XXVII Congresso Interamericano de Engenharia Sanitária e Ambiental I-093 - CARACTERIZAÇÃO DA BIOTA DE UMA ESTAÇÃO EXPERIMENTAL DE TRATAMENTO DE ESGOTOS EM DIFERENTES IDADES DE LODO Tereza Cristina Reis da Silva(1) Bióloga. Bacharel em Ecologia. Mestranda da Escola de Química da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Chefe do Serviço de Laboratório e Controle do Corpo Receptor da Companhia Estadual de Águas e Esgotos - CEDAE-RJ. Benito Piropo Da-Rin Engenheiro Civil pela Escola Nacional de Engenharia. Professor da Disciplina Tratamento de Esgotos do Curso de Engenharia Civil com ênfase para Meio Ambiente da PUC-RJ. Engenheiro da CEDAE. Endereço(1): Ladeira do Meireles, 47 - apto 102 - S. Teresa - Rio de Janeiro - RJ - CEP: 20241-340 - Brasil Tel: 55 (21) 508-7831 - e-mail: [email protected] RESUMO Em um reator de bancada para tratamento de esgotos pelo processo de lodos ativados foram realizadas experiências visando estabelecer correlações entre as condições microbiológicas do sistema e seus parâmetros físico-químicos e operacionais. O reator, em acrílico transparente, foi alimentado com esgoto sanitário decantado ao qual se adicionou solução de carboidratos durante parte do experimento. O reator, dividido em duas câmaras separadas por uma chicana ajustável, foi operado pelo processo de lodos ativados, variante mistura completa com fluxo contínuo, com a câmara de montante simulando o tanque de aeração e a de jusante o decantador secundário. O experimento foi levado a cabo em duas fases sucessivas. Durante a primeira fase, o volume útil (de líquido) do reator foi de 7.150 ml e a idade do lodo foi mantida em 20 dias através da remoção diária de 358 ml do líquido do interior do tanque de aeração. Durante a segunda fase, o volume útil (de líquido) do reator foi reduzido para 5.000 ml e a idade do lodo foi mantida em 5 dias através da remoção diária de 1.000 ml do líquido do interior do tanque de aeração. Durante ambas as fases foram feitas análises microbiológicas quantitativas empregando a técnica descrita por Madoni (1984) para estimativa de populações de ciliados através de técnicas de subamostragem. A técnica foi adaptada para contagem de protozoários não ciliados (gimnamebas e tecamebas) e micrometazoários. O objetivo do experimento foi caracterizar a idade do lodo através do predomínio de grupos de protozoários e micrometazoários na biota, buscando correlações entre a densidade relativa destes grupos de organismos e a idade do lodo. São apresentados gráficos e tabelas correlacionando os principais parâmetros físico-químicos e operacionais das diferentes etapas de operação e a biota do reator. Os resultados obtidos mostram que as análises microbiológicas são uma importante ferramenta para avaliação das condições operacionais de uma estação de tratamento de esgotos pelo processo de lodos ativados. O grupo que apresentou melhor correlação foi o das tecamebas, cuja densidade relativa correlacionou-se diretamente com a idade do lodo. PALAVRAS-CHAVE: Tecamebas, Lodos Ativados, Protozoários, Idade do Lodo, Controle Microbiológico. INTRODUÇÃO Desde a partida da primeira estação de tratamento de esgotos (ETE) pelo processo de lodos ativados em 1922, diversos pesquisadores têm utilizado a caracterização da microbiota do tanque de aeração como indicadora das condições operacionais e eficiência do sistema. Não obstante, a análise microscópica do lodo não integra o programa padrão de análises em estações de tratamento que, em geral, só realizam análises físico-químicas para o controle do processo. No entanto, várias pesquisas têm sido desenvolvidas com o objetivo de estabelecer relações entre os parâmetros físicoquímicos operacionais de ETEs e a estrutura das comunidades de microrganismos presentes no lodo. A maioria delas investiga os microrganismos