Associação Paulista dos Auditores Fiscais da Previdência Social Aspectos Constitucionais PARIDADE E CONTRIBUIÇÃO DE APOSENTADOS E PENSIONISTAS OUTUBRO/2003 ÍNDICE INTRODUÇÃO...................................................................5 PARIDADE REMUNERATÓRIA .......................................7 BREVE HISTÓRICO SOBRE A REVISÃO DOS PROVENTOS ..................... 8 A NECESSIDADE DE PRESERVAR ESSA CONQUISTA ........................... 10 CONTRIBUIÇÃO DE APOSENTADOS E PENSIONISTAS ...........................................................13 A JUSTIFICATIVA APRESENTADA ............................................................. 13 AS NORMAS CONSTITUCIONAIS APLICÁVEIS ......................................... 17 O ALEGADO DESEQUILÍBRIO DO SISTEMA ............................................. 18 A EVASÃO DA RECEITA PREVIDENCIÁRIA .............................................. 20 A CONCLUSÃO ............................................................................................ 21 Paridade e Contribuição de aposentados e pensionistas 4 Paridade e Contribuição de aposentados e pensionistas INTRODUÇÃO No momento em que se discute no Congresso Nacional a proposta de reforma do regime de Previdência dos servidores públicos, a Associação Paulista dos Auditores Fiscais da Previdência Social – APAFISP – elabora o presente trabalho, para mais uma vez demonstrar a flagrante inconstitucionalidade que será cometida caso a emenda seja aprovada tal como está. O presente material foi encaminhado para todos os senadores da República, na expectativa de subsidiar as atuações parlamentares, representando uma singela contribuição com o desempenho da função de legislador, no convencimento acerca da matéria, não somente na Comissão de Constituição e Justiça, mas principalmente no Plenário do Senado O diretor jurídico da APAFISP, Gilberto U. Franceschini, rebate as alterações propostas, com argumentos jurídicos, reunindo também trabalhos de diversos outros juristas. Conselho Executivo da APAFISP outubro/2003 5 Paridade e Contribuição de aposentados e pensionistas 6 Paridade e Contribuição de aposentados e pensionistas PARIDADE REMUNERATÓRIA Ao assegurar a PEC (art. 8º), para os já aposentados e pensionistas, bem assim àqueles que, até a data da publicação da nova Emenda, “tenham cumprido todos os requisitos para a obtenção desses benefícios, com base nos critérios da legislação então vigente” (art. 3º), a absoluta paridade entre os respectivos proventos ou pensões com a remuneração percebida pelos servidores em atividade, estendendo-lhes quaisquer benefícios ou vantagens concedidos posteriormente, “inclusive quando decorrentes da transformação ou reclassificação do cargo ou função em que se deu a aposentadoria ou que serviu de referência para a concessão da pensão...”, objetiva a proposta, ora submetida à deliberação desse Senado Federal, encerrar toda e qualquer dúvida porventura ainda existente, tanto na esfera administrativa, como no âmbito do Poder Judiciário. Nada mais justo, portanto, o que propõe a norma em questão, consolidando, em caráter definitivo, o que já determinava, a respeito, a Constituição Federal, em sua redação originária (art. 40, §§ 4º e 5º), bem como a Emenda Constitucional nº 20, de 15.12.98 (art. 40, § 8º). Tal tratamento, porém, não será dispensado tanto aquele que ingressar no serviço público após a promulgação da nova Emenda (§ 8º do art. 40) como “àquele que tenha ingressado regularmente em cargo efetivo na Administração Pública direta, autárquica e fundacional até a data da publicação” da Emenda nº 20, de 15.12.98 (§ 6º do art. 2º) Para esses, uma vez aposentados, o que se pretende assegurar é “o reajustamento dos benefícios para preservarlhes, em caráter permanente, o valor real, conforme os critérios estabelecidos em lei.” O mesmo se diga em relação àquele “que tenha ingressado no serviço público até a data de publicação” da nova Emenda (art. 7º) e opte por aguardar sua aposentadoria com proventos integrais, cumprindo, cumulativamente, todas as condições ali estabelecidas: 60 anos de idade, se homem, e 55, se mulher; 35 anos de contribuição, se homem, e 30, se mulher; 20 anos de efetivo exercício no serviço público; e 10 anos de carreira e 5 de efetivo exercício no cargo em que se der a aposentadoria. Nessa hipótese, e como consta do parágrafo único do men7 Paridade e Contribuição de aposentados e pensionistas cionado art. 7º, “Os proventos das aposentadorias... serão