Titulo: As Forças Armadas Revolucionárias Da Colômbia (FARC) e Sua Atuação no Cenário Internacional Autor: Kalki Zumbo Coronel Guevara Publicado em: Revista Eletrônica de Direito Internacional, vol. 6, 2010, pp. Disponível em: http://www.cedin.com.br/revistaeletronica/volume6/ ISSN 1981-9439 Com o objetivo de consolidar o debate acerca das questões relativas ao Direito e as Relações Internacionais, o Centro de Direito Internacional – CEDIN - publica semestralmente a Revista Eletrônica de Direito Internacional, que conta com artigos selecionados de pesquisadores de todo o Brasil. O conteúdo dos artigos é de responsabilidade exclusiva do(s) autor (es), que cederam ao CEDIN os respectivos direitos de reprodução e/ou publicação. Não é permitida a utilização desse conteúdo para fins comerciais e/ou profissionais. Para comprar ou obter autorização de uso desse conteúdo, entre em contato, [email protected] 212 AS FORÇAS ARMADAS REVOLUCIONÁRIAS DA COLÔMBIA (FARC) E SUA ATUAÇÃO NO CENÁRIO INTERNACIONAL Kalki Zumbo Coronel Guevara* RESUMO O presente trabalho estará voltado para a o entendimento de como as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC) atuam e vêem se comportando no cenário internacional. Para tanto será analisado o processo histórico atrelada a tal entidade, além de peculiaridades presentes em cada época de sua formação. Tendo como objetivo compreender como tal organização veio se desenvolvendo e quais suas implicações para a área das Relações Internacionais e o Direito Internacional, se farão uso dos conceitos presentes nos atores e sujeitos presentes da arena internacional, bem como o que vem se entender como sendo o fenômeno terrorista. Por fim, se procurará abarcar as diversas definições atreladas ao objeto de estudo em questão, para posteriormente ter-se uma noção de como é qualificado no ambiente internacional. Palavras-chave: Forças Armadas Revolucionarias da Colômbia (FARC), Organizações Internacionais, Movimentos de Libertação Nacional (MLN) e fenômeno terrorista. RESUMEN El presente trabajo estará destinado a la comprensión de como las Fuerzas Armadas Revolucionarias de Colombia (FARC) atuan y vienen comportándose en el escenario internacional. Para tanto será analizado el proceso histórico atrelada a tal entidad, además de peculiaridades presentes en cada época de su formación. Teniendo cómo objetivo comprender como tal organización vino desarrollándose y cuáles sus implicações para la área de las Relaciones Internacionales y el Derecho Internacional, se harán uso de los conceptos presentes en los actores presentes en la arena internacional, así como lo que viene a entenderse cómo siendo el fenómeno terorista. Finlmente, se buscará abarcar las diversas definiciones atreladas al objeto de estudio en cuestión, para posteriormente tenerse una noción de cómo es calificado en el ambiente internacional. Palabras-llave: Fuerzas Armadas Revolucionarias de Colombia (FARC), Organizaciones Internacionales, Movimientos de Liberación Nacional (MLN) y fenómeno terorista. ___________________________ * Bacharel em Relações Internacionais pelo Centro Universitário de Belo Horizonte (UNI-BH); pósgraduado em Direito Internacional pelas Faculdades Milton Campos/CEDIN; e membro do Grupo de Pesquisa do Centro de Direito Internacional (CEDIN). 213 1 INTRODUÇÃO Levando-se em consideração a presença das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC) no território do continente sul americano, e a insurgência dos acontecimentos ocorridos no decorrer dos últimos anos, tais como a morte de importantes membros – como Raúl Reyes, um de seus líderes; além da libertação de alguns de seus reféns civis, mantidos sobre seu domínio na selva amazônica1, percebese a relevância do estudo deste tema para a área das Relações Internacionais, partindo-se com isso, para uma análise mais detalhada acerca dos aspectos que envolvem sua conjuntura. Para tanto, o propósito do presente trabalho será de apresentar o processo que veio propiciar o surgimento das FARC no transcurso de sua história, destacando-se seus principais ideais e princípios constitutivos, para que se possa compreender, de maneira mais clara e condizente, do que se trata este movimento 2. Posteriormente, haja vista o seu envolvimento no plano internacional, se trará à tona uma discussão teórica, que terá o intuito de apresentar como o campo de estudos do Direito Internacional e das Relações Internacionais analisam o ator em questão, ou seja, a maneira pela qual estas duas áreas o interpretam. Outro aspecto a ser analisado será o de interpretar, em termos conceituais, o que se entende por Movimento de Libertação Nacional (MLN) e fenômeno terrorista, para que, em um segundo momento, possa-se relacionar-los com o estudo aqui abordado. Esta inter-relação se dará com o intuito de procurar compreender se as FARC possuem uma relação com estes dois conceitos e, em caso afirmativo, em quais circunstâncias. Assim sendo, com o propósito de auxiliar na elaboração do trabalho, este se fragmentará em três capítulos distintos, porém complementares entre si. O primeiro terá o objetivo de apresentar os atores ou sujeitos de maior relevância no cenário internacional e, conseqüentemente, para a compreensão das dinâmicas presentes nas próprias FARC. Para tanto serão abordados as características principais presentes nos Estado, nas Organizações Internacionais, nos indivíduos e nos Movimentos de Libertação Nacional. Ainda, juntamente com a análise dos referidos atores, serão abarcados os papeis desempenhados por estes e quais as suas participações na formação do sistema internacional que compõem. 1 Como exemplos, podem ser citadas as libertações ocorridas entre os anos de 2008 e 2009 da Francocolombiana Ingrid Betancourt, além de Claras Rajas, Consuelo Gonzáles e outros. 2 Movimento aqui entendido como grupos de indivíduos que se reúnem em torno de causas em comum. 214 Por sua vez, o segundo capítulo terá como objetivo apresentar o que vêem a ser as FARC propriamente ditas, referindo-se à suas características constitutivas e históricas, introduzindo assim o tema proposto neste trabalho. Para tanto será traçada uma linha cronológica temporal que terá a função de demarcar os principais acontecimentos ao longo dos anos, presentes no decorrer de seu processo de formação, chegando até nos tempos atuais. Em seguida, será interpretado o que vem a ser um fenômeno terrorista, levando-se em consideração suas características marcantes e sua dificuldade em defini-lo. Por fim, o terceiro e último capítulo se dedicará em relacionar as próprias FARC à noção do que se entende e o que se definiu como sendo um Movimento de Libertação Nacional, juntamente com o que vem a ser o fenômeno terrorista, criando o campo propício para se relacionarem as informações que serão apresentadas no desenvolver desse artigo. Esta última seção terá a função de pontuar, a partir de um embate entre teoria e conceitos, como se classificam as FARC perante o sistema internacional, em função de suas ações e atuações no âmbito das relações internacionais. 2 SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL3 Entende-se por sujeitos 4 do direito internacional aqueles agentes ou instituições que compõem e integram o sistema internacional 5 em seus diversos aspectos, sendo estes, econômicos, políticos ou sociais (PELLET, A. 2005). Para tanto, essa seção se destinará a apresentar os principais sujeitos do direito internacional, abordando suas peculiaridades e características compositivas, bem como suas competências e poder de agência no meio em que se encontram inserido. Nesse sentido se começará explanando sobre a figura do Estado, este que se tornou um dos sujeitos mais preponderantes na área internacional desde que adquiriu papéis específicos ao longo da história; também se abordará o que são as Organizações Internacionais, instituições estas de suma importância no desenvolvimento das relações internacionais; posteriormente analisar-se-á como o indivíduo passou a ser interpretado 3 Entende-se como Sujeitos de Direito Internacional aquelas entidades que possuem capacidade para apresentar reclamações sobre violações de DI; capacidades para celebrar tratados e acordos válidos no âmbito internacional; e gozos de privilégios e imunidades concedidos por jurisdições internacionais 4 Destaca-se aqui a existência de expressões distintas por parte do campo de estudos do Direito Internacional e das Relações Internacionais, utilizadas para designar o mesmo objeto, sendo este classificado como “sujeito” para o DI e “ator” para as RI (PELLET, A. 2005). 