrimonial”. Contudo, as vezes, a referência ao dano moral
toma sentido mais estrito, designando a afronta a bem jurídico integrante da
personalidade do ofendido, que tem a sua dignidade atacada.58
Nessa perspectiva, Pablo Stolze Gagliano59 preceitua dano moral como
“prejuízo ou lesão de direitos, cujo conteúdo não é pecuniário, nem comercialmente
redutível a dinheiro, como é o caso dos direitos da personalidade, a saber, o direito ä
vida, ä integridade física, psíquica e moral”.
Para Sergio Cavalieri Filho60, dano moral é “a violação do direito à dignidade
[...] qualquer agressão à dignidade pessoal lesiona a honra, constitui dano moral e é
por isso indenizável”.
Vale ressaltar, que a plena reparação do dano moral só se deu com a
chegada da Constituição Federal de 1988, que dispôs no seu artigo 5°61:
V- É assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além
da indenização por dano material, moral ou à imagem; [...] X- São
invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das
pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou
moral decorrente de sua violação.
Deste modo, é assegurado constitucionalmente o direito ao lesado à
reparação do dano, ainda que de ordem moral.
5.1 O dano moral decorrente do abandono afetivo
Atribui-se a Maria Berenice Dias62 a seguinte lição: “O conceito atual de
família, centrada no afeto como elemento agregador, exige dos pais o dever de criar
57
CASTRO, Guilherme de Couto. Direito Civil: Lições. 2. ed.Rio de Janeiro: Impetus, 2008. p.160.
58
CASTRO, Guilherme de Couto. Direito Civil: Lições. p.160.
59
GAGLIANO, Pablo Stolze. FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo curso de direito civil:
responsabilidade civil. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 44.
60
FILHO, Sergio Cavalieri. Programa de responsabilidade civil. 9. ed. São Paulo: Attlas, 2010. p.
82.
61
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Promulgada em 05 de Outubro de 1988.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em 02
de maio de 2013.
62
DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p. 74.
644
SILVA, Letícia Anna da; GIRARDI, Maria Fernanda Gugelmin. A responsabilidade civil por abandono afetivo dos
filhos no direito brasileiro. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 630-653, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
2236-5044
e educar os filhos sem lhes omitir o carinho necessário para a formação plena de
sua personalidade”.
Logo, é sabido que a convivência familiar é dever dos pais. A partir do
momento em que um dos pais se omite em prestar afeição e cuidado para com o
desenvolvimento do seu filho, pode surgir, então, o dano moral. Porém não existe
concordância acerca da medida repressiva a ser aplicada por este dano moral, há os
juristas que defendem a reparação civil e outros que não, com o argumento de que
nenhuma pessoa pode ser obrigada a amar.
Para Sergio Cavalieri Filho63, mesmo nas relações familiares é possível
ocorrer situações que ensejam indenização por dano moral:
Pais e filhos, marido e mulher na constância do casamento, não
perdem o direito à intimidade, à privacidade, à autoestima, e outros
valores que integram a dignidade. Pelo contrário, a vida em comum,
reforçada por relações intimas, cria o que tem sido chamado de
moral conjugal ou honra familiar, que se materializa nos deveres da
sinceridade, de tolerância, de velar pela própria honra do outro
cônjuge e da família.
O Poder Judiciário vem se manifestando também a respeito do dano moral
decorrente do abandono afetivo. Em uma decisão inédita, o Superior Tribunal de
Justiça, no ano de 2012, pela primeira vez, reconheceu que a falta de afeto acarreta
dano cabível de reparação, obrigando o pai a indenizar a filha em duzentos mil reais
por abandono afetivo.
No seu voto, a relatora ministra Nancy Andrighi64 destacou que:
Não existem restrições legais à aplicação das regras relativas à
responsabilidade civil e o consequente dever de indenizar/compensar
no Direito de Família. [...] Aqui não se fala ou discute o amor, e sim, a
imposição biológica e legal de cuidar, que é dever jurídico, corolário
da liberdade das pessoas que gerarem ou adotarem filhos. [...] Em
suma, amar é faculdade, cuidar é dever.
Portanto, o abandono afetivo segundo decisões do Poder Judiciário, já vem
sendo configurado como dano moral, ou seja, os pais que descumprem o dever de
cuidar dos filhos, deixando de prestar os mínimos cuidados e, especialmente, não
63
FILHO, Sergio Cavalieri. Programa de responsabilidade civil. p. 83-84.
