Livro produzido pelo projeto
MARCOS NICOLAU
(Org.)
Para ler o digital: reconfiguração do livro na cibercultura PIBIC/UFPB
Departamento de Mídias Digitais - DEMID / Núcleo de Artes
Midiáticas - NAMID
Grupo de Pesquisa em Processos e Linguagens Midiáticas Gmid/PPGC/UFPB
Coordenador do Projeto
Marcos Nicolau
Capa
Keila Lourenço
Editoração Digital
O LIVRO DIGITAL
Ana Carolina Medeiros Caldas
Marriett Albuquerque
Integrantes do Projeto
Bruno Gomes
Fabrícia Guedes
Filipe Almeida
Keila Lourenço
Marina Maracajá
Marriett Albuquerque
Rennam Virginio
E SUAS MÚLTIPLAS PERSPECTIVAS
EDITORA
Av. Nossa Senhora de Fátima, 1357, Bairro Torre
Cep.58.040-380 - João Pessoa, PB
www.ideiaeditora.com.br
L788
O livro digital e suas múltiplas perspectivas [recurso eletrônico] / Marcos Nicolau (org.).-- João Pessoa: Editora Idéia, 2014.
CD-ROM; 43/4pol. (2.000kb)
ISBN: 978-85-7539-882-1
João Pessoa - 2014
1. Livro digital. 2. Editoração eletrônica. 3. Mídias digitais. I.Nicolau,
Marcos.
UFPB/BC
CDU: 002:004.087
7
O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO
Apresentação
Marcos Nicolau .............................................................07
Do códice ao leitor digital:
a reconfiguração do livro na cibercultura
Rennam Virginio e Filipe Almeida .................................. 08
O livro digital e a interdependência
dos fatores da midiatização
Rennam Virginio ......................................................... 32
Livros digitais no meio editorial paraibano
Marriett Albuquerque ................................................... 52
A Reconfiguração do Livro Didático em Versão Digital:
Uma Ideia de Sustentabilidade
Filipe Almeida ............................................................. 65
Livro Digital: Percalços e Artimanhas
de um Mercado em Reconfiguração
Rennam Virginio .......................................................... 81
O Livro Digital e as Novas Necessidades
de Produção e Leitura
Fabrícia Guedes, Filipe Almeida e Marriett Albuquerque ..... 100
Livros Digitais no Brasil:
Analisando as Causas do Insucesso
Rennam Virginio ......................................................... 118
A ascensão do livro digital
e a autonomia do autor na cibercultura
Filipe Almeida ............................................................ 137
Capa
Sumário
A criação do Projeto Para Ler o Digital: a reconfiguração do livro na cibercultura, no segundo semestre de 2010
trouxe consigo, não apenas a produção de eBooks e ePubs
que foram sendo publicados na página do eLivre – livros eletrônicos livres (http://www.insite.pro.br/Livros.html), criada
para esse propósito, mas, também a elaboração de artigos
científicos apresentados em encontros da área.
A presente obra é uma coletânea de todos esses
artigos produzidos no decorrer de três anos, por alunos
graduandos do DEMID/UFPB, que atuam como pesquisadores PIBIC e PIVIC, e por um mestrando do PPGC/UFPB.
Os trabalhos contaram com a nossa colaboração, como
co-autor, e foram apresentados em Congressos do INTERCOM Regional ou Nacional, pelos próprios alunos.
Esse conjunto de textos compõe uma pesquisa que
tem a importância de demonstrar como se deu, não apenas a
evolução dos livros, desde a sua concepção como códex, passando pelo avanço da tipografia há pouco mais de 500 anos.
Mostra, também, o desenvolvimento dos eBooks e dos ePubs
desde suas concepções, assim como os aspectos e as questões que envolvem o mercado dos livros digitais. Constitui,
por isso, um trabalho bem fundamentado que está subsidiando inúmeras outras pesquisas - tanto Trabalhos e Conclusão
de Curso (TCC), quanto Dissertações de mestrado.
Marcos Nicolau
Professor do DEMID e do PPGC
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
DO CÓDICE AO LEITOR DIGITAL:
A RECONFIGURAÇÃO DO LIVRO NA CIBERCULTURA
Rennam VIRGINIO
Filipe ALMEIDA2
1
na internet. Buscamos, neste artigo, fazer um apanhado
histórico do livro, de seu surgimento a sua reconfiguração
no meio digital, expondo os recursos e funcionalidades,
além de discutir as discrepâncias das práticas mercadológicas atuais.
Palavras-chave: Livros digitais. e-Books. Reconfiguração. Cibercultura.
Introdução
Resumo
Séculos após a invenção da prensa de Gutenberg, que
permitiu a produção em massa de livros na era moderna, o livro encontra-se reconfigurado para o meio digital, apresentando-se nos formatos eBook e epub, levando
aos usuários uma nova experiência em leitura, agregando
as funcionalidades e recursos que o hipertexto permite.
Dentro deste contexto, não apenas o livro sofreu transformações: o mercado editorial digital, ameaçado pelos
riscos de pirataria e compartilhamento que a “nuvem”
possibilita, impõe aos usuários uma série de restrições
que buscam impedir a livre circulação dos livros digitais
Graduando do Curso de Comunicação em Mídias Digitais da UFPB.
Bolsista do Programa de Iniciação Científica (PIBIC) da UFPB/CNPq.
E-mail: [email protected]
2
Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Comunicação – PPGC/
UFPB. E-mail: [email protected]
O livro é, sem dúvida, um dos bens mais importantes da humanidade. Através dele, informações e conhecimentos puderam ser armazenados, difundidos e compartilhados por todo mundo ao longo da história.
Para Chartier e Roche (apud PINHEIRO, 1999, p.68),
livro é um signo cultural, suporte de um sentido transmitido pela imagem e pelo texto. Até a invenção da prensa de
Gutenberg, no século XV, os livros eram manuscritos por
escribas ou copistas, o que limitava a produção e dificultava o acesso para a leitura destes livros.
A máquina criada por Gutenberg permitiu, pela primeira vez na história, a produção em massa de livros,
popularizando a leitura e ampliando as possibilidades de
um mercado.
1
Capa
Sumário
Esse desejo muito natural de se ter facilmente livros
à disposição, e livros de formato cômodo e portáteis,
acompanhou passo a passo a crescente rapidez da lei-
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
tura, que se tornara possível com a impressão do texto
em tipos uniformes e móveis, em contraste com a leitura
mais dificultosa dos manuscritos. Este mesmo movimento, pela acessibilidade e caráter portátil do livro criou
públicos e mercados cada vez maiores, os quais eram
indispensáveis ao sucesso de todo o empreendimento
gutenberguiano. (MCLUHAN, 1972, p.281)
O livro evoluiu e hoje também está disponível no
formato eletrônico, conhecido como eBook, podendo ser
lido em diversos dispositivos digitais como tablets, computadores e smartphones.
Criado na década de 1970, os livros eletrônicos
apresentam-se hoje em um crescente mercado, chegando a vender em alguns países mais até do que os livros
impressos. Novos produtos são lançados constantemente,
e com preços cada vez mais acessíveis, difundindo ainda
mais o hábito da leitura de livros digitais entre as pessoas,
atraídas pela tecnologia e portabilidade que oferecem.
Neste artigo, procuramos fazer um apanhado histórico do livro, do seu surgimento até a sua reconfiguração no
meio digital, mostrando seus formatos, suas funcionalidades e a atual problemática das barreiras mercadológicas.
Escrita, tipografia e impresso
A escrita é considerada uma invenção decisiva para
a história da humanidade, uma forma de representar o
pensamento e a linguagem humana através de símbolos.
Capa
Sumário
A criação do sistema fonético pelos Gregos fez com que
a escrita fosse disseminada por diversos povos pelo planeta. De acordo com Kerckhove apud NICOLAU (2010), o
alfabeto grego tinha suas peculiaridades:
O alfabeto grego era diferente dos demais sistemas de
escrita, pois ao invés de obrigar o leitor a se prender
ao contexto, permitiam a remoção de enunciados dos
seus pontos de origem e a sua recolocação em outro local. Isso, por um lado, exigia um novo processo
cognitivo da leitura e por outro, permitia a decifração
e a leitura em voz alta de qualquer linha, mesmo que
a pessoa não soubesse o que estava lendo, gerando
implicações e desdobramentos para os processos de
reprodução textual na atualidade, pois está presente
também em todas as máquinas de códigos linguísticos, como uma inovação tipicamente ocidental. (Kerckhove apud NICOLAU, 2010)
Alguns elementos da natureza foram responsáveis por servir de suporte à escrita, dentre eles: tabuletas de argila ou de pedra, papiro e pergaminho (considerado um dos precursores do papel). Outros foram
aperfeiçoados ao longo do tempo, como é o caso do
códice, também denominado de códex, que consiste
numa compilação de páginas costuradas, substituindo o
rolo de pergaminho e originando o pensamento do livro
como objeto.
Com a evolução da escrita, houve também a necessidade de organização e padronização das representações
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
gráficas, surgindo assim a tipografia. Os chineses foram
os primeiros povos a utilizar tipos bastante rudimentares, entretanto, apenas no século XV, este conceito foi
redescoberto pelo alemão Johannes Gutenberg através da
prensa tipográfica. A invenção da tipografia marcou a divisão entre a tecnologia medieval e a moderna (USHER,
1929), possibilitando a mecanização da arte do escriba ou
copista. Segundo Marshall McLuhan, a invenção tipográfica foi fundamental para o surgimento do impresso:
... do mesmo modo que a palavra impressa foi a primeira coisa produzida em massa, foi também o primeiro “bem” ou “artigo de comércio” a repetir-se ou
reproduzir-se uniformemente. A linha de montagem de
tipos móveis tornou possível um produto que era uniforme e podia repetir-se tanto quanto um experimento
científico. Esse caráter não se encontra no manuscrito.
(MCLUHAN, 1972, p.177)
Apesar da resistência dos copistas, a impressora com tipos móveis de Gutenberg fez com que o livro
fosse popularizado, tornando-o mais acessível através
da redução de custos da produção em série. Para Nicolau (2010), tal invenção permitiu também que os textos pudessem ser reconfigurados através de matrizes,
tornando possível a reprodução de muitos exemplares.
Com isso, a tipografia tornou-se peça fundamental no
sistema de impressão, originando o que conhecemos
hoje por design editorial.
Capa
Sumário
A prensa de Gutenberg
A invenção da impressão a partir de tipos móveis
metálicos, por Johannes Gutenberg, alemão nascido em
Mainz, acelerou a circulação dos conhecimentos, e por
isso é considerada uma das mais importantes invenções
da idade moderna.
Para entendermos melhor o que foi essa invenção
de Gutenberg, vamos partir do significado de impressão.
Segundo Costella (2001), impressão é a ação que produz
um sinal em um corpo pela pressão de um outro corpo.
Enquanto que a tipografia é uma das muitas técnicas de
impressão com uso de tinta.
Tipografia, portanto, é a técnica de escrever com tipos,
isto é, de imprimir sinais gráficos, com tinta, pelo emprego de tipos móveis. Esclareça-se: os tipos móveis são letras soltas, cada uma se apresentando, individualmente,
como um minúsculo carimbo. (COSTELLA, 2001, p.35)
Antes de Gutenberg criar os tipos móveis metálicos, outros materiais eram usados para a fabricação
das matrizes que serviram de base para as impressões.
De acordo com Costella (2001), no século VIII já eram
utilizados no Japão matrizes de madeira para impressão
de talismãs. Usando essa mesma técnica de impressão a partir de matrizes de madeira, conhecida como
xilografia, os chineses produziram o primeiro livro impresso que se tem conhecimento, no final do século IX.
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
Os chineses também produziram cartas de baralho e
papel-moeda. Além disso, criaram os tipos móveis, na
metade do século XI, produzidos com cerâmica. Depois,
foram criados tipos móveis de madeira, no Turquistão,
por volta de 1300.
Na Europa, os primeiros livros foram impressos
a partir da xilografia, onde eram usadas matrizes de
madeira. Isto é, todo o conteúdo estava “preso” numa
única matriz. O uso dessa técnica barateou o custo dos
livros, pois até então eram manuscritos, o que limitava
a tiragem e o acesso da população a estas obras, sendo
quase sempre encontrados apenas em bibliotecas e em
quantidades limitadas.
Porém, segundo Costella (2001), estas matrizes
inteiriças de madeiras eram relativamente frágeis e por
isso não suportavam numerosas prensagens, e qualquer
rachadura ou desgaste em qualquer parte desta matriz, a
inutilizava por completo. Além disso, como as letras estavam esculpidas em uma única matriz, não podiam ser
reaproveitadas em outras.
Diante disso, surgiu a invenção de Gutenberg: uma
máquina de impressão tipográfica a partir de tipos móveis metálicos, composto de chumbo, estanho, antimônio
e bismuto, que poderiam ser produzidos em grande escala. Esses tipos, de acordo com Costella (2001), por serem
de metal, teriam uma maior resistência, permitindo grandes quantidades de prensagens sem danificar os tipos.
Além de mais resistentes, os tipos criados por Gutenberg
Capa
Sumário
eram móveis, o que possibilitaria ao artesão combiná-las
e recombiná-las, aproveitando para a composição de diferentes páginas de texto. Para Mindlin (1999) esta invenção foi uma revolução mais importante até mesmo que a
revolução da informática.
A invenção dos tipos móveis, proporcionando a publicação de livros, desde os chamados incunábulos, que
são os livros impressos entre 1455, data aproximada da
Bíblia de Gutenberg, até 1500, foi uma revolução mais
importante, na vida da humanidade, do que está sendo a
revolução da informática. (MINDLIN, 1999, p.47)
Para McLuhan (1972), graças à impressão e à multiplicação de textos, os livros deixaram de ser um objeto
precioso, a ser consultado numa biblioteca: havia necessidade cada vez maior de se poder conduzi-lo com facilidade, a fim de recorrer-se a ele, ou lê-lo, em qualquer lugar
e a qualquer hora.
Portanto, o que Gutenberg fez, foi um aperfeiçoamento da técnica tipográfica, aliada a já conhecida técnica
da prensagem, muito utilizada por papeleiros, vinhateiros
e também por xilógrafos. Foi uma das mais importantes
invenções da história da humanidade, por contribuir decisivamente no barateamento do livro, e consequentemente, no aumento do seu alcance a várias classes sociais,
espalhando conhecimento e informações para uma grande parcela da população mundial.
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
Os livros digitais: do surgimento a evolução
Mais de cinco séculos depois da invenção da máquina de Gutenberg, que permitiu a impressão de livros em
grande escala devido à utilização dos tipos móveis, surgiu
um novo tipo de livro, reproduzido em uma mídia diferente do tradicional papel: o livro eletrônico.
Segundo Horie (2011), um livro eletrônico, também
conhecido como eBook, é uma versão digital de um livro que pode ser lido em computadores ou em aparelhos
portáteis. Em 1971, quando Michael S. Hart digitalizou
a Declaração de Independência dos Estados Unidos, deu
início ao Project Gutenberg. Enquanto no livro tradicional
nos deparamos com o texto impresso, no livro digital nos
encontramos um texto virtual, um hipertexto. “Um hipertexto é uma matriz de textos potenciais, sendo que alguns
deles vão se realizar sob o efeito da interação com um
usuário.” (LEVY, 1996, p.40)
A diferença entre um livro impresso e um livro digital não está apenas na mídia que é utilizada. A experiência da leitura também passa por transformações. Levy
(1996) explica algumas destas transformações que diferem a leitura de um texto impresso de um texto virtual:
O leitor de um livro ou de um artigo no papel se confronta com um objeto físico sobre o qual uma certa versão do
texto está integralmente manifesta. Certamente ele pode
anotar nas margens, fotocopiar, recortar, colar, proceder
a montagens, mas o texto inicial está lá, preto no bran-
Capa
Sumário
co, já realizado integralmente. Na leitura em tela, essa
presença extensiva e preliminar à leitura desaparece. O
suporte digital (disquete, disco rígido, disco ótico) não
contem um texto legível por humanos, mas uma série
de códigos informáticos que serão eventualmente traduzidos por um computador em sinais alfabéticos para um
dispositivo de apresentação. A tela apresenta-se então
como uma pequena janela a partir da qual o leitor explora uma reserva potencial. (LEVY, 1996, p.39)
Como um exemplo de uso dessa “reserva potencial”
mencionada por Levy, podemos citar a afirmação de Lemos
(2011) na qual diz que o leitor é editor e distribuidor, onde a
ação de edição e compartilhamento pode ser feita pelo leitor.
Cresce formas e instrumentos de uma cultura letrada que
se faz por uma leitura sociabilizada. O leitor é também
‘tipógrafo’ (‘Desafios da Escrita’ de R. Chartier) que pode
mexer nas fontes e alterar as localizações das informações. Só há textos e leitores móveis.(LEMOS, 2011)3
De acordo com Procópio (2010), para a leitura de
um livro digital, três elementos fazem-se necessários: o
Dispositivo de Leitura (Hardware), o Reader e o eBook. O
Dispositivo de Leitura é o Hardware utilizado (e-Reader,
Notebook, Tablet, PC...). O Reader trata-se do software
que auxilia a leitura do livro, e o eBook é o próprio livro,
o conteúdo, logo, o mais importante dos elementos, que
pode ser encontrado em diversos formatos.
3
Disponível em: http://andrelemos.info/2011/10/flica/
Acesso em: 01/11/2011
eLivre
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
Dispositivos de leitura
Os livros digitais podem ser lidos em dispositivos
não-portáteis como computadores de mesa, ou em dispositivos portáteis como palmtops, celulares e até smartphones. Porém, estes últimos por possuírem um tamanho bastante reduzido, limitam a área de visualização de
informações de uma só vez. Em meados dos anos noventa
surgiram os e-Readers (dispositivos dedicados a leitura de
livros eletrônicos). Foram muitas as tentativas das empresas de se firmarem no mercado dos livros digitais com
a venda de e-Readers, porém nenhum fez muito sucesso.
O primeiro e-Reader lançado no mercado foi o The
Rocket eBook. Em seguida vieram outros modelos, como o
MyFriend, eBookMan e o HieBook. Estes dispositivos eram
dedicados à leitura de livros e não tiveram sucesso por diversos motivos, como o reduzido número de livros digitais
disponíveis e a baixa interoperabilidade dos sistemas.
As empresas apostaram depois em um produto que
agregava ao e-Reader outras funções, funcionando como
um “organizador pessoal”: os Handhelds. Empresas importantes, como a Cassio, a HP e a Compaq lançaram seus
Handhelds, porém sem o sucesso esperado. Os Handhelds
eram semelhantes aos Smartphones vendidos hoje.
Após inúmeros insucessos de grandes marcas, a empresa norte-americana Amazon, já com experiência neste
mercado - pois vendia os e-Readers citados – lançou seu
leitor de livros digitais, o Kindle, atualmente sucesso de
Capa
Sumário
vendas. A Amazon além de vender o Kindle, vende também os livros digitais que serão lidos no dispositivo. Este
ano, a Amazon já vendeu mais eBooks para o Kindle do
que livros impressos.4
Outros dispositivos para leitura estão disponíveis no
mercado, como o Sony Reader, Cooler, Nook, Alpha, além
dos conhecidos Tablets - que também possuem a função
de leitura de livros eletrônicos – Ipad, Galaxy Tab e Xoom,
entre outros.
O sucesso do Kindle não é devido ao dispositivo em
si, e sim, porque ele possui uma grande variedade de livros
digitais disponíveis para serem lidos. Como foi dito anteriormente, o mais importante é o conteúdo. “Vem hardware e vai hardware, o importante para as editoras é manter o foco no con­teúdo. Pois, cada vez mais, é nisso que
os consumidores irão apostar, nos equipamentos que mais
trouxerem conteúdo relevante” (PROCÓPIO, 2010, p.125)
Readers
Para lermos os livros digitais precisamos de um
software que “rode” o formato utilizado pelo livro digital escolhido. Procópio (2010) diz que um dos entraves
para uma maior aceitação dos eBooks é o fato de que a
maioria dos Readers (softwares) lêem um único formato
de eBook.
Disponível em: http://www.revolucaodigital.net/2011/05/23/amazon-venda-ebooks-livro/. Acesso em: 02/11/2011.
4
eLivre
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
Os primeiros Readers foram: Acrobat eBook Reader,
MobiPocket Reader, MS Reader e o Palm Reader (baseado
no PeanutPress Reader). Hoje, destacam-se o Adobe Digital Editions (antigo Acrobat), MobiPocket Reader, Saraiva
Digital Reader, Sony Reader e o Kindle Reader.
Horie (2011) afirma que estes aplicativos de leitura gerenciam a biblioteca de eBooks e a maioria inclusive sincroniza os marcadores de página e anotações entre
dispositivos diferentes.
Formatos de eBook
Os eBooks podem ser encontrados em vários formatos, o que torna mais difícil a convergência dos eBooks
com os dispositivos. Procópio (2010) afirma que esse é
justamente um dos fatores que impedem uma maior aceitação dos livros digitais. Entre os formatos existentes, podemos citar: ASCII, TXT, HTML, XML, OPF, PRD, PDB, PDF,
WAP, WML, DOC, DocPalm, RTF, RB, EXE, SWF, KML, HLP,
TK3, Mobi, Kindle Format 8 e ePub.
Segundo Procópio (2010), a interoperabilidade é bloqueada a partir do momento em que existem diversos har­
dwares, diversos softwares para leitura e diversos formatos.
Deste modo, nos deparamos com vários tipos de Readers,
e-Readers e formatos, impedindo que haja uma convergência que amplie as possibilidades do mercado editorial digital.
Três formatos se destacam entre os demais: PDF,
Mobi (atual Kindle Format 8) e ePub.
Capa
Sumário
PDF
O PDF é o mais popular de todos os formatos, além
de ser um dos mais antigos. Horie (2011) afirma que boa
parte dos aplicativos e leitores de eBooks lêem este formato nativamente ou com o auxílio de aplicativos quase
sempre gratuitos.
O PDF apresenta algumas vantagens como a possibilidade de se criar eBooks interativos através de recursos
como hyperlinks e a inserção de vídeos e animações e seu
reaproveitamento para impressão. Entretanto, o PDF também possui algumas desvantagens, como o tamanho do
arquivo, muitas vezes pesado, o que dificulta a leitura na
maioria dos e-Readers. Outro problema do PDF é o fato de
seu conteúdo ser estático, ou seja, não pode ser redimensionado de acordo com o tamanho e a tela do e-Reader, diferentemente de outros formatos, como ePub e Mobi, que
se adaptam a qualquer tamanho e formato de tela.
Mobi
De acordo com Horie (2011), o Mobi é um formato
de eBook desenvolvido pela Amazon especificamente para
os eReaders da própria Amazon, o Kindle.
Assim como o ePub, o Mobi também redimensiona
o conteúdo de acordo com o formato e o tamanho da tela
do dispositivo no qual está sendo lido, fornecendo uma
visualização mais dinâmica e confortável para os leitores.
eLivre
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
Também podemos encontrar aplicativos gratuitos,
desenvolvidos pela própria Amazon e por outras empresas, que permitem a visualização deste formato em
computadores de mesas e em outros dispositivos de leitura de eBooks.
Recentemente, a Amazon anunciou a substituição
do Mobi (conhecido como Mobi 7) pelo Kindle Format 8. A
troca ocorrerá devido a chegada do novo Kindle Fire, que
permitirá a visualização de eBooks em diferentes diagramações, com suporte a recursos como fontes embutidas,
layout fixo, elementos flutuantes, drop caps, texto em
imagens de fundo e marcadores.
ePub
O ePub (abreviação de eletronic publication) nada
mais é do que um padrão internacional para eBooks, livre e
aberto. Também conhecido como o MP3 dos livros, ele possibilita uma boa leitura em diversos dispositivos tecnológicos, tais como: computadores, notebooks, smartphones
eReaders e tablets. Diferentemente do PDF, onde o layout
das páginas é fixo e não é permitido se alterar o tamanho
da fonte, no ePub, o texto e as imagens são redimensionados de acordo com a tela do dispositivo utilizado.
