Ano I # 11
Editorial
Duas campanhas, um mesmo MP
Grupo de Estudos
Pela segurança pública
Hédio Silva Júnior
Um defensor dos excluídos
Palavra do Presidente
APMP DEFENDE VOCÊ E O MP.
SEMPRE!
A trajetória que imprimimos neste último ano foi a de defesa incondicional do Ministério Público e dos associados. Trabalhamos muito nas causas que julgávamos importantes para
o destino da Instituição, dos promotores e dos procuradores
de justiça, sem descuidarmos dos problemas administrativos.
I. Internamente, estes foram os assuntos principais:
Conselhos Nacionais do Ministério Público e da Justiça:
a APMP travou luta genuína pela democracia e pleiteou eleições
diretas pela Classe. Infelizmente, não foi a postura da PGJ e do
CSMP. Nesse assunto, talvez tenha ocorrido a maior derrota do
MPSP nos últimos dez anos. Não custa lembrar que a escolha
em São Paulo foi indireta e que ficamos sem representantes
nesses importantes órgãos (confira APMP Já 02, 06 e 07).
Caso Riviera de São Lourenço: cuidamos de defender,
primeiro, o MP no cenário externo e, depois, lutamos pelo
respeito às garantias de um promotor de justiça. No episódio, caso da maior gravidade foi a veiculação de informações
sigilosas em horário nobre da TV. Até este momento não se
chegou a um único culpado. Não custa lembrar que as informações confidenciais de todos os membros do MP estão nos
mesmos arquivos de onde partiu o vazamento (confira APMP
Já 03 e APMP em Reflexão 04 e 06).
Ouvidoria: A APMP entende que, em face da relevância do
órgão, ele deve possuir o máximo de independência. Nada mais
natural seja escolhido pelo maior número de eleitores. A proposta
da APMP, não acolhida pela Procuradoria-Geral nem pelo Órgão
Especial do Colégio de Procuradores, trazia mais democracia. A
luta da APMP prossegue na Assembléia Legislativa (confira APMP
Já 06 e 11 e APMP em Reflexão 06).
Procuradoria de Interesses Difusos: a APMP sabe da
importância dos interesses difusos para o MP. A Lei da Ação
Civil Pública, tal como a conhecemos, nasceu nos Grupos de
Estudos. Por isso, defendemos a discussão pela
Classe e que se desse o status necessário
a tema tão complexo. O assunto, porém,
foi mal conduzido pela PGJ e pelo Órgão
Especial e culminou em fragorosa derrota para a Instituição (confira APMP em
Reflexão 09 e 10).
Orçamento: dedicamo-nos a buscar
soluções para os cortes unilaterais da nossa
proposta de orçamento. Vários estudos foram
dedicados ao tema, como o livro “O MP e a
crise orçamentária”. Oxalá nossa Instituição não aceite, uma vez mais e
passivamente, novos cortes (confira APMP em Reflexão 08).
Revista APMP EM REFLEXÃO
Veículo mensal de comunicação
da Associação Paulista do
Ministério Público.
Ano I, Número 11 (2005).
Tiragem: 4.000 exemplares.
Conselho Editorial
João Antonio Garreta Prats
Cláudia Jeck Garcia de Souza
Paulo Roberto Dias Júnior
Sérgio de Araújo Prado Júnior
Isonomia entre os membros do MP: democracia pressupõe o tratamento igualitário entre todos os membros. Pensando
assim, a APMP lutou o quanto pôde contra injustiças em face
dos inativos. Propusemos que a PGJ não aceitasse os cortes orçamentários e, assim, tratasse os associados como merecem:
com respeito e sem diferenciação (confira APMP Já 04 e 10).
II. No âmbito externo, trabalhamos para reforçar a imagem positiva do trabalho individual e coletivo de promotores
e procuradores de justiça de São Paulo.
Defesa dos promotores do Júri: no jornal Folha de São
Paulo, o ex-vice-prefeito Hélio Bicudo chamou os promotores
do júri de “preguiçosos”. A APMP respondeu e mostrou a importância do trabalho desenvolvido pelo MP (confira APMP Já
03 e APMP em Reflexão 02).
