UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO LAURA JOSANI ANDRADE CORREA VIDEOCLIPE: A DIMENSÃO AUDIOVISUAL DA MÚSICA NA CONTEMPORANEIDADE Cuiabá 2010 LAURA JOSANI ANDRADE CORREA VIDEOCLIPE: A DIMENSÃO AUDIOVISUAL DA MÚSICA NA CONTEMPORANEIDADE Dissertação apresentada como requisito parcial para obtenção do título de mestre em Estudos de Cultura Contemporânea pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT). Orientador: Dr. Yuji Gushiken Cuiabá 2010 2 LAURA JOSANI ANDRADE CORREA VIDEOCLIPE: A DIMENSÃO AUDIOVISUAL DA MÚSICA NA CONTEMPORANEIDADE Dissertação apresentada como requisito parcial para obtenção do título de mestre em Estudos de Cultura Contemporânea pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT). Aprovado em 30 de março de 2010. Banca examinadora: _____________________________________________________ Dr. Yuji Gushiken (ECCO-UFMT) _____________________________________________________ Dr. Leonel Azevedo de Aguiar (PUC-Rio) _____________________________________________________ Dra. Lúcia Helena Vendrúsculo Possari (ECCO-UFMT) 3 AGRADECIMENTOS A realização desta dissertação não seria possível sem a colaboração de algumas pessoas. Agradeço ao professor Dr. Yuji Gushiken pela orientação, brilhantismo, dedicação e disponibilidade, sem ressalvas, em colaborar com a confecção deste trabalho. À professora Drª Lúcia Helena Vendrúsculo Possari pelas aulas enriquecedoras durante o mestrado, pela colaboração no desenvolvimento deste trabalho e por aceitar fazer parte da banca avaliadora. Ao professor Dr. Leonel Azevedo de Aguiar pela gentileza em colaborar com a lapidação deste trabalho e por aceitar o convite para participar da banca avaliadora. Ao meu marido, Robson Castanho, pela compreensão, apoio, companheirismo e paciência. À minha amiga, Lucienne Zaramella Figueiredo, pela valiosa colaboração e cumplicidade. Aos meus familiares pelo carinho, em especial à tia Dinha pela acolhida nessa caminhada. Agradeço-os, carinhosamente, um a um. 4 RESUMO Esta dissertação faz um mapeamento das transformações do consumo de música a partir do início das práticas sociais envoltas no videoclipe. O estudo dessas mudanças requer a análise do processo de refuncionalizações, que é a passagem das eras culturais: cultura de massa, cultura das mídias e cibercultura. Inicia-se pela narração das condições de emergência do videoclipe e pela busca da conceituação desse gênero audiovisual. Em seguida, realiza-se um mapeamento das interfaces com outras práticas comunicacionais. Logo após, trata-se das transformações das tecnologias midiáticas que redefinem os processos de produção, circulação e consumo do bem simbólico pesquisado. Finaliza-se com uma costura de teorias necessárias ao entendimento do videoclipe. No plano metodológico, foi realizada pesquisa qualitativa por meio de pesquisa documental e revisão bibliográfica. Para tanto, adotou-se o método indutivo e descritivo por se tratar de um objeto em constante atualização. A descrição pôde evidenciar uma história da mídia guiada pelo videoclipe. Palavras-chave: videoclipe, consumo de música, audiovisual, tecnologias midiáticas. 5 ABSTRACT This dissertation maps the transformations of music consumption from the beggining of the social practices involved in the music video. The study of this change requires the analysis of the process of readaptation, which is the passage of cultural ages: mass culture, media culture e cyberculture. It begins with the narration of the rising conditions of music video and the search of a concept for this audiovisual gender. Next, the interfaces with other communication practices are analyzed. Then, the transformations of media technologies that redefine the production, circulation and consumption of the symbolic goods presented here are discussed. Finally, an articulation of theories necessary to the understanding of music video. Methodologically, a qualitative research through documental and bibliographic review was made. For that purpose, the inductive and descriptive methods were adopted, because of the constantly updated object. The description evidentiated a history of media guided by the music video. Key words: music video, music consumption, audiovisual, media technologies 6 LISTA DE FIGURAS FIGURA 1 - FRAME DO FILME O CANTOR DE JAZZ 14 FIGURA 2 - FRAME DO FILME FANTASIA 14 FIGURA 3 – APARELHO AUDIOVISUAL SCOPITONE 15 FIGURA 4 - FRAMES DO VIDEOCLIPE TAKE A BOW 23 FIGURA 5 - FRAMES DOS VIDEOCLIPES BAD E BEAT IT 24 FIGURA 6 - FRAMES DO VIDEOCLIPE SINGLE LADIES 25 FIGURA 7 - FRAMES DO VIDEOCLIPE CHECK ON IT 26 FIGURA 8 - FRAMES DO VIDEOCLIPE BOHEMIAN RHAPSODY 29 FIGURA 9 - FRAMES DO VIDEOCLIPE TEMPO PERDIDO 32 FIGURA 10 - FRAMES DO VIDEOCLIPE LIKE A PRAYER 35 FIGURA 11 - FRAMES DO VIDEOCLIPE SEGUE O SECO 39 FIGURA 12 - FRAMES DO VIDEOCLIPE ELA DISSE ADEUS 43 FIGURA 13 - FRAMES DO VIDEOCLIPE I DESAPPEAR 47 FIGURA 14 - FRAMES DO VIDEOCLIPE SABOTAGE 50 FIGURA 15 - FRAMES DO VIDEOCLIPE DIÁRIO DE UM DETENTO 55 FIGURA 16 - FRAMES DO VIDEOCLIPE SEGREDOS 57 FIGURA 17 - FRAMES DO VIDEOCLIPE ALALA 61 FIGURA 18 - APARELHO TOCADOR DE MP4 MARCA PHILIPS 73 FIGURA 19 - IXI DE KANE KRAMER (PROTÓTIPO DO IPOD) 73 FIGURA 20 - IPOD TOUCH MODELO SAFARI 74 FIGURA 21 - SOM AUTOMOTIVO MARCA LG 75 FIGURA 22- FRAMES DO VIDEOCLIPE HIBI NO NEIRO 77 FIGURA 23 - FRAMES DO VÍDEO FUNK DO JEREMIAS 80 FIGURA 24 - FRAMES DO VÍDEO INDIAN THRILLER / GOLIMAR 88 FIGURA 25- FRAMES DO VIDEOCLIPE THRILLER E DO REMAKE FILIPINO 90 7 SUMÁRIO INTRODUÇÃO 10 1. HISTÓRIA E CONCEITO DE VIDEOCLIPE 13 1.1 Videoclipe: nomeando os empirismos 17 1.2 Marco histórico: Bohemian Rhapsody 28 1.3 Tempo Perdido, da banda Legião Urbana 31 1.4 Like a Prayer, de Madonna 34 1.5 Segue o Seco, de Marisa Monte 37 2. MULTILINEARIDADE DAS INTERFACES COM OUTROS GÊNEROS AUDIOVISUAIS 41 2.1 Cinema 41 2.1.1 Cinema Mudo 42 2.1.2 Trilha sonora de filme 46 2.2 Televisão 49 2.2.1 Série de TV 49 2.2.2 Propaganda de TV 51 2.3 Documentário 53 2.4 Animação 56 2.5 Videoarte 59 3. VIDEOCLIPE NAS TRANSFORMAÇÕES DA MÍDIA: MASSIVA, SEGMENTADA E EM REDE 62 3.1 VIDEOCLIPE NA COMUNICAÇÃO DE MASSA: MTV 62 3.2 Videoclipe na cultura das mídias 66 3.3 Videoclipe na cibercultura 76 3.4 Thriller: convergência entre comunicação de massas e comunicação mediada por computadores 82 4. TECIDO TEÓRICO DO VIDEOCLIPE 92 CONSIDERAÇÕES FINAIS 100 8 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 103 9 VIDEOCLIPE: A DIMENSÃO AUDIOVISUAL DA MÚSICA NA CONTEMPORANEIDADE INTRODUÇÃO O tema de estudo desta pesquisa é o gênero audiovisual videoclipe. O recorte temático, ou mais propriamente, o chamado objeto de estudo específico é o videoclipe no que se refere às transformações nos modos de consumo musical a partir do advento deste gênero do audiovisual na paisagem midiática da década de 1980 aos dias de hoje. As transformações no processo de consumo de música implicam analisar a passagem da chamada “cultura de massa” do século XX, tangenciando a “cultura das mídias” até a “cibercultura” do século XXI. Para realizar essa empreitada, buscou-se narrar as condições socioeconômicas e culturais de emergência do videoclipe como gênero audiovisual, traçar concepções e definições do que é videoclipe, mapear as principais interfaces de linguagem que o diferenciam e caracterizam como gênero (cinema, documentário, videoarte, animação e propaganda), analisar as mudanças na MTV1 Brasil e tratar das transformações intensas das tecnologias midiáticas na passagem de século que vêm redefinindo modos de produção, circulação e consumo de produtos culturais. A proposta do presente trabalho foi realizar inicialmente uma pesquisa documental, uma revisão bibliográfica sobre o que havia sido pesquisado acerca do tema. Para tanto, como procedimento metodológico, foi realizada uma pesquisa qualitativa e descritiva. Adotou-se, portanto, um método indutivo e descritivo de exposição de dados empíricos que evidenciam uma história da mídia a partir do videoclipe. A adoção do procedimento descritivo teve como consequência mais visível a evidência das transformações das fases midiáticas entre o século XX e o XXI: a passagem da comunicação de massa ao que hoje se denomina de cultura das mídias e de cibercultura nas esferas de produção, circulação e consumo de bens 1 Music Television – primeiro canal de televisão dedicado à exibição de videoclipes. 10 simbólicos, incluindo o gênero audiovisual do videoclipe. Para finalizar, foi realizada uma costura de teorias basilares e de apoio ao gênero audiovisual pesquisado. Realizou-se pesquisa bibliográfica tendo como fontes e referências livros, artigos e informações disponíveis em sites e blogs. A descrição de videoclipes é realizada com a finalidade de verificar a potencialidade de experimentação da linguagem deste gênero, tendo como parâmetro as interfaces que ele produziu historicamente a partir de outros gêneros audiovisuais. Os clipes selecionados ao longo deste trabalho de pesquisa são representativos e funcionam para tipificar não a homogeneidade do gênero, mas sua tendência ao diálogo com as mais diversas produções culturais e artísticas. O trabalho é composto de quatro capítulos que buscam estruturar o percurso da pesquisa: 1) a história e o conceito de videoclipe; 2) a multilinearidade das interfaces com outros gêneros audiovisuais; 3) o videoclipe nas transformações da mídia: massiva, segmentada e em rede; 4) o tecido teórico do videoclipe. O primeiro capítulo narra as condições socioeconômicas, culturais e midiáticas de emergência do videoclipe como gênero audiovisual e traça as concepções mais gerais que permitem verificar convergências e divergências na definição do que é videoclipe diante da bibliografia pesquisada, lançando mão de alguns exemplos. O segundo capítulo enfatiza o videoclipe como mediador de linguagens audiovisuais através do mapeamento de algumas das experimentações e interfaces do videoclipe com cinema, propaganda, séries de TV, documentário, animação e videoarte. O terceiro capítulo pontua as abordagens sobre as transformações tecnológicas nos modos de produção, circulação e consumo do videoclipe e como esses processos podem levar à verificação dos limites do que é videoclipe. O trabalho busca ancorar-se em parte sobre a história do canal MTV e uma breve análise das mudanças na MTV Brasil. Também é citado o exemplo do clipe Thriller, de Michael Jackson, para demonstrar o trânsito do videoclipe entre a cultura das mídias (SANTELLA, 2003) e a cibercultura (LÉVY, 1999). O quarto capítulo apresenta um conjunto de conceitos teóricos que servem de base e apoio para entendimento do videoclipe como objeto teoricamente construído. A trajetória deste trabalho, que se propõe enquadrar como estudos do audiovisual, 11 tem como perspectiva as mediações (MARTIN-BARBERO, 1997) e o modelo teórico da comunicação como “ciência da cultura” no campo maior das ciências da comunicação (LIMA, 2001), mas tendo como referência seu enquadramento nos estudos de cultura contemporânea. Segundo Douglas Kellner (1995, p. 40), “as sociedades contemporâneas demandam constantes mapeamentos e remapeamentos devido à intensidade das mudanças e da velocidade das transformações sociais em curso”. Nessa perspectiva, este projeto terá relevância tanto para a área científica dos estudos em comunicação quanto para os produtores de audiovisual na medida em que contribuir para a sistematização de dados sobre o audiovisual em geral e sobre o videoclipe em particular. O livro Videoclipe: o elogio da desarmonia, de Thiago Soares, privilegia as questões referentes à linguagem. Capítulos de livros como de Arlindo Machado (A arte do vídeo) e de Maria Goretti Pedroso e Rosana Martins (Admirável Mundo MTV Brasil) tratam do assunto de modo pontual, dando suas contribuições para a construção de um pensamento comunicacional sobre videoclipe. E há também artigos apresentados em seminários e congressos das ciências da comunicação sobre videoclipe, que trazem também informações pontuais sobre o gênero audiovisual. Este trabalho de dissertação, ao organizar dados sobre os processos de transformação constante na paisagem tecnológica e midiática, visa contribuir para que se organizem informações sobre o gênero videoclipe, ele próprio em constante evolução. 12 1. HISTÓRIA E CONCEITO DE VIDEOCLIPE Segundo o comunicólogo Marshall Macluhan (1964), houve uma ruptura entre som e imagem que teve início com o alfabeto escrito, sendo seguido do advento da palavra impressa de Gutemberg que traça uma linha sucessória entre: a lanterna mágica do século XIV, passando pela câmara escura, pela fotografia no século XIX e, nos últimos anos daquele século, o cinema. Tom Gunning (1996, p. 31), em seus estudos sobre o cinema das origens, chama atenção para um dos nomes com o qual ele foi batizado: “fotografias animadas”. O teórico do cinema Nöel Burch (1992, p. 120) afirma que os realizadores e o público constataram rapidamente a necessidade de um acompanhamento sonoro (musical) para as imagens, cujo silêncio parecia insuportável. Enquanto a evolução das técnicas ligadas à imagem galopava, o som seguia a passos lentos. Não que essa não fosse a vontade dos pesquisadores, foram vária tentativas. Em 1877 foi criado o fonógrafo. Depois veio o kinetophone que não funcionava bem. Só em 1902, Leon Gaumont inventou o chronophone, que funcionou de maneira satisfatória para a época. E então, entre 1911 e 1913, há um consenso de que a música é o acompanhamento ideal para as imagens. Na metade da década de 20, a Warner Brothers e a Fox Film Corporation apresentavam aparelhos que sincronizavam som e imagem. A partir daí surgiram vários números filmados. Em 1927 é produzido o primeiro filme “cantado” do cinema: O cantor de jazz, protagonizado pelo cantor Al Jolson, com direção de Alan Crosland. Por se tratar de um marco para música e cinema, cabe uma análise mais pormenorizada do filme. Segundo Massimo Canevacci (2005, p. 21), o cantor interpreta o papel de um moço que decide ser cantor contra a vontade do pai que acha imoral e degenerado o mundo do jazz. A mãe está muito doente e não consegue impedir que o pai expulse o filho. O cantor se torna famoso, mas para não ser reconhecido pinta o rosto de preto. A mãe adoece cada vez mais, o pai continua condenando o poder da mídia. Al grava seu grande sucesso “Mamie”, toda a elite acompanha seu triunfo. Ela morre de desgosto, por não participar da vida do filho. O pai é condenado pela excessiva rigidez. Todo mundo se alegra por ter visto e escutado o cantor de jazz, o fruto 13 sincrônico do enxerto da vitrola com o cinema. Canevacci (2005, p. 21) enfatiza que é nesse contexto de pós-guerra e conflitos entre pais e filhos que se produzirá a ascensão das culturas juvenis como subculturas, como contraculturas e como mídiaculturas. Elas são as culturas expressas e veiculadas pelos meios de comunicação social que nasciam na época. Figura 01: cena do filme O cantor de jazz. Fonte: www.camilomarcelino.com/.../cinema_sonoro.html De acordo com a pesquisa de Thiago Soares (2004, p. 16), ao constatar a necessidade da música para os filmes, os Estúdios Disney produzem na década de 1940 o desenho animado Fantasia, no qual se observa uma relação muito próxima entre música e imagem. Figura 02: cena do filme Fantasia. Fonte: planetadisney.blogspot.com/2009_10_01_archive. 14 Em 1945 surgiu a “vitrola de fichas visuais”, comuns nos bares dos Estados Unidos. Nesses aparelhos era possível visualizar números musicais em preto e branco. Bing Crosby foi um cantor que se tornou referência quando se falava em tal aparelho. A década de 1950 ficou marcada pelos números musicais da TV e do cinema que passaram a render números para a indústria fonográfica. Surgiu naquela década o Rei do Rock, Elvis Presley, que estrelou vários musicais, entre eles: Love Me Tender (1956); Loving You (1956); Jailhouse Rock (1957); King Creole (1958), e muitos outros, além de um documentário de shows em 1972. No final da década de 1950, a rede de televisão BBC, na Inglaterra, lançou o programa “6’5 Special” que mostrava exclusivamente apresentações musicais. Em 1960 surgiu na França o scopitone, aparelho semelhante ao jukebox, que tinha acoplado a ele um projetor de cinema em formato 16 mm. Enquanto a música tocava, as imagens em preto e branco passavam no projetor. Depois, o scopitone foi levado para a Europa, particularmente para Alemanha e Inglaterra. Em 1979, o aparelho foi retirado de circulação. Figura 03: aparelho audiovisual scopitone. Fonte:www.hifiholiday.com/storage/scopitone5.jpg 15 Em 1964 houve o lançamento do filme A Hard Day`s Night, da banda de Liverpool, The Beatles, dirigido por Richard Lester. Além do filme, os Beatles faziam alguns vídeos. Os vídeos eram denominados “promos”, abreviação de promocional. O pesquisador Guilherme Bryan (2005) afirma que “os vídeos dos Beatles não podem ser considerados videoclipe porque eram usados para que a banda pudesse aparecer em mais de um programa de TV”. Sobre a intenção de produzir uma ferramenta de marketing para divulgação da música poderíamos até dizer que não. Mas não se pode deixar de ressaltar que esses vídeos faziam as pessoas terem acesso à música e ainda divulgavam a imagem da banda. Então, de fato, poderíamos inferir que mesmo não sendo produzidos com essa intenção, eles funcionavam como ferramenta de divulgação de música e imagem da banda. Os “promos” seriam uma espécie de embrião do videoclipe, que é hoje importante ferramenta de marketing audiovisual da indústria fonográfica. Em 1974, de acordo com Juliana Abonízio (2008, p. 59), Raul Seixas gravou o videoclipe da música Gita, primeiro musical colorido para o programa Fantástico, da Rede Globo de Televisão. Além do Fantástico, na década de 1970, não havia muitas opções de programas que mostrassem videoclipes. Segundo Leão Serva: Nos anos 70, o público brasileiro podia ver o programa do Big Boy (um DJ que se apresentava com o bordão: Hello, crazy people, Big Boy rides again, assim, em inglês numa terra de monoglotas provincianos como era o Brasil do auge da ditadura militar... Era uma sensação!) E o Big Boy só passava clipes importados dos Estados Unidos (SERVA apud PEDROSO, 2006, p. 02). Ainda na década de 1970, os musicais voltam à cena com American Grafitti (1973), Os embalos de sábado à noite (1977), Abba – O filme (1977) e Grease, Nos tempos da brilhantina (1978). No Brasil, os primeiros esboços de produção de videoclipe têm como possíveis primeiras experimentações a cidade de Recife (PE), em 1975. A banda Ave Sangria gravou uma espécie de vídeo-performance da música Geórgia, a carniceira para o programa Fantástico. Mas o material nunca foi exibido. Em 1973, o 16 cantor e compositor Alceu Valença fez A Noite do Espantalho, um filme-clipe dirigido por Sérgio Ricardo, em Nova Jerusalém (PE). No final da década de 70, Alceu Valença fez outro vídeo, dirigido por Jomard Muniz de Brito, com a música Imitação da vida. Depois, no começo dos anos 80, Alceu Valença e Rucker Vieira fizeram Amanhecendo, um documentário livre sobre um disco inteiro. Foi realizado em Recife, em 1984, um vídeo musical produzido pela Rede Globo, Edy Clínio, O Conde do Rock, um curta-metragem com sete minutos de duração, dirigido pelo jornalista Amin Stepple Hiluey. As experiências em Recife podem ser consideradas como primórdios do videoclipe no Brasil, ainda que não tenham circulado no circuito de exibição de massa. 1.1 Videoclipe: nomeando os empirismos Até o momento, já foi publicado um livro que trata especificamente do tema, Videoclipe: o elogio da desarmonia, de Thiago Soares, publicado em Recife-PE. “Entre a arte e as intenções comerciais, o videoclipe é considerado importante para a compreensão da cultura contemporânea, por sintetizar a aproximação do que é próprio da indústria cultural com as vanguardas” (PRYSTON apud SOARES, 2004, p. 7). Em seu livro, Thiago Soares traz em doze ensaios, uma abordagem voltada para o campo das linguagens que articula teoria, história e crítica. Algumas publicações como A arte do vídeo, de Arlindo Machado, Admirável Mundo MTV Brasil, organizado por Maria Goretti Pedroso e Rosana Martins, tratam de questões pontuais, com análises de casos sobre o gênero audiovisual videoclipe. Arlindo Machado discute a imagem eletrônica, trata da distinção entre vídeo e televisão e relata um possível surgimento de uma televisão inovadora e crítica que transformaria o vídeo em produto de arte. Já Maria Goretti Pedroso e Rosana Martins têm como proposta estudar a linguagem televisiva sob o prisma da MTV Brasil. Pesquisaram toda equipe técnica da emissora, gerentes, VJs, bandas, cantores, compositores e estudiosos da música e da MTV. Segundo as organizadoras a MTV Brasil é única, arrojada e subversiva em sua estética e linguagem. Há outros livros que disponibilizam capítulos sobre o assunto, como o artigo de Jeder Janotti Jr., “O videoclipe como forma de experiência estética na 17 comunicação contemporânea”, que compõe o livro organizado por Sérgio Matos, A televisão e as Políticas Regionais de Comunicação. O videoclipe, como gênero do audiovisual, começa a ser produzido na ambiência maior dos sistemas de comunicação de massa, que funcionam em meio à constante dilatação do mercado em suas estratégias de conseguir satisfazer a tantas demandas diferenciadas. Quando é utilizado o vocábulo gênero, trata-se de gênero midíático descrito por Jeder Janotti Jr. (2005) que define o termo a partir dos estudos de análise do discurso e aspectos sociológicos do consumo de produtos midiáticos da seguinte maneira: Os gêneros delimitam as produções de sentido, demarcando a significação e os aspectos ideológicos dos textos, bem como o alcance comercial (e o público-alvo) dos produtos midiáticos. Toda definição de gênero pressupõe uma demarcação negativa e/ou comparativa com outros gêneros, ou seja, analisar um produto midiático através dessa perspectiva pressupõe perceber as relações entre esse produto e outros de diferentes gêneros, compará-lo com expressões canônicas ou similares dentro do mesmo paradigma. Os gêneros são dinâmicos justamente porque respondem a determinadas condições de produção e reconhecimento, indicativos das possibilidades de produção de sentido e de interação entre os modos de produção/circulação/consumo dos produtos midiáticos (JANOTTI JR., 2005, p. 05). Na mídia de massa, o videoclipe tornou-se uma ferramenta de marketing da indústria fonográfica e coadjuvante da indústria audiovisual. Para o segmento do público jovem, na atual sociedade de consumo, o videoclipe tem se apresentado como um elemento que transformou intensamente o modo de consumo musical. Mais que música para ouvir, o formato audiovisual proposto pelo videoclipe sugeriu, nas transformações da sociedade de consumo, o que hoje é a promoção e divulgação de música para ouvir e ser vista em sua dimensão agora audiovisual. Para Thiago Soares (2004, p. 23), a expressão videoclipe só começou a ser utilizada na década de 1980. Clipe deriva de clipping, recorte (de jornal ou revista), pinça ou grampo, que possivelmente se refere à técnica midiática de recortar imagens e fazer colagens em forma de narrativa em vídeo. A colagem de imagens sugere a tendência contemporânea do videoclipe como gênero do audiovisual de se 18 fazer composições a partir de outros trabalhos e imagens produzidos inclusive na mídia de massa. Segundo Soares (2004, p. 24), no início o clipe tinha edições de imagens rápidas e instantâneas, com prazo de validade enquanto esforço mercadológico para divulgação musical. Uma das características marcantes do videoclipe eram imagens em velocidade frenética, sem obrigação de contar uma história linear com início, meio e fim. Podia ser somente uma justaposição de imagens com o objetivo mercadológico de se apresentar e vender a música. A conceituação de videoclipe vem dessa edição pautada pela agilidade. Já se sabia com Eisenstein (2002, p. 80) que “a complexidade excessiva do ritmo métrico produz um caos de impressões, em vez de uma clara tensão emocional”. Omar Calabrese questiona a temporalidade de jogos em vídeo e do videoclipe. Ele afirma que, em ambos, o tempo de representação da ação requer respostas extremamente aceleradas que podem ocasionar no fim do jogo ou a perda da inteligibilidade do clipe (CALABRESE, 1987, p. 68). O comentário do autor reforça a ideia da primeira conceituação de videoclipe, tendo em vista que o livro foi escrito em meados da década de 1980. Portanto, se as músicas que tinham videoclipe eram voltadas para jovens, essa agilidade seria somente uma consequência dessa relação. Atualmente, já na primeira década do século XXI, a velocidade frenética de cenas e/ou edição não são as únicas opções de produtores audiovisuais de videoclipe. Um videoclipe pode ser lento e compassado, de acordo com a música e a própria subjetividade da criação do clipe. Soares define videoclipe: Postulamos videoclipe como um fenômeno tipicamente pós-pop art, mesclando experiências cotidianas e formas artísticas. Ao unir ferramentas de montagem de vanguardas cinematográficas, cinema gráfico, videoarte e elementos tipicamente surrealistas, notamos que videoclipe aponta o desejo por uma estética, talvez, galgada no êxtase da superficialidade, remontando-nos a uma espécie de cultura do escombro, da ruína, do desperdício, propondo, portanto, como já advertiu Omar Calabrese, um prazer através da série, da repetição, do gozo desta série e do mesmo (SOARES, 2004, p. 39). 