revistos na mesma proporção e na mesma data, sempre que se modificar a remuneração dos servidores em atividade, na forma da lei...” Aos que desconhecem o que ocorria no relacionamento da administração pública com os seus servidores, pode até parecer que, entre a chamada “paridade”, hoje vigente, e a nova sistemática que se pretende ver aprovada, não há diferença alguma, tendo os futuros aposentados e pensionistas, plena garantia de que seus proventos e pensões serão, sempre, reajustados em condições idênticas, sobretudo porque, nas hipóteses elencadas, há referência expressa à preservação de seu “valor real”, e mais ainda, “na mesma proporção e na mesma data.” Nada mais falso, porém, como mais adiante se verá, se mantidos os textos antes referidos com a redação proposta. BREVE HISTÓRICO SOBRE A REVISÃO DOS PROVENTOS A necessidade de manter-se a equivalência estrutural e remuneratória entre ativos, aposentados e pensionistas mereceu de nossos representantes, na Assembléia Nacional Constituinte, da qual resultou, em 1988, a CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL, uma atenção redobrada. E isto porque, até então, eram esses últimos quase sempre relegados, sendo os seus proventos e pensões reajustados, segundo o humor ou a boa vontade do governante. De fato, e não obstante a determinação de aplicação de índices equivalentes, a verdade é que, não raras vezes, através de artifícios astuciosos, criavam-se novos benefícios ou vantagens aos servidores em atividade que não eram, necessariamente, estendidos aos proventos e pensões. Era evidente a burla que se praticava, mas era legítima, naquelas circunstâncias, a exclusão desses últimos, imposta pelos administradores que, antes como hoje, viam e vêem, nos aposentados e pensionistas, um simples e pesado encargo financeiro sem qualquer retorno. Daí porque esse procedimento dissimulatório deixou de ser permitido, com a redação dada ao art. 40 da CF (§§ 4º e 5º), que passaram a regular, de forma mais justa e abrangente, a revisão desses proventos e bem assim dos respectivos benefícios da pensão. Registre-se, como fato histórico, que tais dispositivos, por 8 Paridade e Contribuição de aposentados e pensionistas sua inegável importância, foram os únicos que receberam aprovação unânime dos Constituintes de 1988, a ponto de a decisão em causa ter sido enaltecida pelo saudoso Dr. Ulysses, com a seguinte frase: “A emenda bateu um recorde. Configura uma situação inédita, Nenhum voto contrário!” Com a promulgação, portanto, da chamada “Constituição Cidadã”, viu-se, pela primeira vez, que o servidor aposentado e também o seu pensionista, obtiveram, em definitivo, o reconhecimento desse direito, o que, mais adiante, veio a ser ratificado pela EC nº 20/98, com a redação dada ao § 8º do já mencionado art. 40. A propósito dessa questão, assim se manifestava, à época, Manoel Gonçalves Ferreira Filho, em sua obra “Comentários à Constituição Brasileira de 1988, Saraiva 1990, Volume I, pag. 270/271: “Extensão de benefícios e vantagens. Nada havia no direito anterior a este respeito. Isto ensejava um artifício por parte da administração, quando esta pretendia favorecer os servidores em atividade em detrimento dos servidores aposentados, mormente para sonegar a estes a correção plena (na medida em que o é “plena”...) da depreciação monetária: o de conceder benefícios ou vantagens novos àqueles servidores em atividade. Benefícios e vantagens que, somados ao reajuste geral, plenificavam a correção da depreciação monetária.” Também, dentre tantos outros, os eminentes juristas: Celso Ribeiro Bastos, “in” COMENTÁRIOS À CONSTITUIÇÃO DO BRASIL, 3º volume, Tomo III, Edição Saraiva, pag. 216: “O que se nota é que o constituinte de 88 procurou estender aos inativos (aposentados, em disponibilidade e pensionistas) não somente os acréscimos advindos de medida geral, de cunho nitidamente correcional do poder aquisitivo da moeda: procurou ir mais além. Entendeu conferir também aos inativos aqueles acréscimos decorrentes de reclassificação ou de reestruturação: reavaliações feitas sobre a estrutura de cargos e carreiras quando o governo entende reapreciar o seu valor e moldá-los mais de acordo com o interesse coletivo. Em regra, beneficia apenas um ou alguns cargos, assim como uma ou algumas carreiras. Por vezes, no entretanto, essas medidas são resultado de uma longa luta travada pelos servidores no sentido de obter um melhor reconhecimento da sua situação