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Correios 350 anos
Depoimento de Josimar Fernandes de Oliveira
Entrevistado por Rosana Miziara
Braslia, 08/07/2013
Realizao Museu da Pessoa
HVC_030_ Josimar Fernandes de Oliveira
Transcrito por Karina Medici Barrella
P/1 Josimar, vou comear pedindo para voc falar o seu nome, local e data de nascimento.
R Bom, como desenhista, ilustrador, meu nome J Oliveira, mas meu nome de batismo Josimar Fernandes
de Oliveira. E eu nasci na Ilha de Itamarac, em Pernambuco, e minhas origens so todas pernambucanas.
P/1 Tanto do lado materno quanto paterno?
R Exatamente, materno e paterno. So do interior de Pernambuco, da cidade chamada Joo Alfredo
P/1 E qual a sua trajetria? Voc mudou para So Paulo, Rio?
R , com 15 anos meus pais se mudaram para Mato Grosso do Sul, que na poca era apenas Mato Grosso, e
depois meu pai veio aqui para Braslia, j no fim da construo, e logo em seguida minha famlia se mudou
toda para c. E eu fiquei em Mato Grosso at que eu terminei meus estudos, fui servir o Exrcito na fronteira
com o Paraguai, na cidade de Ponta Por. E quando eu terminei eu fui para o Rio de Janeiro porque o meu
sonho era estudar na Escola Nacional de Belas Artes, foi isso que eu fiz.
P/1 Quando que voc comeou a desenhar?
R Desde criana. O primeiro desenho que eu fiz eu me lembro porque foi uma coisa inusitada. Eu fui
visitar, ns tnhamos nos mudado para uma determinada rua em Campina Grande, na Paraba, que eu morei
tambm na Paraba, e o que aconteceu que era desenhista o filho da famlia e eu fiquei encantado com o
desenho. E ele tinha deixado uma folha em cima da prancheta, que ele tinha feito um desenho sobre ela
na outra folha e deixou as marcas. Ento eu peguei um lpis e preenchi e ele ficou admirado, achando que o
desenho era meu. E quando ele perguntou eu afirmei, eu tinha seis anos: Fui eu que fiz, claro. E ento a
partir da eu nunca mais larguei o desenho.
P/1 Voc comeou a desenhar?
R O desenho sempre me atraiu, antes mesmo de saber ler eu j fazia desenhos, preenchia papis e papis
com personagens de histrias em quadrinhos, etc.
P/1 Tinha algum na sua famlia que desenhava? Voc tinha um exemplo de algum que voc via desenhando?
R Tinha sim, minha av. Minha av era uma exmia desenhista. No s isso, mas ela fazia os bonecos
articulados, inclusive eu tenho aqui, eu consegui, nos ltimos anos eu tenho recolhido dos meus familiares
desenhos dela. Ela desenhava com lpis de cor no fundo de caixas de papelo, caixa de sapato. E ela
montava uns bonecos articulados, chamava Man Gostoso, que voc puxa um cordo e ele levanta as pernas
e os braos. Eu tenho isso comigo. E eu admirava muito o trabalho dela.
P/1 Ela fazia desenhos para voc?
R Fazia desenhos. Eu no lembro dela ter me dado desenho, mas depois eu consegui recolher de vrios tios
meus que tinham guardado, e eu tenho essa coleo comigo. Realmente era um bom exemplo, eu sempre
admirava, sempre gostava de ver ela trabalhando quando eu ia visitar. Porque eu no morava com ela, eu
geralmente ia visitar meus avs nas frias, que a gente morava em Campina Grande, na Paraba, e meus avs
continuaram morando em Joo Alfredo, no interior de Pernambuco, mas todas frias escolares eu passava l
com eles.
P/1 E voc chegou a fazer algum cursinho, algum curso quando era criana?
R Ah sim, com 15 anos eu descobri que eu podia estudar Artes. At ento eu no tinha noo disso, foi quando
eu estava em Mato Grosso. A eu fiz, o primeiro curso que eu fiz foi por correspondncia. Nas histrias em
quadrinhos da poca vinha, na ltima pgina, tinha uma pgina muito interessante mostrando como a vida do
desenhista, era engraado porque sempre o ltimo quadro era o sujeito sentado assim, na cadeira de
espreguiadeira, ao lado de uma piscina, fumando cachimbo e lendo o jornal, era mostrando como seria a
vida de um desenhista. Mas a eu descobri que poderia fazer por correspondncia, existia naquela poca,
logo no incio, a Escola Panamericana de Artes, eu fiz o curso por correspondncia, foi o primeiro curso
que eu fiz.
P/1 Como que era? Eles te mandavam...
R Eles mandavam a apostila com a srie de exerccios, eu fazia os exerccios e mandava, e depois vinha os
trabalhos corrigidos, com indicaes do que eu tinha que fazer. E eu tenho at hoje essas apostilas xerocadas
porque infelizmente eu perdi, mas recentemente eu achei uma pessoa que tinha e me deu o xerox dela.
P/1 E voc fazia pelos Correios?
R Fazia pelos Correios, exatamente. Eu usava os Correios. Nessa poca que surgiu a minha paixo pelo
Selo Postal.
P/1 Nessa poca? Como que foi?
R Eu juntava selos. Quando eu era mais moo eu tinha muito contato com a igreja, era muito ligado Igreja
Catlica, e na poca tinha uns padres que eram americanos. Ento, todas as cartas que eles recebiam eles me
davam os selos, e eu sempre guardava aqueles selos, achava aquelas figurinhas muito bonitas. Mas nunca
fui colecionador, sempre fui ajuntador de selos.
P/1 E quando sua famlia mudou para Braslia voc continuou em Mato Grosso?
R Continuei em Mato Grosso.
P/1 Voc tinha quantos anos?
R Eu tinha 17 anos.
P/1 E como que voc se correspondia com sua famlia?
R A nica maneira, at na Hungria, quando eu fui estudar na Hungria j na dcada de 70, a nica maneira de
comunicao era atravs da carta, no tinha outro sistema de comunicao. Para mim no tinha. Porque meus
pais no tinham telefone, telefone na poca era um bem s para as pessoas que tinham dinheiro. Comunicava
atravs de cartas.
P/1 E voc recebia encomendas da sua famlia?
R Poucas. Porque a gente no precisava de nada, tinha essa grande vantagem que quando tinha bolsa de
estudos num pas, na Hungria, que era um pas socialista, a gente recebia tudo.
P/1 Mas espera a, eu estou voltando, nesse perodo do Mato Grosso.
R No, Mato Grosso, no. Eu morei no Mato Grosso foi de 59 a 65, foi quando eu fui para o Rio de
Janeiro, esse foi o perodo que eu passei l. A metade eu fiquei com meus pais e depois eu fiquei l, eu
fiquei trabalhando. Eu fiquei numa casa que eu fazia certos trabalhos, por exemplo, eu ajudava na igreja,
era uma espcie de sacristo. Foi isso.
P/1 A voc ficou l.
R Fiquei l e depois fui para Aquidauna.
P/1 Que a voc se correspondia com sua famlia por cartas? Quem te escrevia?
R Meu irmo, eu tinha um irmo que infelizmente j faleceu, e a gente sempre trocava correspondncia.
P/1 Tem alguma carta que tenha te marcado? Voc lembra?
R Eu lembro o seguinte, da descrio do que era Braslia. Braslia para mim era uma coisa assim, eu tinha
muita curiosidade. At que quando eu completei 17 anos, antes dos meus 18 anos eu vim para c visitar
meus pais, a fiquei encantado com a cidade, era uma coisa extraordinria. Era praticamente um deserto,
um deserto, claro, com rvores, essas rvores tortas, e no meio desse deserto l no alto voc j avistava essa
coisa branca, instalada, parecia um disco voador parado. Foi uma coisa, foi uma viso extraordinria de
Braslia, desde ento eu tenho me encantado com a cidade.
P/1 Mas o seu irmo te descrevia por cartas, como era?
R Sim. Exatamente. Descrevia, dizia como era a vida aqui, que era complicadssima, no incio no tinha
nada, no incio era muita poeira. Isso eu alcancei porque em 61 eu estive em Braslia a primeira vez.
Braslia s tinha um ano e meio na primeira vez que eu vim aqui. E aqui era muito complicado, no tinha
nada. As coisas eram bem precrias, eu me lembro. E quando chovia era um lamaal tremendo. Para gente
entrar em casa tinha que ser com um pedao de ferro para tirar a quantidade de lama que aqui cola no
solado.
P/1 A l no Mato Grosso voc pegava esse selo e voc j guardava? Eles te davam.
R Exato. Com a minha paixo pela imagem, tudo que era interessante, como por exemplo, histria em
quadrinhos, raros vdeos infantis que na poca praticamente no existia, e principalmente selos postais,
todas as crianas juntavam. interessante, na poca a gente tinha essa mania, no era bem colecionador
porque colecionador uma coisa muito sria, no simplesmente juntar, mas j tinha lbum de selos, essas
coisas. E a gente ficava atrs de selo estrangeiro, sempre interessante. Eu lembro de selos que a gente no
conseguia saber de que pas era, era Netherland, Magyarorszg, que diabo isso? Hungria. Eu no conseguia
identificar, a gente guardava e no sabia de onde era esse selo (risos) porque sempre escreve no idioma
original.
