A COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO E O RECONHECIMENTO DO TEMPO DE SERVIÇO (TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO) PARA FINS PREVIDENCIÁRIOS Leonardo de Mello Caffaro Procurador Federal junto à Procuradoria Regional Federal da 2ª Região (Rio de Janeiro) – Advocacia Geral da União- AGU. Especialista em Direito do Trabalho pela Universidade Gama Filho/RJ. RESUMO: O presente trabalho visa discorrer acerca do reconhecimento do tempo de contribuição para fins previdenciários a partir das sentenças trabalhistas considerando o disposto as normas que envolvem a atribuição de competência da Justiça do Trabalho para executar as contribuições sociais decorrentes de suas decisões. A abordagem que será realizada enfocará a questão dos benefícios previdenciários sujeitos ao tempo de contribuição e a questão dos efeitos da prescrição da execução das contribuições previdenciárias nos benefícios previdenciários, considerando a orientação da Constituição Federal, da Legislação e da Administração Previdenciária, bem como do Poder Judiciário, especialmente do Supremo Tribunal Federal-STF no julgamento do RE 569.056/ 2008. Tentar-se-á de certa forma compor os interesses do segurado e do sistema de previdência social, a partir de sua configuração constitucional e da busca de coerência, efetividade e justiça, na medida do possível. PALAVRAS-CHAVE: Contribuições previdenciárias. Execução. Justiça do Trabalho. Competência. Prescrição. Tempo de Contribuição. Reconhecimento. Benefícios Previdenciários. SUMÁRIO: 1 INTRODUÇÃO; 2 A COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO, O DIREITO DO TRABALHO E A QUESTÃO PREVIDENCIÁRIA; 3 DO RECONHECIMENTO DO TEMPO DE SERVIÇO (TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO) PARA FINS PREVIDENCIÁRIOS E AS SENTENÇAS TRABALHISTAS; 4 DA CONCLUSÃO; 5 REFERÊNCIAS. “ Na luta do rochedo contra o mar, quem sofre é o marisco.” ( Ditado popular) 1 INTRODUÇÃO A questão do reconhecimento do tempo de serviço, a rigor agora tempo de contribuição, para fins previdenciários a partir das sentenças da Justiça do Trabalho, apesar de sua grande relevância social – observe-se a enorme massa de trabalhadores que fica desprovida da cobertura da previdência social na idade avançada por não ter pleiteado seus direitos trabalhistas e previdenciários em período prévio, a maior parte das vezes por completa falta de instrução, gerando grande carga de atuação da Assistência Social –, continua um tema em aberto, diante das disposições normativas existentes. Com o objetivo tornar mais clara a problemática e despertar maiores debates, apresentamos as considerações a seguir expostas como contribuição para o tema. 2 A COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO, O DIREITO DO TRABALHO E A QUESTÃO PREVIDENCIÁRIA. Na sua busca por Justiça, o Direito Processual visa dar efetividade ao Direito Material ao qual está vinculado. Assim procede o Processo do Trabalho com relação ao Direito do Trabalho. A competência da Justiça do Trabalho, antes da Emenda Constitucional 45/2004, concentrava-se basicamente no Direito do Trabalho, sendo aquela um ramo especializado do Poder Judiciário neste ramo do Direito. 1 Como sustenta Fábio Zambitte Ibrahim alguns estudiosos defendem que o Direito do Previdenciário seria uma evolução do Direito do Trabalho, havendo inclusive quem sustentasse o contrário. O fato é que existe, em parte, uma intima correlação entre o Direito do Trabalho e o Previdenciário. Ocorre que houve uma intensa mudança na competência da Justiça do Trabalho, especialmente em razão da emenda Constitucional n◦ 45/2004, passando sua competência básica não ser a da pessoa do trabalhador e do empregador para ser sobre a matéria relação de trabalho, expressão mais ampla que relação de emprego, envolvendo dentre outros os trabalhadores avulsos, eventuais e autônomos. Em dois dispositivos fixou-se a competência em razão da matéria relação de trabalho. No inciso I do art. 114 da Constituição