funcional. Alguns se aposentam, todavia, antes de ver logrado o fruto dos seus esforços. Esta a razão pela qual o constituinte manda 9 Paridade e Contribuição de aposentados e pensionistas estender também aos inativos os aumentos dessa natureza.” Diógenes Gasparin, “in” DIREITO ADMINISTRATIVO, Editora Saraiva, 3ª Edição, pag. 158: “Estabelece o § 4º do art. 40 da Constituição Federal que “os proventos da aposentadoria serão revistos, na mesma proporção e na mesma data, sempre que se modificar a remuneração dos servidores em atividade, sendo também estendidos aos inativos quaisquer benefícios ou vantagens posteriormente concedidos aos servidores em atividade, inclusive quando decorrentes da transformação ou reclassificação do cargo ou função em que se deu a aposentadoria, na forma da lei”. A razão desse dispositivo é evidente. Diga-se que por ele quer-se evitar que o inativo sofra os males da desvalorização da moeda e proporcionar-lhe a manutenção dos proventos o mais próximo dos vencimentos percebidos na atividade. Essa revisão é, assim, uma garantia que não pode ser desconhecida, nem mesmo por lei, pela entidade que o aposentou.” A NECESSIDADE DE PRESERVAR ESSA CONQUISTA Frise-se, desde já que, não obstante a meridiana clareza do dispositivo constitucional vigente desde 1988 (§§ 4º e 5º, atual § 8º do art. 40), nem sempre o Poder Executivo a ele se submete. Assim é que, não raras vezes, através de Medidas Provisórias que alteram a estrutura de determinadas categorias funcionais, com a criação ou organização de Carreiras específicas, insiste o governo em excluir os já aposentados e pensionistas da condição de beneficiários de uma nova vantagem pecuniária, atribuindo-a, indevidamente, apenas aos servidores em atividade. Se, em razão desse equivocado procedimento, isso acontece nos tempos atuais - e são tantos os exemplos – a ponto de os aposentados e pensionistas, com base no já mencionado preceito constitucional, serem obrigados a socorrerse do Poder Judiciário para fazer valer seus direitos, imagine o que poderá ocorrer com a redação que se pretende dar aos dispositivos citados, não lhes estendendo, automaticamente, todos esses benefícios ou vantagens e, por via de 10 Paridade e Contribuição de aposentados e pensionistas conseqüência, permitindo a revisão dos proventos e pensões, não do seu todo, mas apenas em relação a uma parte deles. Por tudo isso, a eventual eliminação dessa regra trará, com certeza, enorme angústia e intranqüilidade para uma parcela ponderável de servidores que se submeterão, inclusive, a uma gama enorme de requisitos para a fruição de suas aposentadorias. Admitir-se que, nessas hipóteses, as expressões “valor real” ou “na mesma proporção e na mesma data... na forma da lei”( leia-se Medida Provisória) sejam mais do que suficientes para garantia de uma futura revisão, em sua integralidade, é posicionar-se de forma ilusória. A história nos ensina: vantagens ou benefícios até então concedidos de forma geral, isto é, a todos os integrantes de uma determinada categoria funcional ou Carreira, decorrentes do próprio e normal exercício do cargo ou função não eram, necessariamente, extensíveis aos já aposentados e pensionistas, porque a isso não obrigava a Constituição Federal. Nada justifica, portanto, uma volta a essa situação, quando, a pretexto de reajustar a remuneração dos servidores ativos, utilizava o governo de mecanismos mirabolantes, instituindo, para esses, uma gratificação qualquer, perdendo o aposentado ou o pensionista, por essa via tortuosa, um direito que lhe era assegurado. Registre-se, para melhor explicitar, que tal parcela remuneratória, quando concedida em caráter genérico, não se confunde com indenizações de natureza individual ou vantagens especialíssimas, estas evidentemente não extensíveis, como é o caso da ajuda de custo, diárias, transporte, adicionais de insalubridade, periculosidade e penosidade, além de outras. É imperioso, pois, pelo simples cotejamento dessa norma restritiva com os princípios hoje estabelecidos, que se impeça a prática, em futuro próximo, de atos comprovadamente danosos a aposentados e pensionistas, dadas as naturais e deletérias repercussões na vida pessoal de cada um. Importa, isto sim, com vistas à preservação dessa histórica conquista, que os nossos Senadores, não abdicando de sua competência, promovam, em relação aos dispositivos invocados, as alterações necessárias, porque assim recomenda e assim exige a nossa Carta Cidadã. 