A COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO E O RECONHECIMENTO DO
TEMPO DE SERVIÇO (TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO) PARA FINS
PREVIDENCIÁRIOS
Leonardo de Mello Caffaro
Procurador Federal junto à Procuradoria Regional Federal da 2ª Região (Rio de Janeiro) –
Advocacia Geral da União- AGU. Especialista em Direito do Trabalho pela Universidade Gama
Filho/RJ.
RESUMO: O presente trabalho visa discorrer acerca do reconhecimento do tempo de
contribuição para fins previdenciários a partir das sentenças trabalhistas considerando o
disposto as normas que envolvem a atribuição de competência da Justiça do Trabalho
para executar as contribuições sociais decorrentes de suas decisões. A abordagem que
será realizada enfocará a questão dos benefícios previdenciários sujeitos ao tempo de
contribuição e a questão dos efeitos da prescrição da execução das contribuições
previdenciárias nos benefícios previdenciários, considerando a orientação da
Constituição Federal, da Legislação e da Administração Previdenciária, bem como do
Poder Judiciário, especialmente do Supremo Tribunal Federal-STF no julgamento do
RE 569.056/ 2008. Tentar-se-á de certa forma compor os interesses do segurado e do
sistema de previdência social, a partir de sua configuração constitucional e da busca de
coerência, efetividade e justiça, na medida do possível.
PALAVRAS-CHAVE: Contribuições previdenciárias. Execução. Justiça do Trabalho.
Competência. Prescrição. Tempo de Contribuição. Reconhecimento. Benefícios
Previdenciários.
SUMÁRIO: 1 INTRODUÇÃO; 2 A COMPETÊNCIA
DA JUSTIÇA DO TRABALHO, O DIREITO DO
TRABALHO E A QUESTÃO PREVIDENCIÁRIA; 3 DO
RECONHECIMENTO DO TEMPO DE SERVIÇO
(TEMPO
DE
CONTRIBUIÇÃO)
PARA
FINS
PREVIDENCIÁRIOS
E
AS
SENTENÇAS
TRABALHISTAS;
4
DA
CONCLUSÃO;
5
REFERÊNCIAS.
“ Na luta do rochedo contra o mar, quem sofre é o marisco.”
( Ditado popular)
1 INTRODUÇÃO
A questão do reconhecimento do tempo de serviço, a rigor agora tempo de
contribuição, para fins previdenciários a partir das sentenças da Justiça do
Trabalho, apesar de sua grande relevância social – observe-se a enorme massa de
trabalhadores que fica desprovida da cobertura da previdência social na idade
avançada por não ter pleiteado seus direitos trabalhistas e previdenciários em
período prévio, a maior parte das vezes por completa falta de instrução, gerando
grande carga de atuação da Assistência Social –, continua um tema em aberto,
diante das disposições normativas existentes.
Com o objetivo tornar mais clara a problemática e despertar maiores
debates, apresentamos as considerações a seguir expostas como contribuição para
o tema.
2 A COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO, O DIREITO DO TRABALHO
E A QUESTÃO PREVIDENCIÁRIA.
Na sua busca por Justiça, o Direito Processual visa dar efetividade ao Direito
Material ao qual está vinculado. Assim procede o Processo do Trabalho com relação
ao Direito do Trabalho. A competência da Justiça do Trabalho, antes da Emenda
Constitucional 45/2004, concentrava-se basicamente no Direito do Trabalho, sendo
aquela um ramo especializado do Poder Judiciário neste ramo do Direito.
1
Como sustenta Fábio Zambitte Ibrahim alguns estudiosos defendem que o
Direito do Previdenciário seria uma evolução do Direito do Trabalho, havendo
inclusive quem sustentasse o contrário. O fato é que existe, em parte, uma intima
correlação entre o Direito do Trabalho e o Previdenciário.
Ocorre que houve uma intensa mudança na competência da Justiça do
Trabalho, especialmente em razão da emenda Constitucional n◦ 45/2004, passando
sua competência básica não ser a da pessoa do trabalhador e do empregador para
ser sobre a matéria relação de trabalho, expressão mais ampla que relação de
emprego, envolvendo dentre outros os trabalhadores avulsos, eventuais e
autônomos. Em dois dispositivos fixou-se a competência em razão da matéria
relação de trabalho.
