O PROJETO MEMORIAL DO LIVRO MORONGUÊTÁ E O HERCÚLEO RESGATE
DA MEMÓRIA INTELECTUAL PARAOARA
Elisangela Silva da Costa
Pró-Reitoria de Relações Internacionais da UFPA
[email protected]
Introdução:
A doação de Bibliotecas particulares há anos vem sendo utilizada para
desenvolver o acervo de bibliotecas de inúmeras instituições de ensino superior;
entretanto na contemporaneidade as doações vem dividindo opiniões. Alguns
bibliotecários não as aceitam por considerar que as obras ofertadas são defasadas e
alheias à bibliografia básica do MEC, sendo apontados inclusive como itens de baixa
da qualidade do acervo caso ele seja composto apenas por esta modalidade de
aquisição (MAIRE apud WETZEL, 2012); outros ao contrário julgam que este tipo de
material enriquece e diversifica o acervo, pois permite que obras que estão fora de
catálogo editorial possam ser incorporadas. Del Corral (2005, p. 10) defende a
doação de livros a bibliotecas e vê nesta “uma de nossas modalidades de
intervenção específicas para reforçar a demanda de leitura e formar novos leitores.
Divergências a parte; o amor incondicional ao livro, à memoria e à
perpetuação do estudo e da pesquisa amazônidas uniu quatro pessoas de trajetórias
profissionais distintas (um arquiteto e pró-reitor de relações internacionais da UFPA,
o Prof. Flavio Nassar, uma geóloga, Gloria Martins, uma estudante de
Biblioteconomia, Geisa Dias 1 e uma Bibliotecária que pertencia ao Sistema de
Bibliotecas da UFPA, Elisangela Costa) na mais genuína ratificação da assertiva de
Raul Seixas “Um sonho sonhado sozinho é um sonho. Um sonho sonhado junto é
realidade” e ocasionou a criação do Projeto Memorial do Livro Moronguêtá2, com o
intento de reunir, organizar, disponibilizar e promover ações reflexivas sobre às
Bibliotecas que pertenceram a relevantes intelectuais paraenses (UFPA, 2012).
O Projeto supracitado iniciou suas atividades em novembro de 2012 e desde
então está sediado provisoriamente no Fórum Landi, organização supra-institucional
e supranacional localizada na Rua Siqueira Mendes, n. 60, ao lado da Igreja do
Carmo, no Bairro da Cidade Velha, em Belém do Pará. A sede definitiva do
Moronguêtá será o casario localizado na Ladeira do Castelo, ladeado pelo Museu de
Arte Sacra e pelo Forte do Castelo. Esta edificação pertenceu à ordem inaciana e lá
abrigava a biblioteca do Colégio dos Jesuítas do Grão-Pará, no período de 16631753. O projeto arquitetônico prevê a reunião de três ambientes documentais – um
museu que irá concatenar objetos pessoais do intelectual, um arquivo onde ficarão
armazenados: as cartas, os prêmios, os relatórios, as portarias, etc., e a Biblioteca,
espaço reservado a reunir os livros que pertenceram ao homenageado.
A Coleção seminal foi a Biblioteca de Maria Annunciada Ramos Chaves (19152006) eminente jurista e professora, que lecionou em afamadas instituições de
ensino públicas e particulares belenenses. Foi uma das fundadoras da Faculdade de
Filosofia e Ciências Humanas da UFPA. Presidiu o Conselho Estadual de Cultura do
Pará (CEC-PA), além de ser membro da Academia Paraense de Letras (APL) e do
1
Geisa Dias Graduou-se em Biblioteconomia pela UFPA em 2013 e trabalha na Biblioteca do Instituto
Evandro Chagas.
2
O vocábulo Moronguetá é oriundo da língua indígena nheengatu, e significa: falar de coisas boas
(SILVA, A., 2011) e foi sugerido para denominar o Projeto pelo folclorista paraense Vicente Salles.
