Evolvere Scientia, V. 1, N. 1,p. 33-45, 2013 Evolvere Scientia ARTIGO UNIVERSIDADE FEDERAL DO VALE DO SÃO FRANCISCO ROTAÇÃO DE IMAGENS MENTAIS A PARTIR DE UMA FONTE SENSORIAL TÁTIL Rodrigo Oliveira Damasceno, Anne da Silva Barreto, Leonardo Rodrigues Sampaio, Luiza dos Santos Sá, Tiago Oliveira de Lima Universidade Federal do Vale do São Francisco, 56304-917, Petrolina, PE. INTRODUÇÃO atuando como inputs informacionais imediatos (MARMOR & ZABACH, 1976). A representação mental é um conceito há muito pesquisado por psicólogos cognitivistas com o objetivo de REVISÃO entender como ocorrem os processos mentais e de que forma o ser humano consegue manipulá-los (STERNBERG, 2008). Uma das hipóteses mais aceitas atualmente é a de que as representações mentais são funcionalmente equivalentes às percepções visuais, ou seja, imagens Em termos gerais, representação mentais são funcionalmente análogas aos mental pode ser definida como a forma em objetos reais por elas representados (Farah, que conceitos, episódios, objetos, entre 1988; Shepard e Metzler, 1971). Sendo outros assim, as imagens mentais possuem função conhecimentos externamente, são adquiridos representados e manipulados mentalmente (Carpenter & Eisenberg, 1978). Desta forma, entende-se representação mental como uma projeção “interna” de coisas sentidas e percebidas externamente, pois ao perceber um objeto, a imagem deste é construída mentalmente. Tal imagem pode ser posteriormente evocada sem que haja fontes sensoriais 33 e características semelhantes as da percepção. Sobre essa questão, Atkinson (2002, p. 354) argumenta que “muitas vezes recuperamos percepções passadas, ou partes delas, e atuamos sobre elas da mesma maneira que atuaríamos sobre um percepto real”. Um exemplo seria tentar responder à Evolvere Science, V. 1, N. 1, p. 33-45, 2013 pergunta “quantos cômodos existem na sua localização de pontos (SHEPARD 1982, casa?”. Para responder a essa questão, é apud FARAH 1988). preciso recobrar previamente uma representação armazenada na memória, examinando mentalmente toda a extensão da casa. Um considerável número de descobertas da Neuropsicologia expande, tanto qualitativa quanto quantitativamente, as teses sobre a comunalidade entre Apesar de esse exemplo ser bem mecanismos de percepção e imaginação subjetivo, existem evidências que propõem visual. a existência de processos em comum entre a divididas em dois grandes grupos: as que imaginação mental e a percepção visual defendem a existência de mecanismos (FINKE, 1985, apud ATKINSON, 2002). cognitivos independentes de imaginação Uma vezes visual e percepção visual, mas com negligenciada fonte de dados é aquela processamento neurológico comum; e as gerada a partir dos estudos na área da que Neuropsicologia. Neste campo, diversos processamento visual na imaginação visual programas (FARAH, 1988). importante de e muitas pesquisa produziram evidências empíricas de que imaginação e percepção são mediadas pelos mesmos substratos neurais, tendo, portanto, sistemas funcionais comuns (FARAH, 1988). Tais descobertas defendem Ainda o uso segundo podem de Farah áreas ser de (1988), evidências fortes de que parte do córtex visual participa da imaginação visual vem do uso de técnicas eletrofisiológicas de medida de fluxo sanguíneo e localização da A descoberta de Shepard (1982) de que formas geométricas simples podem ser mentalmente reorientadas apenas com uma rotação mental contínua, forneceu uma breve demonstração das aparentes propriedades visuoespaciais das imagens mentais. Em outro trabalho, o mesmo autor explicou a rotação e as transformações de imagens mentais pelos mesmos mecanismos que influenciam a percepção visual do equivalência movimento, funcional e também entre a imagens mentais e perceptos visuais numa tarefa de 34 atividade neuronal no cérebro. Como exemplo disto citam-se os experimentos de Roland e