XXVII Congresso Interamericano de Engenharia Sanitária e Ambiental
I-093 - CARACTERIZAÇÃO DA BIOTA DE UMA ESTAÇÃO EXPERIMENTAL
DE TRATAMENTO DE ESGOTOS EM DIFERENTES IDADES DE LODO
Tereza Cristina Reis da Silva(1)
Bióloga. Bacharel em Ecologia. Mestranda da Escola de Química da Universidade Federal
do Rio de Janeiro. Chefe do Serviço de Laboratório e Controle do Corpo Receptor da
Companhia Estadual de Águas e Esgotos - CEDAE-RJ.
Benito Piropo Da-Rin
Engenheiro Civil pela Escola Nacional de Engenharia. Professor da Disciplina Tratamento
de Esgotos do Curso de Engenharia Civil com ênfase para Meio Ambiente da PUC-RJ.
Engenheiro da CEDAE.
Endereço(1): Ladeira do Meireles, 47 - apto 102 - S. Teresa - Rio de Janeiro - RJ - CEP: 20241-340 - Brasil Tel: 55 (21) 508-7831 - e-mail: [email protected]
RESUMO
Em um reator de bancada para tratamento de esgotos pelo processo de lodos ativados foram realizadas
experiências visando estabelecer correlações entre as condições microbiológicas do sistema e seus
parâmetros físico-químicos e operacionais.
O reator, em acrílico transparente, foi alimentado com esgoto sanitário decantado ao qual se adicionou
solução de carboidratos durante parte do experimento. O reator, dividido em duas câmaras separadas por uma
chicana ajustável, foi operado pelo processo de lodos ativados, variante mistura completa com fluxo contínuo,
com a câmara de montante simulando o tanque de aeração e a de jusante o decantador secundário.
O experimento foi levado a cabo em duas fases sucessivas.
Durante a primeira fase, o volume útil (de líquido) do reator foi de 7.150 ml e a idade do lodo foi mantida em
20 dias através da remoção diária de 358 ml do líquido do interior do tanque de aeração.
Durante a segunda fase, o volume útil (de líquido) do reator foi reduzido para 5.000 ml e a idade do lodo foi
mantida em 5 dias através da remoção diária de 1.000 ml do líquido do interior do tanque de aeração.
Durante ambas as fases foram feitas análises microbiológicas quantitativas empregando a técnica descrita por
Madoni (1984) para estimativa de populações de ciliados através de técnicas de subamostragem. A técnica foi
adaptada para contagem de protozoários não ciliados (gimnamebas e tecamebas) e micrometazoários.
O objetivo do experimento foi caracterizar a idade do lodo através do predomínio de grupos de protozoários e
micrometazoários na biota, buscando correlações entre a densidade relativa destes grupos de organismos e a
idade do lodo.
São apresentados gráficos e tabelas correlacionando os principais parâmetros físico-químicos e operacionais
das diferentes etapas de operação e a biota do reator.
Os resultados obtidos mostram que as análises microbiológicas são uma importante ferramenta para
avaliação das condições operacionais de uma estação de tratamento de esgotos pelo processo de lodos
ativados. O grupo que apresentou melhor correlação foi o das tecamebas, cuja densidade relativa
correlacionou-se diretamente com a idade do lodo.
PALAVRAS-CHAVE: Tecamebas, Lodos Ativados, Protozoários, Idade do Lodo, Controle Microbiológico.
INTRODUÇÃO
Desde a partida da primeira estação de tratamento de esgotos (ETE) pelo processo de lodos ativados em 1922,
diversos pesquisadores têm utilizado a caracterização da microbiota do tanque de aeração como indicadora
das condições operacionais e eficiência do sistema.