No inciso I do art. 114 da Constituição da República Federativa do Brasil,
fixou-se a competência para processar e julgar as ações oriundas da relação de
trabalho. No inciso IX; outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, na
forma da lei.
2
Ora entende-se por trabalho, como define Süssekind , toda energia humana
, física ou intelectual, empregada com fim produtivo, que pode ser objeto de uma
relação jurídica.
A partir dessa noção, sustenta-se que só o trabalho da pessoa humana
poderia ser objeto de relação de trabalho, excluindo-se, por exemplo, as pessoas
jurídicas. Por questões de interesse político, houve decisão da Presidência do
Supremo Tribunal Federal – referendada pelo plenário – na ADI n.3.395, proposta
pela AJUFE- Associação dos Juízes Federais do Brasil excluindo as relações jurídicas
dos servidores estatutários desenvolvidas com as pessoas jurídicas de Direito
Público, já que estas, a rigor, estariam incluídas dentro da relação de trabalho.
Grande parte da doutrina entende excluída a relação de consumo, pela diferença de
enfoque da prestação de serviço a um destinatário final, ou seja, a um consumidor
e da relação de trabalho.
Para uns não haveria diferença entre o inciso I e o IX, já que estariam
falando da mesma coisa. Para outros o inciso IX só serviu para excluir aquelas
relações de trabalho que por força de lei fossem excluídas da competência da
Justiça do Trabalho.
3
No nosso modo de ver, há uma nítida diferença entre ações oriundas de
relação e controvérsias decorrentes de relação de trabalho. Oriundas seriam
aquelas originadas da própria relação de trabalho e decorrentes seriam outras
relações jurídicas que adviriam da relação de trabalho, sendo esta questão
prejudicial, como a previdenciária, a tributária e a criminal ( sendo que, neste
último caso, há uma ADI do Procurador Geral da República – STF- ADI n 3684-DF,
rel. min Cezar Peluso- questionando a competência Criminal da Justiça do
Trabalho).
1
IBRAHIM, Fabio Zambitte. Curso de Direito Previdenciário. 7. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2006. p. 110.
2
SÜSSEKIND, Arnaldo. Curso de Direito do Trabalho. Rio de Janeiro: Renovar,2002. p.3.
3
LEITE, Carlos Henrique Bezerra.Curso de direito processual do trabalho. 5. ed. São Paulo: LTr 2007. p. 220-224.
O fato é que, apesar da expectativa, anterior à reforma do Judiciário, de que
Justiça do Trabalho passasse também a ser uma Justiça Previdenciária não se
concretizou, salvo com relação a execução, de ofício, das contribuições sociais
previstas no art.195,I,a, e II, e seus acréscimos legais decorrentes das sentenças
que proferir, que a rigor já vinha previsto em emenda anterior( E.C. n◦ 20/98)
É a partir deste tópico que se reacendeu a questão do reconhecimento do
tempo de serviço ( agora tempo de contribuição) para fins previdenciários com
relação às sentenças da Justiça do Trabalho, como se verá a seguir.
3 DO RECONHECIMENTO DO TEMPO DE SERVIÇO (TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO) PARA FINS PREVIDENCIÁRIOS E AS SENTENÇAS
TRABALHISTAS.
O artigo 55, § 3◦, da Lei n◦ 8213/91 dispõe que a comprovação do tempo de
serviço, para fins de concessão do benefício da aposentadoria por tempo de serviço,
dependeria de início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente
testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito,
conforme disposto no Regulamento da Previdência Social. As regras contidas nos
artigos 62, §5◦ e 63 do Decreto n◦ 3.048/99 viriam na mesma orientação.
A Previdência Social , em razão do que foi acima exposto, não vem
admitindo como eficaz a decisão judicial trabalhista que não tenha sido fundada em
início razoável de prova material constante dos autos do processo.