64
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1.159.242- SP. Disponível em:
<https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/ita.asp?registro=200901937019&dt_publicacao=10/05/2012>
. Acesso em 10 de maio de 2013.
645
SILVA, Letícia Anna da; GIRARDI, Maria Fernanda Gugelmin. A responsabilidade civil por abandono afetivo dos
filhos no direito brasileiro. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 630-653, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
2236-5044
expressando afeição, já estão sendo civilmente responsabilizados, por estarem
cometendo lesão ao menor.
6 DA RESPONSABILIDADE CIVIL
Conceitua-se responsabilidade civil, segundo Arnoldo Wald65 como “um
mecanismo de resposta ou reação a uma violação de lei ou do contrato, à
determinada falha ou desvio de conduta humana ou uma consequência por uma
lesão perpetrada”.
Nos ensinamentos de Maria Helena Diniz66, a responsabilidade civil é:
A aplicação de medidas que obriguem alguém a reparar dano moral
ou patrimonial causado a terceiros em razão de ato do próprio
imputado, de pessoa por quem ele responde, ou de fato de coisa ou
animal sob sua guarda ou, ainda, de simples imposição legal.
Definição esta que guarda, em sua estrutura, a ideia de culpa quando
se cogita da existência do ilícito (responsabilidade subjetiva), e a do
risco, ou seja, da responsabilidade sem culpa (responsabilidade
objetiva).
Sergio
Cavalieri
Filho67,
por
sua
vez,
apresenta
em
síntese,
a
responsabilidade civil como “um dever jurídico sucessivo que surge para recompor o
dano decorrente da violação de um dever jurídico originário”.
Deste modo, toda atividade que origina um dano gera responsabilidade de
indenizar.68 Esta obrigação de indenizar encontra-se fundamento no artigo 927 do
Código Civil Brasileiro69, que dispõe “aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187),
causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”.
65
WALD, Arnoldo; GIANCOLI, Bruno Pandori. Direito civil: responsabilidade civil. São Paulo:
Saraiva, 2011. v. 7. p. 28.
66
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 25. ed. São Paulo:
Saraiva, 2011. v. 7. p. 50.
67
FILHO. Sergio Cavalieri. Programa de responsabilidade civil. p. 02.
68
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: responsabilidade civil. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2007. v. 4.
p. 01.
69
BRASIL. Código Civil Brasileiro. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm >. Acesso em 07 de maio de 2013
646
SILVA, Letícia Anna da; GIRARDI, Maria Fernanda Gugelmin. A responsabilidade civil por abandono afetivo dos
filhos no direito brasileiro. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 630-653, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
2236-5044
Entende-se que o ato ilícito, com base no artigo 186 do Código Civil
Brasileiro70 é cometido por “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência
ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, exclusivamente moral”.
Logo, a análise do artigo supracitado confirma que três são os pressupostos
essenciais da responsabilidade civil: a) conduta culposa do agente; b) nexo causal; e
c) dano.71
Referente à conduta, Guilherme Couto de Castro72 conceitua:
Ação ou a omissão humana, geradora do dano. Sempre que o dever
de ressarcir pressuponha a conduta culposa, afirma-se que a
responsabilidade é subjetiva. Já a responsabilidade objetiva é a que
ocorre independentemente de culpa; ela não é pressuposto para o
ônus de indenizar.
Quanto ao nexo de causalidade entre o dano e a ação, este também é
elemento essencial, pois segundo Maria Helena Diniz73 “a responsabilidade civil não
poderá existir sem o vínculo entre ação e o dano. Se o lesado experimentar um
dano, mas este não resultou da conduta do réu, o pedido de indenização será
improcedente”. Por último, abrange-se também a figura do dano, uma vez que sem a
confirmação do prejuízo, ninguém poderá ser responsabilizado civilmente.74
Percebe-se, portanto, que no momento que alguém, por conduta culposa,
viola direito alheio, ocasionando prejuízos aparentes, está diante de um ato ilícito
passível de reparação.
6.1 Responsabilidade civil em razão ao abandono afetivo do menor
A discussão acerca da possibilidade ou não da reparação do dano moral
causado ao filho menor, mediante o abandono afetivo, talvez tenha sido um dos
assuntos mais comentados e mais debatidos no âmbito do direito de família
atualmente.