A base do ePub é bastante simples, pois ele é produzido em XHTML, em geral, com os mesmos códigos utilizados no desenvolvimento de uma página simples para
web. Além disso, é permitido realizar alterações no estilo
Capa
Sumário
das páginas com CSS, tornando os livros mais atrativos
visualmente. De acordo com Horie (2011):
Um ePub é composto, basicamente, de arquivos XML
que contém o conteúdo de um livro, arquivos de imagens, acrescidos de mais alguns documentos que definem os estilos de parágrafo e caracter e um sumário, todos “envelopados” por um compactador comum.
(HORIE, 2011, p.18)
O formato surgiu em 2007, organizado por um consórcio de empresas chamado IDPF (International Digital
Publishing Forum), entre elas Sony, Adobe, Microsoft,
além de grandes editoras inglesas e norte-americanas.
A adoção do padrão decorre de necessidades básicas,
como a escolha de um padrão aberto que possa ser aperfeiçoado ao longo do tempo, à medida que o mercado
evolui e a possibilidade do livro ser lido pela maior quantidade de aparelhos e programas possíveis, facilitando a
cadeia de produção.
A reconfiguração do livro e as novas possibilidades
da leitura hipertextual
A reconfiguração do livro para o formato eletrônico não significa apenas uma nova forma de fazer livro,
publicado agora em uma mídia digital, mas também significa que o ato da leitura também sofrerá transforma-
eLivre
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
ções devido aos recursos e facilidades que o livro digital
oferece aos leitores.
As novas possibilidades de leitura são um grande
incentivo para a leitura de livros em plataforma digital.
Segundo Levy (1996), as novas formas de apresentação
do texto só nos interessam porque dão acesso a outras
maneiras de ler e de compreender.
Apesar de todos os recursos e possibilidades que as
tecnologias oferecem, pesquisas mostraram que os leitores de eBooks são conservadores5: eles preferem que o
eBook seja o mais parecido possível com um livro impresso. Lemos (2011)6 afirma que o sucesso do livro eletrôni-
O suporte digital apresenta uma diferença considerável
em relação aos hipertextos anteriores à informática: a
pesquisa nos índices, o uso dos instrumentos de orientação, de passagem de um nó a outro, fazem-se nele com
grande rapidez, da ordem de segundos. Por outro lado,
a digitalização permite associar na mesma mídia e mixar
finalmente os sons, as imagens animadas e os textos.
Segundo essa primeira abordagem, o hipertexto digital
seria, portanto, definido como uma coleção de informações multimodais disposta em rede para a navegação
rápida e ‘intuitiva’. (LEVY, 1996, p.44)
O que estamos vendo é um retorno a experiências anteriores, com o aproveitamento das inovações sociais e
tecnológicas do digital, principalmente no que se refere
às possibilidades de produção de conteúdo, de compartilhamento de informação e de criação de redes sociais.
Os e-readers emulam, com a e-ink7, muito bem o papel
e a tinta. Alguns não tem iluminação interna e tornam-se muito confortáveis para a leitura. O que está em
jogo aqui é usar a tecnologia digital e as redes sem
fio para proporcionar portabilidade da biblioteca e uma
leitura próxima da do livro impresso (sem firulas, links
desnecessários, ou interatividade exagerada). O leitor
nem sempre quer ser “interator”. Ele quer ler como se
lê um livro em papel. A relação material é importante
aqui: ler um produto acabado em uma postura corporal
similar àquela da leitura dos livros jornais e revistas
Os recursos que os eBooks oferecem, facilitam a interação com o conteúdo, além de permitir uma grande
portabilidade: um único dispositivo pode carregar milhares de títulos, e ter - através de uma conexão com Internet - acesso imediato a outros milhares de títulos disponíveis gratuitamente ou a venda em sites de todo o mundo.
“É possível carregar vários títulos (centenas e até milhares) em um único dispositivo de leitura que cada vez mais
estão baratos, leves e com melhor autonomia de bateria
e capacidade de armazenamento”. (HORIE, 2011, p.16)
Capa
Sumário
co está na materialidade do dispositivo e na emulação do
passado.
impressas. (LEMOS, 2011)8
Disponível em:http://ipsilon.publico.pt/livros/texto.aspx?id=295029
Acesso em: 05/11/2011
6
Disponível em: http://andrelemos.info/2011/10/flica/
Acesso em: 01/11/2011
7
Também conhecido como “papel eletrônico” ou “tinta eletrônica”, é
uma tecnologia que mimetiza o papel impresso em um display.
8
Disponível em: http://andrelemos.info/2011/10/flica/
Acesso em: 01/11/2011
5
eLivre
27
O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
Podemos afirmar então, que o livro vem reconfigurando-se sob o apoio dos recursos e facilidades que a tecnologia oferece, entretanto, tentando manter a base já
aceita e consagrada dos livros impressos, buscando reproduzir o impresso no digital e agregando novas funcionalidades que gerem uma maior interação leitor-conteúdo.
Alguns formatos, como o Mobi, da Amazon, rodam apenas em leitores específicos, comprometendo
a convergência do conteúdo. De acordo com Procópio
(2010), outra estratégia utilizada pela editoras que lançam livros digitais é a aplicação de DRM, que além de
Aspectos configuracionais que dificultam
a expansão mercadológica dos eBooks
atuar como uma senha de segurança, impedindo a cópia ilimitada de um eBook, também faz todo o traba-
Alguns fatores impedem uma maior aceitação dos
eBooks: a grande quantidade de formatos existentes,
quase sempre, exclusivos para um único e-Reader e as
DRM9 (Digital Rights Management) impostas pelas editoras e produtoras de livros digitais a fim de combater a
pirataria digital.
Essa situação apresenta-se como um verdadeiro
paradoxo: as reconfigurações do livro sempre ocorreram
visando facilitar o conhecimento do leitor, democratizando cada vez mais a leitura, e hoje, na era da cibercultura,
da computação em nuvem (cloud compunting)10 e da Internet em banda larga e móvel, que poderiam funcionar
como verdadeiros catalisadores na difusão da leitura diDRM, ou Digital Rights Management, são tecnologias para controlar
a distribuição e a visualização de conteúdos digitais.
10
O conceito de computação em nuvem (em inglês, cloud computing)
refere-se à utilização da memória e das capacidades de armazenamento e cálculo de computadores e servidores compartilhados e interligados por meio da Internet, seguindo o princípio da computação
em grade. Wikipedia
9
Capa
gital, nos deparamos com barreiras mercadológicas que
freiam essas possibilidades.
Sumário
lho de porcentagem para terceiros e quantificação de
núme­ro de cópias vendidas. Para os formatos Mobi e
ePub, já existem sistemas de DRM modernos e relativamente seguros.
Podemos dar um exemplo dos problemas que um
eBook protegido pode gerar: um eBook em um certo formato, protegido por uma DRM, não pode ser convertido
para outro formato. Ou seja, se tivermos um eBook em
formato Mobi (formato de eBook para leitura no Kindle),
não conseguiremos converte-lo em PDF para podermos
ler em qualquer outro dispositivo.
Diante disso, fica claro que as potencialidades de
expansão do conhecimento através dos livros digitais
estão comprometidas devido aos interesses mercadológicos, que vem limitando o uso e a liberdade do consumidor para utilizar da maneira que achar conveniente o
seu produto.
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
Conclusão
Após séculos de história, o livro, até então existente apenas em meio impresso, hoje aparece reconfigurado, com uma nova possibilidade de publicação: o formato
digital. A dinâmica de produção, difusão e leitura agora
é outra - os autores podem publicar diretamente e gratuitamente na web ou podem enviar diretamente para a
editora; a facilidade de produção é impressionante. Novas
ferramentas e funcionalidades estão disponíveis para os
leitores, também atraídos pela interatividade e portabilidade que o livro digital oferece.
Entretanto, estas novas possibilidades nem sempre
atendem a necessidade dos usuários, acostumados com a
liberdade quase sempre presente no ciberespaço. Os entraves mercadológicos e a grande quantidade de formatos
existentes impedem uma livre circulação dos livros digitais
entre os leitores. É também correto afirmar que mesmo
com as restrições tecnológicas e de mercado, sempre há
formas de burlar os processos de controle, e as empresas
vem trabalhando para desenvolverem formas ainda mais
seguras de proteção.
Diferentemente do que acontece com um livro impresso, onde o leitor tem total liberdade para emprestá-lo a qualquer momento, com o livro digital isso nem
sempre pode acontecer, contrariando a história do livro,
que sempre se reconfigurou buscando facilitar o conhecimento do usuário.
Capa
Sumário
O livro não foi invenção de Gutenberg, mas ele permitiu a sua reprodutibilidade como suporte e produto vendável em larga escala; agora essa escala de reprodutibilidade ganha uma dimensão inimaginável. Uma coisa é
certa: uma vez lançado na rede, o livro ganha vida própria
e não pode mais nem sequer ser retirado da internet, pois
passa a habitar a nuvem.
O cenário atual do mercado editorial digital mostra um amplo domínio da empresa americana Amazon,
que produz o Kindle, leitor de livros digitais e disponibiliza
para venda uma imensa gama de títulos para serem lidos
neste mesmo leitor, através de um formato exclusivo, o
Mobi (agora chamado de Kindle Format 8). Existem outras
empresas crescendo no mercado, mas quase sempre impondo essas mesmas práticas, dando prosseguimento às
barreiras mercadológicas.
Diante dessa situação, os leitores de livros digitais,
encontram-se presos aos limites impostos pelo mercado,
que contrariam a lógica do livro como um instrumento de difusão do conhecimento e da leitura. Nesse contexto, o usuário, a partir do momento em que ele é impedido de fazer o
que bem entender, deixa de sentir-se dono de um livro.
Hoje, faz-se necessário repensar as práticas do mercado editorial digital. Livreiros, agentes literários e editores
tradicionais vão ter de se adaptar aos novos tempos, buscando ampliar as possibilidades de compartilhamento, permitindo que o livro continue sendo instrumento de difusão
de informação, conhecimento e cultura para todos os povos.
eLivre
31
O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
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Sumário
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
Introdução
O LIVRO DIGITAL E A INTERDEPENDÊNCIA
DOS FATORES DA MIDIATIZAÇÃO1
Rennam VIRGINIO2
Resumo
Mediante a relevância do processo de midiatização na sociedade e os fatores que compõem esse processo, nosso
objetivo é apresentar o livro digital como um exemplo da relação de interdependência entre estes fatores. As interações
e recursos possíveis com o livro digital traz aos leitores uma
nova ferramenta de leitura, capaz de permitir uma rede de
compartilhamento e troca de informações e conteúdos, característicos da midiatização. A partir dos fatores mercadológicos, humanológicos e tecnológicos da midiatização, faremos uma análise de suas atuações e influências no mercado
do livro digital, também conhecido como eBook.
Palavras-chave: Livro digital. Midiatização. Fatores da
midiatização. Mercado editorial.
Artigo originalmente publicado no livro Midiatização e Cotidiano:
Reflexões sobre as Interações Tecnomediadas (Editora Ideia).
2
Graduando de Comunicação em Mídias Digitais - DEMID/UFPB. Bolsista do Programa de Iniciação Científica (PIBIC), UFPB/CNPq.
Email: [email protected]
1
Capa
Sumário
Séculos se passaram desde o surgimento do livro
impresso como conhecemos hoje. Até chegar ao modelo atual, o livro se apresentou em formato de rolo e
foi publicado em papiro e pergaminho. Entretanto, não
foram apenas as mídias que sofreram transformações
e alteraram os materiais e modelos mercadológicos de
certos produtos.
Com as novas tecnologias da área comunicacional,
os comportamentos e as relações sociais também sofreram mudanças significativas e que hoje caracteriza a “sociedade midiatizada”. De acordo com Fausto Neto (apud
SGORLA, 2009, p.63), essa “sociedade” apresenta:
sua estrutura e dinâmica calcada na compressão espacial e temporal, que não somente institui, como faz funcionar um novo tipo de real, cuja base das interações
sociais não mais se tecem e se estabelecem através de
laços sociais, mas de ligações sociotécnicas.
Sgorla (2009) resume midiatização como múltiplos
entrecruzamentos entre as tecnologias midiáticas, campos e atores sociais, e meios de comunicação social tradicionais e a sociedade. A partir de tal afirmação, podemos incluir o livro digital – também conhecido eBook -,
segundo Horie (2011, p.15) “uma versão digital de um
livro que pode ser lido em computadores ou em aparelhos
portáteis”, como um exemplo de produto integrante do
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
processo de midiatização.
O livro digital têm gerado discussões sob as mais
diversas perspectivas ideológicas, culturais e mercadológicas, o que aumenta a relevância do produto como um
objeto de estudo. As vantagens apresentadas pelo livro
em formato eletrônico são várias, como a facilidade de
portabilidade e a dispensa do uso do papel para impressão, o que consequentemente torna o livro digital mais
barato que o livro impresso.
Entretanto, diversos fatores contribuem para que
o crescimento do livro digital não seja tão grande quanto o esperado pelos apostadores desta tecnologia, como
as artimanhas praticadas pelas editoras e vendedoras
de eBooks numa tentativa de impedir a pirataria e manter seus lucros. Todo esse processo, que vai desde a
produção dos livros digitais para atender a demanda
dos leitores até os entraves mercadológicos, constitui o
processo de midiatização, pois altera relações sociais e
cria novas situações e modelos de negócios, protagonizado pelo jogo de interesses dos vendedores de eBooks,
o que acaba gerando uma situação de heteronomia
aos compradores, tornando-os “reféns’ das vontades
do mercado, com a impossibilidade de compartilharem
seus livros e conteúdos.
Diante da relevância desses dois objetos aqui
apresentados – midiatização e livro digital -, neste artigo, iremos analisar e exemplificar três dos principais
fatores que compõem a midiatização, a partir do estudo
Capa
Sumário
de Nicolau (2012): fator mercadológico, humanológico
e tecnológico, demonstrando a relação de interdependência de tais fatores.
O livro digital: panorama atual
de um mercado em crescimento
Percebemos hoje no meio dos livros digitais uma
crescente aceitação por parte dos novos leitores desta mídia. Consequentemente, o mercado tem acompanhado
este crescimento, sobretudo nos Estados Unidos e no Oeste Europeu, onde estão localizados os países mais ricos
deste continente. Nos EUA, a Amazon já vende – desde o
ano passado -, mais eBooks do que livros impressos.
Vale salientar que esse sucesso deve-se principalmente ao fato de que a Amazon oferece aos leitores um
eReader (Kindle) de baixo custo e uma grande variedade
de títulos a venda com preços em torno de dez dólares.
Deste modo, os usuários tem o “suporte” necessário para
comprarem eBooks e continuarem usando essa tecnologia.
O mercado é dominado por poucas empresas que
detém a maior fatia do mercado, como a norte-americana Amazon – maior vendedora de eBookse e Readers do
mundo – e a Kobo, empresa canadense que ganhou espaço nos último anos e já ameaça a Amazon. É importante
ressaltar que a Kobo já se instalou no Brasil e iniciou as
vendas de seu leitor, enquanto que a Amazon deve iniciar
suas atividades no início de 2013. Ambas já adiantaram
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
acordos com editoras brasileiras.
Inevitavelmente, a chegada dessas empresas cria
uma forte expectativa quanto ao impacto mercadológico
que podem causar. Amazon e Kobo encontrarão no Brasil
um mercado de livros digitais, ainda pequeno, com poucos títulos e adeptos a esta tecnologia, reservada a um
pequeno nicho de consumidores.
A aposta destas empresas está no potencial econômico do Brasil e na própria cultura de sua população, movida pelos anseios de compartilhar e interagir com novas
tecnologias. Esses anseios são apenas um dos elementos
que movem o fator humanológico da midiatização presente no contexto dos livros digitais.
Uma nova tendência que vem ganhando espaço e
investimentos no mercado dos livros digitais é a “auto-publicação”, que funciona da seguinte maneira: o autor
envia seu livro em arquivo PDF ou DOC para uma empresa que oferece este serviço. A empresa contratada fará a
editoração digital e a intermediação com as livrarias para
que o autor – caso deseje vender -, ganhe a sua porcentagem relativa às vendas do livro digital.
No Brasil, a Simplíssimo é a empresa que tem investido neste serviço, firmando parcerias com importantes
livrarias, como a Saraiva, Cultura e a iBookstore (Apple).
Assim, a empresa consegue atrair clientes, pois garante
a venda legalizada do livro digital (em formato ePub) em
uma grande livraria.
Para os autores independentes, esse serviço surge
Capa
Sumário
como uma interessante opção para aqueles que querem
publicar suas obras. Os livros digitais permitem um alcance maior da obra, pois a reprodução é ilimitada, além de
não haver gastos com impressão e transporte, o que reduz os custos de produção e, consequentemente, amplia
os lucros gerados pelas vendas.
Os eBooks no contexto da Midiatização
(ou simplesmente “Os fatores da midiatização”)
Os livros digitais representam, sem dúvida, um produto decorrente do processo de midiatização, definida por
Sodré (2006) como uma ordem de mediações socialmente realizadas, configurando um tipo particular de interação, que podemos chamá-la de tecnomediações. Estas,
por sua vez, ainda segundo o autor, são caracterizadas
por uma espécie de prótese tecnológica e mercadológica
da realidade sensível.
O conceito de mediação também é definido por Sodré (2006) a fim de diferenciá-lo do termo midiatização.
Segundo o autor, mediação é a ação de fazer ponte ou
fazer comunicarem-se duas partes, através de diferentes
tipos de interação.
Também é importante explicitar o processo e o contexto histórico no qual se dá a midiatização. De acordo
com Fausto Neto (2006, p.2-3),
A midiatização situa-se em processos e contextos históricos e em percursos de desenvolvimento de alta com-
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
plexificação que impõem a necessidade de considerar
mecanismos de explicação que são atualizados no movimento destes próprios processos históricos e nos quais
se passa o desenvolvimento das técnicas, dos processos
e das práticas de comunicação. Nestes termos, a sociedade na qual se engendra e se desenvolve a midiatização
é constituída por uma nova natureza sócio-organizacional na medida em que passamos de estágios de linearidades para aqueles de descontinuidades, onde noções
de comunicação, associadas a totalidades homogêneas,
dão lugar às noções de fragmentos e às noções de heterogeneidades.
A partir da afirmação de Fausto Neto (apud GARCIA, 2011) de que a midiatização manifesta-se no momento em que surgem novas formas de fazer, de perceber e de apropriar-se dos produtos midiáticos, isto
é, quando as práticas sociais são afetadas pela lógica
midiática, podemos afirmar que os livros digitais estão
incluídos no processo de midiatização, pois os livros digitais trazem uma nova experiência para a leitura e o
livro em si, baseada não só nas inovações tecnológicas aqui representadas pelos eReaders e outros dispositivos
eletrônicos compatíveis, além dos formatos de publicação que vem ganhando novos recursos e encriptações
-, como também nas questões mercadológicas, quem
impõem barreiras visando combater a pirataria e aumentar seus lucros.
O cenário de conflito provocado pela tecnologia e
o mercado, ocorre ao mesmo tempo em que os usuários
Capa
Sumário
– aqui entra o fator humanológico -, querem compartilhar seus conteúdos, mas se veem presos as “artimanhas”
provenientes do conflito tecnologia x mercado.
O eBook traz ao campo social um situação nova,
que contradiz o papel histórico do livro, até então “livre”
de barreiras mercadológicas. As tecnologias atuais são
capazes de proporcionar aos adeptos dos livros digitais
uma experiência de compartilhamento e interação ampla, baseadas nos recursos de hipertexto que, segundo
Levy (1997, p.33), é “um conjunto de nós ligados por
conexões. Os nós podem ser palavras, páginas, imagens, gráficos ou partes de gráficos, sequencias sonoras, documentos complexos que podem ser eles mesmos hipertextos.”
O alcance e as possibilidades do hipertexto podem
ir além da imaginação humana: “Navegar em um hipertexto significa, portanto desenhar um percurso em uma
rede que pode ser tão complicada quanto possível. Porque cada nó pode, por sua vez, conter uma rede inteira.”
(LEVY, 1997, p.33).
Entretanto, essas possibilidades esbarram no atual modelo de negócio utilizado pelas editoras e livrarias
que exploram a venda de livros digitais, conseqüente das
ações anti-pirataria impostas pelo mercado. Aqui encontramos uma situação de incongruência protagonizada pelos fatores mercadológicos e tecnológicos da midiatização, que por fim acaba prejudicando os usuários, atores
que movem o fator humanológico.
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
Por se tratar de um processo complexo, a midiatização apresenta-se, portanto, alimentada por “agentes”,
aqui denominadas como “fatores”:
Existem inúmeros fatores atuantes na cibercultura, capazes de provocar fenômenos comunicacionais os mais
diversos e que vêm sendo apontados por muitos autores, como responsáveis por novas ordens sociais que
deflagram a midiatização. Flores e Barrichello (2009)
afirmam que, além da tecnologia, outro fator decisivo
para que a ordem social e o modelo cultural contemporâneo alcancem a feitura atual diz respeito à localização
da mídia no centro da sociedade, bem como à expansão de suas lógicas para outros campos sociais. Para
essas autoras, também baseadas nos estudos de Sodré
(2006) e Fausto Neto (2006), a midiatização é um processo relacional resultante de fatores que interferem
nas realidades de origem, sendo configurados de acordo com as lógicas das mídias. (NICOLAU, 2012, p.2)
Existem diversos fatores que influenciam na midiatização, entretanto, tomaremos aqui os três fatores
apresentados por Nicolau (2012) – Humanológico, Tecnológico e Mercadológico – e suas respectivas ações,
influências e consequências no contexto do mercado
editorial digital.
Fatores humanológicos
Segundo Nicolau (2012), o fator humanológico se
baseia no desejo latente de participação cultural a partir
Capa
Sumário
do compartilhamento de ideias e opiniões através das tecnomediações, além de sustentar-se em Sodré (2006) ao
afirmar que a virtualização das relações humanas presente em determinadas pautas individuais de conduta baseadas nas tecnologias da comunicação, é um dos aspectos
que confirma a hipótese de que a sociedade contemporânea rege-se pela midiatização, processo muito diferente
da mediação por este ter um caráter meramente relacional, embora consolidado socialmente.
Além dos anseios de compartilhar suas idéias e opiniões fazendo uso das tecnomediações, também podemos
destacar como um dos componentes do fator humanológico da midiatização - no que tange a questão dos livros
digitais - , a necessidade de portabilidade, pois um único
dispositivo eletrônico pode armazenar milhares de livros.
Também podemos destacar o interesse dos usuários
de acompanharem as tendências tecnológicas e podemos
citar como exemplo os produtos da Apple, que viraram
uma tendência e hoje atrai uma legião de fiéis usuários
que cresce a cada dia.
A questão já abordada anteriormente da “auto-publicação” também pode ser considerada: agora os autores
não precisam mais de gráficas ou assinar contratos com
editoras para terem seus livros produzidos, publicados e
vendidos, e isso sem dúvida representa uma alteração
no modelo de produção e comércio de livros, que agora
pode ser feito totalmente online. “A nossa necessidade
premente de participar desta esfera existencial de com-
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
partilhamentos, baseada nos aparatos tecnológicos e movida pelos impulsos mercadológicos, reforçam a grande
influência do fator humanológico no processo social da
midiatização.” (NICOLAU, 2012, p. 4)
No que tange a experiência de ler livros em dispositivos eletrônicos e quais seriam as motivações que
estruturam o fator humanológico, podemos considerar
a seguinte afirmação de Levy (1996, p.40): “A digitalização e as novas formas de apresentação do texto só
nos interessam porque dão acesso a outras maneiras de
ler e de compreender”
Temos, portanto, uma relevante quantidade fatores
humanológicos, constituído de interesses e transformações sociais que hoje movimentam e participam do processo de midiatização.
Fatores tecnológicos
Destacamos o fator tecnológico por este exercer
uma função de destaque no processo de midiatização,
atuando em constante relação com os fatores humanológicos e mercadológicos – que serão conceituados e exemplificados na sequência do presente artigo -, embora essa
relação não se configure de forma harmônica.
do ações danosas, como a pirataria, que gera incalculáveis prejuízos ao mercado. Percebe-se então a forte relação, tanto positiva quanto negativa, do fator tecnológico
e como as funções pensadas a priori para os produtos
tecnológicos podem ganhar outros usos, atrapalhando a
própria indústria e o mercado.
Os aparatos tecnológicos produzidos pela indústria,
disponibilizados aos milhões e com alcance global,
chegam às mãos das pessoas e ganham vida própria.