como possíveis indicadores da eficiência das ETEs. No entanto ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 1 XXVII Congresso Interamericano de Engenharia Sanitária e Ambiental poucos são os estudos sobre a sucessão de espécies - principalmente de protozoários - em função das variações da idade do lodo, uma das principais ferramentas de controle do processo de lodos ativados. Em muitas ETEs a idade do lodo é controlada pela quantidade de lodo descartada periodicamente. No entanto, torna-se difícil calcular com precisão o volume a ser descartado devido às flutuações diurnas nas concentrações de sólidos no lodo (MARAIS e EKAMA, 1976) e à imprecisão dos dispositivos de medição de vazão usados para este fim. Em virtude disso, freqüentemente a idade do lodo real é muito diferente daquela presumida pela operação. Por outro lado, análises microscópicas são capazes de fornecer indicação rápida do real regime de operação da ETE. O presente estudo tem como objetivo caracterizar a biota do lodo ativado através da identificação e quantificação de protozoários e micrometazoários presentes, buscando correlacioná-los com os resultados das análises físico-químicas e parâmetros operacionais de uma estação de tratamento de esgotos experimental. Um enfoque especial foi dado à diferenciação da idade do lodo através do predomínio na biota de determinados protozoários. MATERIAIS E MÉTODOS Descrição do Reator Experimental A instalação experimental utilizada na pesquisa foi montada no Laboratório da ETE Penha, da Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro (CEDAE/RJ) e foi alimentada com o efluente primário da própria ETE, que recebe esgotos tipicamente domésticos com alguma contribuição de efluentes industriais despejados diretamente na entrada da ETE por caminhões tanque. Empregou-se um reator de bancada de acrílico transparente dividido em duas câmaras separadas por uma chicana ajustável. A câmara de montante do reator simula o tanque de aeração e a de jusante o decantador secundário. A parede frontal externa da câmara de jusante é inclinada visando facilitar o retorno do lodo sedimentado à câmara de montante. A saída do efluente é feita através de registro de 6,5 mm situado no alto desta parede. A coleta de amostras de lodo é feita através de um registro idêntico situado próximo ao fundo da câmara de montante. A Figura 1 mostra uma representação esquemática do reator. Na primeira fase da pesquisa (idade do lodo de 20 dias), o volume útil (de líquido) do reator foi de 7.150 ml. Durante a segunda fase, com idade de lodo fixada em 5 dias, esse volume foi diminuído para 5.000 ml visando reduzir o volume de esgoto afluente requerido. Nesta fase, a dimensão de 15cm indicada no esquema foi reduzida para 10 cm. Figura 1 - Representação esquemática do reator. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 2 XXVII Congresso Interamericano de Engenharia Sanitária e Ambiental A câmara de montante foi aerada mediante a utilização de difusor tipo pedra porosa adaptado à extremidade de uma mangueira alimentada por compressor de ar tipo bomba de aquário. A homogeneização foi efetuada por agitador mecânico, com hélice de aço inoxidável de 5,5 cm de diâmetro. O reator foi alimentado por bomba peristáltica, cujas mangueiras de silicone de pequeno diâmetro foram introduzidas em orifícios situados na parte superior da parede frontal da câmara de aeração. Tanto o esgoto afluente quanto o efluente foram armazenados em garrafões de vidro. Operação do Reator Experimental O desenvolvimento da pesquisa dividiu-se em duas fases, descritas a seguir. 