P/1 E a voc queria fazer faculdade de Belas Artes?
R Isso. A eu descobri que existia no Rio uma escola muito boa, a Escola Nacional de Belas Artes, tradio.
Uma escola fundada pelos franceses e que tinha os grandes artistas, tinha grandes artistas na primeira
metade do sculo, e fim do sculo XIX tinham estudado nessa escola. Ento fui para o Rio de Janeiro para
isso, para estudar na escola de Belas Artes.
P/1 Ento voc nem chegou a vir para Braslia, voc foi de Mato Grosso para o...
R Exato. Eu estava iniciando minha vida de adulto e eu tinha que definir minha vida. E aqui no tinha
condies nenhuma. Aqui no tinha a escola que me interessava. Ento eu resolvi ir para o Rio de Janeiro e
deu certo de eu conseguir entrar na Escola Nacional de Belas Artes, fiz o vestibular, me preparei seis
meses antes. Eu trabalhava de tarde e de manh eu fiz um curso pr-vestibular.
P/1 Voc trabalhava tarde l no Mato Grosso?
R No, no Mato Grosso eu no trabalhava, no Mato Grosso eu apenas estudava e cuidava dessa parte que
eu te falei, trabalhava na parquia. E no Rio de Janeiro eu consegui um emprego.
P/1 Onde?
R Numa loja americana chamada Sears Roebuck que fechou, hoje no existe mais. Chegou a ter at aqui
em Braslia quando eu voltei da Hungria. Eu estudava de manh no centro da cidade e tarde at noite eu
ficava trabalhando na loja, eu era vendedor de cortinas. E foi muito importante isso, consegui conciliar
ento as coisas. At que chegou o momento...
P/1 Como que era a Faculdade de Belas Artes, quem eram os professores, quem frequentava?
R Bom, a Escola Nacional de Belas Artes era muito interessante porque ela era num prdio no centro da
cidade, num prdio fantstico, que hoje o Museu Nacional de Belas Artes. J era museu, mas uma parte do
museu pertencia escola. E voc imagina, da minha janela eu via o Teatro Municipal. E do outro lado da
rua tinha a Biblioteca Nacional. Bem no centro da cidade de Rio de Janeiro, uma coisa extraordinria.
Hoje, infelizmente, a escola est bem distante. E era muito estimulante, era um local muito estimulante. E
a escola oferecia condies, tinha tradio e tudo. Mas eu comecei a me apaixonar por desenho animado,
coisa que no tinha na escola, no existia desenho animado. A na poca ns j tnhamos contato com o pessoal
que projetava filmes, era o movimento estudantil e tinha os cineclubes que projetavam muitos filmes de
pases socialistas. Eu fiquei encantado com os desenhos animados dos pases socialistas. E tinha um amigo
meu, que o Mau Oliveira, que infelizmente j faleceu, ele tinha cineclube e conseguiu atravs de contato
com as embaixadas, ele conseguiu que a Hungria me desse uma bolsa de estudos. Ento, eu e o meu
amigo Rui de Oliveira, que ilustrador tambm, fomos para Hungria graas a esse meu amigo.
P/1 Depois de formado ou no meio do curso?
R A que est, as condies estavam pssimas. Era plena ditadura, tinha vrios amigos meus que comearam a
ser visados. E imagina que essa pessoa que me ajudou, que o Mau Oliveira, j falecido, ele simplesmente
roubou o primeiro avio para Cuba. Ento se eu estivesse aqui no Brasil eu estaria ferrado. Eu teria um
grande problema porque eu era amicssimo dele, frequentava a casa dele. Ele fez isso no mesmo ano que
eu fui para Hungria. Ento esse problema militar, da ditadura, me deu oportunidade de ir embora, eu disse:
Vou embora daqui porque no tem condies de estudar aqui.
P/1 Voc parou em que ano?
R Eu parei no terceiro ano. A na Hungria tive que recomear tudo de novo. Fui l para estudar desenho
animado, passei seis meses estudando desenho animado. E depois eu descobri que existia uma escola de
artes l que tinha curso de Artes Grficas, isso que me interessava. Ento, eu consegui entrar na escola, mas
a condio que eu tinha que saber o idioma, no existia escola para estrangeiros, todo estrangeiro tinha que
se comunicar em hngaro. Foi o que eu fiz. Eu frequentei a escola de idioma durante um ano e logo depois
fiz vestibular e entrei na escola.
P/1 E como voc se mantinha l?
R Ah, a bolsa de estudos.
P/1 Era bolsa?
R Era bolsa de estudos. Na poca, os governos dos pases socialistas tinham uma poltica muito interessante
relacionada com terceiro mundo. Eles ofereciam tudo, voc s tinha que pagar a passagem para ir, uma vez
conseguida a bolsa de estudos voc pagava passagem de ida e quando voc chegava l voc passava a ser um
assalariado, eles pagavam um salrio que dava todas as condies de sobrevivncia, o local para voc dormir,
um restaurante que voc podia frequentar. E a escola era como em todos os pases socialistas, as escolas
ofereciam todas as condies para os estudantes, ento voc no precisava se preocupar com a sobrevivncia.
Alm de te dar todo o material, tudo, voc s tinha que fazer uma coisa, s tinha que estudar e nada mais. Era
muito bom.
P/1 E a voc nesse perodo voc fez alguns trabalhos l?
R Bom, eu comecei a fazer meus trabalhos l. No comeo foi um pouco difcil porque o nvel era muito alto,
o sistema de ensino artstico na Hungria, j desde criana a pessoa, quando se revela que est interessada em
estudar Arte, a pessoa comea a frequentar escolas de artes, chamam-se Ginsios de Arte, ento eu tive uma
certa dificuldade. Mas como eu tinha levado comigo uma sries de livros sobre folclore brasileiro, uma
coisa que sempre me interessou, eu procurei, eu comecei a fazer gravuras, xilogravuras. Foi uma coisa
que foi muito importante para mim porque eu tive apoio do professor de desenho, que gostou muito e
falou que eu devia desenvolver isso. E eu comecei, j tinha trazido tambm do estudo que eu passei seis
meses estudando desenho animado no estdio, que no era uma escola, mas era um estdio, frequentando o
estdio. Eu tinha trazido uma srie de projetos grficos de filme, storyboard, que abordava a histria do
Nordeste. E, por sorte, apareceu a oportunidade de visitar a Itlia, em 1973, que l tinha um festival de
histria em quadrinhos muito importante na cidade de Lucca, e esse festival, ns fomos convidados. Por
acaso encontramos na Hungria um dos diretores que estava recolhendo filmes para ser apresentado
porque nesse festival alm de ter um festival de histria em quadrinhos, noite eles projetavam desenho
animado. E, por sorte, nesse ano o pas homenageado foi a Hungria. Ento, cruzamos com essa pessoa e
ele ficou encantado porque a esposa dele tinha morado no Brasil, enfim, nos convidou, eu e o Rui, para
participarmos do festival. Foi muito interessante porque eu encontrei com Ziraldo nesse festival, mas no
s isso, eu levei comigo meus projetos de desenho animado que eram storyboards, semelhantes a histria
em quadrinho, e era a nica coisa que eu tinha, eu no tinha histria em quadrinhos para mostrar. E tive a
sorte de encontrar um editor que se interessou. Ento, eu mesmo estudante j publicava na Itlia, eu tinha
trabalhos publicados na Itlia sobre histrias sobre o Nordeste, que depois, quando eu voltei aqui para o
Brasil, o Ziraldo pediu e publicou numa revista especial com o selo do Pasquim, ele publicou essas
histrias. A revista chama-se A Guerra no Reino Divino. Isso foi uma experincia muito interessante para
mim.
P/1 Voc conheceu o Ziraldo l? Voc j conhecia ele?
R No, eu conhecia o irmo do Ziraldo aqui antes de ir, o irmo do Ziraldo que tambm trabalhava com
desenho animado. E uma das razes que me fez ir para Hungria tambm foi que existia na poca um festival
chamado JB Mesbla, que era patrocinado pelo Jornal do Brasil e por uma loja de departamentos muito
famosa da poca chamada Mesbla. E eu fiz um filme desenhado sobre pelcula, um filme desenho animado
com trilha sonora e colorido a mo, e esse filme ganhou um prmio especial nesse festival. E graas a isso
ento foi uma das coisas que tambm me possibilitou ganhar essa bolsa de estudos para ir para Hungria.
P/1 Voc ficou quanto tempo l?
R Fiquei seis anos, alis, faltou s uma ou duas semanas para completar seis anos. Mas para mim foi muito
interessante. Fomos de navio porque na poca avio era muito caro e navio era baratssimo. Eu consegui a
passagem com o que eu recebi da loja, que eu pedi para ser demitido, eles me demitiram, e com esse
dinheiro eu consegui comprar a passagem, de navio samos do Rio de Janeiro e fomos at Gnova, depois
pegamos o trem, cruzamos todo o norte da Itlia at chegar Hungria.