19 A pesquisadora norte-americana E. Ann Kaplan, uma das fundadoras da abordagem feminista na crítica cinematográfica, ao final da década de 1980, precisamente em 1987, realizou uma pesquisa sobre videoclipe. Em seus estudos, os clipes foram analisados a partir da psicanálise de Freud e Lacan. De acordo com Soares (2004, p. 54), a norte-americana disse que foi possível tipificar o videoclipe em cinco categorias, segundo temas e conteúdos: 1) romântico; 2) socialmente consciente; 3) niilista; 4) clássico; 5) pós-moderno. A citação acima é necessária na medida em que faz parte da história dos estudos sobre videoclipe. Mas é preciso ponderar que, devido às transformações midiáticas, à evolução tecnológica, ao envelhecimento planificado dos objetos no modo de produção capitalista e à atualização das pesquisas sobre o tema, essa classificação se vê limitada pelo próprio andamento das transformações sociotécnicas do final do século XX e início de século XXI. Tais transformações refletem o constante processo de inovação a que se sujeitam os objetos no desenvolvimento do capitalismo. Nessa abordagem, o videoclipe e suas transformações são contemporâneos da necessidade, no capitalismo histórico, de se investir nas experimentações e na inovação. Daí o caráter da potência criativa, do hibridismo, das interfaces do videoclipe com outros gêneros audiovisuais, enfim da pluralidade e multilinearidade presentes no videoclipe como gênero que atua como ponto de mediação entre diversas outras linguagens. A tentativa de se classificar o gênero videoclipe em subgêneros torna-se difícil, quando não insuficiente, em especial pelo fato de se tratar de um campo próprio para experimentações de linguagens na relação com outros gêneros audiovisuais. Classificar/categorizar o videoclipe é um trabalho com resultados insuficientes porque este gênero audiovisual emerge das seguintes condições: 1) da hibridação, das trocas, das fusões e dos intercâmbios culturais em geral; 2) da contaminação em que se expressa o rompimento de barreiras técnicas e opções estéticas de um gênero audiovisual para outro (cinema, propaganda etc.) e de uma obra de arte para outra e 3) da experimentação em que se sinaliza a potência de criação, de argumentos inventivos no roteiro e execução do videoclipe. Steven Connor, ao comentar as relações entre TV, vídeo e filmes pósmodernos, tece algumas críticas ao videoclipe. Connor cita a definição negativa de 20 Dick Hebdige sobre as funções e efeitos do videoclipe na descrição de Road to nowhere, dos Talking Heads. Hebdige critica a forma de contar uma imagem, no lugar de contar uma história e a falta de crítica proporcionada pelo clipe (CONNOR, 1993, p. 131). O autor também menciona Pat Aufderheide, que defende o potencial criativo do videoclipe, mas critica o fato de ele ser uma ferramenta de marketing, de ser penetrado pela propaganda. Connor finaliza apontando que é raro encontrar, em descrições contemporâneas do videoclipe, autores que façam a análise de isolar propósitos progressistas das banalidades e estereotipações dos clipes e também da saturação do tipo mais rasteiro de comercialização (CONNOR, 1993, p. 132). Sobre a questão comercial e artística que envolve o videoclipe Soares esclarece: A contemporaneidade prevê uma maleabilidade conceitual que nos leva a perceber que não podemos (nem devemos) traçar linhas/fronteiras divisórias marcadas para elementos dotados do dinamismo das esferas do consumo. Propomos, portanto, uma quebra destes marcos limítrofes entre o comercial e o artístico, o centro e a periferia, o mainstream e o alternativo. Não devemos tratar esses conceitos (que sabemos ser profundamente cambaleantes, efêmeros e transitórios) a partir de marcos rígidos. Hoje, os núcleos de produção massiva de clipes (destacamos diretores e produtoras) estão inseridos na dinâmica de marketing das grandes gravadoras (agentes financiadores dos videoclipes), sendo, por isso, um veículo de associação entre a tônica musical e a imagética, entre o artista e o conceito que se faz deste artista (SOARES, 2004, p. 67). Em outras palavras, o autor conclui: Os videoclipes são detentores de uma confluência simbólica, de uma subjetividade oriunda do sistema capitalista que precisa articular elementos existentes no seio da sociedade de consumo – sejam estes elementos de ordem mais artística ou mais comercial (SOARES, 2004, p. 69). O videoclipe se evidencia como gênero do audiovisual na contemporaneidade para vender um conjunto que, além da música, inclui a imagem do artista. Atualmente, a noção de videoclipe como justaposição de imagens, ao modo de uma bricolagem, quase já não se sustenta como padrão identificador ou modelo conceitual. Hoje, conforme os muitos caminhos virtualmente acessíveis, os clipes podem apresentar construções narrativas, lineares ou não. Na composição do clipe, 21 as imagens se relacionam em maior ou menor intensidade com a letra da canção. A dimensão imagética é criada nesta tensão entre o sonoro e as possíveis traduções em forma de imagem que cada música suscita. No videoclipe, entretanto, nem sempre o que é dito na música é visto na imagem. A tradução intersemiótica, principalmente se for uma “tradução literal”, não é uma obrigação ou norma para se caracterizar videoclipe. Tradução intersemiótica, de acordo com Julio Plaza, é a tradição pensada como interpretação de signos verbais por meio de outros signos não verbais, que passou a ser também tradução generalizada de um sistema de signos a outro (PLAZA, 2003, p. 23-24). O que está fortemente estabelecido na caracterização do videoclipe como gênero audiovisual é que a música é o suporte fundamental. Enfaticamente nos primórdios do videoclipe, as imagens produzidas tendiam a ser “traduções” visuais da música, ou seja, as imagens guardavam uma correspondência quase literal do sentido sugerido pela letra da música. Mas, num movimento diacrônico com relação a uma suposta linearidade da narrativa ou convergência entre som e imagem, as imagens passaram a não ter necessariamente a função de pôr em relação os possíveis sentidos entre o visual e o sonoro. Eduardo de Jesus (2004, p. 7) é enfático ao afirmar que “o cenário audiovisual contemporâneo caracteriza-se por uma intensa hibridação entre formatos, suportes, gêneros e técnicas”. Apesar de ser um formato televisivo e comercial, tanto para a TV quanto para a indústria fonográfica, o videoclipe é um gênero audiovisual que agrega valores de outros gêneros, proporcionando e mesmo sugerindo as potencialidades da experimentação. O pesquisador Goodwin (apud CARVALHO, 2005) afirma, em 1992, que o videoclipe é um produto da indústria fonográfica que está estruturado na música e na imagem, e é legitimado pela produção e difusão da música pop. São vários os elementos técnicos utilizados para compor o videoclipe. Na etapa de produção, a iluminação pode ser executada conforme parâmetros já estabelecidos em outros campos profissionais. Como exemplo, a iluminação pode ser bem marcada para evidenciar o cantor, como é feita na produção de peças de propaganda. A fotografia, assim como a iluminação, pode seguir os moldes da propaganda, enfatizando planos próximos e detalhados ou sequências que 22 acompanhem a evolução do roteiro como acontece no cinema, que inicia com planos mais abertos para localizar o espectador e segue mostrando o desenvolvimento da história. No clipe Take a bow, da cantora Rihana, produzido em 2008 com direção de Anthony Mandler, a fotografia do clipe, em vários momentos, é caracterizadamente de propaganda, com planos bem próximos e iluminação que evidencia somente a cantora. O clipe conta uma história de fim de romance, mas o essencial do clipe é o fato de a iluminação destacar, no plano da fotografia, o rosto da cantora. Em mesmo nível, ou até mais que a música, o interesse é que a imagem da cantora seja evidenciada e difundida junto ao seu público. Figura 04: frames do clipe Take a bow. Fonte: www.islanddefjam.com/idjtv/channels.aspx?plid Também é possível ter uma iluminação natural ou imitando ambientes urbanos, como é feito no cinema. O videoclipe de Michael Jackson, The way you make me feel, revela uma iluminação muito próxima da que comumente se encontra nas ruas de pouca movimentação: quase nenhuma, o que sugere o lusco-fusco noturno dos ambientes urbanos. A programação de luz é feita para que seja criado o cenário de uma rua. Pontos fixos são como os postes de iluminação pública. Quando o roteiro exige atuação e desenvolvimento da cena o cantor, a atriz e os dançarinos se posicionam diante da luz. Mas quando a cena é de dança, eles fogem do foco de luz. O cinema, como referência, oferece outras possibilidades como os distintos tipos de iluminação característicos dos diversos gêneros: terror, suspense, ficção ou ainda inovações. Ainda existe a possibilidade de o videoclipe ser feito em plano 23 sequência. A banda Ira fez um clipe chamado Bebendo vinho, que foi totalmente realizado em plano sequência, ou seja, sem cortes na gravação e edição. O clipe foi exaustivamente ensaiado para ser gravado de uma só vez. Figurino e cenografia podem funcionar para ditar moda, fazer referência ou ser experiência estética. O roteiro é outro aspecto técnico que pode variar bastante nos clipes. A narração não é obrigatória. O clipe pode contar a história da música (narração), pode introduzir novos conceitos relacionados à letra e ainda pode ser contrário à letra. Além destas, ainda tem a opção da performance dos músicos, fazendo referência aos primórdios do videoclipe. E há a opção de não levar nada disso em conta e partir para algo que ainda não foi feito. Já que este gênero permite a inventividade e transcende no campo da potência criativa. O videoclipe se caracteriza por ser um espaço de experimentação de linguagens, o que parece ser possível na medida em que os trabalhos sejam feitos por pessoas com diferentes formações profissionais e experiências no campo audiovisual (cinema, documentário, propaganda, animação e videoarte). Como uma opção criativa, a coreografia e a dança podem ser estabelecidas como principais em um videoclipe. Para esse tópico os videoclipes de Michael Jackson podem ser citados, uma vez que grande parte deles são protagonizados pela dança. Bad é totalmente baseado na dança e integração com a paisagem urbana. O clipe tem como locação uma estação de metrô abandonada, na coreografia são incorporados pichação e movimentos como subir escadas e pular a catraca. Figura 05: frames dos clipes Bad e Beat It. Fonte: iamshallow.files.wordpress.com/2009/07/bad.jpg 24 O clipe Bad foi produzido em 1987, a música faz parte do álbum Bad, do mesmo ano. Beat It foi produzido em 1982, narra uma briga de gangues rivais. Michael Jackson dança na maior parte do clipe, na parte final, até a briga é coreografada. Em seguida, é desenvolvida a coreografia até que o clipe termine. A música é do álbum Thriller, o maior sucesso do astro pop. Outro clipe que tem como destaque a coreografia é Single Ladies, da cantora Beyoncé. Ele foi produzido em 2008 e faz parte do álbum com mesmo nome do título da música. No clipe aparece a cantora e duas dançarinas que desenvolvem a coreografia num cenário totalmente vazio. O clipe foi feito em preto e branco e o cenário alterna entre claro e escuro. Figura 06: frames do clipe Single Ladies. Fonte: www.fashionbubbles.com/.../ Na pós-produção, as opções disponíveis de transição entre uma tomada e outra vão desde o corte seco à fusão de imagens. O corte seco dá agilidade e a fusão sobrepõe as imagens. A edição pode ser frenética ou não, depende do 25 resultado esperado pelo diretor. Pode ser pautada no ritmo da música ou não, também a critério dos realizadores. A pós-produção dispõe de vários recursos de computação gráfica que podem ser inseridos à obra audiovisual. No clipe dirigido por Jarbas Agnelli, Made in Japan, da banda Pato Fú, foi utilizada a técnica de 3D (animação em três dimensões). A gravação com a banda foi feita em chroma key2, depois foi adicionada à animação dos músicos com o cenário e os robôs. Há clipes em que se observa a repetição na estrutura (música e roteiro) montada a partir de convenções da música pop. É o caso do clipe Check on it, da cantora Beyoncé, que faz parte da trilha sonora do filme A pantera cor de rosa. No clipe, basicamente o que importa é o rebolado da cantora que rima com toda repetição da letra da música. E para ficar caracterizado que o clipe é trilha sonora do filme A pantera cor de rosa, tudo é rosa. O figurino é rosa, o cenário é feito com cetim rosa de várias tonalidades, até o cabelo da cantora aparece rosa. Figura 07: frames do clipe Check on it . Fonte: toxicsquall.blogspot.com/2009/09/3gp-music-vi... Fundo verde ou azul utilizado em gravações que terão o fundo removido na edição para ser substituído por outro. 2 26 Este vídeo caracteriza a utilização da função fática da linguagem, como a descreve Samira Chalhub (2001 p. 22): “A necessidade de chamar a atenção do espectador e influenciá-lo é a característica central da função fática da linguagem”. Neste caso chamando atenção para o clipe que está fazendo referência ao filme a todo o momento. Há que se ressaltar que pode haver, em alguns casos, a convergência entre comunicação e arte no videoclipe. Devido ao aspecto mercadológico da produção do videoclipe estar vinculada ao consumo da música popular massiva, não devemos cair num objetivismo de desvincular totalmente o videoclipe da arte. Desta forma, reduzindo-o a ser apenas uma peça publicitária. Mas algo tem que ficar claro: as técnicas artísticas presentes nos videoclipes (em alguns) não são capazes de transformá-los em realizações artísticas, devemos guardar as proporções. Como esclarece Lúcia Santaella “o traço distintivo da arte está na intencionalidade do artista em criar algo que não sofre os constrangimentos de quaisquer outros propósitos a não ser da própria criação” (SANTAELLA, 2007, p. 57). Nas condições socioeconômicas da atualidade, o videoclipe consolida-se como uma peça de divulgação publicitária e uma nova maneira de consumir música. Como afirma Valéria Brandini: Os videoclipes tornaram-se um novo referencial para a apreciação estética da música associada a uma forma de oferecer um produto ao consumo. Inegavelmente, pela indústria fonográfica, vídeos musicais são formas de exposição de um produto que está à venda, um apelo ao consumo. Sua estética une técnicas apuradas do cinema e da publicidade, a liberdade de criação de film makers é um universo simbólico que visa à expressão do sentido da canção e da personalidade do artista (BRANDINI apud PEDROSO & MARTINS, 2006, p. 04). A dimensão mercadológica é o que confere ao videoclipe existência como gênero do audiovisual, mas ao mesmo tempo deve ser compreendido em sua pluralidade de ser pensado e concebido numa potencialidade criativa do audiovisual contemporâneo. O videoclipe representa a transformação nos modos de consumo de música e evidencia a tendência da cultura contemporânea ser extremamente calcada 27 na conjugação do som e da imagem. Como ferramenta de apelo mercadológico, o videoclipe também influencia comportamento e moda, em especial no segmento da chamada cultura jovem que vem marcando a vida contemporânea desde a década de 1960. Num esforço metodológico de mostrar alguns modos de fazer videoclipe, ou ainda, evidenciar aqueles que fizeram parte da história do videoclipe, recorre-se à descrição de quatro videoclipes: Bohemian Rhapsody, da banda Queen; Tempo Perdido, da banda Legião Urbana; Like a Prayer, de Madonna e Segue o Seco, de Marisa Monte. 1.2 Marco histórico: Bohemian Rhapsody Em 1975, a banda Queen lança o videoclipe: Bohemian Rhapsody, que os estudiosos consideram como o primeiro videoclipe intencionalmente produzido de acordo com o conceito então nascente no campo do audiovisual. Este videoclipe foi produzido com o objetivo de divulgar o disco da banda, ou seja, funcionar como ferramenta de marketing. As exibições frequentes do clipe no programa Top of the Pops, da rede BBC, fez com que aumentassem as vendas do disco. Nesta música, as gravações das vozes foram feitas em seis estúdios diferentes, para que fossem multiplicadas. O videoclipe, com duração de cinco minutos e cinquenta segundos, foi dirigido por Bruce Gowers. Em 2009, ele dirigia o programa de competição de calouros American Idol, que entrou no ar em 2002. Já foram realizadas oito edições do programa, a oitava temporada ocorreu entre janeiro e maio de 2009. A música Bohemian Rhapsody é uma composição de Freddie Mercury que está no álbum A Night at the Opera, também conhecido entre os fãs como o "White Album", numa alusão ao disco de mesmo nome dos Beatles. Este disco do Queen foi o primeiro da banda a conseguir disco de platina, o primeiro a vender mais de 1 milhão de cópias, o primeiro a atingir o topo das paradas do Reino Unido e dos EUA. A Night at the Opera definiu um novo tipo de rock: o rock arte. O videoclipe foi produzido seis anos antes da estreia da MTV. E, apesar de antigo, continua inovador. Neste clipe, a intenção não é contar uma história, e sim 28 montar uma paisagem visual para a música. Fica evidente que os efeitos especiais são o aspecto técnico mais importante deste videoclipe. É uma tradução intersemiótica, ou seja, imagens utilizadas para traduzir o som. Usando uma técnica de retorno da voz, esse disco criou o som que se tornou marca registrada do Queen e o lançou para a fama. Bohemian Rhapsody, quando lançada, recebeu críticas por não ter apelo comercial e ser muito longa, ela é composta por seis sessões e não tem refrão. No entanto, o resultado foi o primeiro lugar das paradas durante nove semanas consecutivas. Bohemian Rhapsody era tocada ao vivo em shows da banda Queen, algumas vezes eles colocavam uma gravação nas partes mais complexas3. Figura 08: frames do clipe Bohemian Rhapsody. Fonte: tropicalmoments.wordpress.com/.../ 3 Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Queen 29 O clipe mostra as imagens dos músicos cantando sem acompanhamento de instrumental com efeitos especiais e a performance da banda com os instrumentos. O figurino: o vocalista Freddie Mercury veste um macacão justo de cetim branco e um bolero também de cetim branco, o baixista John Deacon usa calça e camisa de cetim brancos, o guitarrista Brian May veste uma camisa listrada de preto e branco com calça branca e o baterista Roger Taylor, com um visual mais básico, de jaqueta de couro. Esse figurino é usado no momento da performance da banda como se fizessem um show, com iluminação e gelo seco. Os primeiros versos são cantados enquanto três componentes aparecem em sombras, percebem-se apenas os contornos. Depois o fundo fica totalmente preto, um feixe de luz evidencia o baixista, o baterista e o guitarrista. A luz se espalha de maneira desigual no rosto dos músicos dando uma impressão de rosto cadavérico. Em seguida, é inserida a imagem do rosto do vocalista sobrepondo a imagem dos outros três componentes. Esta transição de sobreposição de imagens é usada no clipe nos momentos em que a música está com andamento lento. A música apresenta mudanças de andamento com evoluções da forma de interpretar que variam de um andamento lento, uma sensação de balada, até um andamento bem rápido de rock. A música também apresenta momentos de canto sem acompanhamento instrumental. Depois da sobreposição de imagens entra a imagem dos quatro músicos cantando, vem novamente a transição com a imagem do rosto do vocalista que é acompanhada por efeitos sonoros. Em seguida, a performance da banda com os instrumentos. O baterista surge quando a bateria entra em evidência na música, o mesmo com o guitarrista. Neste caso entre uma imagem e outra a transição de sobreposição aparece novamente. De repente, na música se ouve uma ópera, e aparece Freddie Mercury como uma sombra, com a mão na cintura enquanto canta, em seguida entram os três cantando com iluminação em feixe único. Então, é utilizado um efeito especial que deixa a imagem parecida com uma colmeia ou caleidoscópio. Este é um momento em que todos cantam em alto volume. Entra uma sequência de imagens que se alternam: o vocalista e o baterista cantando. Um à esquerda e outro à direita, depois eles cantam juntos e a imagem é dos dois. Na sequência, uma das imagens mais famosas do clipe: o rosto do 30 vocalista é multiplicado em imagens azuis que formam uma linha. Depois do efeito especial, o vocalista continua cantando e fica sua imagem no canto esquerdo da tela sendo alternada com a imagem dos quatro componentes cantando. Logo depois, é repetida a imagem em forma de colmeia com os quatro integrantes da banda que vai sendo intercalada com a imagem dos componentes cantando. A forma de colmeia aparece quando as vozes são duplicadas. Depois desta, surge novamente a imagem dos quatro, porém desta vez com um efeito especial igualmente àquele aplicado ao vocalista, em que a imagem se multiplica. Mais uma vez, são intercaladas as imagens dos quatro artistas cantando com o efeito visual de colmeia, mas desta vez acrescentando a imagem de Freddie Mercury no canto esquerdo da tela. Em seguida, surge uma sequência de transições das imagens anteriores uma sobreposta à outra. Quando as imagens da performance da banda com seus instrumentos são mostradas, o ritmo do rock acelera. Nestes momentos as transições dão lugar ao corte seco. As imagens são colocadas em sequência sem a transição. O corte seco dá agilidade à edição. Logo, a música fica com andamento lento: das imagens do pianista, passa para as imagens do guitarrista com transição de sobreposição que se alternam por instantes e no fim da música é mostrada a imagem dos quatro músicos e desta vez os três: o baixista Jonh Deacon, o guitarrista Brian May e o baterista Roger Taylor abaixam a cabeça enquanto Freddie Mercury sussurra os últimos versos da música. 