Titulo: As Forças Armadas Revolucionárias Da Colômbia (FARC) e Sua
Atuação no Cenário Internacional
Autor: Kalki Zumbo Coronel Guevara
Publicado em: Revista Eletrônica de Direito Internacional, vol. 6, 2010, pp.
Disponível em: http://www.cedin.com.br/revistaeletronica/volume6/
ISSN 1981-9439
Com o objetivo de consolidar o debate acerca das questões relativas ao Direito e as Relações
Internacionais, o Centro de Direito Internacional – CEDIN - publica semestralmente a Revista Eletrônica
de Direito Internacional, que conta com artigos selecionados de pesquisadores de todo o Brasil.
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AS FORÇAS ARMADAS REVOLUCIONÁRIAS DA COLÔMBIA (FARC) E
SUA ATUAÇÃO NO CENÁRIO INTERNACIONAL
Kalki Zumbo Coronel Guevara*
RESUMO
O presente trabalho estará voltado para a o entendimento de como as Forças
Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC) atuam e vêem se comportando no
cenário internacional. Para tanto será analisado o processo histórico atrelada a tal
entidade, além de peculiaridades presentes em cada época de sua formação. Tendo
como objetivo compreender como tal organização veio se desenvolvendo e quais suas
implicações para a área das Relações Internacionais e o Direito Internacional, se farão
uso dos conceitos presentes nos atores e sujeitos presentes da arena internacional, bem
como o que vem se entender como sendo o fenômeno terrorista. Por fim, se procurará
abarcar as diversas definições atreladas ao objeto de estudo em questão, para
posteriormente ter-se uma noção de como é qualificado no ambiente internacional.
Palavras-chave: Forças Armadas Revolucionarias da Colômbia (FARC), Organizações
Internacionais, Movimentos de Libertação Nacional (MLN) e fenômeno terrorista.
RESUMEN
El presente trabajo estará destinado a la comprensión de como las Fuerzas
Armadas Revolucionarias de Colombia (FARC) atuan y vienen comportándose en el
escenario internacional. Para tanto será analizado el proceso histórico atrelada a tal
entidad, además de peculiaridades presentes en cada época de su formación. Teniendo
cómo objetivo comprender como tal organización vino desarrollándose y cuáles sus
implicações para la área de las Relaciones Internacionales y el Derecho Internacional, se
harán uso de los conceptos presentes en los actores presentes en la arena internacional,
así como lo que viene a entenderse cómo siendo el fenómeno terorista. Finlmente, se
buscará abarcar las diversas definiciones atreladas al objeto de estudio en cuestión, para
posteriormente tenerse una noción de cómo es calificado en el ambiente internacional.
Palabras-llave: Fuerzas Armadas Revolucionarias de Colombia (FARC),
Organizaciones Internacionales, Movimientos de Liberación Nacional (MLN) y
fenómeno terorista.
___________________________
* Bacharel em Relações Internacionais pelo Centro Universitário de Belo Horizonte (UNI-BH); pósgraduado em Direito Internacional pelas Faculdades Milton Campos/CEDIN; e membro do Grupo de
Pesquisa do Centro de Direito Internacional (CEDIN).
213
1 INTRODUÇÃO
Levando-se em consideração a presença das Forças Armadas Revolucionárias da
Colômbia (FARC) no território do continente sul americano, e a insurgência dos
acontecimentos ocorridos no decorrer dos últimos anos, tais como a morte de
importantes membros – como Raúl Reyes, um de seus líderes; além da libertação de
alguns de seus reféns civis, mantidos sobre seu domínio na selva amazônica1, percebese a relevância do estudo deste tema para a área das Relações Internacionais, partindo-se
com isso, para uma análise mais detalhada acerca dos aspectos que envolvem sua
conjuntura.
Para tanto, o propósito do presente trabalho será de apresentar o processo que
veio propiciar o surgimento das FARC no transcurso de sua história, destacando-se seus
principais ideais e princípios constitutivos, para que se possa compreender, de maneira
mais clara e condizente, do que se trata este movimento 2. Posteriormente, haja vista o
seu envolvimento no plano internacional, se trará à tona uma discussão teórica, que terá
o intuito de apresentar como o campo de estudos do Direito Internacional e das
Relações Internacionais analisam o ator em questão, ou seja, a maneira pela qual estas
duas áreas o interpretam.
Outro aspecto a ser analisado será o de interpretar, em termos conceituais, o que
se entende por Movimento de Libertação Nacional (MLN) e fenômeno terrorista, para
que, em um segundo momento, possa-se relacionar-los com o estudo aqui abordado.
Esta inter-relação se dará com o intuito de procurar compreender se as FARC possuem
uma relação com estes dois conceitos e, em caso afirmativo, em quais circunstâncias.
Assim sendo, com o propósito de auxiliar na elaboração do trabalho, este se
fragmentará em três capítulos distintos, porém complementares entre si. O primeiro terá
o objetivo de apresentar os atores ou sujeitos de maior relevância no cenário
internacional e, conseqüentemente, para a compreensão das dinâmicas presentes nas
próprias FARC. Para tanto serão abordados as características principais presentes nos
Estado, nas Organizações Internacionais, nos indivíduos e nos Movimentos de
Libertação Nacional. Ainda, juntamente com a análise dos referidos atores, serão
abarcados os papeis desempenhados por estes e quais as suas participações na formação
do sistema internacional que compõem.
1
Como exemplos, podem ser citadas as libertações ocorridas entre os anos de 2008 e 2009 da Francocolombiana Ingrid Betancourt, além de Claras Rajas, Consuelo Gonzáles e outros.
2
Movimento aqui entendido como grupos de indivíduos que se reúnem em torno de causas em comum.
214
Por sua vez, o segundo capítulo terá como objetivo apresentar o que vêem a ser
as FARC propriamente ditas, referindo-se à suas características constitutivas e
históricas, introduzindo assim o tema proposto neste trabalho. Para tanto será traçada
uma linha cronológica temporal que terá a função de demarcar os principais
acontecimentos ao longo dos anos, presentes no decorrer de seu processo de formação,
chegando até nos tempos atuais. Em seguida, será interpretado o que vem a ser um
fenômeno terrorista, levando-se em consideração suas características marcantes e sua
dificuldade em defini-lo.
Por fim, o terceiro e último capítulo se dedicará em relacionar as próprias FARC
à noção do que se entende e o que se definiu como sendo um Movimento de Libertação
Nacional, juntamente com o que vem a ser o fenômeno terrorista, criando o campo
propício para se relacionarem as informações que serão apresentadas no desenvolver
desse artigo. Esta última seção terá a função de pontuar, a partir de um embate entre
teoria e conceitos, como se classificam as FARC perante o sistema internacional, em
função de suas ações e atuações no âmbito das relações internacionais.
2 SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL3
Entende-se por sujeitos 4 do direito internacional aqueles agentes ou instituições
que compõem e integram o sistema internacional 5 em seus diversos aspectos, sendo
estes, econômicos, políticos ou sociais (PELLET, A. 2005).
Para tanto, essa seção se destinará a apresentar os principais sujeitos do direito
internacional, abordando suas peculiaridades e características compositivas, bem como
suas competências e poder de agência no meio em que se encontram inserido.
Nesse sentido se começará explanando sobre a figura do Estado, este que se
tornou um dos sujeitos mais preponderantes na área internacional desde que adquiriu
papéis específicos ao longo da história; também se abordará o que são as Organizações
Internacionais, instituições estas de suma importância no desenvolvimento das relações
internacionais; posteriormente analisar-se-á como o indivíduo passou a ser interpretado
3
Entende-se como Sujeitos de Direito Internacional aquelas entidades que possuem capacidade para
apresentar reclamações sobre violações de DI; capacidades para celebrar tratados e acordos válidos no
âmbito internacional; e gozos de privilégios e imunidades concedidos por jurisdições internacionais
4
Destaca-se aqui a existência de expressões distintas por parte do campo de estudos do Direito
Internacional e das Relações Internacionais, utilizadas para designar o mesmo objeto, sendo este
classificado como “sujeito” para o DI e “ator” para as RI (PELLET, A. 2005).