São transformados, manipulados, adaptados para que
possam cumprir funções, muitas vezes, diferentes para
as quais foram criados. No âmbito do cenário mundial
de tecnologia, instaura-se a computação pervasiva que
permeia toda a vida social do planeta em suas distintas sociedades; instaura-se a ubiquidade da comunicação, sem fronteiras de idiomas, raças ou crenças.
(NICOLAU, 2012, p.5)
O fator tecnológico apresenta, portanto, uma contraditória relação do fator tecnológico com os outros fatores do processo de midiatização aqui destacados e que
serão discutidos detalhadamente mais adiante.
A indústria é quem movimenta este fator, produzindo os aparatos tecnológicos necessários para a realização
das tecnomediações. Entretanto, esta mesma indústria
produz softwares e hardwares que acabam possibilitan-
Capa
Sumário
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
Fatores mercadológicos
Este fator apresenta importante participação no
processo de midiatização no contexto dos livros digitais,
uma vez que, as movimentações do fator tecnológico são
decorrentes das demandas do fator mercadológico.
A partir disto, podemos afirmar que o fator tecnológico é uma consequência do fator mercadológico, e que
este, por sua vez, atende aos anseios explicitados no fator
humanológico. Temos agora, uma nítida demonstração de
que os fatores da midiatização atuam em uma relação de
constante interdependência, a qual iremos aprofundar no
decorrer deste artigo.
As afirmações de Nicolau (2012, p.5) reforçam esta
ideia, além de chamar atenção para questão dos direitos
autorais, presentes em todos os ramos do mercado das
mídias digitais, inclusive dos eBooks:
O fator mercadológico é determinante para que sejam
desenvolvidas as bases inovadoras das tecnologias da
informação e da comunicação, proporcionando a produção dos aparatos técnicos capazes de atender as necessidades comunicacionais. Mas é também no cerne deste
fator que tem havido os mais acirrados embates entre
os que defendem o controle sobre os direitos autorais e
os que pregam a pirataria como uma prática natural na
internet, por exemplo.
No mercado dos livros digitais, os fatores mercadológicos tem se apresentado como o maior empecilho para
Capa
Sumário
o crescimento deste produto, sobretudo no Brasil, onde
as editoras ainda se mostram inseguras neste mercado,
lançando poucos livros em formato eletrônico e aplicando
preços semelhantes aos praticados nos livros impressos.
O fator mercadológico se apresenta, portanto, como
um fator decisivo para a midiatização, pois não só age
na busca de atender aos anseios do fator humanológico, como também entra em conflito com este mesmo fator e com o fator tecnológico a partir do momento em
que começa a impor barreiras e dificuldades comerciais.
Tais ações, caso ocorram de modo brusco e duradouro,
pode gerar consequências graves, como o desinteresse
dos usuários (fator humanológico) em seguir usando tal
tecnologia, o que afetaria a indústria (fator tecnológico) e
o próprio mercado (fator mercadológico).
Os fatores da midiatização no mercado dos eBooks:
uma relação de interdependência
Após apresentar os três fatores da midiatização escolhidos para serem abordados neste artigo, podemos
agora aprofundar no objetivo principal, que é expor a relação de interdependência existente entre estes fatores,
elencando um fator ao outro.
Essa relação interdependente apresenta-se como
uma espécie de “ciclo” contínuo, onde as ações de um fator acabam por influenciar nas ações praticadas e sofridas
pelos outros fatores. Podemos elencar diversas situações
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
onde os fatores atuam de forma harmônica ou contraditória, porém, para o presente estudo, exemplificaremos
apenas alguns casos.
Tomando por base o já mencionado desejo dos
usuários de estarem sempre compartilhando informações, opiniões, ideias e conteúdos – caracterizando,
portanto, o fator humanológico -, temos por consequência a ação do fator mercadológico, representado
pelo interesse das empresas de venderem produtos que
atendam a essa demanda, buscando obter o maior lucro
possível. Nesse momento, a indústria produz os aparatos tecnológicos necessários para que o mercado atenda às necessidades humanas.
Até então, podemos visualizar uma relação de interdependência entre os fatores da midiatização, mas que
ocorre sem conflitos entre as partes. Entretanto, a partir do
momento em que o fator humanológico desperte interesses
que busquem maior autonomia no uso dos produtos, como
o compartilhamento livre de conteúdos, o que ameaça os
lucros do mercado e gera os primeiros conflitos e contradições dos fatores da midiatização. Vale ressaltar, que os
produtos tecnológicos quase sempre permitem brechas –
intencionais ou não -, para a pirataria e o livre compartilhamento, que prejudicam o mercado e a própria indústria.
Quando os anseios dos fatores humanológicos não
são atendidos, não temos apenas um conflito mercadológico x tecnológico, mas também humanológico x mercadológico, conforme afirma Nicolau (2012, p.5):
Capa
Sumário
Voltando ao princípio de que o fator humanológico tem
como base as vontades humanas mais intrínsecas de
usar os aparatos tecnológicos para relacionamento, participação, opinião, compartilhamento é de se compreender que este se articula com o fator tecnológico e entra
em conflito com o fator mercadológico, estabelecendo
uma negociação constante.
A figura a seguir exemplificará as relações expostas no presente artigo para uma melhor compreensão
do estudo.
Figura 1 – O ciclo contínuo da relação interdependente
entre os fatores da midiatização
Fonte: o autor
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
No contexto do mercado dos livros digitais, temos
Considerações finais
como principal entrave para o crescimento deste produto,
protagonizado pelo fator mercadológico, motivado pela
questão dos Direitos Autorais.
Os leitores de livros digitais não têm a mesma
“liberdade” que um leitor de livro impresso, capaz de
emprestar ou tirar cópias sempre que quiser, ou seja, o
adepto dos eBooks parece não ter a mesma autonomia
sobre sua propriedade se comparado a um leitor de livros impressos, gerando um descontentamento e uma
pressão sobre as empresas, que, por sua vez, impõem
táticas para impedir o livre compartilhamento e pirataria,
a fim de evitar prejuízos.
Esse caso reforça a ideia de que as relações de interdependência dos fatores da midiatização se constroem tanto de formas positivas e complementativas quanto de formas negativas e conflituosas.
Certamente, existem outros tantos casos que podem ser explorados nesta perspectiva, mas que serão
tratados neste artigo. Algumas poucas transformações e
novidades vêm acontecendo no mercado de livros digitais, principalmente no Brasil, e que merecem atenção,
pois podem significar o surgimento de novas formas de
relacionamento entre os fatores da midiatização e que
deverão ser estudadas futuramente.
Capa
Sumário
O processo de midiatização alterou de várias formas
as relações não apenas sociais, mas também mercadológicas, e tal processo é decorrente da influência dos fatores da midiatização apresentados neste artigo.
O livro digital apresenta-se como um produto de
forte potencial mercadológico, bem como cultural e educativo, pois permite um alcance inestimável após ser lançado na rede mundial de computadores. Esse alcance, que
pode representar a difusão de conhecimento é o mesmo
alcance que preocupa as editoras, ameaçadas pela pirataria, cuja prática reduz seus lucros.
Nos EUA e em alguns países europeus, o eBook já
atinge bons números de vendas e aceitação, enquanto
que, no mercado brasileiro, o livro digital ainda dá seus
primeiros passos e as razões para esse “atraso” são várias, como a resistência das editoras em apostar neste
mercado, a falta de mão-de-obra especializada na produção de eBooks em formato ePub, a oferta de e-Readers
com preço acessível e indisponibilidade de títulos em português a preço competitivo.
Os fatores da midiatização atuam de forma conjunta e interdependente: tanto pode se apresentar de
forma harmônica, em que se complementam e beneficiam umas as outras, como também em situações de
conflito, quando os interesses de um ou mais fatores
são contrariados por outro.
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
De acordo com Garcia (2011), temos a interatividade como principal ferramenta da comunicação no processo
midiatizado, isto é, existe a efervescência desse modelo
comunicacional participativo, colaborativo e convidativo.
O livro digital apresenta essas características, pois é capaz de permitir aos leitores uma troca de conteúdos e, inclusive, de opiniões a partir de softwares e aplicativos que
dispõem de recursos como: inserir comentários e marcações no texto, para ser compartilhado e alterado de forma
cooperativa entre vários usuários.
Nitidamente, existe um impasse, no qual, tanto o
total controle dos livros digitais por parte das editoras,
quanto à liberação exacerbada desses conteúdos para
os leitores, são atitudes extremas e que sugerem a necessidade de se encontrar um meio-termo que atenda
ao interesse de todas as partes, gerando assim um modelo de negócio atraente do ponto de vista econômico,
mas também garantindo a autonomia dos leitores de
livros digitais.
Portanto, temos no livro digital um exemplo de
como os fatores da midiatização se relacionam de forma
interdependente, expondo os anseios dos usuários e os
conflitos gerados pelas divergências de interesses entre
estes fatores - e é isso que contribui para uma situação
de constante negociação que pode vir a beneficiar toda
a sociedade.
Capa
Sumário
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NICOLAU, M. “Menos Luiza que está no Canadá” e o fator humanológico da midiatização. In: Revista Culturas Midiáticas, João Pessoa, ano 5, n. 8, jan./jul. 2012. p. 1-12. Disponível em: <http://www.cchla.ufpb.br/ppgc/smartgc/uploads/arq
uivos/907aad9df920120611090301.pdf>. Acesso em: 20 nov.
2012.
SGORLA, Fabiane. Discutindo o processo de midiatização. In:
Mediação. Belo Horizonte, v. 9, n. 8, jan./jun. 2009. Disponível
em: <http://www.fumec.br/revistas/index.php/mediacao/article/view/285/282>. Acesso em: 21 de nov. 2012
SODRÉ, Muniz. Eticidade, campo comunicacional e midiatização. In: MORAES, Dênis de (Org.). Sociedade midiatizada.
Rio de Janeiro: Mauad, 2006. Disponível em: <http://www.
scribd.com/doc/23350785/Eticidade-Campo-Comunicacional-e-Midiatizacao-Muniz-Sodre>. Acesso em: 22 de nov. 2012.
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53
O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
direcionar o artigo para um pertinente enfoque na atual
situação de produção e editoração dos livros digitais neste
Estado nordestino.
Palavras-chave: Ebooks. Editoração. Mídias digitais.
Paraíba.
LIVROS DIGITAIS NO MEIO
EDITORIAL PARAIBANO1
Marriett ALBUQUERQUE2
Introdução
Resumo
O presente artigo tem como objetivo expor uma breve síntese sobre a trajetória dos livros eletrônicos, os ebooks,
sua atual posição no mercado da editoração mundial e
sua importância na área de pesquisa acadêmica na Paraíba. Foram utilizados dados coletados sobre as novidades
em todos os setores envolvidos no mercado, da produção editorial dos livros à fabricação dos leitores digitais.
Além dessa coleta, foram usadas, como base para este
artigo, entrevistas feitas com professores da Universidade
Federal da Paraíba (UFPB) diretamente envolvidos nesse
campo de estudo e produção, bem como, com o diretor de
uma editoras paraibanas que já começa a se familiarizar
com o formato (Editora Ideia). Esse apanhado permitiu
Artigo originalmente publicado no XIV Congresso de Ciência da Comunicação na Região Nordeste - Intercom. Recife, 2012.
2
Graduanda em Comunicação em Mídias Digitais pela UFPB. Integrante do projeto Para Ler o Digital. Email: [email protected]
1
Capa
Sumário
Quem nunca ouviu a expressão “não julgar um livro
pela capa”? Com as plataformas digitais cada vez mais populares hoje em dia, é provável que nos deparemos com
uma derivação, “não julgar um livro pelo seu formato”.
Primeiro em rolos, depois a utilização de folhas de
pergaminho encadernadas. Com a introdução do papel
(inventado em 105 d.C. pelo chinês Cai Lun) na Europa,
graças à vitória dos árabes sobre os chineses na batalha
de Talas em 751 d.C. que permitiu a captura de artesãos
que iniciaram a produção de papel em Bagdá cerca de 40
anos após o episódio.
Uma importante inovação, para a palavra escrita, foi a de
substituir o rolo de papiros ou de pergaminho pela encadernação de folhas de pergaminho, de tamanho regular,
sob forma de livro, permitindo que se escrevesse nos dois
lados da folha. O difícil processo de ler, mediante o gradual desenrolar de papiros ou pergaminhos, ficou substituído pelo fácil manuseio de um texto escrito em folhas
costuradas por sua margem esquerda, ou direita, para
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55
O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
certas grafias, graças ao sistema de códex, inventado pelos cristãos no século IV d.C.. (JAGUARIBE, 1999, p. 24)
O movimento seguinte, que permitiu a revolução
na forma de produzir os livros, deu-se com a invenção
dos tipos móveis de metal por Gutenberg, que possibilitaram a reprodução de textos com velocidade e facilidade superior à que era feita até então. Após este grande
salto, as tecnologias editoriais continuam avançando até
então. A evolução é notável, não só na forma de produção de livros, como no grande investimento em novas
plataformas de leitura.
Os recursos que os eBooks oferecem, facilitam a interação com o conteúdo, além de permitir uma grande portabilidade: um único dispositivo pode carregar milhares
de títulos, e ter - através de uma conexão com Internet
- acesso imediato a outros milhares de títulos disponíveis
gratuitamente ou a venda em sites de todo o mundo.
(ALMEIDA; VIRGINIO, 2012, p.148)
Hoje o mercado editorial mundial volta-se para a grande aposta do meio tecnológico: a portabilidade. Com a recente revolução dos tablets, os computadores portáteis que
invadiram o mercado, e a acirrada disputa pela preferência
dos consumidores, as editoras encontram um mercado promissor cujos resultados já são visíveis. Os eBooks, os livros
em formato digital, proporcionam uma completa reconfiguração dos textos para agradar os leitores dessa plataforma.
Capa
Sumário
A reconfiguração do livro para o formato eletrônico não
significa apenas uma nova forma de fazer livro, publicado agora em uma mídia digital, mas também significa
que o ato da leitura também sofrerá transformações devido aos recursos e facilidades que o livro digital oferece
aos leitores. (ALMEIDA; VIRGINIO, 2012, p.148)
Sem dúvidas, 2011 foi o ano dos eBooks, oportunidade em que houve grandes avanços, não só na
maneira de produzir esse material, mas também nas
plataformas necessárias para sua leitura. Altos investimentos das grandes empresas, como Samsung, Sony,
Amazon, Apple, dentre outras, tornaram os tablets e
e-readers (leitores digitais) os mais novos objetos de
desejo do público que está conectado às mídias digitais
e à internet. Os investimentos continuam para torná-los
cada vez mais funcionais, o que, aliado à progressiva
baixa de preços, os tornará, aos poucos, objetos essenciais, tal como são cada vez mais necessários hoje,
o telefone celular e o notebook. Com uma vantagem:
os tablets, devido às suas funcionalidades e capacidade
cada vez mais extensas e por oferecer maior liberdade
que o computador pessoal, estão em um meio termo
das tecnologias citadas.
Portabilidade e praticidade são as palavras-chave
no mercado de tecnologias, e se 2011 foi o ano das ferramentas da editoração digital, 2012 servirá para que
as expectativas em relação a esse mercado se concretizem de vez.
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
Os primeiros passos do ebook,
sua popularização e o perfil brasileiro
Os ebooks começaram a ser divulgados em 1998,
nos EUA, no entanto, sem grande sucesso. O primeiro
destaque veio em 1999 com uma obra inédita do novelista estadunidense Stephen King. A decisão do autor em
colocar seu conto “Montado na bala” apenas no formato
on line pelo custo singelo de U$2,50 acarretou um positivo retorno: mais de 500 mil cópias vendidas em um
final de semana, mesmo depois de a obra ter sido disponibilizada gratuitamente na internet por alguns dias
(PROCÓPIO, 2010).
Atualmente, esse formato já supera a venda de impressos nos Estados Unidos (em aproximadamente 5%),
segundo anúncio feito no início de 2011 pela Amazon3,
empresa que trabalha com o comércio e produção de
eletrônicos, líder de mercado nessa área editorial e que,
além do vasto catálogo conta com uma linha exclusiva de
e-readers, os aparelhos especializados para a leitura deste formato de livros.
No Brasil, esse nicho editorial ainda engatinha, mas
começa a mostrar que temos um futuro promissor. Embora
ainda haja resistência por parte de muitas editoras, outras
aproveitam tanto o apoio governamental quanto o interesse
Noticia de O Estado de S. Paulo, versão eletrônica, em 20 de maio
de 2011, no link http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,na-amazon-ebook-vende-mais-que-livro-de-papel,721630,0.htm Acesso em 22/05/2011.
privado e se preparam para esse futuro próximo. É o caso
das editoras Gato Sabido, Saraiva e Livraria Cultura, que
começam a configurar um bom acervo de ebooks, ainda
que uma boa parte apresente um preço consideravelmente
elevado (tendo em conta o barateamento na produção que
a nova plataforma possibilita). Dá-se um grande passo em
direção à nova realidade editorial.
Um ponto decisivo para a consolidação dos ebooks
ainda são os tablets e e-readers. Embora estes venham
se popularizando cada vez mais no país, ainda possuem
preços elevados para o padrão de vida do brasileiro. A
situação tende a mudar com a fabricação dos aparelhos
em solo nacional. Isso vem sendo discutido junto ao governo, que demonstra interesse em apoiar projetos dessa
área, pois a questão também abrange a inclusão digital,
já trabalhada no país, além de tratar-se de um ponto que
auxilia o desenvolvimento tecnológico. O incentivo fiscal
previsto para tablets pode chegar a reduzir mais de 30%
dos impostos sobre o produto fabricado com pelo menos
20% de componentes nacionais4. Isso pode dar oportunidade para o Brasil seguir com um modelo democrático
de distribuição cultural e intelectual, cujo fortalecimento
permitirá igualar-se aos países que hoje se apresentam
firmes nessa modalidade editorial.
3
Capa
Sumário
http://g1.globo.com/economia/noticia/2011/05/brasil-ficou-atraente-para-fabricacao-de-tablets-diz-ministro-da-fazenda.html Acesso
em 15/12/2011.
4
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
O objeto de estudo de pesquisadores paraibanos
A Paraíba vai aos poucos despertando para esse
mercado, e mostra interesse na área principalmente para
divulgação junto ao público acadêmico, por se tratar de
um meio onde a relação diária com as plataformas digitais
é mais comum. A informação é de Henrique Magalhães5,
professor e pesquisador da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e diretor da Editora Marca de Fantasia, um selo
independente e artesanal criado em 1995, com enfoque
em obras do meio acadêmico e da cultura alternativa.
A relação da Editora citada (que age como projeto
de extensão universitária) com os livros digitais começou
em 2009 com o livro Discurso, poder e subjetivação:
uma discussão foucaultiana, de J. J. Domingos. Desde então a produção editorial de ebooks passou a fazer parte
do seu conceito, que mostra a preocupação com a adaptação das obras para o meio digital, o que as torna mais
atrativas e de fácil leitura. Hoje, não basta fazer apenas
um pdf da versão impressa do livro, a obra tem que ser
repensada para a plataforma digital, e os recursos existentes (como maior uso de cores, hiperlinks que facilitem
a navegação interna e o uso livre do espaço disponível)
tem que ser explorados ao máximo.
Em contrapartida, os ebooks ainda sofrem bastante preconceito a respeito da sua categorização enquanto
Em entrevista concedida para auxiliar nesta pesquisa, em setembro
de 2011, o professor dividiu algumas de suas ideias a respeito da
área de editoração digital.
5
Capa
Sumário
livro. Os amantes do impresso ainda relutam em reconhecê-lo como livro no formato digital e mais ainda em
aderir a esse tipo de leitura. Sobre isso, Henrique Magalhães assinala também a facilidade do impresso devido sua independência da mídia eletrônica, mas é positivo
em relação aos tabletes, que avançam para promover a
mobilidade conforme haja melhorias na longevidade das
baterias e implementação da hipermídia. Ele frisa: “Ainda
temos no Brasil um público conservador, saudosista, romântico, que resiste a abrir mão da materialidade do livro
impresso.” Apesar dessa postura ainda enraizada no leitor,
há a tentativa de superar esses obstáculos por meio das
ferramentas proporcionadas pela própria tecnologia e que
podem ajudar a aliviar esse estranhamento.
No caso do livro digital, são criados documentos que simulam visualmente o “passar” de páginas, acompanhado do ruído emitido pelo movimento do papel. É como se
o objetivo dessa estratégia de contato fosse recuperar e
renovar o “contato”, a “confiança” que já está na memória afetiva do leitor, remetendo às características do livro
impresso como um lugar reconhecido, do qual se poderia
partir com segurança para novas práticas de leitura. (LACERDA; MACEDO, p.48-49, 2011)
Na UFPB existe ainda um projeto liderado pelo professor Marcos Nicolau (co-fundador da Editora Ideia, em
1989), que é totalmente voltado ao estudo do mercado
editorial digital e à experimentação de modelos editoriais
que se encaixem neste novo segmento.
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
O projeto Para ler o digital existe desde 2010 e já
ganhou um prêmio EXPOCOM, do INTERCOM6 pelos resultados obtidos, e tem recebido críticas positivas por parte
dos usuários que tiveram acesso às obras. Além de fazer
esse estudo, um dos principais objetivos do professor Nicolau7 com o projeto é preparar os estudantes para esse
novo mercado editorial, dando-lhes as ferramentas necessárias para que eles façam este segmento progredir.
Marcos Nicolau atua na área de editoração de livros
desde 1978. Com o surgimento do curso de Comunicação
e Mídias Digitais na UFPB, em 2010 e seu trabalho em
conjunto com a Editora Marca de Fantasia encontrou o
apoio necessário para fundar o projeto.
A Paraíba, sem dúvidas, sempre foi uma fonte de
material intelectual e cultural. A era digital é o grande
trunfo para a exposição e disseminação dessas habilidades, como ressaltou o professor Nicolau nessa discussão:
“Sempre tivemos aqui grandes valores artísticos, culturais
e até mesmo científicos, que podem ser mostrados para
todas as demais culturas do mundo”.
Falta ainda na UFPB um apoio mais concreto a fim
de proporcionar aos seus estudantes e pesquisadores esse
acesso dinâmico à informação. A Biblioteca Central da Universidade não conta com nenhum plano que forneça esse
tipo de serviço. Mas a diretora Suely Pessoa mostra-se a
Edição regional do congresso nacional voltado à área de pesquisa
em comunicação.
7
O professor Nicolau também participou da etapa de coleta de dados,
respondendo a algumas questões em entrevista.
6
Capa
Sumário
favor da implantação8, e afirma que uma negociação está
em andamento com a ebrary Academic Complete9, e com
a concretização desse projeto, a UFPB poderá tornar-se a
pioneira no Nordeste a adquirir esse sistema.
Editoração digital e o mercado estadual
Para além do âmbito acadêmico, uma empresa de
mercado que está aos poucos sendo inserida no meio digital é a Editora Ideia. Apesar de ter uma postura tradicional
quanto aos seus títulos, mostra-se positiva em relação ao
novo modelo. Alguns livros que recebem seu selo ganharam recentemente uma edição digital: obras do professor
Marcos Nicolau, que as aproveitou como material de estudo do projeto sobre a reconfiguração do livro na UFPB.
Essas novas versões tornaram possível a contínua distribuição destas obras, agora para um número ilimitado de
pessoas, facilitando até mesmo seu uso como material
didático para o curso de Comunicação em Mídias Digitais.
A Editora Ideia tem 22 anos de mercado e trabalha
não só com público acadêmico, mas também com os mais
diversos segmentos. A visão de Magno Nicolau10, um dos
As informações foram cedidas pela atual diretora Sônia Suely Araújo
Pessoa, que também foi procurada durante a etapa de pesquisa.
9
Trata-se de uma biblioteca virtual com acervo superior a 76.000
obras de mais de 400 editoras espalhadas pelo mundo. Seus serviços
garantem acesso ilimitado aos títulos. Dados coletados na página oficial da empresa: http://www.ebrary.com/corp/index.jsp
10
Com a entrevista do diretor da Ideia, fechamos as fontes diretas de
pesquisa envolvidas na produção do artigo.