5 O sistema internacional diz respeito ao ambiente no qual interagem os sujeitos ou atores internacionais. 215 pelo Direito Internacional, juntamente com sua influência e participação ao longo do tempo; por fim, se desenvolverá um estudo acerca do que vem a ser um Movimento de Libertação Nacional e suas prerrogativas. 2.1 O Estado Considerado por muitos historiadores como o principal sujeito do direito internacional, o Estado veio adquirindo forma e personalidade jurídica peculiar no transcurso das relações internacionais. O Estado é uma instituição que veio se desenvolvendo desde os primórdios das civilizações e ao longo dos séculos, por meio do qual foi sendo estruturando e assumindo características próprias, tais como população, território e governo. A análise da instituição estatal também pode ser estudada em concomitância ao desenvolvimento da sociedade, devido ao fato de ter sido moldado de acordo com suas necessidades em cada período histórico (WEBER, M. 1999). Nesse sentido, é possível interpretá-lo e estudá-lo a partir de uma perspectiva sociológica, por meio da qual, por tratar-se de uma construção social 6, também necessitou passar por uma série de transformações e adaptações nas quais lhe demandaram um largo espaço de tempo, até que assumisse o modelo no qual o conhecemos atualmente, ou seja, até que se caracteriza-se como um Estado moderno 7 (WEBER, M. 1999). Tomando como marco histórico a Paz de Westfália 8 de 1648, podemos afirmar que o Estado passou a adquirir as características necessárias para se afirmar como uma instituição de peso e importância no bojo das relações internacionais, uma vez que passava ser detentor de legitimidade frente à sociedade internacional. Essa concepção pode ser evidenciada pois além de ser constituído por uma população, um território e um governo, o Estado também passava deter e usufruir da soberania, características essas que o fundamentam e que serão mais bem analisadas a seguir (BOBBIO, N; NOGUEIRA, M. 2000). 6 O Estado é um fenômeno histórico, sociológico e político considerado pelo Direito. DAILLIER, P; DINH, N; e PELLET, A. Direito Internacional Público, Ed: 1999, pg. 373. 7 A definição moderna de Estado esta diretamente ligada à definição que o Cientista Político Max Weber define como sendo uma entidade possuidora de povo, território, governo, e soberania, ou seja, detentor do uso legítimo de força nos assuntos de ordem interna e externa. 8 A Paz de Westfalia, que marcou o fim da Guerra dos 30 anos na Europa, foi um acontecimento de suma importância para a história das relações internacionais, pois a partir daquele momento estavam se consolidando as instituições estatais, detentoras de um povo, território, governo e poder soberano. 216 O conceito que gira em torno do que vem a ser uma população esta diretamente ligada à idéia de um contingente de indivíduos que por razões em comum – sejam essas de afinidade ou por motivos de segurança - passam a se organizar e a se reunir conjuntamente em uma determinada região ou território. Assim sendo, é essa coletividade, formada por uma massa de indivíduos, que da origem a população de um Estado (BOBBIO, N; NOGUEIRA, M. 2000). Por sua vez, os indivíduos pertencentes à população de um determinado Estado, passam a se tornar os habitantes de tal instituição, em que além de serem os responsáveis pelo povoamento da região, passarão a manter uma estreita relação com esta, e vice-versa. Essa relação se pautará sobre certos deveres e obrigações que dizem respeito à preservação e a manutenção do ambiente em que co-existem (BOBBIO, N; NOGUEIRA, M. 2000). Já no que diz respeito ao outro elemento constitutivo do Estado, referindo-se nesse caso ao território ao qual pertence, pode-se dizer que se trata de uma estrutura física na qual o próprio Estado se ergue e passa a desempenhar suas funções. Nesse sentido, o território é a região na qual o Estado passa a predominar, também podendo ser classificado como o espaço geográfico entorno do qual a instituição estatal é consolidada. De modos a facilitar a compreensão do que vem ser o território estatal e quais suas implicações, basta-se interpretá-lo como sendo a estrutura física responsável por sustentar o aparato estatal e conceder-lhe a área necessária para seu desenvolvimento econômico, político e social. Dessa forma, são nas dependências dessa área territorial que o Estado passa exercer seu poderio político/administrativo, direcionando-o por sua vez à população que o compõe. Cabe ressaltar ainda que o território estatal é composto por uma área geopolítica – podendo esta ser integrada por montanhas, rios, mares e espaço aéreo –, em que passa a ser delimitada por fronteiras que demarcam e separam o espaço nacional do internacional, responsável também por delimitar o alcance do poderio do Estado (WEBER, M. 1999). Passando-se analisar a figura do governo, elemento este também indispensável na constituição do Estado, pode-se interpretá-lo como sendo a entidade provida de autoridade legal para gerir os interesses estatais. Essa autoridade por sua vez, passa ser outorgada por parte da população, que lhe aufere a legitimidade necessária para 217 representar-los perante o ambiente interno e externo, bem como para governar-los em prol do bem coletivo (BOBBIO, N; NOGUEIRA, M. 2000). Assim sendo, o governo passa ser o responsável legítimo em administrar o aparato estatal em toda sua amplitude, devido ao fato de lhe ser conferida a confiança e a competência necessária para tal. Para isso, o governo passa a fazer uso de um conjunto de ferramentas administrativas e burocráticas, que se dividem em setores distintos, com o objetivo de suprir as demandas e necessidades de seus nacionais (BOBBIO, N; NOGUEIRA, M. 2000). Com isso, a figura do governo passa a ser caracterizada como entidade máxima de representação estatal, adquirindo caráter político, jurídico e administrativo, responsável pela manutenção da ordem interna e defesa dos interesses do Estado em suas relações internacionais. Analisando finalmente o que se entende por soberania estatal, componente essencial e imprescindível na composição do Estado tal como ele é, pode-se interpretála como sendo uma característica que veio se desenvolvendo em comunhão à desenvoltura do direito internacional. Esta inter-relação pode se comprovar uma vez que a noção de soberania traz atrelada em si uma série de princípios e considerações oriundas da jurisprudência internacional (BOBBIO, N; NOGUEIRA, M. 2000). Assim como se é sabido, o Estado veio se arquitetando socialmente ao longo da história, até que logrou adquirir status de uma instituição poderosa e influente tanto no meio interno como no internacional. Dessa forma, de modos a ceder status legítimo ao Estado no plano nacional e, de procurar manter uma ordem no sistema internacional – o qual é caracterizado pela natureza anárquica9 -, a soberania estatal impera como sendo detentora de um poderio supremo dentro dos limites territoriais do Estado; e no plano internacional, valendo-se dos princípios de independência e igualdade, concede aos Estados o mesmo poder e nível hierárquico (BULL, H. 2002). Nesse sentido é a soberania estatal que outorga ao Estado agir livremente, tendo autonomia e sendo detentor legítimo do poder em seu ambiente doméstico, assim como ser detentor de personalidade jurídica especifica e sem vínculo de subordinação no ambiente internacional. Cabe pontuar que todas as características que compõem a 9 O motivo pelo qual o sistema internacional é composto por um ambiente de anarquia se da pelo fato que nas relações internacionais, diferentemente do que ocorre nas relações domésticas, há a inexistência de um poder central ou hierárquico entre as partes que o compõem. Assim sendo, não existe um poder supranacional que norteie ou controle as diversas relações existentes, sendo estas de qualquer ordem (BULL, H. 2002). 