Não obstante, a análise microscópica do lodo não integra o programa padrão de análises em estações de
tratamento que, em geral, só realizam análises físico-químicas para o controle do processo. No entanto,
várias pesquisas têm sido desenvolvidas com o objetivo de estabelecer relações entre os parâmetros físicoquímicos operacionais de ETEs e a estrutura das comunidades de microrganismos presentes no lodo. A
maioria delas investiga os microrganismos como possíveis indicadores da eficiência das ETEs. No entanto
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poucos são os estudos sobre a sucessão de espécies - principalmente de protozoários - em função das
variações da idade do lodo, uma das principais ferramentas de controle do processo de lodos ativados.
Em muitas ETEs a idade do lodo é controlada pela quantidade de lodo descartada periodicamente. No
entanto, torna-se difícil calcular com precisão o volume a ser descartado devido às flutuações diurnas nas
concentrações de sólidos no lodo (MARAIS e EKAMA, 1976) e à imprecisão dos dispositivos de medição de
vazão usados para este fim. Em virtude disso, freqüentemente a idade do lodo real é muito diferente daquela
presumida pela operação. Por outro lado, análises microscópicas são capazes de fornecer indicação rápida do
real regime de operação da ETE.
O presente estudo tem como objetivo caracterizar a biota do lodo ativado através da identificação e
quantificação de protozoários e micrometazoários presentes, buscando correlacioná-los com os resultados das
análises físico-químicas e parâmetros operacionais de uma estação de tratamento de esgotos experimental.
Um enfoque especial foi dado à diferenciação da idade do lodo através do predomínio na biota de
determinados protozoários.
MATERIAIS E MÉTODOS
Descrição do Reator Experimental
A instalação experimental utilizada na pesquisa foi montada no Laboratório da ETE Penha, da Companhia
Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro (CEDAE/RJ) e foi alimentada com o efluente primário da
própria ETE, que recebe esgotos tipicamente domésticos com alguma contribuição de efluentes industriais
despejados diretamente na entrada da ETE por caminhões tanque.
Empregou-se um reator de bancada de acrílico transparente dividido em duas câmaras separadas por uma
chicana ajustável. A câmara de montante do reator simula o tanque de aeração e a de jusante o decantador
secundário. A parede frontal externa da câmara de jusante é inclinada visando facilitar o retorno do lodo
sedimentado à câmara de montante. A saída do efluente é feita através de registro de 6,5 mm situado no alto
desta parede. A coleta de amostras de lodo é feita através de um registro idêntico situado próximo ao fundo
da câmara de montante. A Figura 1 mostra uma representação esquemática do reator. Na primeira fase da
pesquisa (idade do lodo de 20 dias), o volume útil (de líquido) do reator foi de 7.150 ml. Durante a segunda
fase, com idade de lodo fixada em 5 dias, esse volume foi diminuído para 5.000 ml visando reduzir o volume
de esgoto afluente requerido. Nesta fase, a dimensão de 15cm indicada no esquema foi reduzida para 10 cm.
Figura 1 - Representação esquemática do reator.
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A câmara de montante foi aerada mediante a utilização de difusor tipo pedra porosa adaptado à extremidade
de uma mangueira alimentada por compressor de ar tipo bomba de aquário. A homogeneização foi efetuada
por agitador mecânico, com hélice de aço inoxidável de 5,5 cm de diâmetro.
O reator foi alimentado por bomba peristáltica, cujas mangueiras de silicone de pequeno diâmetro foram
introduzidas em orifícios situados na parte superior da parede frontal da câmara de aeração. Tanto o esgoto
afluente quanto o efluente foram armazenados em garrafões de vidro.
Operação do Reator Experimental
O desenvolvimento da pesquisa dividiu-se em duas fases, descritas a seguir.
1. Operação em regime contínuo, idade do lodo de 20 dias
Durante essa fase o sistema recebeu uma vazão média de 8.9 l/d. Com o objetivo de controlar o processo, a
idade do lodo foi mantida em 20 dias através da remoção diária de 358 ml de líquido do interior do reator de
7.150 ml.
