A efetividade do sistema de controle na América
Latina: comunicações do Seminário Internacional de
Controle Público em Santa Fe, República Argentina
Mestrando em Prestação Jurisdicional e Direitos
Humanos pela Escola Superior de Magistratura
Tocantinense em convênio com a Universidade Federal
do Tocantins, Conselheiro do Tribunal de Contas do
Estado do Tocantins.
Mestre em Contabilidade. Presidente do Tribunal de
Contas do Estado da Bahia, professor da Universidade
Federal da Bahia.
A presente resenha se propõe, de forma ambiciosa, à tarefa de condensar e dar ampla divulgação
aos principais aspectos evidenciados no Seminário Internacional de Controle Público, registrando,
principalmente, o que é atinente aos frutos da boa governança, na gestão por resultados, na
profissionalização da administração pública, na relevância das normas de contabilidade e auditoria
para o bom controle, na importância da transparência para a restauração da credibilidade e da
confiança perdida na administração pública, sobretudo nos países da América do Sul. Ao final, destaca
a evidente necessidade de maior interação dos organismos de controle congregados na Organização
Latino Americana e do Caribe de Entidades Fiscalizadoras Superiores (Olacefs) e vinculados à
Organização Internacional de Entidades Fiscalizadoras Superiores (Intosai).
O Seminário Internacional de Controle Público, realizado nos dias 21 e 22 de abril, sob os auspícios do
Tribunal de Contas de Santa Fe, República Argentina, contou com um programa de atividades plural,
haja vista a diversidade de seus participantes. Estiveram presentes o governador da Provincia de Santa
Fe, o Presidente do Tribunal de contas local, Dr. Gerardo Gasparrini, autoridades da Olacefs e diversos
outros técnicos conferencistas.
Nos debates levados a efeito, ressaltou-se que é essencial — para que o sistema de controle na
América Latina tenha efetividade, — que haja integração entre os organismos de controle. Por esse
prisma, é forçoso entender que o objeto de análise do controle externo não é local, pois, em outros
termos, a matriz do problema é global e se concretiza nos alarmantes índices de desconfiança que as
populações têm em relação aos seus governos.
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FONTE: WWW.TCE.BA.GOV.BR
Inaldo da Paixão Santos Araújo
FONTE: WWW.ATRICON.ORG.BR
André Luiz de Matos Gonçalves
A corrupção, consoante se asseverou nesse seminário, é fator nuclear da referida desconfiança
nas gestões públicas. É fato inequívoco, e até mesmo óbvio, que onde se percebe corrupção não
há confiança. Com destaque para a América Latina, observam-se alarmantes índices mundiais de
descrédito nas ações governamentais.
Nesse ambiente turvo, a transparência exsurge como grande meio de restauração do prestígio
das ações de governo. É relevante pontuar que transparência, seja ela ativa, seja ela passiva, tem
íntima relação com acesso à informação. Outrossim, a transparência passa, indubitavelmente, pela
qualificação dos órgãos de controle e pela clareza dos dados que são veiculados por esses mesmos
órgãos.
Tornando concreto o argumento posto, salta aos olhos o tema “Financiamento das Campanhas
Eleitorais”. A percepção geral do homem médio é de que tais subvenções têm como razão maior os
contratos que serão celebrados após o pleito eleitoral, com flagrante violação aos princípios éticos
e morais. Cabe assinalar, na mesma trilha, que a percepção do senso geral não é desprovida de
fundamento; no entanto, tal vislumbre não é nada, se comparado ao que ocorre na realidade, em
dimensões colossais.
Diante de tal cenário, torna-se imperioso registrar que a solução para esse infortúnio é o controle
independente, autônomo e efetivo. No entanto, qual será a autonomia do controle desprovido de
recursos para o desenvolvimento do múnus público? É certo que nulo.
A boa governança é o arquétipo desejado, mas exige, para que se efetive, transparência, redução de
custos, aumento de eficiência, participação cidadã e fortalecimento da probidade. Aliado a tudo isso,
deve-se ter um controle interno efetivo e dotado de capacidade técnica.
