Estado do Amazonas MINISTÉRIO PÚBLICO DE CONTAS PARECER N.º : 10987 / 2014 : PRESTAÇ ÃO DE CONTAS ANUAIS : CÂM ARA MUNICIPAL DE APUÍ : VAGNER DA SILVA LUIZ D A SILVA 792 / 2015 - MP- RMAM EMENTA DIREITO CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. FINANCEIRO. GESTÃO. GRAVES IRREGULARIDADES. DANO AO ERÁRIO, OCORRÊNCIA. CONTAS, REJEIÇÃO, MULTAS, IMPUTAÇÃO DE DÉBITO, CABIMENTO. Verificados episódios de grave violação à ordem jurídica e de dano ao erário, as contas de gestão devem ser rejeitadas com a aplicação das penalidades do artigo 54, II e III, da Lei Orgânica do TCE/AM, e imputação de débito equivalente ao dano ao erário apurado. RELATÓRIO Sob controle, as contas de 2013, da Câmara de Apuí, sob a responsabilidade do Senhor Vagner da Silva Luiz da Silva, referentes ao exercício de 2013. Reaberta a instrução, por meio do Despacho exarado às fls. 842 e 843, diante do pedido formulado por este órgão ministerial, o gestor foi regularmente notificado e apresentou defesa às fls. 852 a 1365. Por meio da Informação n. 267/2015-DICAMI, a Comissão de Inspeção propõe o julgamento no sentido da regularidade com ressalvas. FUNDAMENTAÇÃO Observa-se a subsistência de graves achados de má gestão, de grave ofensa à ordem jurídica, que devem comprometer as contas sob exame, no sentido da reprovação com definição de responsabilidade subjetiva do agente público. Com efeito, são os seguintes os motivos de aplicação de multas, nos termos do artigo 54, II e III, da Lei Orgânica, e de imputação de débito, a saber: a um, concessão de diárias sem demonstração de finalidade pública na realização do 1 Este documento foi assinado digitalmente por RUY MARCELO ALENCAR DE MENDONÇA. Para conferência acesse o site http://consulta.tce.am.gov.br/spede e informe o código: F2F7397F-43819F87-90E442C9-3B02E460 PROCESSO Nº ASSUNTO ORGÃO RESPONSÁVEL Estado do Amazonas MINISTÉRIO PÚBLICO DE CONTAS : 10987 / 2014 : PRESTAÇ ÃO DE CONTAS ANUAIS : CÂM ARA MUNICIPAL DE APUÍ : VAGNER DA SILVA LUIZ D A SILVA deslocamento, o que poderia caracterizar ato ilegítimo e antieconômico; a dois, carona não motivada à ata de registro de preços de outro Município, com violação aos princípios da impessoalidade e licitatório. No tocante à primeira irregularidade, o defendente limitou-se a alegar que o processo de concessão das diárias obedeceu a todas as regras previstas na Lei Orgânica e Regimento Interno da Câmara Municipal de Apuí. Além disso, aduziu que ficou evidenciada a finalidade pública em todos os processos referentes à concessão das indenizações. Ocorre que tais alegações, desacompanhadas de qualquer lastro probatório, representam a própria confissão da irregularidade em comento, denotando ausência de mínima conduta diligente no trato da coisa pública. Não há, portanto, como eximir de responsabilidade o gestor, pois deveria ter se certificado, em processo formal, quanto à compatibilidade das diárias concedidas com os termos das normas autorizadoras e com o interesse público. Deveria assim comprovar a existência de justo motivo para o deslocamento. Como é cediço, o ônus da prova da idoneidade do emprego dos recursos públicos, no âmbito do processo de controle externo, recai sobre o gestor, devendo o mesmo demonstrar que os recursos foram regularmente aplicados quando da realização do interesse público. Nessa trilha, vale trasladar as lúcidas considerações expendidas no voto condutor da Decisão 225/2000 - TCU- 2.ª Câmara, da lavra do eminente Ministro Adylson Motta, proferido nos autos do TC-929.531/19981: A não-comprovação da lisura no trato de recursos públicos recebidos autoriza, a meu ver, a presunção de irregularidade na sua aplicação. Ressalto que o ônus da prova da idoneidade no emprego dos recursos, no âmbito administrativo, recai sobre o gestor, obrigando-se este a comprovar que os mesmos foram regularmente aplicados quando da realização do interesse público. Aliás, a jurisprudência deste Tribunal consolidou tal entendimento no Enunciado de Decisão 176, verbis: "Compete 2 Este documento foi assinado digitalmente por RUY MARCELO ALENCAR DE MENDONÇA. Para conferência acesse o site http://consulta.tce.am.gov.br/spede e informe o código: F2F7397F-43819F87-90E442C9-3B02E460 PROCESSO Nº ASSUNTO ORGÃO RESPONSÁVEL Estado do Amazonas MINISTÉRIO PÚBLICO DE CONTAS : 10987 / 2014 : PRESTAÇ ÃO DE CONTAS ANUAIS : CÂM ARA MUNICIPAL DE APUÍ : VAGNER DA SILVA LUIZ D A SILVA ao gestor comprovar a boa e