218 soberania e permeiam no Estado foram norteadas no campo de estudos do direito, em particular do direito internacional (BOBBIO, N; NOGUEIRA, M. 2000). Assim sendo, é através das características específicas de cada elemento aqui abordado que surge o Estado nas relações internacionais, passando também a adquirir status de sujeito do direito internacional. No que diz respeito a seu papel de sujeito de direito, pode se destacar o fato de ser o Estado o responsável em representar-se no rol do ambiente internacional, quando assim for necessário, bem como quando achar pertinente. O Estado ainda traz atrelado a si uma serie de questões que lhe são particulares, tais como ser o único sujeito do direito internacional capaz de celebrar Tratados e integrar Organizações Internacionais, sendo o responsável por cumpri-los e reger-los, valendo-se e estando protegido pelos princípios e normas do ordenamento jurídico internacional (PELLET, A. 2003). 2.2 As Organizações Internacionais Desenvolver uma análise tendo como objeto de estudo as Organizações Internacionais requer uma abordagem histórica, que como no caso dos Estados, remonta aos primórdios das relações internacionais. Essa abordagem se torna necessária para que se possa compreender como foram se desenvolvendo as interações entre seus atores, em busca de seus interesses, e como o direito internacional veio ordenando-os. As Organizações Internacionais surgiram com o objetivo de defender interesses estatais em comum, pautadas sobre o princípio da cooperação entre seus membros. Estas, que são compostas primordialmente por Estados, são munidas de caráter intergovernamental que, como o próprio nome diz, são geridas por autoridades soberanas, responsáveis por sua vez em legitimar-lhes a atuação no cenário internacional. Assim, como se deve presumir, tais instituições vieram se constituído posteriormente ao surgimento dos Estados, tendo como berço a Europa do século XIX, marcada por uma vasta gama de interesses nacionais que careciam de organização para serem bem direcionados10 (HERZ, M; HOFFMANN, A. 2004). Torna-se importante pontuar que pelo fato das organizações serem compostas por diversos Estados, estas se 10 Podem ser citadas como primeiras Organizações Internacionais a Comissão Central do Reno (1815) e a Comissão Européia do Danúbio (1856) que se tratavam de acordos realizados entre as principais potências européias em prol de se regulamentar o usufruto dos mais importantes rios presentes em tal continente. DAILLIER, P; DINH, N; e PELLET, A. Direito Internacional Público, Ed: 1999, pg. 524. 219 caracterizam por um multilateralismo 11 no qual devem lidar com interesses de natureza variada. No entanto, de forma a ceder-lhes um ordenamento funcional e jurídico, estas ficam submetidas a regras e normas pré-estabelecidas e acordadas por um Tratado constitutivo. Estes tratados por sua vez, são os responsáveis por institucionalizar-las, no intuito de delegar-lhes as funções, responsabilidades e obrigações, padronizando-as dessa forma não apenas como instituição, mas como também frente à arena internacional na qual desempenham suas ações (TRINNDADE, A. 2002). Nesse sentido, devido ao fato de serem constituídas por entidades soberanas e ao mesmo tempo serem pautadas por tratados constitutivos, nos quais os próprios Estados lhe delegam a função de representação, as organizações passam a desempenhar um papel preponderante em suas relações. Isso ocorre em função de serem consideradas um dos sujeitos do direito internacional com maior proeminência, em razão principalmente de possuírem uma autonomia particular e especifica em suas interações. Assim sendo, as Organizações Internacionais tem a competência de representar e defender seus interesses de forma legítima e autônoma, detendo poder de negociação e, podendo até mesmo firmar acordos em âmbito internacional, acarretando deveres e obrigações às partes envolvidas. A partir desses atributos percebe-se que tais instituições se assemelham bastante a forma de atuação estatal, se diferenciando no entanto quanto ao nível de soberania que detém (TRINNDADE, A. 2002). Isso se explica analisando-se o grau de abrangência que o atributo da soberania concede a tais instituições, pois, mesmo essas organizações sendo compostas por Estados e serem suas representantes legais, é o Estado que lhe transfere o poder soberano. Dessa maneira, afirma-se que o nível do poder soberano presente nas organizações aplica-se de forma variada de acordo com cada situação específica. Seguindo-se essa lógica, a soberania assume sua plenitude desde que não se choque ou vá contra as vontades estatais, devido ao fato de estarem em última instância submetidos e condicionados à estas entidades (HERZ, M; HOFFMANN, A. 2004). Outra competência presente nas instituições em questão, e o de servirem como foro de negociação e mediação, relativo aos assuntos que defendem, os quais encontram-se constituídos nos tratados que lhes da origem. De forma a exemplificar tais 11 As Organizações Internacionais são providas de caráter multilateral pois devem ser compostas necessariamente por um numero de três ou mais membros. Caso contrário, estas assumiriam um caráter uni ou bilateral, característica essa que não se aplica a uma organização (HERZ, M; HOFFMANN, A. 2004). 220 competências, podem ser citadas as inúmeras conferências e pareceres consultivos requisitados as Nações Unidas – considerada uma das principais organizações existentes - no intuito de se procurar solucionar questões que ponham em risco a ordem e paz internacional (KRASNER, S. 1983). Por fim, cabe pontuar que mesmo as organizações tendo como seus principais integrantes os Estados participantes na formulação dos ratados que lhes deram origem, estas podem ser compostas igualmente por outros Estados - que passam a se integrar de forma associada -, ou até mesmo por membros não estatais, tais como organizações nãogovernamentais12 – agregados como observadores. Quanto ao poder de agência dos respectivos membros, os associados acabam tendo os mesmos direitos dos Estados permanentes, com exceção ao poder de voto; já no que confere aos membros observadores, esses acabam desempenhando um poder um pouco mais limitado, tendo direito apenas a se pronunciarem quando assim forem solicitados (TRINNDADE, A. 2002). 2.3 Os Indivíduos Partindo-se do pressuposto que temos um sistema internacional formado por Estados detentores de autonomia e poderes soberanos, valendo-se ainda da afirmativa que é competência legitimada do Estado gerir, defender e representar os interesses nacionais, torna-se interessante abarcar as questões relativas à classificação dos indivíduos como agentes e sujeitos do direito internacional. Os Indivíduos, que em conjunto compõem a população dos Estados, são partes integrantes fundamentais na própria constituição e dinâmica presente nas relações internacionais. Pode-se dizer que os acontecimentos e evoluções que pairaram entorno da sociedade internacional ao longo dos anos, teve necessariamente a figura do indivíduo como interlocutor e agente, tanto nas tomadas de decisões como também no desenrolar de suas ações. Concomitantemente, sentiu-se a necessidade de se prover um aparato legal de representação ao indivíduo no bojo de suas relações sociais, políticas e econômicas, tarefa essa que passou ser desempenhada por parte do direito. Nesse sentido, a sociedade veio sendo acompanhada e norteada por uma jurisdição responsável em 12 As Organizações Não Governamentais (ONG‟s) são entidades constituídas por parte da saciedade civil organizada em que se reúnem em torno da defesa de causas em comum, e que como o próprio nome diz, encontram-se desvinculadas dos governos estatais. 