1.3 Tempo Perdido, da banda Legião Urbana Nos anos 1980, década um tanto quanto melancólica, de exacerbação do neoliberalismo, altas taxas de desemprego, pandemia mundial de aids. Restava, uma busca pelas referências de décadas passadas. A banda Legião Urbana, de Brasília, era a primeira a ser influenciada mais visivelmente pelo punk rock. Ela trazia as letras poéticas do vocalista Renato Russo, que foi da banda punk Aborto Elétrico. 31 Figura 09: frames do video?s=989404&o=48 clipe Tempo perdido. Fonte: http://br.video.yahoo.com/mypage/fav_ O videoclipe Tempo Perdido foi produzido no ano de 1986, dirigido pelo jornalista José Emilio Rondeau. A música é composição de Renato Russo para o álbum Dois da banda Legião Urbana. O clipe mostra a influência musical da banda de Brasília. No clipe aparecem fotografias dos músicos Paul Mccartney, Jonh Lennon, Brian Wilson, Bob Dylan, Janis Joplin, Jimi Hendrix, Sid Vicious e Mike Jagger. Alguns dos ídolos mostrados pelas fotos do clipe morreram jovens. A letra faz referência ao tempo que passa, por isso, a vida deve ser aproveitada. Na letra percebe-se a referência ao movimento literário barroco4, com a característica da efemeridade, do carpe diem: “Todos os dias quando acordo, não tenho mais o tempo que passou”, ela é composição de Renato Russo. O clipe é uma espécie de lista de ídolos do pop rock, cuja trajetória se relaciona diretamente com a letra da música. Este clipe não tem intenção de contar uma história com roteiro fixo; busca mais citar o macroambiente da própria música pop, ao modo de uma homenagem que rende ao próprio circuito artístico. O clipe de Tempos Perdidos se diferencia de outros clipes pela forma de filmar a performance da banda, com ângulos e movimentos de câmera pouco utilizados. Os movimentos de câmera são panorâmicas, feitas de cima, dando a impressão de 4 O Barroco foi um período estilístico e filosófico da História da sociedade ocidental, ocorrido durante os séculos XVI e XVII (Europa) e XVII e XVIII (América), inspirado no fervor religioso e na passionalidade. 32 serem realizados com o auxílio de uma grua5, o que facilita a movimentação ampla com planos gerais de cima para baixo, seguidos de planos giratórios como se formassem círculos em torno dos músicos. Percebe-se que o repertório de influências musicais da banda brasileira Legião Urbana estava repleto de ídolos de outras nacionalidades que não a brasileira: americanos e ingleses. A primeira imagem que aparece é o close (plano bem próximo) do botão de volume da guitarra de Dado Villa Lobos. A imagem seguinte, sobreposta à anterior, é a mão de Dado tocando a guitarra. A câmera passeia pelo instrumento até encontrar a outra mão que executa os acordes no braço da guitarra. A imagem do baterista Marcelo Bonfá se funde com a imagem anterior. O enquadramento é aberto a partir do baterista ampliando para que a imagem de toda a banda aparecesse. Logo, Renato Russo começa cantar. Ele mal completa uma frase e a câmera focaliza o aparelho de televisão posicionado em frente à banda, em cima de uma mesinha que mostra fotos dos ídolos anteriormente mencionados. Faz-se um corte seco (sem transição) e a edição passa para a performance da própria banda. A câmera passeia pelo cenário mostrando cada integrante da banda. Na sequência entram mais algumas fotos na TV. Desta vez, as fotos são dos Beatles e de Jonh Lennon. São três fotos e na última a imagem se encerra até os olhos de John Lennon ficarem em evidência. Corte seco novamente, e volta para a banda com imagens do baterista e depois do baixista, fusão (sobreposição de imagens) e mostra Renato Russo dançando freneticamente, algo que se tornou a marca dele. Toda a sequência da dança de Renato é sobreposta às imagens da banda. Em seguida mais fusão de imagens: Renato Russo cantando e a mão no braço da guitarra. A imagem do vocalista continua, o enquadramento é primeiro plano (do busto à cabeça), a câmera gira do lado esquerdo para o direito e quando termina o movimento mostra o baixista. Mais uma vez a câmera mostra a TV com uma sequência de três fotos, entre elas o líder da banda Beach Boys, Brian Wilson. A imagem volta para a banda, a câmera volta a passear intercalando movimentos giratórios em torno de cada músico 5 Suporte onde a câmera é acoplada para a realização de planos que mostram a amplitude da cena, como planos gerais e grandes movimentos rotatórios ou não. 33 com planos que revelam detalhes. Depois vem uma tomada de cima para baixo que dura poucos instantes, novamente o passeio da câmera. Mais uma tomada de cima para baixo que se funde com a imagem da foto na TV. A foto é de Paul MacCartney, outra sequência de fotos novamente, agora doze no total, dentre elas: Bob Dylan, Janis Joplin, Jimi Hendrix, Sid Vicious e Mike Jagger. A imagem mostrada volta para o cenário, a banda se retira enquanto uma senhora, com lenço na cabeça, varre o chão repleto de folhas de jornal picadas. Na TV não aparece mais nada. 1.4 Like a Prayer, de Madonna No mundo dos negócios, Madonna utiliza o escândalo de seu comportamento artístico e pessoal como estratégia de vendas de seus discos e shows. Like a Prayer foi apenas a primeira polêmica de Madonna com a Igreja, que considerou o clipe como blasfêmia. Em agosto de 2006, a Igreja Ortodoxa Russa pediu um boicote por parte dos fiéis ao show de Madonna em Moscou, devido às cenas de crucificação que aconteciam na turnê Confessions6. Madonna aborda temas polêmicos e gera discussão como afirma o autor Douglas Kellner: A complexidade e a sensibilidade das questões raciais, sexuais, de preferência sexual e de classe demonstram a coragem de abordar temas controversos que poucos artistas famosos do cenário musical atacam com sua constância e provocação (KELLNER, 2001, p. 362). Na década de 1980 surge uma moda nos Estados Unidos: boates são inauguradas onde anteriormente havia igrejas. Em Nova York, houve a boate The Limelight que abriu e fechou várias vezes entre os anos 80 e 90. Igualmente a The Monastery que ficava em Seattle; era uma igreja que ficava no centro da cidade e tinha torre com sino e porão. A igreja transformada em boate era de três andares, no porão havia um cinema com assentos de avião. Na Filadélfia houve a Revival que funcionou entre os anos de 85 e 91. É neste contexto da cultura pop e utilizando como cenário uma igreja que surge o clipe Like a Prayer, de Madonna. 6 Matéria publicada dia 04/08/2006, da Redação, site da UOL – UOL música. 34 O videoclipe de Madonna, Like a Prayer foi produzido em 1989 e dirigido por Mary Lambert. A música é composição da própria cantora para o álbum também intitulado Like a Prayer. O clipe tem duração de cinco minutos e trinta e três segundos. Ele versa sobre os assuntos religião e racismo, traçando paralelos entre o tabu do amor interracial e a perseguição sofrida por Cristo. Segundo informações do site da cantora7, chegou a ser cogitada uma versão do roteiro em que haveria cenas de extermínio de negros pelo grupo racista Ku Klux Klan que agia nos Estados Unidos, na década de 80. Por medidas de segurança, esta versão foi vetada. A letra da música fala de mistério, que todos devem se levantar sozinhos, do poder do chamado divino e da força da oração. Figura 10: frames do clipe Like a Prayer. Fonte: vh1brasil.uol.com.br/.../madonna/videos/ As imagens do clipe praticamente traduzem a letra da música. O elemento teatral é utilizado no clipe. O recurso utilizado no fim do videoclipe em que a cortina 7 Disponível em: www.madonnaonline.com.br 35 vermelha desce é extremamente atenuador para qualquer complicação que ela pudesse ter posteriormente. A cortina vermelha é característica do teatro elisabetano, aquele praticado por William Shakespeare no que corresponde ao período barroco, que de alguma forma, também retoma os questionamentos propostos por Madonna em Like a Prayer, como o fato de acreditar na existência de um santo negro que também é um preso, que é condenado por tentar prestar auxílio ao próximo. O teatro é imagético o suficiente para transformar uma prisão, com um negro atrás das grades, em uma nave de uma capela com um santo no andor. É uma espécie de heterotopia na qual um espaço é instaurado em outro de forma dialógica, realizando assim, a utopia do autor. O figurino de Madonna é um vestido vermelho justo, na altura dos joelhos. Mas no começo do clipe ela veste um sobretudo preto por cima do vestido. Na primeira cena, Madonna corre e cai, enquanto entra um som de vento, depois um solo de guitarra que logo dá lugar a música Like a Prayer. Depois que ela cai, a porta da igreja se fecha. Em seguida, aparece a imagem de uma cruz pegando fogo, alusão ao movimento racista Ku Klux Klan. Uma cena de assassinato é mostrada rapidamente. Ela se levanta e aparece a igreja, com uma sequência de imagens que a mostra por fora e vai focalizando a porta. Na cena posterior, um homem negro é levado por um policial. Madonna entra na igreja e começa a tirar o sobretudo. A música, que estava com andamento lento, acelera. São mostradas imagens do interior da igreja, depois Madonna com o casaco nas mãos. Na cena seguinte entra uma sequência de imagens de santos, em estátuas e quadros. Um santo negro é evidenciado pelas imagens. Ele é do tamanho de um homem e está do lado direito do altar, num lugar semelhante a uma cela, com grades. O santo negro chora, a imagem é bem próxima para dar evidência aos olhos. Madonna, ajoelhada, canta agarrada às grades, enquanto observa o choro do santo. Ela se deita no banco, parece sonhar. Entra uma imagem da cantora como se estivesse caindo do céu. Uma integrante do coral a joga de volta, e ela flutua no céu. Na sequência ela beija o pé do santo, abre as grades e acaricia o rosto dele. Ele solta as rosas que segura e a abraça, depois a beija e sai da igreja. Madonna pega um punhal que está no chão. Ela se machuca: são as chagas de Cristo. Ela canta: 36 “Deixe o coro cantar” (música de autoria de Madonna) e aparece na igreja um coro cantando em estilo gospel. A cantora sai da Igreja e testemunha um assassinato. Os homens que mataram uma mulher saem correndo. O santo que virou homem, sem entender o que acontecia, segurou a mulher que acabava de ser morta. A cena é intercalada com o coro cantando animado. A polícia chega e leva o homem. Madonna assiste a tudo sem saber o que fazer. Um dos assassinos olha para ela, que reage correndo. Na cena seguinte, ela aparece cantando e dançando em meio a crucifixos em chamas. Algumas das imagens evidenciam o rosto da cantora, elas são intercaladas a imagens que a mostram por inteiro para dar ênfase à dança. Em seguida ela já está dentro da igreja, dançando com o coro. A cantora do coral que jogou Madonna no céu vai até a frente e dança com ela. Aparece a cena dela deitada no banco. Volta para a imagem da cantora do coral que canta bastante animada, Madonna dança de uma maneira um tanto sensual. A cantora põe a mão na cabeça de Madonna que se ajoelha e continua dançando. Logo vem a imagem dela deitada no banco. O santo negro a beija. Depois aparece a imagem dela dançando ajoelhada, os seios da cantora ficam quase a mostra. Entra uma sequência rápida de imagens: o santo beijando Madonna, a cruz incendiada, a cantora dançando, o santo chorando sangue e o santo de escultura, a imagem se transformando em homem. Ela dança e canta com o coral. O santo volta para o altar e a grade se fecha. Ela está deitada no banco e se levanta olhando para o coral. Aparece o santo em seu altar, ela olha para a direção do santo e aparece o homem negro (o santo) atrás das grades. Ela explica ao policial o que aconteceu. De repente, aparece uma cortina vermelha que vai descendo. Aparece uma imagem dela dançando em meio às cruzes incendiadas. Era uma peça de teatro. Os atores recebem o aplauso e voltam a dançar enquanto a cortina desce. 1.5 Segue o Seco, de Marisa Monte O clipe Segue o Seco tem duração de cinco minutos e dez segundos. Foi produzido em 1995, com a direção de Cláudio Torres e Zé Henrique Fonseca. O tema deste videoclipe é a seca nordestina, assunto recorrente no cotidiano dos 37 brasileiros. O ano de produção coincide com a estreia do VMB (Vídeo Music Brasil) da MTV, no qual Segue o Seco foi o grande vencedor, premiado nas categorias: melhor edição, direção, fotografia e melhor videoclipe do ano. Ele se destaca dentre os demais videoclipes pela fotografia de Nelson Pereira dos Santos. No clipe foi criado o que Thiago Soares (2004, p. 74) denomina “sertão encenado”, devido aos recursos de iluminação, direção de arte e cenografia. Foram recriados elementos e cores encontrados na natureza para montar em estúdio o sertão nordestino. Na fotografia, que se torna o elemento técnico mais importante do clipe, as cores amarelo, marrom e preto transmitem exatamente a angústia de viver na seca. E mesmo se referindo a um problema social, o clipe consegue pôr em evidência a função poética pela junção dos elementos cor, movimento e música. O clipe começa com uma imagem em preto e branco do solo rachado pela seca. O som vem com uma espécie de ladainha sem acompanhamento de instrumentos, só uma voz sofrida de um homem. Depois entram imagem e som de berimbau e outros instrumentos. A imagem a seguir parece um paradoxo: o sol forte e amarelo, as pessoas todas como sombras. A câmera acompanha a coreografia executada por Marisa Monte e a oração das pessoas ao redor de um crucifixo. O verso: “a boiada seca” é retratado em primeiro plano, enfatizando o verso da música. Em seguida a câmera passeia pelo cenário, mostrando o solo seco, o crucifixo e a ossada de boi. As imagens aparecem acompanhando o ritmo da música. O clipe, no geral, é bastante lento, as imagens são editadas num ritmo diferente dos cortes em ritmo acelerado típico dos primórdios do videoclipe. Marisa Monte clama pela chuva a maior parte do clipe. Ela e os figurantes olham para o céu em várias cenas, como se implorassem pela chuva. No refrão, a ladainha do começo se repete, mais uma forma de representar o pedido pela chuva: a própria repetição do tempo que não passa, acentuando o contraste com o imaginário da velocidade do que se convencionou ser um videoclipe. O close (plano muito próximo, com o objetivo de evidenciar o que está sendo mostrado) no rosto envelhecido mostra o sofrimento causado pela seca, retratado na pele do ser humano. Depois vem a cena com as crianças: uma brinca com ossos do boi e a outra está deitada, mostrando que todos sofrem: velhos e jovens. Nesta cena, a referência à pobreza aparece na brincadeira do menino que, sem ter com que 38 brincar, distrai-se de forma tranquila com a ossada de boi, o que culturalmente a outros olhos causaria, no mínimo, estranheza. Figura 11: frames do clipe Segue o Seco. Fonte: nathy.com.br/10-clipes-que-marcaram/ Como sugere o próprio título do CD de Marisa Monte, Verde, Anil, Amarelo, Cor De Rosa & Carvão, este clipe tem um apelo muito forte com o uso de cores, mais especificamente os tons de amarelo. Edgar Moura descreve esse amarelo do Sol: “Ao se por e ao se levantar o sol é amarelo. Se era branco e ficou amarelo é porque perdeu, entre o meio-dia e às seis da tarde, um dos componentes da luz branca. Quando o sol fica amarelo está faltando o componente azul da luz” (MOURA, 1999, p. 194). É justamente essa função poética que se pode observar no clipe 39 porque a cor que predomina é o amarelo e um dos figurinos da cantora é azul a cor que faz para o sol ficar mais forte, ou seja, ela assume para si o sol severo para aliviar a dor deste povo. No momento em que ela faz a prece aos céus, ela está de azul e parece que chega até o céu porque o fundo vai ficando escuro. Outro figurino é um vestido preto, como se estivesse de luto por causa da seca. Marisa Monte é o elo entre o povo sofrido e os céus, ela dá carinho ao menino sem forças, ela chega ao céu pedindo por chuva, ela assume a cor do sol mais forte, por fim ela vive o que vivem os flagelados da seca nos momento em que pede pela chuva – filmada de cima para baixo. 40 2. MULTILINEARIDADE DAS INTERFACES COM OUTROS GÊNEROS AUDIOVISUAIS A produção do videoclipe se caracteriza por ser um espaço de experimentação de linguagens, ou seja, tende a ser um campo da virtualidade da inovação audiovisual. Pode-se considerar que o videoclipe é um processo mediador de linguagens, na medida em que os trabalhos de direção e produção sejam realizados por pessoas com distintas experiências no campo audiovisual (cinema e publicidade) e outras artes (artes plásticas, teatro). Dessa maneira, o videoclipe funciona como prática social no campo audiovisual, embora, evidentemente, seja marcada pela busca da profissionalização a partir do momento em que tenha sido historicamente um trabalho remunerado no mercado audiovisual. Para profissionais da área de comunicação o videoclipe tem funcionado como experiência profissional inicial, ou seja, uma forma de se exercitar qualidades profissionais em fotografia, direção, produção, usando o resultado do trabalho como portfólio ou apresentação de habilidades ligadas ao campo audiovisual. Depois da experiência com videoclipe, esses profissionais buscam tornar-se reconhecidos como aptos para desenvolver outros trabalhos profissionais, e evidentemente remunerados, em programas de TV, filmes, séries e outros. O videoclipe configura-se, portanto, como gênero, a partir das marcas de distinção que produz com relação a outros modelos e tipificações do audiovisual. Trata-se de um gênero audiovisual calcado na experimentação e que vem se apresentando dessa maneira a pelo menos duas décadas. Essa característica traz coesão ao videoclipe na medida em que é concebido em sua pluralidade de ser pensado e concebido. São necessárias citações de clipes que exemplifiquem a hibridação e a contaminação de distintos referenciais discursivos. 2.1 CINEMA No início, o cinema foi apenas fotografia animada, registro do que aconteceu na realidade (LEITE, 2003, p. 14). Com os irmãos Lumière foi possível assistir os 41 primeiros registros de cenas do cotidiano. Nessa primeira fase do cinema a câmera ficava num ponto fixo, seja para captação de imagens da vida real ou peças de teatro. O material filmado não sofria alterações, era emendado. As linguagens do cinema e os elementos estéticos surgiram com Griffith. Ele foi o primeiro a sintetizar a narrativa cinematográfica com closes, travellings e cortes para contar uma história. Ele libertou a câmera da posição de espectadora passiva, passou a ser uma criação artística independente do teatro (LEITE, 2003, p. 16-17). Apesar do cinema ser denominado como sétima arte e que algumas vezes sejam explorados puramente seus aspectos estéticos, ele é arte industrial de massas que depende do retorno dos recursos aplicados em sua produção (SANTAELLA, 2007, p. 35). 2.1.1 CINEMA MUDO O clipe Ela Disse Adeus, dos Paralamas do Sucesso foi produzido em 1998. Com a direção de Andrew Waddington, Breno Silveira e Toni Vanzoni. O primeiro é conhecido como Andrucha, ele é sócio da produtora de vídeo Conspiração Filmes. A empresa é responsável pela realização de diversos videoclipes, entre eles: Uma Brasileira, do Paralamas do Sucesso; Garota Nacional, do Skank e filmes como Carlota Joaquina, Gêmeas, Traição. No início, Andrew Waddington dirigia comerciais para a televisão. Andrucha acredita que “o videoclipe é uma janela para novos talentos”, relatou o jornalista Celso Masson que entrevistou o diretor 8 (Revista VEJA, edição 02/09/1998). Breno Silveira9 iniciou a carreira atuando na área de fotografia em cinema. Também dirigiu comerciais e videoclipes. Em 2005, estreia na direção do longa metragem Dois filhos de Francisco. Seu mais recente trabalho em cinema é intitulado Era uma vez, lançado em 25 de julho de 2008. Silveira também faz parte da sociedade na produtora Conspiração. Disponível em: http://veja.abril.com.br/020998/p_142.html Disponível em: http://www.filmeb.com.br/quemequem/html/QEQ_profissional.php?get_cd_profissional=PE55 e http://www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada/ult90u411971.shtml 8 9 42 Figura 12: frames do clipe Ela disse adeus. Fonte: top100brazil.wordpress.com/.../ Toni Vanzoni10 é diretor de arte, já trabalhou com propaganda, videoclipe e filmes. No filme Eu tu eles, Vanzoni trabalhou em conjunto com Andrucha, realizando a direção de arte. Ele também faz parte da Conspiração Filmes. Em 2010, estreia na direção de longas com o filme Eu e meu guarda chuva, uma adaptação do livro de autoria de Branco Mello, da banda Titãs. A música Ela Disse Adeus foi composta por Hebert Viana e faz parte do álbum Hey Na Na. O clipe foi sucesso de crítica e ganhou cinco das sete categorias em que concorreu na quarta edição do VMB (Video Music Brasil) de 1998: clipe do ano, clipe pop, direção, direção de arte e fotografia. Percebe-se neste clipe a utilização da função de metalinguagem: um gênero audiovisual (videoclipe) falando de outro gênero audiovisual (cinema mudo). A partir desta observação, constata-se que o videoclipe é um espaço para a criação midiática também fazendo referências ao próprio sistema audiovisual. A figura de linguagem antítese aparece em dois aspectos: na contradição entre o antigo e o novo e na contradição entre o não falar do cinema mudo e o cantar do videoclipe. O novo se reveste da linguagem do antigo, para atualizá-lo numa linguagem híbrida do cinema mudo e do videoclipe. Depois do acesso a algumas obras de Charles Chaplin, percebe-se a realização de uma espécie de caricatura, devido à interpretação um tanto exagerada Disponível em: http://www.filmeb.com.br/quemequem/html/QEQ_profissional.php?get_cd_profissional=PE460 e http://bitsmag.com.br/200811271440/imagem/eu-e-meu-guarda-chuva-comeca-a-ser-filmado-em-saopaulo.html 10 43 no clipe. Os diretores utilizaram as técnicas de cinema dos anos 1920, tanto que nas gravações a câmera ficava sempre fixa. A lente usada era igual a da época do cinema mudo. Houve ainda, o cuidado de registrar todas as imagens em película para depois, na fase de pós-produção, sujar o filme arranhando-o manualmente. A troca simbólica é enfatizada não só pela fotografia em preto e branco, mas também pelo som, com o forte ruído do projetor captado pelo áudio. O figurino foi inspirado nas roupas usadas no início do século XX. O clipe começa com uma tela preta e apenas um círculo de imagem que mostra os três músicos da banda: Hebert Viana (vocalista e guitarrista), Bi Ribeiro (baixista) e João Barone (baterista). Eles giram como se fossem bonecos com instrumentos na mão. O clipe conta a história de uma serviçal doméstica do início do século passado que tem envolvimentos sentimentais com os três patrões. As imagens seguintes começam com um pequeno círculo que aumenta e revela uma mulher varrendo o chão e arrumando a casa, lavando o banheiro, lavando e passando roupas. Todas as tarefas são executadas com muito carinho, a serviçal parece bastante contente em realizar as tarefas domésticas. Para demonstrar a satisfação com que realiza os trabalhos ela faz movimentos exagerados como: piscar bastante, por a mão no coração e girar. A serviçal citada é a atriz Fernanda Torres. O que se ouve são os ruídos do projetor de imagens. A doméstica parece adormecer sobre a mesa de refeições, ela desperta com o barulho da porta. Ela pisca várias vezes, alegre porque os patrões estão chegando. Então começa a música. Um a um ela recebe os patrões. O primeiro a chegar é o personagem de João Barone, trajado de terno, que a cumprimenta com um sorriso, mas logo passa a simpatia e ele dá um tapa na serviçal. Depois entra o personagem de Hebert Viana com cartola e capa, que reage com desdém ao carinho da recepção. Mas assim mesmo retribui com um beijo na testa. Por último, entra o personagem de Bi Ribeiro de fraque, mas com uma aparência asquerosa devido ao cabelo (peruca) eles se cumprimentam de maneira pouco convencional, com olhares pervertidos, ela se aproxima e ele a empurra. Ela serve a refeição para o personagem de Bi Ribeiro, manda beijos enquanto amarra o guardanapo no pescoço dele, tentando agradar. Depois costura a meia (piscando para fazer charme) do personagem de João Barone enquanto ele lê um 44 livro. Ela serve vinho (e suspira) para o personagem de Herbert Viana durante sua refeição, mais uma vez ele reage com desdém. O personagem de Bi Ribeiro oferece um pedaço de frango sem a menor cerimônia enquanto agarra a doméstica. Na cena seguinte, o personagem de João Barone tenta agarrá-la no sofá, ela balança as pernas tentando escapar. O personagem de João Barone se irrita com a demora da costura da meia, ela implora para não apanhar, ele dá um tapa nela. O personagem de Bi Ribeiro mostra irritação porque a comida não está pronta. O personagem de Herbert Viana dá um escândalo porque o vinho acabou e também bate nela, ela gira e cai com o tapa. Na sequência, ela apanha novamente do personagem de João Barone e depois do personagem de Bi Ribeiro, ela se sacode inteira enquanto ele a enforca. Muito triste e insatisfeita a serviçal vai para o quarto, tira o vestido e chora, chacoalha o corpo quando chora. O personagem de João Barone olha pela fechadura, ela percebe e fica ainda mais nervosa e joga o vestido na porta. Nesta cena temos um efeito visual: a imagem com formato de fechadura. Em seguida, o personagem de Hebert Viana tenta beija-la, sem sucesso. Depois, o personagem de Bi Ribeiro vai em busca de carícias, também sem sucesso. Ela vai em direção a um baú e pega um porta-retrato, olha, chora e põe junto ao peito. E chorando ela vai até um cais e olha para a Lua. De repente, a imagem se aproxima e revela uma expressão sarcástica de quem já sabia o que ia fazer. O personagem de Bi Ribeiro chora enquanto come, o personagem de João Barone chora abraçado a almofada. Enquanto ela, em outro cômodo da casa, fuma displicentemente sua cigarrilha. O personagem de Herbert Viana está triste bebendo vinho. Na cena seguinte, aparecem os três juntos chorando por ela. Então, ela faz um carinho em João Barone. Enquanto ele se banha na banheira, ela o afoga com cinismo e alegria no olhar. O personagem de Herbert Viana é a segunda vítima. Ele está bebendo vinho, ela coloca veneno na taça. Ele bebe, fica sufocado e morre. O personagem de Bi Ribeiro que aparece várias vezes comendo. Ela aproveita o momento de colocar o guardanapo no pescoço dele e o enforca. Ela chuta um a um no cais para que caiam na água. Encerra com a imagem dela fumando a cigarrilha calmamente com um sorriso no rosto. 45 2.1.2 TRILHA SONORA DE FILME O clipe I Disappear, da banda Metallica tem duração de quatro minutos e trinta e quatro segundos. A direção é de Wayne Isham11 e o ano de produção é 2000. O diretor já trabalhou com artistas de diferentes estilos musicais, dentre eles Britney Spears, dirigindo o clipe da música I’m not a girl, not yet a woman, de 2004. Michael Jackson com o clipe da música You are not alone, de 2003. Dave Matheus Band com o clipe Satellite, de 2001. Will Smith com o clipe Miame, de 1999. A extinta banda de rock Skid Row, com os clipes Psycho love e Wasted time, ambos de 1993. A música I Disappear, composta pela banda Metallica faz parte da trilha sonora do filme de ação Missão: Impossível 2, do diretor John Woo. Com os atores Tom Cruise, Anthony Hopkins, Thandie Newton e Dougray Scott. O agente secreto Ethan Hunt (Tom Cruise) interrompe suas férias e se reúne com sua equipe de agentes para procurar um agente renegado que ameaça a humanidade. A ameaça é o vírus letal chamado quimera e a missão é recuperar e destruílo. Para atingir o objetivo o agente se vê obrigado a se aliar a uma ladra profissional (Thandie Newton), ex-namorada do agente renegado (Dougray Scott). O filme é repleto de cenas de ação, ele foi inspirado na série de TV com mesmo nome e que foi ao ar na década de 60. É dessa série que vem a frase: “esta mensagem se autodestruirá em cinco segundos”. As cenas do clipe têm início com um pequeno resumo do que está por vir: imagens justapostas do filme e da banda Metallica: James Hetfield (vocalista), Kirk Hammett (guitarrista), Jason Newsted (baixista) e Lars Ulrich (baterista). As cenas são montadas com cortes, aproximações e zoom bruscos no ritmo da música, com os acordes da guitarra. O aspecto técnico mais relevante deste clipe é o roteiro que, além de cenas do filme, valoriza a performance da banda com os instrumentos. É importante frisar que a sincronia entre som e imagem na edição ressalta a energia do ritmo da música. O clipe traduz a tônica do filme sem precisar mostrar inúmeras cenas dele. O roteiro apresenta situações que despertam a curiosidade para saber o que acontecerá. Os 11 Disponível em: http://www.imdb.com/name/nm0410864/#director1980 46 clipes de trilha sonora de filmes funcionam como processo de trocas simbólicas e legitimação de audiovisuais. As únicas cenas do filme incluídas no clipe são do personagem principal Ethan (Tom Cruise), o cenário é o Grand Canyon americano. A escolha do cenário faz um recorte específico do filme, a partir do qual se pensa o roteiro. São quatro histórias, uma para cada componente, elas são intercaladas com a performance da banda Metallica no Grand Canyon. Durante o clipe o zoom in e zoom out 12 são utilizados para indicar de qual personagem é a próxima cena que está sempre acompanhada da batida frenética da música. Figura 13: frames do clipe I desappear. Fonte: www.mtv.fr/.../?playlist=metallica-videographie Ainda sobre a escolha de cenário, aparece a figura de linguagem antítese, porque os clipes de heavy metal geralmente mostram imagens sombrias, escuras e algumas vezes desagradáveis. Neste clipe, aparece o sol forte, o céu azul e o 12 Efeito de aproximação e afastamento do ponto de observação, respectivamente. 47 cenário arejado do Grand Canyon. No figurino permanece o visual tradicional do heavy metal: preto e couro. O clipe começa com um grande plano geral, utilizado para localizar o espectador na história, do Grand Canyon. Em seguida, os componentes da banda são apresentados um a um com seus respectivos instrumentos. As primeiras cenas funcionam como um parágrafo introdutório. A primeira história é a do guitarrista Kirk Hammett que está perdido no deserto e repentinamente é perseguido por um avião que faz voos rasantes e ameaçadores ao personagem, que corre desesperadamente tentando escapar. Para dar agilidade à edição, são colocadas cenas de diferentes ângulos, as imagens são aproximadas e afastadas e os cortes da edição acompanham a batida da música. A segunda história apresentada é a do baixista Jason Newsted, que aparentemente é um executivo ou empresário confuso em meio a uma multidão de pessoas muito bem trajadas que sobe uma escada. Para enfatizar a confusão em que o personagem se encontra é utilizada uma câmera subjetiva que se movimenta como se estivesse conectada ao ator. Novamente aparecem imagens aproximadas e afastadas que estão aliadas a tomadas do personagem subindo e descendo a escada, trombando nas pessoas em meio à multidão. Num dado momento ele cai e começa a utilização da câmera subjetiva, o personagem fica parado enquanto a multidão sobe e desce a escada, depois recomeça uma sequência de imagens dele subindo e descendo e volta para banda. Em seguida é a vez do vocalista James Hetfield, com tomadas rápidas e planos detalhe (do volante, do anel tocando guitarra e dirigindo, do pé no acelerador) são mostradas imagens dele num carro preto em alta velocidade fugindo de uma onda catastrófica que destruía tudo pelo caminho. Nesta parte, a descrição das cenas fica por conta dos planos próximos e detalhes. Após as cenas do vocalista, as imagens voltam para o Grand Canyon, por onde a câmera passeia e logo são acrescentadas cenas do filme do personagem Ethan escalando as estruturas rochosas. As histórias encerram-se com o baterista Lars Ulrich que está num prédio olhando compenetrado pela janela de onde de repente corre desesperado fugindo de uma onda catastrófica (semelhante aquela da qual o vocalista fugia). Ele passa por 48 vários cômodos do apartamento, com grades e depois de tanto correr ele se joga pela janela, a queda é enfatizada com um zoom out, depois zoom in, inverte o ângulo e zoom in novamente. A última cena da banda é uma ventania com muita areia. Finaliza com imagens do filme, o personagem Ethan no Grand Canyon. Observa-se também o inverso: a linguagem do videoclipe sendo referência incorporada pelo cinema. O filme Corra Lola Corra, de 1999, dirigido pelo alemão Tom Tykwer, é um exemplo da estética do videoclipe no cinema. O roteiro, que justapõe três possibilidades de narrativa em um mesmo filme, mistura as linguagens de cinema, videoclipe, videogame, música e animação. 2.2 TELEVISÃO Segundo o pesquisador de linguagem Patrick Charaudeau: A televisão é o domínio do visual e do som, lugar da combinação de dois sistemas semiológicos, o da imagem e o da palavra. Dessa combinação nasce um produto, talvez mais apto do que outros a fabricar imaginário para o grande público, isto é, um espelho que devolve ao público aquilo que é a própria busca de descoberta do mundo (CHARAUDEAU, 2006, p. 222). A pesquisadora Yvana Fechine relata que autorreferencialidade é a característica mais evidente em toda programação televisiva contemporânea. A programação é autorremissiva e autopromocional. A televisão é a principal aliada da sociedade de consumo, então ela alimenta o consumo de si mesma. (FECHINE apud MACHADO, 2007, p. 103). A característica citada acima se enquadra nos videoclipes analisados a seguir. 2.2.1 SÉRIE DE TV Os Beastie Boys foram o primeiro grupo de rap bem-sucedido composto por brancos. Eles começaram com o punk rock, mas acabaram mudando para o rap. O clipe Sabotage foi dirigido por Spike Jonze, que já trabalhou na direção de videoclipes de vários artistas como: Crush with eyeliner da banda REM, produzido em 1995; Eletrobank da dupla Chemical Brothers, de 1997; Home de Sean Lennon, 49 de 1998; It’s in our hands da Björk, produzido em 2002. Spike Jonze dirigiu o filme Quero ser Jonh Malkovich, no ano de 1999 e para televisão trabalhou como criador e produtor executivo do programa Jackass. Figura 14: frames do clipe Sabotage. Fonte: www.babelgum.com/.../beastie-boys-sabotage.html Produzido em 1994, o videoclipe Sabotage faz uma paródia das séries policiais de televisão da década de 70. Para marcar essa referência, aparecem no clipe os créditos como os que apareciam nos seriados. Nesse caso, o videoclipe utiliza a linguagem televisiva das séries das décadas de 1980, como Miame Vice. No clipe, os integrantes da banda estão caracterizados de policiais com perucas e bigodes. O roteiro traz o cotidiano satirizado de policiais. São mostradas 50 as dificuldades de uma perseguição policial de carro e a pé. Durante as cenas de perseguição a sirene é bastante enfatizada. As operações com agentes disfarçados dão o toque de humor, presente no desenrolar do clipe. Nas cenas de queda são utilizados bonecos para ironizar o perigo. É utilizado o clichê dos policiais comerem rosquinhas na tocaia. O videoclipe Sabotage foi um grande sucesso na MTV, mas o fato que chama a atenção é que o clipe não ganhou nenhum prêmio no Video Music Awards de 1994, tendo em vista que ele concorreu em quase todas as categorias existentes na época: vídeo do ano, melhor vídeo de grupo, vídeo que fez sucesso, melhor direção e escolha do espectador. Outra questão é que os personagens interpretados pelos Beastie Boys extrapolaram o próprio clipe, os rapers deram entrevistas e participaram de programas devidamente caracterizados como policiais retratados nas séries de TV. Um outro videoclipe que cita a série de TV Miame Vice é Burning ´Up, da banda americana de pop rock Jonas Brothers. Produzido em 2008 ele cita também os filmes 007 e Kill Bill. O videoclipe é dirigido pelos irmãos Emmett e Brendan Malloy. Nas interpretações, cabe ao irmão Joe Jonas o papel de policial bigodudo, Rick Lava, que prende o bandido e salva a mocinha. 2.2.2 PROPAGANDA DE TV Um clipe que pode facilmente ser confundido com uma propaganda é Sneakernight, da cantora americana Vanessa Hudgens. Na Noite do Tênis, a cantora calça o par de tênis para dançar. Vários takes13 têm o objetivo principal de mostrar os tênis. Um efeito especial que torna os cadarços iluminados como néon é utilizado para dar ainda mais ênfase aos calçados. Em alguns momentos, a cantora dança diante de um cenário que tem os cadarços em néon ampliados. No decorrer do clipe, esse efeito especial dos cadarços em néon é mantido enquanto os dançarinos executam a coreografia. A marca de calçados Ecko é patrocinadora do videoclipe. 13 É a tomada que começa quando a câmera é ligada para gravar e termina quando a câmera para de gravar. 51 Para constatar essa relação próxima do videoclipe Sneakernight com comerciais de calçados, é feita a comparação com as propagandas dos tênis Bamba, de 198214 e dos tênis da Sandy15. No videoclipe e nas duas propagandas os personagens desenvolvem coreografias, os takes são, na maior parte, dos pés dos dançarinos. No comercial dos calçados Bamba os atores desenvolvem a coreografia dentro de um fliperama gigante que se ilumina a todo instante. No anúncio dos tênis Sandy Sounds, exibido no início de 2008, da marca Grendene, a cantora dança enquanto toca uma espécie de piano gigante montado no chão, que se acende quando ela põe o pé, referenciando ao filme Quero ser grande, de 1988, protagonizado por Tom Hanks e dirigido por Penny Marshall. Podemos observar a troca simbólica da propaganda com videoclipe na produção do ano de 2007 Coisas que eu sei, do álbum música nova, que são composições da cantora brasileira Danni Carlos. O clipe revela, em imagens detalhadas, o rosto da cantora. Percebe-se a clara intenção de promover a imagem da mesma para que o público a identifique. Imagens da cantora tocando violão também são mostradas. O figurino e a cenografia são brancos e minimalistas para que a cantora tenha atenção total. Em alguns momentos entram em cena pétalas de rosas vermelhas que se assemelham com propagandas de perfumes das marcas Kenzo, Valentino e Nina Ricci, devido ao cenário vazio e claro, à atuação da cantora e à utilização de pétalas de rosas. Também se observa o fluxo contrário: a propaganda se utilizando da linguagem do videoclipe. De acordo com Juliana Souto e Thiago Soares (2005), a Rider, marca de chinelos e sandálias, por intermédio da W/Brasil, empresa de propaganda, produziu uma série de vídeos que utilizavam a linguagem do gênero videoclipe. Eles esclarecem que a aproximação do VT publicitário da Rider com a indústria fonográfica se deu através do lançamento do Rider Hits. Um CD que continha músicas pop que fizeram parte de seus comerciais. No total foram 14 VTs musicais produzidos entre os anos de 1993 e 2004. 14 Disponível em: http://www.YouTube.com/watch?v=KL-jMgU8uj0 15 Disponível em: http://www.YouTube.com/watch?v=0mMTSb_Swuc&feature=related 52 Os comerciais criaram um simbolismo para a marca, identificando-a como parte da cultura brasileira. Com a utilização de imagens da natureza do Brasil. Os pesquisadores concluem que mais do que uma simples propaganda de chinelos, a linguagem publicitária foi capaz de utilizar-se de um gênero de forte influência no público jovem, o videoclipe. Criando assim, uma esfera de consumo muito mais abrangente e sedutora (SOARES; SOUTO, 2005) Uma técnica semelhante é usada nos comerciais de xampu da marca Seda, linha Sunsilk. O VT publicitário e a música popular massiva se encontram. O comercial, que custou cerca de R$ 30 milhões devido aos direitos de imagem e autorais, foi ao ar em fevereiro de 200816 no Brasil. Para a propaganda foram utilizadas personalidades da indústria do entretenimento: cinema e música. A ideia principal da campanha é mostrar mulheres com comportamento de vanguarda em relação aos cabelos. Com o slogan “a vida não pode esperar” é insinuado que a mulher deve estar a frente de seu tempo, elas conseguirão isso usando o xampu. A partir da utilização das imagens da atriz Marilyn Monroe e das cantoras Shakira e Madonna a marca mostra que se estas estrelas que adotaram/adotam posturas inovadoras em seus cabelos estão vinculadas à Seda, então, as mulheres vanguardistas devem confiar no produto. A propaganda é dinâmica na edição e traz a imagem dessas três mulheres para abarcar três públicos diferentes: meia idade, jovens e adultas. 2.3 DOCUMENTÁRIO Definir documentário exatamente não é algo fácil, mas pode-se estabelecer que ele seja uma representação do mundo em que vivemos. Às vezes, é classificado como reprodução do real devido à fidelidade com o original (NICHOLS, 2005, p. 47). Apesar de não ser um gênero com características fixas, podemos estabelecer algumas convenções para distinguir o documentário de outros: comentário em off (que Nichols denomina voz de Deus) entrevistas, gravação de som direto, imagens 16 Disponível em: http://trilhacomercial.com/2008/04/21/3-estrelas-nesse-comercial-da-seda/ 53 de pessoas realizando tarefas cotidianas e a predominância de uma lógica informativa que organiza as representações da realidade presentes no filme (NICHOLS, 2005, p. 54). Michel Moore, diretor do documentário Bowling in Columbine, dirige o clipe Boom para a banda System of a Down. No clipe, não aparecem imagens da banda tocando. As imagens editadas são de manifestações antibélicas de vários lugares do mundo. O que se vê é a linguagem do documentário sendo trazida para o videoclipe. A referência, em tom de documental, também é observada no clipe A Minha Alma, da banda O Rappa. O videoclipe traz assuntos de violência e cultura periférica, a direção do clipe é de Kátia Lund, que codirigiu os filmes Cidade de Deus e o documentário Notícias de uma guerra particular. Vitor Amati e Cássio Amarante dirigiram o clipe da música Luz dos olhos, de Nando Reis. Os diretores denominaram de reality clip (de reality show), porque era um pequeno documentário sobre um casamento. O clipe mostra imagens dos preparativos do casamento e encerra com um show surpresa de Nando Reis depois da cerimônia. O casal que protagoniza o clipe foi escolhido dentre os casais que apareceram para a seleção. Os diretores do clipe anunciaram no jornal impresso que seriam feitos testes para a escolha de um casal para o clipe da música Luz dos olhos de Nando Reis. Entre outras variações, o comentário social, presente em documentários apareceu bastante em videoclipes brasileiros. Entre eles Diário de um detento, dos Racionais MCs. Dirigido por Maurício Eça, o videoclipe mostra o cotidiano dos presidiários e relata a chacina de 111 presos no Pavilhão Nove do Presídio do Carandiru, em São Paulo. A letra nasceu de uma carta entregue a Mano Brown numa visita ao presídio. A partir da carta do preso e mais algumas histórias, foi feito o rap que conta a versão dos presos sobre a chacina ocorrida em 2 de outubro de 1992. O fato aconteceu com a intervenção da tropa de choque da polícia militar de São Paulo. E esta história se repete no filme Carandiru, de Hector Babenco. A chacina teve grande repercussão e também apareceu na letra da música Haiti, de Caetano Veloso. 54 O diretor de videoclipes Maurício Eça já dirigiu mais de cem clipes, segundo informações do Jornal da Tarde17. A formação dele é em cinema, mas começou na publicidade, e devido à vontade de experimentar foi dirigir videoclipes. Já trabalhou com as bandas: Bidê ou Balde, Detonautas, CPM22, e artistas como Pitty, Marcelo D2, Supla e outros. Foi a partir do contato que teve com rap e hip hop na direção de Diário de um detento, que ele iniciou o documentário Universo paralelo, produzido em 2004. Figura 15: frames do clipe Diário de um detento. Fonte: www.gamesis.ru/index.php?key=DETENTO Ana Rosa Marques (2007) analisa a forma do documentário Surplus, feito para a TV pública da Suécia, dirigido pelo cineasta Erik Gandini. As gravações aconteceram na Índia, nos EUA, em Cuba, na Hungria, na Itália e na própria Suécia utilizando suporte digital e película. O documentário aborda a questão da cultura de consumo, seus efeitos ambientais, econômicos e sociais. A pesquisadora afirma que no aspecto formal, é utilizada a linguagem do videoclipe, que ela classifica como: “imagens estilizadas e virtuosísticas, uso intenso de músicas, ênfase no sentimento e na emoção, centralidade no ritmo, montagem fragmentada e descontínua, manipulação e inversão temporal” (MARQUES, 2007, p. 05). Ela também justifica 17 Disponível em: http://www.jt.com.br/editorias/2006/06/21/var-1.94.12.20060621.1.1.xml 55 que a narrativa em alguns momentos se torna seqüência musical, evidenciando que a linguagem do videoclipe permeia o documentário. 2.4 ANIMAÇÃO A história da animação digital está diretamente relacionada com a história da computação gráfica. Desde os primeiros dispositivos disponíveis percebeu-se a possibilidade de uso para geração de ilusão de movimento. A animação em 3D é o sucessor digital da animação por stop motion. A figura animada é modelada no monitor e “vestida” com um esqueleto virtual. Então os membros, olhos, bocas, roupas, entre outros, da figura em 3D são movimentadas pelo animador18. O primeiro desenho animado foi de Émile Reynaud, que criou o sistema de animação de 12 imagens, o praxynoscópio, um sistema próximo do projetor de filme. O desenho foi apresentado em 1892. O primeiro desenho animado exibido com o projetor de filmes moderno foi Fantasmagorie, dirigido por Émile Courtet. Segundo Jarbas Agnelli19 a animação em videoclipes começou há 19 anos com o clipe Money for Nothing, da banda Dire Straits. Era um tipo de animação rudimentar com formas quadradas que se valiam da repetição. Além do 3D foi utilizada outra técnica, uma pintura sobreposta a imagem nas cenas da performance da banda. A banda fazia referência à MTV durante o clipe, na letra da música e com as imagens de vinhetas da emissora. Utilizando a linguagem de animação, a banda Gorillaz, que se apresenta em forma de desenho animado. É uma banda que não tem rosto, os clipes são feitos apenas com animação. Damon Albarn (vocalista da banda Blur), Jamie Hewlet Dan (desenhista gráfico) e Dan Nakamura (produtor) são os criadores da Gorillaz, mais conhecida como banda de cartoons. O trabalho foi lançado no final de 2000, incluindo clipes e desenhos animados em 2D para a TV e internet. O primeiro clipe da banda foi intitulado 19-2000. 18 Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Desenho_animado Diretor de clipes, comerciais e produtor trilhas sonoras. Dirigiu os clipes Made in Japan e Anormal, da banda Pato Fú, Instinto Coletivo, O Rappa, entre outros. 19 56 A produção do videoclipe Segredos foi realizada em 2002, com a direção de Maurício Vidal, Renan de Moraes e Léo Santos e duração de quase quatro minutos. O clipe Segredos evidencia o uso das novas tecnologias de informática na concepção de projetos audiovisuais no Brasil. Ele foi eleito pelo público carioca como o 3o Melhor Curta Brasileiro do 10o festival Anima Mundi, em 2002. Ganhou os prêmios de Melhor Clipe Pop e Melhor do Ano no VMB (Vídeo Music Brasil da MTV) e em 2003 foi eleito pelo público como Melhor Clipe do Ano no 10º Prêmio Multishow de Música Brasileira. Ele é considerado a primeira experiência em animação 3D para videoclipes feitos no Brasil. Figura 16: frames do clipe Segredos. Fonte: vh1brasil.uol.com.br/musica/artistas/frejat/ 57 O clipe conta a história de um homem que busca o amor ideal. Ele se apaixona pela lua, são mostrados todos os planos e as tentativas do personagem para chegar até o grande amor: a lua. Começa com uma tomada do terraço de um apartamento, o personagem está de costas falando ao telefone. Ele desliga de forma brusca, suspira, olha uma foto e a joga num baú cheio de outras fotos. Então, ele vai para fora tentar esquecer tudo. Com a expressão de desapontamento ele pensa por instantes e olha para o céu e vê a lua com expressão e rosto feminino, ela (lua) pisca para ele. Logo, ele pensa ter encontrado o grande amor. Ele começa pôr em prática os planos para chegar a lua. Durante a execução dos planos são intercaladas imagens da performance de Frejat tocando violão de roupa preta, sem cenário, só um fundo branco. Neste momento a opção estética pelo minimalismo vem para enfatizar somente a imagem do cantor tocando o violão. Muito animado com a piscada da lua, nas pontas dos pés ao melhor estilo desenho animado, ele vai em direção à mesa de desenhos. Ele desenha bastante e o primeiro plano é ser arremessado com o auxílio de um canhão. Cada detalhe do movimento, em grande velocidade, do arremesso foi lembrado. O arremesso é concluído, mas um avião desvia o personagem e impede a sua chegada. Mas ele não desiste e volta à mesa de desenhos. Após as várias tentativas inspiradas pela musa, ele planeja alcançar seu objetivo com um balão. Começa, então, devagar, compassado, mas ao olhar para lua, o personagem se empolga demais e põe tudo a perder, enche muito o balão que acaba por estourar. Mas ele não desiste, ‘vai até o fim’ como diz a letra, e nas pontas dos pés, novamente, recomeça com o plano mais ambicioso: um foguete. Para mostrar esta cena, a câmera passeia pelo terraço até chegar à mesa de desenhos com o rascunho do foguete. O lançamento é mostrado em três ângulos diferentes: plano geral do prédio acompanhando o foguete, plano conjunto do foguete que vai aproximando e, outro, da lua para a terra. Muito perto da amada, ele se desprende do foguete e fica em meio às estrelas, como se voasse, em êxtase. Quando ele chega finalmente na lua, a euforia rapidamente dá lugar ao desapontamento e decepção. A imagem vai abrindo e ele fica pequeno como uma formiga diante da imensidão da lua. Ele fica pensativo enquanto caminha pela 58 superfície dela. Volta para a atuação do boneco com o violão. Uma chuva de fotos cai sobre o boneco, dentre elas uma foto do planeta terra. Ele olha e fica encantado, ela (a Terra) pisca, é uma nova paixão. Ele se apaixona pela terra, como um recomeço. E de volta a mesa de desenhos ele planeja como voltar para sua amada Terra. 2.5 VIDEOARTE Muitos procedimentos inventados pelos artistas do vídeo foram imediatamente incorporados em filmes e em videoclipes na televisão. Aliás, são muito tênues as distinções entre os vídeos que são produzidos estritamente como obras de arte e aqueles que surgem como ferramentas promocionais para a indústria da música (SANTAELLA, 2007, p. 35). O videoclipe também busca referência no formato videoarte, que nada tem a ver com a linguagem da televisão e muitos menos do cinema. A narrativa descontínua é muito presente na videoarte. Para Jean-Paul Fargier, as imagens em vídeo remetem ao ruído e têm a finalidade de tornar toda imagem barulhenta (FARGIER in PARENTE, 1993, p. 231-232). Sobre a desarmonia do videoclipe, também presente na videoarte, escreve Soares: O videoclipe agrega, portanto, os conceitos de conflito gerador de idéia, a partir dos estudos de semiótica russa de Eisenstein, além de ocupar um lugar na esfera midiática como um objeto marcadamente desarmônico. E é pelo fato de ser desarmônico que o videoclipe rege tantas noções existentes na sociedade contemporânea. Neste sentido, a desarmonia existente no clipe é integradora de uma máxima da contemporaneidade que, de alguma maneira, exige a existência de forças criadoras que vão de encontro ao princípio estático da regularidade (SOARES, 2004, p. 26). De acordo com Osmar Gonçalves dos Reis Filho, videoarte seria a “estética do vago”, com uma linguagem constituída mais de ruídos do que de sinais, é a indeterminação elevada à categoria estética, na qual o sentido se desfaz, é uma busca por extensão e polifonia (REIS FILHO, 2007, p. 03). Enquanto o cinema trata a imagem como quase sagrada, o vídeo tem uma postura diferente e ousada para 59 desconstruir a imagem. Ele afirma ainda, que a lógica do vídeo não se baseia no conforto, nem na harmonia e na beleza, mas no choque, provocação e denúncia. O pesquisador conclui que a videoarte tem caráter abstrato, com apelos visuais mais gráficos e rítmicos do que fotográficos, colocando a ênfase do processo comunicativo nas sensações (REIS, 2007, p. 12). Um videoclipe que utiliza a linguagem da videoarte é Alala, da banda Cansei de ser Sexy, produzido em 2006 e dirigido por Cat Solen. A diretora também trabalhou com a banda no videoclipe Let’s make love and listen to death from above. Um fato que merece ser notado sobre o clipe em questão é que esse é um segundo clipe feito para a música Alala. A outra versão foi feita em 2005, com direção de Daniel Zanard. O primeiro clipe tem uma proposta bem diferente do segundo. A produção de 2005 é feita em locação externa, com paisagem bucólica. São intercaladas as imagens das componentes tocando os instrumentos musicais com a história de uma caixa de papelão que as persegue. Em entrevista20 concedida ao site Banana Mecânica, de música independente, a diretora Cat Solen diz que a ideia inicial era unir uma música forte a imagem de recuperação de um machucado. O videoclipe conta o que acontece após um incidente durante a festa de amigos a beira da piscina. Tudo começa quando uma das convidadas tropeça no cachorro e cai. Outro convidado aponta e ri, é o suficiente para iniciar a maior confusão: roupas rasgadas, olhos roxos, machucados, garrafas quebradas. As cenas de briga são intercaladas com as imagens de cada compenetre da banda tendo seus machucados curados, devido à inversão da ordem das imagens. As imagens e a música se aproximam do gênero videoarte devido à descontinuidade das imagens e da utilização da inversão da ordem na edição. Na sonoridade da música podemos notar ruídos eletrônicos pouco usuais na música popular massiva. Podemos notar a utilização de efeitos especiais em maquiagem para que os componentes da banda pareçam acidentados, o que gera um certo desconforto para quem assiste. Esse não é um procedimento muito usual em videoclipes, o mais próximo disso é a maquiagem para que os personagens sejam transformados em monstros (caso de Thriller). 20 Disponível em:http://www.tonelada.org/conteudo/index.php?op=ViewArticle&articleId=127&blogId=4 60 Figura 17: frames do clipe Alala. Fonte: www.quartopiso.com.br/.../ No geral, os clipes mostram a banda de maneira favorável à imagem: bem maquiados, bem vestidos. Mas o objetivo dessa banda é justamente vir com novas propostas. Cansei de ser Sexy (CSS) foi formada em São Paulo em setembro de 2003, ela mistura influências de rock, pop, música eletrônica, cinema, design e moda. Está entre as bandas brasileiras de maior visibilidade internacional, caracterizandose pela sua postura pretensamente despreocupada e alternativa. 61 3. VIDEOCLIPE NAS TRANSFORMAÇÕES DA MÍDIA: MASSIVA, SEGMENTADA E EM REDE A partir dos relatos citados no capítulo anterior, é possível observar que o videoclipe, em seus primeiros momentos como gênero audiovisual, começa a ser veiculado em programas da TV aberta, ou seja, no modelo midiático da comunicação de massa caracterizada pela fórmula “uma mensagem para todos”. Posteriormente foi criado um canal de exibição inteiramente dedicado a videoclipes, a MTV, que inicia suas atividades com transmissão a cabo, ao modo de uma comunicação segmentada, mas que depois migra para o modelo da TV aberta, num processo de massificação numérica. Atualmente existem outros canais de TV, além da MTV, que apresentam clipes na grade de programação. A MTV é a única emissora em canal aberto que tem sua grade de programação baseada especificamente em veiculação de videoclipes. Os outros canais são pagos, com transmissões feitas via cabo ou satélite. Existe ainda a possibilidade de consumo de videoclipes em computadores e em aparelhos eletrônicos portáteis como os tocadores de MP4, telefones móveis, smartphones e outros equipamentos. Quando estes suportes midíaticos têm capacidade de acesso à internet, essa conexão caracteriza a transformação tecnológica que sugere a dinâmica da cibercultura. 3.1 Videoclipe na comunicação de massa: MTV A cultura de massa, regida pela lei do mercado, norteia-se pela dinâmica entre produção e consumo em grande escala, o que só se tornou possível com o advento das mídias impressas e eletrônicas com seu poder de difusão de mensagens para muito além do local de produção. Nessa perspectiva, a comunicação de massa torna-se um modelo midiático moldado pela produção de uma mensagem para todos e qualquer um, num padrão mercadológico caracterizado pela padronização da produção oriunda do fordismo. Lucia Santaella (2003, p. 79) relata que foi com o advento da televisão que se solidificou a ideia de homem-massa e a ideia de mídia 62 de massa. Segundo ela, não fazíamos ideia da existência de consumo de massa e psicologia de massa até que a TV fizesse delas o seu conteúdo. O videoclipe, do modo como é inicialmente concebido, emerge nessas condições da comunicação de massa tendo a TV aberta como veículo central. Nos anos 1960 surgiu a banda The Beatles, que teve papel preponderante nas transformações culturais da época. Eles lançaram filmes musicais e produziram vídeos promocionais, denominados promos. O vídeo promocional da música Help, produzido em 1965, traz uma edição dinâmica de imagens, enfatizando na fotografia cada componente da banda. O vídeo começa com o primeiro verso sem que haja imagens, apenas um fundo preto. A marcação da música é enfatizada com o plano detalhe de Ringo Star tocando a bateria e dele evolui um zoom out (movimento de afastamento de câmera) que revela o baterista por inteiro. Em seguida, na batida da música, faz-se um corte para um plano geral com a banda toda no estúdio. O vídeo mostra cada componente cantando, os enquadramentos escolhidos são primeiro plano e primeiríssimo plano para que as pessoas se familiarizassem com o rosto de cada um deles. Os takes enfatizam detalhes dos músicos tocando seus instrumentos, intercalando com alguns momentos da banda toda em plano geral. Outro recurso técnico de captação de imagem é a utilização do foco, que ora está no detalhe de George Harrison tocando a guitarra e ora de John Lennon cantando. O que chama atenção no vídeo é a alegria com a qual Ringo Star toca a bateria. Com o vídeo de Help percebe-se que os empresários sabiam exatamente o que estavam fazendo. Eles queriam que o público conhecesse as músicas, mas também identificasse prontamente os cantores, por meio dos vídeos promocionais e aparições da banda em programas de TV. Neste processo, o videoclipe surge na indústria fonográfica e audiovisual depois que já estava instaurada a cultura pop. Tal termo é utilizado para descrever o momento de crise em que estava a arte e a indústria cultural com um possível entrelaçamento de ambas. Na década de 1970, alguns artistas gravaram vídeos em estúdio utilizando a técnica de chroma key. A banda inglesa Black Sabath gravou no início daquela década os vídeos das músicas Paranoid e Iron Man, ambas do álbum Paranoid. O álbum é o maior sucesso da banda. Os vídeos foram gravados em estúdio com fundo 63 verde ou azul, e então editados com a sobreposição do fundo original das imagens, o chroma key. No Brasil, esse recurso técnico foi bastante explorado pela revista eletrônica Fantástico, da Rede Globo de Televisão. Clara Nunes, com a música Macunaíma, Jorge Ben, com a música Namorado da Viúva, e Raul Seixas, com a música Sociedade Alternativa, todos tiveram vídeos gravados em meados de 1970 com produção do programa Fantástico. Em 1975, o programa inova ao gravar os vídeos musicais ao ar livre, como América do Sul, de Ney Matogrosso. Em 2008, fez vinte e cinco anos de falecimento de Clara Nunes. Foi lançado no mesmo ano o DVD com a coletânea dos vídeos musicais que a cantora gravou para o Fantástico durante as décadas de 1970 e 1980. Devido à aparente simplicidade dos vídeos musicais da época, os críticos consideram que Bohemian Rhapsody, da banda inglesa Queen, seja o primeiro videoclipe. Na medida em que tem efeitos especiais de edição, mostra uma união sincrônica de som e imagem e inova na gravação da música. É a partir da década de 1970 que a indústria fonográfica percebe a televisão como meio de divulgação de música através dos videoclipes, apesar de essa expressão só começar a ser utilizada na década seguinte. Não que isso não tenha sido feito na década de 1960 pelos Beatles. É que naquele momento, o videoclipe passou a ser utilizado por vários artistas. Os Beatles foram os pioneiros do videoclipe, quando ele ainda não tinha esse nome. Os anos 1980, no Brasil, foram marcados pelos programas de videoclipe em várias emissoras: o FM-TV (TV Manchete); o Videorama (TV Record); o Clip Trip (TV Gazeta); o Som Pop (TV Cultura); o Realce (SBT Rio); o Super Special (TV Bandeirantes); o Fantástico e o Clip Clip (Rede Globo). Mas nenhuma das emissoras era específica para videoclipes. Ainda na década de 1980, o modo de consumo de música foi transformado pela estreia, mais precisamente em 1981, nos EUA, da MTV, canal dedicado a exibir exclusivamente videoclipes. No início, a MTV era um canal a cabo, como dito anteriormente, depois passou a ser transmitido em canal aberto. A MTV é um êxito mundial globalizado, que a cada semente plantada em outros países tenta se glocalizar, quer dizer, procura se adaptar as culturas locais adjetivando costumes, cultura, fenótipos e gêneros musicais (PEDROSO, 2006, p. 110). 64 Nesta conjuntura de transformação tecnológica e reinvenções do mercado, o videoclipe passou a ser um elemento através do qual a indústria fonográfica se agregou à indústria audiovisual. O primeiro videoclipe exibido na MTV foi Killed the Radio Star, da banda Buggles. Ele foi produzido em 1979 com a direção de Russel Mulcahy que dirigiu os filmes Highlander e Resident Evil 3. Maria Goretti Pedroso analisa esse videoclipe de estreia e o videoclipe, em particular: Killed the Radio Star não queria só dizer que a TV destronava a rádio. Também queria dizer vídeo kills pop music, ou seja, a imagem completou a música. Não é possível negar que cada videoclipe então foi se desenvolvendo e criando sua própria linguagem. Essa linguagem, única, faz um mix de outras de outras tantas, como música, cinema, televisão, publicidade (PEDROSO, 2006, p. 110). Dois anos mais tarde, foi criado o American Video Awards, festival que premiava os clipes. Em 1987 é a vez da Europa conhecer a MTV, que estreou com o clipe Money For Nothing, da banda Dire Straits. O antropólogo argentino-mexicano Nestor Garcia Canclini descreve a versatilidade da MTV: conquista a audiência de jovens de quase todo mundo, é graças a sua capacidade de combinar várias inovações: mistura gêneros e estilos, de rebeldias roqueiras a melodias hedonistas e “pensamento liberal normalizado”, associa-se a “grandes causas” (lutas contra pobreza, o analfabetismo, a AIDS e a poluição), propondo exercícios de cidadania internacionalizados compatíveis com um sentido moderno e sensual da vida cotidiana (CANCLINI, 2003, p. 150). Assistindo à MTV, a impressão que se tem é que, na programação total, passam um videoclipe que não tem fim, pois toda a programação é pensada para criar a atmosfera musical de forma intensa. Com a emergência da MTV, o videoclipe ganha visibilidade e se firma como gênero do audiovisual. A MTV chega ao Brasil na década de 1990. O clipe que inaugura a emissora, no dia 20 de outubro de 1990, é Garota de Ipanema, uma versão remix de Marina Lima. O clipe foi dirigido pelo americano Jon Klein. A apresentadora que anunciou este clipe foi Cuca Lazarotto. Guilherme Bryan (2005) comenta a escolha do clipe evidenciando que a emissora transformou a música brasileira, e ainda que a escolha 65 do clipe não foi aleatória porque ele continha elementos modernos aliados a símbolos representativos da cultura brasileira. A MTV Americana estabelece que as filiais, além de manterem a linguagem dirigida ao público jovem, também devem ter as marcas da cultura do país que representam. Foi em consequência de toda a diversidade e singularidade que houve a demanda por um canal específico para os videoclipes. Para contextualizar a história do videoclipe, a MTV tem papel primordial, pois é com ela que este gênero audiovisual ganha notoriedade pública. O jornalista Leão Serva faz uma observação sobre a MTV, apontando que tudo começou com uma revolução na maneira de ouvir a música ou senti-la. Deixou de ser apenas apelo sonoro para estimular os outros sentidos a partir da visão. A consequência do apelo visual, o dinamismo e a criatividade, peculiares ao videoclipe, gerou referências para propaganda e cinema, segundo o jornalista (SERVA apud PEDROSO, 2006, p. 3). No dia 28 de julho de 2006, a agência de notícias Reuters (Londres) divulgou a seguinte matéria do jornalista Mike Collett-White: “Canais de videoclipes lutam para sobreviver na era da internet”. Ele afirma que os canais de videoclipe são uma espécie ameaçada no mundo pop e que tais canais estão aprendendo da maneira mais difícil que é necessário se adaptar à era da internet. Ele fala ainda que o programa da BBC21, Top of the Pops, parada de sucessos mais antiga da TV mundial, sairá do ar. Comenta também que a emergência da MTV, um dos motivos do fim do programa, vai se reinventar proporcionando interatividade. E, com base em pesquisa feita no Reino Unido, ele aponta que as pessoas dedicam mais tempo à internet que a TV. 3.2 Videoclipe na cultura das mídias Os autores Douglas Kellner e Lúcia Santaella propõem definições de cultura das mídias que dialogam entre si na medida que citam o uso personificado dos produtos culturais. Santaella (2002, p. 48) esclarece que as fronteiras entre cultura de elite, popular e de massa tornam-se flexíveis e caem no vazio com o advento de A BBC (British Broadcasting Corporation) é uma emissora estatal de rádio e televisão do Reino Unido, fundada em 1927. 21 66 novas formas de consumo cultural proporcionadas pelas tecnologias comunicacionais do disponível e do descartável: fotocopiadoras, videocassetes, videojogos, videoclipes, controle remoto, TV a cabo. Do consumo massificado, no qual cada receptor apenas consome a informação difundida pelos meios de comunicação, passa-se a um consumo individualizado, no qual o campo da recepção tende a fazer uma espécie de gestão do consumo: o indivíduo adequa o consumo às duas necessidades: tempo (pode escolher data) e espaço (onde será consumido). Junto com a sintaxe dos videoclipes e videojogos, que ditam ritmos frenéticos, descontínuos e fragmentários, e com o zapear do controle remoto, foi crescendo a tendência para trânsitos e intercâmbios dos meios de comunicação entre si, criando redes de complementaridades. A estas conexões deu-se o nome de cultura das mídias (SANTAELLA, 2002, p. 49). Fazendo um paralelo das evoluções tecnológicas da comunicação com o início da TV digital, Arlindo Machado (2009, p. 223) enfatiza: “a transmissão direta via satélite, a passagem da TV preto e branco para a colorida e o surgimento do videocassete produziram impactos muito mais profundos nos modos de fazer e ver televisão do que agora a TV digital pode agora insinuar”. A cultura das mídias, ao evidenciar o processo de complexificação da produção, distribuicão e consumo de música, tendeu a exigir da indústria fonográfica o remodelamento de suas estratégias comerciais. Entre outras coisas, a complexificação mudou o cenário musical, até então sob controle de grandes conglomerados multinacionais: Universal Music, Sony/BMG Entertainment, EMI e Warner Music, que juntos controlam mais de 70% do mercado fonográfico (HERSHMANN, 2009, p. 05). Outra questão levantada por Hershmann (2009, p. 6), a partir da crise do suporte físico de gravação, é a denominação das companhias fonográficas e ou gravadoras que pode não estar mais adequada na atualidade, tendo em vista que essas empresas gerenciam as carreiras dos artistas (intérpretes e bandas) no que se refere ao planejamento da agenda e à estrutura de shows. As “gravadoras” estão impondo contratos mais abrangentes aos artistas, com direitos plenos ou múltiplos. Para enfrentar o encolhimento do mercado de fonogramas essas empresas compensam suas perdas com a taxação de bilheterias e recebimento pela transmissão de shows ao vivo (HERSHMANN, 2009, p. 6-7). O 67 crescimento do consumo de música ao vivo não interfere diretamente no consumo de videoclipe porque ele é algo complementar para a música, é ferramenta de divulgação que faz parte da estratégia de marketing montada para cada artista. O videoclipe We made you, do rapper Eminem, produzido em 2009, traz uma miscelânea de citações da cultura das mídias: representada por filmes que sucessos de bilheterias e crítica como Ray Man, Psicose e Fargo, outros apenas comédias pastelão como Austin Powers e o membro de ouro, séries de TV como Jornada nas Estrelas, videoclipes de cantoras como Britney Spears, programas de fofocas que falam da vida de celebridades como Jessica Simpson, Amy Winehouse, Ellen Degeneres e reality shows como Rock of love, do canal VH1 (dos EUA) de televisão por assinatura. A música é uma crítica à mídia que produz celebridades que não têm nada a oferecer ao público senão escândalos e fofocas. O encadeamento aleatório das imagens sugere que esses astros fabricados não têm conteúdo. O clipe citado acima ilustra o que diz Douglas Kellner sobre a cultura das mídias ser a força dominante de socialização. As imagens e as celebridades substituem as instituições família, escola e igreja. As celebridades são os novos modelos de identificação de estilo, moda e comportamento. Dentro de casa, os indivíduos recebem um novo mundo virtual de entretenimento, informação, sexo e política. Dessa maneira, produzem novos modos de experiência e subjetividade (KELLNER, 2001, p. 24). O Multishow é um canal por assinatura brasileiro da operadora Globosat de televisão. Está no ar desde 1991 e tem uma programação voltada para o entretenimento do público jovem com programas de variedades, musicais e internacionais. TVZ é o programa que se destaca na veiculação de videoclipes desse canal por assinatura. Ele apresenta videoclipes nacionais e internacionais com legendas, o que o diferencia da MTV, sua maior concorrente nesse segmento. Na MTV, apenas o programa SAP apresenta clipes com tradução em legendas. O programa TVZ, do canal Multishow, apresenta 25 clipes e tem duas edições diárias, pela manhã e à noite. Apesar de não ter a grade de programação inteiramente focada nos videoclipes, o canal enfatiza a música, exibindo shows internacionais e nacionais (Multishow Music Live, Volume Máximo), entre outros 68 programas especiais abordando a temática musical (Edgard No Ar, O Assunto é Música e Sound). O VH1, canal americano por assinatura, foi criado em 1985 pela Warner Entertainnement-Amex Satelite, subsidiária da Warner Communications, uma das proprietárias da MTV. O objetivo inicial do canal era consolidar a MTV, possibilitando maior segmentação de público para os programas. Na atualidade, o canal VH1 exibe outros programas além dos exclusivos para clipes, como séries e filmes. O Canal Brasil, da operadora Globosat de Televisão, também tem na programação um programa voltado especificamente para apresentação de videoclipes, o Clipe Brasil. Neste programa são exibidos somente clipes nacionais. O programa tem duração de uma hora e é exibido pela manhã com reapresentação à tarde. Durante o segundo semestre de 2006, a MTV Brasil estava em crise. O canal enfrentava pela primeira vez uma concorrência direta, a Play TV, que participava da disputa pela audiência do público jovem. Além disso, o YouTube22 tornava-se cada vez mais acessado na internet. A concorrência ficou tão acirrada que o diretor da MTV Brasil, Zico Góes, chegou a sugerir que “o videoclipe não pertence mais à televisão” (MELLO, 2006). A partir desses fatos, o então diretor anuncia mudanças na grade de programação da MTV que preterem o videoclipe. Toda essa discussão teve repercussão nos sites de notícias, uma vez que a direção da MTV Brasil apostava que as pessoas não mais assistiriam aos clipes nos televisores, e sim nos computadores por intermédio de sites como YouTube e o próprio site da MTV. Não era uma decisão infundada, já que as pesquisas apontavam que as pessoas dedicavam mais tempo ao computador pessoal e cada vez menos à TV (MUNIZ, 2006). Mas, com o tempo, esta tendência não se confirmou: o que aconteceu foi a coexistência do consumo do videoclipe na mídia de massa e nas mídias interativas digitais, mesmo com a evidência da cibercultura. No final do século XX foram criados diversos suportes midiáticos que permitiram a visualização de videoclipes conforme a vontade do consumidor, que tem a partir desse momento a opção de decidir qual videoclipe quer ver e em que situação. Ainda na década de 1980, artistas como Michael Jackson disponibilizaram 22 Site que permite que usuários visualizem e compartilhem vídeos em formato digital. 