O FUNDAMENTAL É O SER HUMANO ARÍSTIDES VARGAS The fundamental thing is the human being Arístides Vargas, diretor do grupo equatoriano Malayerba, além de trazer os espetáculos Nossa Senhora das Nuvens e A Moça dos Livros Usados, participará do Fórum de Teatro Latino-Americano no FITBH/2008. Por e-mail, ele respondeu às perguntas dos curadores Eid Ribeiro e Richard Santana. FIT - Você dirigiu espetáculos em vários países da América latina. Poderia fazer uma análise das diferenças, em relação à criação teatral, que observou e viveu nesses países? 94 AV - Certamente, dirigi espetáculos em vários países da América Latina como Costa Rica, México, Argentina, Nicarágua e outros. O que eu pude constatar é a grande diversidade expressiva que há, não só entre uns e outros países, mas em um mesmo território. Tenho a sensação de que o teatro é um espaço onde as diferenças devem ser vistas como algo positivo. É importante assinalar que em um mundo altamente uniformizado, essas diferenças fazem com que as comunidades se tornem singulares em termos expressivos. FIT- Quantas peças você escreveu até agora? Qual é seu método de trabalho com relação à dramaturgia? Você escreve solitariamente ou também trabalha o texto a partir de improvisações dos atores? AV - Fundamentalmente, trabalho com um coletivo teatral, isso significa que o texto está imerso em uma dinâmica de criação que envolve as atrizes e os atores que participam de cada projeto. Não ne- A Moça dos Livros Usados Malayerba/Equador/2008 (Foto: Elena Vargas) cessariamente o ponto de partida de nosso grupo é o texto teatral, entendendo este unicamente pela parte literária. Penso que o grande texto teatral é aquele que faz com que se suscite, no campo do espetáculo, a maior quantidade de imagens poéticas. Escrevi cerca de 15 textos teatrais e cada um foi encenado por diferentes grupos. Não concebo a criação do texto teatral como um ato desprendido do coletivo e do espetáculo, mas não tenho nada contra autores que escrevem, de forma solitária, obras para teatro. Creio que os processos podem ser múltiplos, amplos e diferentes entre si. De todas as formas, é o espetáculo, em sua trama visual e sonora, o que determina as qualidades de uma dramaturgia. FIT - Como diretor, como é seu processo de trabalho? Há diferenças, em relação à estética, em outros grupos que dirige fora do Equador? AV - O ponto de partida sempre é a conversa íntima que estabeleço com as diferentes equipes com as quais trabalho. Essa conversa não só se relaciona com o teatro, mas também abarca as vivências, memórias e experiências vividas pelos artistas com os quais trabalho. Para mim, o fundamental é o ser humano, a pessoa com a qual nos dispomos a vivenciar uma viagem comum, uma viagem que será o conjunto de nossas identidades e de nossas diferenças. Para mim, o teatro não é unicamente uma representação, é também uma apresentação, entendendo esta como os antecedentes que possibilitam que o teatro seja feito de uma maneira, e não de outra. FIT - Pelo pouco que conhecemos de sua obra, no Brasil, sua dramaturgia aborda uma temática realista popular; sem dúvida, poderíamos dizer que, quando é encenada sob sua direção, adquire uma estética bastante sofisticada, quanto à encenação. Você imagina, quando escreve, como dirigirá a peça, ou tudo surge de acordo com as particularidades do elenco? AV - Quero dizer-lhe que, para além da denominação em relação à minha obra, sinto que é difícil classificar o que escrevo. Muitas vezes se tem dito que há nela elementos do universo popular, combinados com elementos sofisticados. Também se Nossa Senhora das Nuvens – Malayerba/Equador/2008 (Foto: Elena Vargas) tem dito que há conexões com o surrealismo e o realismo mágico. Quero dizer que escrevo a partir de formas narrativas que conformam minha cultura pessoal e que, combinadas com minhas vivências, se tornam obsessivas, e dentro dessas obsessões não previstas, já que não escrevo esperando que se repitam meus fantasmas, não tenho nenhuma imagem prevista de antemão. O exercício de escrever é autônomo em relação à outra forma de criação, que é a direção. FIT - Sua obra, infelizmente, ainda é pouco encenada no Brasil. Sem dúvida, gostaríamos de saber mais sobre ela, pois tem muito a ver com a nossa realidade. É possível conseguir todos os seus textos para que possamos divulgá-los entre os grupos brasileiros? AV - A difusão dos textos, infelizmente, não depende de nossa vontade, e de fato meus textos são pouco conhecidos no Brasil, se bem que alguns foram encenados em alguns pontos do País. Há um problema adicional que é a língua, e que seria resolvido por meio de uma boa política de publicações, tanto do lado do português como do lado do castelhano, especialmente da América Latina. Seria uma boa idéia conceber edições bilíngües de autores latino-americanos contemporâneos, tanto do Brasil quanto do resto da América latina. Na 9ª edição do FIT-BH esperamos marcar presença com textos de nosso grupo através de livros e revistas. In addition to bringing the performances Nossa Senhora das Nuvens and A Moça dos Livros Usados, Arístides Vargas, director of the Equatorian group Malayerba, will take part in the Fórum de Teatro Latino-Americano (Latin American Theater Forum) at FIT-BH 2008. He gave the interview below by e-mail to the curators Eid Ribeiro and Richard Santana. FIT - You have directed performances in many Latin American countries. Could you analyzes the differences concerning theater creation which you have observed and experienced in these countries? 