Tal exigência tem sua razão de ser em virtude da carência dos benefícios
previdenciários, que - como se sabe – pressupõe um número mínimo de efetivas
contribuições mensais, podendo em determinados casos haver reclamações
trabalhistas forjadas, visando burlar tal requisito legal, de maneira que seria
necessário provar o efetivo desempenho da atividade laborativa, em regra, a partir
de prova documental contemporânea da referida atividade.
É interessante destacar a mudança do TST na sua jurisprudência relativa ao
4
recolhimento das contribuições sociais , como destaca Bezzerra Leite :
Imperioso ressaltar que recentemente o TST alargou a competência
da Justiça do Trabalho para determinar o pagamento das
contribuições prevideniciárias quando o processo trabalhista
acarretar o reconhecimento de vínculo de emprego. Essa posição foi
adotada pela Terceira Turma, que deu provimento, por maioria de
votos, ao recurso do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Tal
decisão foi proferida no recurso de revista RR-1119/99 e teve
grande repercussão, pois o “pagamento das contribuições sociais e
o conseqüente reconhecimento previdenciário do tempo de serviço
são de fundamental importância para quem, constastando o
propósito irregular do mau empregador, vê reconhecida a existência
de contrato individual de trabalho”, acescentou o relator, juiz
convocado Alberto Bresciani. O acórdão da Suprema Corte
Trabalhista fondou-se no art. 114,§3◦,da CF ( atualmente inciso
VIII) e no Decreto n. 3048/99 que regulamentou a lei previdenciária
dispondo que “se da decisão resultar reconhecimento de vinculo
empregatício, deverão ser exigidas as contribuições, tanto do
empregador como do reclamante ( trabalhador) , para todo período
reconhecido, ainda que o pagamento das remunerações a ele
correspondentes não tenha sido reclamado na ação.
A referida decisão do TST foi muito criticada porque, segundo
alguns, o exame de uma ação meramente declaratória, isto é, que
reconhece tão-somente a relação de emprego, não poderia levar o
4
op. cit. p. 247
juiz a promover de ofício o desconto do crédito previdenciário, o que
levou o TST a reformular a redação do item I da Súmula n. 368
daquela Corte, para firmar o entendimento de que a “competência
da Justiça do Trabalho, quanto à execução das contribuições
previdenciárias, limita-se às sentenças condenatórias em pecúnia
que proferir e aos valores, objeto do acordo homologado, que
integram o salário de contribuição.
A verdadeira razão dessa mudança de orientação do TST não foi essa questão
5
técnico-processual – até porque como reconhece Humberto Teodoro Júnior em
casos específicos a busca de efetividade pode fazer que sentenças declaratórias
possam ter força executiva, se delas se possa extrair o conteúdo obrigacional mas o esvaziamento da autoridade do TST pelo órgão previdenciário, que por atos
como a IN INSS/PRES n. 11/ 2006,em seu artigo 112, §3◦, inciso I, alínea “c”(
atualmente, IN INSS/ PRES Nº 20, de 11/10/2007), também acrescentava a este
requisito de início de prova documental, para fins de comprovação do tempo de
serviço, ainda que tenha havido recolhimento de contribuições, a manifestação do
Instituto Nacional do Seguro Social-INSS no processo judicial acerca do indício de
prova material atendendo-se ao princípio do contraditório.
O posicionamento adotado pela Previdência é no sentido de que o
reconhecimento judicial do vínculo de emprego e o efetivo recolhimento das
contribuições previdenciárias não obrigariam o INSS a reconhecer o tempo de
serviço do reclamante, por força do art. 472 do CPC, quando preceitua que a
sentença faz coisa julgada entre as partes, não beneficiando, nem prejudicando
terceiros.
Por força deste entendimento, doutrinadores como Maurício Godinho
defendem que o INSS deveria participar da lide trabalhista para ser abrangido pela
coisa Julgada. Ocorre que, de lege lata, a Competência Previdenciária do Regime
Geral é distinta da Competência Trabalhista, sendo a rigor da Competência da
Justiça Federal as questões do Regime Geral de Previdência e a ação de
responsabilidade do acidente do trabalho em face do INSS da competência da
Justiça Estadual, devendo nesses casos a ação ser direcionada especificamente
contra o INSS.
