Audiência Pública nº 01/2014 Patrimônio Cultural no Licenciamento Ambiental Rio de Janeiro, 13 de Outubro de 2014 1 Instrução Normativa nº 01 de 2014 Considerações encaminhadas pela comunidade arqueológica, apoiadas pela Diretoria da SAB, e baseadas no documento: “Instrução Normativa nº 01 de 2014 – Manual de Aplicação do IPHAN”, que estabelece procedimentos administrativos a serem observados pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional nos processos de licenciamento dos quais participe (p.5) 2 Comentários Gerais Entendemos a necessidade de revisão dos procedimentos relativos ao Licenciamento Ambiental. Consideramos que a IN tem aspectos positivos, sobretudo, no que se refere aos seguintes aspectos: • padronização dos trâmites burocráticos nas Superintendências do IPHAN nos Estados; • inclusão de ampla categoria de patrimônios; • orientação sobre Educação Patrimonial (apesar de haver ressalvas apontadas pelos colegas). 3 Da não relação das etapas de licenciamento (obtenção de Licença Prévia, Licença de Instalação e Licença de Operação) às fases da pesquisa arqueológica PROBLEMA Sem a vinculação com as fases do licenciamento, pesquisas intensas podem ocorrer em áreas de empreendimentos que poderão ser alteradas ou acontecer dos mesmos não serem implantados, gerando interferências em sítios que poderiam ter sido preservados. PERGUNTAS • Como se dará a vinculação da pesquisa arqueológica às etapas do licenciamento ambiental previstas, anteriormente, na Portaria nº 230/2002, e indicadas na Portaria Interministerial nº 419/2011 ? • Tendo em vista, as incongruências observadas entre o disposto na IN e a Portaria Interministerial nº 419/2011, a primeira revogará a segunda? 4 Da classificação dos empreendimentos e impactos por níveis PROBLEMA A IN não considera a intensidade de interferência sobre o solo, mas privilegia as dimensões da área afetada em relação à mudança de seu uso. Loteamentos podem ser menores em área, mas impactam de forma intensa o solo; ao contrário da agro-silvicultura que atinge área maior, mas resulta em menor impacto. PERGUNTAS • Uma vez que a correlação entre o patrimônio arqueológico (e cultural em geral) e os empreendimentos tem muitas especificidades, essa classificação não deveria ser apenas uma referência? • No entendimento da IN que profissional seria mais capacitado do que o arqueólogo para determinar o nível do empreendimento, os potenciais impactos e os procedimentos de pesquisa adequados à situação apresentada em campo? 5 Da supressão e redução da avaliação do arqueólogo nos empreendimentos de nível I e II PROBLEMA Ao exigir para o Nível I exclusivamente o Termo de Compromisso do Empreendedor (TCE), a IN determina que o empreendedor seja o responsável por identificar e comunicar possíveis ocorrências arqueológicas. PERGUNTAS • A IN considera que o empreendedor, que não tem formação em Arqueologia, poderá realizar o que, anteriormente, era um dos procedimentos do diagnóstico? • Não se considera o risco do patrimônio arqueológico ser ignorado, de forma a evitar prejuízos econômicos resultantes da interrupção da obra, sob a alegação de desconhecimento técnico sobre o que seriam as “ocorrências arqueológicas”? 6 Da supressão e redução da avaliação do arqueólogo nos empreendimentos de nível I e II PROBLEMA Ao exigir para o Nível II apenas o “Acompanhamento Arqueológico” a IN desconsidera que tal procedimento é moroso, metodologicamente menos eficiente e de maior custo no caso de ocorrer a identificação e proteção do patrimônio arqueológico existente. • PERGUNTA O Estado pode determinar a metodologia a ser empregada no conhecimento do potencial arqueológico de uma área? Não é o arqueólogo o profissional capacitado para definir as abordagens a serem utilizadas em campo, em contexto específicos? 7 Dos empreendimentos com intervenções de caráter secundário PROBLEMA A fragmentação do empreendimento poderá minimizar o seu impacto global e nesse caso ampliar o potencial impacto sobre o patrimônio arqueológico . PERGUNTA • Nos empreendimentos complexos, como esses, não deveria ser considerado o maior Nível de enquadramento para todas as intervenções? 8 Do impedimento do Arqueólogo (Coordenador e/ou de Campo) receber novas autorizações de pesquisa durante a vigência de todo cronograma da obra PROBLEMA A emissão de autorização de pesquisa pelo IPHAN muitas vezes não coincide com o início dos trabalhos de campo, que com frequência sofrem atraso por questões de natureza diversa. PERGUNTA • Como o IPHAN pretende gerenciar esses cronogramas? 9 Do impedimento do Arqueólogo (Coordenador e/ou de Campo) receber novas autorizações de pesquisa durante a vigência de todo cronograma da obra PROBLEMA A pesquisa arqueológica não se resume ao trabalho de campo, sendo apenas uma parte do processo de investigação, que inclui atividades que não implicam na presença do arqueólogo em campo (laboratório, curadoria de material, relatório, etc). PERGUNTA • O cronograma considerado não deveria ser apenas aquele relativo ao trabalho de campo? O que impede o arqueólogo de assumir outro projeto enquanto, por exemplo, redige os relatórios de um trabalho anterior? 