5
O sistema internacional diz respeito ao ambiente no qual interagem os sujeitos ou atores internacionais.
215
pelo Direito Internacional, juntamente com sua influência e participação ao longo do
tempo; por fim, se desenvolverá um estudo acerca do que vem a ser um Movimento de
Libertação Nacional e suas prerrogativas.
2.1 O Estado
Considerado por muitos historiadores como o principal sujeito do direito
internacional, o Estado veio adquirindo forma e personalidade jurídica peculiar no
transcurso das relações internacionais.
O Estado é uma instituição que veio se desenvolvendo desde os primórdios das
civilizações e ao longo dos séculos, por meio do qual foi sendo estruturando e
assumindo características próprias, tais como população, território e governo. A análise
da instituição estatal também pode ser estudada em concomitância ao desenvolvimento
da sociedade, devido ao fato de ter sido moldado de acordo com suas necessidades em
cada período histórico (WEBER, M. 1999).
Nesse sentido, é possível interpretá-lo e estudá-lo a partir de uma perspectiva
sociológica, por meio da qual, por tratar-se de uma construção social 6, também
necessitou passar por uma série de transformações e adaptações nas quais lhe
demandaram um largo espaço de tempo, até que assumisse o modelo no qual o
conhecemos atualmente, ou seja, até que se caracteriza-se como um Estado moderno 7
(WEBER, M. 1999).
Tomando como marco histórico a Paz de Westfália 8 de 1648, podemos afirmar
que o Estado passou a adquirir as características necessárias para se afirmar como uma
instituição de peso e importância no bojo das relações internacionais, uma vez que
passava ser detentor de legitimidade frente à sociedade internacional. Essa concepção
pode ser evidenciada pois além de ser constituído por uma população, um território e
um governo, o Estado também passava deter e usufruir da soberania, características
essas que o fundamentam e que serão mais bem analisadas a seguir (BOBBIO, N;
NOGUEIRA, M. 2000).
6
O Estado é um fenômeno histórico, sociológico e político considerado pelo Direito. DAILLIER, P;
DINH, N; e PELLET, A. Direito Internacional Público, Ed: 1999, pg. 373.
7
A definição moderna de Estado esta diretamente ligada à definição que o Cientista Político Max Weber
define como sendo uma entidade possuidora de povo, território, governo, e soberania, ou seja, detentor do
uso legítimo de força nos assuntos de ordem interna e externa.
8
A Paz de Westfalia, que marcou o fim da Guerra dos 30 anos na Europa, foi um acontecimento de suma
importância para a história das relações internacionais, pois a partir daquele momento estavam se
consolidando as instituições estatais, detentoras de um povo, território, governo e poder soberano.
216
O conceito que gira em torno do que vem a ser uma população esta diretamente
ligada à idéia de um contingente de indivíduos que por razões em comum – sejam essas
de afinidade ou por motivos de segurança - passam a se organizar e a se reunir
conjuntamente em uma determinada região ou território. Assim sendo, é essa
coletividade, formada por uma massa de indivíduos, que da origem a população de um
Estado (BOBBIO, N; NOGUEIRA, M. 2000).
Por sua vez, os indivíduos pertencentes à população de um determinado Estado,
passam a se tornar os habitantes de tal instituição, em que além de serem os
responsáveis pelo povoamento da região, passarão a manter uma estreita relação com
esta, e vice-versa. Essa relação se pautará sobre certos deveres e obrigações que dizem
respeito à preservação e a manutenção do ambiente em que co-existem (BOBBIO, N;
NOGUEIRA, M. 2000).
Já no que diz respeito ao outro elemento constitutivo do Estado, referindo-se
nesse caso ao território ao qual pertence, pode-se dizer que se trata de uma estrutura
física na qual o próprio Estado se ergue e passa a desempenhar suas funções. Nesse
sentido, o território é a região na qual o Estado passa a predominar, também podendo
ser classificado como o espaço geográfico entorno do qual a instituição estatal é
consolidada.
De modos a facilitar a compreensão do que vem ser o território estatal e quais
suas implicações, basta-se interpretá-lo como sendo a estrutura física responsável por
sustentar o aparato estatal e conceder-lhe a área necessária para seu desenvolvimento
econômico, político e social. Dessa forma, são nas dependências dessa área territorial
que o Estado passa exercer seu poderio político/administrativo, direcionando-o por sua
vez à população que o compõe.
Cabe ressaltar ainda que o território estatal é composto por uma área geopolítica
– podendo esta ser integrada por montanhas, rios, mares e espaço aéreo –, em que passa
a ser delimitada por fronteiras que demarcam e separam o espaço nacional do
internacional, responsável também por delimitar o alcance do poderio do Estado
(WEBER, M. 1999).
Passando-se analisar a figura do governo, elemento este também indispensável
na constituição do Estado, pode-se interpretá-lo como sendo a entidade provida de
autoridade legal para gerir os interesses estatais. Essa autoridade por sua vez, passa ser
outorgada por parte da população, que lhe aufere a legitimidade necessária para
217
representar-los perante o ambiente interno e externo, bem como para governar-los em
prol do bem coletivo (BOBBIO, N; NOGUEIRA, M. 2000).
Assim sendo, o governo passa ser o responsável legítimo em administrar o
aparato estatal em toda sua amplitude, devido ao fato de lhe ser conferida a confiança e
a competência necessária para tal. Para isso, o governo passa a fazer uso de um conjunto
de ferramentas administrativas e burocráticas, que se dividem em setores distintos, com
o objetivo de suprir as demandas e necessidades de seus nacionais (BOBBIO, N;
NOGUEIRA, M. 2000).
Com isso, a figura do governo passa a ser caracterizada como entidade máxima
de representação estatal, adquirindo caráter político, jurídico e administrativo,
responsável pela manutenção da ordem interna e defesa dos interesses do Estado em
suas relações internacionais.
Analisando finalmente o que se entende por soberania estatal, componente
essencial e imprescindível na composição do Estado tal como ele é, pode-se interpretála como sendo uma característica que veio se desenvolvendo em comunhão à
desenvoltura do direito internacional. Esta inter-relação pode se comprovar uma vez que
a noção de soberania traz atrelada em si uma série de princípios e considerações
oriundas da jurisprudência internacional (BOBBIO, N; NOGUEIRA, M. 2000).
Assim como se é sabido, o Estado veio se arquitetando socialmente ao longo da
história, até que logrou adquirir status de uma instituição poderosa e influente tanto no
meio interno como no internacional. Dessa forma, de modos a ceder status legítimo ao
Estado no plano nacional e, de procurar manter uma ordem no sistema internacional – o
qual é caracterizado pela natureza anárquica9 -, a soberania estatal impera como sendo
detentora de um poderio supremo dentro dos limites territoriais do Estado; e no plano
internacional, valendo-se dos princípios de independência e igualdade, concede aos
Estados o mesmo poder e nível hierárquico (BULL, H. 2002).
Nesse sentido é a soberania estatal que outorga ao Estado agir livremente, tendo
autonomia e sendo detentor legítimo do poder em seu ambiente doméstico, assim como
ser detentor de personalidade jurídica especifica e sem vínculo de subordinação no
ambiente internacional. Cabe pontuar que todas as características que compõem a
9
O motivo pelo qual o sistema internacional é composto por um ambiente de anarquia se da pelo fato que
nas relações internacionais, diferentemente do que ocorre nas relações domésticas, há a inexistência de
um poder central ou hierárquico entre as partes que o compõem. Assim sendo, não existe um poder
supranacional que norteie ou controle as diversas relações existentes, sendo estas de qualquer ordem
(BULL, H. 2002).
218
soberania e permeiam no Estado foram norteadas no campo de estudos do direito, em
particular do direito internacional (BOBBIO, N; NOGUEIRA, M. 2000).