No início desta fase a ETE experimental foi alimentada com o esgoto sanitário da ETE Penha após sofrer
tratamento preliminar (gradeamento e desarenação) e primário (decantação primária). A carga orgânica
desse esgoto, no entanto, mostrou-se demasiadamente baixa para promover o crescimento da biomassa no
interior do reator até a concentração desejada (ver resultados de análises de SSV no reator, Tabela 2). Para
elevar o conteúdo de matéria orgânica no afluente, decidiu-se adicionar sacarose em solução com
concentração de 10 g/l. A proporção empregada foi de 2.1 % de solução de sacarose e 97.9 % de esgoto
decantado e a adição foi iniciada em 26/04/99.
Após a adição de sacarose, estabeleceram-se rapidamente condições de intumescimento do lodo no reator.
Visando controlá-las, a solução de sacarose foi substituída por solução de glicose, mas o intumescimento do
lodo persistiu, obrigando a voltar a alimentar o sistema apenas com esgoto sanitário decantado da ETE
Penha. Os resultados de análises quantitativas da bactéria filamentosa causadora do intumescimento do lodo
(Sphaerotilus natans) e as correlações com os parâmetros físico-químicos e operacionais deste período
experimental foram apresentados no IX Simpósio Luso-brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental
(SILVA et al, 2000).
Durante esta fase ocorreram situações em que o pH do líquido sob aeração caiu até valores muito baixos.
Nestas ocasiões promoveu-se sua alcalinização através da adição de solução 2M de hidróxido de cálcio
[Ca(OH)2] em volume suficiente para manter o pH em torno de 7.
2. Operação em regime contínuo, idade do lodo de 5 dias
Na fase de operação em regime contínuo com idade do lodo de 5 dias o sistema recebeu uma vazão média de
14,3 l/d. Com o objetivo de controlar o processo, a idade do lodo foi mantida em 5 dias através da remoção
diária de 1.000 ml de líquido do interior do reator (cujo volume foi reduzido para 5.000 ml).
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MONITORAMENTO
1. Análises microbiológicas
A identificação dos protozoários e micrometazoários foi feita de acordo com Foissner (1996) e Patterson
(1992). As análises microbiológicas quantitativas seguiram a técnica descrita por Madoni (1984). Serão
apresentados apenas os resultados das contagens dos protozoários e micrometazoários que alcançaram
densidade relativa mínima de 20% pelo menos uma vez durante o experimento.
2. Análises físico-químicas
A tabela 1 apresenta as análises físico-químicas realizadas, a localização dos pontos de amostragem e o
método de análise ou instrumento utilizado.
As determinações das concentrações de nitrato dissolvido foram realizadas no sobrenadante de amostras do
líquido sob aeração decantadas em proveta. Estas análises tiveram o objetivo de investigar a ocorrência dos
fenômenos de nitrificação e posterior desnitrificação no reator, já que durante a fase de operação com idade
de lodo de 20 dias verificou-se a flotação de lodo e o desprendimento de bolhas de gás na superfície do
decantador secundário. As análises foram realizadas nos dias 24/2, 7/4 e 26/5/1999, todos na primeira fase
do experimento.
Todas as análises dos parâmetros constantes da tabela 1 foram realizadas de acordo com o “Standard
Methods for the Examination of Water and Wastewater”, 18ª edição.