Friberg (1985), que analisaram o fluxo sanguíneo de áreas do cérebro, enquanto sujeitos submetiam-se a três diferentes tarefas cognitivas: resolução de problemas aritméticos, escaneamento de memória e uso da imaginação visual. Em cada um dos sujeitos testados, o padrão de fluxo sanguíneo na tarefa de imaginação visual mostrou forte ativação das regiões posteriores do cérebro, incluindo o lobo occipital, lobo parietal posterior superior e Evolvere Science, V. 1, N. 1, p. 33-45, 2013 lobo temporal posterior inferior. Essas são SACKS as mesmas áreas que normalmente mostram STENGEL, 1948 apud FARAH, 1988). aumento de fluxo sanguíneo durante tarefas de percepção visual. Além disso, essas áreas não mostraram aumento de fluxo sanguíneo em comparação com o estado de descanso nas outras duas tarefas cognitivas (MAZZIOTTA, PHELPS, & HALGREN, 1983; ROLAND, 1982; ROLAND & SKINHOJ, 1981; ROLAND & FRIBERG'S, 1985 apud, FARAH, 1988). Estudos feitos em sujeitos com déficits cerebrais específicos & WASSERMAN, 1987; Sobre esta questão, Sacks (1995) descreve o caso de um pintor de 65 anos, que após um acidente de carro perdeu totalmente a capacidade de perceber as cores. Com o passar do tempo, aquele homem que dominava o uso e a combinação de cores vai se dando conta de que também perdera toda a capacidade de imaginar objetos coloridos, bem como de lembrar como as cores lhe pareciam. À nas medida que examinava o paciente, Sacks habilidades visuais sugerem que se a percebeu que tudo o que restou ao pintor imaginação visual mesmos em relação às cores estava em nível de mecanismos cognitivos percepção memória verbal, ou seja, ele conseguia visual, então se pode esperar que pacientes relatar como a experiência de cores lhe com déficits específicos nas habilidades de parecia, mas não conseguia, efetivamente, imaginação, também os demonstrem na lembrar disto. usa os da habilidade perceptiva. De fato, para todos esses tipos de déficits visuais devidos a lesões corticais, onde a imaginação tem Outros dados clínicos1 demonstram sido examinada, déficits paralelos de que pacientes com danos no lobo parietal imaginação têm sido notados (FARAH, direito frequentemente falham na detecção 1988). de estímulos apresentados no lado esquerdo Numa série de estudos de caso com pacientes que perderam a capacidade de enxergar cores, notou-se uma associação entre perda das cores na percepção e na imaginação (BEAUVOIS & SAILLANT, 1985; HEIDENHAIN, 1927; JOSSMAN, 1929; LEWANDOWSKY, 1908; PICK, 1908; RIDDOCH & HUMPHREYS, 1987; 35 do campo visual, ainda que seus processos sensoriais elementares para tal estímulo no lado afetado do espaço estejam intactos. (Heilman, Watson, & Valenstein, 1985; Posner, Walker, Friedrich, & Rafal, 1984, 1 Uma revisão mais completa de trabalhos empíricos nos quais se busca estabelecer um paralelo entre imaginação visual e percepção visual pode ser encontrada em Finke (1985). Evolvere Science, V. 1, N. 1, p. 33-45, 2013 apud Farah, 1988). Esse déficit é conhecido dados que mostram haver relações entre as como negligência visual e também parece propriedades da percepção e da imaginação se manifestar na imaginação visual. Bisiach visuais teria sido construído com este viés. constatou que pacientes com negligência Por fim, pesquisas sobre imaginação em visual no lobo parietal direito também cegos congênitos chamam a atenção para a falharam em acessar os lados esquerdos dos existência de representações de ordem objetos e cenas imaginados (BISIACH & espacial não visual, similares às visuais. LUZZATTI, 1978; BISIACH, LUZZATTI, Segundo Farah (1988), se cegos congênitos & PERANI, 1979, apud FARAH, 1988) apresentam desempenhos semelhantes a sujeitos com visão normal neste tipo de pesquisa, isso torna possível que as Apesar de haver um robusto corpo de dados empíricos (COOPER & PODGORNY, 1976) que apóia a tese levantada anteriormente, descobertas