Assim sendo, é através das características específicas de cada elemento aqui
abordado que surge o Estado nas relações internacionais, passando também a adquirir
status de sujeito do direito internacional. No que diz respeito a seu papel de sujeito de
direito, pode se destacar o fato de ser o Estado o responsável em representar-se no rol
do ambiente internacional, quando assim for necessário, bem como quando achar
pertinente.
O Estado ainda traz atrelado a si uma serie de questões que lhe são particulares,
tais como ser o único sujeito do direito internacional capaz de celebrar Tratados e
integrar Organizações Internacionais, sendo o responsável por cumpri-los e reger-los,
valendo-se e estando protegido pelos princípios e normas do ordenamento jurídico
internacional (PELLET, A. 2003).
2.2 As Organizações Internacionais
Desenvolver uma análise tendo como objeto de estudo as Organizações
Internacionais requer uma abordagem histórica, que como no caso dos Estados, remonta
aos primórdios das relações internacionais. Essa abordagem se torna necessária para que
se possa compreender como foram se desenvolvendo as interações entre seus atores, em
busca de seus interesses, e como o direito internacional veio ordenando-os.
As Organizações Internacionais surgiram com o objetivo de defender interesses
estatais em comum, pautadas sobre o princípio da cooperação entre seus membros.
Estas, que são compostas primordialmente por Estados, são munidas de caráter
intergovernamental que, como o próprio nome diz, são geridas por autoridades
soberanas, responsáveis por sua vez em legitimar-lhes a atuação no cenário
internacional. Assim, como se deve presumir, tais instituições vieram se constituído
posteriormente ao surgimento dos Estados, tendo como berço a Europa do século XIX,
marcada por uma vasta gama de interesses nacionais que careciam de organização para
serem bem direcionados10 (HERZ, M; HOFFMANN, A. 2004).
Torna-se importante
pontuar que pelo fato das organizações serem compostas por diversos Estados, estas se
10
Podem ser citadas como primeiras Organizações Internacionais a Comissão Central do Reno (1815) e a
Comissão Européia do Danúbio (1856) que se tratavam de acordos realizados entre as principais
potências européias em prol de se regulamentar o usufruto dos mais importantes rios presentes em tal
continente. DAILLIER, P; DINH, N; e PELLET, A. Direito Internacional Público, Ed: 1999, pg. 524.
219
caracterizam por um multilateralismo 11 no qual devem lidar com interesses de natureza
variada. No entanto, de forma a ceder-lhes um ordenamento funcional e jurídico, estas
ficam submetidas a regras e normas pré-estabelecidas e acordadas por um Tratado
constitutivo. Estes tratados por sua vez, são os responsáveis por institucionalizar-las, no
intuito de delegar-lhes as funções, responsabilidades e obrigações, padronizando-as
dessa forma não apenas como instituição, mas como também frente à arena
internacional na qual desempenham suas ações (TRINNDADE, A. 2002).
Nesse sentido, devido ao fato de serem constituídas por entidades soberanas e
ao mesmo tempo serem pautadas por tratados constitutivos, nos quais os próprios
Estados lhe delegam a função de representação, as organizações passam a desempenhar
um papel preponderante
em suas relações. Isso ocorre em função de serem
consideradas um dos sujeitos do direito internacional com maior proeminência, em
razão principalmente de possuírem uma autonomia particular e especifica em suas
interações.
Assim sendo, as Organizações Internacionais tem a competência de representar e
defender seus interesses de forma legítima e autônoma, detendo poder de negociação e,
podendo até mesmo firmar acordos em âmbito internacional, acarretando deveres e
obrigações às partes envolvidas. A partir desses atributos percebe-se que tais
instituições se assemelham bastante a forma de atuação estatal, se diferenciando no
entanto quanto ao nível de soberania que detém (TRINNDADE, A. 2002).
Isso se explica analisando-se o grau de abrangência que o atributo da soberania
concede a tais instituições, pois, mesmo essas organizações sendo compostas por
Estados e serem suas representantes legais, é o Estado que lhe transfere o poder
soberano. Dessa maneira, afirma-se que o nível do poder soberano presente nas
organizações aplica-se de forma variada de acordo com cada situação específica.
Seguindo-se essa lógica, a soberania assume sua plenitude desde que não se choque ou
vá contra as vontades estatais, devido ao fato de estarem em última instância
submetidos e condicionados à estas entidades (HERZ, M; HOFFMANN, A. 2004).
Outra competência presente nas instituições em questão, e o de servirem como
foro de negociação e mediação, relativo aos assuntos que defendem, os quais
encontram-se constituídos nos tratados que lhes da origem. De forma a exemplificar tais
11
As Organizações Internacionais são providas de caráter multilateral pois devem ser compostas
necessariamente por um numero de três ou mais membros. Caso contrário, estas assumiriam um caráter
uni ou bilateral, característica essa que não se aplica a uma organização (HERZ, M; HOFFMANN, A.
2004).
220
competências, podem ser citadas as inúmeras conferências e pareceres consultivos
requisitados as Nações Unidas – considerada uma das principais organizações existentes
- no intuito de se procurar solucionar questões que ponham em risco a ordem e paz
internacional (KRASNER, S. 1983).
Por fim, cabe pontuar que mesmo as organizações tendo como seus principais
integrantes os Estados participantes na formulação dos ratados que lhes deram origem,
estas podem ser compostas igualmente por outros Estados - que passam a se integrar de
forma associada -, ou até mesmo por membros não estatais, tais como organizações nãogovernamentais12 – agregados como observadores. Quanto ao poder de agência dos
respectivos membros, os associados acabam tendo os mesmos direitos dos Estados
permanentes, com exceção ao poder de voto; já no que confere aos membros
observadores, esses acabam desempenhando um poder um pouco mais limitado, tendo
direito apenas a se pronunciarem quando assim forem solicitados (TRINNDADE, A.
2002).
2.3 Os Indivíduos
Partindo-se do pressuposto que temos um sistema internacional formado por
Estados detentores de autonomia e poderes soberanos, valendo-se ainda da afirmativa
que é competência legitimada do Estado gerir, defender e representar os interesses
nacionais, torna-se interessante abarcar as questões relativas à classificação dos
indivíduos como agentes e sujeitos do direito internacional.
Os Indivíduos, que em conjunto compõem a população dos Estados, são partes
integrantes fundamentais na própria constituição e dinâmica presente nas relações
internacionais. Pode-se dizer que os acontecimentos e evoluções que pairaram entorno
da sociedade internacional ao longo dos anos, teve necessariamente a figura do
indivíduo como interlocutor e agente, tanto nas tomadas de decisões como também no
desenrolar de suas ações.
Concomitantemente, sentiu-se a necessidade de se prover um aparato legal de
representação ao indivíduo no bojo de suas relações sociais, políticas e econômicas,
tarefa essa que passou ser desempenhada por parte do direito. Nesse sentido, a
sociedade veio sendo acompanhada e norteada por uma jurisdição responsável em
12
As Organizações Não Governamentais (ONG‟s) são entidades constituídas por parte da saciedade civil
organizada em que se reúnem em torno da defesa de causas em comum, e que como o próprio nome diz,
encontram-se desvinculadas dos governos estatais.
221
ceder-lhe direitos e obrigações cruciais para sua desenvoltura e boa convivência. De
maneira a exemplificar alguns dos princípios fundamentais que perduraram na
sociedade ao longo dos anos, e por via de conseqüência no indivíduo, podem ser citados
aqueles que defendem o direito à vida e o da nacionalidade, características estas que
concedem ao indivíduo um laço de pertencimento à uma determinada região ou Estado
e o direito à própria existência (PELLET, A. 2003).
Assim sendo, o indivíduo veio adquirindo certas características ao longo da
história que lhe proporcionaram assumir um patamar preponderante frente à questões de
extrema importância para com o mundo e consigo mesmo, fato esse responsável por
conceder-lhe personalidade jurídica especifica frente as relações internacionais.