P/1 E a, voc tinha planos para quando acabasse e voltar para o Brasil? O que voc pensava?
R No existia um plano definido. O fato de eu ter estudado no exterior e de ter, por exemplo, no caso a
nota final minha e do Rui foi mxima porque a gente se dedicou. Realmente nos dedicvamos 24 horas por
dia aos estudos. Fazia sempre com muito afinco e isso nos deu uma segurana muito grande. Ento, quando
eu voltei, eu tive dificuldade no primeiro ano aqui, mas na poca tambm no era to difcil voc conseguir
emprego. Eu consegui fazer concurso aqui e passei para Secretaria da Educao.
P/1 Aqui em Braslia?
R Aqui de Braslia, fiquei um ano e depois eu tive a oportunidade de trabalhar numa autarquia do
Ministrio da Agricultura que estava iniciando um projeto de comunicao visual rural, ento o meu estilo de
desenho caiu muito bem. A eu fiquei toda minha vida nesse emprego.
P/1 No Ministrio da Agricultura?
R , uma autarquia que chamava CFP, Companhia Nacional de Abastecimento, que depois o Collor
transformou vrias empresas numa s, enfim, mas eu fiquei 25 anos l. Trabalhei e me aposentei, na Conab,
no fim se tornou Conab. E claro, paralelamente eu fazia meus trabalhos, sempre trabalhei noite, sempre
quando chegava em casa, por volta de oito horas, sentava na prancheta e comeava a desenhar. Ento, eu
fiz muitos trabalhos, inclusive para Itlia, depois eu fiz vrios trabalhos para Itlia, tenho vrios servios
publicados na Itlia e feitos aqui, na prancheta, aqui em Braslia noite.
P/1 Como que comunicao visual para o setor rural?
R A comunicao rural para o setor rural, primeiro que voc tem que... Eu tenho muita dificuldade de
desenhar linha reta, engraado, e todo meu trabalho baseado muito na xilogravura nordestina, na
xilogravura medieval, nas gravuras medievais, e todas as outras manifestaes como os bonecos de
Vitalino, so todas coisas meio arredondadas. No s isso, mas tambm as caractersticas do campo, as casas,
a maneira de se vestir, os apetrechos que se usa, como que se locomove. Ento, essas coisas so fceis para
mim e isso cai bem na comunicao rural porque a CFP, no caso Companhia Nacional de Abastecimento,
lidava com o preo mnimo. O preo mnimo o preo que o governo oferecia para estimular o agricultor a
produzir, e geralmente, claro, para grandes e pequenos agricultores, ento os pequenos agricultores tinham
que ser bem estimulados. Fazia histria em quadrinhos, cartazes, anunciando quais eram os novos preos
que o governo iria pagar. Ento essas coisas sempre tm que ter uma imagem atraente, e essa imagem eu
conseguia fazer. Foi por a que eu trabalhei nessa companhia do Ministrio da Agricultura.
P/1 Os 25 anos voc passou fazendo isso l?
R Passei 25 anos, mas era muito agradvel porque eu trabalhava com desenho, eu tinha uma prancheta, at
que chegou um momento, j no fim, que no precisava, a tinha que usar computador, mas eu nunca
assimilei trabalhar com computador. Trabalho com computador escaneando para mandar um trabalho
para editora, para fazer pesquisa. Eu uso muito computador para fazer pesquisa, principalmente agora os
tablets que eu ponho em cima da prancheta porque quem trabalha com desenho tem que ter sempre
referncias visuais. Ningum sabe desenhar tudo de cabea. Ento, eu uso muito computador para isso, mas,
infelizmente, eu nunca aprendi a lidar com programas como Illustrator, tem vrios programas que se
trabalha com imagem. Isso eu no aprendi, infelizmente (risos). Mas eu cansei de fazer como o Ziraldo
faz, ele falou que quando quer trabalhar no computador ele pega uma pessoa que sabe lidar e ele vai
dizendo: Faz isso, faz isso, faz isso. timo, eu gostaria de ter esse sujeito comigo (risos).
P/1 Qual foi o primeiro livro infantil que voc fez?
R O primeiro livro infantil que eu fiz foi um livro que a me da minha mulher trabalhava numa editora na
Bulgria. Eu estudava na Hungria, minha mulher blgara, eu me casei com uma bulgra, em Budapeste, e
ela trabalhava na editora e me passou um livro, chama-se O Papagaio. No sei, est escrito em blgaro
inclusive (risos), com alfabeto cirlico. Mas esse foi o primeiro trabalho que eu fiz. Mas o segundo
trabalho que eu fiz a foi mais interessante, era baseado em cordel, chama-se A Briga do Cachorro Gato.
Foi publicado na Itlia, super colorido, um dos livros mais bem impressos que eu tenho comigo at hoje. E
foi um trabalho de encomenda de uma editora italiana.
P/1 J, quando que voc comeou a desenhar selo?
R Ah, interessante.
P/1 E como comeou isso?
R Ento, o seguinte, voc v que eu comecei a fazer histrias em quadrinhos usando a referncia nordestina e
eu comecei a fazer gravuras usando a referncia nordestina. Quando estava para terminar o curso que foi
logo em seguida, foi em 74, eu tinha que fazer o trabalho do diploma, eu escolhi o tema chama-se
Folclore do Nordeste, onde eu fiz cartazes, fiz livros infantis, usei as histrias em quadrinhos que tinham
sido impressas na Itlia como itens deste diploma. Eu teria que fazer vrias peas grficas, todas em cima de
um assunto central que foi o Nordeste. E eu resolvi ento fazer tambm selos. Eu peguei um livro infantil
que eu havia feito anteriormente, que era um livro sobre o bumba meu boi, e reduzi na fotografia, tinha
um laboratrio, ns tnhamos acesso a um laboratrio com papis especiais, eu fiz a reduo em preto e branco e
colori. Coloquei o ttulo, Brasil Correios, na poca tinha esse ttulo nos selos brasileiros, e fiz uma srie de
dez selos s sobre bumba meu boi, e colorido com aquelas canetas pequenininhas, picotei na mo, ou seja,
fiz tudo como se fosse selo. Isso foi muito importante para mim...
P/1 Por que voc decidiu colocar selo no item?
R Porque eu gostava sempre de selos, e como estava na Hungria, a nica maneira de se comunicar com
meu pessoal aqui era atravs de cartas. Ento, para gente se comunicar naquela poca levava um ms, eu
escrevia uma carta que em 15 dias chegava aqui, meus pais ou meu irmo respondia, e 15 dias depois eu
sabia a resposta. E coincidiu, quando eu estava na Hungria, que os Correios se transformaram em
empresa. E essa empresa investiu no novo design do selo postal. Teve uma melhora tremenda, que os
selos at ento eram selos no muito atraentes, e a partir de quando se tornou empresa eles tiveram deram
importncia muito grande ao visual. Ento convidaram um grande artista, o Gian Calvo, que foi o que fez o
logotipo que a ECT usa at hoje, e o Gian Calvo tambm desenvolveu todo um design com o novo selo
brasileiro. Isso me encantou muito, eu falei, Puxa, que bonito, ento eu resolvi incluir selo postal que era a
coisa que sempre me acompanhou o dia a dia porque eu recebia as cartas, e essas cartas vinham com os
novos selos. Eu achei que poderia, quem sabe quando eu for para o Brasil eu no posso fazer selos? Foi o
que aconteceu.
P/1 Voc tinha isso na cabea?
R Tinha. Primeira coisa que eu fiz quando cheguei aqui, na primeira semana foi procurar a ECT. Eu fui,
levei esses selos fictcios.
P/1 Voc tem esses fictcios ainda guardados?
R Tenho, est por aqui, mas eu tenho guardado.
P/1 Ah, depois se voc puder achar para gente.
R (risos), eu vou ter, hoje eu no garanto no, mas eu posso achar, escanear e mandar para voc.
P/1 Ah, voc faz isso?
R Isso. Eu vou procur-los. E ento, foi com esses selos que eu fiquei assim abismado porque logo que eu
mostrei o selo, uma semana depois me telefonaram dizendo que tinham um trabalho para mim. A me
deram uma srie...
P/1 Voc veio falar com quem? Nos Correios voc veio falar com quem?
R Eu fui falar com a Las, Las Scuotto. Era era assessora filatlica, pessoa responsvel por essa, uma pessoa
muito bem preparada, pessoa com uma viso muito ampla sobre selo postal. E eu fiz os primeiros selos e
deu um resultado muito bom porque o pessoal gostou. Eu fiz da maneira tradicional na poca, eu nem
colori os selos, apenas fiz a srie preto e branco e coloquei um papel vegetal em cima e fiz as misturas,
que na poca a gente trabalhava muito com as misturas, as quatro cores que se imprimem, a gente trabalha
com percentuais, mistura, tinham as siglas que voc colocava, 30% de magenta, sei l, mais 20% de outra
cor, das quatro cores e a voc formava as cores. A vantagem disso era que a grfica fazia isso. A grfica
tinha pessoas especializadas que transformavam essas indicaes nas cores que a gente escolheu. E as cores
eram muito boas porque no eram cores que eram feitas atravs de filtragem, eram cores diretas, ou seja,
era cor que saa direto e passava sem ter nenhuma mquina de captao, como uma mquina fotogrfica. Ento,
ficavam bem vibrantes as cores, e foi isso que aconteceu com o selo que eram os Mamulengos, que
talvez seja os melhores selos que eu tenho at hoje. Eu gosto muito desse...
P/1 Chama o qu?
R Mamulengos.
P/1 Voc tem eles ainda?
R Tenho sim. Esto aqui.
P/1 Voc vai escanear para gente tambm guardar?
R Vou sim. Eu vou escanear. Ento, o seguinte esse foi o incio. No ano seguinte eu comecei a fazer mais
selos. Fiz selos sobre Cavalhadas, ento eu praticamente quase me especializei em selos sobre folclore. Eu
tenho mais de 20 selos sobre folclores, cheguei at a fazer aqueles selos sobre a cultura chinesa, que no
deixa de ser folclore chins.
P/1 E como que ? Os Correios te encomendava?
R , os Correios me encomenda. Os Correios tem o seguinte sistema...
P/1 Como ele te encomendava naquela poca?
R E at hoje o mesmo jeito, s que hoje mais complicado porque tem muitos artistas inscritos. Os Correios
tinham pessoas que trabalhavam para eles que faziam selos, mas eles usavam algumas pessoas, artistas
principalmente, artistas plsticos, pintores etc. Os selos, a temtica escolhida um ano antes, so propostas, so
pessoas que pedem, so autoridades, so pedidos, geralmente de aniversrio de alguma coisa importante,
histrico, cultural etc. Ento, existe uma comisso que escolhe os temas que sero lanados no ano seguinte e
antes de terminar o ano ento so contratados artistas e todos artistas fazem, todos os desenhistas fazem os
selos que so encomendados. No caso, eu me especializei muito no selo do folclore, da cultura popular,
embora eu tenha feito selos sobre literatura, selos sobre eventos como o Ano Internacional da Criana que
eu fiz, fiz selo sobre Medicina, tem vrios selos meus, sobre a Cruz Vermelha, que inclusive eu ganhei o
Melhor Selo do Ano com um dos selos da Cruz Vermelha. Mas funciona dessa maneira, eles so
aprovados e no ano seguinte eles so lanados.
P/1 Mas essa linha do folclore foi uma linha que voc levou para os Correios ou eles te sugeriram?
R No, eles j tinham. Tanto que quando eu estive l, eu tive sorte que eles estavam precisando de algum
para fazer os selos sobre Mamulengo, Teatro de Mamulengo. Ento eu tive sorte, a hora que eu cheguei
tinha uma srie que ia ser lanada no ano seguinte e que no tinha ainda desenhista escolhido, foi minha
sorte, a eu fiz esses selos.
P/1 Qual foi o primeiro concurso que voc participou?
R Concurso de?
P/1 Selo.
R No existe concurso, existe convite. Hoje em dia eles fazem um certo concurso, hoje em dia eles fazem
o seguinte, no existe assim um mtodo fixo, mas eu sei que hoje em dia eles convidam, eles convidam
dois ou trs artistas que eles acham que seriam ideais para fazer determinados selos e pedem projetos,
esboo. E esse esboo submetido a uma comisso, o pessoal da assessoria de filatelia, e l eles escolhem qual
artista que vai fazer. Hoje assim, mas antigamente era um pouco diferente, eles convidavam diretamente
o artista que geralmente aceitava.
P/1 Qual foi o primeiro que voc participou?
R Foi desse, do Mamulengo, em seguida eu comecei a fazer selo, todo ano eu fiz selo, teve ano que eu fiz
sete selos. Hoje, raramente eu fao um ou dois por ano, nem todo ano eu fao selo. Antigamente chegava a
fazer at sete selos por ano. Levando em considerao que no uma quantidade muito grande, no passa de, sei
l, entre 20 e 30 selos, que so lanados por ano, no so tantos.
P/1 Vinte a trinta selos por ano?
R , eu no sei quantos fazem hoje, mas teve uma poca que era essa a quantia.
P/1 E qual a remunerao? Como funciona?
R A remunerao, hoje est bem melhor, mas era muito simblica. Mas mesmo assim, o selo a nica pea que
se me convidassem a fazer de graa eu faria, porque me d muita satisfao. Primeiro que um dos poucos
trabalhos que voc, a pessoa que recebe no paga nada, de graa, voc ganha um selo de graa, e vai para toda
parte do mundo. E, alm disso passa a ser uma pea da cultura oficial, passa a fazer parte de colees de
museus, de exposies, ento para um desenhista grfico isso muito importante. Geralmente os nossos
trabalhos no tm vida longa. A no ser que caia na mo de colecionadores, mas a capa de uma revista, a
revista passa, acabou. A capa de livro, quanto tempo dura? Mas o selo no, o selo vai ser colecionado, o
selo vai participar de colees internacionais, todos os museus internacionais de filatelia tm que ter teu selo
porque tm que ter selos do mundo inteiro. Ento, a remunerao no muito importante, embora eu ache que
deveria pagar mais, a gente sempre acha que deve pagar mais.
P/1 Qual foi o primeiro prmio internacional que voc recebeu?
R Olha, primeiro eu tive os prmios aqui no Brasil, j recebi quatro vezes o melhor selo. Porque todo ano
existe uma premiao, escolhido o melhor selo e quatro vezes eu recebi esse prmio aqui, essa medalha.
P/1 Quem organiza esse prmio? Onde que ?
R o prprio Correios. Hoje em dia, j h algum tempo tem a participao de pessoas, votantes, que ou tm o
selo ou acessa pela internet e vota no selo. O mais recente foi o de 2011 que so quatro selos sobre
folclore e eu ganhei o prmio, que inclusive eles vo me entregar esse ano, uma espcie de trofu. E duas
vezes selo, o selo que ganha o primeiro lugar so mandados para eventos internacionais, e dois selos meus
ganharam Melhor selo do mundo na categoria Turismo. So trs categorias que existe, e eu ganhei nessa
categoria, Turismo.
P/1 Quais so os selos?
R um sobre literatura de cordel, que so dois selos que abordam dois cordis famosos que A Imperatriz
Porcina e o segundo O Pavo Misterioso. E o outro uma srie de selos que eu fiz sobre bailado popular e os
selos, se no me engano, o selo que foi focado o selo sobre Folia de Reis, Reizada, alis.
P/1 Que ganhou prmio internacional?
R , um prmio internacional. um trofu que, esse trofu eu no recebi, quem recebeu foi o Brasil, foi os
Correios do Brasil, e esse trofu est no Museu Postal.
P/1 E como a premiao, voc vai para l?
R No. Infelizmente porque no fui eu que ganhei, o meu trabalho que ganhou. Quem vai l o pessoal dos
Correios, mas quando ganhou eu estava com viagem para Itlia e eu participei, eu fui l por conta prpria e
participei. Foi na cidade de Asiago, que uma cidade que fica perto, no norte, no Vneto perto de Vincenza.
A eu fui l, apareci l (risos) por conta prpria.
P/1 Qual o seu processo de criao, quer dizer, como a confeco de um selo?
R A confeco de um selo o seguinte, voc pega, te mandam o tema e cabe ento a mim a fazer as pesquisas,
pesquisa visual. Se for sobre um livro, caso que aconteceu comigo, eu leio o livro, eu li o livro A
Bagaceira do Jos Amrico que foi um dos livros que eu fiz, que era sobre Literatura. Eu leio o livro,
procuro informaes, procuro ler crtica, enfim, eu me informo o mximo possvel. E vou atrs de imagens, se
existe imagem especfica do livro ou se so imagens sobre a temtica, no caso do Jos Amrico eu coloquei
um close dele, do escritor, e atrs eu coloquei uma famlia de retirantes se dirigindo para cidade, e coloquei
os personagens que ele encontrou na cidade, ento esse contraste. Por exemplo, o ltimo selo que eu fiz a
ser lanado foi 100 anos de Luiz Gonzaga. Eu procurei fazer toda uma histria, mostrando Luiz Gonzaga
no primeiro plano com a sanfona, vestido a rigor, fantasia que ele usava quando se apresentava. A
imagem do pssaro, Asa Branca, voando de um lado que est a seca, que um lado todo vermelho com
cactus, at chegar numas nuvens bem azuis, e uma cena que lembra o inverno, que lembra o tempo
chuvoso. Embaixo, bem no cantinho eu coloquei dois olhos verdes e uma plantao de milho bem
verdinha, que um dos poemas de Asa Branca que fala Quando o verde dos teus olhos se espalhar na
plantao. E tambm interessante, eu no sabia, o Luiz Gonzaga era maom; a maonaria pediu e os Correios
colocaram em cima a logomarca da maonaria. Inclusive aqui em Braslia foi lanado no espao da prpria
maonaria. Interessante.
P/1 Esse selo?
R . Tem toda a histria (risos)
P/1 E de todos esses selos que voc fez qual o mais importante? O que te marcou mais?