1. Operação em regime contínuo, idade do lodo de 20 dias Durante essa fase o sistema recebeu uma vazão média de 8.9 l/d. Com o objetivo de controlar o processo, a idade do lodo foi mantida em 20 dias através da remoção diária de 358 ml de líquido do interior do reator de 7.150 ml. No início desta fase a ETE experimental foi alimentada com o esgoto sanitário da ETE Penha após sofrer tratamento preliminar (gradeamento e desarenação) e primário (decantação primária). A carga orgânica desse esgoto, no entanto, mostrou-se demasiadamente baixa para promover o crescimento da biomassa no interior do reator até a concentração desejada (ver resultados de análises de SSV no reator, Tabela 2). Para elevar o conteúdo de matéria orgânica no afluente, decidiu-se adicionar sacarose em solução com concentração de 10 g/l. A proporção empregada foi de 2.1 % de solução de sacarose e 97.9 % de esgoto decantado e a adição foi iniciada em 26/04/99. Após a adição de sacarose, estabeleceram-se rapidamente condições de intumescimento do lodo no reator. Visando controlá-las, a solução de sacarose foi substituída por solução de glicose, mas o intumescimento do lodo persistiu, obrigando a voltar a alimentar o sistema apenas com esgoto sanitário decantado da ETE Penha. Os resultados de análises quantitativas da bactéria filamentosa causadora do intumescimento do lodo (Sphaerotilus natans) e as correlações com os parâmetros físico-químicos e operacionais deste período experimental foram apresentados no IX Simpósio Luso-brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental (SILVA et al, 2000). Durante esta fase ocorreram situações em que o pH do líquido sob aeração caiu até valores muito baixos. Nestas ocasiões promoveu-se sua alcalinização através da adição de solução 2M de hidróxido de cálcio [Ca(OH)2] em volume suficiente para manter o pH em torno de 7. 2. Operação em regime contínuo, idade do lodo de 5 dias Na fase de operação em regime contínuo com idade do lodo de 5 dias o sistema recebeu uma vazão média de 14,3 l/d. Com o objetivo de controlar o processo, a idade do lodo foi mantida em 5 dias através da remoção diária de 1.000 ml de líquido do interior do reator (cujo volume foi reduzido para 5.000 ml). ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 3 XXVII Congresso Interamericano de Engenharia Sanitária e Ambiental MONITORAMENTO 1. Análises microbiológicas A identificação dos protozoários e micrometazoários foi feita de acordo com Foissner (1996) e Patterson (1992). As análises microbiológicas quantitativas seguiram a técnica descrita por Madoni (1984). Serão apresentados apenas os resultados das contagens dos protozoários e micrometazoários que alcançaram densidade relativa mínima de 20% pelo menos uma vez durante o experimento. 2. Análises físico-químicas A tabela 1 apresenta as análises físico-químicas realizadas, a localização dos pontos de amostragem e o método de análise ou instrumento utilizado. As determinações das concentrações de nitrato dissolvido foram realizadas no sobrenadante de amostras do líquido sob aeração decantadas em proveta. Estas análises tiveram o objetivo de investigar a ocorrência dos fenômenos de nitrificação e posterior desnitrificação no reator, já que durante a fase de operação com idade de lodo de 20 dias verificou-se a flotação de lodo e o desprendimento de bolhas de gás na superfície do decantador secundário. As análises foram realizadas nos dias 24/2, 7/4 e 26/5/1999, todos na primeira fase do experimento. Todas as análises dos parâmetros constantes da tabela 1 foram realizadas de acordo com o “Standard Methods for the Examination of Water and Wastewater”, 18ª edição. PARÂMETRO PONTO DE COLETA MÉTODO ANALÍTICO DQO total Afluente Método de refluxo aberto pH Líquido sob aeração pHâmetro Quimis Q 400A Nitrato Afluente, Efluente, líquido sob aeração Espectrofotômetro Hach DR 4000U OD Líquido sob aeração Oxímetro Digimed DM 4 Temperatura Líquido sob aeração Termômetro (coluna de mercúrio) SST Líquido sob aeração Método gravimétrico SSV