PARÂMETRO
PONTO DE COLETA
MÉTODO ANALÍTICO
DQO total
Afluente
Método de refluxo aberto
pH
Líquido sob aeração
pHâmetro Quimis Q 400A
Nitrato
Afluente, Efluente, líquido sob aeração
Espectrofotômetro Hach DR 4000U
OD
Líquido sob aeração
Oxímetro Digimed DM 4
Temperatura
Líquido sob aeração
Termômetro (coluna de mercúrio)
SST
Líquido sob aeração
Método gravimétrico
SSV
Líquido sob aeração
Método gravimétrico
Tabela 1: Parâmetros, pontos de coleta, métodos analíticos e equipamentos utilizados.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Resultados das análises físico-químicas e parâmetros operacionais
1. Fase de operação com idade de lodo de 20 dias
As tabelas 2, 3 e 4 exibem valores médios, mínimos e máximos de alguns dos parâmetros característicos do
afluente e do líquido sob aeração durante a fase operação com idade de lodo de 20 dias, bem como os valores
médios de fator de carga, obtidos em amostras analisadas em três etapas sucessivas: antes da adição de
carboidratos ao afluente, durante o período em que se adicionou carboidratos e após a interrupção desta
adição.
Parâmetro
Médio
Máximo
Mínimo
Afluente
DQO (mg/l)
219
564
77
Líquido sob aeração
SST (mg/l)
566
728
252
SSV (mg/l)
452
584
212
0,49
Fator de Carga (kg DQO/kg SSTA.d)
Tabela 2: Parâmetros característicos antes da adição de carboidratos (θ
θc: 20 dias).
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Parâmetro
Médio
Máximo
Mínimo
Afluente
DQO (mg/l)
500
670
415
Líquido sob aeração
SST (mg/l)
764
1072
472
SSV (mg/l)
626
848
416
1,01
Fator de Carga (kg DQO/kg SSTA.d)
Tabela 3: Parâmetros característicos durante adição de carboidratos (θ
θc: 20 dias).
Parâmetro
Médio
Máximo
Mínimo
Afluente
DQO (mg/l)
227
430
74
Líquido sob aeração
SST (mg/l)
625
730
506
SSV (mg/l)
503
605
390
0,46
Fator de Carga (kg DQO/kg SSTA.d)
Tabela 4: Parâmetros característicos após cessar adição de carboidratos (θ
θc: 20 dias).
11/6
24/5
5/5
28/4
20/4
13/4
6/4
26/3
18/3
11/3
1/3
4/2
650
600
550
500
450
400
350
300
250
200
150
100
50
0
30/1
DQO e DQOs (m g/l
A variação ao longo do experimento dos valores da concentração de DQO no afluente é mostrada na Figura
2, onde se pode notar sua elevação brusca a partir do momento em que se iniciou a adição de carboidratos
simples ao afluente, em 26/04 - o que, por sua vez, provocou o súbito aumento no fator de carga.
data
Figura 2: Variação das Concentrações de DQO afluente (θ
θc: 20 dias).
A observação dos valores da concentração de nitrato no afluente, no sobrenadante do lodo e no efluente,
mostrados na Tabela 5, evidenciam que, nas ocasiões em que as análises foram realizadas (todas durante a
fase do desenvolvimento experimental em que o reator foi operado com idade de lodo de 20 dias), houve forte
nitrificação no interior da câmara de aeração e ligeira desnitrificaçao na câmara de decantação.
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Data
Afluente (mg/l)
Sobrenadante do
lodo (mg/l)
24/02/99
5,0
20,0
07/04/99
6,2
29,2
26/05/99
4,9
16,9
Tabela 5: Resultados das análises de nitrato no afluente,
efluente da ETE Experimental (idade do lodo de 20 dias).
Efluente (mg/l)
14,0
21,1
15,2
sobrenadante do lodo e
Fase de operação com idade de lodo de 5 dias
A tabela 6 exibe valores médios, mínimos e máximos de alguns parâmetros característicos do afluente e do
líquido sob aeração, bem como o valor médio do fator de carga, obtidos em amostras analisadas durante a fase
de operação com idade de lodo em 5 dias.
Parâmetro
Médio
Máximo
Mínimo
Afluente
DQO (mg/l)
242
490
132
Líquido sob aeração
SST (mg/l)
731
1125
550
SSV (mg/l)
632
940
470
1,08
Fator de Carga (kg DQO/kg SSTA.d)
Tabela 6: Parâmetros característicos do afluente e líquido sob aeração (θ
θc:5 dias).