R Olha, tem trs selos que eu gosto muito. O primeiro foi o Mamulengo, que eu acho que foi, me marcou
muito, no s isso, mas tambm a soluo, como eu conseguir solucionar.
P/1 Como foi?
R bem simples, no tem fundo, so os traos bem grossos imitando gravura e as cores chapadas, bem vivas.
E esse selo, ele quase como um cartaz, voc olhou, voc j sabe que a mensagem chega at voc, e escrito
embaixo Mamulengos, escrito mo. O outro foi sobre literatura de cordel, que uma paixo minha muito
grande desde minha infncia, que eu gostei muito porque na hora de eu fazer os selos, so dois selos. O
selo o seguinte, tem as pginas separadas que so para ser vendidas no guich, que o usurio vai usar no
prprio envelope, e tem uma outra pea filatlica que o bloco filatlico onde tem os dois selos e em volta tem
toda uma decorao sobre a temtica. Esse bloco foi o que ganhou o prmio Melhor Selo do Mundo.
P/1 Esse bloco vai na carta tambm?
R No, esse bloco para colecionadores.
P/1 Feito j para colecionador?
R Feito para colecionador. Caso, se quiser, tem o selo picotado, mas eu duvido que algum arranque, a no
ser que por necessidade, mas no precisa.
P/1 O colecionador compra nos Correios, isso?
R Compra nos Correios, que uma grande coisa para os Correios. Voc compra o recibo, paga o servio e os
Correios no faz o servio (risos), prega direto no seu lbum. Bom, ento o seguinte, esse selo sobre o
Mamulengo, a ento chefe da filatelia, a Las, ela queria fazer dois selos, mas ela s tinha um que era A
Imperatriz Porcina, e ela perguntou para mim: Que selo voc gostaria de fazer?. A eu dei a sugesto e ela
aceitou, que era O Pavo Misterioso, que uma histria que sempre me acompanhou desde minha infncia,
uma histria muito bonita, passada na Grcia e no Oriente, Oriente Prximo, muito interessante. E ela
aceitou essa minha ideia, ela falou: Eu gostei. E isso me abriu uma coisa muito interessante na minha
vida porque logo em seguida eu falei, era um sonho meu fazer uma verso infantil dO Pavo Misterioso,
que a histria do pavo misterioso original, o folheto, ele no foi escrito para criana, mas a histria bem conto
de fadas, mil e uma noites, a eu transformei ele em infantil. E com esse livro eu consegui vrias coisas, eu
consegui prmio, ganhei o Prmio Tucuxi de ilustrao dado pelo Museu da Imagem e Som do Rio de
Janeiro, o prmio foi entregue nas dependncias da Academia Brasileira de Letras, uma das votantes foi a
Rachel de Queiroz. A depois me possibilitou conseguir atravs da Embaixada Americana, graas a esse
Pavo Misterioso, viajar e ficar 30 dias nos Estados Unidos participando de um encontro internacional,
visitando vrias partes dos Estados Unidos, o ms inteiro de viagens s indo para universidades ligadas ao
livro infantil, encontrando com autores, enfim. A coisa mais interessante recentemente foi que eu
participei da Festa Literria Internacional de Paraty e tem a parte infantil, claro, fui participar dessa parte
infantil. E o teatro que eles montam, que estava montado para receber as crianas, o fundo eles ampliaram
assim o pavo misterioso quase 10 metros pregado no palco. Ento so coisas assim, O Pavo Misterioso,
graas a esse selo, que foi depois abrindo vrias coisas, me deu essa, eu viajei nas asas do pavo depois do
selo postal. Ento foi muito interessante, uma coisa inusitada, mas que me d muita satisfao.
P/1 J, como que a confeco mesmo? Porque o selo pequeno, quais so as propores?
R como eu tinha falado, primeiro eu fao a pesquisa, depois eu fao uma srie de esboos a lpis, rpido, at
encontrar uma soluo de composio. A partir da, dependendo do selo, eu vou atrs de referncias visuais.
Uma vez encontradas as referncias visuais, a eu tento fazer aquele esboo, passo a limpo a lpis e quando
eu acho que est definitivo ento, em geral, eu uso uma mesa de luz e copio o desenho. Como eu falei, eu
no trabalho com computador, eu copio o desenho no papel definitivo, geralmente tem um papel especial,
um papel importado, chama-se papel aquarela, papel grosso, que no enruga. E uma vez desenhado a lpis
eu venho com canetinha, primeiro eu desenho com caneta e em seguida, hoje em dia, antigamente eu no
fazia isso, mas hoje em dia eu pego pincel com tinta acrlica preta e vou engrossando as linhas. Uma vez
terminado eu espero secar e uso ento aquarela lquida, que so os vidrinhos de tinta super forte, umas cores
muito, muito intensas, e vou colorindo conforme eu acho ideal. Se no fim est tudo certinho, se eu fico
satisfeito, com um papel de seda eu ponho no envelope e entrego nos correios. Ou ento eu escaneio,
geralmente eu fao do tamanho do scanner e mando atravs da internet, assim que funciona.
P/1 Como uma gravura?
R Como uma gravura, exatamente. Geralmente para os Correios eu mando o original porque os originais
geralmente ficam com ele. Todos os meus originais vocs podem encontrar l no Museu Postal. Mas so
sempre feitos sobre papel.
P/1 A eles reduzem?
R , teve um selo, deixa eu te mostrar aqui. Este selo aqui (mexendo em papel). Este selo aqui que o, aqui
a reproduo. Essa pea aqui o edital.
Cmera J, voc pode segurar prximo de voc, um pouco mais para cima s. , a, est legal.
R Esse aqui o edital. O edital uma pea, uma espcie de folder, que feito especialmente para filatelista ou
para quem quer saber todas as informaes sobre o selo. Ento aqui est escrito, tem um texto de apresentao
geralmente feito por uma pessoa que especialista no assunto e vem em dois idiomas, ingls e portugus,
antigamente vinha at em francs, eram trs idiomas. E no fim tem toda a ficha tcnica de qual foi o processo
de impresso, qual a tiragem etc, qual o picote, para colecionadores, especialistas, isso muito importante.
E tambm tem um texto mostrando o que eu fao, qual era a minha concepo. Esse selo, essa pea aqui, a
gente faz um desenho diferente. E esse aqui, por exemplo, eu fiz em trs dimenses, que esse selo sobre o
ano do boi, que do horscopo chins, e ele metlico. Aqui no metlico porque uma reproduo, ele feito, ele
tem uma aplicao de metal dourado sobre o desenho. E esse aqui eu fiz especialmente para essa pea, que o
edital, e eu fiz em trs dimenses. Eu procurei ver, esse touro aqui eu no inventei, nem tampouco eu copiei,
mas eu fui atrs de referncias visuais sobre os bonequinhos que eles fazem com a figura do touro e eu fui
pegando vrias referncias e fiz esse tourinho com plastilina e pintei com tinta acrlica, e l o pessoal dos
Correios fotografou e aplicou a nesse edital aqui. Ento voc pode ver que pode se fazer selo tambm com
trs dimenses.
P/1 Essa pea, o edital, fica onde? Como que as pessoas tm acesso?
R Fica geralmente em agncias especiais, tem agncias que tem uma seo especial s para atender
colecionadores. O selo que eu falei, metlico, esse aqui. Eu no falei do terceiro selo, so trs selos que eu
falei, esqueci de falar. O terceiro selo esse daqui, um selo que para mim tambm foi muito interessante
porque eu no tenho a arte final dele, ele foi feito em vrias partes separadas. Eu fiz o esboo e cada parte
foi feita separado. E a Casa da Moeda no fim aplicou a indicao que eu dei, em relevo, desse dourado
aqui, que voc que tem caracterstica bem chinesa. Aqui tem todos os animais do horscopo chins, est
escrito em chins aqui, e embaixo a traduo. Mas um selo brasileiro.
P/1 Foi para os Correios esse?
R Exato, para os Correios.
P/1 E por que chins? Foi uma encomenda ou voc que...
R No, no foi encomenda. Os Correios decidiram homenagear a China e ento queriam fazer, pretendia, eu
entendi isso, todo ano sairia um selo, porque cada ano um animal diferente do horscopo chins. Eu
cheguei a fazer s trs, eu no sei porque razo no continuaram a fazer, s foram lanados trs selos, sobre trs
animais, deveriam ser 12.
P/1 Ento os dois prmios internacionais foi esse que voc ganhou do...
R No, o outro prmio internacional um selo chamado, que eu j tinha falado, sobre Reizado, da srie...
P/1 Ele est aqui, esse?
R Ele est aqui bonitinho. O do Reizado est aqui,
P/1 Ah, esse do Reizado. A Mrcia fotografou esse, ser?
R Sim, fotografou todos.
P/1 Qual a histria desse prmio, como foi a encomenda? Conta desde a encomenda.
R A encomenda o seguinte, todo ano os Correios faziam selos sobre cultura popular, porque agosto o ms
do folclore, geralmente lanado em agosto. Bom, os Correios sempre homenageiam, ou homenageavam,
no tenho acompanhado se homenageiam todo ano agora, o folclore brasileiro, a cultura popular. E este
selo geralmente lanado no ms de agosto. E este ano eles resolveram fazer sobre a dana popular, ento eu
escolhi trs temas, era da Caboclinho, se no me engano, Reizado e o outro, Marujada, no lembro quais so.
