REVISTA MULTIDISCIPLINAR DA UNIESP
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Três presentes para Maria
CAMARGO, Maria Ap. Bosschaerts de1
Quando o envelope brilhou na tela azulada, Maria o olhou, intrigada: recebia muitas
mensagens via correio eletrônico, gostava delas, abria todas com a mesma curiosidade dos
tempos de menina.
O envelope brilhou novamente, convidando-a a abri-lo. Já se preparava para fazê-lo
da forma convencional, quando reparou numa seta minúscula que apontava um dos cantos
do retângulo. Aumentando o tamanho da fonte, pôde ler a frase em letras pequeninas, que
se escondia entre garatujas e traços a esmo: este é o caminho!
Já encantada com a novidade do bilhete, ela aproximou o mouse do ponto indicado.
Clicou , mas nada aconteceu.
Então ela intuiu, arriscou, recebeu um aviso de uma voz distante, ela não sabe dizer
ao certo o que houve. Aproximou a mão do envelope que brilhava, do ponto que a atraía e
fez o gesto de pegá-lo. Então, de repente, o envelope não estava mais na tela, mas em suas
mãos assustadas, entre seus dedos trêmulos. Ele era tão diáfano, quase sem concretude, e no
entanto ela soube que, dentro dele, moravam deliciosos segredos.
Com mãos agora mais ágeis abriu o envelope feito de cores e brilhos. E de lá de
dentro botaram palavras. Cascatas de palavras de afeto, de carinho, de saudade, de vontade
de saber do outro, de seus afetos, de seus carinhos. Palavras nomeando sentimentos,
descrevendo sensações, projetando paraísos.
Quando as palavras cessaram, como menina estimulada pela visão de delícias,
Maria olhou novamente para dentro do envelope já amado. Celeremente, aos punhados,
bocas perfumadas saíram voando, coloridas, cariciosas, graciosamente aproximando-se de
seu rosto que sorria. As borboletas pousaram tão delicada e envolventemente, que ela se
sentiu beijada. E então, seu corpo todo foi saudado pelas borbobeijas brincalhonas,
osculando com prazer mãos, pés, coxas, o ventre arrepiado, os seios ansiosos.
SABER ACADÊMICO - n º 05 - jun. 2008/ ISSN 1980-5950
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Quando ela pensou que os presentes tivessem se esgotado, o envelope começou a
pulsar novamente. Lá bem no fundo, vibrava um coração. Ela o trouxe, com redobrados
cuidados, para junto de seu próprio peito.
O latejar do coração só fez aumentar, com o toque em sua pele e com a carícia de
suas mãos carinhosas. Então ele cresceu e transbordou de felicidade, liquefez-se em
pulsações amorosas. Derretido, escorreu por seus seios e ventre, penetrou sua pele, fazia
parte dela, agora.
Uma mulher diferente saiu da sala onde ainda rebrilhava, entre papéis e aromas de
flores, um envelope translúcido. Ela nunca mais foi a mesma. Sabia-se agora amada e
querida e sentia-se capaz de amar e querer na mesma intensidade.
Os passos de Maria a levavam agora para o endereço lido no remetente. Ela sabia
que lá havia alguém especial e já muito amado, a esperar por ela e pelos presentes que
receberia, tão merecidamente.
Cidaboss 27/03/07
1
Doutora em educação pela UNESP/ Marilia, docente do curso de Pedagogia e Coordenadora do
Núcleo de Apoio ao Discente e Docente da Faculdade de Presidente Prudente (UNIESP).
SABER ACADÊMICO - n º 05 - jun. 2008/ ISSN 1980-5950
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