em sujeitos videntes também sejam devidas ao uso de representações espaciais não visuais. alguns pesquisadores não concordam com os pressupostos supramencionados e propõe Dentre as formas de manipulação hipóteses alternativas sobre a construção e de manipulação de imagens mentais. Pylyshyn transformação rotacional, que permite (1981, apud FARAH, 1988), por exemplo, movimentar imagens mentais em diferentes acredita que os sujeitos em experimentos de sentidos e direções e é também chamada de imaginação podem usar, em vez de Rotação Mental. Através de uma série de mecanismos estudos, especificamente visuais, imagens mentais Shepard e destaca-se Metzler a (1971) processos mais gerais somados a algum tipo constataram que o tempo necessário para de o rotacionar imagens mentais é diretamente funcionamento de seus sistemas visuais. proporcional ao ângulo de rotação da Isso substituiria o uso do sistema visual imagem, quando comparada à sua posição propriamente dito. Intons-Peterson (1983, originalmente apresentada. Outros dados apud FARAH, 1988), por sua vez, propôs indicam que não há diferença significativa que do experimentador entre o tempo de rotação de figuras planas e durante pesquisas deve ser levada em conta, em profundidade, e nem quando se compara pois os paradigmas experimentais usados o sentido de rotação (horário ou anti- no estudo das propriedades visuais da horário) da imagem. Ademais, os tempos de imaginação são, segundo ele, vulneráveis a reação são mais longos para figuras esta variável. Desta forma, grande parte dos desconhecidas do que para as conhecidas 36 conhecimento a expectativa implícito sobre Evolvere Science, V. 1, N. 1, p. 33-45, 2013 (Jolicoeur, Snow e Murray, apud Sternberg, vertical, sempre tomando alguma parte da 2008). Em outras palavras, a disparidade imagem ou estímulo como ponto de angular, assim como o conhecimento ou o referência. Outros resultados indicaram que não conhecimento prévio de um objeto, era mais fácil realizar a rotação mental influenciam diretamente no tempo que o quando o estímulo era visto girando na sujeito leva para rotacionar uma figura- mesma direção da que lhe foi previamente estímulo. Entretanto, quando se considera o apresentado o estímulo, e que isto fazia com sentido de rotação e o plano de fundo das que os participantes trouxessem-no para a figuras, posição vertical ao longo do caminho mais observa-se que estes não influenciam no tempo de resposta do curto de rotação sujeito. CAVANAGH, 1992). (JOLICOEUR & A pesquisa de Jolicoeur e Cavanagh (1992) investigou se há relação entre a percepção do “movimento” real e de rotação mental, através de um conjunto de quatro experimentos nos quais foram utilizados caracteres alfanuméricos como estímulos-alvo (as letras maiúsculas F, G, J, P e R, e dígitos 2, 5 e 7). Os participantes eram estudantes universitários com visão normal ou corrigida. Os estímulos eram apresentados visualmente em um monitor colorido com tempo de apresentação controlado, alternando entre os ângulos 0º, 60º, 120º, 180º, 240º ou 300º, nos três primeiros experimentos, e 0°, 90°, 180° e 270° no último. Por fim solicitava-se que os colaboradores acusassem se a figura mostrada estava na posição normal ou invertida. Corroborando os postulados de Shepard e Metzler (1971), a transformação mental realizada no estudo de Jolicoeur e Cavanagh (1992) quantidade de tempo demandou uma proporcional à diferença angular entre a orientação do estímulo e a orientação do quadro de referência. As conclusões e hipóteses dessa pesquisa, juntamente com estudos de Corballis e McLaren (1982, 1986 apud Jolicoeur e Cavanagh, 1992) sugerem resultados semelhantes aos de Sherpard e outros (1981, 1982, apud Jolicoeur e Cavanagh, 1992), demonstrando que a rotação mental pode estar associada à percepção de movimento físico ou real, e que “a rotação mental pode