Nesse sentido, em razão de ser reconhecido pelo direito internacional como seu
sujeito, este passou a deter poder de agência dentro do cenário internacional dispondo,
porém, de uma competência limitada devido ao fato do indivíduo ser parte integrante do
Estado e estar sob seu condicionamento. Esta limitação de agência se explica
principalmente em função do Estado estar legitimado pelo princípio da soberania, que
por sua vez lhe designa poderes exclusivos, que dentre outros, tem a função de
representar legalmente sua população e se responsabilizar por ela, deixando seus
indivíduos em situação de dependência e com restrita margem de ação (PELLET, A.
2003).
No entanto, cabe pontuar que se por um lado os indivíduos estejam atrelados aos
Estados por não possuírem poderes soberanos frente suas ações, por outro, também são
detentores de um aparato legal, condicionado pela jurisprudência internacional, que lhe
outorga o direito de poderem se representar e se defender. Servindo como exemplos da
atenção cedida pelo direito internacional nesse assunto, podem ser citadas a Convenção
Universal dos Direitos Humanos, aprovada pela Assembléia Geral das Nações Unidas
em 1948, e a Carta das Nações Unidas 13, que trazem agregados direitos fundamentais do
homem pautados nos princípios dos valores da pessoa humana 14 (TRINNDADE, A.
2002).
Dessa forma, pelo fato dos indivíduos passarem a ser protegidos pelo direito
internacional e lhe serem concedidos poderes de agência, estes acabam exercendo o
13
A Carta das Nações Unidas foi o documento que deu origem a Organização das Nações Unidas (ONU),
assinada em 26 de junho de 1945 na cidade de São Francisco – EUA.
14
Esses princípios e valores defendem, regra geral, que a pessoa humana possua uma vida digna
independente de raça, sexo, religião ou língua. Ou seja, que cada indivíduo tenha a liberdade de viver de
acordo com seus valores morais e culturais (TRINNDADE, A. 2002).
222
papel de sujeitos, podendo recorrer a instituições tais como as Organizações
Internacionais ou Cortes em prol dos Direitos Humanos, no intuito que sejam
defendidos ou representados seus interesses. Cabe pontuar finalmente que esses
interesses devem respeitar os princípios atrelados à soberania estatal para que possam
ser considerados como pertinentes e legítimos na dinâmica das relações internacionais
(PELLET, A. 2003).
2.4 Movimentos de Libertação Nacional (MLN)
Os MLN, como o próprio nome indica, estão relacionados com uma causa de
cunho nacionalista, no sentido de procurarem se libertar de alguma forma de dominação
seja esta colonial15, econômica ou política e, conseqüentemente, alcançarem uma
integridade identitária relacionada com a constituição de um Estado, em seu sentido
moderno.
Assim sendo, para que um MLN seja classificado como tal, este precisa
primeiramente passar por um processo de aprovação frente às Nações Unidas, composto
basicamente pelos seguintes procedimentos: Em primeiro lugar, o MLN deve receber
um reconhecimento prévio realizado por meio de uma Organização Internacional –
independentemente de qual seja esta -, de forma a ser digno de uma legitimidade na
esfera internacional. Posteriormente, a partir do momento que este MLN seja possuidor
de tal reconhecimento, este passa por um processo de aprovação e confirmação
desempenhado pelas Nações Unidas, através dos Estados componentes de sua
Assembléia Geral (PELLET, A. 2003).
Logo após ser aprovado pelas Nações Unidas, o MLN passa a ser detentor de
uma personalidade jurídica internacional, ou seja, passa a se tornar um Sujeito de
Direito Internacional. Não obstante, essa classificação de Sujeitos de Direito
Internacional cedida aos MLN é passível de uma análise mais detalhada, pois, esta é
possuidora de certas características intrínsecas e peculiares à tais movimentos 16.
15
Podem ser citados como exemplo o Movimento Popular de Libertação de Angola, o Movimento de
Independência da Argélia e a Frente de Libertação de Moçambique, que auxiliaram no processo de
independência, a partir de meados do século XX, nos respectivos países africanos.
16
Os MLN são convidados na ONU a titulo de “observadores” a participar nos trabalhos referentes à
Assembléia Geral. Com isso, lhes são concedidos direitos superiores aos que são reconhecidos às ONG‟s,
estando privados apenas das seções plenárias e das reuniões do Conselho de Segurança. Com isso,
percebe-se que a personalidade jurídica internacional dos MLN é por definição temporária, devido ao
fato de ainda estarem atrelados ao Estado, passando a ser definitiva a partir do momento que se tornem de
fato os próprios Estados. Ver à propósito PELLET, A. Direito Internacional Público, Ed: 2003, pg. 536 e
537.
223
Algumas destas características peculiares, dizem respeito aos limites de atuação
dos MLN frente às decisões e acontecimentos internacionais. Podem ser citados como
forma a exemplificar tal raciocínio, a questão que essas entidades, apesar de serem
convidadas e aceitas nos foros internacionais, não são dignas de poder de voto, mas
apenas de voz, frente às inúmeras decisões desempenhadas por exemplo nas
dependências da ONU (PELLET, A. 2003).
Com isso percebe-se então que apesar dos MLN possuírem atrelados a si
aspectos de personalidade jurídica, estes ainda continuam dependentes à vontade dos
Estados como entidade, pois necessitam de um consentimento estatal para que passem a
ser considerados sujeitos de direito, além de não serem detentores de uma autonomia
plena frente às decisões que envolvam suas atuações no cenário internacional,
dependendo, por exemplo, do voto estatal para realizar determinadas atividades.
Contudo, apesar das já mencionadas limitações que os MLN possuem no bojo de
suas Relações Internacionais, estes ainda podem participar na formação de alguns tipos
de tratados internacionais, fazendo referência por exemplo aos tratados relativos à
condução da luta armada, acordos estes que tem o intuito de negociar o desempenho dos
conflitos belicosos entre os diversos MLN; também tratados que possuem certas
características de atos constitutivos de Organizações Internacionais, haja vista o caso da
Organização de Libertação da Palestina (OLP), por meio da qual exerce a função de
representar o Estado da Palestina frente ao cenário internacional; outro modelo de
tratado internacional composto pelos MLN são os referentes aos Acordos de
Independência, entorno dos quais estes movimentos passam a ser considerados Estados
nacionais propriamente ditos, além de também, passarem a ser detentores das
características plenas presentes nos Sujeitos de Direito Internacional (PELLET, A.
2003).
3 APRESENTAÇÃO HISTÓRICA DAS FARC
Para se compreender como as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia
(FARC) surgiram e se fundamentaram ao longo do tempo é necessário tomar-se como
análise o Estado colombiano e a conjuntura internacional presente no contexto regional
da segunda metade do século XX.
Os primórdios do surgimento das FARC tem sua origem procedente do combate
e ataques constantes por parte do governo colombiano – de viés liberal – contra grupos
224
e cooperativas de agricultores que se mobilizavam à favor de melhorias de condições de
vida, inspirados e pautados sob ideais socialistas. Tais ataques ocorriam com o objetivo
de se impedir a organização de movimentos comunistas e revolucionários que
contestassem ou pusessem em risco a estrutura do Estado colombiano (PARDO, Rafael,
2000).
Pode-se tomar o ano de 1966 como marco da fundação das FARC, tendo como
seus principais responsáveis Manuel Marulanda Velez ou “Titofijo”, Jacobo Arenas e
outros membros proeminentes do Partido Comunista Colombiano que adotaram esta
denominação para designar o grupo na segunda reunião de agricultores rebelados contra
o governo colombiano na região de Marquetalia. As FARC têm suas raízes na luta dos
movimentos de auto defesa Liberal e Comunista durante o período conturbado e de
fortes repressões do governo, mas surgiu de fato como grupo guerrilheiro após os
ataques militares aos campesinos, quando após terem sido desalojados pelo exército,
passaram a se agrupar em guerrilhas móveis (PARDO, Rafael, 2000).