69 seus videoclipes em fita VHS, para consumo no sistema de home vídeo. O formato VHS concorria na época com o formato Betamax, o primeiro formato. Mas logo o VHS se popularizou e tomou o lugar para tornar-se fita de uso caseiro. Ainda em meados da década de 1980, a banda de hard rock Bon Jovi traz ao mercado fonográfico e audiovisual a primeira coletânea de videoclipes da banda, em VHS: Breakout: Video Singles23, que continha seis clipes: In and Out of Love, Only Lonely, Silent Night, She Don’t Know Me, The Hardest Part Is The Night e Runaway. Em 1991, a dupla sueca Roxette lançou The Videos24 com os clipes das músicas dos álbuns Look Sharp e Joyride, e ainda a trilha sonora do filme Uma Linda Mulher, It Must Have Been Love. Em 1995 a dupla voltou a lançar uma coletânea de vídeos, Don’t Bore Us – Get to the Chorus! Roxette’s Greatest Video Hits25. No ano 2000, a cantora Britney Spears também lançou um VHS, Live and More! 26 Nessa fita há uma apresentação ao vivo no Havaí e três videoclipes: Lucky, Oops!... I Did It Again e Stronger. Alguns dos VHS citados acima também foram lançados no formato Laserdisc27 (LD) que era um disco óptico de armazenamento analógico de áudio e vídeo, foi demonstrado em 1972 pelas empresas MCA e Philips. Ele esteve disponível ao público a partir de 1978. Apesar da alta qualidade de som e imagem o formato não teve um grande apelo popular devido ao seu tamanho, era muito grande, tinha cerca de 30 cm de diâmetro, enquanto um DVD tem 12 cm de diâmetro. Mesmo assim, o formato Laserdisc desfrutou de certa popularidade entre os colecionadores, em países como o Japão, onde foram produzidos, até janeiro de 2009, leitores de LD da marca Pioneer para que os consumidores pudessem desfrutar de audiovisuais disponíveis somente nesse formato. No final dos anos 1980 surgiu na MTV o formato unplugged, que, como o nome sugere, seria um show com menos guitarras e mais violões, num formato mais 23 Disponível em: http://territorio.terra.com.br/rockonline/az/discografia/?a=Bon%20Jovi 24 Disponível em: http://www.roxettebrasil.net/musica/4v/3tv.html 25 Disponível em: http://www.roxettebrasil.net/musica/4v/5dbu.html 26 Disponível em: http://www.britneyspears.com/ Disponível em: http://guia.mercadolivre.com.br/ld-laserdisc-disco-laser-cdv-compact-disc-video47086-VGP 27 70 intimista, com pouca plateia e pouca dança. Grande parte dos unpluggeds dos EUA e da Inglaterra não chegou a ser lançada em CD ou DVD. No Brasil, o novo formato de apresentar a música pop foi chamado de acústico. Também o objetivo inicial era veicular os programas na emissora. Depois, foi efetuada uma parceria entre a mídia, a MTV Brasil e a indústria fonográfica que transformou o programa no maior produto da emissora. Então, o programa seria exibido na programação e lançado em CD e DVD (PITRE-VASQUEZ in PEDROSO & MARTINS, 2006, p. 94). O grande destaque do formato acústico foi o programa com a banda brasileira Titãs, que ressurgiu para o público. O DVD não trouxe grandes mudanças no que se refere à produção de videoclipes. Mas no tocante ao consumo de música pelo DVD houve grande mudança devido à pirataria de DVDs. No geral, artistas e gravadoras optaram pelo uso do formato DVD para gravação de shows ao vivo. De cada show gravado em DVD elegiam-se uma ou duas músicas que funcionariam como videoclipe na divulgação do álbum. Outra opção que existe em DVD são as coletâneas com clipes de determinada época que são encontrados em lojas de departamento, atualmente transformadas num dos meios mais visíveis de distribuição a preços populares, e sites de comércio virtual. A tecnologia do DVD consiste na maior capacidade de armazenar dados que o CD devido à compressão de informações. Essa compressão é a redução do espaço ocupado pelos dados no dispositivo. No processo, além da redução também são eliminadas as redundâncias de dados, ou seja, os dados repetidos. Para que o DVD seja lido, o aparelho de TV pode ser de tecnologia analógica ou digital. Uma evolução do formato de armazenamento DVD é o Blu-ray Disc, que também é disco óptico com 12 cm de diâmetro. A diferença está na imagem de alta definição e armazenamento de dados de alta densidade. A empresa responsável pelo desenvolvimento do Blu-ray é a Blu-ray Disc Association que foi criada pela Sony e Panasonic. Este formato permite uma melhor qualidade de imagem e maior capacidade de armazenamento28. Disponível em: http://idgnow.uol.com.br/computacao_pessoal/2007/11/27/idgnoticia.2007-1127.3134255321/ 28 71 Para que o Blu-ray funcione é necessário que o leitor esteja conectado a um televisor de tecnologia digital: Full HD, plasma, LCD ou LED. O concorrente do Bluray seria o HD-DVD. Eles têm tecnologia semelhante, a diferença está na fabricação que ocorre em empresas distintas. O HD-DVD era fabricado pela Sanyo. Mas em 2008 esta disputa teve fim porque a Warner Bros (umas das maiores produtoras de filmes e programas de TV) decidiu pelo formato Blu-ray29. Uma breve pesquisa em sites de lojas populares como Americanas e Submarino percebe-se a pouca oferta de títulos em Blu-ray. Os videoclipes passaram a ser visualizados posteriormente em aparelhos portáteis como o MP4 (cujo nome completo é MPEG-4, part 14). Ele foi criado quando houve a possibilidade de compactar arquivos de áudio e vídeo. Este aparelho é uma espécie de evolução do tocador de MP3 que é capaz de armazenar e reproduzir arquivos de áudio. O MP3 foi inventado em 1998, na Coreia do Sul, pela empresa Saehan Information Systems. Em geral, para o tocador de MP4, o formato do arquivo é MP3 com vídeo, AVI ou ainda o formato AMV, o mais comum. Portanto, o nome do aparelho é mais para indicar uma evolução do MP3 e não necessariamente que ele leia o arquivo em MP4. Este formato é usado no aparelho iPod vídeo, da marca americana Apple30. O iPod é um tocador de MP3 e MP4, lançado em 2001 pela empresa americana Apple Inc. Mas o conceito do aparelho, batizado de IXI, já havia sido patenteado anteriormente por Kane Kramer em 1979. O aparelho iPod é um reprodutor de áudio e vídeo digitais e armazenador de fotos. O aparelho era um leitor de música digital do tamanho de um cartão de crédito, botão central contendo um menu que armazenava três minutos e meio de dados. 29 Disponível em: http://g1.globo.com/Noticias/Tecnologia/0,,MUL304402-6174,00SONY+VENCE+TOSHIBA+NA+GUERRA+DOS+FORMATOS+DE+DVD.html 30 Disponível em: http://guia.mercadolivre.com.br/mp4-15484-VGP e http://www.comprafacil.blog.br/29/ 72 Figura 18: aparelho tocador de MP4 marca Philips. Fonte: http://revistaconnect.blog.uol.com.br /arch2007-10-07_2007-10-13.html O inventor não teve dinheiro para manter a patente, então ela se tornou de domínio público. O modelo iPod Classic teve oito versões diferentes. A mais recente (2009), iPod classic sétima geração, armazena 150 horas de vídeo em disco rígido, sendo disponibilizado aos consumidores nas cores, já clássicas, preto e prata. Figura 19: IXI de Kane Kramer (protótipo do iPod). Fonte: http://pplware.sapo.pt/2008/09/09/appleadmite-nao-ter-criado-ipod/ 73 O modelo iPod Nano, lançado em setembro de 2005, teve quatro versões. A mais atual (2009) tem tela reversível horizontal/vertical, armazena quatro horas de vídeo, captura vídeo com áudio e utiliza memória flash para armazenar os dados. A memória flash ocupa menos espaço, tem baixo consumo de energia, alta resistência e durabilidade. Esse modelo apresenta nove opções de cores para os usuários. O modelo iPod Touch foi lançado em setembro de 2007 e possui tela sensível ao toque com sistema de navegação wi-fi, denominado Safari. Figura 20: iPod touch safari. Fonte: www.hongkiat.com/.../ O MP4 teve, por assim dizer, uma evolução para o MP5, MP6, MP7, MP8, MP9. O que muda de um para o outro é que a cada número adicionado equivale a mais uma função agregada ao aparelho. No geral, as funções do MP4 são: executar arquivos em formato MP3, gravar áudio em MP3, escutar rádio FM, executar vídeos no formato AMV, gravar e não executar arquivos de texto, imagem (formato JPG), ou seja, funcionando como pen drive, alguns podem ter jogos. No caso das evoluções os nomes dados (MP5, MP6, MP7 etc) já não são nomes de formato de arquivo. São 74 utilizados meramente para ilustrar que novas funções foram agregadas ao aparelho31. Não é possível dizer qual aparelho tem qual evolução agregada porque cada fabricante dá a numeração que quiser. Entre as novas funções do aparelho estão: executar vídeos em outros formatos além do AMV, como ASF, WMA, AVI; câmera para fotos e vídeos com zoom óptico e flash; expansão da memória; tela TouchScreen; funcionar como aparelho de telefonia móvel; ter duplo chip e ainda sintonizador de TV. As marcar disponíveis no mercado são: Foston, Vision, Strike, Dynacon, SanDisck e outras. No geral, estes aparelhos não têm acesso à internet. Os que têm acesso são de grandes marcas da telefonia móvel: Motorola, Nokia, Samsung. Neste caso, trata-se de celulares com outras funções oferecidas. Desde 2006, já era possível a conexão de aparelhos reprodutores de vídeos como MP4, celular, smartphone, iphone e iPod em sistemas de som automotivos. Essa conexão pode ocorrer devido à entrada USB que passava a fazer parte dos aparelhos de CDplayer de som automotivos. Na época, os sistemas sonoros eram instalados depois. Em 2009, alguns carros já vêm de fábrica com esse sistema de som automotivo com entrada USB. As marcas que têm este tipo de conexão disponível são: Sony, LG, JVC, Buster, Pionner, Philips e outros. Dessa maneira, os usuários podem acessar os videoclipes da memória do aparelho ou quando a tecnologia permitir acessar sites como YouTube e Myspace para ver os vídeos dos artistas da música 32. Figura 21: som automotivo marca LG. Fonte http://revistaconnect.blog.uol.com.br/arch2006-12-03 31 Disponível em: http://vomicae.net/tecnologia/mp1-mp2-mp3-mp4-mp5-mp6-mp7-mp8-mp9-mp-oque/ ; http://www.baixaki.com.br/info/1488-evolucao-das-siglas-do-mp3-ao-mp9.htm e http://www.pensandonisso.com/tecnologia/mp3-mp4-mp5/comment-page-1/ 32 Disponível em: http://revistaconnect.blog.uol.com.br/arch2006-10-29_2006-11-04.html 75 3.3 VIDEOCLIPE NA CIBERCULTURA A cibercultura marca sua distinção com relação a outras culturas comunicacionais – a cultura de massas e a cultura das mídias – na medida em que os conceitos aplicáveis a elas como indústria cultural, por exemplo, já não são pertinentes. Isso ocorre devido as constantes transformações sociotécnicas que mudaram os modos de produção, circulação e consumo de bens simbólicos. A distinção deve-se à lógica de distribuição das músicas do videoclipe se transformar conforme as tecnologias se transformam: os consumidores é que procuram os sites, páginas de relacionamento e blogs que disponibilizam os videoclipes. Um videoclipe que exemplifica as mudanças nas formas de produção, consumo e distribuição de música nas práticas sociais da cibercultura é Hibi no Neiro33, da banda japonesa Sour, formada pelo guitarrista e vocalista Hoshijima, pelo baixista Sohey e pelo baterista Kenn. O clipe dirigido por Masashi Kamura, Hal Kirkland, Magico Nakamura e Masayoshi Nakamura é uma produção colaborativa da banda com seus fãs. Foi realizado em 2009, a partir de coreografias gravadas com webcams (câmeras para computador) pelos fãs da banda. Hipoteticamente, o contato com os fãs para a produção do videoclipe foi feito por intermédio da rede mundial de computadores, uma vez que banda tem um site oficial e também está presente no Myspace. E ainda, o consumo da música se dá com a visualização do videoclipe em sites como YouTube, Myspace e alguns blogs. Na imagem seguinte, o quadro é divido em quarenta e dois, as pessoas seguram papéis com desenho de coração. Eles se movimentam como um grande coração que bate. Depois a banda aparece por alguns momentos, fazendo uma performance com os instrumentos. O quadro volta a ser divido em vinte e cinco quadrinhos que envolvem a imagem da banda que está no centro. 33 Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=WfBlUQguvyw ; http://.anime.com.br/blog/tag/banda-sour/ e http://appleaddicted.com.br/blog/videoclipe-da-banda-sour-e-gravado-com-diversas-webcams/ 76 Figura 22: frames do clipe Hibi no Neiro. Fonte: fake-doll.com/tag/clipe/ Para acompanhar a evolução tecnológica que permeia a história do videoclipe na esfera do consumo, a MTV Brasil criou um site que estreou dia 27 de junho de 1997. Ele trata da programação televisiva, de notícias sobre bandas e cantores, e traz também colunas, chats, blogs, comunidades, entre outras ferramentas de comunicação. A MTV Brasil atualmente tem um programa chamado Scrap MTV, que exibe comentários de internautas e dá dicas de sites relacionados à música, moda, jogos e outros assuntos. O Scrap estreou dia 28 de janeiro de 2008 e é apresentado pela VJ MariMoon com duração de quinze minutos. Percebendo esse panorama de interatividade, que vem tipificando o que se entende nos dias de hoje por cibercultura, a MTV Brasil tem um programa chamado MTV de Bolso, no qual são exibidos comentários de internautas que se cadastram no site da emissora. O programa entrou no ar em abril de 2006 e continua até então 77 (CARPANEZ, 2006). Ao tratar de interatividade, este trabalho faz referência ao sentido mencionado por Lucia Santaella: “interatividade está nas vizinhanças semânticas das palavras ação, agenciamento, correlação e cooperação, das quais empresta seu significado” (SANTAELLA, 2007, p. 153). Na edição do ano de 2006, o Video Music Brasil (VMB), no dia 28 de setembro, da MTV, trouxe várias inovações, entre elas a votação pela internet para todas as categorias e as transmissões ao vivo em rádio e internet tanto do evento como dos bastidores (MELLO, 2006). Também havia uma premiação para clipes produzidos pelo público, na categoria “Vc fez”. Infere-se destas informações que a MTV busca a interatividade com o público de várias maneiras, devido à demanda do mercado consumidor que procura a interatividade disponível na rede mundial de computadores. A tentativa de interatividade da MTV Brasil não funcionou da maneira como a emissora esperava, porque o consumo de tecnologia de câmeras digitais ainda era restrito. Em 2006, uma câmera digital com resolução de 4 megapixels custava em torno de R$ 500,00, valor acima do salário mínimo vigente. Naquele ano, portanto, o preço das câmeras digitais ainda não era acessível a amplas faixas do público jovem, consumidor de videoclipes que ainda emergia como produtor amador. Na MTV Brasil, os programas de auditório predominaram em 2007. Mas, em 2008, os clipes voltaram à programação, com programas segmentados em estilos musicais como o caso do MTV Lab que é subdividido em Clássicos, Cult, Trash, Matinal, Now e Radio. A programação ficou variada, com programas de auditório, de entrevistas e também o mtv.com.br, que traz para a TV o que está acontecendo no site: vídeos, animação, debates. A MTV Brasil traz, durante sua programação, teasers dos clipes, uma propaganda, informando sobre os clipes novos da programação, demonstrando a importância que o videoclipe ainda tem na emissora. A MTV Brasil, também no ano de 2008, disponibiliza parte da programação para ser visualizada nos aparelhos de telefonia móvel. Além da programação, podem ser baixados para o celular: jogos, toques, vinhetas, enquête e papéis de parede. Os conteúdos são vendidos e podem ser acessados com o celular pelo site www.wap.mtv.br. Mais uma maneira de consumo e tentativa de interatividade. Para o ano de 2008, o VMB buscou premiar as seguintes categorias: artista do ano, artista 78 internacional, revelação, aposta MTV, hit do ano, show do ano e web hit, a novidade, com os vídeos mais assistidos na internet. Novas tecnologias e novas condições de produção e consumo de videoclipe tornaram possíveis a emergência de dispositivos como os sites YouTube e GoogleVideo. O site YouTube, fundado em 2005, pode ser acessado pelo endereço eletrônico: www.YouTube.com. Os vídeos disponibilizados utilizam a tecnologia Adobe Flash Player, formato FLV. Nele estão disponíveis vídeos das mais diversas naturezas, vídeos caseiros de adolescentes, videoclipes, vídeos de shows etc. O GoogleVideo já não é mais utilizado, pois o Google comprou o YouTube, passando então a visualização dos vídeos apenas por este último. O acesso aos clipes só era possível pelos aparelhos de TV. Devido ao avanço da tecnologia, os clipes passaram a ser visualizados em celulares, computadores e televisores portáteis. Os consumidores de videoclipe agora, com a internet, não apenas assistem, mas manipulam o videoclipe: editam e fazem modificações nas imagens utilizadas, dando a elas mesmas o crédito autoral por esta prática midiática. Há, também, amadores produzindo seus próprios vídeos caseiros com músicas inéditas ou de bandas favoritas, postando-os no YouTube. Alguns desses vídeos ganham notoriedade e têm grande número de acessos. É o caso do Funk do Jeremias, que já teve mais de 3,5 milhões de visualizações.34 Trata-se de uma edição de trechos de entrevistas de um programa policial produzido em Pernambuco. O programa exibiu uma entrevista com Jeremias que foi preso por pilotar sua moto embriagado. O funk foi feito a partir da mixagem das falas do entrevistado. A partir da versão original, o vídeo ganhou muitas outras versões produzidas por outros autores. Uma delas, por exemplo, tem uma animação acrescentada por um cibernauta que assina a autoria desta nova versão. Assim, paródia sobre paródia percebe-se uma prática social, cujo saber é de domínio público, em que os internautas reproduzem as técnicas de produção de videoclipes. Esses vídeos são feitos de maneira ‘descomplicada’, com programas básicos de computador como o Movie Maker, um programa de edição de fácil utilização. Ele faz parte do pacote de aplicativos do Windows. 34 Acesso: 12 de fevereiro de 2010. 79 Figura 23: frames do vídeo Funk do Jeremias. Fonte: mais.uol.com.br/view/r71k1ntkdfex/chaves-e-o-... As práticas de intertextualidade, muito próximas do que Santaella chama de interatividade e do que Pierre Lévy chama de desterritorialização, colocam em crise o conceito inicial do que é, ou seria, um videoclipe. Wilton Garcia esclarece que o conceito de intertextualidade embasado nos estudos de Bakhtin (GARCIA, 2000, p. 34) pode ser aplicado como construção, produção ou transformação de sentido a partir dos processos de citação, alusão e estilização. A citação como referência teórica ou artística. Alusão seria a reprodução subjetiva ou ainda, uma adaptação quase paródica. Estilização funcionando como reprodução do estilo de outro, estilo entendido como forma e conteúdos individuais. Pierre Lévy alega que “o espaço cibernético introduz a idéia de que toda leitura é uma escrita em potencial” (LÉVY, 1994, p. 03) trazendo a ideia de desterritorialização do texto. Quando se usa a interatividade é no sentido mencionado por Santaella de ser semelhante à ação, agenciamento, correlação e cooperação. As ideias de intertextualidade, desterritorialização e interatividade caracterizam as práticas midiáticas na cibercultura no que se refere à produção de vídeos. Na medida em que há multiplicidade de autores para um mesmo vídeo, em que ele sofre/a modificações e interferências, essas práticas arrastam o conceito de videoclipe. Isso força o gênero audiovisual a se flexibilizar, a ponto de abarcar vídeos de músicas não produzidas na indústria fonográfica e vídeos desprovidos de maior aparato técnico e teórico. Sobre o tema, André Lemos (2004, p. 109) registra: 80 “passamos do reino do especialista, figura típica e marcante da modernidade, ao reino do amador, tipicamente pós-moderno”. Além do site YouTube, há o caso do canal Multishow com o TVZÉ, uma espécie de vinheta com vídeos caseiros de pessoas dublando músicas da programação, ao modo de paródias feitas por amadores. Os vídeos são invariavelmente caseiros e feitos por “qualquer um”, o “Zé” como nome genérico do cidadão anônimo. Esses vídeos são exibidos durante o programa TVZ do canal Multishow. A partir de 2009, o TVZÉ passou a fazer parte do Prêmio Multishow. A procura pelo TVZÉ foi tão expressiva que o Multishow acrescentou à programação, nos intervalos do TVZ, o que depois denominou de TOP TVZÉ35, que destaca cinco destes vídeos amadores. A emissora denomina tais vídeos como “colaborativos” e os disponibiliza em seu site pelos seguintes links: “buscador de vídeos”, “o TOP”, “os mais recentes”, “os mais vistos”, “os mais votados” e “envie seu vídeo”. Os vídeos que apareceram durante a programação são assinalados no site, como “exibido na TV”. Na seção “Os Mais Vistos”, existe um vídeo intitulado Spice Girls Brasil 36 , postado pelo internauta que assina simplesmente Cláudio, que já foi visualizado 50.389 vezes (acesso dia 15/07/2009). No vídeo, dois adolescentes dublam a música Wannabe, do grupo de cantoras britânicas Spice Girls – grupo de música pop formado em 1993 e que encerrou a carreira em 2001, mas em 2007 voltaram a gravar juntas, pela última vez. Esta situação sinaliza o que Henry Jenkins denomina de cultura convergente, que seria o processo no qual os meios de comunicação têm suas funções e status transformados pela introdução de novas tecnologias (JENKINS, 2008, p. 39-40). A convergência representa uma mudança cultural na qual consumidores são encorajados a renegociar sua relação com a mídia, proporcionando novas formas de participação, evidenciando o potencial democrático de algumas tendências contemporâneas (JENKINS, 2008, p. 314). 