Há julgados do Colendo Superior Tribunal de Justiça e da Câmara Nacional de
Revisão dos Juizados Especiais Federais se posicionando pela admissão da decisão
trabalhista como início de prova material para a ação proposta perante a Justiça
Federal, com vistas ao reconhecimento do tempo de serviço.
Ocorre que por questões afetas ao equilíbrio atuarial o benefício deixou de ser
aposentadoria por tempo de serviço para ser aposentadoria por tempo de
contribuição pela Emenda Constitucional n. 20/98, regido pela Lei n. 8213/91, arts
52 a 56, existindo ainda a aposentadoria por idade ( Lei n. 8213/91, arts 48 a 51),
concedida aos 65 anos de idade, se homem , e 60 anos de idade , se mulher,
reduzido em cinco anos o limite para os trabalhadores rurais de ambos os sexos e
para os que exerçam atividade em regime de economia familiar,nestes incluídos o
produtor rural, o garimpeiro e o pescador artesanal. Este último benefício comporta
carência , que é de 180 contribuições mensais, sendo na verdade, essa carência
exigida somente para os segurados filiados ao RGPS após 24/07/91,data de
promulgação da Lei n.8213/91, que aumentou este período de 60 para 180 meses.,
havendo regra de transição para os demais segurados prevista no art. 142 desta
6
Lei, como observa Fabio Zambitte .
5
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil – Processo de Execução e Cumprimento de sentença,
Processo Cautelar e Tutela de urgência. Rio de Janeiro: Forense,2007. p. 25 e segs.
6
IBRAHIM, Fábio Zambitte. Resumo de direito previdenciário. 8.ed. Rio de Janeiro: Impetus,2007. p. 177 e segs.
Observe-se que há uma nítida diferença entre tempo de serviço e tempo de
contribuição. Quando o regime era o do tempo de serviço, bastava ao trabalhador
comprovar o exercício de atividade remunerada enquadrada como de contribuição
obrigatória (diferentemente do segurado facultativo, cuja filiação ao regime geral é
ato voluntário) para que seu tempo de atividade laborativa fosse computado para
fins previdenciários, cabendo a Previdência Social cobrar da pessoa responsável
pelo recolhimento da contribuição social as contribuições não recolhidas,
responsabilidade esta que na relação de emprego cabia ao empregador. No regime
do tempo de contribuição, não basta apenas a comprovação do tempo de serviço,
mas deve-se comprovar também o efetivo recolhimento da contribuição social,
sendo aquele apenas um pressuposto para a obrigatoriedade do recolhimento
desta, nos casos especificados em lei.
Deve-se destacar que a mesma Emenda Constitucional (E.C. n. 20/98) que
estabeleceu o regime do tempo de contribuição, em substituição ao do tempo de
serviço, previu a execução de ofício da contribuição previdenciária do empregado e
do empregador, o que visava, pelo menos diretamente, resguardar os interesses do
empregado, que com o novo regime teria que demonstrar à Previdência Social o
efetivo recolhimento das contribuições sociais para ter seu tempo de contribuição
efetivamente reconhecido.
Com a criação da Receita Federal do Brasil, pela Lei n.11.457/07, foi alterada
a redação do parágrafo único do art. 876 da CLT, ao preceituar que: “Serão
executadas ex-officio as contribuições sociais devidas em decorrência de decisão
proferida pelos Juízes e Tribunais do Trabalho, resultantes de condenação ou
homologação de acordo, inclusive sobre os salários pagos durante o período
contratual reconhecido.”
Tal dispositivo veio fazer frente ao item I da Súmula n. 368 do TST.
Observe-se que o Supremo Tribunal Federal já tem entendimento firmado a
respeito do âmbito de incidência do art. 114, VIII, da Constituição Federal, como se
vê a seguir:
Recurso
extraordinário.
Repercussão
geral
reconhecida.
Competência da Justiça do Trabalho. Alcance do art. 114, VIII, da
Constituição Federal. A competência da Justiça do Trabalho prevista
no art. 114, VIII, da Constituição Federal alcança apenas a execução
das contribuições previdenciárias relativas ao objeto da condenação
constante das sentenças que proferir. (RE 569.056, Rel. Min.