Ento foi passada essa tarefa para mim, eu estudei cada uma das manifestaes, fui atrs de revista, de
fotografias e a partir da eu compus. A composio aquele processo que eu sempre fao igual, da mesma
maneira, s que as solues so diferentes dependendo do tema. Solues de composio etc. Eu fiz ento esses trs
selos que foram lanados no mesmo dia, homenageando o folclore, foi isso.
P/1 E a, quem inscreve para participar? Voc j tinha me falado.
R o seguinte, os Correios tm uma comisso que estuda todas as propostas que so mandadas. Porque vrias
pessoas mandam propostas, polticos, cidades que esto comemorando aniversrio, clubes de futebol, todo
mundo manda pedido para fazer selo, est aberto, qualquer um, qualquer pessoa pode sugerir. Essa
comisso se rene e v quais so os selos que podem ou no ser lanados porque muito limitado. Ento, v quais
so as coisas mais importantes, quer dizer, mais interessantes mesmo, e a partir da, como eu falei, escolhe
o desenhista, hoje em dia geralmente escolhem trs desenhistas, que faz os projetos e so submetidos l a
essa comisso. Essa comisso escolhe quem que vai fazer.
P/1 Mas para esses prmios so os Correios que fazem?
R Os prmios no. Tem dois prmios, o prmio nacional que, eu no sei como hoje, mas antigamente tinha
uma comisso que se reunia para escolher o melhor selo. Hoje em dia eu sei que tem a participao popular,
a pessoa pode votar atravs da internet. Os Correios lanam, pem no ar, eu acredito, no seu site os selos que
esto concorrendo, os selos do ano anterior, que foram lanados, e pedem para as pessoas votarem. E agora
eu no sei se existe, se essa comisso tambm depois disso julga, se realmente o melhor selo escolhido pelos
votantes esse que vai ser, eu nunca procurei me inteirar como hoje, antigamente eu sabia como era.
P/1 Esse o nacional. E o internacional, quem que inscreve?
R O internacional o seguinte, os prprios Correios de todo o mundo so convidados e inscrevem os selos
nesses concursos internacionais, no caso esse a. Eu no conheo outros concursos internacionais, eu s
conheo esse da Itlia, mas provvel que existam outro. E o melhor selo do ano anterior no ano seguinte
inscrito nesse concurso internacional para concorrer.
P/ 1 Mais ou menos quantos selos voc j fez at hoje para os Correios?
R Eu fiz mais de 50, eu no tenho o nmero certo porque eu no parei para contar, mas eu j contei 50, pelo
menos 50. Alm de peas filatlicas como postais, tem vrios postais que eu fiz. Alguns postais, por exemplo,
eu fiz o postal sobre o ano do boi, tambm, que foi bem anterior, foi lanado numa feira internacional em
Hong Kong, quando Hong Kong ainda era independente, no era chins, pertencia Inglaterra. E tambm tem
os desenhos de envelope Primeiro Dia; cada envelope, voc v cada envelope aqui tem, esse aqui um
envelope especial que tem para colecionadores. Eles colocam um selo e est escrito que envelope
Primeiro Dia, isso muito importante para colecionador que s coleciona, tem colecionadores que se
limitam a esse. Ento eu tenho que fazer o qu? Eu tenho que fazer um desenho alusivo ao tema e tambm
uma coisa que eu esqueci, eu tambm tenho que fazer um desenho do carimbo. Ento so trs peas filatlicas
quando faz o selo. Ou mais. Tem o edital, nem sempre tem o edital, ultimamente eu no lembro se sempre
tem edital, mas sempre tinha edital, tinha o envelope Primeiro Dia, tinha o carimbo, ento so trs ou quatro
desenhos que se faz.
P/1 Ento essa arte, voc tem que fazer uma para o envelope?
R Tem que fazer uma para o envelope, uma para o carimbo e uma para o...
P/1 O carimbo diferente do selo?
R , exato. O carimbo diferente de selo porque o seguinte, uma pea muito especial, que voc tem que levar
em considerao que ela tem que ser muito bem pensada porque na hora que carimba, se voc fizer muito,
ela pode fechar, no uma impresso muito precisa, ento, precisa ter um certo cuidado para que ele no borre
muito, no fique muita sujeira, ? E o selo tambm. Voc pode colocar o que quiser, mas tem que sempre
levar em considerao que vai ser muito reduzido. Porque eu fao geralmente em tamanho ofcio, ou seja, no
tamanho A4, e significa que tem 21 por 29,7 centmetros, ento voc fazer um desenho desse tamanho e
reduzir para c, muitas vezes a reduo, voc est entendendo? Eu nunca calculei, mas a reduo extrema,
precisa ter muito cuidado para no fechar. Se voc pegar uma lupa, voc vai ver detalhes assim, incrveis,
que no sei como consegue. Teve um selo que eu fiz, que acho que era 120, acho que era 150 anos do
Dirio de Pernambuco, que eu decidi que teria a primeira pgina da primeira edio, embora na poca o jornal
era pequenininho, era mais ou menos do tamanho de uma folha A4, um pouquinho menor. E eles me
deram uma cpia, um facsimile dessa primeira edio, s que as letras redondas, o o, o e, o a, estava tudo
fechado, e eu queria que estivesse no selo, mas eu achei que seria muito ruim que tivesse aquela coisa
borrada. Eu coloquei um papel vegetal por cima e com a caneta fininha eu desenhei toda pgina, copiei a
mo, tudo, ttulo, tudo, e inclu junto com o desenho original do selo e deixei o espao atrs, um retngulo e
pedindo Casa da Moeda para incluir. O interessante que eles fizeram isso, e na hora que eu recebi o selo,
eu peguei uma lupa e olhei, nenhuma letra estava fechada, todas as letras estavam abertinhas, ento voc v
precisamente, melhor do que o facsimile que me deram. Fiquei encantado, a tcnica, a que ponto chegou.
Voc v, pega uma pgina inteira e reduz para um trechinho do selo e voc pega uma lupa e l tudo, no tem
uma letra fechada. Isso foi antes da tecnologia de computador. isso.
P/1 Qual foi o primeiro carto postal que voc fez? Quando foi?
R O primeiro carto postal, acho que foi sobre Cavalhada... Sabe, eu no consigo me lembrar, mas um que
eu lembro muito bem, que realmente todo mundo gostou foi sobre o Pavo Misterioso. Esse est aqui, em
algum lugar aqui, eu te mostrei h pouco... Est aqui .
P/1 Ai que lindo! Fiquei encantada!
R Nem sempre o Correios faz, antigamente fazia mais. Esse negcio de...
P/1 Esse Pavo Misterioso foi dentro daquela temtica que voc tava falando?
R Exatamente, foi dentro, foi feito o selo, foi feito o carimbo, foi feito tambm o envelope Primeiro Dia,
todas essas coisas foram feitas para o Pavo Misterioso.
P/1 E voc fazia todos esses trabalhos concomitantes ao seu trabalho no Ministrio da Agricultura?
R Sim, pois . Eu tinha que ter um emprego porque a gente no pode sobreviver, em Braslia
principalmente, no existe um mercado para ilustrador, para voc sobreviver, pelo menos eu nunca achei
isso. Ento, eu fui trabalhar aqui no Ministrio como desenhista, que foi uma grande vantagem, eu nunca
deixei de fazer o que eu gostava, mas eu reservei a noite e eu trabalhava noite. Eu gostava muito de
trabalhar, at hoje eu trabalho muito noite, eu prefiro trabalhar noite do que de dia. Graas a esses 25 anos
que eu produzia. Mas depois que eu me aposentei foi quando eu consegui fazer muito mais coisa, a eu
me dedico totalmente a isso. Tenho feito muitos trabalhos para editoras de So Paulo, principalmente de
So Paulo. Tenho participado de muitos encontros, tenho feito viagens internacionais. No ano passado eu
estive fazendo palestra sobre livro infantil em Toronto, a convite do Consulado Brasileiro. E vou fazer
agora vrias paletras, a dcima quinta vez que eu vou participar de palestras em escolas a convite do Sesi,
ele tem um programa educacional muito interessante que leva os autores, chama-se Literatura Viva. Ele
convida os autores para ir visitar as escolas, e promover o livro, e falar sobre literatura. Eu j fiz em 13 ou
12 escolas em So Paulo, tanto na periferia de So Paulo como no interior, em cidades como Piracicaba,
agora vou para Sertozinho, vou tambm para Franca, Ribeiro Preto, est marcado para agosto.
P/1 J, da poca que voc comeou a fazer postal, selo, para hoje, o que mudou? Qual a principal mudana?