Comparação entre as análises quantitativas de protozoários e micrometazoários e
parâmetros físico-químicos e operacionais nas distintas fases de operação (idade do lodo
de 20 dias e 5 dias)
Os resultados das análises microbiológicas quantitativas de protozoários e micrometazoários são apresentados
através de figuras que correlacionam os parâmetros operacionais de controle do processo de lodos ativados
(fator de carga e idade do lodo) com o número total (indivíduos/ml) e a densidade relativa (%) dos principais
grupos identificados.
A observação da figura 3 evidencia que o número total (ind/ml) de protozoários e micrometazoários
relaciona-se diretamente com o fator de carga e inversamente com a idade do lodo, mostrando claramente que
estes microrganismos foram mais abundantes durante a fase de operação com idade do lodo de 5 dias, com
exceção, justamente, do período em que a adição de carboidratos ao afluente provocou a elevação do valor
médio do fator de carga. Este fato está em conformidade com os resultados obtidos por Al-Shahwani et al
(1991), nos quais o incremento do número total de protozoários no líquido sob aeração foi associado a
elevações nas cargas orgânicas e à baixa idade do lodo, com forte redução do número de protozoários em
idades de lodo maiores que 10 dias.
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Figura 3: Fator de carga e n.º total de protozoários e micrometazoários.
A figura 4 mostra que a densidade relativa de tecamebas atingiu seus valores máximos (superiores a 70%) na
fase de operação com idade do lodo de 20 dias. A contagem incluiu três gêneros de tecamebas: Arcella,
Euglypha e Centropyxis. O gráfico enfatiza os valores da densidade de Euglypha pelo fato de ter sido este
gênero o mais representativo no experimento, alcançando o valor de densidade relativa de 67% em
29/03/1999.
A influência do fator de carga sobre a densidade relativa de tecamebas pode ser observada na mesma figura
4, onde se verifica que as densidades relativas de tecamebas mantiveram-se altas quando os valores do fator
de carga estavam em torno de 0.5 kg DQO/kgSSTA.d, reduzindo-se drasticamente no período em que a
adição de carboidratos ao afluente da ETE experimental fez o fator de carga elevar-se bruscamente até o
valor de 1.01 kg DQO/kg SSTA.d ainda na fase de idade do lodo de 20 dias.
Os resultados encontrados estão de acordo com as informações de que as tecamebas colonizam ETEs com
remoção de nitrogênio e fator de carga baixo (POOLE, 1984). Tecamebas são mais abundantes em lodos
caracterizados por fator de carga baixo e alta concentração de oxigênio dissolvido no tanque de aeração,
que permite a completa nitrificação (DRAKIDES, 1978), e em plantas com idade do lodo alta devido às
baixas taxas de crescimento características destes organismos (MADONI, 1994). De fato, a figura mostra
claramente que as tecamebas foram mais abundantes no experimento com idade do lodo de 20 dias,
diminuindo consideravelmente sua abundância na fase de operação com idade do lodo de 5 dias. De todos
os organismos observados, as tecamebas foram os que exibiram mais forte correlação com os parâmetros
operacionais.
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Figura 4: Fator de carga e densidade relativa de tecamebas.
De acordo com Curds (1992), para que haja nitrificação, deve ser mantida uma concentração mínima de
oxigênio dissolvido de 2,0 mg/l no tanque de aeração. A figura 5 exibe as concentrações de OD no tanque
de aeração na fase de idade de lodo de 20 dias, período em que se verificou a ocorrência da nitrificação,
onde se percebe que, em 90% das análises realizadas, a concentração de OD esteve igual ou acima de 2,0
mg/l . Além deste fator, a taxa de crescimento de microrganismos nitrificantes é significativamente afetada
pela temperatura (observa-se a ocorrência de nitrificação na faixa de 5ºC a 50ºC, porém a faixa ótima situase entre 25ºC e 36ºC). Durante a fase de idade do lodo de 20 dias, a temperatura situou-se sempre na faixa
entre 25ºC e 31ºC. Portanto é fácil concluir que a nitrificação foi favorecida pelas elevadas concentrações
de oxigênio dissolvido associadas às altas temperaturas do líquido sob aeração.
Na fase de operação com idade de lodo de 20 dias verificou-se a acidificação do líquido sob aeração, cujo
pH caiu até níveis muito baixos (figura 6), levando a efetuar correções com solução 2M de hidróxido de
cálcio [Ca(OH)2]. Essa acidificação foi conseqüência da acentuada redução da concentração de amônia no
líquido sob aeração devido a sua conversão em nitrato durante o processo de nitrificação.
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7,5
7
6,5
6
5,5
OD (m g /L )
5
4,5
4
3,5
3
2,5
2
1,5
1
0,5
20/5
10/5
30/4
20/4
10/4
31/3
21/3
11/3
1/3
19/2
9/2
30/1
20/1
0
data
Figura 5: Variação das conc. de OD no líquido sob aeração (θ
θc: 20 dias)
9
8
7
6
5
pH
4
3
2
1
03/05
30/04
29/04
28/04
27/04
26/04
23/04
20/04
19/04
14/04
13/04
09/04
08/04
07/04
06/04
31/03
23/03
0
d a ta
Figura 6: Variação de pH no líquido sob aeração (θ
θc: 20 dias)
O valor máximo da densidade relativa de hipotríquios (24.1%) ocorreu na fase de idade do lodo de 20 dias,
precisamente no dia 28/04/1999, logo após a elevação do fator de carga provocada pela adição de
carboidratos simples ao afluente (ver figura 7). Nesta data, os hipotríquios, juntamente com os peritríquios,
atingiram 98.8% do total de protozoários e micrometazoários da amostra.
Os gêneros mais freqüentes de hipotríquios são Euplotes, Aspidisca, Oxytricha e Stylonychia
(VAZOLLÉR, 1989). O gênero Aspidisca foi o responsável pelo aumento da densidade relativa de
hipotríquios em 28/4/1999 (quando a densidade relativa de Aspidisca atingiu 22.4%). Foram observados
espécimens de outros gêneros, porém em densidades relativas baixas.
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Figura 7: Fator de carga e densidade relativa de hipotríquios.
Segundo Curds & Cockburn (1970b), “a proporção de espécies de ciliados identificados como hipotríquios
diminui com o aumento do fator de carga” Isso não foi constatado no presente experimento onde, pelo
contrário, o valor máximo de densidade relativa de hipotríquios coincidiu com a elevação do fator de carga
provocada pela adição de carboidratos (ver figura 7). É possível que este fenômeno possa ser explicado pelo
fato do aumento de alimento disponível para os microrganismos durante a adição de carboidratos ter
incrementado a proliferação de bactérias no lodo e com isso estimulado o crescimento de hipotríquios,
especialmente os representantes do gênero Aspidisca, que alimentam-se principalmente de bactérias
(FOISSNER,1996).
Os rotíferos estiveram presentes em todo o período experimental (figura 8), mas não foi possível estabelecer
nenhuma correlação entre variações de sua densidade relativa e parâmetros operacionais da ETE.
Figura 8: Fator de carga e densidade relativa de rotíferos.
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Durante a fase de operação com idade do lodo de 20 dias, os pleurostomatídios apareceram em0 apenas 25%
das análises microbiológicas efetuadas, e sempre em densidades relativas menores que 1%. Já durante a fase
de idade do lodo de 5 dias, estes protozoários se fizeram presentes em 100% das amostras analisadas, embora
com densidades relativas baixas. O valor máximo, de 27,1%, ocorreu em 20/07/1999 (figura 9).