Menezes Direito, julgamento em 11-9-08, DJE de 12-12-08)
Ocorre que em se tratando de sentenças condenatórias, segundo a moderna
7
doutrina , viabiliza-se o reconhecimento da prescrição, o que pode causar sérios
prejuízos para o trabalhador no que toca aos aspectos relativos à questão
Previdenciária, ainda mais estando vinculados os benefícios previdenciários ao
tempo de contribuição.
Vemos como alternativa para o trabalhador fazer valer o seu tempo de serviço
( tempo de contribuição) a regra do §1◦ do art. 11 da Consolidação das Leis do
Trabalho-CLT, que exclui da prescrição trabalhista as ações que tenham por objeto
anotações para fins de prova junto à Previdência Social. Com isso, a prescrição só
atingiria as verbas trabalhistas, não se referindo às contribuições previdenciárias,
pelo menos esta é a tese que defendemos a partir de uma interpretação extensiva.
A rigor, tais ações teriam caráter declaratório, não incidindo a prescrição,
observando-se que no Direito do Trabalho vigora o Princípio da Primazia da
7
AMORIM FILHO, Agnelo . Critério Científico para Distinguir a Prescrição da Decadência e para Identificar as Ações
Imprescritíveis. Revista dos Tribunais v. 300, out. 1960, p. 7 – reproduzido na RT, v. 711, out. 1997, p.725-6.
Realidade, configurando-se a relação de emprego uma vez preenchidos os
requisitos dos arts. 2º e 3º da CLT, destacando-se que o art. 442 da CLT estabelece
que o contrato individual de trabalho é o acordo tácito ou expresso, correspondente
à relação de emprego e os arts. 9º e 444 da CLT vedam artifícios tendentes a
fraudar a relação de emprego.
Como vimos, a sentença declaratória pode ter força executiva, se dela se
possa extrair o conteúdo obrigacional, porém, uma vez mantido o entendimento de
que somente as sentenças condenatórias poderiam viabilizar a execução das
contribuições previdenciárias, poder-se-ia concluir que, em face do disposto no § 1º
do art. 11 da CLT, estaríamos diante de uma situação excepcional de uma ação
condenatória em que não se possibilita o reconhecimento da prescrição (da
exigência de recolhimento das Contribuições Previdenciárias), considerando que a
prova do recolhimento da contribuição previdenciária é necessária para o
reconhecimento do tempo de contribuição.
O fato é que, em nome da efetividade e da concretização da noção de
Justiça, não se admitindo as situações anteriormente apresentadas, ter-se-ia que
admitir a construção de que, em último caso, estar-se-ia reconhecendo uma
obrigação de emitir declaração de vontade, que, nos termos do art.466 A do CPC,
uma vez transitada em julgado, produzirá todos os efeitos da declaração não
emitida ( regramento este que poderia ser aplicado subsidiariamente à CLT nos
termos do art. 769 deste diploma legal, sendo adequado aos fins sociais da
consolidação).
Excluídas do prazo prescricional, as contribuições poderiam ser cobradas,
considerando inclusive as regras de sucessão de empresa, a desconsideração da
personalidade jurídica ( art.50 do CC) e a sucessão causa mortis. Não se aplicando
o prazo da prescrição quinquenal fixado pelo STF para cobrança das contribuições
sociais (permitindo-se, assim, a prova perante a Previdência Social do recolhimento
das contribuições previdenciárias, para contagem do tempo de contribuição).
A determinação judicial para que a secretaria da vara do trabalho efetuasse
as anotações na CTPS, nos termos do § 1◦ e 2◦do art. 39 da CLT , seria medida
meramente formal. Podendo a sentença servir como início de prova material na
Justiça Federal, devendo-se, no entanto, comprovar o efetivo recolhimento das
contribuições sociais, destacando-se o caráter contributivo da Previdência Social.
Entendemos que a Administração Previdenciária deve rever seu
posicionamento, considerando, inclusive, o entendimento já consolidado junto ao
Superior Tribunal de Justiça e da Câmara Nacional de Revisão dos Juizados
Especiais Federais de que a sentença trabalhista pode ser considerada como início
de prova material.