221 ceder-lhe direitos e obrigações cruciais para sua desenvoltura e boa convivência. De maneira a exemplificar alguns dos princípios fundamentais que perduraram na sociedade ao longo dos anos, e por via de conseqüência no indivíduo, podem ser citados aqueles que defendem o direito à vida e o da nacionalidade, características estas que concedem ao indivíduo um laço de pertencimento à uma determinada região ou Estado e o direito à própria existência (PELLET, A. 2003). Assim sendo, o indivíduo veio adquirindo certas características ao longo da história que lhe proporcionaram assumir um patamar preponderante frente à questões de extrema importância para com o mundo e consigo mesmo, fato esse responsável por conceder-lhe personalidade jurídica especifica frente as relações internacionais. Nesse sentido, em razão de ser reconhecido pelo direito internacional como seu sujeito, este passou a deter poder de agência dentro do cenário internacional dispondo, porém, de uma competência limitada devido ao fato do indivíduo ser parte integrante do Estado e estar sob seu condicionamento. Esta limitação de agência se explica principalmente em função do Estado estar legitimado pelo princípio da soberania, que por sua vez lhe designa poderes exclusivos, que dentre outros, tem a função de representar legalmente sua população e se responsabilizar por ela, deixando seus indivíduos em situação de dependência e com restrita margem de ação (PELLET, A. 2003). No entanto, cabe pontuar que se por um lado os indivíduos estejam atrelados aos Estados por não possuírem poderes soberanos frente suas ações, por outro, também são detentores de um aparato legal, condicionado pela jurisprudência internacional, que lhe outorga o direito de poderem se representar e se defender. Servindo como exemplos da atenção cedida pelo direito internacional nesse assunto, podem ser citadas a Convenção Universal dos Direitos Humanos, aprovada pela Assembléia Geral das Nações Unidas em 1948, e a Carta das Nações Unidas 13, que trazem agregados direitos fundamentais do homem pautados nos princípios dos valores da pessoa humana 14 (TRINNDADE, A. 2002). Dessa forma, pelo fato dos indivíduos passarem a ser protegidos pelo direito internacional e lhe serem concedidos poderes de agência, estes acabam exercendo o 13 A Carta das Nações Unidas foi o documento que deu origem a Organização das Nações Unidas (ONU), assinada em 26 de junho de 1945 na cidade de São Francisco – EUA. 14 Esses princípios e valores defendem, regra geral, que a pessoa humana possua uma vida digna independente de raça, sexo, religião ou língua. Ou seja, que cada indivíduo tenha a liberdade de viver de acordo com seus valores morais e culturais (TRINNDADE, A. 2002). 222 papel de sujeitos, podendo recorrer a instituições tais como as Organizações Internacionais ou Cortes em prol dos Direitos Humanos, no intuito que sejam defendidos ou representados seus interesses. Cabe pontuar finalmente que esses interesses devem respeitar os princípios atrelados à soberania estatal para que possam ser considerados como pertinentes e legítimos na dinâmica das relações internacionais (PELLET, A. 2003). 2.4 Movimentos de Libertação Nacional (MLN) Os MLN, como o próprio nome indica, estão relacionados com uma causa de cunho nacionalista, no sentido de procurarem se libertar de alguma forma de dominação seja esta colonial15, econômica ou política e, conseqüentemente, alcançarem uma integridade identitária relacionada com a constituição de um Estado, em seu sentido moderno. Assim sendo, para que um MLN seja classificado como tal, este precisa primeiramente passar por um processo de aprovação frente às Nações Unidas, composto basicamente pelos seguintes procedimentos: Em primeiro lugar, o MLN deve receber um reconhecimento prévio realizado por meio de uma Organização Internacional – independentemente de qual seja esta -, de forma a ser digno de uma legitimidade na esfera internacional. Posteriormente, a partir do momento que este MLN seja possuidor de tal reconhecimento, este passa por um processo de aprovação e confirmação desempenhado pelas Nações Unidas, através dos Estados componentes de sua Assembléia Geral (PELLET, A. 2003). Logo após ser aprovado pelas Nações Unidas, o MLN passa a ser detentor de uma personalidade jurídica internacional, ou seja, passa a se tornar um Sujeito de Direito Internacional. Não obstante, essa classificação de Sujeitos de Direito Internacional cedida aos MLN é passível de uma análise mais detalhada, pois, esta é possuidora de certas características intrínsecas e peculiares à tais movimentos 16. 15 Podem ser citados como exemplo o Movimento Popular de Libertação de Angola, o Movimento de Independência da Argélia e a Frente de Libertação de Moçambique, que auxiliaram no processo de independência, a partir de meados do século XX, nos respectivos países africanos. 16 Os MLN são convidados na ONU a titulo de “observadores” a participar nos trabalhos referentes à Assembléia Geral. Com isso, lhes são concedidos direitos superiores aos que são reconhecidos às ONG‟s, estando privados apenas das seções plenárias e das reuniões do Conselho de Segurança. Com isso, percebe-se que a personalidade jurídica internacional dos MLN é por definição temporária, devido ao fato de ainda estarem atrelados ao Estado, passando a ser definitiva a partir do momento que se tornem de fato os próprios Estados. Ver à propósito PELLET, A. Direito Internacional Público, Ed: 2003, pg. 536 e 537. 223 Algumas destas características peculiares, dizem respeito aos limites de atuação dos MLN frente às decisões e acontecimentos internacionais. Podem ser citados como forma a exemplificar tal raciocínio, a questão que essas entidades, apesar de serem convidadas e aceitas nos foros internacionais, não são dignas de poder de voto, mas apenas de voz, frente às inúmeras decisões desempenhadas por exemplo nas dependências da ONU (PELLET, A. 2003). Com isso percebe-se então que apesar dos MLN possuírem atrelados a si aspectos de personalidade jurídica, estes ainda continuam dependentes à vontade dos Estados como entidade, pois necessitam de um consentimento estatal para que passem a ser considerados sujeitos de direito, além de não serem detentores de uma autonomia plena frente às decisões que envolvam suas atuações no cenário internacional, dependendo, por exemplo, do voto estatal para realizar determinadas atividades. Contudo, apesar das já mencionadas limitações que os MLN possuem no bojo de suas Relações Internacionais, estes ainda podem participar na formação de alguns tipos de tratados internacionais, fazendo referência por exemplo aos tratados relativos à condução da luta armada, acordos estes que tem o intuito de negociar o desempenho dos conflitos belicosos entre os diversos MLN; também tratados que possuem certas características de atos constitutivos de Organizações Internacionais, haja vista o caso da Organização de Libertação da Palestina (OLP), por meio da qual exerce a função de representar o Estado da Palestina frente ao cenário internacional; outro modelo de tratado internacional composto pelos MLN são os referentes aos Acordos de Independência, entorno dos quais estes movimentos passam a ser considerados Estados nacionais propriamente ditos, além de também, passarem a ser detentores das características plenas presentes nos Sujeitos de Direito Internacional (PELLET, A. 2003). 