ter evoluído como uma habilidade em seres humanos. Uma das observações feitas pelos Isto possibilitou uma vantagem adaptativa autores foi a de que a imagem era no sentido que nós passamos a ser capazes mentalmente a de prever a posição e orientação de objetos alinhar-se à posição inicial, neste caso, na que se deslocam, principalmente daqueles 37 rotacionada de forma Evolvere Science, V. 1, N. 1, p. 33-45, 2013 três congênitos, cegos tardios e videntes com os dimensões” (p.13). Conclui-se, portanto, olhos vendados, na qual utilizaram como que o movimento percebido e o movimento estímulos duas letras (P e F) colocadas a imaginado podem estar relacionados em direita tarefas de rotação mental; essa interação respectivamente. Na tarefa, era solicitado parece ocorrer em um nível mais abstrato que os participantes tateassem as letras a do fim de construir uma representação mental que possuem deslocamento processamento e em independente de elementos mais simples do córtex estriado. Segundo Jolicoeur e Cavanagh (1992) os sujeitos foram capazes de girar mentalmente a imagem nos sentidos horário ou anti-horário com a mesma eficiência, sendo que a decisão de como fazê-lo era tomada de forma arbitrária. Assim como quando o estímulo era apresentado em qualquer superfície, cada visual, e a percepção de um não anulava a do outro. Portanto, conclui-se que nos casos em que se demanda o processamento de dois estímulos desta natureza, eles são analisados de forma independente, podendo representados esquerda do sujeito, mental. Foram realizados quatro experimentos, sendo os três primeiros com os mesmos materiais e variando os sujeitos, e no quarto utilizou-se um novo estímulo, para que não houvesse efeitos de aprendizagem, decorrentes das primeiras sessões experimentais. percepto separadamente no mesmo nível do córtex ser a das mesmas para uma posterior rotação (estímulo e superfície) era processado ainda e de forma bidimensional, ou tridimensional, quando houver a percepção das três dimensões. De maneira geral, os resultados sugerem que informações visuais prévias não são pré-requisitos necessários para rotação mental, posto que sujeitos cegos não apresentaram dificuldades em realizá-la durante as tarefas experimentais. Neste sentido, os pesquisadores concluiram ser possível que as representações mentais demandem mais das representações espaciais (construídas a partir do tato, cinestesia e sentido vestibular) do que das Uma questão levantada pelos pesquisadores a respeito da rotação mental representações visuais (CARPENTER & EISENBERG,1978). é a de que se este tipo de transformação Ainda sobre a relação entre as mental requer sempre algum tipo de informações visuais e espaciais, Marmor e informação Zaback (1976) realizaram uma pesquisa visual prévia. Sobre esta questão, Carpenter e Eisenberg (1978) com realizaram uma pesquisa com sujeitos cegos cegueira adquirida e videntes vendados, 38 cegos congênitos, pessoas com Evolvere Science, V. 1, N. 1, p. 33-45, 2013 cujo objetivo era compreender se cegos se que a partir do estímulo visual é possível congênitos manipulam imagens mentais e rotacionar como estas são formadas. Foi utilizada uma imagéticas. Entretanto a visão não é o único base com um estímulo fixo a ela, e foi sentido capaz de estimular a imaginação pedido aos participantes que apertassem um mental. É sabido que o olfato, o tato, a botão à direita quando o estímulo estivesse visão, a audição e o paladar são importantes na posição normal e um botão à esquerda para o reconhecimento perceptivo e como quando na posição invertida. Observou-se fonte de informação para a construção de uma diferença significativa no tempo de imagens mentais dos objetos da realidade resposta dos sujeitos cegos congênitos e (Atkinson, cegos adquiridos. Entretanto, constatou-se Sternberg, 2008). que à medida que a disparidade angular aumentava, aumentava