11 Paridade e Contribuição de aposentados e pensionistas 12 Paridade e Contribuição de aposentados e pensionistas CONTRIBUIÇÃO DE APOSENTADOS E PENSIONISTAS Até hoje todas as tentativas levadas a efeito, no sentido de ver instituída a contribuição previdenciária sobre os proventos das aposentadorias e pensões dos servidores públicos resultaram infrutíferas, notadamente após ter o Supremo Tribunal Federal, pela unanimidade de seus membros (11 x 0), considerado inconstitucional a sua cobrança, quando do julgamento da AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Nº 2010-2 proposta pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, sendo Relator o E. Ministro Celso de Mello. Infelizmente, porém, o novo governo, não demonstrando, sequer, qualquer espécie de constrangimento, mas movido, tanto quanto o anterior, por uma incontida ira que dedica aos seus servidores, encaminha ao Congresso Nacional uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC nº 40/2003) com idêntica finalidade. E tudo isso, como diz Janio de Freitas (Folha de São Paulo) para “economizar uma importância que nada significa no Governo: estimada em R$ 1,1 bi, se chegar a tanto, que nada mais é do que R$ 91,6 milhões por mês. Ou seja, menos do que o lucro de um único banco graúdo, um só, em 21 dias...” A obsessão quase paranóica de impor, a qualquer custo, essa contribuição não poderá prosperar, dada a notória inconsistência dos argumentos até agora apresentados. De fato, a sociedade brasileira, bombardeada no dia a dia, por essa campanha insidiosa e muito bem articulada por grupos inescrupulosos, apoiados por uma mídia quase sempre mal informada, saberá, ao final de toda essa angustiante e cansativa discussão, distinguir a verdade da “meia verdade”. A JUSTIFICATIVA APRESENTADA Ao dispor a PEC sobre a contribuição dos servidores aposentados e pensi13 Paridade e Contribuição de aposentados e pensionistas onistas dos três Poderes, inclusive dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incidente a partir de determinados limites, informa o Exmo. Sr. Presidente da República que a crescente diferença entre o que se arrecada dos servidores em atividade e o que se gasta com os aposentados e pensionistas, prejudica, sobremaneira, todo o esforço que desenvolve no sentido de sanear as contas públicas. Em várias outras oportunidades, foi a proposta derrotada, exatamente porque o arcabouço constitucional e legal prevê requisitos que, uma vez cumpridos, asseguram o direito à plena percepção dos proventos e das pensões, sem que, sobre eles, venha a incidir qualquer contribuição. Admitindo-se, portanto, que o Senado Federal venha a aprová-la, ainda assim, e em nenhuma hipótese, poderá a Emenda dela decorrente ingressar em nosso ordenamento jurídico, pois irá afrontar o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada, petrificados que estão pelo inciso IV do § 4º do art. 60 da Carta originária e oponível à norma emanada de Poder Reformador. A propósito, vale a deliberação do Excelso Supremo Tribunal Federal, na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 939-7, Distrito Federal, sendo Relator o Ministro Sydney Sanches: “Uma Emenda Constitucional, emanada, portanto, de Constituinte derivada, incidindo em violação à Constituição originária, pode ser declarada inconstitucional, pelo Supremo Tribunal Federal, cuja função precípua é de guarda da Constituição (art. 102, I, “a”, da C.F.).” Também, e no mesmo sentido, assim se manifestaram, o ex-Senador da República e jurista, Josaphat Marinho, e o não menos ilustre Deputado Federal e Constitucionalista, Michel Temer: “Tem-se dito com desenvoltura, para justificar emendas, que não há direito contra a Constituição. Sim, se o direito já não estiver nela consagrado... E se emenda pode modificar a Constituição, está, entretanto, sujeita a limites expressos e implícitos, para não deformar ou negar o sistema em que se baseia...” Josaphat Marinho (Correio Brasiliense, 081095). .................................................................................................................. “Muitos sustentam que a expressão “lei” se refere à ordinária apenas. A interpretação é, como se vê, literal. Adotando essa posição, chegaríamos à conclusão de que a lei complementar, o decreto legislativo e as resoluções podem violar o direito adquirido. A PEC é “lei” no sentido de “ato normativo”. Tem apenas mais força (eficácia) que as demais, 14 Paridade e Contribuição de aposentados e pensionistas mas tal como os demais atos normativos, submete-se à Constituição...” Michel Temer (O Estado de São Paulo, 13.10.95). .................................................................................................................. “Tenho sustentado, baseado no instituto do ato jurídico perfeito, a tese da impossibilidade de tributar os atuais inativos. Disse até que a simples invocação do direito adquirido não seria suficiente para impedir a cobrança da contribuição, já que se adquire o direito à aposentadoria pelo decurso do prazo temporal, mas não se adquire o direito à imunidade após a aposentação. Ao que me parece, apenas aquele argumento tem sido levado ao Supremo Tribunal Federal. O argumento do ato jurídico perfeito, entretanto, é o que impede a cobrança. .................................................................................................................. Assim, seja pela interpretação sistemática, seja pela interpretação literal, as emendas constitucionais (leis no sentido lato) submetem-se ao controle da constitucionalidade no STF. Que é para onde deve ir a emenda constitucional que tributará os inativos, se aprovada.” Michel Temer (Folha de São Paulo, 030703). Lúcido e convincente, por sua vez, o pronunciamento do ilustre ex-deputado federal Ubiratan Aguiar, hoje Ministro do Tribunal de Contas da União, proferido na Sessão de 16.11.99, quando da apreciação da PEC nº 136/99. Dizia ele em um de seus trechos: “É inconstitucional, portanto, a proposta do Governo. Macula o direito adquirido porque, conforme leciona CELSO RIBEIRO BASTOS, no seu Dicionário de Direito Constitucional, no verbete direito adquirido, “a utilização da lei em caráter retroativo” – e para este parlamentar a Constituição é antes de tudo uma Lei: Lei Magna, Lei Fundamental, Lei Maior – “repugna pois fere situações jurídicas que já tinham por consolidadas no tempo, e esta é uma das fontes principais da segurança do homem na terra”. Macula o ato jurídico perfeito, porque “ato (o da aposentadoria) já consumado segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou.” (Lei de Introdução ao Código Civil, art. 6º, § 1º). Macula a coisa julgada, porque não é novidade que inúmeros tribunais já se manifestaram sobre a questão, dando ganho de causa aos aposentados, e o próprio Supremo Tribunal Federal, embora em apreciação liminar, vem de fazê-lo pela unanimidade de seus membros, quando do exame de Mandado de Segurança impetrado pela Ordem dos Advogados do Bra15 Paridade e Contribuição de aposentados e pensionistas sil sobre a matéria. Aquela unanimidade, senhor Presidente, soa-me eloqüente, imprimindo mesmo à questão foros de coisa julgada...” Mais adiante, assim se expressava o mesmo parlamentar, reproduzindo (até por sua atualidade) o que já nos ensinava, há tanto tempo, Rui Barbosa, o nosso jurista maior: “O aposentado, o jubilado, o reformado, o pensionista do Tesouro são credores da Nação, por títulos definitivos, perenes e irretratáveis. Sob um regime, que afiança os direitos adquiridos, santifica os contratos, submete ao cânone da sua inviolabilidade o Poder Público, e, em garantia deles, adstringe a Lei à Norma Tutelar da irretroatividade, não há consideração alguma, juridicamente aceitável, moralmente honesta, socialmente digna, logicamente sensata, pela qual se possa autorizar o Estado a não honrar a dívida que com esses credores contraiu, obrigações que para com eles firmou.” E, concluindo o seu pronunciamento, acrescentava: “...A instituição de contribuição previdenciária aos aposentados via proposta de Emenda Constitucional abre as portas para que amanhã ocorra a violação de outros princípios fundamentais do direito, alcançando a propriedade, os contratos, tudo enfim que esteja sob o albergue das cláusulas pétreas.” .................................................................................................................. “Relegado ou sofismado hoje o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada, o que não se sofismará amanhã a título de conseguir um melhor ajuste nas contas públicas? Qual será o próximo direito fundamental, fixado pelo constituinte originário, a ser objeto de deliberação do constituinte derivado? Tal preocupação, senhor Presidente, e aqui encerro o meu pronunciamento, conduzindo-me ao belo texto No Caminho com Maiakowski, de Eduardo Alves da Costa, assim: “Na primeira noite, eles se aproximam e roubam