70
BRASIL. Código Civil Brasileiro. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm >. Acesso em 07 de maio de 2013.
71
FILHO, Sergio Cavalieri. Programa de responsabilidade civil. p. 18.
72
CASTRO, Guilherme de Couto. Direito Civil: Lições.p.149.
73
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. p. 54.
74
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 6. ed. São Paulo:
Saraiva, 2011. p. 54.
647
SILVA, Letícia Anna da; GIRARDI, Maria Fernanda Gugelmin. A responsabilidade civil por abandono afetivo dos
filhos no direito brasileiro. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 630-653, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
2236-5044
A indenização por abandono afetivo não está prevista na legislação, porém o
Projeto de Lei nº 4.294/200875 do Deputado Carlos Bezerra, almeja mudar esta
realidade. Tal projeto pretende obrigar os pais a indenizar os filhos menores que não
receberam afeto e a convivência necessária para o seu desenvolvimento,
acarretando lesões e sofrimentos irreversíveis.
O artigo 1.632 do Código Civil Brasileiro76, se aprovado o Projeto de Lei nº
4.294/2008, passa então a vigorar acrescido do seguinte parágrafo único:
Art. 1632. A separação judicial, o divórcio e a dissolução de união
estável não alteram as relações entre pais e filhos senão quanto ao
direito, que aos primeiros cabe, de terem em sua companhia os
segundos. Parágrafo único: O abandono afetivo sujeita os pais ao
pagamento de indenização por dano moral.
Como justificativa do Projeto de Lei, o autor adverte que:
Entre as obrigações existentes entre pais e filhos, não há apenas a
prestação de auxílio material. Encontra-se também a necessidade de
auxílio moral, consistente na prestação de apoio, afeto e atenção
mínimas indispensáveis ao adequado desenvolvimento da
personalidade dos filhos [...] o trauma decorrente do abandono
afetivo parental implica marcas profundas no comportamento da
criança. A espera de alguém que nunca telefona – sequer nas datas
mais importantes – o sentimento de rejeição e a revolta causada pela
indiferença alheia provocam prejuízos profundos em sua
personalidade.77
Pois bem, a Comissão de Seguridade e Família já aprovou o texto, no dia 13
de abril de 2011, nos termos do parecer da relatora, deputada Jô Moraes que
destacou que “para gerar o dever de indenizar, deve-se proceder ao reconhecimento
a existência de um dano, à apuração de sua extensão, à determinação de sua
repercussão e à aferição do grau de culpa do agente, da vítima e de terceiros”.78
75
BRASIL.
Câmara
dos
Deputados.
Projeto
de
Lei
nº
4.294/2008.
<http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=415684>. Acesso em
09 de maio de 2013.
76
BRASIL. Código Civil Brasileiro. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm>. Acesso em 09 de maio de 2013.
77
BRASIL.
Câmara
dos
Deputados.
Projeto
de
Lei
nº
4.294/2008.
<http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=415684>. Acesso em
09 de maio de 2013.
78
BRASIL.
Câmara
dos
Deputados.
Projeto
de
Lei
nº
4.294/2008.
<http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=415684>. Acesso em
09 de maio de 2013.
648
SILVA, Letícia Anna da; GIRARDI, Maria Fernanda Gugelmin. A responsabilidade civil por abandono afetivo dos
filhos no direito brasileiro. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 630-653, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
2236-5044
Presentemente, o projeto aguarda votação na Comissão de Constituição e
Justiça da Câmara, cujo relator, o deputado Antônio Bulhões mostra-se também
favorável e espera pela aprovação, segundo ele:
Ocorrem casos em que o abandono ultrapassa os limites do
desinteresse e, efetivamente, causa lesões no direito da
personalidade do filho, com atos de humilhações e discriminações.
Nesses casos, estaria configurado o abandono afetivo gerador do
direito à indenização moral.79
Nessa direção, Maria Berenice Dias80 também leciona que provado que a
falta de convívio pode ocasionar danos, a ponto de danificar o desenvolvimento
integral do filho, a omissão do pai origina dano suscetível de ser reparado. Não se
trata de atribuir um valor ao amor, mas conhecer que o afeto é um bem que tem
importância.