também os tempos de resposta nos três grupos de sujeitos e vice-versa. representações 2002; mentais Schiffman, 2005; O presente estudo foi desenvolvido para avaliar se o princípio da equivalência funcional aplicado a rotação de imagens mentais poderia ser observado quando a Em linhas gerais, a pesquisa de fonte sensorial para formação da imagem Marmor e Zaback (1976) ratificou que as era informações critério especificamente, objetivou-se investigar se fundamental para rotação mental, pelo fato através do tato as pessoas conseguem de cegos congênitos conseguirem realizá-la reconhecer, criar e manipular a imagem e terem tempos de respostas proporcionais mental de um objeto-estímulo. visuais não são àqueles de pessoas com cegueira adquirida e com visão normal. Os autores apontam para a necessidade de novas pesquisas na área das representações mentais, para que se possa melhor compreender esses processos, tanto em videntes quanto em cegos. A partir dos experimentos discutidos até então, em experimentos realizados por Shepard e Metzler (1971) feitos com objetos tridimensionais, e por Jordan e Huntsman (1990, apud Sternberg, 2008) com objetos bidimensionais, percebe39 o tato e não a visão. Mais Participaram desta pesquisa 50 sujeitos com visão normal, sendo 30 do sexo feminino e 20 do sexo masculino, com faixa etária variando entre 17 e 30 anos de idade, estudantes da Universidade Federal do Vale do São Francisco. Para aplicação do experimento utilizou-se dois objetos-estímulo, uma base onde estes seriam fixados os objetos e materiais auxiliares como folhas de registros para respostas e tempos de latência, canetas esferográficas, cronômetro CRONOBIO e fita adesiva. Evolvere Science, V. 1, N. 1, p. 33-45, 2013 Na confecção da base foram 0° de rotação em relação ao sujeito, ou seja, utilizadas uma folha de isopor e uma de os estímulos eram colocados exatamente de emborrachado, medindo 50 x 50 cm, na frente para o sujeito. Com isso visava-se o qual estavam demarcados os ângulos 0º, reconhecimento dos estímulos por parte dos 30°, 60º, 90°, 120º, 150°, 180º, 210°, 240º, participantes, 270°, 300° e 330º. Os objetos-estímulo construíssem uma imagem mental dos utilizados foram duas letras “R” na posição mesmos. normal (R) e invertida (Я), desenhadas na fonte Arial Black e construídas com emborrachado medindo 14 mm de espessura. Foram feitas demarcações nos objetos-estímulo para facilitar o alinhamento com a base e utilizou-se velcro para fixá-los à mesma. Na para segunda que eles fase os assim mesmos objetos-estímulo foram apresentados aos sujeitos na posição normal e invertida, com ângulos de rotação de 0º, 30°, 60º, 90°, 120º, 150°, 180º, 210°, 240º, 270°, 300° e 330º. Deste modo, os objetos-estímulo foram apresentados em ambas as posições, e em cada um dos ângulos, totalizando 24 A aplicação do experimento ocorreu na Sala 1 do Laboratório de Desenvolvimento Processos Aprendizagem Psicossociais (LDAPP) e da apresentações. A ordem de apresentação dos ângulos e as posições dos objetos foram randomizadas ao longo das sessões experimentais para evitar efeitos de ordem. UNIVASF, campus Petrolina - PE. Uma Cada vez que a posição e ângulo de mesa foi preparada com a demarcação em rotação do objeto eram modificados o fita adesiva do espaço exato onde a base participante deveria tateá-lo e dizer qual sua seria colocada. O piso da sala também foi posição: marcado, no local exato onde a cadeira do cronômetro sujeito deveria ficar. Antes da realização do participante dava o primeiro toque no experimento foram dadas ao sujeito as estímulo e parado quando ele emitia sua informações necessárias para a realização resposta. do mesmo e solicitada à assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. O experimento foi dividido em duas “normal” logo que O o os participantes eram indagados acerca de suas estratégias cognitivas para a realização da tarefa e depois de ter suas dúvidas e curiosidades sujeitos que colocassem as vendas nos experimento. 