96 AV - Absolutely, I have directed performances in many Latin American countries such as Costa Rica, Mexico, Argentina, Nicaragua and others. What I could observe is the wide expressive diversity that exists, not only among the countries, but also in the same territory. I have the feeling that the theater is a space in which differences should be seen as a positive thing. It is important to point out that in a highly uniform world these differences make communities become singular in expressive terms. FIT - How many plays have you written so far? What is your A Moça dos Livros Usados - Malayerba/Equador/2008 (Foto: Elena Vargas) work method concerning dramaturgy? Do you write alone or also work the text from the actors' improvisations? AV - Basically I work with a theater collective, which means that the text is inserted in a creation dynamics which involves the actresses and actors who take part in each project. The starting point of our group is not necessarily the theater text, understood only as literary work. I think the great theater text is one that can raise, in the performance area, the higher number of poetic images. I have written about 15 theater texts and each one of them was set by different groups. I do not conceive the creation of the theater text as an act disconnected from the collective and the performance, but I have nothing against authors who write theater works in a lonely way. I believe the processes may be multiple, large and different among themselves. Of all ways, it is the performance, in its visual and sound plot, that determinates the qualities of dramaturgy. FIT - As a director, how is your work process? Is it any different, in aesthetic terms, from others groups you direct outside of Ecuador? AV - The starting point is always a close conversation I have with the different teams I work with. That conversation is related not only to theater, but also about the memories and experiences lived by the artists I work with. For me, the fundamental thing is the human being, the person with whom we are willing to share a common trip, a trip that will be the intersection of our identities and our differences. For me, theater is not only a representation, it is also a presentation, and I see this as the predecessor which makes it possible for theater to be made in a way and not the other. FIT - From the little we know about your work in Brazil, your dramaturgy approaches a popular realistic theme; without a doubt we could say that, when is set under your direction, it acquires a quite sophisticated aesthetics in what relates to the setting. Dou you imagine, when you write, how you will direct the play, or everything comes out according to the particular characteristics of the cast? AV - I would like to say that, beyond the opinions about my work, I feel it is difficult to classify what I write. Many times has it been said that there are some elements of the popular universe in it, combined with sophisticated elements. It has also been said that there are connections with surrealism and magic realism. I would like to say that I write from narrative forms which conform with my personal culture and which, combined with my experiences, become obsessive, and inside these unpredicted obsessions, since I do not write expecting my ghosts to be repeated, I have no predicted image right away. The exercise of writing is autonomous in relation to the other form of creation which is direction. FIT - Unfortunately your work is still not very often set in Brazil. Without a doubt, we would like to know more about it, because it has a lot to do with our reality. Is it possible to get all your texts so we can disseminate them among the Brazilian groups? AV - Unfortunately the dissemination of texts does not depend on my wish, and in fact my texts are little known in Brazil, although some of them have been set in some parts of the country. There is an additional problem which is the language, which could be resolved with a good policy of publications, both from the Portuguese side and the Spanish side, especially from Latin America. It would be a good idea to conceive bilingual editions of contemporary Latin American authors, both from Brazil and from the rest of Latin America. In the 9th edition of FIT-BH we hope present texts by our group by means of books and magazines. 97 Corpo, Carne e Espírito – Johannes Birringer/Paulo Chagas/Alemanha-Brasil/2008 (Foto: Johannes Birringer)