É importante pontuar que o Estado colombiano, naquele contexto, passava por
uma série de problemas estruturais de ordem econômica e política que refletiam de
maneira geral em toda sua sociedade e, de maneira especifica, em seus setores mais
carentes e fragilizados tais como a população campesina. Nesse sentido, pelo fato dos
contingentes mais debilitados do Estado não receberem uma assistência social que
condiziam com suas expectativa, percebe-se que se começava a arquitetar a formulação
de um organismo, que visava responder e suprir as necessidades eminentes presentes na
sociedade colombiana, criando-se portanto o campo propício para o surgimento das
FARC. A partir desse momento, percebe-se a mobilização de agentes que mesmo
estando desvinculados dos aparatos estatais passavam a se posicionar de forma
proeminente entorno da defesa das causas da população marginalizada (MEZA, R.
2001).
As FARC, que se fundamentou através dos princípios e ideais socialistas – tendo
ênfase na reforma agrária e projetos anti-imperialistas e anti-capitalistas -, também se
desenvolveu entorno das idéias defendidas pelo líder latino-americano Simon Bolívar17,
assumindo em função disso um caráter nacionalista, apoiando uma autosustentabilidade e independência frente a intervenções externas. Nesse sentido as FARC
17
Simon Bolívar (1783-1830) foi um aristocrata em que lutava e defendia a idéia da libertação da
América Latina no período colonial, ou seja, a independência dos países. Atualmente, ele se tornou
símbolo da luta contra as influências externas nos países latino americanos, podendo se citados
principalmente a Venezuela, a Bolívia e a Colômbia (URQUIDI, 1970).
225
surgiu como uma organização preocupada com o progresso social, político e econômico
do Estado colombiano, mais especificamente da população colombiana que não detinha
meios para tal desenvolvimento, responsabilizando conseqüentemente a Colômbia por
não fornecer os recursos básicos necessários (MEZA, R. 2001).
A partir de uma análise sobre a história da Colômbia, constata-se que a segunda
metade do século XX foi marcada por uma época de fortes instabilidades, oriundas
principalmente por não possuir uma economia estabilizada e um poder político
centralizado, passando a estar suscetível à influencias externas, tal como foi detectada a
proximidade da nação norte-americana e sua influência em assuntos de ordem interna.
Destaca-se nesse contexto como se constituía o sistema internacional, marcado pelo
ambiente da Guerra Fria 18 e, regido por um delicado equilíbrio de poder no qual estava
em disputa a influência das diversas regiões do planeta, sob a égide das duas principais
potências mundiais - EUA e URSS (MEZA, R. 2001).
Assim sendo, a situação da sociedade colombiana que desprovia de assistência
social, econômica e política básica, ficou ainda mais prejudicada pelo fato do Estado
colombiano além de não ser capaz de suprir as necessidades de sua população, passar a
estar sob a influência de uma potência mundial. Esse fato prejudicava ainda mais os
setores necessitados da população, uma vez que a assistência estatal que já era precária
passou a ser mais debilitada em função da Colômbia ter se vinculado à área externa,
deixando de dar a devida atenção as questões internas e nacionais (AMIN, M. 2004).
A partir destas informações evidencia-se que as FARC se constituíram
enfatizando a necessidade de se ceder mais atenção aos setores postos à margem da
sociedade, tais como os camponeses, indígena e operários, uma vez que estes não
possuíam os meios de reivindicarem seus direitos. Nota-se também que as causas
defendidas por seus membros, como Manuel Véles – um de seus fundadores, partem de
pressupostos e princípios de viés marxista, devido ao fato de estes estarem sobre a
influência das ideologias socialistas presentes no embate de choque entre os Estados da
Guerra Fria e, conseqüentemente, se oporem as práticas da vertente neoliberal existentes
em seu país em tal época (AMIN, M. 2004).
Com isso, destaca-se ainda que as FARC se consideram como um grupo político
organizado, por meio do qual procuram alcançar um desenvolvimento nacional
18
A Guerra Fria que teve seu início a partir da década de 1950, foi um conflito que trazia atrelado à si
disputas entre as ideologias de viés socialista e capitalistas, estando estas representados principalmente
pelo URSS e os EUA, respectivamente.
226
alternativo em contra-oposição à aquele desempenhado pela Colômbia, acreditando que
serão capazes de levantar recursos e conquistarem a confiança da população civil,
alcançando com isso um status legitimo frente as questões e práticas que desempenham.
Entretanto, devido a pouca aceitação por parte principalmente dos EUA e da
Colômbia, em função das práticas de caráter ilícitos desempenhadas por esta entidade,
haja vista o financiamento de suas ações por meio do capital arrecadado pelo
narcotráfico,
contrabando de armas e, até mesmo, pela práticas de seqüestros em
território colombiano, as FARC também são classificadas com grupo terrorista,
passando-lhes a ser rechaçadas qualquer tipo de apoio, seja político ou institucional
frente as causas que declaram defender (MEZA, R. 2001).
Não obstante, se analisarmos o grau de aceitação da população campesina
presente no interior do Estado colombiano, percebe-se que há uma certa adesão e
simpatia para com as causas desempenhadas por esta entidade, podendo ser melhor
evidenciado no quadro a seguir:
Quadro 1: Décadas do crescimento das FARC-EP nos municípios
colombianos
Ano
1964
1970
1979
1985
1991
1995
1999
2004
Municípios
4
54
100
173
437
622
1.000
1.050
Percentagem de Municípios
0,04
0,50
9,00
15,00
42,00
59,00
95,00
100,00
Fontes : Grace Livingstone, Inside Colombia (London: Latin American Bureau, 2003), 8; James F.
Rochlin, Vanguard Revolutionaries in Latin América (London: Lynne Reinner Publishers, 2003), 99;
FARC-EP, FARC-EP Historical Outline (Toronto: International Commission, 2000), 14; Jesus Bejarano
Ávila, Camilo Enchandia, Rodolfo Escobedo & Enrique Querez, Colombia: Inserguridad, Violencia Y
Desempeno Economico en las Areas Rurales (Bogotá: Universidad Externado de Colombia, 1997), 133;
Timothy Wickham-Crowley, Guerrillas & Revolution in Latin America (Princeton, N. J.: Princeton
University Press, 1992), 109-10; Jorge P. Osterling, Democracy in Colombia (Oxford: Transaction
Publishers, 1989), 99. (Dados retirados do Artigo de BRITAIN, J. James. Uma Excepção Revolucionária
numa era de expanção imperialista. Disponível em <<http://resistir.info/colombia/brittain_farc.html>>
acessado em 20 de março de 2010.
Este quadro evidência, no transcurso de quarenta anos a partir do surgimento das
FARC, um crescimento evolutivo por parte da população rural colombiana. Percebe-se,
analisando-o atentamente, que houve um constante apoio de nacionais que estiveram em
227
busca de uma maior proteção ou segurança, devido principalmente ao pouco caso
cedido a estes pelas autoridades governamentais.
Nesse sentido, destaca-se que apesar das FARC ser muitas vezes desaprovada
pela opinião pública internacional, e até mesmo confrontada e perseguida por certos
Estados, esta ainda vem sendo aderida por cidadãos colombianos, em que passam-lhe
ceder a estrutura necessária para que continue atuando e representando seu interesses
ao longo dos anos. É importante pontuar no entanto o caráter polêmico atrelado a esta
organização no desenvolver de sua história, característica esta responsável por inúmeros
estudos e analises acerca do tema e que será apresentado nesse trabalho.
3.1 O Terrorismo
Compreender e analisar o que vem a ser o fenômeno do terrorismo não é uma
tarefa muito simples, pois se trata de um conceito desprovido de uma idéia ou definição
aceita universalmente, sendo submetido por sua vez à uma variedade de estudos
analíticos por parte das diversas áreas do conhecimento tal como é o caso do próprio
Direito Internacional (PELLET, S. 2003).