da República Federativa do Brasil, fixou-se a competência para processar e julgar as ações oriundas da relação de trabalho. No inciso IX; outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, na forma da lei. 2 Ora entende-se por trabalho, como define Süssekind , toda energia humana , física ou intelectual, empregada com fim produtivo, que pode ser objeto de uma relação jurídica. A partir dessa noção, sustenta-se que só o trabalho da pessoa humana poderia ser objeto de relação de trabalho, excluindo-se, por exemplo, as pessoas jurídicas. Por questões de interesse político, houve decisão da Presidência do Supremo Tribunal Federal – referendada pelo plenário – na ADI n.3.395, proposta pela AJUFE- Associação dos Juízes Federais do Brasil excluindo as relações jurídicas dos servidores estatutários desenvolvidas com as pessoas jurídicas de Direito Público, já que estas, a rigor, estariam incluídas dentro da relação de trabalho. Grande parte da doutrina entende excluída a relação de consumo, pela diferença de enfoque da prestação de serviço a um destinatário final, ou seja, a um consumidor e da relação de trabalho. Para uns não haveria diferença entre o inciso I e o IX, já que estariam falando da mesma coisa. Para outros o inciso IX só serviu para excluir aquelas relações de trabalho que por força de lei fossem excluídas da competência da Justiça do Trabalho. 3 No nosso modo de ver, há uma nítida diferença entre ações oriundas de relação e controvérsias decorrentes de relação de trabalho. Oriundas seriam aquelas originadas da própria relação de trabalho e decorrentes seriam outras relações jurídicas que adviriam da relação de trabalho, sendo esta questão prejudicial, como a previdenciária, a tributária e a criminal ( sendo que, neste último caso, há uma ADI do Procurador Geral da República – STF- ADI n 3684-DF, rel. min Cezar Peluso- questionando a competência Criminal da Justiça do Trabalho). 1 IBRAHIM, Fabio Zambitte. Curso de Direito Previdenciário. 7. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2006. p. 110. 2 SÜSSEKIND, Arnaldo. Curso de Direito do Trabalho. Rio de Janeiro: Renovar,2002. p.3. 3 LEITE, Carlos Henrique Bezerra.Curso de direito processual do trabalho. 5. ed. São Paulo: LTr 2007. p. 220-224. O fato é que, apesar da expectativa, anterior à reforma do Judiciário, de que Justiça do Trabalho passasse também a ser uma Justiça Previdenciária não se concretizou, salvo com relação a execução, de ofício, das contribuições sociais previstas no art.195,I,a, e II, e seus acréscimos legais decorrentes das sentenças que proferir, que a rigor já vinha previsto em emenda anterior( E.C. n◦ 20/98) É a partir deste tópico que se reacendeu a questão do reconhecimento do tempo de serviço ( agora tempo de contribuição) para fins previdenciários com relação às sentenças da Justiça do Trabalho, como se verá a seguir. 3 DO RECONHECIMENTO DO TEMPO DE SERVIÇO (TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO) PARA FINS PREVIDENCIÁRIOS E AS SENTENÇAS TRABALHISTAS. O artigo 55, § 3◦, da Lei n◦ 8213/91 dispõe que a comprovação do tempo de serviço, para fins de concessão do benefício da aposentadoria por tempo de serviço, dependeria de início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento da Previdência Social. As regras contidas nos artigos 62, §5◦ e 63 do Decreto n◦ 3.048/99 viriam na mesma orientação. A Previdência Social , em razão do que foi acima exposto, não vem admitindo como eficaz a decisão judicial trabalhista que não tenha sido fundada em início razoável de prova material constante dos autos do processo. Tal exigência tem sua razão de ser em virtude da carência dos benefícios previdenciários, que - como se sabe – pressupõe um número mínimo de efetivas contribuições mensais, podendo em determinados casos haver reclamações trabalhistas forjadas, visando burlar tal requisito legal, de maneira que seria necessário provar o efetivo desempenho da atividade laborativa, em regra, a partir de prova documental