uma flor do nosso jardim. E não dizemos nada. Na segunda noite, já não se escondem: pisam as flores, matam nosso cão, e não dizemos nada. Até que um dia, o mais frágil deles entra sozinho em nossa casa, rouba-nos a luz e, conhecendo o nosso medo, arranca-nos a voz da garganta e, como não dissemos nada, já não podemos dizer nada...” .................................................................................................................. Também, e na mesma linha, tantos outros pronunciamentos, dentre os quais, 16 Paridade e Contribuição de aposentados e pensionistas para exemplificar, os seguintes trechos: “A pretendida reforma da Previdência Social traz no seu bojo duas conseqüências imediatas: a cizânia, ao intrigar trabalhadores com servidores públicos, e a insegurança destes, que se apressam a aposentar-se... Os inativos, que não eram vinculados à Previdência Social... são apontados agora como os “vilões” responsáveis pelo “rombo” do INSS... ...Evitar o caos da Previdência Social é imperativo, sem dúvida, mas não foram os servidores civis e militares que o causaram, pois não eram seus segurados. O Estado os recrutou sob satisfação de requisitos ao alcance de todos. Sua diferença de status não é prerrogativa de privilégio mas de conquista...” (Jarbas Passarinho, escritor, ex-Ministro da Previdência Social, Jornal do Brasil, 10.06.03). .................................................................................................................. “A proposta de emenda constitucional não é só injusta com o servidor, mas envolve fortes desequilíbrios fiscais em todo o sistema previdenciário público... e abre espaços para enormes pendências judiciais... Os atuais aposentados não serão penalizados apenas com a contribuição do inativo, pois seus benefícios terão redução de 30% em suas pensões... Portanto, o direito adquirido, tão defendido pelo presidente nos palanques, foi simplesmente esquecido... A reforma proposta é extremamente perversa para o Estado, porque é vista apenas como uma forma de reduzir despesas... Para atingir o seu fim, o governo petista rasga sua história, tripudia das promessas que o elegeram. Pratica a mais odiosa injustiça contra os servidores, desmonta as carreiras de Estado e joga a política de recursos humanos dos três níveis de governo num clima de incerteza sem precedentes...” (Geraldo Biasoto Jr., Professor do Instituto de Economia da Unicamp, Folha de São Paulo. AS NORMAS CONSTITUCIONAIS APLICÁVEIS Com a promulgação, em 15.12.98, da Emenda Constitucional nº 20, alte17 Paridade e Contribuição de aposentados e pensionistas rou-se, profundamente, o regramento atinente, não apenas em relação aos servidores públicos, como a todos os demais trabalhadores. Ao tempo em que a Emenda, ao dar uma nova redação ao art. 40 da CF, assegura aos servidores, em seu “caput”, “o regime de previdência de caráter contributivo, observados os critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial e o disposto neste artigo”, acrescenta, através de seu § 12, que “Além do disposto neste artigo, o regime de previdência dos servidores públicos titulares de cargo efetivo observará, no que couber, os requisitos fixados para o regime geral de previdência social.” Por sua vez, ao dispor o art. 195, sobre o financiamento da seguridade social, enumera, dentre outras contribuições (inciso II), aquela proveniente do “trabalhador e dos demais segurados da previdência social, não incidindo contribuição sobre aposentadoria e pensão concedidas pelo regime geral de previdência social de que trata o art. 201.” Disso resulta que a impossibilidade dessa cobrança passou a existir de maneira expressa no texto constitucional, pois se o seu fundamento, em ambos os regimes, é o mesmo, qualquer tratamento diferenciado que venha a ser dado a aposentados e pensionistas de um fere o princípio da isonomia tributária, violando, por conseguinte, o art. 150 da CF, cujo inciso II veda expressamente: “instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por ele exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos.” A motivação apresentada pelo governo não afasta, por conseguinte, todos os óbices ainda presentes, autorizando a concluir que a pretendida cobrança revela uma ilegítima apropriação de verba alimentar, identificando-se com o próprio conceito de imposto (dupla tributação), inclusive com manifesta ofensa ao art. 150, IV, que proíbe a utilização de “tributo com efeito de confisco”. O