Líquido sob aeração Método gravimétrico Tabela 1: Parâmetros, pontos de coleta, métodos analíticos e equipamentos utilizados. RESULTADOS E DISCUSSÃO Resultados das análises físico-químicas e parâmetros operacionais 1. Fase de operação com idade de lodo de 20 dias As tabelas 2, 3 e 4 exibem valores médios, mínimos e máximos de alguns dos parâmetros característicos do afluente e do líquido sob aeração durante a fase operação com idade de lodo de 20 dias, bem como os valores médios de fator de carga, obtidos em amostras analisadas em três etapas sucessivas: antes da adição de carboidratos ao afluente, durante o período em que se adicionou carboidratos e após a interrupção desta adição. Parâmetro Médio Máximo Mínimo Afluente DQO (mg/l) 219 564 77 Líquido sob aeração SST (mg/l) 566 728 252 SSV (mg/l) 452 584 212 0,49 Fator de Carga (kg DQO/kg SSTA.d) Tabela 2: Parâmetros característicos antes da adição de carboidratos (θ θc: 20 dias). ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 4 XXVII Congresso Interamericano de Engenharia Sanitária e Ambiental Parâmetro Médio Máximo Mínimo Afluente DQO (mg/l) 500 670 415 Líquido sob aeração SST (mg/l) 764 1072 472 SSV (mg/l) 626 848 416 1,01 Fator de Carga (kg DQO/kg SSTA.d) Tabela 3: Parâmetros característicos durante adição de carboidratos (θ θc: 20 dias). Parâmetro Médio Máximo Mínimo Afluente DQO (mg/l) 227 430 74 Líquido sob aeração SST (mg/l) 625 730 506 SSV (mg/l) 503 605 390 0,46 Fator de Carga (kg DQO/kg SSTA.d) Tabela 4: Parâmetros característicos após cessar adição de carboidratos (θ θc: 20 dias). 11/6 24/5 5/5 28/4 20/4 13/4 6/4 26/3 18/3 11/3 1/3 4/2 650 600 550 500 450 400 350 300 250 200 150 100 50 0 30/1 DQO e DQOs (m g/l A variação ao longo do experimento dos valores da concentração de DQO no afluente é mostrada na Figura 2, onde se pode notar sua elevação brusca a partir do momento em que se iniciou a adição de carboidratos simples ao afluente, em 26/04 - o que, por sua vez, provocou o súbito aumento no fator de carga. data Figura 2: Variação das Concentrações de DQO afluente (θ θc: 20 dias). A observação dos valores da concentração de nitrato no afluente, no sobrenadante do lodo e no efluente, mostrados na Tabela 5, evidenciam que, nas ocasiões em que as análises foram realizadas (todas durante a fase do desenvolvimento experimental em que o reator foi operado com idade de lodo de 20 dias), houve forte nitrificação no interior da câmara de aeração e ligeira desnitrificaçao na câmara de decantação. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 5 XXVII Congresso Interamericano de Engenharia Sanitária e Ambiental Data Afluente (mg/l) Sobrenadante do lodo (mg/l) 24/02/99 5,0 20,0 07/04/99 6,2 29,2 26/05/99 4,9 16,9 Tabela 5: Resultados das análises de nitrato no afluente, efluente da ETE Experimental (idade do lodo de 20 dias). Efluente (mg/l) 14,0 21,1 15,2 sobrenadante do lodo e Fase de operação com idade de lodo de 5 dias A tabela 6 exibe valores médios, mínimos e máximos de alguns parâmetros característicos do afluente e do líquido sob aeração, bem como o valor médio do fator de carga, obtidos em amostras analisadas durante a fase de operação com idade de lodo em 5 dias. Parâmetro Médio Máximo Mínimo Afluente DQO (mg/l) 242 490 132 Líquido sob aeração SST (mg/l) 731 1125 550 SSV (mg/l) 632 940 470 1,08 Fator de Carga (kg DQO/kg SSTA.d) Tabela 6: Parâmetros característicos do afluente e líquido sob aeração (θ θc:5 dias). Comparação entre as análises quantitativas de protozoários e micrometazoários e parâmetros físico-químicos e operacionais nas distintas fases de operação (idade do lodo de 20 dias e 5 dias) Os resultados das análises microbiológicas quantitativas de protozoários e micrometazoários são apresentados através de figuras que correlacionam os parâmetros operacionais de