R A principal mudana que eu sinto o seguinte, o selo mudou no sentido que hoje quase ningum recebe
cartas, ento isso deve ter cortado muito assim a quantidade de selos usados. Ento, as tiragens de selo hoje
so menores, por exemplo, eu sinto isso. E essa coisa tambm de colecionismo me parece que est
completamente diferente. Na minha poca, quando eu era criana, todas as crianas que eu conhecia na
escola gostavam de juntar selo; hoje voc no v mais nenhuma criana juntando selo, pelo menos no
percebo mais isso. Se existe raro porque hoje no se escreve cartas como antigamente. E hoje, claro, se
usa selos para pacotes, mas voc nem recebe pacote, voc no manda pacote todo dia um para o outro, ento
est muito reduzido. Isso uma mudana. Porque o selo, sempre tem essa coisa, o selo uma divulgao da
cultura oficial, da cultura estabelecida, claro que isso inclui a cultura popular e etc. E o selo tem essa
coisa de levar para o exterior a imagem do pas, ento o selo uma espcie de carto postal, de vitrine. E
antigamente isso era muito difundido.
P/1 Tem colecionador que veio aqui diretamente com voc? Tem histria de colecionador?
R Tenho. Tenho histria de colecionador, sim. Uma vez recebi uma carta, um e-mail de um colecionador,
que infelizmente me escapa o nome, do Rio Grande do Sul. E ele estava interessado em originais. Porque
os colecionadores, eles so figuras especiais, eles se dedicam quilo de corpo e alma, so muito minuciosos.
Tem coisas que eu nunca consegui entender do trabalho de pesquisa, de ir atrs, de se encontrar, de
encontro. muito interessante, um outro mundo que eu nunca consegui entender completamente. E esse
colecionador uma pessoa muito especial, ele publica revistas sobre filatelia e ele coleciona originais. Mas
como eu no tenho originais, j que os originais todos ficam no correio, por contrato pertencem aos
Correios, mas eu tinha muito esboo. E teve trabalhos meus tambm que foram recusados, nem todos
trabalhos meus foram aceitos. Mas teve trabalhos que eu fiz e no fim resolveram que seria mais
interessante fazer noutra proporo, ento se o desenho quadrado ele no cabe num retngulo, ento esses
desenhos ficaram comigo. Ento a, quando me procurou, quando me contatou, eu falei que eu tinha vrias
coisas em casa, eu fui atrs, que eu sempre quase nunca jogo fora as minhas coisas, eu juntei tudo e ele
comprou de mim, foi muito interessante isso. Pena que eu no tenha mais. Mas, s vezes, aparecem,
raramente aparecem. Tem pessoas que colecionam at esboo do selo, isso enriquece muito na exposio
porque as exposies so exposies geralmente so temtica e, s vezes, tem concurso, eles concorrem. Existem
congressos que eles concorrem, qual foi a melhor coleo sobre determinada coisa. E recebem prmios. E
imagina uma coleo que tenha o original do selo, deve ser uma coisa fora do comum. Nem todo mundo
tem isso.
P/1 Algum colecionador participou, j teve alguma exposio dos seus selos?
R Eu nunca vi, mas exposio sim, vrias exposies, inclusive internacionais os selos participam, depende da
temtica, isso comum. Essas colees sempre esto percorrendo o mundo a, sempre vo ou vm. Existe essa
troca entre colecionadores entre eventos internacionais de filatelia, isso existe.
P/1 At hoje voc est fazendo selo?
R At hoje estou fazendo selo, eu estou aguardando agora os Correios, eu vou atrs, eu fico procurando
porque eu gosto muito de fazer selos, e eu estou agora aguardando a definio de um tema que eu deva
fazer para o ano que vem. J que eu ganhei o prmio eu falei: P, aproveita enquanto eu estou vivo a, vamos
fazer esse selo (risos)
P/1 O prmio voc ganhou esse ano?
R No recebi ainda. Foi um selo feito em 2011.
P/1 Que o do...
R O do folclore, eu vou mostrar depois esses selos, so quatro selos. E esse selo foi lanado em So Paulo
na cidade que tem uma festa folclrica muito bonita que em Olmpia, eu tenho muita vontade de conhecer
e nunca fui. E o selo o seguinte, ele feito no ano, ele escolhido no ano e premiado no ano seguinte. O
meu foi premiado no ano passado mas, no sei porqu, qual foi a razo, ainda no me entregaram, talvez
estejam esperando um momento para, numa festa, eu suponho que no lanamento do livro capaz de me
entregarem esse trofu. Eu tenho aqui as medalhas que eu ganhei tambm, a medalha Olho de Boi. Hoje
diferente, eles do uma medalha que o primeiro selo. Eu tenho aqui, esqueci de mostrar para vocs.
P/1 Ah isso bom at a Marcinha tirar depois uma foto. Est timo. Voc j recebeu alguma carta com um selo
seu?
R Ah, sim! Poucas vezes, mas eu tenho algumas cartas a que eu recebi.
P/1 Como foi, voc recebeu?
R muito interessante. muito interessante voc receber. Sabe o que muito interessante tambm? Quando,
como eu trabalho nesse campo de livro infantil, e encontro s vezes com pessoas, com desenhistas, e
falam: Quando eu era criana eu colecionava os seus selos (risos). Isso muito interessante. Ento, vrias
pessoas assim...
P/1 Como que foi uma carta sua que chegou aqui para voc e voc falou: Nossa, meu selo!
R Foi uma vez que eu recebi uma carta que no tinha nada a ver, ele nem sabe que era meu, era o selo que
eu fiz em homenagem a Orlando Villas-Boas, que foi logo depois que ele faleceu. E chegou uma carta
aqui, uma carta comercial com meu selo. Eles nem sabem que me mandaram (risos), estranho chegar
uma carta com meu selo. Parece que eu trouxe aquela carta, sei l, me pertence. bom.
P/1 Voc j organizou alguma exposio s de selos, carimbos?
R No, s de selos no. Mas sempre, toda exposio que eu fao, eu no fao muita exposio porque eu no tenho
trabalho para vender, eu trabalho com reproduo. E aqui no Brasil o trabalho sobre papel no muito
valorizado. Ento o que eu fao? Quando eu fao uma exposio, geralmente eu ponho temticas diferentes, eu
abordo livro infantil, dependendo da exposio eu ponho cartazes, que eu fiz vrios cartazes. Voc nem
imagina o que aconteceu, falando sobre cartaz. Recentemente, isso eu vou mostrar para voc. Eu estava
numa livraria no Rio de Janeiro a vi um livro grande sobre, do tempo da ditadura. O ttulo no era esse no,
feito pelo Instituto Herzog. A eu achei o livro interessante, quando eu abro, dois desenhos meus imensos.
Eu falei: Como que eu estou aqui?. E depois eu vi, tem dez trabalhos meus l, so trabalhos que eu fiz
quando morava na Hungria e eu tinha contato com o Partido Comunista Brasileiro, ento fiz vrias coisas
para eles que apareceram agora como trabalhos subversivos, eu falei ainda bem que no estamos na
ditadura. (risos) Ento tem esses trabalhos, e isso uma coisa inusitada, me descobri uma figura que estava
fazendo coisa contra a ditadura (risos). Pois , est l.
P/1 Voc j falou bastante, mas qual , em sntese, a importncia do selo para cultura e arte nacional, para
cultura brasileira?
R Eu acho que a importncia isso, primeiro, a fixao da cultura. Ao mesmo tempo tem a importncia de
ressaltar coisas da nossa histria, ou pessoas, ou valorizar o trabalho de artistas num pedacinho de papel
que fica, no eterno, mas uma coisa que vai estar sempre presente em lugares inusitados como museus
internacionais como o prprio Museu Postal, em colees particulares. E eu acho que aquilo um
reconhecimento do trabalho e de coisas que importante para o pas, tanto na cultura popular, como
pessoas, como eventos, como datas etc. Eu acho que o selo isso, o selo uma afirmao visual sobre
determinados assuntos que interessam para o pas.
P/1 Pelas suas origens, e por que mais voc escolheu esse caminho do folclore, da arte popular, da
literatura de cordel?
R Ah, porque o seguinte, toda minha infncia, e uma coisa que no abordamos no incio, as primeiras
lembranas que eu tenho da minha infncia, ainda em Itamarac, que eu morei na Ilha de Itamarac at os
cinco anos, era o contato com a arte e com a cultura popular. Era o carnaval, era o bumba meu boi que
acontecia perto de casa, era o meu pai fantasiado passado num bloco, ento, todas essas coisas fizeram
parte da minha formao como nordestino. E eu sa de l com 15 anos, e isso ficou muito marcado, todas
essas coisas ficaram marcadas, o contato com o cordel na feira, meu av que tinha coleo de cordel em
casa, os cantadores, que meu av costumava trazer os repentistas para fazer apresentaes na sala dele.