O conjunto de todos esses momentos de força irão conferir, no vetor direcional, confiabilidade
nas informações que servirão como base sólida para a tomada de decisões. Nesse sentido, ficará
evidenciada uma importante ferramenta: a divulgação de dados via portal web. No Chile, como foi
dito no seminário, é possível, por meio do Portal, o acesso até mesmo ao contrato que rege a relação
jurídica entre o particular, vencedor do certame público, e o ente governamental.
Na sequência das abordagens, surge um personagem que protagoniza o exame do trato com os recursos
públicos, qual seja, os tribunais de contas. Há quem aponte impropriedade técnica na denominação. Os
que assim aduzem, realçam que tais cortes, em verdade, não são tribunais, isto em face da inexistência
do caráter vinculante de suas decisões. Em outras palavras, não há compulsoriedade nos decretos
como há nas decisões provenientes do judiciário. Por outro lado, complementa-se a crítica afirmando
que estas cortes não tratam somente de contas, visto que examinam os atos de admissão de pessoal,
aposentadorias e de outros atos administrativos.
Inobstante a censura propedêutica, e já deixando os aspectos terminológicos a latere, surgem, como
extremamente relevantes, as chamadas auditorias de desempenho ou operacionais. Tais auditorias, se
levadas a cabo e a termo por estas cortes, seriam muito relevantes por ocasião do parecer prévio nas
contas consolidadas. Essa conclusão é extraída em razão dos dados produzidos, que traduzem com
clareza o atingimento da eficiência, economicidade e eficácia.
Sobreleva-se que tais cortes, com assento constitucional, possuem amplas garantias conferidas pela
própria Lei Maior, a fim de que não sejam mitigadas, em suas prerrogativas, pelo legislador derivado.
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Nesse passo, é isofismável que podem contribuir por meio das auditorias mencionadas para que a
sociedade não vislumbre apenas a sanção, derivada do desvio e da violação da norma, mas possa
contemplar medidas de controle preventivas, visto que o controle posterior, no judiciário, nem sempre
tem efetividade dado o longo decurso de tempo até o pronunciamento definitivo.
É relevante pontuar que a mencionada espécie de auditoria revela-se em um moderno sistema de
controle, inclinado para a orientação em detrimento do vetusto modelo sancionatório. Tal modelo
propicia, além da indicação do apontamento, a recomendação da melhor prática no trato da gestão
da máquina pública. Em arremate, pode-se afirmar que o controle formal não se apresenta desprovido
de valor, mas o controle por desempenho se mostra mais exitoso.
De igual modo, o Executivo, principal agente concretizador das políticas públicas, deve ser o primeiro
a fomentar o controle. Em outros termos, a fiscalização representa segurança para quem se conduz
retamente e, nesse passo, nunca invadirá competências. Sem olvidar que um controle efetivo impõe
melhor fundamentação dos atos de gestão, o que promove a transparência.
No entanto, cumpre antecipar que o controle jamais atentará contra a discricionariedade. Esta deve
ser entendida como um feixe de alternativas igualmente válidas, das quais poderá se servir o gestor
para o atingimento do interesse público. Nesse sentido, o controle não interfere na decisão sobre a
melhor forma de executar a política pública, tendo em vista que compete ao administrador público
o juízo de conveniência e oportunidade. Conquanto o entendimento acima expendido, não se pode
desconsiderar que o controle da discricionariedade, inserto no espectro da juridicidade, é regra técnica
de universal consenso, contra a qual não pode haver insurgência.
Noutro vértice, é assente o entendimento de que o controle restrito ao aspecto da legalidade é
insuficiente. Diversamente, deve-se buscar a integralização do primeiro aspecto com a efetividade,
ou seja, aptidão para gerar efeitos concretizados no atingimento das políticas públicas aspiradas pelo
interesse público.
De regresso ao tema da transparência, plasmado no acesso à informação, é cediço que esse deve
ser atingido em sua plenitude, ou seja, a transparência deve ser alcançada em suas vertentes ativa e
passiva. Não se pode olvidar, na valoração desse instrumento, que se trata de um direito do cidadão
e que, além disso, trará como fruto o tão almejado fortalecimento institucional como inafastável
consectário da confiança.
A transparência traz, ainda, como subproduto, a projeção, ou não, de uma gestão por resultados,
orientada pelo planejamento estratégico, com formulação de propostas que levem em conta a vertente
setorial e intersetorial de administração de recursos e que desemboca no estuário da avaliação do
desempenho.
É relevante aclarar que a auditoria por resultado passa, como dito, pelo planejamento. Nessa fase
o auditado é avaliado conforme suas particularidades. No ato seguinte, será traçado um plano de
auditoria específica e conectada com as peculiaridades do auditado. Só então ter-se-á a matriz de
auditoria, a qual definirá o eixo que delimitará como será produzido o relatório final, cujos resultados
serão comunicados e poderão servir como norte de correção de rumos. Desnecessário dizer que total
transparência deverá ser dada a esse relatório auditorial.
Em termos gerais, quando se trata de boa governança, deve-se levar em conta parâmetros comuns em
matéria de transparência e probidade. Tais parâmetros devem ser sistematizados em princípios, como
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afirmado, orientadores do dever de prestar contas. Obrigação essa denominada pelos anglo-saxões
de accountability.
Nessa esfera, verifica-se que cumpre a todo aquele que maneja recursos públicos, sem exceção,
o dever legal e o compromisso ético de informar e justificar. Em sendo assim, é inquestionável a
importância da integralidade do sistema de prestação de contas, ou seja, não se pode omitir ou
obstaculizar o controle, o acesso a qualquer informação. Cumpre, portanto, ao fiscal, confrontar
a estreita correspondência entre o que está no papel e o que se verifica na realidade; em outros
termos, quanto menor for a distância entre a norma e a realidade, maior será o desenvolvimento
social.
O aspecto sancionatório também tem seu espaço na medida em que é dissuasivo de condutas
desviadas. Com efeito, aquele que viola a norma, aquele que descumpre o seu dever de prestar
contas deve sofrer a sanção devida e imediata. A sensação de impunidade é um relevante vetor de
multiplicação das práticas dilapidadoras do erário e de desacato aos comandos legais, sobretudo os
principiológicos, os mais caros na estrutura jurídica.
Outrossim, é princípio geral a participação ativa da sociedade civil. Este é um importante veículo de
informações que impulsiona o controle externo pleno. Mas, para que esta simbiose (controle social e
externo) ocorra, é imprescindível um canal eficiente de comunicação com o agente social.
A mudança para a auditoria de boa governança pressupõe o estabelecimento de um marco legal
completo para a prestação de contas. Nesse sentido, é imperioso o estabelecimento de normas que
garantam efetividade e compulsoriedade na adoção destas boas práticas. Nessa linha de pensamento
é imperioso mencionar a importância da adoção das normas de contabilidade pública, reconhecidas
internacionalmente, que permitam a geração de relatórios financeiros confiáveis e tempestivos, pois
é por demais consabido que a informação contábil precisa ser correta para possibilitar a adequada
tomada de decisão. Mas não bastam apenas balanços públicos elaborados com base em padrões
internacionais. É imperiosa também a realização de auditoria com base em normas internacionalmente
reconhecidas, pois torna-se necessário certificar, de forma independente, se as informações prestadas
à sociedade são justas e confiáveis.
Nesse ânimo, é imprescindível, ainda, a conscientização social de que o dever da verificação de boa
aplicação dos recursos públicos não é apenas dos órgãos de controle, mas dever de todos os cidadãos.
Nesse sentido, cumpre verificar se o programa político guarda relação com as metas estabelecidas nas
leis orçamentárias.
A disseminação da ética, enquanto valor, também deve ser buscada. A ética funcionará como um
importante critério orientador e catalizador da interpretação virtuosa dos atos administrativos.