Assim como os fenômenos presente ao redor do mundo por exemplo19, o
terrorismo também padece de certas dificuldades que lhe são inerentes, tais como a não
existência de um parâmetro capaz de qualificá-lo ou quantificá-lo de acordo como sua
intensidade ou amplitude. Outra característica que pode ser citada como pertencente a
tal fenômeno, diz respeito à sua aparição muitas vezes inesperada e repentina, ou seja,
sem um aviso prévio de onde, como ou quando ocorrerá (PROENÇA, D; DINIZ, E.
1999).
De acordo com os primórdios da palavra, o terrorismo é proveniente da
expressão latina terror, a qual foi incorporada pela língua francesa em 1335 (com a
expressão terreur) designando: “um medo ou uma ansiedade extrema correspondendo,
com mais freqüência, a uma ameaça vagamente percebida, pouco familiar e largamente
imprevisível” 20. No entanto essa definição se esbarrava com uma série de problemas de
caráter conceitual, em que por se tratar a primeira tentativa de classificação do termo do
19
São citados nesse caso os fenômenos da natureza tais como tempestades, furacões, maremotos,
terremotos e etc, em que quando ocorrem não é possível bem ao certo traçar-lhes suas origens nem
tampouco suas conseqüências.
20
Para mais informações ver: GUILLAME, G. Terrorisme et Droit Internationa, R.C.A.D.I., vol. 215,
1989-III, p.296. (PELLET, S. A Ambigüidade da Noção do Terrorismo, IN______ BRANT, L.
Terrorismo e Direito, 2003).
228
qual se tem notícia – pelo menos no mundo ocidental -, traz atrelado a si uma definição
muito ampla e generalista.
Nesse sentido, com o passar dos anos, o termo terrorismo foi sendo interpretado
de maneira distinta, passando a adquirir características particulares que o classificavam
de acordo com a época e período histórico em que se encontrava. Com isso, traçando-se
uma evolução histórica do termo em questão, percebe-se que no final do século XVIII com o advento da Revolução Francesa - este era considerado uma política exclusiva do
Estado, pelo fato das autoridades terem implementado uma governança que se
legitimava e requeria respeito pautada, em uma lógica de ameaça e prática de terror
(PELLET, S. 2003).
Posteriormente, no final do século XIX e com o surgimento de grupos
extremistas ou facções nacionalistas exacerbadas – tais como são exemplos os Niilistas
da Rússia ou os Anarquistas presentes na Europa - evidencia-se uma mudança no
sentido do termo. Essa mudança diz respeito à passagem de um terrorismo de Estado,
presente na já mencionada Revolução Francesa, para um terrorismo contra o próprio
Estado, ou seja, atos designados a ferir a integridade e soberania estatal (BRANT, L.
2006)
Dessa forma, acompanhando-se ainda o transcurso histórico à procura de uma
identificação e definição do fenômeno aqui abordado, destaca-se que este atravessa o
século XX sendo objeto de largas discussões e interpretações nos diversos foros
mundiais e pelos inúmeros Estados componentes do sistema internacional. Pode-se
dizer que o terrorismo assume o atributo internacional após o incidente acorrido em
Marselha (França) no ano de 1934, no qual são assassinados, por via de um cidadão
croata, o Rei Alexandre I da Iugoslávia e um Ministro Francês de Assuntos
Estrangeiros, despertando uma eminente preocupação por parte da comunidade
internacional em procurar-se compreender e tipificar o fenômeno em questão
(PELLET, S. 2003).
Assim sendo, passou a se tornar um assunto amplamente discutido e analisado
no âmbito da Liga das Nações, passando posteriormente para as dependências da
Organização das Nações Unidas, assim como no bojo dos demais encontros ou
Organizações internacionais que percebiam a necessidade eminente de se proteger
contra uma ameaça internacional e de poderem contribuir para manutenção da paz
mundial (BRANT, L. 2006).
229
Destarte, foram se criando uma série de conceitos como ocorreu no artigo
primeiro da primeira Convenção de Genebra de 1937 em que:
na presente Convenção, a expressar „atos terroristas‟ quer dizer fatos
criminosos dirigido contra um Estado, e cujo objetivo ou natureza é
provocar o terror em pessoas determinadas, em grupo de pessoas ou no
público (PELLET, S. 2003).
Assim como é procurado ser definido por estudiosos como o francês Antoine
Sottile, em que o classifica como sendo: “O ato criminal perpetrado mediante terror,
violência ou grande intimidação, tendo em vista a alcançar um objetivo determinado” 21.
Já Antonio Cassese, caracteriza o terrorismo como sendo:
(...) qualquer ato violento contra pessoas inocentes como a intenção de
forçar um Estado, ou qualquer outro sujeito internacional, para seguir uma
linha de conduta que, de outro modo, não seguiria, é um ato de terrorismo
(PELLET, S. 2003)22.
Cabe pontuar, entretanto, que mesmo havendo a existência de definições por
parte de organismos internacionais, bem como por parte de estudiosos sobre o assunto,
ainda não se foi possível chegar à um consenso – entre os diversos atores que compõem
as Relações Internacionais – acerca do que vem a ser de fato o fenômeno do terrorismo.
Essa dificuldade de classificação pode estar atrelada em grande medida na influência em
que o terrorismo passa a exercer sob determinado ator, sendo esta questão responsável
por sua vez pela tipificação do objeto de estudo.
Não obstante, com o advento do século XXI e certos acontecimentos
catastróficos acorridos no cenário internacional em função do terrorismo – tais como o
atentado de 11 de setembro nas torres de World Trade Center em Nova York; e as
explosões das bombas no metro de Madri em 11 de março de 2004 -, alerta a sociedade
internacional sobre a necessidade eminente de se compreender o fenômeno, em suas
diversas facetas, para se prevenir das ameaças e manter a segurança internacional.
21
22
Ver nota de roda pé n. 24, p. 17 de (PELLET, S. 2003).
Ver nota de roda pé n. 29, p. 18 de (PELLET, S. 2003).
230
4
A
ÁREA
DE
INFLUÊNCIA
DAS
FARC
E
SUAS
DIVERSAS
CLASSIFICAÇÕES
Considerando a explanação de informações, presentes nos capítulos anteriores,
relacionadas à como se fundamentaram ao longo da história as Forças Armadas
Revolucionárias da Colômbia (FARC), juntamente com o que vem a se entender como
sendo um Movimento de Libertação Nacional e o fenômeno do terrorismo,
desempenhar-se-á uma análise que terá o objetivo de procurar compreender qual a
relação existente entre esses três fatores.
Desta forma, de modo a propiciar o desenvolvimento de tal análise, serão corelacionados tanto elementos conceituais quanto teóricos, além de fazer menção aos
principais acontecimentos que se fizeram presentes e, de alguma forma, marcaram a
atuação das FARC perante a opinião pública e a sociedade internacional, principalmente
no que concerne aos últimos anos.
Para tanto, será necessário voltar a se fazer referência aos primórdios da
formação das FARC como entidade, para que se possa a partir daí pontuar algumas
características intrínsecas a tal organização. A principal delas compreende os próprios
princípios constitutivos das FARC como entidade, para que através deles se possa
melhor compreender quais foram os propósitos basilares de sua formação. Assim sendo,
destaca-se que os motivos condicionantes para a formulação de tal entidade giraram
entorno de aspirações que visavam a conquista de um desenvolvimento nacional
alternativo, uma vez que na década de 1960 a Colômbia - assim como a maioria dos
países da América Latina -, permanecia sobre uma forte influência de políticas neoliberais por parte dos Estados Unidos da América 23.
Estas aspirações, de um desenvolvimento nacional alternativo na Colômbia,
referiam-se essencialmente ao fato de procurarem propiciar a seus integrantes - em sua
maioria campesinos e agricultores, uma vida digna, não mais dependentes em sua
totalidade do Estado colombiano, que por sua vez estava influenciado, político e
economicamente pelas potências estrangeiras e que, em detrimento deste fato, não lhe
era cedia a assistência necessária a seu povo. Assim sendo a organização das FARC,
tinham como objetivo alcançarem um desenvolvimento auto-sustentável, pois, estavam
diretamente ligadas a vontade de lograrem desempenhar um desenvolvimento
23
Esta menção faz referência a uma série de golpes militares, presentes no continente latino americano a
partir de meados do século XX.
231
autônomo. Nesse sentido, percebe-se que foi através deste argumento que a organização
passou a se consolidar ao longo de sua história, fazendo menção em seus
pronunciamentos, que estiveram, assim como continuam estando, a favor de uma causa
nacionalista e legítima, devido ao fato de acreditarem e defenderem seu próprio
desenvolvimento nacional (AMIN, M. 2004).
Desta forma observa-se que, de acordo com os integrantes das próprias FARC,
esta pode ser considerada como um Movimento de Libertação Nacional propriamente
dita, tendo em vista as considerações e a auto-denominações anteriormente
mencionadas, realizadas por seus membros. Contudo, antes de se definir estritamente se
as FARC são dignas, ou não, de uma classificação entorno do que se é definido como
sendo um MLN, é preciso se levar em consideração não apenas seus objetivos, ou
resultados esperados a serem alcançados, mas também os meios utilizados para tal.
Sendo assim, passando a observar os meios utilizados pelas FARC nas práticas
de suas ações, percebem-se algumas particularidades que merecem ser mais bem
analisadas. Partindo-se do pressuposto que esta entidade exerce suas atividades
financiadas, na maioria das vezes, através do dinheiro arrecadado pelo narcotráfico de
drogas, além de uma série de outros atos ilícitos, haja vista por exemplo, a prática de
seqüestros e contrabando de mercadorias ou de armas, se torna complicado e complexo
defini-las como pertencentes a um MLN legítimo (MEZA, R. 2001).
De modo a melhor exemplificar a prática de ilicitudes desempenhadas pelas
FARC, são factíveis de destaque os seguintes indícios, cada uma de acordo com suas
peculiaridade. Segundo pesquisas oficiais elaboradas pelo Fundo Nacional para a
Defesa da Liberdade Pessoal (Fondelibertad), vinculados ao governo colombiano, a
incidência de seqüestros praticados pelas FARC de 1996 até 2008 são altíssimos,
mantendo sobre seu domínio uma media de reféns que ultrapassam a cifra de 700
(setecentas) pessoas por ano. Dentre estes reféns, estão incluídos personalidades
importantes da vida política e econômica da Colômbia, em que são mantidos em
cativeiro por uma extensa data, até que passam a ser negociados por meio do pagamento
de resgates ou, servirem de barganha para a libertação de seus membros que foram
presos pelas autoridades legais.
O narcotráfico e o contrabando de mercadorias também podem ser citados como
artifícios fortes que agem de forma a alimentar financeiramente as FARC, pois juntas
são responsáveis por movimentar quantias que giram entorno dos dois bilhões de
dólares anuais. Dentre as principais drogas e mercadorias contrabandeadas constam a
232
cocaína24, a maconha e a intensa comercialização de arsenal bélico que servem para
armar e concederem um poder relativo a esta entidade, frente às forças que tentam
combatê-las (MEIRA, L. 2007).
Desta forma, percebe-se que muitos dos meios utilizados pelas FARC de modo a
lograrem alcançar seus objetivos são exercidos de forma ilícita e fora dos padrões ou
normas, aceitas pelas instancias jurídicas internacionais. Estas práticas, além de serem
desaprovadas pelos órgãos jurisdicionais internacionais, tais como a ONU, passam a
acarreta-lhe também uma desaprovação da opinião pública mundial, que por sua vez
recrimina tais atos por não os considerarem corretos ou aceitáveis, tamanha a crueldade
praticada por seus membros.
Outra questão importante a ser mencionada é a discussão entorno da qual surge a
polêmica de como as FARC vem sendo denominadas pela sociedade internacional nos
últimos anos, principalmente por alguns Estados, tais como os Estados Unidos, o
Canadá, a Inglaterra e a própria Colômbia.
Segundo a definição concedida pelos Estados Unidos às FARC, no mandato do
presidente George W. Bush, este as denomina como sendo um grupo terrorista 25 na qual
a considera como uma ameaça inerente a paz mundial e que deve ser combatida,
independentemente de quão custoso isso se torne (AMIN, M. 2004).
Desta forma, em parceria ao governo de Álvaro Uribe, os Estados Unidos
promovem um plano denominado “Plano Colômbia”, em que consistia principalmente
formar uma Força Nacional de combate aos grupos terroristas insurgentes e a
erradicação do cultivo da folha de coca, ou seja, às FARC e suas práticas. Este plano
passaria a ser financiado, econômica e tecnologicamente pelos EUA, além de possuir
um acompanhamento periódico de oficiais norte americanos no território colombiano e
nas dependências de suas Forças Armadas. Posteriormente a este “Plano Colômbia”,
surgiu à tona um segundo plano, denominado desta vez como o “Plano Patriota”, em
que basicamente serviria como continuidade ao anterior, desenvolvendo as mesmas
práticas e aspirando os mesmos objetivos, se diferenciando apenas nas quantias de
investimentos financeiros que lhe passaram a ser em quantias maiores (MEIRA, L.
2007).
24
A Colômbia é líder no ranking entre os países que produzem cocaína no mundo (MEIRA, L. 2007).
Existe uma extensa discussão entorno da qual se define a partir de quais circunstancias um determinado
grupo pode ser classificado como terrorista. Neste caso especifico, os Estados Unidos referem-se às
FARC como terrorista pelo fato desta praticar e disseminarem o terror no meio da sociedade. Para mais
detalhes ver: BRANT, L. Terrorismo e Direito, Ed: Forense, 2003.
25
233
Porém, não são todos os Estados que compartilham com a definição cedida pelos
Estados Unidos e seus aliados, classificando as FARC como grupos terroristas.
Podemos destacar como exemplo a esta não conformidade, o posicionamento da
Venezuela no cenário internacional, em que através de seu líder Hugo Chavez passa a
criticar e a questionar a postura dos EUA frente a tal definição.
Segundo Hugo Chavez, a classificação de terroristas atribuída às FARC é
concedida de forma equivocada, pois de acordo com ele esta entidade compõe um
verdadeiro exército que ocupa o território colombiano e, portanto precisa ser
reconhecido como força insurgente que além de possuir um projeto político, este é
legítimo (NETO, R. 2008).
Independentemente se esta afirmação, feita pelo representante da Venezuela,
seja verdadeira ou não, o fato é que se iniciou a partir das intermediações realizadas por
este chefe de Estado um longo processo de negociações, entorno do qual estavam sendo
barganhadas as possibilidades de libertação de alguns dos reféns mantidos sobre o
domínio das FARC.
Estas negociações que continham um amplo apoio tanto de organismos
internacionais – como foi o caso da presença da Comissão Internacional da Cruz
Vermelha (CICV), quanto de um forte apoio de inúmeros Estados, tais como a França,
Espanha, Brasil, dentre outros, teve como principal articulador o próprio Hugo Chavez.
Sendo assim, foram a partir destas negociações que se lograram com êxito alcançar a
libertação de alguns de seus reféns, tais como Clara Rojas, Consuelo Gonzáles, além de
alguns soldados do Exercito e da polícia colombina tais como William Giovanny
Dominguez, Alexis Torres Zapata e Juan Fernando Galícia Uribe, como também a
libertação da Franco-colombiana Ingrid Betancourt dentre os últimos anos (BBC –
Brasil, 2009).
No decorrer destas negociações, um fator importante de ser mencionado, de
acordo a opinião de inúmeros especialistas e analistas internacionais, é o fato da
importância que o chefe de Estado venezuelano representou para se conseguir alcançar
um bom resultado entre as partes, ou seja, se conseguir efetuar a libertação dos
mencionados reféns do poderio das FARC. Ainda segundo estes estudiosos, o bom êxito
destas negociações pode estar atrelado ao fato de como Hugo Chavez se identificou com
as FARC, não lhes auferindo um conceito de terroristas, mas sim de detentores de um
status legítimo frente as causas que defendem, podendo com isso ter flexibilizado tais
negociações (BBC – Brasil, 2009).