8
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
fundadores do selo e que está atualmente à frente da Editora, é a de que: “O mundo ainda tem um longo percurso
para o meio digital. Estamos de olho no futuro, mas a longo prazo, assim como as grandes editoras.” Ou seja, aos
olhos da editora, o livro impresso não está ameaçado pelo
digital como muitos acreditam, mas os devidos cuidados
em relação ao futuro precisam ser tomados, mesmo que
aos poucos, já que há a necessidade de se pensar nesse
novo modelo para não se tornar obsoleto.
Conclusão
O ebook não é outro produto que não um livro, o
que muda entre ele e o impresso é a plataforma na qual
está inserido. Esse produto não veio para competir e tentar
extinguir o livro tradicional, mas para dar alternativas aos
leitores que precisam carregar consigo uma grande quantidade de material e que veem na prática digital a opção
mais viável para atender às suas necessidades diárias.
Um dos aspectos principais desse novo mercado é
a democratização do acesso às obras: nesse contexto é
possível que os livros comerciais coexistam com as produções avulsas a serem disponibilizadas gratuitamente. Os
autores anônimos, que jamais teriam suas obras comercializadas, podem agora criar e compartilhar seus trabalhos literários diretamente com as pessoas interessadas, a custo
zero. Por sua vez, aqueles que jamais teriam condições de
comprar livros a preço de mercado, passam a ter acesso às
Capa
Sumário
informações provenientes desses ebooks compartilhados.
Com os experimentos que veem sendo feitos na Paraíba, tanto autores, quanto profissionais de editoração e
editores estão sendo beneficiados, numa área em franca
expansão e com muitas novidades ainda a oferecer. Isso
porque, o mercado editorial não é mais uma primazia dos
grandes centros do país e suas portentosas editoras. O
advento da internet e a revolucionária tecnologia das mídias digitais interativas ampliou de forma imensurável as
possibilidades dessa área.
Pelo visto, há espaço de mercado suficiente para
gerar novos modelos de negócios editoriais, assim como
há espaço para o compartilhamento e a democratização
do conhecimento, esse patrimônio universal que tem no
livro sem principal mensageiro.
Referências
JAGUARIBE, Hélio. O significado do papel para a cultura. In:
DOCTORS, M. (Org.); A cultura do papel. Rio de Janeiro:
Casa da Palavra, 1999.
MCLUHAN, Marshall. A galáxia de Gutenberg: a formação
do homem tipográfico. São Paulo: Editora Nacional, Editora da
USP, 1972.
PROCÓPIO, Ednei. O livro na era digital: o mercado editorial
e as mídias digitais. São Paulo: Giz Editorial, 2010.
LACERDA, Luciano; MACEDO, Helton. O vazio da estante: o
acesso ao livro digital sob a perspectiva das suas dimensões
política e cultural. In: Revista Comunicação Midiática, v.6,
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65
O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
n.1, jan./abr. P 44, 2011.
ALMEIDA, Filipe; VIRGINIO, Rennam. Do códice ao leitor digital: a reconfiguração do livro na cibercultura. In: NICOLAU,
Marcos. (Org.); Reconfiguração das práticas midiáticas na
cibercultura. João Pessoa: Marca de Fantasia, 2012.
A RECONFIGURAÇÃO DO LIVRO DIDÁTICO
EM VERSÃO DIGITAL:
UMA IDEIA DE SUSTENTABILIDADE1
Sites
http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,na-amazon-ebook-vende-mais-que-livro-de-papel,721630,0.htm
http://g1.globo.com/economia/noticia/2011/05/brasil-ficou-atraente-para-fabricacao-de-tablets-diz-ministro-da-fazenda.html
Filipe ALMEIDA2
Resumo
http://www.ebrary.com/corp/index.jsp
A mesma portabilidade que originou o livro impresso também está presente no livro digital, com uma grande diferença: ao invés de um, o leitor digital carrega consigo
dezenas ou centenas de livros no mesmo suporte do tamanho de um livro tradicional. É no contexto dessa inovação tecnológica que se vislumbra uma nova era para o livro didático, reconfigurando uma prática educacional que
poderá contribuir com a inclusão digital e com um modelo
de sustentabilidade para a indústria editorial brasileira.
Procuramos demonstrar neste artigo, porém, que, no viés
Trabalho apresentado na Divisão Temática Comunicação Multimídia,
da Intercom Júnior – VII Jornada de Iniciação Científica em Comunicação, evento componente do XXXV Congresso Brasileiro de Ciências
da Comunicação
2
Graduando em Comunicação em Mídias Digitais pela UFPB. Integrante do Projeto Para Ler o Digital. Email: [email protected]
1
Capa
Sumário
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
de novos hábitos de leitura e acesso ao conhecimento provocado pelo livro digital, bem como de sustentabilidade,
há entraves ainda por superar, como, por exemplo, o atual
modelo de negócio do livro didático impresso que deverá
atrasar uma aceitação imediata do livro didático digital no
mercado editorial.
Palavras-chave: Livro digital. Livro didático. Mercado
editorial. Sustentabilidade.
Introdução
Cerca
de quinhentos anos após o desenvolvimento
da prensa tipográfica por Gutenberg, é dado o pontapé
inicial para a disseminação do livro digital, por meio do
Projeto Gutenberg, criado pelo americano Michael Hart. Os dois marcos não estão interligados apenas pelo nome
do inventor alemão, o conceito de portabilidade já existente no surgimento do impresso é o mesmo que permeia
o livro eletrônico.
O livro digital surgiu em decorrência do grande número de novos aparatos tecnológicos que aparecem atualmente e com frequência no mercado. Com isso, também
surgiu a necessidade de novas experiências de leitura, interatividade e portabilidade. Como exemplo dessa atual
expansão, no início de 2011, a Amazon comunicou que
estava vendendo mais livros digitais do que em papel, pois
Capa
Sumário
a cada 100 livros impressos vendidos, a empresa vendia
205 eBooks3 - o nome mercadológico do livro digital.
Entrando na área de livros didáticos convencionais,
por fazer parte do mesmo processo do livro impresso,
constatou-se necessidades semelhantes. No caso dos livros educacionais, há um problema maior, pois eles servem de base para o aprendizado das crianças e adolescentes nos diversos níveis escolares. Com o avanço da
tecnologia, observa-se cada vez menos crianças entretidas com o estudo, e os aplicativos encontrados nos dispositivos eletrônicos são muito mais atrativos e divertidos
do que o conteúdo dos livros tradicionais.
Outro fator essencial para esta reconfiguração é a
sustentabilidade. A produção do livro impresso demanda
uma série de recursos naturais, tanto em sua fabricação
quanto no transporte. Com os dispositivos de leitura, tem-se uma diminuição considerável no uso de matérias primas do meio ambiente, além de uma redução imensa do
espaço físico necessário para o armazenamento dos livros.
Pretendemos mostrar neste artigo as vantagens da
utilização do livro digital como uma forma de reconfigurar o livro didático para atender às necessidades tecnológicas e sustentáveis da sociedade atual. Mas, também,
as dificuldades que esse modelo enfrentará para ser implantado satisfatoriamente.
Disponível
em:
http://revistaepoca.globo.com/Revista/
Epoca/0,,EMI234832-15224,00-AMAZON+VENDE+MAIS+LIVROS+
DIGITAIS+QUE+LIVROS+DE+PAPEL.html. Acesso em: 20/04/2012.
3
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
Livros digitais: surgimento e conceituação
de se poder realizar leituras de diversos livros em um
único dispositivo. Além da economia de espaço físico, os
O
processo histórico do livro surge com a invenção da escrita pelos sumérios, que foi impulsionada pelo
sistema fonético grego, fazendo com que a mesma fosse
propagada por vários povos do planeta. Até se chegar aos
suportes de leitura que se conhece hoje (livro, computador, smartphone, tablet), um longo caminho foi percorrido
e diversos elementos da natureza foram utilizados como
base para a escrita.
No século XV, Johannes Gutenberg desenvolveu a
prensa tipográfica, fazendo com que o livro se transformasse num produto portátil, tornando-o acessível a uma
parcela maior da sociedade. De acordo com McLuhan
(1972):
Esse desejo muito natural de se ter facilmente livros
à disposição, e livros de formato cômodo e portáteis,
acompanhou passo a passo a crescente rapidez da leitura, que se tornara possível com a impressão do texto
em tipos uniformes e móveis, em contraste com a leitura mais dificultosa dos manuscritos. Este mesmo movimento pela acessibilidade e caráter portátil do livro criou
públicos e mercados cada vez maiores, os quais eram
indispensáveis ao sucesso de todo o empreendimento
gutenberguiano (MCLUHAN, 1972, p.281).
livros digitais possibilitam a preservação de uma obra
sem que haja perda de conteúdo, degradação das folhas, ou ainda o odor de mofo daqueles que passam
anos sem ser consultados.
O pontapé inicial para a disseminação dos livros
digitais foi dado pelo americano Michael Hart. Em 1971,
ele criou o Projeto Gutenberg, responsável por arquivar
obras culturais por meio de digitalização de livros, em
sua maioria, em domínio público. A Declaração de Independência dos Estados Unidos foi a primeira obra a ser
disponibilizada gratuitamente de forma eletrônica pelo
projeto. Antes disso, em 1945, Vannevar Bush escreveu
um artigo para o periódico The Atlantic Monthly, intitulado “As we may think”. Neste artigo, Bush idealizou o
primeiro protótipo de uma máquina de leitura, chamado
de MEMEX (MEMory EXtesion), algo que ele considerava ser a biblioteca universal do futuro. Com base na
ideia de Bush, em 1998, empresas da indústria editorial
lançaram dois leitores portáteis, o SoftBook Reader e o
Rocket eBook, com capacidade para armazenar cerca
de cinco mil páginas de livros.
Atualmente, podemos atribuir o surgimento dos
livros digitais, movido por um mercado editorial consolidado, à necessidade de portabilidade, à comodidade
Capa
Sumário
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
A reconfiguração do livro didático
e o atual Modelo de negócio
Figura 1 – Esboço do MEMEX.
Para se entender a necessidade de reconfiguração
do livro didático, devemos observar o conceito dessa categoria de livros, estabelecido por MELLO (1999): “É o
livro de uso individual do aluno, em geral “indicado” ou
“adotado” pelo professor. Dessa forma, especialmente no
Brasil, o mais comum é que todos os alunos de uma mesma turma ou classe usem um mesmo livro” 4.
Fonte: <http://u-tx.net/ccritics/as-we-may-think.html>
Segundo Horie (2011), um livro eletrônico ou digital,
também conhecido como eBook, é uma versão digital de
um livro que pode ser lido em computadores ou em aparelhos portáteis. O eBook possibilita ao leitor diversas funcionalidades como marcadores de páginas, bloco de anotações, busca de palavras, ajuste no tamanho e no tipo de
fontes, além de inúmeros recursos existentes em aplicativos desenvolvidos especificamente para os livros digitais.
Como relata Dziekaniak et al. (2010, p.85), “essa
é a realidade da leitura virtual, um formato que convida
o leitor a interagir e a explorar símbolos e palavras que
mudam de cor ou que oferecem a facilidade de manuseio com um simples toque”. Com isso, a leitura virtual,
se torna uma experiência agradável, ou seja, um convite
para que o leitor possa interagir com elementos capazes
de proporcionar um aumento significativo na absorção do
conteúdo dos livros.
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Sumário
O Brasil é um dos oito países que mais consomem
livros no mundo. Em 2006, foram 310 milhões de livros
vendidos, sendo 60% de livros didáticos (PROCÓPIO,
2010). De acordo com a FNDE (Fundação Nacional de Desenvolvimento da Educação), o orçamento do PNLD (Programa Nacional do Livro Didático) em 2012 é de R$1,48
bilhão, destinado à compra de livros didáticos para os ensinos fundamental e médio 5. Segundo o jornal Estadão,
para o ano de 2012 só o governo fez uma compra de 170
milhões de livros didáticos 6.
Devido à grande quantidade de livros didáticos necessários para o ensino, a demanda por recursos naturais
MELLO, Guiomar Namo de. O livro didático no sistema de ensino público do Brasil. Disponível em: http://www.namodemello.
com.br/pdf/escritos/outros/livrodidat2.pdf. Acesso em: 02/05/2012.
5
Disponível em: http://www.fnde.gov.br/index.php/programas-livro-didatico. Acesso em 02/05/2012.
6
Disponível em: http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,brasil-ja-importa-ate-livro-didatico-,837912,0.htm?reload=y. Acesso em
02/05/2012.
4
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
para a fabricação dos mesmos é de grandes proporções.
Com o uso das novas tecnologias e o aspecto sustentável
discutido neste trabalho, é possível visualizar uma tendência em que, num futuro próximo, os livros digitais didáticos serão comercializados em larga escala. Algumas
instituições de nível médio e superior no Brasil e em grande parte dos Estados Unidos e Europa já utilizam algum
tablet como material escolar7.
Além do fator de sustentabilidade, o livro didático
digital propicia ao aluno uma nova experiência, facilitando
o processo de aprendizagem pela interação com diversos
elementos audiovisuais.
Entretanto, sabemos que viabilizar, de imediato,
uma mudança de livros didáticos impressos para livros
didáticos digitais esbarra é uma questão mercadológica
muito grave. O mercado editorial brasileiro, notadamente o de livros didáticos movimenta quantias de dinheiro
significativas. Trata-se de um modelo de negócio consolidado, que gera milhões de empregos e bilhões em lucro.
Mas, ao mesmo tempo, faz com que somente famílias de
classe média e alta possam comprar todos os livros necessários à educação de seus filhos, comprometendo, com
sacrifício, parcela dos recursos financeiros, que poderiam
ser destinados a outros benefícios imprescindíveis.
O mercado editorial brasileiro produz cerca de 200
milhões de livros didáticos, sendo que, desse total, 150
Disponível em: http://ultimosegundo.ig.com.br/educacao/tablets-substituem-livros-em-escolas-brasileiras/n1597608252795.html.
Acesso em: 02/05/2012.
7
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Sumário
milhões são comprados pelo Governo Federal para distribuir às Escolas Públicas, para o ensino fundamental e o
ensino médio, em todo o país, conforme o site Agência de
Notícias Brasil Que Lê, do Programa de Ação Cultural do
Estado de São Paulo8. Essa distribuição é feita através do
Plano Nacional do Livro Didático (PNLD), garantido pela
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, dos anos
de 1990, conforme Cassiano (2007)9.
A Agência de Notícias Brasil Que Lê informou ainda
que o mercado editorial de livros escolares esperava faturar, em 2011, dois e meio bilhões de reais, quantia que
é 500 milhões de reais a mais do que em 2010. E, desse
montante, três quartos seria pago pelo Governo Federal.
Vale salientar que esta fatia de livros escolares representa 51 por cento do mercado editorial brasileiro, segundo ainda a referida Agência. Desse modo, podemos
deduzir que a produção de livros do mercado editorial
brasileiro ultrapassa a casa dos 400 milhões de livros, em
média anual.
E mesmo que a indústria do livro tenha, parte da sua
produção de celulose apoiada pela atividade extrativista de
plantio próprio de árvores como Eucalipto, há um significativo impacto ambiental provocado pela fabricação das obras.
Disponível em: http://www.brasilquele.com.br/noticia_show.
php?noticia=6575. Acesso em: 24/06/2012.
9
CASSIANO, Célia Cristina de Figueiredo. O mercado do livro didático no Brasil. Tese de doutorado da Pontifica Universidade Católica
de São Paulo, 2007. Disponível em: http://ged1.capes.gov.br/CapesProcessos/premio2008/968930-ARQ/968930_5.PDF. Acesso em:
24/06/2012.
8
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75
O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
A questão sustentável
Questões comparativas entre o livro de papel e o digital são muito comuns nos dias de hoje, e vários critérios
podem ser analisados para tentar definir qual dos dois é
melhor, se conforto e experiência de leitura, mobilidade,
ou ainda o preço do livro. Há também outro aspecto que
está bastante em evidência, a questão sustentável. Por
isso decidimos destrinchar um pouco esse processo comparativo entre o passado e o presente dos livros, levando
em consideração a sustentabilidade.
Em 1987, a Comissão Mundial sobre Meio Ambiente
e Desenvolvimento (World Commission on Environment
And Development - WCED), no relatório denominado de
“Nosso Futuro Comum” ou “Relatório Brundtland”, definiu
o conceito de desenvolvimento sustentável como: “Aquele
que atende às necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem as
suas próprias necessidades.” (WCED, 1987).
Aplicando este conceito em desmatamento de florestas, em 1997, um relatório do World Resources Institute (WRI)10 estimou que quase metade da cobertura
original de florestas do planeta já foi destruída. Por meio
de uma análise direcionada ao impacto causado pela produção de papel, Dougherty (2011, p.110) afirma que:
World Resources Institute. Last Frontier Forests: Ecosystems
and Economies on the Edge. Disponível em: http://pdf.wri.org/
lastfrontierforests.pdf. Acesso em: 01/05/2012.
10
Capa
Sumário
Além de promover a destruição de florestas, a produção
de papel consome uma quantidade imensa de energia e,
por isso, tem um impacto muito grande de gases-estufa.
Considerados em conjunto, os fatos mostram que a indústria do papel é a quarta maior produtora industrial
de dióxido de carbono, sendo responsável por 9% das
nossas emissões de gases-estufa. Isso está longe de ser
sustentável [...]
Dougherty (2011) também ressalta os sérios impactos ambientais causados pela quantidade excessiva de
água utilizada na indústria do papel, além da queima constante de combustível fóssil para transformar a fibra da madeira em papel seco. Já de acordo com o relatório “Paper
Cuts” 11, o Worldwatch Institute informou que “O consumo
mundial de papel e papelão tem crescido tão rapidamente
que superou os ganhos obtidos com a reciclagem”.
Uma análise em vídeo realizada em parceria com
um projeto do Banco Santander mostra que cada livro de
papel consome 30 litros de água e emite entre 2 e 3 quilos
de dióxido de carbono em sua produção. Já o custo ambiental de um livro digital é muito pequeno, entretanto, se
faz necessário a fabricação de um dispositivo de leitura.
Nesse caso, são gastos aproximadamente 300 litros de
água e emitidos de 60 a 100 quilos de CO2 12.
Worldwatch Institute. Paper Cuts: Recovering the Paper Landscape. Disponível em: http://www.worldwatch.org/system/files/
EWP149.pdf. Acesso em: 02/05/2012.
12
Baseado no vídeo: Sustentabilidade: Livros x Ebooks. Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=CCzFU4b_o40&list=PL54
B22834BFD3F9EE&index=2&feature=plcp. Acesso em: 02/05/2012.
11
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77
O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
Dessa forma, podemos observar que o custo ambiental para a produção de um dispositivo de leitura é bem
maior do que o custo para a fabricação de um livro impresso. Entretanto, é importante ressaltar que, num único dispositivo eletrônico, é possível armazenar centenas de livros
digitais, tornando o eBook uma alternativa sustentável.
Outro fator que deve ser levado em consideração é
o transporte do livro. No produto impresso, são necessárias inúmeras viagens para o livro sair da fábrica e chegar
ao seu destino final, o leitor. Com o meio digital, o livro
passa a ser vendido e enviado diretamente pela internet,
diminuindo a emissão de gases poluentes do transporte,
o tempo de espera para a chegada do livro e o custo final
para o leitor.
Considerações finais
Diante do conteúdo exposto, observamos que o livro digital não é tão recente como muitos imaginam, além
de sua origem possuir características que se assemelham
bastante ao surgimento do livro impresso. E não se trata
de apresentar o livro digital como uma solução pela substituição ao livro impresso. Percebemos que ambos podem
conviver simultaneamente, em uma complementação imprescindível para a construção do conhecimento e a consolidação de prática educacional mais produtiva.
O aspecto sustentável já vem sendo bastante discutido em eventos cuja temática principal é o meio am-
Capa
Sumário
biente. São muitos os impactos causados pela produção
do papel, havendo assim, a necessidade de preservação
de sua matéria-prima. O livro digital pode vir a atender
às necessidades sustentáveis da sociedade atual, fazendo com que haja uma diminuição considerável na utilização de recursos naturais, redução do espaço físico e nos
gastos com transporte.
Além de solucionar as questões sustentáveis e tecnológicas, os recursos audiovisuais interativos provenientes do livro eletrônico podem alterar os hábitos de crianças e jovens que não encontram mais no livro didático
convencional o estímulo necessário para a aquisição do
conhecimento. Do ponto de vista educacional, a aprendizagem torna-se fácil e divertida, com elementos multimídia capazes de prender a atenção do leitor.
Com a popularização dos dispositivos portáteis,
principalmente smartphones e tablets, o eBook já é uma
realidade no mercado, grandes editoras já possuem versões digitais dos seus livros e revistas mais importantes.
Várias escolas e universidades também estão aderindo
rapidamente aos benefícios decorrentes do livro digital,
tornando-o uma ferramenta essencial para a educação.
Com isso, entendemos que o livro didático precisa ser reconfigurado, tornando-se uma alternativa sustentável e
digital, mas sem perder sua essência, que é a de facilitar
o processo educacional.
Ganham com essa reconfiguração do livro digital,
tanto os estudantes de classes média e alta, quanto os es-
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79
O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
tudantes mais carentes, das Escolas Públicas; ganha, enfim, a sociedade brasileira, que precisa urgentemente de
um plano educacional mais arrojado para alcançar a tão almejada condição de grande potência no contexto mundial.
Referências
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aplicada a leitores de e-book: avaliando a interface do Kindle III WiFi. (Dissertação de Mestrado). Universidade Federal da
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eLivre
81
O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
soa: Marca de Fantasia, 2012.
WCED. WORLD COMMISSION ON ENVIRONMENT AND DEVELOPMENT. Our Common Future, 1987.
LIVRO DIGITAL: PERCALÇOS E ARTIMANHAS
DE UM MERCADO EM RECONFIGURAÇÃO1
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http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EMI23483215224,00-AMAZON+VENDE+MAIS+LIVROS+DIGITAIS+QUE+
LIVROS+DE+PAPEL.html
Rennam VIRGINIO2
http://www.fnde.gov.br/index.php/programas-livro-didatico
http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,brasil-ja-importa-ate-livro-didatico-,837912,0.htm?reload=y
http://ultimosegundo.ig.com.br/educacao/tablets-substituem-livros-em-escolas-brasileiras/n1597608252795.html
http://www.brasilquele.com.br/noticia_show.php?noticia=
6575
Resumo
Cinco séculos após a invenção da prensa de Gutenberg que permitiu a produção em massa de livros impressos -, o
livro reconfigurou-se e hoje também pode ser encontrado
em formato digital, conhecido como e-book ou livro digital.
O livro digital traz ao usuário uma nova experiência em leitura por ser hipertextual, o que garante a possibilidade de
serem explorados recursos interativos. Atualmente a empresa norte-americana Amazon já vende mais e-books do
que livros impressos, enquanto que o mercado brasileiro
ainda dá os primeiros passos. Entretanto, em todo o munTrabalho apresentado no IJ 5 – Comunicação Multimídia do XIV Congresso de Ciências da Comunicação na Região Nordeste realizado de
14 a 16 de junho de 2012.
2
Graduando em Comunicação em Mídias Digitais pela UFPB. Bolsista
do Programa de Iniciação Científica (PIBIC/UFPB) pelo projeto Para
Ler o Digital. Email: [email protected]
1
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Sumário
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
do, o mercado editorial digital - pressionado pelas ameaças de pirataria - faz uso de práticas mercadológicas que
limitam a liberdade dos leitores. Este artigo busca expor e
discutir os percalços e as artimanhas deste novo mercado.
Palavras-chave: Livro digital. Mercado editorial. Reconfiguração.
Introdução
O livro impresso foi um dos principais meios utilizados para a difusão do conhecimento adquirido pelo ser
humano. Entretanto, após cinco séculos de supremacia
do livro impresso, os avanços tecnológicos e as necessidades do homem moderno, permitiram a criação – ainda
na década dos anos de 1970 - de uma nova forma para
a publicação de livros, mas que só agora vem ganhando
notoriedade e mostrando-se como um forte produto comercial: o livro digital, também conhecido como eBook
(abreviação de eletronic book).
O livro na versão eletrônica explora os recursos do
hipertexto e traz aos leitores uma nova experiência em
leitura, podendo conter diversos elementos interativos
que dinamizam as possibilidades dos usuários. Muito tem
se discutido sobre o livro digital, sua usabilidade, legitimidade e o modo como as livrarias e editoras tem conduzido
as atividades mercadológicas deste novo produto.