Mamulengo que voc via na feira. Enfim, tudo isso ficou muito marcado. E quando resolvi ser desenhista
e trabalhar com Comunicao Visual, eu resolvi que eu teria que ter, eu sentia a necessidade de ter uma
referncia visual, eu no queria copiar, como hoje se faz muito. Hoje, quando voc fala com a maioria das
crianas que gosta de desenhar, copia o japons, copia o mang, sempre tem o estilo mang. Ento, o meu
estilo, eu sempre tive essa preocupao de fazer um estilo que fosse ligado s minhas razes. E tinha, e
descobri a capa dos cordis, descobri os mamulengos, descobri os bonecos vitalinos, que coisas que
participaram, que fizeram parte da minha infncia. Foram coisas que eu convivi no meu dia a dia l. Ento
eu resolvi ento trazer isso para o meu estilo de desenhar. Mas como eu estudei e tive oportunidade de
estudar em Escola de Artes, eu descobri que alm disso existiam coisas semelhantes como a gravura
medieval, como as expresses folclricas de vrios pases. Ento essa coisa me enriqueceu. Mas mesmo assim,
mesmo trabalhando assim, muito em cima da coisa brasileira, atualmente eu estou trabalhando em peas
de Shakespeare, me interessa. Eu j ilustrei Alice no Pas das Maravilhas, j ilustrei o Pinquio, gosto muito
de ilustrar outros temas. Tem trs livros que eu fiz para a Editora Globo sobre a histria dos Irmos Grimm.
Enfim, mas eu sempre tento abordar esses assuntos com a viso nordestina, sempre dando esse toque da
gravura, das expresses grficas que fizeram parte da minha infncia. Porque para mim sempre foi, uma
coisa que eu sempre falo, para mim, os contos que eu escutava quando era criana, os contos dos Irmos
Grimm, ou de quem fosse, sempre era contado de uma maneira como se tivesse acontecido na nossa
regio. Ento quando falava que era uma vez uma menina que morava na floresta, para mim era aquela
coisa que estava l no horizonte, eles deviam morar l. Mas no s no Nordeste. Nos contos populares dos
Irmos Grimm e outros contos populares internacionais, sempre que so contados em algum lugar, eles
criam o sabor do local. E essa coisa local que interessante, isso que faz com que eles sejam universais.
Isso eu tento colocar no meu trao, na minha maneira de desenhar, na minha maneira de expressar.
P/1 Tem alguma coisa que voc queira deixar registrado em especial? Eu dei essa sntese para gente
aprofundar tendo em vista que tinha outra...
R Bom, tem uma coisa muito interessante, eu vou mostrar para vocs depois. Eu gosto muito de, eu no sou
muito de ir atrs, assim, no sentido que talvez eu seja muito reservado at por excesso de timidez. Mas eu
ultimamente eu tenho me aproximado muito de pessoas ligadas ao cordel. H uns anos atrs, cinco, seis
anos atrs, eu ilustrei um livro com texto do J Borges, que uma pessoa que eu tenho grande admirao pelo
trabalho dele porque so as minhas referncias. E eu ilustrei um livro para ele, uma editora aqui de Braslia
pediu um texto dele e pediu que eu o ilustrasse, era contando a histria do Dom Quixote, mas um Dom
Quixote que vinha para o Nordeste, a histria se passava no Nordeste. Ento, eu ilustrei e fiquei muito feliz
por ter ilustrado o trabalho do J Borges que eu conhecia antes, e tinha contato com ele. E recentemente,
como no era com editora, era de um editor, mas no era uma editora, era uma pessoa que resolveu editar o
livro. Ele me telefonou e falou: Olha, eu vou fazer o livro de novo, j que a edio j acabou, esgotou, e eu
gostaria de colocar as minhas gravuras. Eu falei: Claro, o texto seu, voc no tem nenhum compromisso.
Foi muito legal dele. A depois ele fez isso, fez o livro e me mandou. Quando chegou o livro eu fiquei, ca
para traz. Na capa est escrito: Gravuras de J Borges, baseadas nos desenhos de J Oliveira. Era o contrrio,
porque para mim ele era meu mestre, ento se baseou no meu trabalho. Isso uma coisa. Outra o seguinte,
eu resolvi fazer histria em quadrinhos no dia que eu li um livro, na Hungria ainda, eu li o livro do
Suassuna, era o livro A Guerra do Reino. Quando eu terminei de ler o livro eu falei, isso aqui o caminho
para fazer histria em quadrinhos. E essa histria em quadrinhos que eu fiz, que na realidade eu comecei a
fazer como storyboard para desenho animado, que depois um editor na Itlia, como eu j falei, gostou, foi
baseado, foram coisas que em mim despertadas atravs da leitura do Ariano Suassuna. E outra pessoa que
eu tambm admiro muito tambm, a obra dele, o Cmara Cascudo, que me acompanha desde que eu me
conheo como gente. O trabalho do Cmara Cascudo me acompanha e eu tenho um grande apreo pelo
trabalho dele, e isso me influencia muito, porque sempre que eu quero fazer uma pesquisa eu recorro
obra dele, ao dicionrio do folclore, e tive sorte de j ter ilustrado trs livros com histrias que ele fez. A
Editora Global de So Paulo me convidou para ilustrar e eu ilustrei. Essas ligaes so importantes porque
uma volta. Outra coisa interessante o seguinte, em 76 quando eu j tinha voltado para c, o Ziraldo pegou
as minhas histrias que eu j tinha publicado no exterior e transformou num livro que eu falei.
P/1 Aquelas da Itlia?
R A Guerra no Reino Divino. O que aconteceu?
P/1 A Guerra?
R A Guerra no Reino Divino. Eu vou mostrar tambm esse livro. Uma escola de samba do segundo grupo
pegou minha histria e desfilou. Inclusive tem um filme que um amigo meu fez, chama-se A Guerra do
Reino Divino. Eu tive a oportunidade, era o desfile ainda na Rio Branco, no Rio de Janeiro. Eu fui l para
ver o desfile da escola de samba desfilando com minha histria em quadrinhos. O ciclo se fechou. Eu parti
da cultura popular para fazer uma histria em quadrinhos que voltou para cultura popular. Essa foi uma
coisa que me deu muita alegria. Por a. isso.
P/1 Acho que deu. Voc tem mais algum outro registro?
R Tem, olha, talvez histria em quadrinhos, esses trabalhos. Eu tenho trabalho que publiquei que nunca
saiu aqui, um livro sobre cangaceiros escrito por Mario Fiorani, que um cineasta e escritor italiano, acho
que j faleceu tambm, faz muito tempo isso. E um livro sobre cangaceiros. um livro super colorido que eu
ilustrei e que teve edies em francs e depois uma edio em alemo, mas no foi publicado no Brasil. E outra
era uma histria em quadrinhos que eu conheci um grande desenhista tambm, todo mundo que eu estou
falando j falecido. (risos). Hugo Pratt que uma sumidade, um dos maiores quadrinistas italianos e que eu
conhecia de outros carnavais, quando eu tinha participado da primeira vez que eu fui na Itlia, dessa vez
que eu encontrei com o Ziraldo. E o Hugo Pratt eu encontrei com ele na Feira de Bolonha anos depois, e
ele tinha lanado um livro sobre cangaceiros. E eu tinha visto o livro, eu fui l, falei com ele, falei: Olha,
gostei muito do seu livro. A ele falou para mim: Voc que devia ter feito esse livro. Eu falei: No, que isso,
eu gostei muito do seu livro, mas eu posso fazer outro. E ele me levou at ao editor e eu publiquei um
livro chamado O Homem de Canudos, que um livro de capa dura.
P/1 Preto?
R No, esse a o Hans Staden.
P/1 Esse outro.
R Esse de capa dura s saiu tambm em italiano, teve duas edies.
P/1 No teve aqui?
R No, no teve. O texto de um amigo meu aqui de Braslia chamado Wanderley Diniz. Ele fez o texto e eu
fiz a adaptao. Tambm nunca saiu aqui no Brasil.
P/1 E no tem planos de sair?
R No tem porque complicado. Eu tive que falar com o editor. Eu prefiro fazer outro. E esse que voc falou
do Hans Staden o seguinte, eu peguei a histria do Hans Staden, gostei muito da histria do Hans Staden,
tudo passado no litoral paulista. Que a histria termina no Rio de Janeiro. Mas eu gostei muito da histria e
por acaso eu tinha visitado a regio sem saber, sem conhecer que a histria tenha se passado l, que fica ali
na Ilha de Santo Amaro, que na realidade uma ilha que ningum sabe que ilha, porque onde est Guaruj
uma ilha. Porque tem um rio que sai l, um rio, um brao de mar, sei l, uma coisa que liga a praia de
Bertioga a Santos. Ento fecha e forma uma ilha, s que ningum sabe, no se tem a noo porque no d para
perceber isso, que apenas um riozinho. E a histria se passa l. E eu fiz a adaptao. Eu li o livro, achei muito
interessante, achei uma verso que o Monteiro Lobato fez que nunca foi republicada, uma edio especial
que ele fez para jovens. E o que aconteceu? Eu fiz a adaptao, levei para Itlia e publicaram l na Itlia. Em
trs edies de uma revista muito conceituada na poca, Corto Maltese que chama a revista, da Editora
Rizzoli, de Milo. E recentemente a Editora Conrad publicou, mas ficou em preto e branco, a minha
original era colorida, eu queria que fosse colorida. E agora a Cortez Editora comprou e vai publicar
colorido. isso. Por a. Est bom.
P/1 Obrigada!
R Eu que agradeo
FINAL DA ENTREVISTA
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tel +55 11 2144.7150 | fax +55 11 2144.7151 | [email protected]
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