234
Por fim se passará analisar o que as próprias FARC se denominam, ou seja,
como esta entidade entende que atua, levando-se em consideração suas características
peculiares. Assim sendo, apresenta-se a seguir um declaração feita por um de seus
integrantes, o Ex Comandante do Secretario geral das FARC, Raúl Reyes26:
As FARC são um exército do povo que se nutre da economia do país, que é
o petróleo, o café, as esmeraldas, o gado, o algodão, a coca e a papoula. Não
perguntamos ao empresário das transportadoras se seus caminhões foram
comprados com dinheiro do narcotráfico. As FARC não têm cultivos, não
negociam com narcóticos, não vendem favores aos narcotraficantes. As
FARC subsistem da economia do país, apesar da campanha encabeçada
pelos EUA que tem por fim desacreditar-nos, mostrar-nos não como uma
organização revolucionária, mas como narcotraficantes, agora
narcoterroristas. Mas é normal que os EUA façam isso, pois são nossos
inimigos e, portanto, fazem o que devem fazer. (Citação retirada do site:
<<http:://www.globalsecurity.org/military/world/para/farc.htm>>. Acessado
em: 30 de abril de 2009).
A partir da análise feita em decorrência de tal declaração, percebe-se
naturalmente que há uma grande repulsa na definição proveniente dos EUA e seus
aliados, em classificá-los como grupo terrorista. Isso se deve ao fato de que com essa
classificação as FARC perdem legitimidade frente ao cenário internacional, podendo ser
alvo de denúncias e perseguições no âmbito do Direito e das Relações Internacionais.
Em função desse fato, os integrantes das FARC fazem o possível para serem
classificados como um movimento revolucionário que lutam e defendem as causas do
povo, para que com isso possam agir de maneira a não infringirem regras e normas
presentes no ordenamento jurídico internacional.
Para se poder ter uma idéia de qual a abrangência das FARC no Estado
colombiano, basta observar o mapa a seguir que traz consigo um território nacional
multifacetado:
26
Raúl Reyes, um dos lideres das FARC, foi assassinado em 2008 por uma operação secreta entre os
governos Álvaro Uribe e George W. Bush, pertencente ao Plano Colômbia.
235
FIGURA I – MAPA DAS ÀREAS CONTROLADAS PELOS GRUPOS NÃO ESTATAIS
FONTE : United Nations Office on Drugs and Crime
Torna-se importante destacar, apenas como matéria de informação, que além
das FARC o território colombiano abriga outros grupos armados não estatais, tais como
é o caso dos paramilitares e do Exército de Libertação Nacional.
Esses grupos por sua vez defendem idéias próprias que se contrastam
principalmente pelas diretrizes que cada um segue. O ELN se caracteriza por ser um
236
grupo marxista-cristão criado em 1964 e fortemente inspirado pelos ideais da Revolução
Cubana, atraindo estudantes, padres, sindicalistas e remanescentes das guerrilhas do
partido Liberal. A estratégia inicial do grupo, que se apoiava fundamentalmente em uma
liderança carismática, era iniciar uma guerra de libertação nacional começando com
uma revolução rural similar ao que ocorreu em Cuba (PRADO, R. 2000)
Já no caso dos Paramilitares, que também surgem na Colômbia no início da
década de 1960, se organizaram em contra-partida às ações desempenhadas tanto pelas
FARC como pelo ELN. Acreditando que esses grupos de viés marxista e revolucionário
pudessem por em risco a estrutura social dos grupos de militares e elites agrárias –
desvinculadas do Estado ou descrentes do mesmo –, esses passaram a se articular à
favor de seus próprios interesses e poderio nas regiões que habitavam, sempre munidos
de fortes recursos, principalmente o capital financeiro (MEIRA, L. 2007).
Essa constatação é mais um indício de o quanto a Colômbia esteve, e continua a
estar, sobre forte pressão de grupos organizados e de contestação das políticas
desempenhadas por tal nação, colocando em choque a estrutura estatal como um todo.
Nesse sentido, torna-se latente a necessidade do restabelecimento da ordem social e
política para se dar continuidade ao desenvolvimento do Estado, em seu plano interno e
em suas relações internacionais.
5 CONCLUSÃO
Com a elaboração deste trabalho se podem considerar certas questões inerentes
ao objeto de estudo aqui analisado, questões estas que se apresentam de forma a melhor
compreender, em termos conceituais e teóricos, como vem a se caracterizar as FARC e
qual a sua atuação no que concerne ao cenário internacional.
Por tanto, a partir da apresentação de sua formação ao longo da história foi
possível pontuar e se entender quais foram os motivos e os princípios basilares, em que
se fundamentaram o surgimento das FARC. Também, em decorrência dessa cronologia
histórica propiciou-se a possibilidade de se ter uma maior noção de como as
circunstancias
presentes
em
cada
momento
distinto
de
sua
existência,
condicionaram esta entidade a tomar certas atitudes no bojo de suas inter-relações.
Posteriormente, fazendo-se uso das conceituações teóricas acerca de como é
fundamentado um Movimento de Libertação Nacional (MLN), apresentando-se as
237
características necessárias para que determinado movimento possa vir a ser classificado
como tal, teve-se uma idéia geral de quais os atributos, e sobre quais condições, estes
organismos se fazem presentes. Assim sendo, a partir da noção de como se classificam
os MLN, passaram a serem relacionados com a conceituação das FARC, no intuito de
se procurar compreender qual a relação existente entre estas duas entidades.
Nessa relação conceitual entre os dois organismos, surgiram certas limitações de
caráter teórico e analítico, devido ao fato das FARC possuírem uma série distinta de
definições, podendo variar dependendo da perspectiva abordada. Esta limitação teórica
esta atrelada ao fato desta entidade fazer uso de uma gama variada de meios para
conseguir lograr seus fins, que por sua vez – segundo o que aparentam -, trata-se de
visarem alcançar uma certa autonomia frente a autoridade governamental e ao poderio
estatal colombiano.
Desta forma, percebe-se como delicado se torna definir as FARC, segundo as
interpretações e classificações presentes no que se constituem os campos de estudos
tanto do Direito Internacional quanto das Relações Internacionais. Esta dificuldade se
torna ainda mais eminente a partir do momento que lhe é concedida uma certa
personalidade jurídica, em que pode ser julgado perante o ordenamento jurídico
internacional, porém é detentor de um grau de alcance limitado, ou em certas
circunstancias até mesmo inexistente, devido ao fato de não ser reconhecido como um
Sujeito de Direito Internacional pleno.
Outra questão que merece ser explanada é a polêmica que gira entorno se as
FARC são uma entidade terrorista – assim como defendem os Estados Unidos e seus
aliados -, ou se pode ser considerada como um organismo legítimo de direitos para dar
continuidade a seus atos, agindo como entidades de cunho meramente político – como
defendido por Hugo Chavez.
Nesse sentido, levando-se em consideração a inexistência de um consenso acerca
do que vem a ser o terrorismo, juntamente com a falta de uma definição condizente e
aceita universalmente à respeito de como é interpretado tal fenômeno tanto pelo Direito
Internacional, como pelas Relações Internacionais, evidencia-se o quão complexo tornase definir as FARC como pertencente a esta qualificação.
Assim sendo, a partir da explanação destes conceitos e de seus embates teóricos,
espera-se haver alcançado o propósito desse artigo, que se refere ao fato de apresentar
as particularidades entorno das quais se assentam os diversos conceitos que pairam
sobre as FARC. Com isso e em função das dificuldades de conceituação das FARC
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como entidade, procurou-se, no desenvolver deste trabalho, de forma sucinta, mas
objetiva, apresentar as principais características inerentes a tal organismo, evitando
dessa forma adentrar de maneira desnecessária em embates teóricos ou análises extensas
que o desvirtuassem.
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