Capa
Sumário
Os eBooks já são mais vendidos do que os livros
impressos na gigante norte-americana Amazon, que também vende o e-Reader mais popular, o Kindle. O segredo
do sucesso está no modelo utilizado, aliando preços acessíveis a um produto de qualidade.
Entretanto, no Brasil, poucas livrarias e editoras resolveram entrar no mercado e os leitores (e-Readers) ainda são vendidos a altos preços, impedindo o crescimento
comercial no país. Essa realidade pode mudar com a chegada da Amazon ao Brasil a partir de setembro deste ano.
O objetivo deste artigo é mostrar as práticas atuais
do mercado editorial digital, - com todas as suas contradições e dilemas para implantação de um sistema de vendas
que seja satisfatório - exemplificando os principais casos,
com destaque para a Amazon, maior vendedora de livros
digitais do mundo, além de fazer um apanhado do mercado
nacional e das novas possibilidades de publicação de obras
a partir do modelo digital, que permite que autores independentes publiquem suas obras sem muitos custos.
Do impresso ao digital: a evolução do livro
O livro depois da prensa de Gutenberg
Desde o surgimento da máquina de prensa criada
pelo alemão Gutenberg, no século XV, o livro passou a
ser um importante produto comercial e de difusão de informações e conhecimentos durante todos estes séculos.
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85
O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
Antes da prensa de Gutenberg, os livros eram manuscritos ou produzidos a partir de matrizes de impressão
feitas de materiais pouco resistentes, como cerâmica ou
madeira, que se estragavam rapidamente e tornavam-se
totalmente inutilizáveis, enquanto que a máquina criada
por Gutenberg possibilitou a cópia em grande quantidade
de livros a partir de uma única matriz feita de metal e com
tipos móveis, que possibilitava a combinação e a recombinação livre dos tipos sempre que necessário.
McLuhan (1972) reforça a importância da criação
de Gutenberg para a história do livro, concluindo que esta
invenção confirmou e estendeu a nova tendência visual do
conhecimento aplicado, dando origem ao primeiro bem de
comércio uniformemente reproduzível, à primeira linha de
montagem e à primeira produção em série.
Entretanto, a criação de Gutenberg não foi a primeira grande contribuição para a formação do livro impresso
tal qual conhecemos hoje:
Uma importante inovação, para a palavra escrita, foi a de
substituir o rolo de papiros ou de pergaminho pela encadernação de folhas de pergaminho, de tamanho regular,
sob forma de livro, permitindo que se escrevesse nos dois
lados da folha. O difícil processo de ler, mediante o gradual desenrolar de papiros ou pergaminhos, ficou substituído pelo fácil manuseio de um texto escrito em folhas
costuradas por sua margem esquerda, ou direita, para
certas grafias, graças ao sistema de códex, inventado pelos cristãos no século IV d.C.. (JAGUARIBE, 1996, p.24)
Capa
Sumário
Percebemos, então, que antes mesmo da prensa de
Gutenberg, o livro passou por diversas transformações,
tanto no material utilizado – começou com papiros e pergaminhos, até chegar ao papel -, quanto em seu formato,
conforme vimos na afirmação de Jaguaribe.
O livro na era da cibercultura
Atualmente, na era da tecnologia e da cibercultura, o livro também se apresenta em formato digital,
possibilitando aos leitores uma nova experiência de
leitura, conhecido como eBook (abreviação para eletronic book).
Os livros digitais surgiram no início dos anos de
1970, a partir do Projeto Gutenberg, liderado pelo norte-americano Michael Hart. O projeto visava a produção e
distribuição gratuita de livros eletrônicos.
Passaram-se algumas décadas e hoje os livros digitais movimentam um lucrativo mercado, que vem crescendo ano após ano. Além dos próprios livros digitais, também são vendidos os aparelhos dedicados a leitura destas
obras em versões eletrônicas: os e-readers (leitores eletrônicos). Apesar dos eBooks poderem ser lidos também
em computadores de mesa ou notebooks com auxílio de
simples softwares, o mercado de e-readers também movimenta milhões e é amplamente lucrativo para os principais desenvolvedores, como a Amazon, empresa norte-
eLivre
87
O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
-americana que atualmente domina os mercado de livros
digitais e leitores eletrônicos, com seu popular aparelho
Kindle, e-reader lançado em 2007 custando US$399,00
Dólares mas que já pode ser encontrado por menos de
US$100,00 em suas versões mais simples. Vale lembrar
que os livros digitais também podem ser lidos em tablets,
como o famoso iPad da Apple.
Os livros digitais apresentam uma diferente forma de texto, conhecido como hipertexto. Segundo Lévy
(1996), hipertexto é uma matriz de textos potenciais,
sendo que alguns deles vão se realizar sob o efeito da
interação com um usuário. Esse tipo de recurso é bem
explorado não só nos livros digitais como também nas
revistas lançadas em formatos digitais, que vem trazendo cada vez mais recursos interativos que tornam a
leitura mais dinâmica e inovadora.
Pierre Levy ainda afirma que “a digitalização e as
novas formas de apresentação do texto só nos interessam
porque dão acesso a outras maneiras de ler e de compreender” (1996, p.40).
Portanto, atualmente temos os livros – ou pelo
menos parte deles – disponíveis em dois formatos: o
impresso e o digital. Cabe ao leitor encontrar o formato que mais lhe agrade e atenda às suas necessidades
enquanto leitor.
Faça você mesmo: os livros digitais facilitam
a publicação de autores independentes
Uma atividade que ganhou força com a cibercultura
e as possibilidades que a Internet oferece, foi a cultura do
“faça você mesmo”, que consiste na prática independente
de algum trabalho ou atividade, dispensando o auxílio de
serviços profissionais.
Na Internet, através de ferramentas disponíveis –
quase sempre gratuitamente – na grande rede, qualquer
usuário pode publicar seus trabalhos. Sites como Youtube3 e MySpace4 revelaram e ainda revelam novos artistas
de diversas áreas devido ao alcance inestimável que esses serviços permitem. O mesmo processo também pode
acontecer agora com escritores independentes.
Para estes escritores, lançar um livro é sempre um
desafio devido aos altos custos que o processo de edição,
impressão e distribuição que um livro requer. Muitos acabam financiando a impressão por conta própria em gráficas e o resultado geralmente é abaixo do padrão editorial
e com uma pequena tiragem.
Os livros digitais permitem aos autores independentes a publicação de suas obras com valor acessível – podendo até ser de graça, caso o próprio autor faça a edição e
diagramação em formato digital – e com um alcance enorme, pois estaria disponível para download na Internet.
3
4
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Sumário
Disponível em: www.youtube.com - Acesso em: 27/03/2012
Disponível em: www.myspace.com - Acesso em: 27/03/2012
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
Além do já citado Amazon’s Kindle Direct Publishing,
podemos citar a Simplíssimo, editora nacional, que produz livros digitais em formato ePub. O autor envia o texto,
e a editora faz a diagramação em formato ePub, podendo
ainda disponibilizar para venda em grandes lojas.
Figura 2: Pacotes de servições oferecidos pela editora Simplíssimo.
deve-se ao Facebook e ao Twitter, redes sociais que contam com os maiores números de usuários.
Aproveitando esse sucesso, Amazon e Submarino
criaram redes sociais especiais para os leitores de livros
digitais que compram em suas respectivas lojas. As redes
sociais funcionam como uma grande rede de interação
entre os usuários e possibilita o agrupamento de pessoas
com interesses afins.
Tanto a rede social da Amazon quanto a do Submarino, a Submarino Digital Club, buscam criar interações
entre os leitores de eBooks. O aplicativo permite que os
usuários possam criar comunidades, fazer anotações, comentar sobre os livros, avaliar, adicionar e seguir outros
usuários, e mercar os livros que já leu, que está lendo e
que pretende ler.
A interação, nesse caso, tem seus atrativos, entretanto, nenhuma das duas redes emplacaram. No Brasil, já
existia uma rede social voltada para os leitores de livros,
o Skoob5, mas este era voltado para leitores de livros impressos. Mas fazendo uma análise dos recursos e funções
que cada um agrega, não encontramos muitas diferenças,
Fonte: http://www.simplissimo.com.br/autores-livres/
apenas uma divisão do público entre leitores das versões
As redes sociais para os leitores de livros digitais:
uma nova ferramenta de interação
As redes sociais vêm crescendo a cada ano, e já são
os sites mais acessados do mundo. Muito desse sucesso,
Capa
Sumário
digitais e leitores das versões impressas.
5
http://www.skoob.com.br/ - Acesso em: 23/03/2012
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
Segundo Procópio (2010), uma das estratégias utilizada pela editoras que lançam livros digitais é a aplicação de DRM6’s, que além de atuar como uma senha
Figura 3: Submarino Digital Club
Disponível em: http://submarino.thecopia.com/home/index.html
O mercado editorial e suas artimanhas
O mercado de livro impressos já está consolidado, enquanto que o mercado de livros digitais ainda engatinha e
sofre para encontrar um modelo de mercado que seja viável
diante das ameaças de pirataria, constantes na Internet.
O que encontramos no mercado atual de livros digitais são uma série de empecilhos surgidos a partir das
práticas mercadológicas impostas pelas editoras que se
lançaram no mercado dos livros digitais e descaracterizam as propriedades de um livro impresso. Por exemplo,
o simples ato de emprestar um livro a um amigo, torna-se
uma tarefa um pouco complicada de ser realizada quando
tratamos de livros digitais.
Capa
Sumário
de segurança, impossibilitando a cópia ilimitada de um
eBook, também faz todo o trabalho de porcentagem para
terceiros e de quantificação do número de cópias vendidas. Essas DRM’s são facilmente “quebradas” por hackers,
inclusive nos formatos de eBooks que possuem sistemas
de DRM mais modernos e seguros, como o Mobi e o ePub.
Vendo-se ameaçadas a perderem grande parte de
seus lucros, as editoras restringem ao máximo a liberdade do leitor com o livro digital. O ePub foi criado com a
intenção de tornar-se um formato universal para eBooks,
entretanto, cada editora busca usar um formato diferente
e limitar a leitura destes arquivos em um software específico criada por ela mesma. Hoje encontramos o Saraiva Reader, Amazon Reader e alguns outros. Essa falta de
convergência acaba bloqueando naturalmente o interesse
dos consumidores de adquirir um livro digital.
Apesar de termos o caso da Amazon como um
exemplo de sucesso na venda de eBooks, faturando milhões nas vendas de livros eletrônicos – hoje superior a
venda de livros impressos -, o sucesso talvez não seja
fruto do interesse dos leitores pelo livro digital em si. Lemos (2010) afirma que o fetiche do papel migra para o
fetiche do dispositivo, como os Tablets e os e-readers e
DRM, ou Digital Rights Management, são tecnologias para controlar
a distribuição e a visualização de conteúdos digitais
6
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
talvez esteja aí uma das razões para o relativo sucesso
deste mercado. Outro fator que influencia no sucesso da
Amazon, é a grande quantidade de livros digitais a venda
para serem lidos no Kindle: mais de um milhão.
Os eBooks já são populares nos Estados Unidos e
em alguns países da Europa, enquanto que no Brasil este
mercado ainda está dando os primeiros passos, pois o
mercado brasileiro ainda não oferece uma plataforma eficiente e segura que dê suporte e variedade de livros digitais que atraia os consumidores – como acontece com
o Kindle nos EUA -, além de não possuir no mercado um
leitor (e-reader) com bom custo benefício.
No cenário atual, encontramos diversos modelos de
negócios para o mercado dos livros digitais, porém, apenas a Amazon têm obtido êxito, ao mesmo tempo em que
muitas outras editoras e livrarias ainda não conseguiram
emplacar neste mercado, sobretudo no Brasil.
O Kindle pode ser encontrado em quatro versões:
Kindle, com WI-FI, tela de 6 polegadas e manuseio através de botões; Kindle Touch, com tela de 6 polegadas
e que também está disponível com conexão 3G, além
de WI-FI e manuseio a partir de toque na tela; Kindle Keyboard, com configurações semelhantes ao Kindle
Touch, mas que também vem com um teclado físico,
que permite ao leitor fazer anotações e escreve mais
rapidamente; e o Kindle DX, similar ao Kindle Keyboard,
mas com tela de 9,7 polegadas. Recentemente a Ama-
Amazon: um modelo de sucesso
zon lançou o Kindle Fire, mas este caracteriza como um
A partir de uma análise do modelo de negócio da
Amazon, compreendemos porque esta empresa vem faturando cada vez mais: ela oferece suporte a escritores
e leitores, além de disponibilizar para venda uma grande
variedade de livros. Aqui no Brasil, são poucos os livros
que saem em formato digital e impresso.
Na Amazon você pode comprar o e-reader Kindle a
partir de 79 dólares. O aparelho já vem com WI-FI, permi-
Capa
tindo conexão sem fio com a internet aos usuários. Através desta conexão, é possível acessar a loja virtual, que
disponibiliza mais de um milhão de títulos para compra,
grande parte com preço até 10 dólares. O leitor pode baixar gratuitamente um trecho do livro para degustação e
decidir se efetuará a compra ou não. Após a confirmação
da compra, o download do livro é realizado e em poucos
segundos já é possível ler o livro.
Sumário
Tablet e não como um e-reader.
O Kindle possui uma tela com tecnologia e-ink,
também conhecido como “papel eletrônico” ou “tinta
eletrônica”, que é é uma tecnologia que mimetiza o papel impresso em um display, o que permite uma leitura
agradável e sem reflexos da luz, como acontece em telas de LED, LCD e Plasma.
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
Recentemente, a empresa norte-americana confirmou a abertura de suas atividades no Brasil para o
dia 1 de setembro deste ano, vendendo Cd’s, DVD’s,
livros impressos, games, softwares e o Kindle e, dependendo dos resultados obtidos na vendas dos primeiros
três meses, venderão também eletrônicos em 2013. A
chegada da Amazon ao Brasil pode ser um divisor de
águas para o mercado de livros digitais, que até agora
mostrou resultados pouco expressivos.
Figura 1: Um dos modelos do Kindle vendido no site na Amazon.
eBooks no Brasil: um mercado que não empolga
Fonte: http://www.amazon.com/gp/product/B0051QVESA/
ref=famstripe_k
Entretanto, há limitações: os eBooks comprados na
Amazon podem ser lidos apenas no Kindle ou em um software específico e não podem ser compartilhados.
A Amazon também pensou nos escritores independentes e permite que qualquer pessoa coloque seu
livro a venda e ainda promova-o, sob algumas condições.
Basta efetuar um cadastro no Amazon’s Kindle Direct Publishing7, formatar o eBook, enviar e pronto.
https://kdp.amazon.com/self-publishing/signin?ie=UTF8&ld=AZK
indleMakeM - Acesso em 22/03/2012
Podemos apontar diversos fatores como causas para
o fraco desempenho das vendas de livros digitais no Brasil, como o reduzido número de livros digitais colocados
a venda, deixando o leitor com poucas opções, o elevado
preço dos eBooks, quase sempre próximo ao valor do livro
impresso, a ausência de um e-reader com bom custo-benefício e as limitações impostas pelas editoras e livrarias
aos livros digitais.
No mercado brasileiro, é desvantajoso para o consumidor comprar um e-reader. O Cool-er, comercializado
pela Gato Sabido8, sai em média por R$800,00 e o Alfa, da
Positivo, por R$700,00. O preço assusta os consumidores,
que acabam preferindo adquir um Tablet, que custa um
pouco mais, porém conta com muito mais recursos. O problema é que com um e-reader, o consumidor consegue se
7
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Sumário
8
www.gatosabido.com.br - Acesso em: 22/03/2012
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
voltar mais para a leitura, pois o aparelho se limita a isto
e a uma simples navegação monocromática pela internet,
enquanto que o Tablet conta com diversos aplicativos, games e funções, além de uma tela colorida. Todos esses elementos distraem o usuário e este perde o foco pela leitura.
Algumas das grandes livrarias nacionais já vendem
– mesmo que timidamente – livros digitais: a Saraiva, a
Leitura, além da Gato Sabido, pioneira no Brasil e o gigante do e-commerce Submarino, que recentemente lançou
um aplicativo para leitura de eBooks que opera também
como uma Rede Social e que veremos mais a frente.
Também está no mercado o IBA, lançado pela editora Abril e que é dedicado para a venda das versões digitais interativas de suas revistas, como a Veja, Super
Interessante, VIP e muitas outras, além de livros literários
e jornais de todo Brasil.
O IBA, a Saraiva e o Submarino lançaram aplicativos para a leitura de seus eBooks, enquanto que a Gato
Sabido e a Leitura permitem que as obras digitais adquiridas em suas lojas possam ser lidas com o Adobe Digital
Editions, leitor de eBooks da Adobe, no qual o usuário
efetua o login e tem acesso a sua “biblioteca”.
O brasileiro se vê diante de muitas opções de livrarias digitais para adquirir seu eBook, mas o número limitado de livros disponíveis, o preço ainda elevado tanto das
obras quanto dos leitores dedicados (e-readers), o livro
digital ainda parece inviável para a nossa realidade.
Capa
Sumário
As limitações impostas pelas vendedoras de
eBooks no Brasil são semelhantes as praticadas pela
Amazon. A diferença é que na Amazon os leitores têm
variedade, suporte e preços acessíveis, que tornam o
livro digital bastante compensável.
É compreensível que as editoras tomem certos cuidados diante das ameaças de pirataria, porém o mercado
brasileiro mostra-se ainda um pouco temeroso com um
mercado que teria tudo pra crescer e gerar grandes lucros.
O livro digital não dá custo para impressão e transporte,
portanto, não há uma explicação lógica para que os preços do livro impresso e o livro digital sejam tão próximos.
Temos à frente um entrave gerado pelas artimanhas do mercado editorial digital: se por um lado temos
as livrarias e editoras se protegendo contra a pirataria, e
bloqueando o máximo possível a liberdade do leitor com
seu livro digital, do outro temos os autores que precisam
divulgar seu material, mantendo a histórica função do livro como um meio de difusão da informação e do conhecimento, e que precisa ser compartilhada.
Conclusão
O livro ganhou novos suportes e formatos de publicação consequentes do avanço tecnológico característico
da era da cibercultura. Essas transformações mudaram o
mercado editorial de alguns países e a perspectiva é que
esse processo se expanda. Muito tem se discutido sobre
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
o livro digital e os rumos que o mercado editorial pode
tomar, principalmente no que se diz respeito aos livros
impressos e seu futuro.
É fato que o livro digital vem ganhando espaço no
mercado, assim como também é fato que o livro impresso ainda detém a maior fatia de participação no mercado
e que essa realidade não deve mudar, pelos menos por
algum tempo. O que temos agora são diferentes opções
para publicação de livros que procuram atender às necessidades de acordo com o perfil de cada leitor.
No Brasil, o livro digital ainda não ganhou notoriedade por diversas razões, tais como a pequena variedade
de livros digitais disponíveis a venda e o alto preço dos
e-Readers vendidos no país, como o Alfa, do Grupo Positivo e o Cool-er, importado pela Gato Sabido, pioneira na
venda de eBooks no Brasil, além das limitações impostas
pelas livrarias e editoras.
Muitas dessas “artimanhas” praticadas pela livrarias
e editoras, como a proteção dos livros digitais por DRM’s,
são conseqüências das ameaças que a pirataria digital oferece, podendo gerar grandes prejuízos ao mercado. Porém,
embora essa atitude seja válida do ponto de vista mercadológico – apesar de em muitos casos ter-se mostrado
ineficiente - deparamo-nos com um paradoxo: de um lado
temos a subsistência das editoras e livrarias - mas estas só
publicam o que lhes interessam; de outro, a possibilidade
de todo e qualquer autor publicar sua obra por conta própria, no processo natural de difusão do conhecimento. Por-
Capa
Sumário
tanto, diante deste entrave, faz-se necessário a criação de
um novo modelo que contemple as necessidades de todos
sem prejudicar o autor, a editora ou leitor.
Referências
JAGUARIBE, Hélio. O significado do papel para a cultura. In:
DOCTORS, M. (Org.); A cultura do papel. Rio de Janeiro:
Casa da Palavra, 1999.
LEMOS, André. Livro e mídia digital. Disponível em: http://
andrelemos.info/2011/10/flica/ Acesso em: 02/04/2012
LÉVY, Pierre. O que é virtual. São Paulo: Ed. 34, 1996.
MCLUHAN, Marshall. A galáxia de Gutenberg: a formação
do homem tipográfico. São Paulo: Editora Nacional, Editora da
USP, 1972.
PROCÓPIO, Ednei. O livro na era digital: o mercado editorial
e as mídias digitais. São Paulo: Giz Editorial, 2010.
Sites
www.amazon.com
www.iba.com.br
www.submarino.com.br
www.gatosabido.com.br
www.simplissimo.com.br
www.positivoalfa.com.br
eLivre
101
O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
O LIVRO DIGITAL E AS NOVAS NECESSIDADES
DE PRODUÇÃO E LEITURA1
Fabrícia GUEDES2
Marriett ALBUQUERQUE3
Filipe ALMEIDA4
Palavras-chave: Livro impresso. Livro digital. Produção
editorial. Leitura.
Resumo
Inseridos na sociedade em rede e envolvidos pela tecnologia do digital, vimos surgir uma era de convergência
responsável por grandes transformações midiáticas. Entre
Trabalho apresentado no IJ06 – Interfaces Comunicacionais do XV
Congresso de Ciências da Comunicação na Região Nordeste realizado
de 12 a 14 de junho de 2013.
2
Graduanda no curso de Comunicação em Mídias Digitais da UFPB.
Bolsista do Programa de Iniciação Científica (PIVIC) da UFPB/CNPq.
Integrante do Projeto Para Ler o Digital. Email: fabriciakguedes@
gmail.com
3
Graduanda no curso de Comunicação em Mídias Digitais da UFPB.
Bolsista do Programa de Iniciação Científica (PIBIC) da UFPB/CNPq.
Integrante do Projeto Para Ler o Digital. Email: kmd.albuquerque@
gmail.com
4
Mestrando no Programa de Pós-Graduação em Comunicação (PPGC/
UFPB). Integrante do Grupo de Pesquisa em Processos e Linguagens
Midiáticas - Gmid/PPGC e do Projeto Para Ler o Digital. Email: [email protected]
1
Capa
elas, o advento do livro digital, uma nova forma de produzir, difundir e ler livros, diferente do processo que conhecemos há mais de 500 anos, com a cultura do impresso. Produzidos em formatos chamados de eBook, o livro
digital, longe de querer substituir o livro impresso, vem,
antes de tudo, para suprir e atender novas necessidades
e usos de uma sociedade que tem na internet seu novo
ambiente de interação e democratização do conhecimento. Portanto, diante das mudanças editoriais que nos arrebatam, queremos saber que necessidades nos movem à
produção e leitura desse atual formado de livro.
Sumário
Introdução
O livro tem como características básicas, o fato de
ser um suporte manual de conteúdos, passível de ser
transportado e lido, página a página pelo seu usuário, permitindo destaques e anotações em trechos, para posterior
uso. E tem sido assim durante mais de quinhentos anos,
desde que Johannes Gutenberg criou a prensa tipográfica
para reprodução mecânica de textos. Embora tenha se originado do códice, com seu ajuntamento de páginas presas
pelo dorso há mais de dois mil anos, é com os recursos de
impressão que o livro ganha produção em série e permite
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
a criação da figura do leitor. De acordo com Parry (2012, p.
59), o livro teve uma trajetória extraordinária:
Originalmente uma maneira de registrar tanto os poemas épicos da mitologia grega quanto os pertences dos
ricos, apresentava-se sob uma forma que mal seria reconhecível hoje. Tornou-se objeto de veneração cristã,
ao alcance apenas de uma elite, para depois converter-se no primeiro meio de comunicação de massas, tendo
por muito tempo preponderado em relação aos demais.
Como principal dispositivo humano de comunicação por
dois milênios, deu origem a um imenso leque de gêneros
que revelaram notável capacidade de resistência perante
os jornais, a radiodifusão e a Web.