Ainda, manifestando um parecer favorável, Priscila Araújo de Almeida 81
acredita que o dano moral, neste caso ocasionado pelo abandono afetivo, não pode
ficar sem indenização, pois vai contra todos os preceitos da justiça e toda pessoa
que cause um prejuízo tem a obrigação de repará-lo. Ademais, observa que:
A responsabilidade civil por abandono afetivo na filiação
desempenha o papel de punição, objetivando educar os pais ou um
deles pelo péssimo exercício do poder familiar. Essa condenação
pecuniária não tem como fundamento a recuperação do dano,
mesmo porque não tem como reparar a dor psicológica suportada
pelo filho, mas serve como medida educativa para o pai não cometer
mais tal conduta.
Assim sendo, a responsabilidade civil decorrente do abandono afetivo, se
regulamentada por lei, diminuirá os detrimentos que a falta de afeto ocasionou à
vítima. É notório que dinheiro nenhum paga o sofrimento do filho que teve um dos
seus genitores ausentes durante o seu crescimento, todavia, esta punição previne
que novos abandonos ocorram, tornando os pais mais presentes na vida de um filho,
que merece todo afeto e cuidado.
79
Direito de Família na mídia. Congresso discute punição por abandono afetivo. Disponível em:
<http://www.ibdfam.org.br/imprensa/direito-de-familia-na-midia/detalhe/5918>. Acesso em 09 de
maio de 2013.
80
DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p. 470.
81
ALMEIDA. Priscila Araújo de. Responsabilidade civil por abandono afetivo. Disponível em:
<http://www.ibdfam.org.br/artigos/detalhe/829>. Acesso em 09 de maio de 2013.
649
SILVA, Letícia Anna da; GIRARDI, Maria Fernanda Gugelmin. A responsabilidade civil por abandono afetivo dos
filhos no direito brasileiro. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 630-653, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
2236-5044
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir do presente estudo, observou-se que é assegurado na legislação
pátria à toda criança e adolescente, o direito à convivência familiar e à dignidade,
dirigindo-lhes a educação, o amparo e sobretudo o afeto, que é elemento norteador
para a formação familiar nos dias atuais.
O dever de assistência dos pais para com os filhos, portanto, não se resume
a recursos materiais, como por exemplo, o pagamento da pensão alimentícia. Fazse obrigatório também o convívio e a demonstração de sentimentos para o
amadurecimento eficaz do menor, que se encontra em estágio vulnerável.
Contudo, nem sempre os pais desempenham esse papel afetivo. Muitos
violam os direitos fundamentais do filho menor, prejudicando-o no que tange à
formação da sua personalidade, podendo então, caracterizar o abandono afetivo.
Logo, o abandono afetivo tem sido entendido como o descumprimento dos
encargos atinentes aos pais pelo poder familiar, podendo acarretar lesões
irreversíveis, como por exemplo, o distanciamento entre pais e filhos. Assim, esta
ausência de afeto dos genitores em relação aos seus filhos enseja dano moral e, por
conseguinte, o direito a indenização mediante reparação civil.
Muito embora as responsabilizações civis por abandono afetivo sejam
matérias recentes e ainda estejam em tramitação para virarem lei, inexistindo um
número pertinente de doutrinas, é possível identificar através das jurisprudências,
que alguns magistrados já estão se manifestando favoráveis às reparações
pecuniárias, quando há comprovação do dano moral ao menor.
Por outro lado, há aqueles que acreditam que a questão do abandono
afetivo deve ser resolvida com a destituição do poder familiar, sem qualquer
reparação. Para eles, não se pode obrigar os pais a amar os filhos, assim como não
se pode quantificar o afeto.
Mesmo diante dessa divergência, averiguou-se através da presente
pesquisa, a existência da possibilidade da responsabilização civil dos pais
decorrente ao abandono afetivo. Trata-se de uma indenização pela omissão e
negligência dos pais no que diz respeito aos seus deveres jurídicos.
É evidente que a falta de afeto nunca será suprida e a indenização não
diminuirá a dor sofrida pelo filho, em razão da indiferença de seu genitor. Entretanto,
a reparação civil em razão do abandono afetivo servirá como forma de
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SILVA, Letícia Anna da; GIRARDI, Maria Fernanda Gugelmin. A responsabilidade civil por abandono afetivo dos
filhos no direito brasileiro. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
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responsabilizar os pais e conscientizar os mesmos da importância de se fazerem
mais presentes na vida dos filhos.
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