35 Disponível em: http://globosat.globo.com/multishow/v4/videos/home.asp?acao=3 81 Outro site da internet em que é possível a visualização de videoclipes de artistas é o MySpace. De acordo com a versão on line da Revista Info (AMARO, 2009) trata-se de uma rede social que surgiu no ano de 2003 para divulgar músicas de bandas iniciantes. Em 2005, foi comprado pela News Corporation (proprietária da Fox e DirecTV). Desde então o serviço de rede social começou a perder usuários. O Myspace oferece maior número arquivos de áudio, os de vídeo são em menor proporção. Em novembro de 2007, Myspace ganhou uma versão em português. Segundo informações do blog da Revista Connect, já em 2006 o YouTube disponibilizava o conteúdo de vídeos para celulares. No final do mesmo ano, a empresa anunciou que os serviços de upload seriam mais rápidos e haveria ferramentas para facilitar o compartilhamento de vídeos no ano de 2007. Um dos aparelhos eletrônicos portáteis mais indicados para navegação em internet é o SmartPhone, uma espécie de computador em forma de celular, ou ainda, é um celular com funcionalidades avançadas que podem ser aumentadas com o auxílio de programas executados no sistema operacional. As características desse produto eletrônico são: conexão à internet, capacidade de armazenamento de 32 GB, GPS (localizador de endereços), filmadora, câmera digital, editor de texto, planilhas eletrônicas e ainda apresenta a integração de funções. O Iphone é o smartphone da empresa americana Apple. O diferencial que ele oferece aos consumidores, segundo propaganda da própria empresa, é a tela touchscream (tela sensível ao toque). Trata-se de um aparelho de telefonia móvel em que há convergência das tecnologias e a possibilidade de conexão com a internet o que possibilita a participação na cibercultura. As marcas que fabricam o SmartPhone são Nokia, Sony Erickson, HTC, LG, Motorola e Samsung. 3.4 THRILLER: CONVERGÊNCIA ENTRE COMUNICAÇÃO DE MASSAS E COMUNICAÇÃO MEDIADA POR COMPUTADORES A passagem da comunicação de massa às novas possibilidades técnicas não significa a extinção da mídia tradicional, mas a coexistência e mesmo a integração da esfera do atual com a do ciberespaço, onde são proeminentes as tecnologias digitalizadas do virtual. Na verdade estamos ingressando no que Salun chama de uma nova “geração” do audiovisual (SODRÉ, 2002, p. 78-79). 82 Em 2009, embora estivesse há mais de dez anos sem fazer shows, Michael Jackson mantinha seu público e ainda estava presente na mídia de massa (rádio e televisão) e na mídia digital interativa (internet). Essa presença se dava por notícias sobre escândalos de sua vida privada, pela reprodução dos clipes ou ainda pelos inúmeros vídeos postados em sites como YouTube, que de alguma maneira retomam as coreografias e clipes do astro pop internacional, morto por overdose de remédios em 2009. Esses vídeos, em geral, eram e são paródias, imitações e releituras do trabalho das músicas e coreografias, tendo como facilitador as novas condições de produção de linguagem audiovisual proporcionadas pela inovação tecnológica. No dia 26 de junho de 2009, dia seguinte à morte do cantor, o Jornal Nacional37, da Rede Globo de Televisão, dedicou quase que inteiramente às notícias referentes à morte e carreira de Michael Jackson. Com matérias em várias partes do mundo – Japão, Israel, África do Sul, Itália, Portugal, Inglaterra –, o jornal avalia a comoção internacional com a morte do ídolo pop. Em edição pouco comum, foram entrevistados cantores brasileiros como Sandra de Sá, Martinho da Vila e Gilberto Gil para comentarem a carreira de Michael Jackson. Profissionais de outras áreas artísticas também participaram daquela edição do telejornal. A coreógrafa brasileira Débora Colker afirmou: “o corpo vira uma orquestra na mão desse cara” O jornalista e produtor musical Nelson Motta38 também participou da bancada daquela edição do telejornal, comentando os vídeos selecionados pela produção do programa jornalístico. Os vídeos eram de todas as fases da carreira do artista, desde a infância de Michael com seus irmãos no grupo Jackson Five até a fase adulta da carreira solo. Em dado momento, falando da carreira do astro, Fátima Bernardes, jornalista que apresenta o jornal diz: “Não dá para falar nele sem falar em Thriller, acho que todo mundo quando pensa nele, num grande sucesso [...] É um dos momentos que vale a pena rever”. 37 Disponível em: http://www.YouTube.com/watch?v=R6IwXV9Otuo 38 Disponível em: http://www.YouTube.com/watch?v=R6IwXV9Otuo&feature=related 83 Em resposta ao comentário da jornalista e também às imagens do clipe, Nelson Motta afirmou: “em 1982, com Madonna e Michael Jackson, a música pop passou a ser audiovisual, e dentro desse visual a dança é uma coisa importantíssima”. Seguem as imagens da carreira do cantor e os comentários dos jornalistas e do convidado. Para encerar o jornal, um fato inédito: Fátima Bernardes anuncia que foram feitos muitos pedidos, então, o Jornal Nacional iria reprisar (e reprisou)39 uma homenagem que o Jornal Bom Dia Brasil fez a Michael Jackson com a música Bem, de 1972. Artistas como Michael Jackson e Madonna modificaram a maneira de conceber um cantor pop e de consumir música. Na medida em que eles protagonizavam os videoclipes da década de 1980, o conceito de cantor mudou. Daquela década em diante seriam necessários a dança e o apelo visual. Não era suficiente o ato de cantar. Com advento do videoclipe se fez necessário um artista que cantasse, dançasse e representasse. A música não era mais somente sonora, mas um entretenimento completo, agora numa dimensão audiovisual. A característica da contemporaneidade audiovisual: o som calcado na imagem, transformando potencialmente o consumo de música. Mais que música para se ouvir, ela se tornava, nas caracterizações audiovisuais do videoclipe, uma música para ouvir e, também, ser vista. O disco Thriller foi o sexto da carreira solo de Michael Jackson, com mais de 100 milhões de cópias vendidas em todo o mundo. No ano de 1983, o cantor ganhou oito Gramys pelo disco, foi premiado em diferentes estilos: rock, pop e R&B40. Para mostrar a imagem do cantor coexistindo na cultura da mídia simultaneamente nos meios de comunicação de massa e meios de comunicação eletrônicos interativos, o videoclipe Thriller é um exemplo exato. O videoclipe Thriller foi produzido em 1983 e dirigido por John Landis. A música é composição de Michael Jackson para o álbum também intitulado Thriller. O 39 Disponível em: http://www.YouTube.com/watch?v=GAYTpHgBdAI&feature=related 40 DA REDAÇÃO. Thriller é relançado no Brasil. Matéria publicada dia 21/02/2008. Revista Rooling Stone Brasil. Disponível em: http://www.rollingstone.com.br/secoes/novas/noticias/1837/ LINÉS, Steban. Disco Thriller de Michael Jackson faz aniversário. Matéria publicada dia 01/12/2007. Site Terra, música/ La Vanguardia. Disponível em: http://musica.terra.com.br/interna/0,,OI2115649-EI1267,00Disco+Thriller+de+Michael+Jackson+faz+aniversario.html 84 vídeo é estrelado pelo cantor e tem duração de curta-metragem41, com 14 minutos e créditos no final. Chega-se a um ponto em que a linguagem visual quase ultrapassa em potencialidade sígnica a própria música, que a certa altura quase vira uma simples trilha sonora. O clipe teve várias características de superprodução na medida em que inovou em efeitos especiais, maquiagem, figurino e coreografia. Ainda é considerado pela crítica como o melhor videoclipe de todos os tempos. Essa obra audiovisual foi lançada no formato VHS em março de 1984. Thriller foi acompanhado por um documentário sobre os bastidores da produção, com o título Making Michael Jackson’s Thriller. Vendeu 14 milhões de cópias e tornou-se o título mais vendido de todos os tempos, até ser superada pelo filme Titanic, em 199742. No clipe, percebem-se as referências dos filmes de terror e dos musicais. O cantor, além de compor a música, participou ativamente das etapas de criação do roteiro e produção. O diretor do clipe, John Landis, fez um filme sobre lobisomem em 1981, intitulado Um lobisomem americano em Londres. Segundo o diretor, o filme não fala apenas de lobisomem, mas, também, da puberdade, da transformação que o corpo do jovem passa nesse período, já que o filme é dirigido ao público adolescente. Em Thriller, o processo é parecido e o público-alvo é o mesmo. A metáfora da transformação da puberdade também foi utilizada. Um dos grandes diferenciais que o filme apresentou foi a representação do lobisomem quadrúpede – em filmes anteriores, lobisomens eram bípedes. Outra característica marcante do filme foi a maquiagem. Segundo John Landis43, foi a partir deste filme que passou a existir o termo “efeito especial em maquiagem”. No filme, a transformação do homem em lobisomem acontece com muita luz, diante das câmeras. É uma mudança total: as mãos viram patas, a orelha se faz pontiaguda, o 41 Curta-metragem é uma obra audiovisual cuja duração é igual ou inferior a 15 minutos; média-metragem é a obra audiovisual cuja duração é superior 15 e inferior a 70 minutos; longa-metragem é a obra audiovisual cuja duração é superior a 70 minutos. 42 Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Michael_Jackson 43 Citação extraída dos extras do filme Um lobisomem americano em Londres, 1981, direção: John Landis. 85 rosto perde a forma humana e ganha um focinho de lobo e ele se torna quadrúpede com pelos por todo corpo. O filme e o clipe têm mesmo assunto e público. No clipe, o lobisomem é bípede, no filme é quadrúpede. A iluminação do clipe é oposta à do filme, porque no filme a maior parte das cenas é bastante iluminada e no clipe há uma escuridão quase total. A caracterização de lobisomem também é diferente. O que é semelhante é o efeito especial em maquiagem utilizado em ambos. Outra semelhança ocorre na transformação, o detalhe da orelha ficando pontuda. No começo do clipe aparece uma tela preta com os dizeres: “Due to my strong personal convictions, I wish to stress that this film in no way indorses a belief in the occult” de Michael Jackson, que significa “devido as minhas fortes convicções pessoais, desejo enfatizar que este filme de maneira alguma aprova uma crença no oculto”. Então, entra o som de respiração com o nome da música. O clipe começa sem música, apenas com o som da cena. O personagem passeia de carro com a namorada e de repente o carro tem um defeito. O casal começa a caminhar pela floresta e ele a pede em casamento. Depois do pedido, ele diz que precisa contar uma coisa, a lua aparece e ele se transforma em lobisomem. Na cena são exibidos os detalhes da transformação: os olhos grandes e amarelos como os de um gato, os dentes enormes, as orelhas ficando pontudas, as mãos com unhas crescendo, o pelo no rosto, as cenas são acompanhadas por uma trilha sonora de suspense. A garota foge pela floresta e durante a fuga a trilha de suspense continua. Quando o lobisomem vai atacar a garota, há um corte para a cena em que Michael Jackson e a personagem (namorada) do filme assistem a um filme enquanto comem pipoca. A namorada dele fica irritada com as cenas e sai do cinema. Neste ponto, percebe-se a utilização de metalinguagem, o gênero audiovisual videoclipe falando do gênero audiovisual cinema, porque além da trama se desenvolver na sala de cinema, há todo o aspecto técnico do clipe. O clipe é montado como um filme: com a música funcionando como trilha, com efeitos especiais de maquiagem (só então utilizados no cinema), características de filmes de terror (iluminação e roteiro) e também elementos de musicais (a música ganhando muita importância na encenação). 86 No enredo do clipe, Michael Jackson hesita um pouco, mas acaba acompanhando a namorada e também sai da sala do cinema. A música entra no clipe por volta dos quatro minutos e onze segundos. A cena seguinte evidencia a fachada da sala de cinema com o letreiro: Thriller. Ainda tem um diálogo sobre o medo do filme. Michael Jackson começa a cantar, ambos caminham, ele com passos coreografados e ela anda dançando. Na sequência, eles andam abraçados e passam diante de um cemitério. Uma voz sintetizada profetiza enquanto monstros saem dos túmulos. Esses monstros saem em busca de algo e circundam o casal de namorados que ficam assustados. Cabe aqui uma das definições de monstro, segundo o autor Luiz Nazário: “Todo monstro é, materialmente, uma máscara: seu horror é externo, sua interpretação dáse por intermédio da fantasia. Os filmes de terror dizem respeito, em última análise, à força dramática da aparência” (NAZÁRIO, 1998, p. 12). Como eles estão diante de um cemitério, são monstros mortos-vivos, reanimados conforme esclarece L. Nazário: “A reanimação, não sendo o mesmo que a ressurreição, o cadáver reanimado não volta plenamente à vida, mantendo fortes ligações com a morte. Sua aparência decomposta é o signo externo desses laços secretos” (NAZÁRIO, 1998, p. 17). De volta ao andamento do clipe: a música para, entram os ruídos dos monstros em seguida a trilha de suspense volta. O casal está cercado e quando a garota olha para Michael como se esperasse uma solução, ele também é um monstro. A música recomeça. A cena seguinte mostra a coreografia que se tornou muito famosa, ele (Michael) e os monstros dançam durante alguns minutos, até que Michael deixa de ter aparência monstruosa. Ele começa a cantar novamente e dá seus gritos característicos, a coreografia com os monstros continua. Ele volta a ser monstro e persegue, junto com os outros, a namorada que entra numa casa abandonada. Neste momento a música para novamente e dá lugar à trilha inicial. A casa é invadida pelos monstros, a garota assustada se encolhe no sofá. As cenas de medo são enfatizadas com a ajuda dos planos: primeiríssimo plano e big close, respectivamente, tomada que mostra o rosto do personagem e close mais aproximado ainda, que neste caso evidencia os olhos. O monstro-Michael aproximase da garota que grita, ele volta à aparência humana e pergunta qual é o problema, e 87 conclui: ‘vou cuidar de você’. Ela se alegra e sai com o namorado, mas ele vira e se transforma em monstro mais uma vez, entra o som de uma risada sarcástica. A partir de então, entram os créditos, e para isso são repetidas algumas cenas do clipe. A música também é colocada novamente para os créditos. O videoclipe aparece como citação em várias obras audiovisuais dentre elas o filme De repente trinta, de 2004, direção Gary Winick, no qual a coreografia do clipe aparece em destaque numa cena de dança; os convidados da festa estavam na faixa etária de 30 anos e dançaram durante a adolescência as músicas do astro pop. Também o filme Um tira da pesada, de 1984, com direção de Martin Brest, faz citação ao figurino do clipe quando dois transeuntes passam diante do protagonista trajados com o figurino do cantor em Thriller. Fazendo citação ao clipe de Michael Jackson, uma das modalidades de intertextualidade, está no YouTube o vídeo conhecido como Indian Thriller ou Golimar44. O vídeo é um trecho musical de um filme indiano chamado “Donga”, produção de A. Kodandarami Reddy no ano de 1985. No vídeo, o indiano faz uma imitação, com tons de humor, de um dos clipes mais famosos da década de oitenta. Figura 24: frame do vídeo Indian Thriller/Golimar. Fonte: http://atmosphera1.zip.net/images/kolyma.jpg 44 Disponível em: http://horaderelaxar.com.br/2009/03/26/videoclipes-bizarros-golimar-indian-thriller/ 88 O videoclipe Everybody, do grupo musical Backstreet Boys, retoma vários elementos do clipe Thriller: terror, coreografia, maquiagem, figurino e efeitos sonoros. Seria quase uma releitura, claro que com música e roteiro diferentes. Mas a referência é clara. A coreografia é inspirada na coreografia de Thriller, a risada sarcástica também aparece ao final do clipe do grupo, mas não a mesma risada. Aliás, este efeito sonoro da risada ao final do clipe de Michael Jackson, passou a ser utilizado quase que como um bordão por vários programas de televisão. Como salienta o pesquisador Guilherme Bryan (2004), Thriller é um clipe histórico. Devido a este fato, torna-se relevante o estudo das repercussões desse marco na história do videoclipe. Uma versão de Thriller foi recriada numa prisão das Filipinas, com ênfase na coreografia do videoclipe original. Os presidiários usaram o uniforme laranja da prisão Centro de Detenção e Reabilitação da Província de Cebu (CPDRC). Apenas uma pessoa que participa da encenação não está com este uniforme, ele/ela usa calça jeans e blusa para fazer o papel da mocinha do clipe. O vídeo teve mais de 1 milhão de acessos no YouTube em menos de uma semana. Ele está disponível no site desde 17 de julho de 2007.45 O diretor deste centro de reabilitação, Byron F. Garcia, segundo a imprensa (POLTRONA TV, 2007)46, inovou a política da instituição ao implantar a coreografia como uma atividade física. Byron ocupa o cargo de consultor de segurança da província e esse seria um método para melhorar o sistema carcerário. Existem sérias dúvidas por parte da imprensa em saber se o objetivo era torturar ou ajudar na recuperação dos presos. O próprio diretor do presídio realiza as filmagens, edita e adiciona os vídeos na internet. “Já vinha colocando outros, havia nove meses, mas nunca eram tão vistos. E agora nós temos um hit!” diz o diretor, satisfeito com a repercussão de Thriller filipino, dançado por cerca de 1.500 prisioneiros filipinos (blog MUNDO EM REVISTA, 2007)47. A atividade de treinamento 45 GLOBO, Jornal da. Espetáculo no presídio. Artigo publicado dia 27/07/2007. Disponível em: http://www.YouTube.com/user/byronfgarcia 46 POLTRONA.TV. Presidiários filipinos reencenam clássico Thriller no YouTube. Artigo publicado dia 25/07/2007. Disponível em: http://www.poltrona.tv/presidiarios-filipinos-reencenam-classico-thriller-no-YouTube/ 47 REVISTA, Mundo em. Remake de Thriller dançado em prisão das Filipinas faz sucesso em internet. Artigo publicado dia 28/07/2007. Disponível em: http://mundoemrevista.blogspot.com/2007/07/remake-de-thrillerdanado-em-priso-das.html 89 das coreografias é obrigatória segundo as normas da prisão. De acordo com o diretor do presídio, todos os presos gostam da atividade física proposta. Todo o jogo de cena protagonizado pelo diretor do presídio é materializado quando ele consegue realizar o vídeo, porque dessa maneira ele consegue objetivar essa organização e ressocialização que foi possível com o treinamento da coreografia. No caso do remake, a interação é mediada, os internautas tiveram (e têm) acesso ao vídeo pela internet, no site YouTube. Figura 25: frames do clipe Thriller e do Remake Filipino. Fonte: www.bbc.co.uk/worldservice/images/ Nos sites de notícia as abordagens também são variadas: uns falam da suspeita de tortura ou da recuperação dos presos e outras descrevem como o vídeo é hilário. No site YouTube, que disponibiliza as imagens do remake, há vários comentários a favor e contra a técnica do diretor do presídio. Há pessoas que concordam com as atividades propostas pelo diretor do presídio e há outras que pensam que dançar seria muita diversão para os detentos. Segundo a Folha On-line, o vídeo da coreografia de Thriller já foi visualizado mais de 37 milhões de vezes. Os presos filipinos voltaram a dançar em homenagem ao ídolo pop, desta vez, contaram com a ajuda do coreógrafo de Michael Jackson, Travis Payne, e dos bailarinos Daniel Celebre e Dres Reid. O vídeo faz parte da 90 campanha de divulgação do documentário This Is It que foi lançado nos formatos DVD e Blu-Ray, em 26 de fevereiro de 2010.48 Dessa maneira, percebe-se alguns processos de interatividade envolvendo o videoclipe de Michael Jackson: o primeiro é a refilmagem do clipe em forma de educação para os presos; o segundo é a gravação e postagem na internet do vídeo feitos pelo próprio diretor do presídio; o terceiro é a grande quantidade acessos (mais de 23,5 milhões)49 do vídeo no YouTube e o último é a interatividade que as pessoas podem ter a partir dos comentários postados sobre o vídeo. Diante disto, considerase que o videoclipe Thriller tem como público-alvo os adolescentes. O clipe evidencia a tendência de que a cultura contemporânea é extremamente calcada na conjugação do som com a imagem. O vídeo produzido pelo diretor do presídio não tem o objetivo mercadológico, mas tem o apelo de tentar vender a imagem de um presídio que cumpre a função de ressocializar os detentos. O elevado número de visualizações do vídeo fez com que o presídio ganhasse uma notoriedade mundial. Diante disto, o Centro de Detenção e Reabilitação da Província de Cebu agora faz parte de roteiro turístico das Filipinas. Aos sábados acontecem as apresentações dos presidiários abertas ao público (BLOG Conta outra) 50·. O diretor do presídio partiu da utilização de um videoclipe da cultura pop e da mídia de massa para a produção de um remake da coreografia que foi uma espécie de paráfrase da coreografia original. A divulgação do vídeo foi feita no site YouTube que, não fazendo parte da velha mídia de massa, ele é elemento constituinte de uma mídia interativa. Desta maneira, nota-se a transformação na circulação de bens simbólicos como o gênero audiovisual do videoclipe. 48 Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/folha/videocasts/ult10038u684539.shtml 49 BLOG Conta outra. Nas Filipinas presos voltam a dançar Thriller em homenagem a Michael Jackson. Postado dia 27/072009. Disponível em: http://www.contaoutra.com.br/cadcomentblog.asp?id_blog=3951 50 BLOG Conta outra. Nas Filipinas presos voltam a dançar Thriller em homenagem a Michael Jackson. Postado dia 27/072009. Disponível em: http://www.contaoutra.com.br/cadcomentblog.asp?id_blog=3951 91 4. O TECIDO TEÓRICO DO VIDEOCLIPE A discussão sobre o gênero videoclipe ganha pertinência na medida em que a produção audiovisual se conjuga com a produção musical contemporânea. Arlindo Machado (1997, p. 173) faz um apontamento crucial sobre o videoclipe que resume em boa parte uma das dimensões características do mundo contemporâneo: “a unidade indecomponível do som com a imagem no vídeo, que nos permite falar verdadeiramente e com toda propriedade de um meio audiovisual”. No campo do audiovisual, o videoclipe é um dos produtos audiovisuais com um flexível modo de concepção e produção. Ele é aberto a experimentações ao oferecer inúmeras possibilidades de criação. Sua concepção pode variar, por exemplo, de uma interface produtiva com distintos gêneros no próprio campo do audiovisual, como documentário e animação. A virtualidade dessas experimentações, que permitem ir além das narrativas jornalísticas típicas da TV, evidentemente é dada, nos dias de hoje, pelo modelo estrutural do sistema digital (MACHADO, 1997, p. 169). A relação direta entre as transformações tecnológicas e as virtualidades das experimentações de linguagens faz do videoclipe um gênero de difícil classificação. Mas é desta multilinearidade, perceptível na produção de videoclipes, que provém o interesse de tantos profissionais da comunicação e outras áreas pelo tema e das questões que ele sugere no campo da cultura contemporânea. O desenvolvimento dos estudos em comunicação, em especial na perspectiva da comunicação como ciência do comportamento, apontou para a necessidade de acompanhamento constante do desenvolvimento científico e tecnológico das mídias e as relações criadas no campo social advindas deste desenvolvimento, o que posteriormente empurrou as pesquisas para o modelo da comunicação como ciência da cultura. Nessa relação entre comunicação e cultura busca-se entender a emergência, a consolidação e a transformação do videoclipe a partir do conceito de mediações do consumo, que por sua vez é permeado pelo constante processo de transformação midiática que subjetiva as relações entre produção e recepção dos produtos culturais. 