É relevante que a ética seja vista como um meio único e indivisível de valoração da condução da
administração pública. Em outras palavras, pode-se dizer que não existe uma ética do público e outra,
do privado, pois deve ser vislumbrada em sua concepção unitária.
Nesses termos, a ética é fundamento dos poderes administrativos. Tais poderes têm liame visceral com
a imposição da autoridade, mas sempre voltada para o atingimento do interesse público. Em arremate,
é adequado afirmar que a prerrogativa ética da atividade pública é de interesse indispensável.
Nas considerações finais, pode-se dizer que a boa governança é o estágio ideal buscado pelo sistema
de controle. Traduzindo em termos prosaicos, na forma brilhantemente apresentada por Eduardo
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Grinberg, Presidente do Tribunal de Contas Argentino, será infernal o ambiente de gestão que pratica
gastos em excesso e de forma direcionada, com poder desmedido, sem transparência e sem controle.
Da junção de todos esses elementos, têm-se a corrupção e a fraude, que geram o descrédito e a
desconfiança abordada no início desta breve resenha.
Noutro passo, os controles externo e interno eficientes, a devida prestação de contas, o controle
independente, aparelhado por um bom sistema de informação, regulação contábil, econômica e
financeira, além das normas sancionatórias, levam a um ambiente melhor, ao qual pode-se chamar,
figurativamente, de purgatório. Inobstante, com a inserção da transparência, atingir-se-á o melhor
estágio, no qual a boa governança se consubstanciará com gastos eficientes, econômicos, eficazes e
efetivos.
Sabe-se que o poder precisa ser limitado, visto que essa limitação representa, em última análise, a
preservação dos direitos fundamentais. Mas, se o controle reclama eficiência e eficácia dos controlados,
antes deverá impor eficiência e eficácia, visto que não é permitido, a ninguém, exigir o que não é
capaz de dar ou fazer.
A sociedade deverá participar, mas antes deverá conhecer o controle, saber como funciona e que
benefícios pode trazer. Tem-se também que caminhar para a profissionalização da administração, pois
só assim ter-se-á a boa gestão.
Sobreleve-se que o controle interno, tão relevante na consecução dos objetivos mencionados,
não pode se mimetizar com a administração, numa relação promíscua e viciada de tergiversação e
subserviência. Em um sistema virtuoso de controle interno, este é efetivo, permanente, independente
com garantias de atuação. A gestão deve reconhecer que um bom controle interno é, antes de tudo,
uma prestimosa fonte de informações para adoção de decisões seguras.
É importante pontuar que o processo de controle deve ser célere. Tal necessidade tem suas
razões. A primeira é inerente à duração razoável do processo que, como é cediço, traduz-se em
direito fundamental. A segunda razão tem estreita relação com a efetividade, pois um processo de
apuração lento é certamente estéreo, tanto no eixo pedagógico quanto no da restauração do erário
desfalcado.
Cumpre conclamar, ainda, o Legislativo, importante instrumento de controle, a aproveitar melhor os
frutos do controle externo na sua atividade legiferante. As leis devem coibir os desvios por meio da
sua força coativa e, ao mesmo tempo, aparelhar as demais estruturas de controle no exercício de suas
tarefas, com um sistema normativo preciso.
Por fim, deve-se registrar que a efetividade do controle público passa também por maior aproximação
e troca de experiências entre os órgãos de controle. Posicionamentos, aliás, diretamente relacionados
ao lema da Organização Internacional de Entidades Fiscalizadoras (Intosai): “experiência mútua em
benefício de todos”.
De igual modo, se o desejo de Simón Bolívar era de uma só América Latina, continua sendo sonho —
neste continente que insiste em manter suas “veias abertas” — promover a sua integração. Para tanto
os órgãos de controle muito podem contribuir para a adoção de medidas que reduzam a desigualdade
e a pobreza. Alguns poderiam dizer que é utopia esse pensar, mas, como enaltece o escritor uruguaio
Eduardo Galeano, a utopia existe tão somente para que a gente não desista de caminhar.
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