O que necessita ocorrer é que a Administração Previdenciária aprecie o
conteúdo das sentenças trabalhistas e, havendo elementos que possam embasar o
posicionamento de que a reclamação trabalhista foi utilizada para acobertar uma
fraude ( o que dependerá de uma apuração de caráter fático) - especialmente com
relação ao requisito de carência dos benefícios previdenciários ( requisito este que
deveria ser fiscalizado pelo próprio Juiz do Trabalho) –, indeferir, em sendo o caso,
o reconhecimento do tempo de contribuição de forma fundamentada, comunicando
à Procuradoria Federal (Advocacia Geral da União) ou ao Ministério Público do
Trabalho a respeito do apurado para que se possa propor ação rescisória do
julgado.
Atuaria a Procuradoria Federal em nome do INSS, na qualidade este de
terceiro interessado, fluindo o prazo decadencial para propositura da ação rescisória
a partir da ciência da Administração Previdenciária do teor da sentença e o
Ministério Público do Trabalho no combate à fraude ou colusão teria como início do
prazo decadencial o da ciência da decisão judicial a ser impugnada pelo parquet.
O que não pode é a Administração Previdenciária tentar impor que a
Procuradoria Federal exerça o trabalho de apuração da irregularidade ( que,
destaque-se, tem caráter fático), fazendo às vezes dos órgãos administrativos
competentes, uma vez que tal exigência extrapola o papel constitucional da
Advocacia Pública.
Observe-se que tanto o requerimento administrativo de reconhecimento do
tempo de contribuição como a ação judicial proposta em face do não
reconhecimento de tempo de contribuição dependeria de prova do recolhimento da
contribuição previdenciária, o que poderia ser facilitado a partir da inclusão dos
dados constantes da guia de recolhimento da Receita Federal do Brasil no Cadastro
Nacional de Informações Sociais - CNIS, aos moldes do que é feito com a Guia de
Recolhimento do FGTS e Informações à Previdência Social- GFIP, especificando-se o
período de contribuição abrangido pelo montante arrecadado.
Destaque-se que não há que se falar em presunção de recolhimento com
relação ao empregado, salvo no caso de constar tal informação no CNIS, uma vez
que a sistemática de contagem de tempo deixou de ser por tempo de serviço para
ser por tempo de contribuição. Deve ser frisado que a cobrança de ofício da
Contribuição Previdenciária pela Justiça do Trabalho visa resguardar o interesse do
trabalhador e não o de arrecadação da Administração, que, se fosse o caso ( o que,
pelo menos diretamente, não é), poder-se-ia valer do Executivo Fiscal, devendo
ficar bem claro que o período de contribuição a ser reconhecido é aquele referente
às contribuições recolhidas, o que se constata a partir da legislação referente à
cobrança da contribuição, anteriormente referida ( realçando o caráter contributivo
da Previdência Social).
Por fim, observemos o teor do atual entendimento da Administração
Previdenciária previsto na IN INSS/ PRES Nº 20, de 11/10/2007, em seu art. 112, §
3º:
Art. 112: [...]
§ 3º Na concessão ou revisão de aposentadoria por tempo de
contribuição ou qualquer outro benefício do RGPS, sempre que for
utilizado tempo de serviço/contribuição decorrente de ação
trabalhista transitada em julgado, o processo deverá ser
encaminhado para análise da Chefia de Benefícios da APS, devendo
ser observado:
I – a contagem de tempo de serviço/contribuição dependerá da
existência de início de prova material, isto é, de documentos
contemporâneos que possibilitem a comprovação dos fatos
alegados, juntados ao processo judicial ou ao requerimento
administrativo do benefício;
II - o cômputo de salário-de-contribuição considerará os valores
constantes da ação trabalhista transitada em julgado, ainda que não
tenha havido o recolhimento das contribuições devidas à
Previdência Social, mas desde que o início de prova material
referido no inciso I contemple os valores referidos, observando o
limite máximo e mínimo de contribuição; Alterado pela INSTRUÇÃO
NORMATIVA INSS/PRES Nº 27, DE 30 DE ABRIL DE 2008 - DOU DE
02/05/2008)
Tal entendimento é duplamente prejudicial: para o trabalhador e para
Previdência Social.