92 Essa construção teórica do objeto videoclipe está alicerçada principalmente nas seguintes transformações das práticas comunicacionais que sugerem distintas fases históricas: cultura de massas, cultura das mídias e cibercultura. O que se percebe na relação entre comunicação e sociedade é a transição da comunicação de massa às comunicações segmentadas e à comunicação em rede como condição de produção de sentido, já que o apelo da linguagem está ligado ao princípio de mercado (GUSHIKEN, 2009, p. 8). Era da informação, cultura participativa, cultura pop, modernidade, juventude, consumo, mediações, globalização e mundialização. Esses conceitos são basilares na abordagem do tema videoclipe, porque se trata de uma nova forma de consumo musical, fortemente ancorada em recursos imagéticos, que se enquadra no cotidiano da sociedade contemporânea. Deve-se esclarecer que a breve explanação sobre tais temas serve para utilizá-los como parâmetros, para sinalizar as mudanças nas teorias aplicáveis ao objeto videoclipe e traçar um panorama no qual o objeto está inserido. Um dos objetivos da indústria fonográfica é o entretenimento proporcionado através da música. O videoclipe, como elemento constituinte da indústria fonográfica, serve também a esse propósito e funciona como ferramenta de marketing na divulgação da música e da imagem do artista. Ele deve ser entendido num processo amplo, que inclui produção, circulação e consumo, ou seja, o complexo de elementos sociotécnicos e históricos que constituem a emergência de um gênero do audiovisual marcado pelo diálogo com um repertório já experimentado pela audiência da TV, da propaganda, do documentário. Entre a repetição e a inovação, o videoclipe é perpassado por uma memória audiovisual acessível e já repertoriada por amplas faixas do público consumidor de música, agora em sua dimensão audiovisual. Jesús Martín-Barbero indica que devem ser estudados todos os polos da comunicação: emissor, receptor, canal e mensagem que estão envolvidos no contexto cultural. Eles são parte de um processo contínuo de intercâmbio entre produção e recepção. Portanto, o conceito de mediações abarca as relações entre cultura, política e comunicação que se dão no cotidiano de cada cidadão e da sociedade. Mas ainda é a produção de sentido que relaciona sujeito, significações e mensagens (MARTÍN-BARBERO, 2003, p. 294). 93 O conceito de indústria cultural surge com os frankfurtianos Adorno e Horkheimer em meados dos anos 1940, nos estudos denominados de teoria crítica. Inquietos diante das transformações culturais ao longo do século XX, eles pesquisam sobre cinema, rádio, revista, propaganda, jornal impresso e música popular, e especificamente como os meios de comunicação transformavam a arte num produto para consumo. Com a junção de arte, cultura e divertimento seria proporcionado o entretenimento através da repetição e da reprodução dos bens simbólicos. Um termo que aparece bastante quando se trata de indústria cultural é a estandardização, a produção em série, a padronização, o fenômeno do sempre igual, da repetição. Sob essa ótica, o autor sugere ainda que o espectador não deveria pensar por si próprio, pois o produto indicaria qualquer reação, ou seja, prevalece a ideia de uma adesão acrítica por parte dos espectadores (ADORNO, 2007, p. 31). Ou ainda, dito de outra maneira: “analisam a produção industrial dos bens culturais como movimento global de produção da cultura como mercadoria” (MATTELART, 2005, p. 77). O videoclipe surge na indústria fonográfica e audiovisual depois que já estava instaurada o que se denominou de cultura pop. Esse termo é utilizado para descrever o momento de crise em que encontravam a arte e a indústria cultural, com um possível entrelaçamento de ambas. Segundo Santaella (2007, p. 37), a partir dos anos 1960, profundas mudanças foram instaladas pelos movimentos arte pop, minimalismo e os pós-minimalismo: conceitualismo, land art, performance, body art e instalações. Esses movimentos desafiaram as concepções modernistas que se fixavam na composição interna da obra. A proposição desses movimentos era justamente uma coexistência do contexto social e político com os aspectos formais da obra. A cultura pop, oriunda dos meios de comunicação de massa dos anos 1950 e 1960, foi um fenômeno tipicamente americano (SANTAELLA, 2007, p. 38). Uma parte da produção de videoclipes se situa nesta relação conflituosa entre indústria fonográfica e técnica artística. Trata-se, portanto, de um processo de certa maneira semelhante à arte pop. Não se trata de considerar videoclipes como peças de arte e nem de dizer que esse conflito está presente em todos eles. Esse é um paradoxo que atravessa o assunto videoclipe em todo momento que há uma tentativa de conceituar esse gênero audiovisual. O que acontece é que alguns 94 artistas musicais, junto com seus produtores, optam pela inventividade permitida por esse gênero do audiovisual. O objetivo de artistas e produtores não é dar ao videoclipe status de obra de arte, e sim de investir nas virtualidades das hibridações e convergências que podem ocorrer entre comunicação e artes. Tal apontamento serve para sugerir um outro modo de se perceber esse produto audiovisual que, embora não sendo necessariamente arte, também não pode ser estereotipado como mera ferramenta de peça publicitária. Outro fator preponderante para a compreensão e a formação de um tecido teórico que envolve o videoclipe é conceituação das fases históricas de transformações midiáticas que acontecem simultaneamente com o desenrolar dessa história do videoclipe. São elas: cultura de massas, cultura das mídias e a cibercultura. Edgar Morin, no início dos anos 1960, ao estudar o fenômeno da cultura de massa, elaborou uma teoria culturológica. A meta de Morin foi elaborar uma sociologia da cultura contemporânea. Ele investigava a relação entre consumidor e o objeto de consumo estabelecida através da contradição entre as exigências produtivas e técnicas de estandardização e o caráter particular e inovador do consumo cultural. O consumo dos produtos se transforma em autorrealização e oferece, em forma de ficção, tudo o que é suprimido da realidade; o irreal torna-se parte da vida dos consumidores (MORIN, 2005, p. 23-24). Lucia Santaella sugere uma descrição das eras culturais: oral, escrita, impressa, de massas, das mídias e digital. As últimas três são mais interessantes para este trabalho. A autora sugere que se pode usar também a expressão “formas culturais”, para dar a ideia que não se trata de períodos lineares, mas de um processo cumulativo de complexificação, no qual uma nova formação comunicativa se integra à anterior, provocando reajustamentos e refuncionalizações. Mas a autora deixa claro que alguns elementos desaparecem para dar lugar a outros, porque em cada período histórico a cultura fica sob o domínio da técnica ou tecnologia de comunicação mais recente (SANTAELLA, 2008, p. 13-14). Santaella evidencia que a partir da década de 1970 houve um processo progressivo de convivência da televisão com outras máquinas e equipamentos que 95 apresentavam uma lógica distinta daquela exibida pela comunicação de massa. A TV, então tipificada como elemento produtor da cultura de massa, passou a se conectar com máquinas de cópias, fax, videocassete, videogame, segmentação de revistas, programas de rádio para públicos específicos, TV a cabo, ou seja, processos comunicacionais a que se denominou de “cultura das mídias” (SANTAELLA, 2003, p. 79). Foi nessa paisagem midiática – na passagem da cultura de massa à cultura das mídias – que surgiu o videoclipe como gênero audiovisual. Tratava-se, nessas condições sociotécnicas, de um gênero coexistente em distintas fases da história da mídia porque foi criado como produto da cultura de massa, mas, segundo as transformações tecnológicas, migrou para a cultura das mídias (com a criação da MTV), mas sem deixar de fazer parte da cultura de massa. Além disso, ainda seguindo as constantes transformações das condições sociotécnicas, enfaticamente digitais a partir da década de 1990, passou a fazer parte também da cibercultura que reflete as novas transformações na concepção de mídia e de práticas midiáticas. O pesquisador Douglas Kellner, ao estudar a cultura das mídias, afirma que foi apenas com a televisão que a mídia se transformou em forma dominante na cultura, na política e na vida social. A mídia veicula a cultura de maneira comercial, como mercadoria que deve ser popular e atrair a audiência de grande público. A necessidade de vender significa que esses produtos culturais devem ser eco da vivência social. Nesse caso, o exemplo seria a segmentação dos canais a cabo que têm públicos bem definidos e programação específica (KELLNER, 2001, p. 23). Os videoclipes estão presentes em vários sites e blogs da rede mundial de computadores, o que os faz pertencer também a cibercultura. Pierre Lévy afirma que o crescimento do ciberespaço resulta de um movimento internacional de jovens ansiosos para experimentar, de maneira coletiva, as formas de comunicação proporcionadas por esse ambiente que diferem da forma que se apresentam as mídias clássicas (LÉVY, 1999, p. 11). O ciberespaço será o mediador da inteligência coletiva, num processo de trocas que ocorre em decorrência da interconexão de conhecimentos, competências e imaginações. Numa perspectiva teórica entre o diagnóstico e o prognóstico, Lévy sugeria que o ciberespaço seria um novo suporte de informação e de comunicação 96 que proporcionará a emergência de gêneros de conhecimento inusitados, critérios de avaliação inéditos para orientar o saber e novos atores na produção e tratamento dos conhecimentos (LÉVY, 1999, p. 167). O crítico marxista inglês Raymond Willians relata que houve a substituição da relação mestre/aprendiz pela relação professor/aluno, no campo das artes (WILLIANS, 2000, p. 60). Na cibercultura, essa moderna relação de ensinoaprendizagem de que fala Williams torna-se um tanto quanto flexível, uma vez que internautas, em especial o público jovem, aprendem por analogia: veem, observam, copiam, tendo como “tutores” outros jovens e suas competências e virtuoses, num processo de produção, circulação e consumo de informações que fogem aos processos tradicionais e modernos de ensino e aprendizagem. Um exemplo é a grande quantidade, difícil de tratar em números, de vídeos amadores postados no site YouTube, que indica, na variedade disponível, os modos como hoje se produz um videoclipe. Para Manuel Castells, cientista social espanhol estudioso da era da informação, a teoria busca apontar os efeitos da tecnologia da informação no mundo contemporâneo. Segundo o autor, o processo de transformação tecnológico se expande de maneira exponencial devido à capacidade de criar novas interfaces entre campos tecnológicos com linguagem digital na qual a informação é gerada, armazenada, recuperada, processada e transmitida. Castells conclui dizendo que as novas tecnologias da informação não são simples ferramentas: elas são processos que se desenvolvem e se redefinem com o uso e aplicações (CASTELLS, 2008, p. 68-69). São essas condições históricas que reforçam a constatação de que os usuários de internet desenvolvem saberes no uso que fazem das ferramentas das tecnologias digitais. É a partir das práticas da cibercultura que se percebe os consumidores como produtores e participantes dessa cultura emergente. Henry Jenkins a denomina de cultura participativa. O autor afirma que estamos numa longa era de transição e transformação de como os meios de comunicação operam. E que os produtores de mídia deverão readequar o relacionamento com os consumidores. O público está ocupando um lugar nessa intersecção entre os velhos e os novos meios de 97 comunicação, e, mais, esse público exige o direito de participar intimamente da cultura (JENKINS, 2008, p. 50). Um exemplo da aplicação deste conceito de cultura participativa em videoclipes é a utilização de imagens de fãs nos clipes, mas não só de maneira anônima mostrando a multidão. Os fãs aparecem em enquadramento de primeiro plano podendo ser identificados. É o caso do videoclipe dos Jonas Brothers, When You Look Me In The Eyes, produzido em 2007. Outro caso de participação do público é o videoclipe de Celebration, de Madonna. A segunda versão do clipe foi protagonizada por fãs e pela filha da cantora. As gravações foram feitas em Barcelona e Madri durante a turnê The Stick and Sweet, em 2009. O clipe foi produzido da mesma maneira que a primeira versão, com pessoas dançando, uma por vez, em fundo preto ou branco. As imagens são intercaladas com as da cantora também dançando. A banda Radiohead lançou um concurso que convoca os fãs da banda a produzir um videoclipe de animação para qualquer uma das músicas do álbum In Rainbows. O vencedor seria premiado em dinheiro (dez mil dólares). O concurso ocorreu em 2008, ao todo foram 900 storyboards inscritos, desses 236 foram produzidos. Apenas treze foram selecionados para a semifinal, cinco ficaram para a final. A banda decidiu premiar quatro videoclipes. Na modernidade, é visualizando as transições das fases midiáticas da cultura de massas, da cultura das mídias e da cibercultura e ainda as esferas de produção, circulação e consumo do videoclipe que se percebe a atuação e desenvolvimento do capitalismo. Ele faz uma autocrítica a partir da obsolescência planificada dos objetos e das estruturas para que elas sejam substituídas por outros novos, num processo de inovação incessante para que assim seja estimulado o consumo e a obtenção constante de lucro. Nestor Garcia Canclini enfatiza, em âmbito latino-americano, o fato de que a produção e a circulação de bens simbólicos no campo artístico ocorrem atualmente de acordo com as regras de inovação e obsolescência periódicas. Essas são as regras que conformam a relação, bastante estreita, entre capitalismo e modernidade. O processo de modernização, no capitalismo histórico, necessita constantemente envelhecer seus próprios produtos e reinventar constantemente o processo de 98 consumo. Trata-se, portanto, de uma era marcada enfaticamente pela busca de previsão do futuro, e muito menos pelas memórias da tradição. É na segunda metade do século XX que o consumo, como categoria sociológica, ganha evidência nos processos econômicos e incidir diretamente nos processos culturais. Consumo incessantemente renovado, surpresa e divertimento passam a ser elementos constituintes do mercado (CANCLINI, 2006, p. 33). A transitoriedade dos objetos sugere, em outras palavras, sua própria desaparição, uma substituição contínua, tendo os objetos prazo de validade (BAUMAN, 2001, p. 141). São nessas condições históricas, de constante inovação nos processos técnicos e midiáticos, que são percebidas as transformações constantes também nos processos culturais. Da cultura de massa, passando pela cultura das mídias, chegando hoje à cibercultura, notam-se os modos como o capitalismo, automodulante por sua própria necessidade de produção de lucro e mais-valia, exige das empresas de tecnologia uma corrida incessante pelos processos de inovação. É desses processos de inovação que as distintas fases da cultura, no que ela se relaciona diretamente com o campo da comunicação, reportam as modulações operadas pela economia nos produtos audiovisuais como o videoclipe. Em plena década de 1980, com o advento do neoliberalismo que atravessou o mundo, era preciso capturar um segmento social que continuava ainda explorado de modo insuficiente como público consumidor: o público jovem, que anos mais tarde viria a constituir um dos mais proeminentes segmentos de consumo na passagem de século XX para o século XXI. Modernização, mercado e capitalismo são temas que atravessam a produção, a circulação e o consumo de videoclipe na cultura de massa, na cultura das mídias e na cibercultura. 99 CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao desenvolver esse trabalho o intuito foi investigar a dimensão audiovisual da música na contemporaneidade, tendo como norteador o gênero audiovisual videoclipe. Para tanto, foi utilizada como orientação a paisagem midiática do advento deste gênero audiovisual até os dias atuais. A história do videoclipe se constitui a partir da evolução tecnológica envolto nas esferas de produção, circulação e consumo deste bem simbólico. Esse acompanhamento da evolução tecnológica se dá na transformação das fases midiáticas da cultura de massa, cultura das mídias e cibercultura. Trata-se de uma história das mídias conduzida pelas práticas sociais que envolvem o objeto pesquisado. Em termos de pesquisas sobre clipes o que havia disponível, até então, eram trabalhos que negligenciavam e/ou menosprezavam o tema, criticando a agilidade da edição (CALABRESE, 1987), tipificando e categorizando (KAPLAN, 1987), criticando a falta de narrativa de alguns clipes (HEBDIGE, 1988), criticando o fato de ele pertencer a propaganda (AUFDERHEIDE, 1986). Esses estudos foram realizados na década de 1980, nos anos em que o termo videoclipe começa a ser utilizado. Mais recentemente existem estudos que privilegiavam o aspecto da linguagem (SOARES, 2004); alguns que apresentavam os contrapontos da linguagem da TV e vídeo em relação ao videoclipe (MACHADO, 1997; PEDROSO & MARTINS, 2006); e ainda, aqueles que faziam análises de caso (SOARES, 2004; BRYAN, 2004) ou comentavam aspectos pontuais do tema (JANOTTI, 1997; JESUS, 2004). Estes trabalhos apresentam-se como fontes que vêm norteando os estudos sobre o videoclipe como produto audiovisual. A história do videoclipe teve início quando foi observada a necessidade de acompanhamento sonoro para as imagens no início do cinema. A partir de então, foram inventados aparelhos para suprir essa necessidade, entre eles: kinetophone e chronophone. Por volta dos anos de 1925 a Warner Brothers e a Fox Film Corporation apresentaram aparelhos que sincronizavam sons e imagens. Em 1929, foi lançado o primeiro filme “cantado” do cinema: O cantor de jazz, protagonizado por Al Jolson. Alguns anos depois, em 1940, os estúdios Disney produzem o filme 100 Fantasia que traz para as telas uma sincronia entre música e imagem. Em 1945 surgiu a “vitrola de fichas visuais”. A década seguinte ficou marcada pelos números musicais da TV e do cinema. Nessa ocasião, o Rei do Rock, Elvis Persley, estrelou vários musicais. Em 1960, surgiu o scopitone aparelho semelhante ao jukebox, que tinha acoplado um projetor de cinema. Na mesma época é lançado o filme A Hard Day’s Night, dos Beatles. Banda que também gravava apresentações musicais que eram denominados “promos” (primórdios do videoclipe). Em 1974, Raul Seixas grava o videoclipe da música Gita para o programa Fantástico, da Rede Globo de Televisão. Em 1975, a banda Queen lança o videoclipe: Bohemian Rhapsody, que foi considerado o primeiro videoclipe intencionalmente produzido para fins de divulgação da música e do álbum. Primeiro veio a prática social de experimentar a música unida com a imagem, depois começaram ser desenvolvidos o nome e o conceito deste gênero audiovisual, ferramenta de marketing na divulgação do artista (banda ou intérprete). Somente na década de 1980, de acordo com Soares (2004, p. 23), que começa a ser utilizado o termo videoclipe que deriva de clipping e fazia referência à técnica midiática de recortar imagens e fazer colagens em forma de narrativa em vídeo. A conceituação de videoclipe vem da edição pautada pela agilidade e pelas imagens em velocidade frenética, sem obrigação de contar uma história linear com início, meio e fim. Podia ser somente uma justaposição de imagens com o objetivo mercadológico de apresentar e vender a música (SOARES, 2004, p. 24). Atualmente, a velocidade frenética de cenas e/ou edição não são as únicas opções de produtores audiovisuais de videoclipe. Ele pode ser lento e compassado, de acordo com a música e a própria subjetividade da criação. A tentativa de classificação/categorização do gênero videoclipe torna-se difícil pelo fato dele ser próprio para experimentações de linguagens, para hibridação, trocas, fusões e intercâmbios culturais em geral na relação com outros gêneros audiovisuais. Ele é próprio, também, para transparecer a contaminação em que se expressa o rompimento de barreiras técnicas e opções estéticas de um gênero audiovisual para outro. Com esse percurso de narrar história e delinear o conceito do videoclipe, o que pôde ser constatado foi que o esforço de classificação deve ser 101 substituído pelo entendimento do videoclipe como processo mediador de linguagens, como gênero que produz interfaces entre outras práticas comunicacionais e que carrega a potência de criação, de argumentos inventivos relativos ao roteiro, a execução e a produção. Dentre as interfaces descritas no trabalho destaca-se: cinema (com cinema mudo e a troca simbólica com a trilha sonora de filme), televisão (séries e propagandas), documentário, animação e videoarte. Nos dias atuais, o videoclipe é veiculado nas mídias massiva, segmentada e em rede, evidenciando que é possível pertencer ao mesmo tempo a cultura de massa, a cultura das mídias e a cibercultura, graças a convergência. A cultura da convergência (JENKINS, 2008) é o processo no qual os meios de comunicação têm suas funções e status transformados pela introdução de novas tecnologias. Dessa maneira, tem-se a circulação e o consumo do bem simbólico videoclipe sendo redefinidos pelas transformações midiáticas contemporâneas. É a partir das transformações sociotécnicas que percebemos na cibercultura que se verificam mudanças no comportamento dos consumidores de videoclipes, nesse contexto, eles buscam os clipes em sites e blogs. Além disso, eles também se comportam, em alguns casos, como produtores fazendo clipes amadores (que podem ser visualizados no YouTube) e também videoclipes profissionais como o caso do clipe Hibi no neiro, da banda japonesa Sour. Em sites como YouTube tem-se a convivência de clipes amadores (produzidos com poucos recursos técnicos e teóricos) e profissionais feitos para veiculação internet. Na medida em que esses vídeos amadores têm um grande número de visualizações e de que são calcados nas práticas midiáticas da interatividade, da intertextualidade e da desterritorialização. Essa conjuntura pode arrastar o conceito de videoclipe, forçando-o a ponto de se flexibilizar e abarcar vídeos de músicas não produzidas na indústria fonográfica e vídeos desprovidos de aparatos técnicos e teóricos. O gênero audiovisual videoclipe está diante de uma possível reformulação. 102 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ADORNO, Theodor. A indústria cultural e sociedade. Trad. Julia Elisabeth Levy. São Paulo: Paz e Terra, 2007. ASSIS, Diego. Detentos estão orgulhosos de Thriller, diz diretor de presídio. Artigo com publicação no dia 25/07/2007. Disponível em: http://g1.globo.com/Noticias/PopArte/0,,MUL76789-7084,00.html. Acesso em: 07 de junho de 2008. AZEVEDO, Ludmila. O homem de 100 clipes. Matéria publicada dia 21/06/2006 Jornal da Tarde (online). Disponível em: http://www.jt.com.br/editorias/2006/06/21/var-1.94.12.20060621.1.1.xml. Acesso em: 02 de abril de 2008. BARRETO, Jorge Lima. Música & Mass Media. Disponível em: www.culturgest.pt/docs/mmm-180106.pdf. 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