40 ativado “invertida”. Ao fim de todas as apresentações, fases: na primeira fase foi pedido aos olhos e tateassem os estímulos, sempre com era ou sanadas, findava-se o Evolvere Science, V. 1, N. 1, p. 33-45, 2013 De maneira geral, observou-se que os resultados encontrados corroboram, em parte, os achados de Shepard e Metzler (1971). Quando comparados os tempo de respostas entre os ângulos 30º e 60° (t = 2,73; p = .008), 30° e 90º (t = -2,30; p = .025), 30° e 120° (t = -3,21; p = .002), 30°e 150° (t = -3,77; p < .001), 30° e 240°, (t = 3,45; p = .001) e 30° e 270°(t = 2,49; p = .001), na posição invertida, observou-se que as diferenças nesses tempos de latência foram significativas, indicando, portanto, Gráfico 1: Tempos médios de resposta para cada ângulo, nas posições Normal e Invertida. que a dificuldade de rotação de imagens mentais variou em função da disparidade angular (ver Gráfico 1). Por outro lado, Quando analisadas as diferenças quando o objeto era apresentado na posição nos tempos de resposta entre ângulos normal este padrão de resultados não se replementares (com disparidade angular repetiu, pois as diferenças entre o tempo equivalente, em relação ao eixo Y), notou- médio de resposta para o ângulo de 30° e se que não houve diferenças significativas, para os demais não foram significativas. o que confirma a hipótese de que o sentido A única exceção a tais resultados foi encontrada na comparação entre o tempo de resposta para o ângulo 30º e para o de 180°, na qual a diferença foi significativa tanto para a posição normal (t = -2,28; p = .002) quanto para a invertida (t = -4,10; p < .001). Em outras palavras, constatou-se que a disparidade angular teve um efeito mais significativo nos tempos de reação quando a figura era apresentada na posição invertida do que na posição normal. da rotação (horário ou anti-horário), não influencia significativamente o tempo da tarefa (SHEPARD & METZLER, 1971; JOLICOEUR & CAVANAGH, 1992). Em termos práticos, nota-se que a comparação entre ângulos replementares, como por exemplo, 30° e 330°; 60° e 300°, geralmente mostra valores semelhantes, corroborando o pressuposto que o sentido de rotação desempenho, não posto interfere que a sobre distância percorrida ao deslocar o estímulo de 30° para 0°, e de 330° para 360° é a mesma. 41 o Evolvere Science, V. 1, N. 1, p. 33-45, 2013 aumento da taxa de erros, à medida que a disparidade angular se aproximava de 180º, e que esta taxa diminuía para os ângulos maiores que 180°, tanto na posição normal quanto na invertida (Gráfico 3). No que se refere aos acertos, por outro lado, o padrão observado foi inverso, ou seja, a taxa de acertos tendeu a ser mais alta com uma menor disparidade angular e a decair à medida que esta disparidade se aproximava de 180°. Estes resultados confirmam a existência de uma relação entre disparidade Gráfico 2: Tempo de resposta acumulado para cada posição. angular e dificuldade na rotação mental, pois o aumento na taxa de erros seguiu o mesmo padrão observado para o tempo de Conforme ilustra o gráfico 2, resposta, em função da disparidade angular. constatou-se que o tempo de resposta total gasto para rotacionar os objetos na posição normal (M = 67,03; d.p. = 32,66) foi menor Erros e Acertos do que o tempo gasto na posição invertida entre estas médias foi significativa (t = 2,03; p = .048). Esses dados sugerem que a familiaridade com o estímulo na posição normal influenciou significativamente o N ú m e ro A b s o lu to d e E r ro s e A c e rto s (M = 73,15; d.p. = 36,14) e que a diferença 60 50 40 30 20 10 0 0° 30° 60° 90° 120° 150° 180° 210° 240° 270° 300° 330° Ângulos Erro Invertido Erro Normal Acerto Invertido Acerto Normal desempenho dos sujeitos posto que nesta situação