contemporânea da referida atividade. É interessante destacar a mudança do TST na sua jurisprudência relativa ao 4 recolhimento das contribuições sociais , como destaca Bezzerra Leite : Imperioso ressaltar que recentemente o TST alargou a competência da Justiça do Trabalho para determinar o pagamento das contribuições prevideniciárias quando o processo trabalhista acarretar o reconhecimento de vínculo de emprego. Essa posição foi adotada pela Terceira Turma, que deu provimento, por maioria de votos, ao recurso do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Tal decisão foi proferida no recurso de revista RR-1119/99 e teve grande repercussão, pois o “pagamento das contribuições sociais e o conseqüente reconhecimento previdenciário do tempo de serviço são de fundamental importância para quem, constastando o propósito irregular do mau empregador, vê reconhecida a existência de contrato individual de trabalho”, acescentou o relator, juiz convocado Alberto Bresciani. O acórdão da Suprema Corte Trabalhista fondou-se no art. 114,§3◦,da CF ( atualmente inciso VIII) e no Decreto n. 3048/99 que regulamentou a lei previdenciária dispondo que “se da decisão resultar reconhecimento de vinculo empregatício, deverão ser exigidas as contribuições, tanto do empregador como do reclamante ( trabalhador) , para todo período reconhecido, ainda que o pagamento das remunerações a ele correspondentes não tenha sido reclamado na ação. A referida decisão do TST foi muito criticada porque, segundo alguns, o exame de uma ação meramente declaratória, isto é, que reconhece tão-somente a relação de emprego, não poderia levar o 4 op. cit. p. 247 juiz a promover de ofício o desconto do crédito previdenciário, o que levou o TST a reformular a redação do item I da Súmula n. 368 daquela Corte, para firmar o entendimento de que a “competência da Justiça do Trabalho, quanto à execução das contribuições previdenciárias, limita-se às sentenças condenatórias em pecúnia que proferir e aos valores, objeto do acordo homologado, que integram o salário de contribuição. A verdadeira razão dessa mudança de orientação do TST não foi essa questão 5 técnico-processual – até porque como reconhece Humberto Teodoro Júnior em casos específicos a busca de efetividade pode fazer que sentenças declaratórias possam ter força executiva, se delas se possa extrair o conteúdo obrigacional mas o esvaziamento da autoridade do TST pelo órgão previdenciário, que por atos como a IN INSS/PRES n. 11/ 2006,em seu artigo 112, §3◦, inciso I, alínea “c”( atualmente, IN INSS/ PRES Nº 20, de 11/10/2007), também acrescentava a este requisito de início de prova documental, para fins de comprovação do tempo de serviço, ainda que tenha havido recolhimento de contribuições, a manifestação do Instituto Nacional do Seguro Social-INSS no processo judicial acerca do indício de prova material atendendo-se ao princípio do contraditório. O posicionamento adotado pela Previdência é no sentido de que o reconhecimento judicial do vínculo de emprego e o efetivo recolhimento das contribuições previdenciárias não obrigariam o INSS a reconhecer o tempo de serviço do reclamante, por força do art. 472 do CPC, quando preceitua que a sentença faz coisa julgada entre as partes, não beneficiando, nem prejudicando terceiros. Por força deste entendimento, doutrinadores como Maurício Godinho defendem que o INSS deveria participar da lide trabalhista para ser abrangido pela coisa Julgada. Ocorre que, de lege lata, a Competência Previdenciária do Regime Geral é distinta da Competência Trabalhista, sendo a rigor da Competência da Justiça Federal as questões do Regime Geral de Previdência e a ação de responsabilidade do acidente do trabalho em face do INSS da competência da Justiça Estadual, devendo nesses casos a ação ser direcionada especificamente contra o INSS. Há julgados do Colendo Superior Tribunal de Justiça e da Câmara Nacional de Revisão dos Juizados Especiais Federais se posicionando pela admissão da decisão trabalhista