Federalização dos crimes contra os direitos humanos:
a APMP defendeu que a federalização dos crimes contra os
direitos humanos é claro desprestígio para os Ministérios Públicos e Justiças Estaduais (confira APMP em Reflexão 05).
Ameaças contra o PJ de Viradouro: defendemos a integridade física do promotor de justiça de Viradouro, ameaçado por
sua dedicada e intrépida atuação funcional. Acionamos a Secretaria de Segurança Pública que, na pessoa do Secretário Saulo
de Castro Abreu Filho, disponibilizou meios aptos a garantir o
exercício funcional do colega (confira APMP Já 04 e APMP em
Reflexão 04).
Movimento contra Arbítrio e Corrupção: invasão do
Fórum de Catanduva para devolução de processos e outras
ações espalhafatosas da Polícia Federal uniram diversos setores da sociedade civil (confira APMP Já 10 e APMP em
Reflexão 08).
Audiências Públicas: Aplaudimos a realização de audiências públicas para prestar contas à sociedade do trabalho do
MP. Alertamos, porém, sobre os riscos da ausência de dados
concretos para subsidiar o debate. Tanto que a audiência pública da Capital, na qual se esperavam milhares de participantes, contou com a presença de pouco mais de 70 pessoas da
comunidade (confira APMP Já 05).
Como se vê, neste primeiro ano de gestão optamos por trilhar o melhor caminho para o MP, ainda que isso pudesse trazer
atritos com órgãos da Administração Superior, em especial PGJ,
CSMP e Órgão Especial do Colégio de Procuradores.
Nesta edição da APMP em Reflexão, trazemos entrevista
com o Secretário da Justiça, Hédio Silva Júnior, artigo da
associada Cláudia Berê e diversas outras matérias.
Boa leitura a todos!
João Antonio Garreta Prats
Presidente
Coordenação Geral
Luciano Ayres
Jornalista Responsável
Adriana Brunelli – MTB 33.183
Redação
Ayres.PP – Comunicação
e MKT Estratégico
(19) 3242-1180
Assessoria de Imprensa
ReDe Comunicação
(11) 3061-3353
Fotos
Vision Press
(19) 3241-7498
Leandro Irmão
04
Contraponto | Hédio Silva Jr. 06
Em defesa do MP | Duas campanhas, um MP
Maxima Venia | A circulação como interesse difuso
passível de tutela pelo Ministério Público
MP em foco | Futuro do MP X MP do Futuro
Grupos de Estudos | Seminário Jurídico
aprova tese sobre a participação do MP
na política de segurança pública
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26
34
Flórida 38
(também) para adultos
APMP Destinos|
Cultura e Lazer |
Buddy Guy
Budd
44
Gastronomia |
48
no Brasil
Petróleo
Vermelho
D
Em defesa do MP
uas campanhas, um mesmo MP
Quando a APMP lançou a campanha “O Ministério Público precisa de você!”, tinha em mente dois destinatários:
1º) o promotor e o procurador de justiça; 2º) a sociedade.
Aos membros da Instituição, quisemos lembrar que
o notável desenvolvimento do Ministério Público decorreu do bom exercício das atribuições que a Constituição de 1988 nos concedeu, bem como do envolvimento da Classe na discussão dos destinos institucionais.
Noutras palavras, a campanha tencionava resgatar a
auto-estima das promotoras, promotores, procuradoras e procuradores, que tantos buscam diminuir.
À sociedade, quisemos lembrar da importância do
Ministério Público para a redução das desigualdades e
da exclusão. De que somos seus “advogados” e de que,
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sem um Ministério Público forte e atuante, o caminhar
rumo a um Brasil mais justo e digno para todos será
cada vez mais lento.