3 APRESENTAÇÃO HISTÓRICA DAS FARC Para se compreender como as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC) surgiram e se fundamentaram ao longo do tempo é necessário tomar-se como análise o Estado colombiano e a conjuntura internacional presente no contexto regional da segunda metade do século XX. Os primórdios do surgimento das FARC tem sua origem procedente do combate e ataques constantes por parte do governo colombiano – de viés liberal – contra grupos 224 e cooperativas de agricultores que se mobilizavam à favor de melhorias de condições de vida, inspirados e pautados sob ideais socialistas. Tais ataques ocorriam com o objetivo de se impedir a organização de movimentos comunistas e revolucionários que contestassem ou pusessem em risco a estrutura do Estado colombiano (PARDO, Rafael, 2000). Pode-se tomar o ano de 1966 como marco da fundação das FARC, tendo como seus principais responsáveis Manuel Marulanda Velez ou “Titofijo”, Jacobo Arenas e outros membros proeminentes do Partido Comunista Colombiano que adotaram esta denominação para designar o grupo na segunda reunião de agricultores rebelados contra o governo colombiano na região de Marquetalia. As FARC têm suas raízes na luta dos movimentos de auto defesa Liberal e Comunista durante o período conturbado e de fortes repressões do governo, mas surgiu de fato como grupo guerrilheiro após os ataques militares aos campesinos, quando após terem sido desalojados pelo exército, passaram a se agrupar em guerrilhas móveis (PARDO, Rafael, 2000). É importante pontuar que o Estado colombiano, naquele contexto, passava por uma série de problemas estruturais de ordem econômica e política que refletiam de maneira geral em toda sua sociedade e, de maneira especifica, em seus setores mais carentes e fragilizados tais como a população campesina. Nesse sentido, pelo fato dos contingentes mais debilitados do Estado não receberem uma assistência social que condiziam com suas expectativa, percebe-se que se começava a arquitetar a formulação de um organismo, que visava responder e suprir as necessidades eminentes presentes na sociedade colombiana, criando-se portanto o campo propício para o surgimento das FARC. A partir desse momento, percebe-se a mobilização de agentes que mesmo estando desvinculados dos aparatos estatais passavam a se posicionar de forma proeminente entorno da defesa das causas da população marginalizada (MEZA, R. 2001). As FARC, que se fundamentou através dos princípios e ideais socialistas – tendo ênfase na reforma agrária e projetos anti-imperialistas e anti-capitalistas -, também se desenvolveu entorno das idéias defendidas pelo líder latino-americano Simon Bolívar17, assumindo em função disso um caráter nacionalista, apoiando uma autosustentabilidade e independência frente a intervenções externas. Nesse sentido as FARC 17 Simon Bolívar (1783-1830) foi um aristocrata em que lutava e defendia a idéia da libertação da América Latina no período colonial, ou seja, a independência dos países. Atualmente, ele se tornou símbolo da luta contra as influências externas nos países latino americanos, podendo se citados principalmente a Venezuela, a Bolívia e a Colômbia (URQUIDI, 1970). 225 surgiu como uma organização preocupada com o progresso social, político e econômico do Estado colombiano, mais especificamente da população colombiana que não detinha meios para tal desenvolvimento, responsabilizando conseqüentemente a Colômbia por não fornecer os recursos básicos necessários (MEZA, R. 2001). A partir de uma análise sobre a história da Colômbia, constata-se que a segunda metade do século XX foi marcada por uma época de fortes instabilidades, oriundas principalmente por não possuir uma economia estabilizada e um poder político centralizado, passando a estar suscetível à influencias externas, tal como foi detectada a proximidade da nação norte-americana e sua influência em assuntos de ordem interna. Destaca-se nesse contexto como se constituía o sistema internacional, marcado pelo ambiente da Guerra Fria 18 e, regido por um delicado equilíbrio de poder no qual estava em disputa a influência das diversas regiões do planeta, sob a égide das duas principais potências mundiais - EUA e URSS (MEZA, R. 2001). Assim sendo, a situação da sociedade colombiana que desprovia de assistência social, econômica e política básica, ficou ainda mais prejudicada pelo fato do Estado colombiano além de não ser capaz de suprir as necessidades de sua população, passar a estar sob a influência de uma potência mundial. Esse fato prejudicava ainda mais os setores necessitados da população, uma vez que a assistência estatal que já era precária passou a ser mais debilitada em função da Colômbia ter se vinculado à área externa, deixando de dar a devida atenção as questões internas e nacionais (AMIN, M. 2004). A partir destas informações evidencia-se que as FARC se constituíram enfatizando a necessidade de se ceder mais atenção aos setores postos à margem da sociedade, tais como os camponeses, indígena e operários, uma vez que estes não possuíam os meios de reivindicarem seus direitos. Nota-se também que as causas defendidas por seus membros, como Manuel Véles – um de seus fundadores, partem de pressupostos e princípios de viés marxista, devido ao fato de estes estarem sobre a influência das ideologias socialistas presentes no embate de choque entre os Estados da Guerra Fria e, conseqüentemente, se oporem as práticas da vertente neoliberal existentes em seu país em tal época (AMIN, M. 2004). Com isso, destaca-se ainda que as FARC se consideram como um grupo político organizado, por meio do qual procuram alcançar um desenvolvimento nacional 18 A Guerra Fria que teve seu início a partir da década de 1950, foi um conflito que trazia atrelado à si disputas entre as ideologias de viés socialista e capitalistas, estando estas representados principalmente pelo URSS e os EUA, respectivamente. 226 alternativo em contra-oposição à aquele desempenhado pela Colômbia, acreditando que serão capazes de levantar recursos e conquistarem a confiança da população civil, alcançando com isso um status legitimo frente as questões e práticas que desempenham. Entretanto, devido a pouca aceitação por parte principalmente dos EUA e da Colômbia, em função das práticas de caráter ilícitos desempenhadas por esta entidade, haja vista o financiamento de suas ações por meio do capital arrecadado pelo narcotráfico, contrabando de armas e, até mesmo, pela práticas de seqüestros em território colombiano, as FARC também são classificadas com grupo terrorista, passando-lhes a ser rechaçadas qualquer tipo de apoio, seja político ou institucional frente as causas que declaram defender (MEZA, R. 2001). Não obstante, se analisarmos o grau de aceitação da população campesina presente no interior do Estado colombiano, percebe-se que há uma certa adesão e simpatia para com as causas desempenhadas por esta entidade, podendo ser melhor evidenciado no quadro a seguir: Quadro 1: Décadas do crescimento das FARC-EP nos municípios colombianos Ano 1964 1970 1979 1985 1991 1995 1999 2004 Municípios 4 54 100 173 437 622 1.000 1.050 Percentagem de Municípios 0,04 0,50 9,00 15,00 42,00 59,00 95,00 100,00 Fontes : Grace Livingstone, Inside Colombia (London: Latin American Bureau, 2003), 8; James F. Rochlin, Vanguard Revolutionaries in Latin América (London: Lynne Reinner Publishers, 2003), 99; FARC-EP, FARC-EP Historical Outline (Toronto: International Commission, 2000), 14; Jesus Bejarano Ávila, Camilo Enchandia, Rodolfo Escobedo & Enrique Querez, Colombia: Inserguridad, Violencia Y Desempeno Economico en las Areas Rurales (Bogotá: Universidad Externado de Colombia, 1997), 133; Timothy Wickham-Crowley, Guerrillas & Revolution in Latin America (Princeton, N. J.: Princeton University Press, 1992), 109-10; Jorge P. Osterling, Democracy in Colombia (Oxford: Transaction Publishers, 1989), 99. (Dados retirados do Artigo de BRITAIN, J. James. Uma Excepção Revolucionária numa era de expanção imperialista. Disponível em <<http://resistir.info/colombia/brittain_farc.html>> acessado em 20 de março de 2010. Este quadro evidência, no transcurso de quarenta anos a partir do surgimento das FARC, um crescimento evolutivo por parte da população rural colombiana. Percebe-se, analisando-o atentamente, que houve um constante apoio de nacionais que estiveram em 227 busca de uma maior proteção ou segurança, devido principalmente ao pouco caso cedido a estes pelas autoridades governamentais. Nesse sentido, destaca-se que apesar das FARC ser muitas vezes desaprovada pela opinião pública internacional, e até mesmo confrontada e perseguida por certos Estados, esta ainda vem sendo aderida por cidadãos colombianos, em que passam-lhe ceder a estrutura necessária para que continue atuando e representando seu interesses ao longo dos anos. É importante pontuar no entanto o caráter polêmico atrelado a esta organização no desenvolver de sua história, característica esta responsável por inúmeros estudos e analises acerca do tema e que será apresentado nesse trabalho. 