Porém, estamos vivenciando uma época de surpreendente desenvolvimento de tecnologias digitais,
que afetam todos os meios de comunicação tradicionais,
entre eles, o livro, objeto de nosso estudo. Trata-se de
transformações estruturais movidas, não apenas por novos modelos de negócio ou por inovações tecnológicas,
mas, principalmente pelo surgimento de novas necessidades e usos para os livros, frente a uma sociedade de
informação que tem a comunicação em rede como seu
grande processo de funcionamento.
De volume impresso, o livro passou para uma tela
digital em um artefato tecnológico cuja grande vantagem
é permitir o armazenamento, não mais de uma, mas de
centenas de obras. As exigências de uma vida corrida e
dinâmica impõem modos de leituras fragmentadas, em
Capa
Sumário
qualquer hora e lugar. E não há como dar conta da atualização de conteúdos tão diversificados se não for pelo
sistema de formatos em eBooks e que se disponibilizam
por computadores, tablets e smartphones.
O objetivo do presente artigo, portanto, é traçar
uma trajetória do livro, mediante sua elaboração e funcionalidade, no sentido de compreender como estão se
instaurando as novas necessidades e usos de produção e
leitura no contexto das tecnologias digitais. Procuramos
compreender como está se comportando o mercado editorial, as resistências ao novo suporte tecnológico, bem
como as emergências pessoais e profissionais que o livro
digital está atendendo.
Contexto histórico: sobre os usos do livro
O valor histórico e social do livro físico é incalculável. Hoje, é impossível imaginar um mundo onde ele não
exista. É através do impresso que a humanidade registra
suas memórias e difunde as experiências, ideias e o conhecimento construído através dos séculos.
Utilizado, a princípio, como meio de documentação
e registro pelas antigas civilizações, por meio de tabuletas
de argila, o artefato que hoje conhecemos como livro, lentamente percorreu o caminho até a popularização do ato
de leitura. O invento do sistema fonético, pelos gregos da
antiguidade, permitiu o desenvolvimento das narrativas
que, em quantidade foram sendo transcritas em papiros e
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105
O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
pergaminhos, dando origem, então, ao livro-rolo, conhecido como volumen.
Entre várias plataformas, o códice é o que mais se assemelha ao padrão conhecido de livro que tradicionalmente
se consagrou. Com ele, a transcrição de textos começava
a ganhar dinamicidade e os volumes, maior mobilidade,
podendo ser transportados e acessados com facilidade. Por
muito tempo, este formato foi utilizado pelo Cristianismo,
oportunidade em que surgiu a necessidade de disseminação de seus ensinamentos para além da fala. A religião
tornava-se difusor desse veículo. (GHAZIRI, 2009).
Assim, aos poucos era configurado o formato de livro que conhecemos hoje, com folhas de papel encadernadas e protegidas por capas. Um avanço fundamental,
neste sentido, foi o surgimento da prensa e depois dos
tipos móveis. O livro, sempre escrito à mão, começava a
ser impresso e reproduzido em série, passando a ser cada
vez mais portátil, popular e acessível. Deixava a restrição
dos mosteiros e das bibliotecas, nas quais se concentravam de forma volumosa e pesada.
Esses novos fatores possibilitaram condições para o
surgimento da ideia de leitor. O livro, aos poucos, tornava-se um produto disponível ao público consumidor.
A multiplicação dos livros é garantida, primeiro, pela
invenção de Gutenberg, segundo, no século XIX, pela
industrialização da atividade gráfica e, enfim, no século
XX, pela multiplicação das tiragens graças aos livros
de bolso. Diante dessa multiplicação, há aqueles que
Capa
Sumário
estão em condições de dominá-la porque sua cultura e
os instrumentos que ela construiu permitem orientar-se
racionalmente nesse mundo prolífico, e aqueles que,
completamente desarmados diante desta profusão, fazem as más escolhas e são como que asfixiados ou afogados pela produção escrita. (CHARTIER, 1998, p.110)
O pensamento de que a produção em escala de livros foi bem aceita desde o princípio é equivocada. Assim
como o livro eletrônico é rejeitado pelos leitores tradicionais, o livro também sofreu restrições quando começou a
ser disseminado na forma impressa, pois causava perturbações na ordem social da época.
O eletrônico aliado ao impresso
Com a recente popularização dos livros eletrônicos, também chamados de eBooks, surge o receio de
que este venha a substituir a tradição do impresso por
completo. Esta questão vem incomodando os amantes
do livro e fazendo com que grande parte deles crie certo preconceito, recusando o formato digital como livro.
Mas, para um artefato tecnológico deixar de existir é
necessário que, primeiro, perca-se o interesse nele. E
o livro impresso dificilmente perderá seu valor, sempre
terá seu fiel público leitor, interessado na imersão da
leitura de suas páginas.
Da mesma forma que o livro digital traz praticidade para a vida moderna, o impresso também continuará
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
se fazendo necessário e por muitas vezes mais adequado em determinadas situações, pois configura outro perfil
de leitura. A questão é que os eBooks e livros físicos são
produtos distintos, apresentados em mídia e formato diferentes; são lidos de formas diferentes e atendem a variados interesses. Mesmo para os que já nasceram no contexto digital, os chamados cibernativos, é importante que
tenham a experiência do impresso, dada a abstração de
pensamento que este permite. Sobre isso, Logan (2012,
p.220) traz uma reflexão oportuna em sua recente obra:
[...] a leitura em uma tela, não importa quão boa seja a
resolução, é uma atividade complicada. O lado direito do
cérebro converte os pixels em letras e o lado esquerdo do
cérebro converte as letras em palavras e frases. Há uma
grande quantidade de tráfego através do corpo caloso.
Portanto, não há como dizer que um formato ocupará o espaço do outro. Ao contrário, os livros eletrônicos
vêm para agregar ou suprir necessidades da vida moderna. Digital e impresso quase se completam, proporcionando ao leitor um leque maior de opções e facilidades,
de acordo com seus interesses pessoais.
Mas qual a diferença entre livro físico e digital?
Segundo Machado (1994, apud PAULINO, 2009, p.3) o
livro impresso é “todo e qualquer dispositivo através
do qual uma civilização grava, fixa, memoriza para si e
para a posteridade o conjunto de seus conhecimentos,
de suas descobertas, de seus sistemas de crenças e os
Capa
Sumário
vôos de sua imaginação”. Partindo desta definição, este
autor faz a seguinte reflexão:
O livro, então, pode ser entendido como o veículo ou
suporte, tangível ou não, de um conjunto específico de
dados, informações ou conhecimentos. O livro eletrônico
seria justamente o veículo eletrônico de um conjunto específico de dados, informações ou conhecimentos. Atente-se para o fato de que o Dicionário Aurélio já consigna
a expressão “livro eletrônico” como sendo “versão de um
livro publicada em mídia digital, como, p. ex., CDROM”.
(PAULINO, 2009, p.4)
Essa diferença de produto é real. E as pessoas, aos
poucos, acostumam-se e percebem a importância do novo
formato, não só pelo aspecto da portabilidade e da tecnologia, mas, pela democratização do acesso ao conhecimento.
Contexto atual
O número de brasileiros que lê livros digitais cresce a cada dia. No final do ano passado, esse número já
ultrapassava nove milhões de leitores5. Com a chegada
da Amazon.com ao Brasil, maior varejista de eBooks do
mundo, o país definitivamente entrou no mercado dos livros digitais. O setor, que está consolidado lá fora, vinha
engatinhando a cerca de dois anos por aqui.
Disponível em: http://olhardigital.uol.com.br/produtos/central_
de_videos/tablets-vs-e-readers-saiba-mais-das-diferencas-entre-os-dois-tipos-de-aparelho. Acesso em: 22/04/2013.
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
Conhecida por suas promoções e preços baixos,
a Amazon causou rebuliços ao chegar no Brasil. Porém,
esses descontos não chegaram por aqui. A diferença de
preços entre os eBooks e os impressos ainda é pequena
aqui no país, diferentemente dos Estados Unidos. Os e-readers, leitores de livros digitais, ainda estão caros no
mercado brasileiro, comparado ao americano. O dispositivo de leitura digital Amazon Kindle 4 custa R$299,00
no Brasil, nos Estados Unidos o mesmo dispositivo custa
R$180,00. O Kobo Touch está sendo vendido no Brasil por
R$399,00 e nos Estados Unidos por R$190,006.
A entrada dessas empresas mudou o cenário das
vendas de eBooks no Brasil, instaurando a concorrência
entre as lojas brasileiras, Saraiva e Cultura, e as gigantes internacionais, Amazon, Apple e GooglePlay. Com
essa disputa, o aperfeiçoamento dos dispositivos, tanto
dos aparelhos quanto dos preços mais acessíveis, deverá acontecer em pouco tempo. Além disso, o consumidor
passou a ter mais facilidade para comprar eBooks e acesso a uma lista extensa de obras.
Resistência aos ebooks
O nascimento do livro digital é movido por um mercado editorial ávido por explorar o oportunismo das novas
tecnologias digitais com ambientes de grande presença
Disponível em: http://www.ebookbr.com/2013/03/os-e-readers-venda-no-brasil.html. Acesso em: 22/04/2013.
6
Capa
Sumário
de usuários. O livro eletrônico surge a partir dos recursos
tecnológicos aliados à necessidade de nova forma de leitura por meio de dispositivos diferentes, da portabilidade,
da interatividade. A expansão dos eBooks está cada vez
maior devido a essa adequação dos livros digitas às necessidades da sociedade em rede. Essa expansão é comprovada com o comunicado da Amazon ao anunciar recentemente que a venda de eBooks cresceu cerca de 70%
no ano de 20127.
Apesar de todo esse crescimento no mercado, os
eBooks ainda não se firmaram como meio de acesso a
leitura. Estudos apontam que os estudantes ainda têm resistência aos livros digitais. A Escola de Administração Ted
Rogers, da Universidade de Ryerson, no Canadá, divulgou
uma pesquisa na qual os universitários dizem preferir o
livro impresso ao digital8.
Foram entrevistados 386 estudantes que passaram a usar textos em formato digital nas aulas. Esses
universitários foram questionados sobre as facilidades
e dificuldades do digital e demonstraram preferência ao
modo tradicional de leitura, o impresso. Os alunos apontaram a dificuldade de concentração como uma problemática, assim como a impossibilidade de fazer anotações e esboços no eBooks. Porém esse recurso existe
aos livros digitais. É possível fazer essas anotações em
Disponível em: http://revolucaoebook.com.br/amazon-vende-70mais-ebooks-apenas-ano/. Acesso em: 20/04/2013.
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Disponível em: http://revolucaoebook.com.br/universitarios-resistem-adocao-ebooks/. Acesso em: 19/04/2013.
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
PDFs ou em aplicativos de tablets e smartphones. Esse
estudo aponta as dificuldades dos alunos em lidar com
a tecnologia do eBook.
Dispositivos de leitura digital, como o tablet, ainda enfrentam resistência dos leitores. Sua tela dificulta
a leitura porque possui a luminosidade semelhante à de
um computador comum, o que deixa uma sensação de
cansaço com o tempo de uso. Além disso, a leitura também é prejudicada em ambientes de grande luminosidade, como sob a luz do Sol, o que exige aumento de brilho
no dispositivo. A tela ainda é responsável por boa parte do
consumo de energia do dispositivo, pois precisa ser atualizada continuamente para manter a exibição das páginas
do livro. A duração da bateria, cerca de 10 horas, é considerada curta para os que usam tablets com o objetivo de
leitura. Carregar a bateria diariamente não é satisfatório
para esses leitores.
Além de ter que enfrentar a inexperiência do usuário, um grande desafio dos eBooks é explorar os recursos
multimídias (áudio, vídeo, animação, etc.) e interação,
para, assim, quebrar de vez a resistência dos estudantes
universitários ou de qualquer outro leitor. Os livros eletrônicos vieram para suprir e adicionar as necessidades
que o impresso não pode atender. O impresso e o digital
coexistem para o leitor, não há pretensão de um eliminar
a existência do outro.
Capa
Sumário
Novos usos do livro digital
Aqui, passamos a mostrar os novos usos e necessidades do livro digital, situações estas que, em determinados casos promovem um distanciamento entre o impresso
e o eletrônico, em outros, acabam por aproximar bastante
as duas versões. Conforme postula Darton (2010), podemos pensar o livro digital como suplemento ao impresso:
O mundo do saber vem mudando tão rapidamente que
ninguém consegue prever como estará daqui a dez
anos. Acredito, porém, que continuará dentro dos limites da galáxia de Gutenberg – ainda que essa galáxia
vá se expandir graças a uma nova fonte de energia, o
livro eletrônico, que servirá como suplemento, e não
substituto, da grande máquina de Gutenberg. (DARNTON, 2010, p.95).
Não se trata de substituir o impresso pelo digital,
acreditamos na convivência entre os dois modelos, já que
eles suprem necessidades diferentes e o livro eletrônico
apresenta novos usos que, combinados, geram uma nova
experiência ao leitor.
Com o livro digital, é possível reunir e consultar centenas de obras em um único dispositivo. Geralmente mais
leve e mais fino que um livro impresso, o livro eletrônico
necessita de menos espaço físico para armazenar e transportar o acervo. Para Darton (2010), essa característica
do eBook é essencial para as bibliotecas de pesquisa, já
que não será mais preciso estocar grandes quantidades
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
de obras impressas, além de facilitar o processo de busca
para o usuário.
O recurso de busca do livro digital facilita a organização de leituras rápidas, com foco em exames, concursos ou palestras. Quando não há muito tempo para
a leitura, pode-se realizar buscas por assuntos ou até
mesmo por palavras-chave que remetam ao conteúdo
procurado.
Para quem lida com obras novas e antigas, os livros digitais impedem que a degradação das folhas ou
o odor de mofo nas páginas seja um empecilho para a
leitura. Muitos leitores e pesquisadores não podem estar
em ambientes que reúnem obras empoeiradas, assim,
os eBooks proporcionam uma leitura ou estudo em melhores condições, com possibilidade de armazenamento,
sem perdas e restrições.
Do mesmo modo como ocorre na versão impressa,
o livro eletrônico também possibilita a inserção de fichamentos, anotações e marcações. Segundo Ghaziri (2009,
p.69), “os comportamentos diante da tela, apesar de parecerem novos, carregam traços do suporte anterior, o
impresso”. Como a versão é digital, o usuário também
pode editar, deletar e até exportar as anotações e compartilhá-las com outras pessoas.
Passamos a vivenciar uma democratização da informação, já que a difusão do conhecimento se dá de forma gratuita e inclusiva. É possível produzir uma obra e
difundi-la sem custos, compartilhar livros de outros auto-
Capa
Sumário
res que porventura não estejam no circuito das editoras,
inclusive com comentários e opiniões a respeito do livro
ou trechos específicos do mesmo.
Obras antigas, que jamais poderiam ser examinadas por grande parte da sociedade, agora podem ser exibidas, em trechos ou capítulos. Observamos, assim, um
favorecimento ao uso coletivo, pois professores e palestrantes podem projetar o conteúdo de um livro sem que o
mesmo esteja no local da apresentação.
O eBook pode ser visualizado em diferentes dispositivos portáteis, como o notebook, smartphone e tablet.
Cada aparato tecnológico possui algumas especificidades,
como o tamanho e o tipo de tela, além da capacidade de
processamento e armazenamento.
Encontramos, também, diferentes formas de intervenção na obra, a partir da utilização de variados aplicativos para diferentes fins. Softwares que reconhecem
arquivos PDF e ePub nos permitem fazer anotações e
marcações; já os editores de texto, como o Microsoft
Word, fazem com que o usuário possa reescrever trechos
da mesma obra.
Observamos diversos formatos de conteúdo (textual, imagético, sonoro), além da visualização de vários gêneros (obras, quadrinhos, filmes, revistas). Lévy (1999,
p.96), destaca alguns destes formatos a partir da utilização do livro digital: “posso não apenas ler um livro, navegar em um hipertexto, olhar uma série de imagens, ver
um vídeo, interagir com uma simulação, ouvir uma músi-
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
ca gravada em memória distante, mas também, alimentar
essa memória com textos, imagens etc.”.
Na medida em que fazemos intervenções nas obras,
anotando e criando códigos de cores, formas e traços, estamos criando novos padrões de linguagem que ajudam
a repassar impressões, dicas e opiniões. Sempre estamos
criando novas maneiras de intervenções, por meio da inclusão de cores ou traços, para realçar determinado trecho relevante, ou por meio de formas e emoticons, para
demonstrar a importância de algum tema, sem precisar
repetir sempre o mesmo texto.
De modo geral, o livro digital pode ser lido em dois
tipos de telas, uma que utiliza a reflexão da iluminação do
ambiente, e outra, que emite luz. As telas reflexivas são
produzidas com a tecnologia E Ink, um papel eletrônico
capaz de simular com perfeição a legibilidade do papel
convencional. As telas que funcionam a partir da emissão
de luz, usualmente de LCD ou LED, estão presentes nos
monitores de computadores e notebooks, smartphones e
tablets. Os dispositivos que utilizam telas emissivas possibilitam, a partir do uso de bateria, a leitura em lugares
escuros ou desprovidos de energia.
Alguns dispositivos, como o Kindle, da Amazon, possuem dicionários embutidos, capazes de realizar uma pesquisa instantânea pelo conteúdo do livro. Já o iPad, da Apple, a
partir do aplicativo iBooks, permite que o leitor consulte informações pertinentes com a integração de serviços de busca
(Google e Wikipédia) por meio de uma conexão com internet.
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Sumário
Os custos de produção e comercialização são reduzidos drasticamente, uma vez que o próprio autor torna-se capaz de editar e diagramar o livro, a partir de softwares com interfaces cada vez mais amigáveis. Não é
mais preciso financiar a impressão, qualquer autor pode
comercializar seu livro digital no valor que achar conveniente ou compartilhá-lo por meio de grandes empresas,
a exemplo da Amazon e da Apple, que cobram apenas
uma porcentagem por livro vendido.
Conclusão
O livro impresso existe há mais de 500 anos. Desde
seu aparecimento vem agregando e cumprindo funções a
fim de atender às necessidades que surgem com a evolução do estilo de vida das sociedades, tais como entreter,
educar, informar, disseminar conhecimento etc.
Nos últimos anos, entretanto, são significativas as
transformações pelas quais os livros vêm passando. O
surgimento do formato eletrônico acarretou inúmeros investimentos no desenvolvimento, não só dos modelos de
eBooks, mas de suas plataformas de leitura, como tablets,
e-readers e smatphones.
Todas essas mudanças devem-se ao surgimento
dessas novas necessidades de uso para o livro. Elas demonstram a importância do digital e garantem ao leitor
que opta por este formato, portabilidade e flexibilidade
tão necessárias nos dias atuais.
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
Essa nova forma de lidar com o livro não chegou
ao fim, ela deve continuar se estendendo à medida que
novas necessidades de uso, além das observadas neste
artigo, surjam, de forma a tornar cada vez mais prática a
relação dos usuários de livro eletrônico.
Porém, o importante é que entramos em uma era de
democratização do conhecimento, em que a produção, a
difusão e o acesso ao saber estão cada vez mais disponíveis, em um processo irreversível. Do mesmo modo que
os celulares estão chegando ao alcance das classes mais
pobres, os conteúdos midiáticos também, afinal o próprio
celular é fonte de acesso a esses conteúdos, inclusive no
formato ePub, o livro digital próprio para este aparato tecnológico pessoal.
Nesse contexto, tanto a permanência do livro impresso proveniente do mercado editorial, quanto a ampliação de uso do livro digital somarão forças para que
o desenvolvimento social e cultural esteja ao alcance de
toda a sociedade. Afinal, conforme diz Parry (2012, p.
60): “Como tipo de mídia, o livro encontra-se em excelente forma, e vai escrevendo um novo capítulo de sua
história nesta era dos meios de comunicação digital”.
GHAZIRI, Samir. A leitura na tela do computador. São Paulo: Baraúna, 2009.
LÉVY, Pierre. Cibercultura. São Paulo: Ed. 34, 1999.
LOGAN, Robert. Que é Informação? A propagação na biosfera, na simbolosfera, na tecnosfera e na econosfera. Rio de
Janeiro: Editora Contraponto - PUC/Rio, 2012.
PARRY, Roger. A ascensão da mídia: a história dos meios de
comunicação de Gilgamesh ao Google. Rio de Janeiro: Elsevier,
2012.
PAULINO, Suzana Ferreira. Livro tradicional x Livro eletrônico:
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Hipertextus. n° 3, junho, 2009. Disponível em: http://www.
hipertextus.net/volume3/Suzana-Ferreira-PAULINO.pdf. Acesso em: 10/04/2013.
Referências
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DARNTON, Robert. A questão dos livros: passado, presente e
futuro. São Paulo: Companhia das Letras, 2010.
Capa
Sumário
eLivre
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
nosso objetivo é apresentar e discorrer sobre as causas
que têm impedido o crescimento das vendas de eBooks e
eReaders no Brasil.
LIVROS DIGITAIS NO BRASIL:
ANALISANDO AS CAUSAS DO INSUCESSO1
Palavras-chave: Ebooks. Livros digitais. Mercado editorial. Causas do insucesso.
Rennam VIRGINIO2
Introdução
Resumo
Desde o surgimento da prensa de Gutenberg até os dias
atuais o livro passou por diversas transformações. Mas,
nenhuma tão significativa como as recentes mudanças.
Com o advento das tecnologias digitais, um novo formato
de livro é produzido e comercializado: o eBook, também
conhecido como livro digital. Este artigo busca apresentar
um breve levantamento da situação atual do mercado de
eBooks no mundo e no Brasil, uma vez que, até o momento, não alcançou os resultados esperados, mesmo após a
chegada de gigantes do ramo no último ano, como a Amazon, o Google Books e a Kobo. Diante desta problemática,
Trabalho apresentado no IJ 5 – Rádio, TV e Internet do XV Congresso de Ciências da Comunicação na Região Nordeste realizado de 12 a
14 de junho de 2013.
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Graduando em Comunicação em Mídias Digitais pela Universidade
Federal da Paraíba. Bolsista do Programa de Iniciação Científica (PIBIC/UFPB) pelo projeto Para Ler o Digital. Email: virginiorennam@
gmail.com
1
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Sumário
Na segunda metade do século XV, uma invenção mudou os rumos dos livros na história: a prensa de Gutenberg. Com esta criação do alemão que dá nome ao invento,
tornou-se possível a impressão e a produção em grande de
escala de livros impressos, criando a categoria de leitor e
permitindo a circulação obras na Europa e no mundo.
McLuhan (1972, p.176) reforça tal importância,
afirmando que a prensa “confirmou e estendeu a nova
tendência visual do conhecimento aplicado, dando origem ao primeiro bem de comércio uniformemente reproduzível, à primeira linha de montagem e à primeira
produção em série.”
A máquina criada por Gutenberg, na realidade não
foi uma “invenção”, ou algo inédito, e sim, o aperfeiçoamento da técnica de impressão. Deste modo, não podemos
afirmar que a prensa de Gutenberg é uma criação, e sim
uma inovação, sendo esta a introdução de tipos móveis
metálicos, que poderiam ser reutilizados e recombinados
eLivre
121
O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
várias vezes, possibilitando uma grande quantidade de cópias a partir de uma única matriz - o que até então não era
possível, pois as matrizes eram de madeira e com os tipos
fixos, provocando o rápido desgaste das tábuas.
Antes da prensa de Gutenberg, os livros eram manuscritos, o que limitava o número de exemplares, tornando a leitura um hábito caro e restrito aos mais nobres e ao
clero, como afirma DeFleur e Ball-Rokeach (1993, p.37):
(...) O número de livros disponíveis ficava severamente
restrito e só podiam ser adquiridos por pessoas de consideráveis recursos. A impressão trouxe uma modificação fantástica. Centenas ou mesmo milhares de cópias
de um determinado livro podiam ser reproduzidas com
grande precisão. Foi uma invenção fabulosa que espantou o mundo alfabetizado da época.
bém comercial, com um lucrativo mercado. Entretanto,
atualmente o livro impresso não é mais o único suporte
oferecido quando se trata de leitura. Junto com os livros
impressos, o mercado também oferece hoje os eBooks
(do inglês “eletronic book”, livro eletrônico), mais conhecido no Brasil como livro digital.