ALEGADO DESEQUILÍBRIO DO SISTEMA Ao inserir, em sua mensagem, números sobre supostos déficits, dando a 18 Paridade e Contribuição de aposentados e pensionistas entender que tal imposição contributiva estaria justificada pela necessidade de promover um suposto equilíbrio financeiro e atuarial, eis, a propósito, alguns trechos do artigo de Francisco E. B. de Oliveira, pesquisador do IPEA, já falecido, importante interlocutor do governo anterior, em relação à questão previdenciária, (“O Estado de São Paulo”, edição de 06.12.99): .................................................................................................................. “De uma hora para outra, a previdência do funcionário foi retirada da penumbra para se transformar no grande demônio das contas públicas. Ao cidadão comum – que tem pouco ou nenhum tempo de pensar nessas questões – o “déficit” dos funcionários soa retumbante nos seus dois dígitos de bilhões de reais por ano.” .................................................................................................................. “A estatística de R$ 18 bilhões que vem sendo apresentada como tal nada mais é do que o total das despesas com aposentados e pensionistas federais menos a contribuição paga pelos funcionários ativos. É claro que, sob o ponto de vista do caixa do governo, se trata, indiscutivelmente, de uma necessidade de financiamento, mas não é “déficit”. Só poderia ser assim qualificado se: • O gasto com inativos devesse ser coberto integralmente pela contribuição dos ativos, ou seja, um regime de repartição simples como o do INSS; • Se não houvesse nenhuma contribuição patronal, ou seja, se apenas o funcionário pagasse contribuições, diferentemente do INSS, para o qual o empregador contribui com uma alíquota de mais que o dobro da paga pelo empregado.” .................................................................................................................. “O segundo ponto é que, não havendo contribuição patronal especificada, simplesmente não se podem comparar os números do INSS com os do funcionalismo público, mesmo se ambos os regimes fossem de repartição. São dois pesos e duas medidas. Para o INSS, o patrão contribui; para o funcionalismo, só o próprio? .................................................................................................................. “ No meu entender, o discurso está completamente equivocado no que se refere ao diagnóstico. Se a intenção é satanizar os funcionários, muito bem. Pode-se até fazê-los encarnar a figura dos novos vilões da economia nacional. Estaremos, entretanto, cada vez mais distantes da solu19 Paridade e Contribuição de aposentados e pensionistas ção dos reais problemas deste país.” O que informa o governo sobre os seus servidores nada mais é do que o produto de uma política administrativa perversa, irresponsável e insensível que se instalou no país: trabalhadores privilegiados, detentores de “abusos adquiridos” ou coisa semelhante, são chavões utilizados, no dia a dia, por aqueles que, totalmente descompromissados com os direitos da cidadania. Mentem descaradamente, afirmando que o servidor pouco contribui (ou nada contribuiu) para o seu sistema próprio de aposentadorias e pensões. Nada se diz, por exemplo, que o Brasil aparece como um dos países que tem menor número de servidores do mundo, tanto que, em relação ao seu PIB, o total da despesa vem declinando, nos últimos anos, de maneira bastante acentuada. Não é justo, portanto, condenar o sistema vigente, pois, na administração pública, há regras específicas para o acesso e investidura no cargo, para fixação e revisão da remuneração, assim como para os planos de carreira, regime jurídico, etc. Não há, no serviço público, para exemplificar, os chamados benefícios assistenciais sem a correspondente fonte de custeio. Como, enfim, comparar o valor médio desses benefícios com aquele atribuído ao servidor público, quando de sua passagem para a inatividade? Em suma, o fato de não terem os demais trabalhadores acesso a esse benefício, em condições idênticas (hipótese socialmente desejável), nada tem a ver com o que ocorre no serviço público. São situações diversas, não configurando qualquer espécie de privilégio, pois, como prevê a CF, ninguém está necessariamente excluído: Os cargos públicos são acessíveis a todos, obedecidos, como se sabe, os requisitos estabelecidos em lei. Se, em determinadas circunstâncias, o brasileiro se aposenta cedo, também não é menos verdade que muitos dos que estão hoje na inatividade remunerada, por certo ali não estariam, não fossem as ameaças que constantemente são veiculadas, desde a desastrada reforma administrativa do Governo Collor, quando milhares de servidores foram “compulsoriamente” aposentados. Era preciso satisfazer à vontade do “rei”, um megalomaníaco que, ao assumir o Poder, tudo fez para desmantelar, por inteiro, o serviço público. E quase conseguiu! 