como início de prova material para a ação proposta perante a Justiça Federal, com vistas ao reconhecimento do tempo de serviço. Ocorre que por questões afetas ao equilíbrio atuarial o benefício deixou de ser aposentadoria por tempo de serviço para ser aposentadoria por tempo de contribuição pela Emenda Constitucional n. 20/98, regido pela Lei n. 8213/91, arts 52 a 56, existindo ainda a aposentadoria por idade ( Lei n. 8213/91, arts 48 a 51), concedida aos 65 anos de idade, se homem , e 60 anos de idade , se mulher, reduzido em cinco anos o limite para os trabalhadores rurais de ambos os sexos e para os que exerçam atividade em regime de economia familiar,nestes incluídos o produtor rural, o garimpeiro e o pescador artesanal. Este último benefício comporta carência , que é de 180 contribuições mensais, sendo na verdade, essa carência exigida somente para os segurados filiados ao RGPS após 24/07/91,data de promulgação da Lei n.8213/91, que aumentou este período de 60 para 180 meses., havendo regra de transição para os demais segurados prevista no art. 142 desta 6 Lei, como observa Fabio Zambitte . 5 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil – Processo de Execução e Cumprimento de sentença, Processo Cautelar e Tutela de urgência. Rio de Janeiro: Forense,2007. p. 25 e segs. 6 IBRAHIM, Fábio Zambitte. Resumo de direito previdenciário. 8.ed. Rio de Janeiro: Impetus,2007. p. 177 e segs. Observe-se que há uma nítida diferença entre tempo de serviço e tempo de contribuição. Quando o regime era o do tempo de serviço, bastava ao trabalhador comprovar o exercício de atividade remunerada enquadrada como de contribuição obrigatória (diferentemente do segurado facultativo, cuja filiação ao regime geral é ato voluntário) para que seu tempo de atividade laborativa fosse computado para fins previdenciários, cabendo a Previdência Social cobrar da pessoa responsável pelo recolhimento da contribuição social as contribuições não recolhidas, responsabilidade esta que na relação de emprego cabia ao empregador. No regime do tempo de contribuição, não basta apenas a comprovação do tempo de serviço, mas deve-se comprovar também o efetivo recolhimento da contribuição social, sendo aquele apenas um pressuposto para a obrigatoriedade do recolhimento desta, nos casos especificados em lei. Deve-se destacar que a mesma Emenda Constitucional (E.C. n. 20/98) que estabeleceu o regime do tempo de contribuição, em substituição ao do tempo de serviço, previu a execução de ofício da contribuição previdenciária do empregado e do empregador, o que visava, pelo menos diretamente, resguardar os interesses do empregado, que com o novo regime teria que demonstrar à Previdência Social o efetivo recolhimento das contribuições sociais para ter seu tempo de contribuição efetivamente reconhecido. Com a criação da Receita Federal do Brasil, pela Lei n.11.457/07, foi alterada a redação do parágrafo único do art. 876 da CLT, ao preceituar que: “Serão executadas ex-officio as contribuições sociais devidas em decorrência de decisão proferida pelos Juízes e Tribunais do Trabalho, resultantes de condenação ou homologação de acordo, inclusive sobre os salários pagos durante o período contratual reconhecido.” Tal dispositivo veio fazer frente ao item I da Súmula n. 368 do TST. Observe-se que o Supremo Tribunal Federal já tem entendimento firmado a respeito do âmbito de incidência do art. 114, VIII, da Constituição Federal, como se vê a seguir: Recurso extraordinário. Repercussão geral reconhecida. Competência da Justiça do Trabalho. Alcance do art. 114, VIII, da Constituição Federal. A competência da Justiça do Trabalho prevista no art. 114, VIII, da Constituição Federal alcança apenas a execução das contribuições previdenciárias relativas ao objeto da condenação constante das sentenças que proferir. (RE 569.056, Rel. Min. Menezes Direito, julgamento em 11-9-08, DJE de 12-12-08) Ocorre que em se tratando de sentenças condenatórias, segundo a moderna 7 doutrina , viabiliza-se o reconhecimento da prescrição, o que pode causar sérios prejuízos para o trabalhador no que toca aos aspectos relativos à questão Previdenciária, ainda mais estando vinculados os benefícios previdenciários ao tempo de contribuição. Vemos como alternativa para o trabalhador fazer valer o seu tempo de serviço ( tempo de contribuição) a regra do §1◦ do art. 11 da Consolidação das Leis do Trabalho-CLT, que exclui da prescrição trabalhista as ações que tenham por objeto anotações para fins de prova junto à Previdência Social. Com isso, a prescrição só atingiria as verbas trabalhistas, não se referindo às contribuições previdenciárias, pelo menos esta é a tese que defendemos a partir de uma interpretação extensiva. A rigor, tais ações teriam caráter declaratório, não incidindo a prescrição, observando-se que no Direito do Trabalho vigora o Princípio da Primazia da 7 AMORIM FILHO, Agnelo . Critério Científico para Distinguir a Prescrição da Decadência e para Identificar as Ações Imprescritíveis. Revista dos Tribunais v. 300, out. 1960, p. 7 – reproduzido na RT, v. 711, out. 1997, p.725-6. Realidade, configurando-se a relação de emprego uma vez preenchidos os requisitos dos arts. 2º e 3º da CLT, destacando-se que o art. 442 da CLT estabelece que o contrato individual de trabalho é o acordo tácito ou expresso, correspondente à relação de emprego e os arts. 9º e 444 da CLT vedam artifícios tendentes a fraudar a relação de emprego. Como vimos, a sentença declaratória pode ter força executiva, se dela se possa extrair o conteúdo obrigacional, porém, uma vez mantido o entendimento de que somente as sentenças condenatórias poderiam viabilizar a execução das contribuições previdenciárias, poder-se-ia concluir que, em face do disposto no § 1º do art. 11 da CLT, estaríamos diante de uma situação excepcional de uma ação condenatória em que não se possibilita o reconhecimento da prescrição (da exigência de recolhimento das Contribuições Previdenciárias), considerando que a prova do recolhimento da contribuição previdenciária é necessária para o reconhecimento do tempo de contribuição. O fato é que, em nome da efetividade e da concretização da noção de Justiça, não se admitindo as situações anteriormente apresentadas, ter-se-ia que admitir a construção de que, em último caso, estar-se-ia reconhecendo uma obrigação de emitir declaração de vontade, que, nos termos do art.466 A do CPC, uma vez transitada em julgado, produzirá todos os efeitos da declaração não emitida ( regramento este que poderia ser aplicado subsidiariamente à CLT nos termos do art. 769 deste diploma legal, sendo adequado aos fins sociais da consolidação). Excluídas do prazo prescricional, as contribuições poderiam ser cobradas, considerando inclusive as regras de sucessão de empresa, a desconsideração da personalidade jurídica ( art.50 do CC) e a sucessão causa mortis. Não se aplicando o prazo da prescrição quinquenal fixado pelo STF para cobrança das contribuições sociais (permitindo-se, assim, a prova perante a Previdência Social do recolhimento das contribuições previdenciárias, para contagem do tempo de contribuição). A determinação judicial para que a secretaria da vara do trabalho efetuasse as anotações na CTPS, nos termos do § 1◦ e 2◦do art. 39 da CLT , seria medida meramente formal. Podendo a sentença servir como início de prova material na Justiça Federal, devendo-se, no entanto, comprovar o efetivo recolhimento das contribuições sociais, destacando-se o caráter contributivo da Previdência Social. Entendemos que a Administração Previdenciária deve rever seu posicionamento, considerando, inclusive, o entendimento já consolidado junto ao Superior Tribunal de Justiça e da Câmara Nacional de Revisão dos Juizados Especiais Federais de que a sentença trabalhista pode ser considerada como início de prova material. O que necessita ocorrer é que a Administração Previdenciária aprecie o conteúdo das sentenças trabalhistas e, havendo elementos que possam embasar o posicionamento de que a reclamação trabalhista foi utilizada para acobertar uma fraude ( o que dependerá de uma apuração de caráter fático) - especialmente com relação ao requisito de carência dos benefícios previdenciários ( requisito este que deveria ser fiscalizado pelo próprio Juiz do Trabalho) –, indeferir, em sendo o caso, o reconhecimento do tempo de contribuição de forma fundamentada, comunicando à Procuradoria Federal (Advocacia Geral da União) ou ao Ministério Público do Trabalho a respeito do apurado para que se possa propor ação rescisória do julgado. Atuaria a Procuradoria Federal em nome do INSS, na qualidade este de terceiro interessado, fluindo o prazo decadencial para propositura da ação rescisória a partir da ciência da Administração Previdenciária do teor da sentença e o Ministério Público do Trabalho no combate à fraude ou colusão teria como início do prazo decadencial o da ciência da decisão judicial a ser impugnada pelo parquet. O que não pode é a Administração Previdenciária tentar impor que a Procuradoria Federal exerça o trabalho de apuração da irregularidade ( que, destaque-se, tem caráter fático), fazendo às vezes dos órgãos administrativos competentes, uma vez que tal exigência extrapola o papel constitucional da Advocacia Pública. Observe-se que tanto o requerimento administrativo de reconhecimento do tempo de contribuição como a ação judicial proposta em face do não reconhecimento de tempo de contribuição dependeria de prova do recolhimento da contribuição previdenciária, o que poderia ser facilitado a partir da inclusão dos dados constantes da guia de recolhimento da Receita Federal do Brasil no Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, aos moldes do que é feito com a Guia de Recolhimento do FGTS e Informações à Previdência Social- GFIP, especificando-se o período de contribuição abrangido pelo montante arrecadado. Destaque-se que não há que se falar em presunção de recolhimento com relação ao empregado, salvo no caso de constar tal informação no CNIS, uma vez que a sistemática de contagem de tempo deixou de ser por tempo de serviço para ser por tempo de contribuição. Deve ser frisado que a cobrança de ofício da Contribuição Previdenciária pela Justiça do Trabalho visa resguardar o interesse do trabalhador e não o de arrecadação da Administração, que, se fosse o caso ( o que, pelo menos diretamente, não é), poder-se-ia valer do Executivo Fiscal, devendo ficar bem claro que o período de contribuição a ser reconhecido é aquele referente às contribuições recolhidas, o que se constata a partir da legislação referente à cobrança da contribuição, anteriormente referida ( realçando o caráter contributivo da Previdência Social). Por fim, observemos o teor do atual entendimento da Administração Previdenciária previsto na IN INSS/ PRES Nº 20, de 11/10/2007, em seu art. 112, § 3º: Art. 112: [...] § 3º Na concessão ou revisão de aposentadoria por tempo de contribuição ou qualquer outro benefício do RGPS, sempre que for utilizado tempo de serviço/contribuição decorrente de ação trabalhista transitada em julgado, o processo deverá ser encaminhado para análise da Chefia de Benefícios da APS, devendo ser observado: I – a contagem de tempo de serviço/contribuição dependerá da existência de início de prova material, isto é, de documentos contemporâneos que possibilitem a comprovação dos fatos alegados, juntados ao processo judicial ou ao requerimento administrativo do benefício; II - o cômputo de salário-de-contribuição considerará os valores constantes da ação trabalhista transitada em julgado, ainda que não tenha havido o recolhimento das contribuições devidas à Previdência Social, mas desde que o início de prova material referido no inciso I contemple os valores referidos, observando o limite máximo e mínimo de contribuição; Alterado pela INSTRUÇÃO NORMATIVA INSS/PRES Nº 27, DE 30 DE ABRIL DE 2008 - DOU DE 02/05/2008) Tal entendimento é duplamente prejudicial: para o trabalhador e para Previdência