10 Da supressão e redução da avaliação do arqueólogo nos empreendimentos de nível I e II PROBLEMA O entendimento pelo disposto na IN de que os “achados fortuitos” podem ser a base do reconhecimento do potencial arqueológico de uma dada área. PERGUNTA • A noção de “achado fortuito” não se refere, exatamente, a uma ocorrência identificada fora do âmbito de uma intervenção sistemática? Não é algo que acontece sem previsão ou planejamento? Não é, portanto, incompatível com os procedimentos sistemáticos previstos no bojo da IN? 11 Sobre a nomeação conjunta do empreendedor e do Arqueólogo na Portaria de Autorização PROBLEMA Ao nomear empreendedor e Arqueólogo na Portaria a IN considera que ambos têm os mesmos objetivos e responsabilidades, apesar dos interesses serem, em diversos aspectos, divergentes. PERGUNTAS • Isso não facilitará a substituição do arqueólogo, em caso de interesse do empreendedor? • Ao arqueólogo serão atribuídos erros do empreendedor? • O arqueólogo terá a função de fiscalizar as ações executadas pelo empreendedor corresponsável, mesmo nos períodos em que não estiver em campo? 12 Sobre a nomeação conjunta do empreendedor e do Arqueólogo na Portaria de Autorização PROBLEMA Como afirmado, anteriormente, a IN propõe que haja uma simetria de objetivos, interesses e responsabilidades entre o empreendedor e o arqueólogo. PERGUNTA • Sendo assim, porque as sanções são dirigidas apenas aos arqueólogos? 13 Sobre o preenchimento da Ficha de Caracterização da Atividade - FCA PROBLEMA • A IN considera que o empreendedor poderá preencher a FCA a partir dos dados disponibilizados no site do IPHAN. PERGUNTA • Considerando a situação atual, como esse preenchimento será feito, uma vez que os dados não estão atualizados e os disponíveis não indicam as coordenadas geográficas precisas? 14 Sobre o preenchimento da Ficha de Caracterização da Atividade PROBLEMA A IN considera que o empreendedor deverá apresentar na FCA informações sobre “estudos anteriormente realizados”, mas afirma que “os relatórios de pesquisa acadêmica” não serão considerados como tal. PERGUNTA • O conhecimento acadêmico não é relevante? As áreas anteriormente conhecidas, apenas pelas pesquisas acadêmicas, serão consideradas como um território vazio de potencial arqueológico para o licenciamento? Qual a justificativa para essa exclusão? 15 Dos Prazos PROBLEMA A IN determina prazos muito céleres para a manifestação do IPHAN. PERGUNTA • Considerando a atual estrutura do órgão, como esses prazos poderão ser cumpridos? Não estaríamos arriscando por demais a possibilidade de emissão de licenças à revelia do IPHAN? 16 Considerações Finais De forma geral, os aspectos considerados mais sensíveis, e que vão além do que foi apresentado aqui, dizem respeito a um possível engessamento metodológico das pesquisas arqueológicas, ao empoderamento dos empreendedores no processo, à redução de responsabilidades do arqueólogo mesmo nas ações em que sua expertise é fundamental e aos prazos pouco realistas para a condução dos trâmites burocráticos pelo IPHAN. Um cenário preocupante para a preservação do patrimônio arqueológico e para o campo da Arqueologia no país. 17 Agradecimentos Carlos Costa – Universidade Federal do Recôncavo Baiano; Christiane Lopes Machado – Rhea Estudos e Projetos; Cláudio Prado de Mello – Instituto de Pesquisa Histórica e Arqueológica do Rio de Janeiro e Terra Brasilis Arqueologia Ltda; Discentes do Museu de Arqueologia e Etnologa da Universidade de São Paulo; Elizabete de Castro Mendonça e Carlos Alberto Santos Costa – Coordenadores da Rede de Professores e Pesquisadores do Campo da Museologia; Grupo de Arqueólogos de Minas Gerais (Adriano Batista de Carvalho; Anaeli Queren Almeida; Andreas Valtuille Lieber; Andrei Isnardis Horta; Ângelo Pessoa Lima; Clarisse Callegari Jacques; Edilaine Aparecida de Souza; Elber Lima Glória; Erik Alves de Oliveira; Évelin Luciana Malaquias Nascimento; Geraldo Pereira de Morais Júnior; Henrique Alcantara e Silva; Lara de Paula Passos; Leandro Vieira da Silva; Lilian Cordeiro; Luís Alberto Silveira da Rosa; Luísa de Assis Roedel; Marcelo Fagundes; Marcony Lopes Alves; Nathalia R Dias Guimarães; Patrícia Fernanda Carvalho de Sousa; Rafael Esteffanio Miranda; Raíssa Baldoni Alves; Raquel Caldas Nolasco; Rogério Tobias Jr.; Taísa Corrêa Jóia; Tallyta Suenny Araujo da Silva; Tânia Porto Guimarães Veloso; Thiago de Souza Nascimento; Valdiney Amaral Leite; Vanessa Linke Salvio); Lúcia Juliani – A Lasca Arqueologia; Marcio W. M. Castro; Maria Dulce Gaspar - Museu Nacional/Universidade Federal do Rio de Janeiro (Iramar Venturini ; Débora da Rocha Barbosa; Henrique Vences Barros; Suzana Maria Roma Bulcão; Marcelle Costa Mandarino ; Gina Faraco Bianchini; Cilcair Andrade de Lima; Cleide Coelho Trindade; Jacqueline Oliveira Amorim; Cassandra Silva Ribeiro; Zélia dos Santos; Renata Nunes Alves); Mariana Petry Cabral e equipe do Instituto de Pesquisas Científicas e Tecnológicas do Estado do Amapá – IEPA; Paulo Seda – Universidade do Estado do Rio de Janeiro e Instituto Brasileiro de Pesquisas Arqueológicas; Paulo Zanettini – Zanettini Arqueologia; Solange Bezerra Caldarelli – Scientia Consultoria Científica; Universidade Federal de Pelotas - Discentes e Docentes do Curso de Bacharelado e do Programa de Pós-Graduação em Antropologia/UFPEL . 18