20 Paridade e Contribuição de aposentados e pensionistas A EVASÃO DA RECEITA PREVIDENCIÁRIA Ainda que não se quantifique, com exatidão, a quanto monta a evasão, não há dúvida que isso também resulta do processo de desmantelamento do serviço público e mais especialmente do sistema previdenciário perpetrado pelos que querem vê-lo abatido, e, por via de conseqüência, substituído por ações próprias da iniciativa privada. Para alguns, a solução está nessas decantadas reformas, enquanto que, para outros, a evasão deve ser combatida através da modernização da máquina arrecadadora. O Governo, porém, radicaliza e, valendo-se da mídia que está a sua disposição, limita-se a apresentar propostas que alcançam apenas a sua “periferia”: Coloca o servidor público ativo contra o aposentado e ambos contra a própria sociedade, retirando-lhes garantias fundamentais (privilégios, no seu entendimento), a exemplo da famigerada instituição da contribuição previdenciária sobre os proventos das aposentadorias e pensões, sem combater – o que seria adequado - a impunidade, o maior fator de estímulo à sonegação. Quando Everardo Maciel, ex-Secretário da Receita Federal, em seu bombástico depoimento que prestou perante a CPI dos Bancos, declarou, há tempos, que a parcela tributável, incidente sobre o equivalente a quase um PIB nacional, não ingressa nos cofres públicos, todos se assustaram. Mas, baixada a poeira, pouco ou nada se fez, a não ser atribuir a responsabilidade por esses desequilíbrios às despesas de seu pessoal, tanto ativo como aposentado ou pensionista. A CONCLUSÃO É inquestionável, pois, que essa nova tentativa não se sustenta. É uma solução imediatista, um confisco que se pretende instituir contra uma geração de servidores que, por isso mesmo, não pode ser responsabilizada. Não é sensata e muito menos legítima, pelo simples fato de que a própria concessão da aposentadoria ou da pensão representa prova irretorquível de que o servidor 21 Paridade e Contribuição de aposentados e pensionistas cumpriu todos os requisitos funcionais, pecuniários e temporais, estabelecidos legalmente. A estratégia agora utilizada pelo governo nada de novo acrescenta. Tratase de uma atitude meramente casuística, adotada de afogadilho, tão ou mais nefasta do que outras já rejeitadas anteriormente. É preciso, pois, que os nossos Senadores não abdiquem de sua competência e rejeitem, desta vez em caráter definitivo, essa espúria medida, seja porque é injusta e cruel em sua essência, incompatível com a situação remuneratória do servidor aposentado ou seu pensionista, seja porque a nossa Carta Cidadã assim recomenda e assim exige. 22 Paridade e Contribuição de aposentados e pensionistas COM A PALAVRA O SENADO FEDERAL! 23 Conselho Executivo 2003 Presidente ................................................................. Assunta Di Dea Bergamasco Vice-Presidente Executivo ........................................ João Martin Rúbia VP de Administração ................................................ Benedito Leite Sobrinho VP de Finanças ........................................................ Victoria Colonna Romano VP de Política de Classe .......................................... Sandra Tereza Paiva Miranda VP de Política de Interesse Fiscal ............................ Edgard dos Santos VP de Aposentados e Pensionistas .......................... Maria Inês Piovesan Bersanetti VP de Cultura Profissional, Esportes e Lazer ........... Carmelina Calabrese VP de Divulgação ..................................................... Ariovaldo Cirelo VP de Serviços Assistenciais ................................... Carlos Alberto Ferraz e Silva VP de Relações Públicas ......................................... Pedro Augusto Sanchez VP de Assuntos Jurídicos ......................................... Wanderley Secco Conselho Fiscal Adairton Baptista Denise Therezinha da Silva Carlos de Assis Salvador Francisco Boccia Sergio Aparecido Tinti Walter de Carvalho Walter Moraes Gallo