Figura 9: Fator de carga e densidade relativa de pleurostomatídios.
Os peritríquios foram dominantes em praticamente todo o período experimental. Conforme pode-se observar na
figura 10, sua densidade relativa independe da idade do lodo. Isto talvez se explique pelo elevado número de
espécies desse grupo (com diferentes nichos ecológicos) e pela maior eficiência de espécies fixas se comparadas às
espécies livres (CURDS, 1982 a). Salvadó (1993) relata a presença constante de espécies de peritríquios em ETEs
de lodos ativados operando com diferentes idades de lodo, com concentrações de Vorticella microstoma
alcançando o máximo entre 2 e 6 dias e de Epistylis plicatilis tendendo a aumentar com a idade do lodo.
Figura 10: Fator de carga e densidade relativa de peritríquios.
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No presente estudo, foram observados os gêneros Epistylis, Vorticella e Charchesium. Como não foram
efetuadas contagens em separado dos diferentes gêneros de peritríquios durante o experimento, não foi
possível correlacioná-los com os parâmetros operacionais da ETE. Portanto, o grupo de peritríquios é de
pouca utilidade como bioindicador das condições da ETE. Para utilizá-los com este fim seria necessária
uma contagem individualizada, ou seja, contando indivíduos classificados por gênero ou até mesmo por
espécie.
A correlação entre a densidade relativa de gimnamebas nas diferentes idades de lodo é mostrada na figura
11. Este grupo foi constatado em apenas 30% das análises efetuadas durante a fase de idade do lodo de 20
dias, sempre com densidades relativas abaixo de 3%. Já durante a fase de idade do lodo de 5 dias,
apareceram em 100% das análises, porém com densidades relativas sempre abaixo de 10% (com exceção
do dia 4/8/1999, quando sua densidade relativa elevou-se bruscamente para 47,5%). Isto está de acordo
com o fato das gimnamebas, juntamente com os pequenos flagelados e pequenos ciliados livres,
prevalecerem em idades de lodo abaixo de 6 dias (SALVADÓ, 1993) e serem indicadores de carga
orgânica alta (RICHARD, 1989.).
Já o aumento brusco da densidade relativa de gimnamebas em detrimento dos outros grupos verificado no
dia 4/8/1999 carece de uma explicação. Sabe-se que o estresse excessivo provocado pela presença de
detergentes, altas concentrações de matéria orgânica dissolvida, mudanças na temperatura ou pH, ou ainda
qualquer outra variação ambiental, pode aumentar a concentração de espécies tolerantes (ESTEBAN,
1991). Durante o experimento a ETE Penha recebeu contribuições intermitentes de despejos industriais. É
possível que uma destas descargas tenha provocado o fenômeno. Porém, nenhuma correlação pode ser feita
devido à falta de análises laboratoriais apropriadas para caracterizar esses despejos. Para estabelecê-la,
seria necessário uma investigação mais profunda sobre a influência de descargas tóxicas de efluentes
industriais na composição da biota presente no reator de lodos ativados.
Figura 11: Fator de Carga e densidade relativa de gimnamebas.
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CONCLUSÕES
As observações realizadas durante o experimento acima descrito permitem concluir que, em uma ETE pelo
processo de lodos ativados variante mistura completa:
•
o número total de protozoários no líquido sob aeração está diretamente correlacionado ao fator de carga e
inversamente relacionado à idade do lodo;
•
valores altos de densidade relativa de tecamebas são indicadores de idade do lodo alta, fator de carga
baixo e nitrificação no tanque de aeração;
•
a presença de pleurostomatídios está inversamente correlacionada com a idade do lodo;
•
os peritríquios são dominantes no líquido sob aeração independentemente da idade do lodo; para que
possam vir a ser utilizados como indicadores de parâmetros operacionais de uma ETE., a contagem
destes organismos deve ser efetuada em subgrupos, seja por gênero, seja por espécie.
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