regular aplicação dos recursos públicos, cabendo-lhe o ônus da prova". Imperioso observar ainda o seguinte julgado: Recurso de reconsideração. Responsabilidade. Meras alegações, desacompanhadas do necessário suporte documental. O ônus da comprovação da regular aplicação dos recursos é do gestor. Negativa de provimento. (Acórdão 6636/2009 - Primeira Câmara – TCU - Relator: Ministro JOSÉ MÚCIO MONTEIRO) A necessidade de o recorrente comprovar adequadamente o destino dado aos recursos públicos sob sua responsabilidade decorre de expresso mandamento constitucional presente no artigo 70, parágrafo único, da Constituição. Em vista disso, também resta pacificado na jurisprudência do Tribunal de Contas da União 1 que a não-comprovação da lisura no trato de recursos públicos recebidos autoriza a presunção de irregularidade na sua aplicação. É, também, nesse sentido, a orientação do Supremo Tribunal Federal, conforme se depreende da ementa do Acórdão do MS 20.335/DF, da lavra do Ministro Moreira Alves: Mandado de Segurança contra o Tribunal de Contas da União. Contas julgadas irregulares. Aplicação da multa prevista no art. 53 do Decreto-lei 199/1967. A multa prevista no art. 53 do Decreto-lei 199/1967 não tem natureza de sanção disciplinar. Improcedência das alegações relativas a cerceamento de defesa. Em Direito Financeiro, cabe ao ordenador de despesas provar que não é responsável pelas infrações que lhe são imputadas, das leis e regulamentos na aplicação do dinheiro público. Coincidência, ao contrário do que lhe foi alegado, entre a acusação e a condenação, no tocante a irregularidade da licitação. Mandado de Segurança indeferido" (grifos acrescidos). 1 Julgados do TCU: Acórdão 11/1997-Plenário; Acórdão 87/1997-2ª Câmara; Acórdão 234/1995-2ª Câmara; Acórdão 291/1996-2ª Câmara; e Acórdão 380/1995 - 2ª Câmara. 3 Este documento foi assinado digitalmente por RUY MARCELO ALENCAR DE MENDONÇA. Para conferência acesse o site http://consulta.tce.am.gov.br/spede e informe o código: F2F7397F-43819F87-90E442C9-3B02E460 PROCESSO Nº ASSUNTO ORGÃO RESPONSÁVEL Estado do Amazonas MINISTÉRIO PÚBLICO DE CONTAS : 10987 / 2014 : PRESTAÇ ÃO DE CONTAS ANUAIS : CÂM ARA MUNICIPAL DE APUÍ : VAGNER DA SILVA LUIZ D A SILVA Nesse passo, meras declarações desacompanhadas de documentação consistente, como fez o notificado, não servem de supedâneo probatório para afastar o achado, consoante a jurisprudência do TCU. Veja-se o seguinte voto do Ministro Valmir Campelo, Relator do Acórdão 1001/2011 – Plenário TCU: 5. Entendo que o Tribunal não pode formar convicção acerca de gestão de recursos públicos, a fim de atribuir-lhe regularidade, calcado tão somente nas declarações dos responsáveis. Se dessa forma procedesse, se aceitariam quaisquer justificativas, independentemente do que se desejasse tornar patente, visto que não haveria necessidade de demonstração de conteúdo, resultado, ou provas. 6. Em outras palavras, os recorrentes não juntaram ao presente processo as provas necessárias à desconstituição das evidências contra eles levantadas, não conseguindo, destarte, sustentar que os recursos tiveram sua destinação comprovada. Resta caracterizado o dano ao Erário, e permanece, assim, a obrigação de ressarcimento por parte dos responsáveis. Também resta patente que os fatores que embasaram o julgamento pela irregularidade de suas contas permanecem inalterados, impedindo, destarte, a reforma da deliberação recorrida. À falta dessa comprovação de interesse público especial justificador das despesas correlatas, presumem-se irregulares as despesas, a teor do disposto no artigo 304, I, da Resolução n. 04/2002, e, em virtude disso, exsurge para o mesmo o dever de ressarcir o erário municipal no valor correspondente, R$ 120.180,00 (fls. 275 e 276), e a incursão na multa do artigo 54, III, da Lei n. 2.423/1996. Lado outro, verificou-se a utilização não motivada do carona à ata de registro de preços de outro Município. Nesses termos, abstraindo-se a questão da falta de previsão legal, já debatida anteriormente no bojo do parecer ministerial n. 2455/2014-MP-RMAM, deve-se registrar que o gestor em momento algum discorreu ou juntou documentação que evidenciasse o cumprimento dos requisitos pertinentes à 4 Este documento foi assinado digitalmente por RUY MARCELO ALENCAR DE MENDONÇA. Para conferência acesse o site http://consulta.tce.am.gov.br/spede e informe o código: F2F7397F-43819F87-90E442C9-3B02E460 PROCESSO Nº ASSUNTO ORGÃO RESPONSÁVEL Estado do Amazonas MINISTÉRIO PÚBLICO DE CONTAS : 10987 / 2014 : PRESTAÇ ÃO DE CONTAS ANUAIS : CÂM ARA MUNICIPAL DE APUÍ : VAGNER DA SILVA LUIZ D A SILVA escolha da ata, tal como lhe caberia. Limitou-se apenas a defender a constitucionalidade do indigitado modelo. Ainda que fosse válida a utilização da figura do carona, deveria o gestor demonstrar a obtenção de vantagem para a Administração na sua utilização concreta dessa figura em detrimento da aplicação do sistema convencional, isto é, que do emprego do carona teria importado vantagem superior a um novo processo licitatório, bem como deveria comprovar a aplicação de critério impessoal e objetivo de escolha da ata (do município vizinho em vez de ata federal/estadual), em consonância com o estabelecido no Decreto Federal n. 7.892/13 e no Decreto Estadual n. 24.052/05 e nos princípios constitucionais de Administração Pública. A não comprovação do atendimento dos requisitos acima expostos faz nascer, como explicado alhures, a presunção de irregularidade no trato dos recursos públicos 2. Diante desse contexto, a desconformidade legal em comento merece reprovação, na forma de multa ao responsável, com fulcro no artigo 54, II, da Lei Orgânica, pois representam descaso para com formalidades essenciais à segurança jurídica, probidade, eficiência, transparência, impessoalidade e moralidade administrativas na gestão de licitações e contratos, geradoras de risco de dano ao erário. Por fim, repisam-se os demais termos do Parecer n. 2455/2014-MPRMAM, tendo em vista a permanência das irregularidades e achados de má-gestão e de grave ofensa à ordem jurídica, ensejadores de multa do artigo 54, II, da Lei Orgânica, a saber: - violação ao disposto nos artigos 48 e 55, §2º, da LRF, considerando o atraso e publicação do Relatório de Gestão Fiscal fora dos prazos legais. 2 Acórdão 264/2007 - Primeira Câmara – TCU 5 Este documento foi assinado digitalmente por RUY MARCELO ALENCAR DE MENDONÇA. Para conferência acesse o site http://consulta.tce.am.gov.br/spede e informe o código: F2F7397F-43819F87-90E442C9-3B02E460 PROCESSO Nº ASSUNTO ORGÃO RESPONSÁVEL Estado do Amazonas MINISTÉRIO PÚBLICO DE CONTAS : 10987 / 2014 : PRESTAÇ ÃO DE CONTAS ANUAIS : CÂM ARA MUNICIPAL DE APUÍ : VAGNER DA SILVA LUIZ D A SILVA - ausência de controle específico de almoxarifado, com registro contínuo e permanente de controle de entrada e saída dos objetos, em descompasso com a regra do artigo 94 da Lei n. 4320/64; - descumprimento dos artigos 95 e 96 da Lei n. 4320/64, diante da realização tardia do inventário, assim como da apuração de divergência entre os valores nele encontrados e os valores contábeis dos Bens Móveis e Imóveis constantes do Balancete Contábil de Dezembro de 2013, evidenciando a desatualização dos mesmos; - ausência de Balanço Patrimonial e Demonstração das Variações Patrimoniais impossibilitando a identificação do resultado patrimonial do exercício, em descumprimento aos artigos 101 c/c 104 e 105 da Lei Federal nº 4.320/64; - violação ao disposto no inciso II do artigo 57 da Lei n. 8666/93, tendo em vista o aditamento do contrato de prestação de serviços de assessoria contábil, que não se enquadram na categoria de serviços de prestação continuada previstos naquele dispositivo; - descumprimento dos artigo 165 da Constituição Federal e do artigo 5.º da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar nº 101/2000), considerando a ausência de balancete mensal que retrate o previsto na Lei Orçamentária Anual e permita identificar o resultado das despesas conforme as metas estabelecidas na Lei de Diretrizes Orçamentárias; ausência de planejamento financeiro mensal, nos termos dos artigos 28 e 29, ou trimestral, como estabelece o art. 47 todos da Lei nº 4.320/64, para fins de verificação da necessidade de cumprimento ao disposto nos arts. 9.º e 12 da Lei de Responsabilidade Fiscal CONCLUSÃO Ante o exposto, este Parquet propõe ao Egrégio Tribunal Pleno que julgue IRREGULARES as contas da Câmara Municipal de Apuí, exercício de 2013, nos termos dos artigos 1º, II, 22, III, alíneas “b” e parágrafo único do artigo 25, todos 6 Este documento foi assinado digitalmente por RUY MARCELO ALENCAR DE MENDONÇA. 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Para conferência acesse o site http://consulta.tce.am.gov.br/spede e informe o código: F2F7397F-43819F87-90E442C9-3B02E460 PROCESSO Nº ASSUNTO ORGÃO RESPONSÁVEL