Social. Para o trabalhador, pois ignora a realidade de grande parte das relações de emprego, que são firmadas sem qualquer base documental. Destaque-se que a própria CLT estabelece que o contrato de trabalho é o ajuste expresso ( escrito ou verbal) ou tácito, isso sem falar dos chamados “pagamentos por fora” ( que devem, em sendo o caso, ser especifica e efetivamente provados pelo trabalhador, não se cabendo falar em meros indícios ou presunções, pois, sem a rigorosa apuração judicial e administrativa, poderão dar margem a situações fraudulentas). Para a Previdência Social, pois poder-se-ia estar diante de Contribuições Sociais prescritas, considerando o prazo quinquenal reconhecido pela orientação do Supremo Tribunal Federal, premiando-se assim o mau empregador. 4 DA CONCLUSÃO A Ciência do Direito veio e vem passando por profundas modificações. Em seus primórdios houve uma enorme preocupação conceptualista em busca de 8 segurança, formando-se a chamada Jurisprudência dos Conceitos . Posteriormente em busca de maiores resultados práticos, de efetividade, veio a chamada Jurisprudência dos Interesses. Até que mais recentemente procurando-se em dar maior objetividade às concepções de Justiça surgiu a chamada Jurisprudência dos Valores. A rigor, todas essas propostas metodológicas não são independentes. Sem conceitos claros não há segurança e muito menos ciência. Sem preocupação com os interesses em jogo não há, no Direito, resultados práticos, não há efetividade. E sem valores não há como concretizar a noção de Justiça. É a partir de uma abordagem dialética do Direito relativa a suas dimensões normativas e factuais, integrando conceitos, interesses e valores, que se pode buscar as interpretações e argumentos para resolver o problema. Com a ampliação da Competência da Justiça do Trabalho , maiores razões surgiram para que ela se tornasse uma Justiça também previdenciária, o que no nosso ver dependeria de simples mudança legislativa. Trata-se, portanto, de questão afeta à política legislativa, que não pode ser imposta à Previdência Social, na atual configuração do ordenamento jurídico. Mas se deve ponderar se a Justiça do Trabalho está preparada para aplicar outros institutos que não os trabalhistas ( é o que se vai ver com a nova competência). A par de terem um entroncamento comum na questão social, o fato é que o Direito Previdenciário tem princípios próprios com relação ao Direito do Trabalho que precisam ser respeitados, como o equilíbrio atuarial. Eis uma questão que importa reflexão. O que não pode, pelo princípio da dignidade da pessoa humana, é o trabalhador virar o marisco da estória. Nem a Previdência transformar-se em Assistência Social, destacando-se o caráter contributivo da primeira, que a diferencia desta última ( que também está sujeita à ponderação com vistas à máxima efetividade do direito fundamental, confrontandose o mínimo existencial e a reserva do possível). Deve-se, certamente, assegurar-se o respeito aos direitos da pessoa humana do trabalhador, o que não se pode é – citando mais uma vez um ditado popular - “ fazer caridade com o chapéu alheio”... 8 Jurisprudência como sinônimo de ciência do Direito. 5 REFERÊNCIAS AMORIM FILHO, Agnelo. Critério Científico para Distinguir a Prescrição da Decadência e para Identificar as Ações Imprescritíveis. Revista dos Tribunais, v. 300, out. 1960, p. 7 – reproduzido na Revista dos Tribunais, v. 711, out. 1997. IBRAHIM, Fábio Zambitte. Curso de Direito Previdenciário. 7. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2006. ______. Resumo de direito previdenciário. 8. ed. Rio de Janeiro: Impetus,2007. LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de direito processual do trabalho. 5. ed. São Paulo: LTr 2007. THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil – Processo de Execução e Cumprimento de sentença, Processo Cautelar e Tutela de urgência. Rio de Janeiro: Forense, 2007. SÜSSEKIND, Arnaldo. Curso de Direito do Trabalho. Rio de Janeiro: Renovar, 2002.