controle do processo de lodos ativados (fator de carga e idade do lodo) com o número total (indivíduos/ml) e a densidade relativa (%) dos principais grupos identificados. A observação da figura 3 evidencia que o número total (ind/ml) de protozoários e micrometazoários relaciona-se diretamente com o fator de carga e inversamente com a idade do lodo, mostrando claramente que estes microrganismos foram mais abundantes durante a fase de operação com idade do lodo de 5 dias, com exceção, justamente, do período em que a adição de carboidratos ao afluente provocou a elevação do valor médio do fator de carga. Este fato está em conformidade com os resultados obtidos por Al-Shahwani et al (1991), nos quais o incremento do número total de protozoários no líquido sob aeração foi associado a elevações nas cargas orgânicas e à baixa idade do lodo, com forte redução do número de protozoários em idades de lodo maiores que 10 dias. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 6 XXVII Congresso Interamericano de Engenharia Sanitária e Ambiental Figura 3: Fator de carga e n.º total de protozoários e micrometazoários. A figura 4 mostra que a densidade relativa de tecamebas atingiu seus valores máximos (superiores a 70%) na fase de operação com idade do lodo de 20 dias. A contagem incluiu três gêneros de tecamebas: Arcella, Euglypha e Centropyxis. O gráfico enfatiza os valores da densidade de Euglypha pelo fato de ter sido este gênero o mais representativo no experimento, alcançando o valor de densidade relativa de 67% em 29/03/1999. A influência do fator de carga sobre a densidade relativa de tecamebas pode ser observada na mesma figura 4, onde se verifica que as densidades relativas de tecamebas mantiveram-se altas quando os valores do fator de carga estavam em torno de 0.5 kg DQO/kgSSTA.d, reduzindo-se drasticamente no período em que a adição de carboidratos ao afluente da ETE experimental fez o fator de carga elevar-se bruscamente até o valor de 1.01 kg DQO/kg SSTA.d ainda na fase de idade do lodo de 20 dias. Os resultados encontrados estão de acordo com as informações de que as tecamebas colonizam ETEs com remoção de nitrogênio e fator de carga baixo (POOLE, 1984). Tecamebas são mais abundantes em lodos caracterizados por fator de carga baixo e alta concentração de oxigênio dissolvido no tanque de aeração, que permite a completa nitrificação (DRAKIDES, 1978), e em plantas com idade do lodo alta devido às baixas taxas de crescimento características destes organismos (MADONI, 1994). De fato, a figura mostra claramente que as tecamebas foram mais abundantes no experimento com idade do lodo de 20 dias, diminuindo consideravelmente sua abundância na fase de operação com idade do lodo de 5 dias. De todos os organismos observados, as tecamebas foram os que exibiram mais forte correlação com os parâmetros operacionais. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 7 XXVII Congresso Interamericano de Engenharia Sanitária e Ambiental Figura 4: Fator de carga e densidade relativa de tecamebas. De acordo com Curds (1992), para que haja nitrificação, deve ser mantida uma concentração mínima de oxigênio dissolvido de 2,0 mg/l no tanque de aeração. A figura 5 exibe as concentrações de OD no tanque de aeração na fase de idade de lodo de 20 dias, período em que se verificou a ocorrência da nitrificação, onde se percebe que, em 90% das análises realizadas, a concentração de OD esteve igual ou acima de 2,0 mg/l . Além deste fator, a taxa de crescimento de microrganismos nitrificantes é significativamente afetada pela temperatura (observa-se a ocorrência de nitrificação na faixa de 5ºC a 50ºC, porém a faixa ótima situase entre 25ºC e 36ºC). Durante a fase de idade do lodo de 20 dias, a temperatura situou-se sempre na faixa entre 25ºC e 31ºC. Portanto é fácil concluir que a nitrificação foi favorecida pelas elevadas concentrações de oxigênio dissolvido associadas às altas temperaturas do líquido sob aeração. Na fase de operação com idade de lodo de 20 dias verificou-se a acidificação do líquido sob aeração, cujo pH caiu até níveis muito baixos (figura 6), levando a efetuar correções com solução 2M de hidróxido de cálcio [Ca(OH)2]. Essa acidificação foi conseqüência da acentuada redução da concentração de amônia no líquido sob aeração devido a sua conversão em nitrato durante o processo de nitrificação. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 8 XXVII Congresso Interamericano de Engenharia Sanitária e Ambiental 7,5 7 6,5 6 5,5 OD (m g /L ) 5 4,5 4 3,5 3 2,5 2 1,5 1 0,5 20/5 10/5 30/4 20/4 10/4 31/3 21/3 11/3 1/3 19/2 9/2 30/1 20/1 0 data Figura 5: Variação das conc. de OD no líquido sob aeração (θ θc: 20 dias) 9 8 7 6 5 pH 4 3 2 1 03/05 30/04 29/04 28/04 27/04 26/04 23/04 20/04 19/04 14/04 13/04 09/04 08/04 07/04 06/04 31/03 23/03 0 d a ta Figura 6: Variação de pH no líquido sob aeração (θ θc: 20 dias) O valor máximo da densidade relativa de hipotríquios (24.1%) ocorreu na fase de idade do lodo de 20 dias, precisamente no dia 28/04/1999, logo após a elevação do fator de carga provocada pela adição de carboidratos simples ao afluente (ver figura 7). Nesta data, os hipotríquios, juntamente com os peritríquios, atingiram 98.8% do total de protozoários e micrometazoários da amostra. Os gêneros mais freqüentes de hipotríquios são Euplotes, Aspidisca, Oxytricha e Stylonychia (VAZOLLÉR, 1989). O gênero Aspidisca foi o responsável pelo aumento da densidade relativa de hipotríquios em 28/4/1999 (quando a densidade relativa de Aspidisca atingiu 22.4%). Foram observados espécimens de outros gêneros, porém em densidades relativas baixas. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 9 XXVII Congresso Interamericano de Engenharia Sanitária e Ambiental Figura 7: Fator de carga e densidade relativa de hipotríquios. Segundo Curds & Cockburn (1970b), “a proporção de espécies de ciliados identificados como hipotríquios diminui com o aumento do fator de carga” Isso não foi constatado no presente experimento onde, pelo contrário, o valor máximo de densidade relativa de hipotríquios coincidiu com a elevação do fator de carga provocada pela adição de carboidratos (ver figura 7). É possível que este fenômeno possa ser explicado pelo fato do aumento de alimento disponível para os microrganismos durante a adição de carboidratos ter incrementado a proliferação de bactérias no lodo e com isso estimulado o crescimento de hipotríquios, especialmente os representantes do gênero Aspidisca, que alimentam-se principalmente de bactérias (FOISSNER,1996). Os rotíferos estiveram presentes em todo o período experimental (figura 8), mas não foi possível estabelecer nenhuma correlação entre variações de sua densidade relativa e parâmetros operacionais da ETE. Figura 8: Fator de carga e densidade relativa de rotíferos. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 10 XXVII Congresso Interamericano de Engenharia Sanitária e Ambiental Durante a fase de operação com idade do lodo de 20 dias, os pleurostomatídios apareceram em0 apenas 25% das análises microbiológicas efetuadas, e sempre em densidades relativas menores que 1%. Já durante a fase de idade do lodo de 5 dias, estes protozoários se fizeram presentes em 100% das amostras analisadas, embora com densidades relativas baixas. O valor máximo, de 27,1%, ocorreu em 20/07/1999 (figura 9). Figura 9: Fator de carga e densidade relativa de pleurostomatídios. Os peritríquios foram dominantes em praticamente todo o período experimental. Conforme pode-se observar na figura 10, sua densidade relativa independe da idade do lodo. Isto talvez se explique pelo elevado número de espécies desse grupo (com diferentes nichos ecológicos) e pela maior eficiência de espécies fixas se comparadas às espécies livres (CURDS, 1982 a). Salvadó (1993) relata a presença constante de espécies de peritríquios em ETEs de lodos ativados operando com diferentes idades de lodo, com concentrações de Vorticella microstoma alcançando o máximo entre 2 e 6 dias e de Epistylis plicatilis tendendo a aumentar com a idade do lodo. Figura 10: Fator de carga e densidade relativa de peritríquios. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 11 XXVII Congresso Interamericano de Engenharia Sanitária e Ambiental No presente estudo, foram observados os gêneros Epistylis, Vorticella e Charchesium. Como não foram efetuadas contagens em separado dos diferentes gêneros de peritríquios durante o experimento, não foi possível correlacioná-los com os parâmetros operacionais da ETE. Portanto, o grupo de peritríquios é de pouca utilidade como bioindicador das condições da ETE. Para utilizá-los com este fim seria necessária uma contagem individualizada, ou seja, contando indivíduos classificados por gênero ou até mesmo por espécie. A correlação entre a densidade relativa de gimnamebas nas diferentes idades de lodo é mostrada na figura 11. Este grupo foi constatado em apenas 30% das análises efetuadas durante a fase de idade do lodo de 20 dias, sempre com densidades relativas abaixo de 3%. Já durante a fase de idade do lodo de 5 dias, apareceram em 100% das análises, porém com densidades relativas sempre abaixo de 10% (com exceção do dia 4/8/1999, quando sua densidade relativa elevou-se bruscamente para 47,5%). Isto está de acordo com o fato das gimnamebas, juntamente com os pequenos flagelados e pequenos ciliados livres, prevalecerem em idades de lodo abaixo de 6 dias (SALVADÓ, 1993) e serem indicadores de carga orgânica alta (RICHARD, 1989.). Já o aumento brusco da densidade relativa de gimnamebas em detrimento dos outros grupos verificado no dia 4/8/1999 carece de uma explicação. Sabe-se que o estresse excessivo provocado pela presença de detergentes, altas concentrações de matéria orgânica dissolvida, mudanças na temperatura ou pH, ou ainda qualquer outra variação ambiental, pode aumentar a concentração de espécies tolerantes (ESTEBAN, 1991). Durante o experimento a ETE Penha recebeu contribuições intermitentes de despejos industriais. É possível que uma destas descargas tenha provocado o fenômeno. Porém, nenhuma correlação pode ser feita devido à falta de análises laboratoriais apropriadas para caracterizar esses despejos. Para estabelecê-la, seria necessário uma investigação mais profunda sobre a influência de descargas tóxicas de efluentes industriais na composição da biota presente no reator de lodos ativados. Figura 11: Fator de Carga e densidade relativa de gimnamebas. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 12 XXVII Congresso Interamericano de Engenharia Sanitária e Ambiental CONCLUSÕES As observações realizadas durante o experimento acima descrito permitem concluir que, em uma ETE pelo processo de lodos ativados variante mistura completa: • o número total de protozoários no líquido sob aeração está diretamente correlacionado ao fator de carga e inversamente relacionado à idade do lodo; • valores altos de densidade relativa de tecamebas são indicadores de idade do lodo alta, fator de carga baixo e nitrificação no tanque de aeração; • a presença de pleurostomatídios está inversamente correlacionada com a idade do lodo; • os peritríquios são dominantes no líquido sob aeração independentemente da idade do lodo; para que possam vir a ser utilizados como indicadores de parâmetros operacionais de uma ETE., a contagem destes organismos deve ser efetuada em subgrupos, seja por gênero, seja por espécie. 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