3.1 O Terrorismo Compreender e analisar o que vem a ser o fenômeno do terrorismo não é uma tarefa muito simples, pois se trata de um conceito desprovido de uma idéia ou definição aceita universalmente, sendo submetido por sua vez à uma variedade de estudos analíticos por parte das diversas áreas do conhecimento tal como é o caso do próprio Direito Internacional (PELLET, S. 2003). Assim como os fenômenos presente ao redor do mundo por exemplo19, o terrorismo também padece de certas dificuldades que lhe são inerentes, tais como a não existência de um parâmetro capaz de qualificá-lo ou quantificá-lo de acordo como sua intensidade ou amplitude. Outra característica que pode ser citada como pertencente a tal fenômeno, diz respeito à sua aparição muitas vezes inesperada e repentina, ou seja, sem um aviso prévio de onde, como ou quando ocorrerá (PROENÇA, D; DINIZ, E. 1999). De acordo com os primórdios da palavra, o terrorismo é proveniente da expressão latina terror, a qual foi incorporada pela língua francesa em 1335 (com a expressão terreur) designando: “um medo ou uma ansiedade extrema correspondendo, com mais freqüência, a uma ameaça vagamente percebida, pouco familiar e largamente imprevisível” 20. No entanto essa definição se esbarrava com uma série de problemas de caráter conceitual, em que por se tratar a primeira tentativa de classificação do termo do 19 São citados nesse caso os fenômenos da natureza tais como tempestades, furacões, maremotos, terremotos e etc, em que quando ocorrem não é possível bem ao certo traçar-lhes suas origens nem tampouco suas conseqüências. 20 Para mais informações ver: GUILLAME, G. Terrorisme et Droit Internationa, R.C.A.D.I., vol. 215, 1989-III, p.296. (PELLET, S. A Ambigüidade da Noção do Terrorismo, IN______ BRANT, L. Terrorismo e Direito, 2003). 228 qual se tem notícia – pelo menos no mundo ocidental -, traz atrelado a si uma definição muito ampla e generalista. Nesse sentido, com o passar dos anos, o termo terrorismo foi sendo interpretado de maneira distinta, passando a adquirir características particulares que o classificavam de acordo com a época e período histórico em que se encontrava. Com isso, traçando-se uma evolução histórica do termo em questão, percebe-se que no final do século XVIII com o advento da Revolução Francesa - este era considerado uma política exclusiva do Estado, pelo fato das autoridades terem implementado uma governança que se legitimava e requeria respeito pautada, em uma lógica de ameaça e prática de terror (PELLET, S. 2003). Posteriormente, no final do século XIX e com o surgimento de grupos extremistas ou facções nacionalistas exacerbadas – tais como são exemplos os Niilistas da Rússia ou os Anarquistas presentes na Europa - evidencia-se uma mudança no sentido do termo. Essa mudança diz respeito à passagem de um terrorismo de Estado, presente na já mencionada Revolução Francesa, para um terrorismo contra o próprio Estado, ou seja, atos designados a ferir a integridade e soberania estatal (BRANT, L. 2006) Dessa forma, acompanhando-se ainda o transcurso histórico à procura de uma identificação e definição do fenômeno aqui abordado, destaca-se que este atravessa o século XX sendo objeto de largas discussões e interpretações nos diversos foros mundiais e pelos inúmeros Estados componentes do sistema internacional. Pode-se dizer que o terrorismo assume o atributo internacional após o incidente acorrido em Marselha (França) no ano de 1934, no qual são assassinados, por via de um cidadão croata, o Rei Alexandre I da Iugoslávia e um Ministro Francês de Assuntos Estrangeiros, despertando uma eminente preocupação por parte da comunidade internacional em procurar-se compreender e tipificar o fenômeno em questão (PELLET, S. 2003). Assim sendo, passou a se tornar um assunto amplamente discutido e analisado no âmbito da Liga das Nações, passando posteriormente para as dependências da Organização das Nações Unidas, assim como no bojo dos demais encontros ou Organizações internacionais que percebiam a necessidade eminente de se proteger contra uma ameaça internacional e de poderem contribuir para manutenção da paz mundial (BRANT, L. 2006). 229 Destarte, foram se criando uma série de conceitos como ocorreu no artigo primeiro da primeira Convenção de Genebra de 1937 em que: na presente Convenção, a expressar „atos terroristas‟ quer dizer fatos criminosos dirigido contra um Estado, e cujo objetivo ou natureza é provocar o terror em pessoas determinadas, em grupo de pessoas ou no público (PELLET, S. 2003). Assim como é procurado ser definido por estudiosos como o francês Antoine Sottile, em que o classifica como sendo: “O ato criminal perpetrado mediante terror, violência ou grande intimidação, tendo em vista a alcançar um objetivo determinado” 21. Já Antonio Cassese, caracteriza o terrorismo como sendo: (...) qualquer ato violento contra pessoas inocentes como a intenção de forçar um Estado, ou qualquer outro sujeito internacional, para seguir uma linha de conduta que, de outro modo, não seguiria, é um ato de terrorismo (PELLET, S. 2003)22. Cabe pontuar, entretanto, que mesmo havendo a existência de definições por parte de organismos internacionais, bem como por parte de estudiosos sobre o assunto, ainda não se foi possível chegar à um consenso – entre os diversos atores que compõem as Relações Internacionais – acerca do que vem a ser de fato o fenômeno do terrorismo. Essa dificuldade de classificação pode estar atrelada em grande medida na influência em que o terrorismo passa a exercer sob determinado ator, sendo esta questão responsável por sua vez pela tipificação do objeto de estudo. Não obstante, com o advento do século XXI e certos acontecimentos catastróficos acorridos no cenário internacional em função do terrorismo – tais como o atentado de 11 de setembro nas torres de World Trade Center em Nova York; e as explosões das bombas no metro de Madri em 11 de março de 2004 -, alerta a sociedade internacional sobre a necessidade eminente de se compreender o fenômeno, em suas diversas facetas, para se prevenir das ameaças e manter a segurança internacional. 21 22 Ver nota de roda pé n. 24, p. 17 de (PELLET, S. 2003). Ver nota de roda pé n. 29, p. 18 de (PELLET, S. 2003). 230 4 A ÁREA DE INFLUÊNCIA DAS FARC E SUAS DIVERSAS CLASSIFICAÇÕES Considerando a explanação de informações, presentes nos capítulos anteriores, relacionadas à como se fundamentaram ao longo da história as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC), juntamente com o que vem a se entender como sendo um Movimento de Libertação Nacional e o fenômeno do terrorismo, desempenhar-se-á uma análise que terá o objetivo de procurar compreender qual a relação existente entre esses três fatores. Desta forma, de modo a propiciar o desenvolvimento de tal análise, serão corelacionados tanto elementos conceituais quanto teóricos, além de fazer menção aos principais acontecimentos que se fizeram presentes e, de alguma forma, marcaram a atuação das FARC perante a opinião pública e a sociedade internacional, principalmente no que concerne aos últimos anos. Para tanto, será necessário voltar a se fazer referência aos primórdios da formação das FARC como entidade, para que se possa a partir daí pontuar algumas características intrínsecas a tal organização. A principal delas compreende os próprios princípios constitutivos das FARC como entidade, para que através deles se possa melhor compreender quais foram os propósitos basilares de sua formação. Assim sendo, destaca-se que os motivos condicionantes para a formulação de tal entidade giraram entorno de aspirações que visavam a conquista de um desenvolvimento nacional alternativo, uma vez que na década de 1960 a Colômbia - assim como a maioria dos países da América Latina -, permanecia sobre uma forte influência de políticas neoliberais por parte dos Estados Unidos da América 23. Estas aspirações, de um desenvolvimento nacional alternativo na Colômbia, referiam-se essencialmente ao fato de procurarem propiciar a seus integrantes - em sua maioria campesinos e agricultores, uma vida digna, não mais dependentes em sua totalidade do Estado colombiano, que por sua vez estava influenciado, político e economicamente pelas potências estrangeiras e que, em detrimento deste fato, não lhe era cedia a assistência necessária a seu povo. Assim sendo a organização das FARC, tinham como objetivo alcançarem um desenvolvimento auto-sustentável, pois, estavam diretamente ligadas a