Horie (2011, p.15) define o eBook como “uma versão digital de um livro que pode ser lido em computadores
ou em aparelhos portáteis”. Os livros digitais geralmente
são lidos em dispositivos portáteis como tablets e eReaders, aparelhos produzidos especificamente para a leitura
de eBooks e que possui a tecnologia E-Ink, ou tinta eletrônica, um tipo de tela anti-reflexiva que mimetiza com o
papel e possibilita uma leitura mais confortável e similar a
do livro impresso. Geralmente, os livros digitais são pro-
O livro, antes mesmo da prensa de Gutenberg, já
duzidos nos formatos ePub ou PDF.
havia passado por transformações, não só em seu modo
Na Europa Ocidental e, principalmente nos EUA,
de produção, mas também em seu formato e sua matéria-
os livros digitais compõem um mercado muito lucrativo,
-prima. A princípio os livros eram de papiro e escritos em
sobretudo a Amazon, principal empresa do ramo que já
rolos, também chamados de volumen. Em seguida pas-
vende mais eBooks que livros impressos desde 20113. O
saram a ser feitos de outro material, o pergaminho, e no
mesmo acontece no Reino Unido desde 20124.
Entretanto o sucesso dos livros digitais não se re-
formato conhecido como códice, que é o livro como conhecemos hoje. Quase sempre, eram manuscritos um a
Mais de cinco séculos se passaram e a produção
de livros impressos cresceu continuamente, tornando-se
não só um produto de importância cultural como tamCapa
Disponível em: http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,na-amazon-ebook-vende-mais-que-livro-de-papel,721630,0.htm
Acesso em: 24/04/2013
4
Disponível em: http://blog.crb6.org.br/artigos-materias-e-entrevistas/amazon-afirma-vender-mais-ebooks-kindle-do-que-livros-impressos-no-reino-unido/ - Acesso em: 24/04/2013
3
um pelos copistas.
Sumário
eLivre
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
pete no Brasil, mesmo com o país contando com três dos
o livro, enquanto que o PDF não possui essa caracterís-
principais grupos do mercado: Amazon, Kobo e Google,
tica. Por esta razão, o PDF é um formato pouco utilizado
sem contar a Apple, que também vende eBooks em sua
para a venda de eBooks.
loja online, o iTunes Store e outras grandes redes de livra-
O ePub é o formato de eBook comercializado na
rias nacionais interessadas no comércio de livros digitais,
grande maioria das lojas, enquanto que o Kindle Format 8
mesmo que em menor escala.
é exclusivo para os e-Readers da Amazon, principal ven-
O presente artigo tem o propósito de expor e dis-
dedora de livros digitais e e-Readers no mundo.
cutir os fatores que colaboram para o insucesso des-
Para “rodar” estes formatos, são necessários sof-
te mercado no Brasil, apesar dos avanços obtidos em
twares ou aplicativos específicos, que podemos chamar
2012, como a chegada de eReaders e surgimento de
de Readers. O Kindle tem seu reader específico, mas exis-
novas lojas de eBooks.
tem outros para PC’s e Tablets que são muito utilizados,
como o Adobe Digital Edition, Adobe Reader, Aldiko e o
Os livros digitais: formatos, readers, e-Readers
e as semelhanças com o impresso
brasileiros Saraiva Reader e IBA.
As possibilidades de leitura de livros digitais são
Uma das principais diferenças do livro digital em relação ao impresso é quanto ao texto. No digital, surge
o hipertexto, definido por Levy (1997, p. 33) como “um
conjunto de nós ligados por conexões. Os nós podem ser
palavras, páginas, imagens, gráficos ou partes de gráficos, sequencias sonoras, documentos complexos que podem ser eles mesmos hipertextos.”
Os livros digitais estão disponíveis em diversos formatos, sendo o ePub, o Kindle Format 8 e o tradicional
PDF. Os dois primeiros são formatos “dinâmicos”, que permitem que os livros se ajustem automaticamente ao tamanho da tela do dispositivo no qual já está sendo rodado
Capa
Sumário
grandes, existem diversos dispositivos compatíveis, como
smartphones, tablets e PC’s. Ma,s o ideal é a leitura em
um e-Reader (do inglês “eletronic reader”, leitor eletrônico), que assim como foi dito anteriormente, é um dispositivo produzido especificamente para a leitura de livros digitais, contando, inclusive, com tecnologia de tela que não
cansa a vista e simula o papel, o que torna a leitura do
livro digital muito próxima da leitura de livros impressos.
André Lemos reforça e descreve esta semelhança,
ressaltando que os leitores de eBooks buscam unir a portabilidade que o digital oferece com a experiência de leitura próxima do impresso:
eLivre
125
O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
Os e-readers emulam, com a e-ink, muito bem o papel e
a tinta. Alguns não tem iluminação interna e tornam-se
muito confortáveis para a leitura. O que está em jogo aqui
é usar a tecnologia digital e as redes sem fio para proporcionar portabilidade da biblioteca e uma leitura próxima
da do livro impresso (sem firulas, links desnecessários, ou
interatividade exagerada). O leitor nem sempre quer ser
“interator”. Ele quer ler como se lê um livro em papel. A
relação material é importante aqui: ler um produto acabado em uma postura corporal similar àquela da leitura
dos livros jornais e revistas impressas. (LEMOS, 2011)5
A afirmação de Levy (1997), de que o hipertexto
retoma e transforma antigas interfaces da escrita, reforça
essa discussão sobre as semelhanças e diferenças entre
o digital e o impresso. Chartier (1999) corrobora com o
pensamento de Levy quando diz que o texto em tela cria
uma organização e estruturação do texto que não é de
modo algum a mesma com a qual se deparava o leitor
do livro em rolo da Antiguidade ou o leitor medieval, moderno e contemporâneo do livro manuscrito ou impresso.
Nestes formatos, o texto é organizado a partir de sua estrutura em cadernos, folhas e páginas.
Disponível em: http://andrelemos.info/2011/10/flica/
Acesso em: 25/04/2013
5
Capa
Sumário
Figura 1: Livros impressos e o Kindle, eReader da Amazon.
Fonte: www.dualpixel.com.br
As causa do insucesso dos eBooks no Brasil
O mercado de livros digitais no Brasil só veio apresentar crescimento relevante no último ano, mesmo
assim, ainda aquém da expectativa inicial dos grandes
investidores, que viam no país um mercado promissor.
Até o primeiro semestre de 2012, poucas livrarias e lojas online vendiam eBooks, como a Saraiva e o Submarino.
Nos últimos meses de 2012, a Amazon se instalou
no Brasil e iniciou as vendas do seu eReader, o Kindle e
também de eBooks. Junto a Amazon, a Kobo, empresa
canadense e uma das principais concorrente firmou parceria com a livraria cultura e também começou a vender
seus eReaders e eBooks. Além destas, o Google e a Apple
eLivre
127
O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
começaram a comercializar livros digitais no Google Play
e na iTunes Store, respectivamente.
Segundo dados da DLD (Distribuidora de Livros Digitais) - empresa que distribui os eBooks das editoras
Objetiva, Planeta, Record, Rocco, L&PM, Novo Conceito
e Sextante -, as vendas de livros digitais teve um crescimento de 900% entre dezembro de 2011 e dezembro de
20126. Vale ressaltar que esses são dados apenas relativos às vendas da DLD.
O crescimento é factual, mas as previsões apontavam prospecções mais positivas para o mercado brasileiro. Essa “demora” para o alavancamento dos livros digitais no Brasil, segundo nossa análise, é consequência de
um conjunto de fatores que atrapalham e desestimulam
os brasileiros a lerem eBooks, além de um fator de cunho
estrutural: o impacto logístico no modelo de mercado
editorial praticado atualmente no país.
Portanto, os fatores – ou causas -, do insucesso dos
livros digitais no Brasil são quatro: eReaders com altos preços, pouca de variedade de eBooks em português, livros
digitais caros e o impacto no modelo atual de negócio.
Alto custo dos e-readers
Os livros digitais podem ser lidos em vários dispositivos, mas são nos eReaders que se concentram as comDisponível em: http://www.tiposdigitais.com/2013/01/o-tamanho-do-mercado-de-ebooks-no-brasil.html
Acesso em: 25/04/2013
6
Capa
Sumário
pras de eBooks; por serem dispositivos específicos para
a leitura, são bem mais confortáveis para ler do que os
tablets ou computadores e notebooks.
Por simular eficientemente um livro impresso, boa
parte dos compradores de eBooks são aqueles que possuem um leitor dedicado, como o Amazon Kindle ou o
Kobo. No Brasil, os leitores dessas duas gigantes do mercado editorial digital chegaram no segundo semestre de
2012, vendendo eBooks e seus eReaders.
Antes da chegada destas empresas, o leitores eletrônicos vendidos no Brasil eram poucos, basicamente o Alfa,
da Positivo e o Cool-er, importado e vendido pela Gato Sabido. Entretanto, os preços eram incompatíveis com a realidade do mercado, custando entre R$600,00 e R$800,00.
Os consumidores por vezes, preferiam pagar valor semelhante a um tablet, que possui mais funcionalidades.
Enquanto isso, nos EUA, um Kindle de modelo mais
simples, poderia ser comprado por 79 dólares, algo em
torno de R$160,00. A chegada da Amazon e da Kobo ao
nosso país e a consequente comercialização de seus leitores indicavam uma queda nos preços e um primeiro passo
pro crescimento dos eBooks no Brasil.
A Amazon chegou e hoje vende seu modelo mais
simples, com tela de 6’, WI-FI e sem touchscreen por
R$299,00 e a Kobo vende seu leitor mais barato, o Kobo
Mini, com tela de 5’, WI-FI e tela sensível ao toque por
R$289,00 na Livraria Cultura. Esses valores já estão bem
abaixo do que era vendido anteriormente, mas ainda sim,
eLivre
129
O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
muito acima dos preços desses mesmos aparelhos nos
EUA, que custam, 69 Dólares (R$140,00) e 80 Dólares
(R$160,00) respectivamente.
Recentemente, as concorrentes lançaram outros
modelos no mercado brasileiro, o Kindle Paperwhite e o
Kobo Glo, mas os preços seguem muito acima do valor
vendido no exterior conforme mostra as imagens abaixo:
Fonte: www.pontofrio.com.br
Podemos constatar que os preços no Brasil, em alguns casos, chegam a custar mais que o dobro dos preços praticados nos Estados Unidos. O alto custo de um
dispositivo que oferece basicamente uma funcionalidade,
acaba por desmotivar os brasileiros a investirem em um
eReader, e isso se reflete, consequentemente, em um número menor de vendas de eBooks.
Figura 2: Kindle Paperwhite é vendido
Pouca variedade de títulos a venda
pelo equivalente a R$240,00 nos EUA.
Não menos importante, há também o fator variedade. O número de eBooks em língua portuguesa à venda
nas lojas brasileiras é muito inferior a quantidade de títulos em inglês e que são vendidos no exterior.
Para se ter uma ideia da desproporcionalidade do
número de obras a venda, a Amazon possui mais de um
milhão de e meio de eBooks em inglês, enquanto que o
número de eBooks em português agora que atingiu a casa
dos vinte mil títulos.7
Muitas editoras nacionais ainda não fecharam acordos e por isso não produzem eBooks, ou seja, muitos livros ficam só no impresso, o que acaba limitando as opções dos leitores, e esse fator também influência na hora
Fonte: www.amazon.com
Figura 3: Kindle Paperwhite vendido no Brasil custa o dobro.
Disponível
em:
http://www.amazon.com.br/s/
ref=amb_link_366167302_33?ie=UTF8&rh=i%3Adigital-text%2Cn%3A5475882011&pf_rd_m=A1ZZFT5FULY4LN&pf_rd_
s=left-4&pf_rd_r=09SFY7Y8T3C73SRT53TT&pf_rd_t=101&pf_rd_
p=1514834982&pf_rd_i=6311441011 - Acesso em: 25/04/2013
7
Capa
Sumário
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
de migrar ou não para o digital, pois há sempre o risco do
leitor não encontrar certos títulos na versão digital.
Figura 4: Busca no site da Amazon mostra o número
de obras disponíveis em português.
Fonte: www.amazon.com.br
Figuras 4 e 5: Comparativo de preços do mesmo livro em formato
impresso e digital na Cultura.
eBooks caros
É verdade que os eBooks já foram mais caros em
nossa terra, mas com a chegada da Amazon, Kobo e a
entrada do Google e a da Apple no mercado, a disputa
ficou mais acirrada, o que acabou refletindo na queda dos
preços. Porém, os preços ainda estão um pouco longe da
realidade daqueles praticados no exterior, onde o mercado se firmou e confronta diretamente com os números
dos livros impressos.
Capa
Alguns livros digitais já são vendidos a preços um
pouco mais baixos que os livros impressos, mas boa parte ainda é comercializada a preços iguais ou até mesmo
mais caro. Vale ressaltar que o livro impresso no Brasil
também custa caro e um eBook, quando vendido a preço
similar, não indica vantagem.
O custo de produção de um livro digital é muito
mais baixo que a de um livro impresso, pois é dispensado
o uso de papel, de impressão e o transporte que leva os
livros até as lojas. O leitor compra o livro e faz o download direto para o dispositivo no ato da compra, portanto,
é incompreensível um livro digital custar tão caro quanto
um livro impresso. Alguns especialistas apontam que a
causa desse alto custo é a pouca mão de obra disponível
no mercado para a produção de eBooks, pois o processo é
mais complexo que a dos livros impressos.
Sumário
Fonte: www.livrariacultura.com.br
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133
O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
O comparativo mostra o livro digital aproximadamente 20% mais barato que o impresso, porém, continua
caro para um livro digital literário e muitos leitores preferem pagar a obra em formato tradicional.
Na Amazon norte-americana, a maioria dos eBooks
custa até 10 dólares, o equivalente a R$20,00, um preço
bastante competitivo e que tem dado certo, visto o sucesso de vendas de livros digitais daquela empresa.
A tendência é que os preços continuem a baixar com
a chegada de novas lojas e o aumento da mão-de-obra
que produza eBooks, mas isso deve acontecer a médio
prazo, deixando os livros digitais com o preço ainda um
pouco acima da média, por um tempo.
Impacto no modelo atual do mercado editorial brasileiro
Além dos fatores apresentados anteriormente,
que estão ligados ao livro digital em si, também existe
um fator que influencia decisivamente no crescimento
ou não do mercado de eBooks do Brasil - e que acontece
de forma mais discreta.
O impacto que um provável sucesso e crescimento repentino dos livros digitais causaria no modelo atual
do negócio do livro no país fez com que muitas editoras e livreiros agissem contra a chegada das gigantes dos
eBooks aqui e continuam resistindo a este mercado.
Uma prova deste fato é uma carta pública assinada
pela ANL – Associação Nacional de Livrarias e que foi enca-
Capa
Sumário
minhada para a imprensa no ano passado, intitulada “Carta
Aberta da ANL sobre o livro digital no Brasil”. O documento
foi uma resposta da ANL à chegada da Amazon ao Brasil.
Na Carta, a ANL faz algumas recomendações às livrarias brasileiras sobre como reagir ao livro digital. Entre
as recomendações estão: a) estabelecer um intervalo de
120 dias entre o lançamento dos livros impressos no formato de papel no mercado brasileiro e sua liberação nas
plataformas digitais; b) que o desconto para revenda do
livro digital para todas as livrarias e para as demais plataformas seja uniforme, possibilitando igualdade de condições para todos os canais de comercialização nesse novo
suporte de leitura ; c) diferença de preço do livro digital
para o formato impresso seja no máximo igual a 30%; d)
Na hipótese de a editora ou distribuidora vender diretamente ao consumidor final, o desconto nos livros digitais
não poderá exceder 5%.
Estas recomendações públicas deixaram claro a resistência das livrarias brasileiras com os livros digitais e
reforça a preocupação destas com o impacto que o crescimento deste mercado poderia causar, gerando prejuízos
não só aos livreiros, como também aos fabricantes de papel e prestadoras de serviços de transporte.
Conclusão
O livro digital surgiu para coexistir com o impresso.
Não é um concorrente, e sim, apenas um novo produto,
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135
O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
uma nova opção para os leitores, o que torna o mercado
editorial mais dinâmico e mais diversificado, oferecendo
outras experiências em leitura que pode vir a atender novas necessidades.
Sucesso nos EUA e na Europa, o livro digital chegou
sem muita força ao Brasil e gerou expectativas de grande crescimento com a vinda da Amazon e Kobo. Porém,
o sucesso esperado ainda não foi atingido pelos fatores
apresentados neste artigo, que vão desde questões como
a falta de mão-de-obra - que encarece os eBooks -, passa
pelos altos impostos cobrados no país - que torna os eReaders duas vezes mais caros -, até chegar a problemas
logísticos, influenciando diretamente nos demais.
Temos um ciclo de causas que afasta dos brasileiros
o interesse em conhecer mais de perto as vantagens dos
livros digitais e impossibilita o crescimento deste mercado
no Brasil. Enquanto nos Estados Unidos os leitores podem
comprar eReaders a menos de 100 Dólares e variados títulos por menos de 10 Dólares, o brasileiro ainda encontra
eReaders caros, e pouco variedade de títulos, a maioria a
alto custo, tudo isso somado aos entraves que as livrarias
provocam por resistir aos livros digitais.
A expectativa, agora, é que esses problemas sejam
contornados e em médio prazo possamos ter um mercado de eBooks próximo do norte-americano, o que não só
aumentaria os lucros das livrarias e editoras que apostassem neste mercado, como também incentivaria a leitura,
pois os custos seriam mais baixos.
Capa
Sumário
Vale lembrar que o livro impresso e seu mercado
passaram por diversas transformações ao longo dos cinco
séculos que transcorreram desde a prensa de Gutenberg
até o surgimento dos processos digitais. Nesse contexto,
os editores, escritores e leitores se adaptaram a estas
transformações e ajudaram a constituir o livro impresso
como conhecemos hoje.
Segundo Parry (2012), apesar do boom das empresas pontocom na primeira década deste século, o livro em
suas diferentes formas, parece ter sido o meio de comunicação de crescimento mais rápido, no que diz respeito
à quantidade de unidades produzidas. Para se ter uma
ideia, conforme o autor, no ano de 2011, apenas nos Estados Unidos, a previsão era de que cerca de 300 mil novos títulos seriam publicados no formato tradicionalmente
impresso, batendo o recorde em relação a qualquer ano
anterior. Além disso, haveria mais de 12 milhões de livros
disponibilizados anualmente em outros formatos, a exemplo das modalidades eletrônicas e como arquivos em PDF.
Nesse sentido, arremata Parry (2012, p. 60): “Como tipo
de mídia, o livro encontra-se em excelente forma, e vai
escrevendo um novo capítulo de sua história nesta era
dos meios de comunicação digital”.
Parece-nos, portanto, tratar-se de um movimento
sem volta essa jornada do livro rumo aos novos formatos
eletrônicos, ao qual o mercado editorial e a sociedade deverão se adaptar, sob pena de serem engolidos pelo atraso que já nos distancia dos países mais avançados.
eLivre
137
O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
Referências
CHARTIER, Roger. A aventura do livro: do leitor ao navegador. São Paulo: Editora UNESP, 1998.
DEFLEUR, Melvin L.; BALL-ROKEACH, Sandra. Teorias da Comunicação de Massa. Rio de Janeiro: Zahar, 1993.
A ASCENSÃO DO LIVRO DIGITAL
E A AUTONOMIA DO AUTOR NA CIBERCULTURA1
HORIE, Ricardo Minoru. Coleção eBooks Volume 1: Arte-finalização e conversão para livros eletrônicos nos formatos
ePub, Mobi e PDF. São Paulo: Bytes & Types, 2011.
Filipe Almeida2
LEMOS, André. Livro e mídia digital. Disponível em: http://
andrelemos.info/2011/10/flica/ Acesso em: 01/11/2011
LÉVY, Pierre. As tecnologias da inteligência: o futuro do
pensamento na era da informática. São Paulo: Ed. 34, 1997
Resumo
MCLUHAN, Marshall. A galáxia de Gutenberg: a formação
do homem tipográfico. São Paulo: Editora Nacional, Editora da
USP, 1972.
O livro digital está ganhando espaço e aceitação no mercado editorial brasileiro, mesmo diante da relutância dos
leitores acostumados com o livro impresso. Não há evidências de que este artefato tecnológico suplantará o livro impresso, mas, na prática, os eBooks, como são denominados, estão despontando como versões capazes de
atender à novas necessidades e de criar novos usos que
os livros impressos já não atendem no contexto da cibercultura. Essa ascensão do livro digital tem reflexos diretos
na produção e negociação dos autores junto à grandes
editoras: a autonomia destes frente ao modelo tradicional
PARRY, Roger. A ascensão da mídia: a história dos meios de
comunicação de Gilgamesh ao Google. Rio de Janeiro: Elsevier,
2012.
Sites
www.amazon.com
www.amazon.com.br
www.livrariacultura.com.br
www.pontofrio.com.br
Artigo originalmente apresentado no VI Simpósio Nacional da ABCiber, Curitiba, 2013.
2
Mestrando no Programa de Pós-Graduação em Comunicação (PPGC/
UFPB). Integrante do Grupo de Pesquisa em Processos e Linguagens
Midiáticas - Gmid/PPGC e do Projeto Para Ler o Digital. E-mail: [email protected]
1
www.kobo.com
Capa
Sumário
eLivre
139
O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
do mercado editorial está provocando mudanças consideráveis na indústria do livro. O presente artigo tem o
propósito de compreender as transformações proporcionadas pelo livro digital junto a leitores, autores e mercado
editorial, a partir das necessidades emergentes e de suas
implicações mercadológicas.
Palavras-chave: Livro digital. Mercado editorial. Autonomia do autor. Cibercultura.
Introdução
O livro é um gênero literário cuja hegemonia no formato impresso tem cerca de 500 anos, participando de
forma significativa de grandes mudanças sociais. Embora
seu formato de folhas manuscritas reunidas em bloco tenha se iniciado com o códex, no Egito Antigo, foi Johannes
Gutenberg, criador da prensa de tipos móveis, quem imprimiu os primeiros 180 exemplares da Bíblia, no período
de 1450 a 1455 (PARRY, 2012).
Daquela época até então, a indústria do livro desenvolveu um sistema editorial de grandes proporções, cujo
modelo de negócios vende milhões de exemplares, anualmente, em todo o mundo. Autores, editores, distribuidores e livreiros participam ativamente desse mercado, cujo
produto representa uma das mais profícuas formas de expressões do saber e da cultura humana. Nesse contexto,
Capa
Sumário
o autor, responsável pelo conteúdo das obras, é quem
menos ganha no processo mercadológico de levar importantes obras a todas as áreas de atuação do ser humano.
Esse império do livro impresso, porém, foi instigado a rever a continuidade de sua hegemonia, diante do
surgimento do livro digital no âmbito da cibercultura. E
mesmo que não haja indícios de que esse novo formato
e padrão editorial de livros que transitam pela tecnologia
das mídias digitais, venham suplantar o livro impresso,
trata-se de uma inovação que já está modificando o modo
como nos relacionamos com as obras, a partir de novas
necessidades de produção e consumo do conhecimento.
Além disso, é um processo editorial que atinge e modifica
consideravelmente os modos de criação e distribuição dos
livros por parte dos autores, dando-lhes uma autonomia
comercial que abala diretamente as práticas editoriais estabelecidas desde o surgimento da indústria cultural.
As tecnologias da informação e da comunicação que
se estabeleceram a partir da computação pervasiva e engendramento dos sistemas midiáticos fixos e móveis, tiveram na internet o espaço apropriado para a produção e
o compartilhamento de informações e conhecimentos em
escala global. Passaram a atuar sob a égide das conhecidas leis da cibercultura, em que se instaurou a distribuição
do polo de emissão, a conectividade de toda a sociedade
e a reconfiguração de práticas midiáticas (LEMOS, 2005).
O que estamos presenciando é a ascensão do livro digital, chamado de eBook e que tem formatos (PDF,
eLivre
141
O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
ePub3 entre outros) e versões diversas, capazes de serem transportados, distribuídos e lidos em computadores,
tablets, smartphones e eReaders4, passíveis de serem
produzidos, editados e vendidos ou compartilhados gratuitamente pelos próprios autores. São responsáveis por
significativas mudanças estruturais no mercado editorial
em grande parte do mundo.
Que transformações são essas verificadas, tanto no
modo de produção, formato estético e consumo, quanto
no processo de editoração e comercialização das obras? E
quais as implicações desse sistema digital que envolve o
livro no cerne das sociedades contemporâneas? Responder essas perguntas é o objetivo maior do presente artigo.