eles deveriam fazer apenas um tipo de rotação (anti-horário ou horário), Gráfico 03: Número absoluto de erros e acertos para cada posição. enquanto que com a figura invertida As análises demonstraram ainda deveriam fazê-la, associada a uma rotação que não houve diferença significativa nos da imagem sobre o sue próprio eixo. tempos de resposta e nem nas taxas de Com relação à quantidade de erros na tarefa (informar que o objeto estava na posição “normal” quando estava “invertido” e vice-versa) notou-se que houve um 42 acertos e erros, relacionadas ao sexo dos participantes. Estes resultados e os de estudos anteriores, como os de Shepard e Metzler (1971) e Jolicoeur e Cavanagh Evolvere Science, V. 1, N. 1, p. 33-45, 2013 (1992), sugerem que a rotação mental mais estudos com este tipo de desenho imagética mecanismos experimental. Outro fato a ser destacado é o cognitivos e neurofisiológicos universais, de que todos os participantes tinham visão os normal e que isto pode ter estar por trás da depende quais podem de ser completamente relação entre tato e visão durante as independentes do sexo. rotações mentais. Sobre esta questão, cita-se que CONCLUSÃO todos os participantes mencionavam, quase que imediatamente após o primeiro toque De maneira geral, o presente estudo no objeto estímulo, que se tratava de uma corrobora da letra “R”. Julga-se que as informações a fornecidas pelo tato eram usadas para imagens acessar a representação imagética da letra mentais e percepção visual. Por outro lado, “R” na memória dos participantes, a qual, confirma evidências anteriores de que a provavelmente, havia sido construída a percepção visual pode não ser a única fonte partir de uma interação entre inputs informacional usada para formar imagens informacionais mentais e que, na verdade, a construção e principalmente, visuais. Todavia, pode-se manipulação de representações mentais questionar se, nos casos em que o indivíduo envolve tanto representações de ordem não visual quanto espacial (WRAGA, SWABY visuais por nunca ter usado o sentido da & & visão (ex: pessoa com cegueira congênita), SATHIAN, 2002). Mais especificamente, a falta de inputs informacionais visuais os resultados aqui observados apontam para estaria associada a algum tipo de diferença a importância das informações sensoriais do na maneira como ele manipula imagens tato nos processos de transformação de mentais? Neste sentido, considera-se que representações mentais. pesquisas futuras podem contribuir para com equivalência existência de FLYNN, Apesar o pressuposto funcional, relações 2008; dos indicando entre PRATHER resultados terem corroborado em parte pesquisas anteriores, alguns dados são discrepantes em relação a achado empíricos anteriores (por exemplo, a não progressão linear dos tempos de possui cinestésicos, representações táteis e, imagéticas esclarecer como pessoas que não possuem a visão constroem e manipulam imagens mentais produzidas através de outras fontes sensoriais não visuais. Como desdobramentos futuros do resposta em função da disparidade angular), presente indicando a necessidade de realização de resultados aqui encontrados sirvam como 43 estudo, objetiva-se que os Evolvere Science, V. 1, N. 1, p. 33-45, 2013 subsídios para o desenvolvimento de uma Psychology: metodologia de performance, Washington, v.2, n.4, p.503- investigação sobre imagens pesquisa mentais adequada a manipulação em pessoas à de com deficiência visual. A partir disto, pretendese avaliar se existem diferenças significativas na maneira como transformações mentais ocorrem as em Human perception and 514, 1976. FARAH, M.J. Is visual imagery really visual? Overlooked evidence from Neuropsychology. Psychological Review, Washington, v.95, n.3, p.307-317, 1988. pessoas com cegueira congênita e cegueira JOLICOEUR, P.; CAVANAGH, P. 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