vontade de lograrem desempenhar um desenvolvimento 23 Esta menção faz referência a uma série de golpes militares, presentes no continente latino americano a partir de meados do século XX. 231 autônomo. Nesse sentido, percebe-se que foi através deste argumento que a organização passou a se consolidar ao longo de sua história, fazendo menção em seus pronunciamentos, que estiveram, assim como continuam estando, a favor de uma causa nacionalista e legítima, devido ao fato de acreditarem e defenderem seu próprio desenvolvimento nacional (AMIN, M. 2004). Desta forma observa-se que, de acordo com os integrantes das próprias FARC, esta pode ser considerada como um Movimento de Libertação Nacional propriamente dita, tendo em vista as considerações e a auto-denominações anteriormente mencionadas, realizadas por seus membros. Contudo, antes de se definir estritamente se as FARC são dignas, ou não, de uma classificação entorno do que se é definido como sendo um MLN, é preciso se levar em consideração não apenas seus objetivos, ou resultados esperados a serem alcançados, mas também os meios utilizados para tal. Sendo assim, passando a observar os meios utilizados pelas FARC nas práticas de suas ações, percebem-se algumas particularidades que merecem ser mais bem analisadas. Partindo-se do pressuposto que esta entidade exerce suas atividades financiadas, na maioria das vezes, através do dinheiro arrecadado pelo narcotráfico de drogas, além de uma série de outros atos ilícitos, haja vista por exemplo, a prática de seqüestros e contrabando de mercadorias ou de armas, se torna complicado e complexo defini-las como pertencentes a um MLN legítimo (MEZA, R. 2001). De modo a melhor exemplificar a prática de ilicitudes desempenhadas pelas FARC, são factíveis de destaque os seguintes indícios, cada uma de acordo com suas peculiaridade. Segundo pesquisas oficiais elaboradas pelo Fundo Nacional para a Defesa da Liberdade Pessoal (Fondelibertad), vinculados ao governo colombiano, a incidência de seqüestros praticados pelas FARC de 1996 até 2008 são altíssimos, mantendo sobre seu domínio uma media de reféns que ultrapassam a cifra de 700 (setecentas) pessoas por ano. Dentre estes reféns, estão incluídos personalidades importantes da vida política e econômica da Colômbia, em que são mantidos em cativeiro por uma extensa data, até que passam a ser negociados por meio do pagamento de resgates ou, servirem de barganha para a libertação de seus membros que foram presos pelas autoridades legais. O narcotráfico e o contrabando de mercadorias também podem ser citados como artifícios fortes que agem de forma a alimentar financeiramente as FARC, pois juntas são responsáveis por movimentar quantias que giram entorno dos dois bilhões de dólares anuais. Dentre as principais drogas e mercadorias contrabandeadas constam a 232 cocaína24, a maconha e a intensa comercialização de arsenal bélico que servem para armar e concederem um poder relativo a esta entidade, frente às forças que tentam combatê-las (MEIRA, L. 2007). Desta forma, percebe-se que muitos dos meios utilizados pelas FARC de modo a lograrem alcançar seus objetivos são exercidos de forma ilícita e fora dos padrões ou normas, aceitas pelas instancias jurídicas internacionais. Estas práticas, além de serem desaprovadas pelos órgãos jurisdicionais internacionais, tais como a ONU, passam a acarreta-lhe também uma desaprovação da opinião pública mundial, que por sua vez recrimina tais atos por não os considerarem corretos ou aceitáveis, tamanha a crueldade praticada por seus membros. Outra questão importante a ser mencionada é a discussão entorno da qual surge a polêmica de como as FARC vem sendo denominadas pela sociedade internacional nos últimos anos, principalmente por alguns Estados, tais como os Estados Unidos, o Canadá, a Inglaterra e a própria Colômbia. Segundo a definição concedida pelos Estados Unidos às FARC, no mandato do presidente George W. Bush, este as denomina como sendo um grupo terrorista 25 na qual a considera como uma ameaça inerente a paz mundial e que deve ser combatida, independentemente de quão custoso isso se torne (AMIN, M. 2004). Desta forma, em parceria ao governo de Álvaro Uribe, os Estados Unidos promovem um plano denominado “Plano Colômbia”, em que consistia principalmente formar uma Força Nacional de combate aos grupos terroristas insurgentes e a erradicação do cultivo da folha de coca, ou seja, às FARC e suas práticas. Este plano passaria a ser financiado, econômica e tecnologicamente pelos EUA, além de possuir um acompanhamento periódico de oficiais norte americanos no território colombiano e nas dependências de suas Forças Armadas. Posteriormente a este “Plano Colômbia”, surgiu à tona um segundo plano, denominado desta vez como o “Plano Patriota”, em que basicamente serviria como continuidade ao anterior, desenvolvendo as mesmas práticas e aspirando os mesmos objetivos, se diferenciando apenas nas quantias de investimentos financeiros que lhe passaram a ser em quantias maiores (MEIRA, L. 2007). 24 A Colômbia é líder no ranking entre os países que produzem cocaína no mundo (MEIRA, L. 2007). Existe uma extensa discussão entorno da qual se define a partir de quais circunstancias um determinado grupo pode ser classificado como terrorista. Neste caso especifico, os Estados Unidos referem-se às FARC como terrorista pelo fato desta praticar e disseminarem o terror no meio da sociedade. Para mais detalhes ver: BRANT, L. Terrorismo e Direito, Ed: Forense, 2003. 25 233 Porém, não são todos os Estados que compartilham com a definição cedida pelos Estados Unidos e seus aliados, classificando as FARC como grupos terroristas. Podemos destacar como exemplo a esta não conformidade, o posicionamento da Venezuela no cenário internacional, em que através de seu líder Hugo Chavez passa a criticar e a questionar a postura dos EUA frente a tal definição. Segundo Hugo Chavez, a classificação de terroristas atribuída às FARC é concedida de forma equivocada, pois de acordo com ele esta entidade compõe um verdadeiro exército que ocupa o território colombiano e, portanto precisa ser reconhecido como força insurgente que além de possuir um projeto político, este é legítimo (NETO, R. 2008). Independentemente se esta afirmação, feita pelo representante da Venezuela, seja verdadeira ou não, o fato é que se iniciou a partir das intermediações realizadas por este chefe de Estado um longo processo de negociações, entorno do qual estavam sendo barganhadas as possibilidades de libertação de alguns dos reféns mantidos sobre o domínio das FARC. Estas negociações que continham um amplo apoio tanto de organismos internacionais – como foi o caso da presença da Comissão Internacional da Cruz Vermelha (CICV), quanto de um forte apoio de inúmeros Estados, tais como a França, Espanha, Brasil, dentre outros, teve como principal articulador o próprio Hugo Chavez. Sendo assim, foram a partir destas negociações que se lograram com êxito alcançar a libertação de alguns de seus reféns, tais como Clara Rojas, Consuelo Gonzáles, além de alguns soldados do Exercito e da polícia colombina tais como William Giovanny Dominguez, Alexis Torres Zapata e Juan Fernando Galícia Uribe, como também a libertação da Franco-colombiana Ingrid Betancourt dentre os últimos anos (BBC – Brasil, 2009). No decorrer destas negociações, um fator importante de ser mencionado, de acordo a opinião de inúmeros especialistas e analistas internacionais, é o fato da importância que o chefe de Estado venezuelano representou para se conseguir alcançar um bom resultado entre as partes, ou seja, se conseguir efetuar a libertação dos mencionados reféns do poderio das FARC. Ainda segundo estes estudiosos, o bom êxito destas negociações pode estar atrelado ao fato de como Hugo Chavez se identificou com as FARC, não lhes auferindo um conceito de terroristas, mas sim de detentores de um status legítimo frente as causas que defendem, podendo com isso ter flexibilizado tais negociações (BBC – Brasil, 2009). 234 Por fim se passará analisar o que as próprias FARC se denominam, ou seja, como esta entidade entende que atua, levando-se em consideração suas características peculiares. Assim sendo, apresenta-se a seguir um declaração feita por um de seus integrantes, o Ex Comandante do Secretario geral das FARC, Raúl Reyes26: As FARC são um exército do povo que se nutre da economia do país, que é o petróleo, o café, as esmeraldas, o gado, o algodão, a coca e a papoula. Não perguntamos ao empresário das transportadoras se seus caminhões foram comprados com dinheiro do narcotráfico. As FARC não têm cultivos, não negociam com narcóticos, não vendem favores aos narcotraficantes. As FARC subsistem da economia do país, apesar da campanha encabeçada pelos EUA que tem por fim desacreditar-nos, mostrar-nos não como uma organização revolucionária, mas como narcotraficantes, agora narcoterroristas. Mas é normal que os EUA façam isso, pois são nossos inimigos e, portanto, fazem o que devem fazer. (Citação retirada do site: <<http:://www.globalsecurity.org/military/world/para/farc.htm>>. Acessado em: 30 de abril de 2009). A partir da análise feita em decorrência de tal declaração, percebe-se naturalmente que há uma grande repulsa na definição proveniente dos EUA e seus aliados, em classificá-los como grupo terrorista. Isso se deve ao fato de que com essa classificação as FARC perdem legitimidade frente ao cenário internacional, podendo ser alvo de denúncias e perseguições no âmbito do Direito e das Relações Internacionais. Em função desse fato, os integrantes das FARC fazem o possível para serem classificados como um movimento revolucionário que lutam e defendem as causas do povo, para que com isso possam agir de maneira a não infringirem regras e normas presentes no ordenamento jurídico internacional. Para se poder ter uma idéia de qual a abrangência das FARC no Estado colombiano, basta observar o mapa a seguir que traz consigo um território nacional multifacetado: 26 Raúl Reyes, um dos lideres das FARC, foi assassinado em 2008 por uma operação secreta entre os governos Álvaro Uribe e George W. Bush, pertencente ao Plano Colômbia. 235 FIGURA I – MAPA DAS ÀREAS CONTROLADAS PELOS GRUPOS NÃO ESTATAIS FONTE : United Nations Office on Drugs and Crime Torna-se importante destacar, apenas como matéria de informação, que além das FARC o território colombiano abriga outros grupos armados não estatais, tais como é o caso dos paramilitares e do Exército de Libertação Nacional. Esses grupos por sua vez defendem idéias próprias que se contrastam principalmente pelas diretrizes que cada um segue. O ELN se caracteriza por ser um 236 grupo marxista-cristão criado em 1964 e fortemente inspirado pelos ideais da Revolução Cubana, atraindo estudantes, padres, sindicalistas e remanescentes das guerrilhas do partido Liberal. A estratégia inicial do grupo, que se apoiava fundamentalmente em uma liderança carismática, era iniciar uma guerra de libertação nacional começando com uma revolução rural similar ao que ocorreu em Cuba (PRADO, R. 2000) Já no caso dos Paramilitares, que também surgem na Colômbia no início da década de 1960, se organizaram em contra-partida às ações desempenhadas tanto pelas FARC como pelo ELN. Acreditando que esses grupos de viés marxista e revolucionário pudessem por em risco a estrutura social dos grupos de militares e elites agrárias – desvinculadas do Estado ou descrentes do mesmo –, esses passaram a se articular à favor de seus próprios interesses e poderio nas regiões que habitavam, sempre munidos de fortes recursos, principalmente o capital financeiro (MEIRA, L. 2007). Essa constatação é mais um indício de o quanto a Colômbia esteve, e continua a estar, sobre forte pressão de grupos organizados e de contestação das políticas desempenhadas por tal nação, colocando em choque a estrutura estatal como um todo. Nesse sentido, torna-se latente a necessidade do restabelecimento da ordem social e política para se dar continuidade ao desenvolvimento do Estado, em seu plano interno e em suas relações internacionais. 5 CONCLUSÃO Com a elaboração deste trabalho se podem considerar certas questões inerentes ao objeto de estudo aqui analisado, questões estas que se apresentam de forma a melhor compreender, em termos conceituais e teóricos, como vem a se caracterizar as FARC e qual a sua atuação no que concerne ao cenário internacional. Por tanto, a partir da apresentação de sua formação ao longo da história foi possível pontuar e se entender quais foram os motivos e os princípios basilares, em que se fundamentaram o surgimento das FARC. Também, em decorrência dessa cronologia histórica propiciou-se a possibilidade de se ter uma maior noção de como as circunstancias presentes em cada momento distinto de sua existência, condicionaram esta entidade a tomar certas atitudes no bojo de suas inter-relações. Posteriormente, fazendo-se uso das conceituações teóricas acerca de como é fundamentado um Movimento de Libertação Nacional (MLN), apresentando-se as 237 características necessárias para que determinado movimento possa vir a ser classificado como tal, teve-se uma idéia geral de quais os atributos, e sobre quais condições, estes organismos se fazem presentes. Assim sendo, a partir da noção de como se classificam os MLN, passaram a serem relacionados com a conceituação das FARC, no intuito de se procurar compreender qual a relação existente entre estas duas entidades. Nessa relação conceitual entre os dois organismos, surgiram certas limitações de caráter teórico e analítico, devido ao fato das FARC possuírem uma série distinta de definições, podendo variar dependendo da perspectiva abordada. Esta limitação teórica esta atrelada ao fato desta entidade fazer uso de uma gama variada de meios para conseguir lograr seus fins, que por sua vez – segundo o que aparentam -, trata-se de visarem alcançar uma certa autonomia frente a autoridade governamental e ao poderio estatal colombiano. Desta forma, percebe-se como delicado se torna definir as FARC, segundo as interpretações e classificações presentes no que se constituem os campos de estudos tanto do Direito Internacional quanto das Relações Internacionais. Esta dificuldade se torna ainda mais eminente a partir do momento que lhe é concedida uma certa personalidade jurídica, em que pode ser julgado perante o ordenamento jurídico internacional, porém é detentor de um grau de alcance limitado, ou em certas circunstancias até mesmo inexistente, devido ao fato de não ser reconhecido como um Sujeito de Direito Internacional pleno. Outra questão que merece ser explanada é a polêmica que gira entorno se as FARC são uma entidade terrorista – assim como defendem os Estados Unidos e seus aliados -, ou se pode ser considerada como um organismo legítimo de direitos para dar continuidade a seus atos, agindo como entidades de cunho meramente político – como defendido por Hugo Chavez. Nesse sentido, levando-se em consideração a inexistência de um consenso acerca do que vem a ser o terrorismo, juntamente com a falta de uma definição condizente e aceita universalmente à respeito de como é interpretado tal fenômeno tanto pelo Direito Internacional, como pelas Relações Internacionais, evidencia-se o quão complexo tornase definir as FARC como pertencente a esta qualificação. Assim sendo, a partir da explanação destes conceitos e de seus embates teóricos, espera-se haver alcançado o propósito desse artigo, que se refere ao fato de apresentar as particularidades entorno das quais se assentam os diversos conceitos que pairam sobre as FARC. Com isso e em função das dificuldades de conceituação das FARC 238 como entidade, procurou-se, no desenvolver deste trabalho, de forma sucinta, mas objetiva, apresentar as principais características inerentes a tal organismo, evitando dessa forma adentrar de maneira desnecessária em embates teóricos ou análises extensas que o desvirtuassem. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AMIN, Mônica Concha. Alguns efeitos das atividades dos participantes no conflito armado na Colômbia sob a ótica de externalidades. Montes Claros: Revista Unimontes Científica, v.6, n.2 jul./dez. 2004. Disponível em: <http://www.unimontes.br/unimontescientifica/revistas> Acessado em: 30/04/2009. BBC Brasil. “Reféns são libertados na Colômbia”. 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