O surgimento do livro digital
no contexto da cibercultura
De acordo com os estudos de Lemos (2005), a cibercultura pode ser caracterizada por três “leis fundadoras”: a liberação do polo de emissão de informações,
mensagens, opiniões etc., o princípio de conexão e compartilhamento em rede e a reconfiguração dos formatos midiáticos e práticas sociais. O livro digital, na atual
Abreviatura de electronic publication, o ePub é um padrão internacional para eBooks, livre e aberto. Por ter um layout fluido, o texto e
as imagens presentes no livro podem ser redimensionadas de acordo
com o tamanho da tela do dispositivo, possibilitando uma boa leitura
nos mais variados aparatos tecnológicos, principalmente nos portáteis.
4
Pequeno aparelho que tem a função de mostrar na tela o conteúdo
dos livros digitais. Nele podem ser armazenadas inúmeras obras.
3
Capa
Sumário
conjuntura, passa a ser orientado pelas mesmas leis que
regem a cibercultura.
Com a liberação da emissão, podemos encontrar
quase todo tipo de informação circulando na rede, independentemente da influência exercida pelo difusor. Nos
livros eletrônicos, observamos a aplicação da primeira
lei na medida em que qualquer pessoa pode escrever
um livro e publicá-lo sem custo algum. Softwares para
a editoração de eBooks estão cada vez mais intuitivos, a
exemplo do iBooks Author, aplicativo gratuito da Apple
que permite ao escritor realizar todo o processo de diagramação com a inserção de recursos de áudio, vídeo,
galeria de imagens, infográficos interativos e objetos
em três dimensões.
O princípio da conectividade generalizada, como
discute Lemos (2005), teve início em meados da década
de 1970, com o surgimento dos primeiros computadores
pessoais. Entre os anos de 1980 e 1990, o PC foi transformado em uma plataforma coletiva com o surgimento e
popularização da internet. Hoje, o caráter portátil dos dispositivos eletrônicos promove uma série de alterações nas
práticas sociais, permitindo ao usuário conexão à rede em
qualquer lugar.
Obedecendo à lei da conectividade, encontramos os
livros digitais disponíveis na internet de forma gratuita ou
paga, cabendo somente ao autor decidir de que forma irá
difundir sua obra. Os eBooks também podem conter links
externos, associados a outros livros ou à páginas da web,
eLivre
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
favorecendo a aplicação do princípio da conexão em rede.
A reconfiguração, terceira lei que rege a cibercultura, expõe a necessidade de se repensar as práticas midiáticas. Para Parry (2012, p.21), “cada nova tecnologia cria
novos formatos de mídia, que ao mesmo tempo acrescentam e modificam seus antecessores”.
Do ponto de vista mercadológico, talvez tenhamos
uma das questões mais recorrentes quando o assunto é
livro eletrônico: será que, com a expansão deste novo
formato, estamos nos aproximando do fim do livro impresso? Acreditamos que não; o livro se encontra em
processo de reconfiguração, portanto, não se trata da
simples substituição do impresso pelo digital. O livro digital surge para suprir novas necessidades que, com os
novos recursos audiovisuais interativos, geram uma nova
experiência de leitura.
não pode ser deixada de lado. Segundo
Dziekaniak et
al. (2010, p.85), “essa é a realidade da leitura virtual,
um formato que convida o leitor a interagir e a explorar
símbolos e palavras que mudam de cor ou que oferecem
a facilidade de manuseio com um simples toque”. Com
esses recursos, a leitura virtual torna-se uma experiência
agradável, um convite para que o leitor possa interagir
com elementos capazes de proporcionar um aumento significativo na absorção do conteúdo dos livros.
Mas, a presença do livro digital está revelando inúmeros outros aspectos intrínsecos à vida contemporânea que fazem dele uma necessidade. A urgência da vida
pessoal e profissional confere novos usos e práticas para
esses aparatos técnicos e permitem que alguns autores
postulem que podemos pensar o livro digital como suplemento do impresso:
Livro digital: novos usos e necessidades
As gerações que nasceram sob a égide do livro impresso, ainda mantêm apreço e saudosismo por um objeto de forte significado na cultura. Folhear um livro e
passar os dedos sobre as letras é uma experiência que se
prolonga desde a infância. E pensar em trocá-lo por um
livro digital que fica condicionado a uma tabuleta de metal
e vidro não é uma ideia que se aceita de imediato.
Porém, quando começamos a conviver com os tablets e os eReaders, aos poucos vamos percebendo que
Capa
existe outra dimensão nessa nova concepção de livro, que
Sumário
O mundo do saber vem mudando tão rapidamente que
ninguém consegue prever como estará daqui a dez anos.
Acredito, porém, que continuará dentro dos limites da galáxia de Gutenberg – ainda que essa galáxia vá se expandir graças a uma nova fonte de energia, o livro eletrônico,
que servirá como suplemento, e não substituto, da grande máquina de Gutenberg. (DARNTON, 2010, p.95).
Uma constatação imediata é a de que o padrão de
livro digital permite reunir e consultar centenas de obras
em um único dispositivo. Geralmente mais leve e mais
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
fino que um livro impresso, o livro eletrônico como suporte tecnológico necessita de menos espaço físico para armazenar e transportar o acervo. Segundo Darton (2010),
essa característica do eBook é essencial para as bibliotecas de pesquisa pelo fato de que não será mais preciso
estocar grandes quantidades de obras impressas, além de
facilitar o processo de busca para o usuário.
Além dessas, uma série de outras observações foram levantadas em recente pesquisa realizada por Guedes, Albuquerque, Almeida e Nicolau (2013), visando demonstrar as necessidades e usos do livro digital.
Dotado de versátil recurso de busca em seus diferentes formatos, o livro digital facilita a organização de leituras rápidas para quem está focado em exames, concursos
ou palestras. Quando não há muito tempo para a leitura,
pode-se realizar buscas por assuntos ou até mesmo por
palavras-chave que remetam ao conteúdo procurado.
Diante da preservação e pesquisa em obras novas e
antigas, os livros digitais impedem que a degradação das
folhas ou o odor de mofo nas páginas sejam um empecilho para a leitura. Muitos leitores e pesquisadores não
podem estar em ambientes que reúnem obras empoeiradas. Nesse caso, os eBooks proporcionam uma leitura ou
estudo em melhores condições, com possibilidade de armazenamento, sem perdas e restrições. No tocante ainda
a obras antigas e que jamais poderiam ser examinadas
por grande parte da sociedade, estas, agora, podem ser
exibidas, em trechos ou capítulos. Tal facilidade favorece
Capa
Sumário
o uso coletivo dos livros, uma vez que professores e palestrantes podem projetar seus conteúdos sem que a obra
esteja no local da apresentação.
O livro digital, tal qual o livro impresso, também
possibilita a inserção de fichamentos, anotações e marcações. Segundo Ghaziri (2009, p.69), “os comportamentos diante da tela, apesar de parecerem novos, carregam
traços do suporte anterior, o impresso”. Como a versão
é digital, o usuário pode editar, deletar e até exportar as
anotações e compartilhá-las com outras pessoas.
Alguns dispositivos de leitores digitais, como o Kindle, da Amazon, por exemplo, possuem dicionários embutidos, capazes de realizar uma pesquisa instantânea pelo
conteúdo do livro. Já o iPad, da Apple, a partir do aplicativo iBooks, permite que o leitor consulte informações pertinentes com a integração de serviços de busca (Google e
Wikipédia) por meio de uma conexão com internet.
A possibilidade de produção e difusão de um livro sem
custos é uma premissa importante para a democratização
da informação, já que a difusão do conhecimento se dá de
forma gratuita e inclusiva. Por sua vez, pode-se compartilhar obras de outros autores que porventura não estejam no
circuito das editoras, inclusive com comentários e opiniões a
respeito do livro ou trechos específicos do mesmo.
O leitor pode estar em qualquer parte do mundo,
seus eBooks podem ser visualizados em diferentes dispositivos portáteis, como o computador, smartphone, tablet e eReader. Cada aparato tecnológico possui algumas
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
especificidades, como o tamanho e o tipo de tela, além
da capacidade de processamento e armazenamento para
conter quantos livros digitais forem necessários.
Outros aspectos técnicos próprios dos livros digitais permitem diferentes formas de intervenção na obra,
a partir da utilização de variados aplicativos para diversos
fins. Softwares que reconhecem arquivos PDF e ePub permitem fazer anotações e marcações. Editores de texto,
como o Microsoft Word, por exemplo, fazem com que o
usuário possa reescrever trechos da mesma obra.
Além de todas essas possibilidades, alguns outros
aspectos se destacam, como o fato de podermos lidar com
formatos de conteúdo (textual, imagético, sonoro), além
da visualização de vários gêneros (obras, quadrinhos, filmes, revistas). Nesse caso, as obras podem conter sons
e vídeos ou mesmo ser representadas por gêneros diversos, como ocorre nas obras infantis.
Seguindo essas perspectivas de propriedades intrínsecas ao padrão do livro digital, percebemos que, na medida
em que fazemos intervenções nas obras, anotando e criando
códigos de cores, formas e traços, estamos criando novos
padrões de linguagem que ajudam a repassar impressões,
dicas e opiniões. Podemos criar novas maneiras de intervenções, seja por meio da inclusão de cores ou traços, para realçar determinado trecho relevante, em diferentes níveis ou
de formas e emoticons, para demonstrar a importância de
algum tema, sem precisar repetir sempre o mesmo texto.
Mais uma vantagem do livro digital é a possibilidade
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Sumário
de leitura em locais inóspitos, com escuridão e ausência
de energia elétrica. Os eBooks podem ser lidos em dois
tipos de telas, uma que utiliza a reflexão da iluminação do
ambiente e outra, que emite luz. As telas reflexivas são
produzidas com a tecnologia E Ink, um papel eletrônico
capaz de simular com perfeição a legibilidade do papel
convencional. As telas que funcionam a partir da emissão
de luz, usualmente de LCD ou LED, estão presentes nos
monitores de computadores e notebooks, smartphones e
tablets. Os dispositivos que utilizam telas emissivas possibilitam, a partir do uso de bateria, a leitura em lugares
escuros ou desprovidos de energia.
Por fim, vale salientar que os custos de produção
e comercialização dos livros digitais são reduzidos drasticamente, uma vez que o próprio autor torna-se capaz
de editar e diagramar o livro, a partir de softwares com
interfaces cada vez mais amigáveis. Como não é mais
preciso financiar a impressão, qualquer autor pode comercializar seu livro digital no valor que achar conveniente ou compartilhá-lo por meio de grandes empresas,
a exemplo da Amazon e da Apple, que cobram apenas
uma porcentagem por livro vendido.
A autonomia do autor e as novas relações
editoriais com o mercado
O conceito de autonomia comunicacional, referente ao autor tem respaldo em Nicolau (2010), para quem
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
a trajetória do texto, do livro e do autor parece ter progredido historicamente a partir do sistema fonético grego, passando pela prensa de Gutenberg e chegando à
instauração da internet.
Para este autor, o modo de escrita dos sumérios,
egípcios e fenícios estava preso a uma referencialidade
própria do contexto. Eram textos que falavam dos reis,
faraós e deuses ou ainda das posses e dos rituais, que
faziam parte da existência imediata desses povos. Foram
os gregos, porém, que desenvolveram um sistema de escrita responsável pela criação de narrativas e expressão
de suas ideias capazes de se perenizar no tempo e no
espaço; de ser lido por outras culturas e ser aplicável à
existência humana de forma generalizada.
Em um segundo momento, essa autonomia comunicacional concretizou-se como autonomia do suporte, no
caso, o livro impresso. Foi a prensa de Gutenberg que
permitiu aos textos, antes manuscritos pelos copistas em
pergaminhos, serem reconfigurados a partir dos tipos móveis, cujas matrizes permitiam a reprodução de muitos
exemplares. Segundo Nicolau (2010), não apenas os textos já existentes, mas também os novos textos podiam
estar nas mãos de uma nova categoria de receptor: o leitor. Com isso, diversos autores, apoiados em novas práticas de difusão de informação, espalharam suas obras pela
Europa e por todo o mundo.
Após o surgimento da Internet e a instauração da
Web, no contexto mais amplo da cibercultura, outra lógica
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Sumário
comunicacional tornou-se evidente, apoiada na autonomia
do texto e na autonomia do suporte: a autonomia do autor.
Nessa trajetória, porém, percebe-se a implantação
de um sistema de mercado que regeu a indústria do livro
durante séculos. Com o surgimento da prensa de tipos
móveis, inventada por Gutenberg por volta de 1450, os
primeiros impressores também desempenhavam as funções de editor e vendedor, a partir da abertura de livrarias com a finalidade de escoar toda a produção impressa.
Conforme Parry (2012), o impressor era quem detinha o
real valor do livro, acumulando lucros bem maiores que os
do próprio autor. Apenas no século XVIII, os autores passaram a ter a escrita como profissão, encorajados pelas
leis de direitos autorais.
Nos séculos seguintes, o modelo de negócio do livro impresso foi aperfeiçoado e consolidado, culminando numa estrutura sólida composta por autores, editoras, distribuidores e livreiros. Durante muito tempo coube
às editoras o ofício de selecionar apenas os títulos mais
prováveis de serem comercializados, ou de autores vendáveis, já conhecidos pelo público leitor. Inúmeras obras
se perdiam em meio a vasta relação de livros rejeitados
para publicação. Ao autor restava apenas arcar com o alto
custo da impressão para visualizar alguns exemplares expostos nas prateleiras das livrarias.
Pela primeira vez, mais de quinhentos anos após o
surgimento do livro impresso, o mercado editorial passa
por uma grande reformulação com o advento do livro digi-
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
tal. Agora, não há mais o custo elevado da produção, armazenamento e transporte das obras, e o mais importante,
qualquer autor pode se tornar vendável. A instauração da
cibercultura, com base nas três leis citadas anteriormente,
possibilitou o surgimento de um novo autor, com a oportunidade de escrever seu próprio livro, diagramá-lo e difundi-lo sem depender do filtro das editoras e, de maneira geral,
do oneroso processo de publicação do impresso.
No processo de reconfiguração, o fator mercadológico também é modificado. Os altos custos na produção
do livro impresso dificultam a distribuição das obras de
autores independentes. Para Virginio e Nicolau (2012),
os livros digitais permitem que estes autores publiquem
suas obras com menos gastos, e ainda, disponibilizem
seu conteúdo a uma parcela maior da sociedade, por
meio da internet.
Os softwares de diagramação estão com interfaces
cada vez mais intuitivas, permitindo que usuários leigos
sejam capazes de realizar todo o processo de editoração facilmente. Visualizamos uma tendência de desenvolvimento de softwares especificamente para autores,
a exemplo do iBooks Author5, da Apple. O aplicativo da
empresa do Vale do Silício permite a inserção de áudio,
vídeo, galerias de imagens, objetos em três dimensões,
diagramas interativos, entre outros recursos. Ao término
da inclusão de todo o conteúdo, o autor deve escolher enO software produz multi-touch books, termo cunhado pela Apple para
tratar de livros com recursos audiovisuais interativos. Disponível em:
http://www.apple.com/br/ibooks-author/. Acesso em: 03/09/2013.
5
Capa
Sumário
tre disponibilizar seu livro de forma gratuita ou cobrar por
cada download realizado.
Hoje, é possível encontrar diversas plataformas
de auto publicação, e a maior parte delas abrange todas as etapas de produção e comercialização do livro
digital. Uma das plataformas mais utilizadas no cenário
mundial é o KDP6 (Kindle Direct Publishing). A ferramenta da Amazon permite a publicação de obras de forma independente, sendo possível publicar um eBook e
distribuí-lo em até 24 horas, além de realizar alterações
no conteúdo a qualquer momento e contar com um sistema automatizado de gerenciamento para controlar a
quantidade de livros vendidos em cada país.
Fazendo uso dessa ferramenta, o escritor americano John Locke atingiu o número de um milhão de eBooks
vendidos em apenas cinco meses, comercializando-os por
US$0,997. Não há custo algum para o autor incluir sua
versão do livro eletrônico na plataforma KDP, entretanto,
a Amazon cobra uma taxa de 30 por cento por livro vendido, de acordo com o plano de comercialização escolhido.
Acompanhando a tendência da auto publicação, no
primeiro semestre do ano, a Livraria Saraiva lançou o Publique-se8. A plataforma da maior rede de livrarias brasileiDisponível
em:
https://kdp.amazon.com/self-publishing/
signin?ie=UTF8&language=pt_BR - Acesso em: 06/09/2013.
7
Disponível
em:
http://revistapegn.globo.com/Revista/
Common/0,,EMI243323-17180,00-SEM+AJUDA+DE+EDITORA+AUT
OR+VENDE+MILHAO+DE+EBOOKS.html - Acesso em: 06/09/2013.
8
Disponível em: http://livrariasaraiva.com.br/publique-se/ - Acesso
em: 06/09/2013.
6
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
ra dispõe de um manual prático para autores, que contém,
de conceitos básicos relativos ao livro digital, a instruções
de como preparar o eBook para publicação. Assim como
ocorre no KDP, a diagramação pode ser feita no Microsoft
Word e convertido automaticamente pelo sistema.
O mercado editorial em busca de adequações
O avanço tecnológico e a popularização dos dispositivos portáteis deu origem a novos mercados, notadamente o de livros digitais, que em grande parte dos países, incluindo o Brasil, ainda está dando seus primeiros passos.
Entretanto, de acordo com um infográfico desenvolvido
pelo site Now Novel, os livros eletrônicos já correspondem
a 9 por cento e 30 por cento do mercado editorial da China e dos Estados Unidos, respectivamente9.
estão exigindo as adequações necessárias. Uma delas é o
sistema de vendas da Amazon a U$ 0,99 e que está gerando desconforto nos autores. Qualquer autor pode vender
sua obra por U$ 0,99 diretamente no site da Amazon e vai
receber 70 por cento do lucro das vendas. Porém, caso o
público desse livro seja de nicho, é necessário que o preço
fique mais alto, trazendo desvantagens para o autor. Nesse
caso a Amazon corta a remuneração pela metade, pagando
35 por cento do valor, o que gera uma perda dupla para o
autor. Aqui no Brasil, com a chegada da Amazon em 2013,
o problema vem seguido de outro. Para ter 70 por cento do
lucro das vendas, além do critério acima é necessário dar
exclusividade à editora norte-americana.
Na Inglaterra, os autores estão se organizando para
desenvolver ações que não sejam tão prejudiciais a eles.
Entre elas, para enfrentar essa situação criada pela Amazon, os autores estão preferindo diversificação de canais
por acreditarem que é melhor vender em outros lugares
do que depender exclusivamente da Amazon10.
Com o surgimento de um mercado promissor, os
agentes do até então consolidado mercado editorial estão buscando adequar suas práticas a esse novo modelo
engendrado pelos eBooks. Estamos em fase de ajustes,
na qual a adaptação aos aparatos portáteis torna-se um
requisito obrigatório para que editoras e livrarias sobrevivam no competitivo cenário digital. Parece-nos que a adoção do ePub como formato padrão de livros eletrônicos
demonstra a atual conjuntura dessa transformação.
Mas, alguns problemas no decorrer desse processo
Outro aspecto importante a ser considerado é o
fato de muitos dos livros lançados pelo sistema de auto
publicação Kindle Direct Publishing possuirem conteúdos
copiados de forma ilegal. Os spammers, como são conhecidos os falsos autores, agem de duas maneiras: geram
um novo livro a partir de conteúdo disponível livremente
na internet, ou copiam trechos de outros livros eletrô-
Disponível em: http://www.nownovel.com/blog/is-there-money-in-ebooks/ - Acesso em: 20/08/2013.
Disponível em: http://revolucaoebook.com.br/pequenos-escritores-britanicos-protestam-contra-termos-amazon/.
Acesso em: 16/set/2013.
10
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
nicos a venda na própria Amazon. De acordo com o Los
Angeles Times, geralmente esses eBooks são encontrados
em valores promocionais (algo em torno de US$ 0,99) e
correspondem a cerca de 10 por cento do faturamento da
multinacional norte-americana11.
As consequências dessa modalidade de publicação
já podem ser vistas no desenvolvimento de sistemas
cada vez mais complexos para a análise de conteúdo
por parte da Amazon, de forma a garantir a manutenção de sua integridade. Em junho do corrente ano ocorreu um fato inusitado com um autor brasileiro que pretendia publicar sua obra utilizando o KDP. Paulo Roberto
Purim, conhecido pelo pseudônimo Paulo Brabo, reuniu
alguns dos textos de sua autoria presentes em seu site
para publicação na Amazon, entretanto, seu conteúdo
foi rejeitado por estar disponível gratuitamente na internet. Após o autor ter retirado o conteúdo do site e
com a repercussão da notícia12, a Amazon voltou atrás
e autorizou a venda do livro.
Considerações finais
Estamos imersos em uma tecnologia pervasiva que
nos proporcionou a ubiquidade da comunicação e isso nos
Disponível em: http://articles.latimes.com/2011/jun/16/business/
la-fi-kindle-spam-20110616. Acesso em: 15/09/2013.
12
Disponível em: http://www.baciadasalmas.com/2013/punido-pela-distincao-como-ser-popular-demais-me-impediu-de-ser-publicado-pela-amazon/#identifier_0_2902. Acesso em: 15/09/2013.
11
Capa
Sumário
trouxe inúmeras novas necessidades comunicacionais e
midiáticas. A principal delas é saber lidar cada vez mais
com o imenso fluxo de informações que nos permita gerar e gerir os conhecimentos exigidos para viver em uma
sociedade em rede.
A presença do livro digital na sociedade contemporânea é uma realidade premente e sem volta. Principalmente porque este circula nos mesmos aparatos tecnológicos das demais mídias digitais, tais como computadores,
tablets, smartphones e eReaders, e estão presentes em
todas as instâncias da vida social, inclusive nas escolas,
complementando o livro didático impresso.
Do códice ao livro impresso e deste para o livro digital, apesar das distâncias que separam um instrumento
do outro, constatamos uma trajetória significativa para
consolidar todo um aparato tecnológico que visa suprir a
necessidade de produção e difusão do conhecimento humano, e que caminhou rumo a uma autonomia comunicacional, por parte do autor, que se presentifica agora no
contexto da cibercultura.
Mas, a ascensão do livro digital e a autonomia autoral
não se estabelecem de forma irrestrita e tranquila: passam
pelos crivos de uma sociedade demarcadamente capitalista e apegada a seus artefatos mercadológicos que movem
grandes cifras financeiras e constitui a base de muitos conglomerados nacionais e internacionais. É nesse contexto
que são regidas as tentativas de estabelecer regras e normas que assegurem um modelo de negócio lucrativo.
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O livro digital e suas múltiplas perspectivas - Marcos Nicolau (Org.)
O presente estudo mostra que o conceito de livro
digital está no cerne da própria cibercultura, uma vez que,
a descentralização do polo de emissão estabelecida pela
autonomia do autor, a conectividade dos dispositivos fixos e móveis para compartilhamento das produções e a
reconfiguração das práticas midiáticas nas mãos de qualquer cidadão provocam significativas transformações em
diferentes níveis de nossas vidas. Ler livros não é mais
uma simples atividade cultural de aquisição do conhecimento, e sim, uma estratégia fundamental de capacitação
e instrumentação dos cidadãos para conviver numa ciberdemocracia. E publicar livros não é mais uma prerrogativa
dos editores que, por muito tempo, dominaram a indústria
do livro, mas uma prática acessível aos cidadãos/autores
espalhados por todas as partes do mundo.
Assim como, não é mais o mercado editorial quem
dita o que deve ou não ser publicado pelos seus critérios
mercadológicos: são os próprios leitores que poderão fazer deste ou daquele livro um “best seller” pelo compartilhamento e não pela prospecção de vendas das editoras.
Além do que, um livro pode ter valor de conteúdo significativo para um pequeno grupo de leitores e mesmo assim
garantir sua existência editorial.
Enfim, em tempos de cibercultura, o embate entre
os autores de obras digitais e a indústria do livro ainda
está longe de terminar, porém, já é possível vislumbrar os
ganhadores: todos nós, leitores e produtores de conteúdos para as mídias digitais interativas.
Capa
Sumário
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