Para o trabalhador, pois ignora a realidade de grande parte das relações de
emprego, que são firmadas sem qualquer base documental. Destaque-se que a
própria CLT estabelece que o contrato de trabalho é o ajuste expresso ( escrito ou
verbal) ou tácito, isso sem falar dos chamados “pagamentos por fora” ( que devem,
em sendo o caso, ser especifica e efetivamente provados pelo trabalhador, não se
cabendo falar em meros indícios ou presunções, pois, sem a rigorosa apuração
judicial e administrativa, poderão dar margem a situações fraudulentas).
Para a Previdência Social, pois poder-se-ia estar diante de Contribuições
Sociais prescritas, considerando o prazo quinquenal reconhecido pela orientação do
Supremo Tribunal Federal, premiando-se assim o mau empregador.
4 DA CONCLUSÃO
A Ciência do Direito veio e vem passando por profundas modificações. Em
seus primórdios houve uma enorme preocupação conceptualista em busca de
8
segurança, formando-se a chamada Jurisprudência dos Conceitos . Posteriormente
em busca de maiores resultados práticos, de efetividade, veio a chamada
Jurisprudência dos Interesses. Até que mais recentemente procurando-se em dar
maior objetividade às concepções de Justiça surgiu a chamada Jurisprudência dos
Valores.
A rigor, todas essas propostas metodológicas não são independentes. Sem
conceitos claros não há segurança e muito menos ciência. Sem preocupação com os
interesses em jogo não há, no Direito, resultados práticos, não há efetividade. E
sem valores não há como concretizar a noção de Justiça.
É a partir de uma abordagem dialética do Direito relativa a suas dimensões
normativas e factuais, integrando conceitos, interesses e valores, que se pode
buscar as interpretações e argumentos para resolver o problema.
Com a ampliação da Competência da Justiça do Trabalho , maiores razões
surgiram para que ela se tornasse uma Justiça também previdenciária, o que no
nosso ver dependeria de simples mudança legislativa. Trata-se, portanto, de
questão afeta à política legislativa, que não pode ser imposta à Previdência Social,
na atual configuração do ordenamento jurídico.
Mas se deve ponderar se a Justiça do Trabalho está preparada para aplicar
outros institutos que não os trabalhistas ( é o que se vai ver com a nova
competência). A par de terem um entroncamento comum na questão social, o fato
é que o Direito Previdenciário tem princípios próprios com relação ao Direito do
Trabalho que precisam ser respeitados, como o equilíbrio atuarial.
Eis uma questão que importa reflexão. O que não pode, pelo princípio da
dignidade da pessoa humana, é o trabalhador virar o marisco da estória. Nem a
Previdência transformar-se em Assistência Social, destacando-se o caráter
contributivo da primeira, que a diferencia desta última ( que também está sujeita à
ponderação com vistas à máxima efetividade do direito fundamental, confrontandose o mínimo existencial e a reserva do possível).
Deve-se, certamente, assegurar-se o respeito aos direitos da pessoa
humana do trabalhador, o que não se pode é – citando mais uma vez um ditado
popular - “ fazer caridade com o chapéu alheio”...
8
Jurisprudência como sinônimo de ciência do Direito.
5 REFERÊNCIAS
AMORIM FILHO, Agnelo. Critério Científico para Distinguir a Prescrição da Decadência e para
Identificar as Ações Imprescritíveis. Revista dos Tribunais, v. 300, out. 1960, p. 7 –
reproduzido na Revista dos Tribunais, v. 711, out. 1997.
IBRAHIM, Fábio Zambitte. Curso de Direito Previdenciário. 7. ed. Rio de Janeiro:
Impetus, 2006.
______. Resumo de direito previdenciário. 8. ed. Rio de Janeiro: Impetus,2007.
LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de direito processual do trabalho. 5. ed. São
Paulo: LTr 2007.
THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil – Processo de
Execução e Cumprimento de sentença, Processo Cautelar e Tutela de urgência. Rio
de Janeiro: Forense, 2007.
SÜSSEKIND, Arnaldo. Curso de Direito do Trabalho. Rio de Janeiro: Renovar, 2002.
Download

A Competência da Justiça do Trabalho e o Reconhecimento do