Instituto Histórico e Geográfico do Pará (IHGP). Atualmente integram o Moronguêtá
as seguintes bibliotecas particulares: a) Roberto Araújo de Oliveira Santos (1932 –
2012), renomado professor universitário, economista, pesquisador, escritor e
cientista do direito (SILVA, O., 2012); b) Clóvis Silva de Moraes Rêgo (1932 – 2006),
ex-governador do Estado do Pará, presidiu a Biblioteca e Arquivo Público do Pará
(BAP), o Tribunal de Contas do Estado do Pará (TCE-PA), o CEC-PA, a APL e o
IHGP. Foi professor do Instituto Educacional do Para (IEP) e Colégio Estadual Paes
de Carvalho (APL, 1990); c) Raimundo Jinkings (1927 – 1995), exímio jornalista,
líder sindical e, sobretudo livreiro que muito contribuiu para a difusão do pensamento
esquerdista na Amazônia (PINTO JÚNIOR, 2011); e, a mais recentemente adquirida
Biblioteca de Inocêncio Machado Coelho (1909 – 2001), inolvidável jornalista
paraense, trabalhou em relevantes publicações periódicas diárias paraoaras, tais
como: O Estado do Pará, Folha do Norte e A Província do Pará. Neste último
manteve de 1952 e 1953, a coluna "Sapos e Estrelas" que posteriormente a
transformou em um livro. Na década de 1940 dirigiu o Museu Paraense Emilio
Goeldi (MPEG) e foi membro de profícuas instituições culturais paraoaras, tais
como: a APL, o CEC-PA e o IHGP (APL, 1990).
Para organizar os Acervos das Bibliotecas Particulares foram desenvolvidas
as seguintes ações: 1°) Coleta dos materiais bibliográficos e dos objetos pessoais
doados ao Memorial; 2°) Seleção das obras: atividade que consiste em verificar o
estado de conservação das obras, isolando os materiais que não estão em bom
estado de conservação para posterior restauração; 3°) Identificação da tipologia
documental, geralmente os acervos são compostos por: Livros, periódicos,
dicionários, enciclopédias, biografias, relatórios, teses, etc. 4°) Inventário das
coleções.
Posteriormente serão aplicados os tratamentos técnicos biblioteconômicos
(catalogação, classificação, indexação e automação via Biblivre, software gratuito
gerenciador de acervos). Os trabalhos envolveram além da equipe do Moronguêtá;
os estudantes da Faculdade de Biblioteconomia da UFPA que voluntariamente vem
colaborando com o Projeto; bem como estudantes do Cuso de Técnico em
Bibliteconomia promovido pela Secretaria de Estado de Educação do Pará (SEDUCPA).
Considerações Finais
Vivemos uma era de transição, a era dos descartáveis em que tudo ou quase
tudo é passível de ser substituído. A época da Modernidade líquida, como aduz o
sociólogo Zygmunt Bauman, em que tudo é efêmero e impossível de ser mantido,
abstrato, impraticável de ter nas mãos, as coisas se esvaem como líquido.
Neste termos o Morongueta se projeta como um centro de resistência ao
fetiche da volatibilidade do conhecimento descartável e se propõe a dar as
bibliotecas doadas o tratamento e respeito que elas merecem e o cumprimento do
desejo de seus antigos donos, bem como a oportunidade das gerações futuras
conhecerem obras de qualidade que foram adquiridas ou produzidas por
personalidades que integraram, formaram e influenciaram e continuarão a influenciar
gerações de intelectuais paraenses.
Palavras-chave: Bibliotecas particulares.
Bibliotecas universitárias. Bibliofilia.
Coleções
especiais.
Doações.
REFERÊNCIAS
ACADEMIA PARAENSE DE LETRAS (APL). Poesia & prosa: antologia. Belem :
CEJUP, 1990.
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade líquida. Trad. Plínio Dentzien. Rio de Janeiro:
Zahar, 2003.
DEL CORRAL, Milagros. Prefacio. In: ROSI, Mauro. A Doação de livros para o
desenvolvimento. [Brasilia] : Unesco, 2005.
PINTO JÚNIOR, Antonio Carlos Pimentel. A Biblioteca vermelha de Raimundo
Jinkings: uma história de livros. 2011. 131 f. Dissertação (mestrado) - Universidade
Federal do Pará. Instituto de Letras e Comunicação. Programa de Pós-Graduação
em Letras, Belém, 2011.
SILVA, Adnilson. Territorialidades e identidade do coletivo Kawahib da terra
indígena Uru-Eu-Wau-Wau em Rondônia: “orevaki are” (reencontro) dos
“marcadores territoriais”. 2010. 301 f. Tese (Doutorado) - Programa de PósGraduação em Geografia, Setor de Ciências da Terra, Universidade Federal do
Paraná, Belém, 2010.
SILVA, Orlando Sampaio. Roberto Santos. 02.08.2012. Disponível em:
http://www.carlosbranco.jor.br/mostratempesp.asp?codigot=3099&menuvolta=conteu
do.asp. Acesso em: 02.05.2013.
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ. Pró-Reitoria de Relações Internacionais.
Projeto Memorial do Livro Moronguêtá. Belém, 2012.
WEITZEL, Simone. Desenvolvimento de coleções: origem dos fundamentos
contemporâneos. TransInformação, Campinas, v. 24, n. 3, p. 179-190, set./dez.,
2012.
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