Quisemos, enfim, alertar os membros do Ministério
Público e a sociedade para o perigo que ronda o regime
democrático, a ordem jurídica e os interesses sociais e
individuais indisponíveis sempre que se tenta, de qualquer forma, sufocar a atuação firme e socialmente comprometida dos promotores e procuradores de justiça.
A campanha publicitária que lançamos há poucos
meses é parte de estratégia mais ampla da APMP de
defesa incondicional e intransigente do Ministério Público e de seus membros, cuja atuação tem desagradado aos que lucram com a manutenção da realidade
social injusta.
Nessa defesa não temos alternativas: precisamos
cada vez mais da população ao nosso lado e ciente de
que um Ministério Público independente é crucial para
o fortalecimento dela própria.
Mas para falar com a população é preciso diversificar a linguagem, pois a sociedade brasileira é muito
heterogênea e complexa.
Nesse particular, com muita alegria saudamos a
campanha deflagrada pela Procuradoria-Geral de Justiça, em solenidade no dia 18 de outubro último, com o
título “Histórias Extraordinárias” (NR: veja a cobertura
completa na seção “MP em Foco”).
Para divulgar alguns resultados práticos da atuação
de promotores de justiça em todo o Estado, escolher artistas consagrados e a linguagem das ilustrações e das
charges, como reforço a textos simples e diretos, foram
iniciativas bastante felizes.
Aliás, para que essa campanha atinja o maior número de pessoas, fica a sugestão de confeccionar panfletos
com papel de menor qualidade e custo, para que centenas
de milhares sejam produzidos e distribuídos à população
mais carente, por intermédio das ONGs, associações de
bairros, centros comunitários, centrais sindicais etc.
Agora, é chegada a hora de direcionar nossos esforços para um aliado tão ou mais importante: a sociedade civil organizada, que congrega a maior parte dos
Quisemos, enfim, alertar os
membros do Ministério Público e a
sociedade para o perigo que ronda
o regime democrático, a ordem
jurídica e os interesses sociais e
individuais indisponíveis sempre que
se tenta, de qualquer forma, sufocar
a atuação firme e socialmente
comprometida dos promotores e
procuradores de justiça.
chamados “formadores de opinião”. Esses efetivamente influenciam os Poderes Executivo e Legislativo nas
questões republicanas mais relevantes, a ponto de, por
vezes, neutralizar as ações de setores a quem interessa
o status quo.
Para atingir esse outro público-alvo, porém, a estratégia deve ser distinta. Campanhas publicitárias são
eficazes, claro, mas devem estar embasadas em dados
estatísticos reveladores da eficiência de nossa atuação
nas mais diversas áreas.
Isso só conseguiremos mostrando nossos impressionantes índices de produtividade, de forma compreensível aos diversos tecidos sociais, o que proporcionaria,
sem dúvida, dezenas de campanhas como as deflagradas
pela APMP e pela PGJ.
O trabalho está no começo e é árduo. Sendo assim,
unamo-nos todos para que os frutos sejam colhidos o
mais rapidamente possível.
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H
Contraponto
Como os formadores de opinião enxergam o MP
Hédio
Silva
Júnior
Correndo o risco de algumas injustiças, a onda
do “politicamente correto” foi feita sob medida para
os ingênuos e para os hipócritas. Noutras palavras,
para os que acreditam que eufemismos e expressões
edulcoradas afastariam qualquer traço de discriminação de que porventura pudessem ser acusados.
A mera retórica não basta na luta contra a discriminação. É preciso atitude. Ou, nas palavras do nosso entrevistado, o “papel ativo de promover a igualdade e não
só o papel passivo de não discriminar”.
Hédio Silva Júnior era um garoto negro e pobre
da periferia. Seu futuro, como o de crianças e adolescentes nascidos nas mesmas condições, não era
nada promissor. Mas com perseverança, disciplina e
apoio familiar, galgou um dos postos mais altos do
Governo Estadual, a Secretaria da Justiça e Defesa da
Cidadania, que ocupa desde 16 de maio deste ano.
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De servente de pedreiro a doutor em Direito
Constitucional, mas sempre militando em favor
dos excluídos, