Título do trabalho O Efeito da Música Sagrada no Processo de Individuação Andreia Valente Tarsitano Eugenia Cordeiro Curvêlo Resumo O presente trabalho vem investigar literatura especializada sobre individuação e sobre música com o propósito de refletir sobre os possíveis efeitos da música sagrada, e como esta, pode contribuir no processo de individuação do ser humano. Considerando a função sentimento, citada por Carl Gustav Jung, refletir, para compreender sobre tais efeitos, já que a música por si só, é uma linguagem que produz sensações e está sempre presente nossas vidas. Contudo, foi percebido que a música leva o individuo a interagir melhor sua autoestima, acalma, melhora sua capacidade e o possibilita entrar em mundo nem sempre possível, o “si mesmo”. Objetivos Objetivo primário O presente trabalho em Psicologia teve como objetivo refletir por meio de investigação literária e levantamento bibliográfico, os possíveis efeitos da Música Sagrada no processo de individuação. Objetivos secundários Compreender o processo de individuação; Compreender a música sagrada e seus efeitos; Refletir sobre qual o processo transformador, que ocorrem por meio da música e que podem levar a um processo de individuação. Justificativa O Ser humano em sua evolução encontrou muitas formas de expressar e comunicar aos outros suas emoções e sensações, seu pensar e seu sentir, usando diferentes linguagens. Uma dessas linguagens é a música que identifica e une de maneira sutil o silêncio e o som. Pensando no ser humano como uma totalidade única e íntegra, embasado na psicologia analítica de Jung, a problemática central deste trabalho é a de investigar por meio de levantamento bibliográfico o efeito da música sagrada no processo de individuação, buscando compreender quais as possibilidades que levam um individuo chegar a atingir o tal processo por meio da música. Desenvolvimento: Para se tornar um ser único, todo indivíduo deve passar por um processo de individuação. Segundo Jung, (1982, p. 49) “Individuação significa que, na medida em que por individualidade entendermos nossa singularidade mais íntima, última e incomparável, significando também, que nos tornamos o nosso próprio Si mesmo”. Podemos, pois, traduzir individuação como “tornar-se Si mesmo ou o realizar-se do Si mesmo”. Dentre as inúmeras possibilidades para se tornar um ser único, a música pode ser uma delas. Quando ouvimos música, ela em geral, nos toca, ativando em nós os arquétipos, produzindo assim, reações instintivas e emocionais, que independem da razão. Jung (2002) diz que quando o arquétipo é ativado, “surge uma compulsão que se impõe a modo de uma reação instintiva contra toda a razão e vontade...”. A ideia de que a música possui valor terapêutico, também é bem antiga. Segundo Bush (1995), na Grécia antiga, Esculápio, o primeiro médico da humanidade, utilizava a música para curar. Na mesma cultura, Pitágoras ensinava os seus discípulos a empregar a música e o canto para se livrarem de medos, preocupações e raiva. "Em alguns templos do oriente, a cura através de sons melódicos e de música elevou-se ao status de arte maior. Acredita-se, por exemplo, que sons repetidos ajudavam a induzir estados de meditação e a reduzir tensões físicas e emocionais" (BUSH, 1995, p. 29). Hurtak, (2003) também acredita nisso, e afirma que “todas as repetições nunca são a mesma coisa e a palavra primitiva, de um mantra sagrado em aramaico ou hebraico é realizado em espaços cada vez mais elevados remetendo se ouvir por meio de conexões entre o consciente e o inconsciente, alcançando o que há de mais sagrado e profundo no ser humano”. A música tem um grande poder de nos emocionar, ela pode ser entendida dentro da função sentimento citada por Hilman (1990), pois, “escuto e me reconheço, e me reconheço, porque é arquetípico, é comum”. Portanto, a música nos põe em contato principalmente com a função sentimento, que, segundo Jung (1971), “é uma das funções que nos ajuda a dar valor a nossas experiências, e pertence à nossa vida psíquica e sua base”. Assim, música sagrada pode ser composta de melodias, sons e mantras que necessariamente a pessoa não precisa saber o seu significado para que seja eficaz basta ouvir ou entoar, ela vai atuar diretamente na “função sentimento” citada por Jung (1971). Considerando que segundo Hilman (1990), nossos sentimentos não são apenas “nossos”, no sentido do “eu sinto”, pessoal ou de posse, “nossos” sentimentos, são num sentido muito mais amplo, algo “em que” estamos, ou seja, os sentimentos são comuns e coletivos. O mantra é uma palavra ou fórmula sagrada que funciona como um ímã para atrair vibrações espirituais, como nos explica Lima (2003), sobre a importância do mantra: “A repetição do mantra liberta a mente da escravidão aos sentidos”. Compreendemos então, as músicas com a participação do sentimento, não apenas ouvindo fisicamente com os ouvidos. “Ficamos frente a uma equação simbólica que fizeram os junguianos que nos leva da música ao sentimento como um modo particular de funcionamento com o mundo” (ALONSO, 2010). Ao escutarmos música, não separamos o sentimento da psique, como se faz nos dias de hoje com tantos pensamentos modernos, o sentimento aparece espontaneamente e faz parte da atmosfera do ouvir música. “É um momento onde não há interferência de perguntas e respostas verbais, que por si só, já nos distanciam do próprio sentimento em si” (ALONSO, 2010). Então, “escutar música pode ser em sentido último, um jeito de alertar a alma e ao mesmo tempo, refinar a função sentimento” (ALONSO, 2010). A música leva o individuo a interagir melhor sua autoestima, a pessoa fica mais calma e tem a capacidade de trabalhar melhor suas atividades. “A música é uma linguagem que tem sensações, sentidos e está presente nas diversas situações de nossas vidas”. Por meio dela a pessoa pode entrar em um “mundo nem sempre possível, o Si mesmo” (MONTELLO, 2004). A partir do momento em que a pessoa entra em contato com determinada música, seus sentimentos tornam-se mais amplos, e este contato faz com que conheça o mundo a sua volta de forma bem prazerosa facilitando o processo de autoconhecimento. De acordo com Jung, (1985) para alcançar a individuação um dos passos seria por meio da “assimilação das quatro funções psíquicas que a consciência usa para fazer o reconhecimento do mundo exterior e orientar-se”. Jung (1985) identificou essas quatro Funções Psíquicas e as definiu como: Sensação, Pensamento, Sentimento e Intuição, estas, junto com as atitudes de introversão e extroversão, representarão os Tipos Psicológicos. Normalmente, uma combinação das quatro funções resulta numa abordagem equilibrada do mundo para a pessoa. Para Silveira (1981), toda pessoa que utiliza a função Sentimento “estabelece julgamentos como o pensamento, mas a sua lógica é toda diferente. É a lógica do coração”. O conceito de individuação talvez seja o elemento mais importante na obra de Jung (1971), para ele: “individuar-se é “tornar-se Si mesmo”, atingindo os potenciais próprios”. Assim, a “individuação é um processo espontâneo de amadurecimento por meio do qual o indivíduo se torna o que está “destinado a ser,” desde o início de sua existência”. A grande tarefa do ser humano é descobrir quem realmente é, e esse será “o seu processo de individuação”. Silveira (1981), aponta duas confusões frequentes sobre individuação. Primeiro que, individuação não é sinônimo de perfeição. “Aquele que busca individuar-se não tem a mínima pretensão a tornar-se perfeito, e sim, de completar-se, o que é muito diferente. E para tal, terá de aceitar o fardo de conviver conscientemente com tendências opostas, irreconciliáveis, inerentes à sua natureza, tragam estas, as conotações de bem ou de mal, sejam escuras ou claras”. Em segundo lugar, individuação não é individualismo. Assim, tornar-se realmente o que e quem se é, “implica em ser livre”, o que, por sua vez, significa compreender, no sentido mais claro e amplo que a palavra pode ter. Ser livre significa ter um entendimento, uma aceitação em si e da sua necessidade de existência em termos ilimitados. Vivenciar esse entendimento é a mais plena é a mais profunda interiorização a que o indivíduo possa chegar. Ser livre é ocupar o seu espaço de vida e esse entendimento de si é um processo e não um estado de ser. Esse processo contém como correlata a possibilidade de o indivíduo constantemente diversificar-se e acrescentar a si próprio dentro de sua coerência. É um processo que cresce em duas direções simultâneas, como se fosse um leque a abrir e fechar num idêntico movimento, atingindo níveis integrativos sempre mais elevados. Crescendo tanto no sentido das delimitações como no de ampliações, a coerência se renova nas potencialidades criativas do indivíduo. A cada síntese, a cada novo nível de compreensão que é possível alcançar, corresponde à base do aparecimento de novas possibilidades de ser e de criar. Assim, a criação é um perene desdobramento e uma perene reestruturação. É uma intensificação da vida (OSTROWER, 1987, apud VARGAS FILHO, 2006, p. 88). Considerações finais Quanto mais conscientes nos tornamos de nós mesmos, por meio do autoconhecimento, tanto mais se reduzirá a camada do inconsciente pessoal que recobre o inconsciente coletivo. Desta forma, emerge uma consciência livre do mundo mesquinho, suscetível e pessoal do Eu, aberta para a livre participação de um mundo mais amplo de interesses objetivos. Assim, a música pode exercer grande efeito sobre os sentimentos das pessoas de modo geral, e proporcionar o autoconhecimento. E a música sagrada possibilitar o processo de individuação do Ser. Referências Bibliográficas ALONSO, P. V., Música e Arquétipo: Ouvir Música é Arquetípico? - Trabalho apresentado como: “Tema Livre” no XVIII Congresso Internacional da Associação Junguiana do Brasil, Curitiba, 2010. BUSH, C. A., A música e a terapia das imagens: caminhos para o eu interior, 222 p., Tradução de Afonso Teixeira Filho. Cultrix, São Paulo, 1995. HILLMAN, J., A função sentimento. A tipologia de Jung. São Paulo: Cultrix, 1990. HURTAK, J.J., O Livro do Conhecimento/Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas: Boletim de Pesquisas Cientificas, Academia para Ciência Futura, p.12, Brasil, 2003. JUNG, C. G., Tipos Psicológicos. Tradução Álvaro Cabral. Rio de Janeiro, Editora Vozes,1971 ______ O Eu e o Inconsciente. Obras completas de C.G.Jung Vol VII/2. Petrópolis: Vozes 1982. ______ A natureza da psique. CW. 8/2. Vozes, Petrópolis, 1985. ______ Os Arquétipos e o Inconsciente Coletivo 2 ed. Editora Petrópolis: Vozes, 2002. LIMA, N. R. C., A música religiosa no tratamento musicoterápico de pacientes com câncer. Monografia (Graduação em Musicoterapia) – Conservatório Brasileiro de Música, Rio de Janeiro, 2003. MONTELLO, L., Inteligência musical essencial: a música como caminho para a cura, a criatividade e a plenitude radiante. Tradução de Gilson César Cardoso de Sousa. São Paulo: Cultrix, 2004. SILVEIRA, N., Jung, vida e obra. 7. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, (Coleção Vida e Obra), Rio de Janeiro, 1981. VARGAS FILHO, L., A Arteterapia como Facilitadora do Processo de Individuação. Monografia de conclusão de curso apresentada ao ISEPE, 2007, 95 f., Rio de Janeiro 2006.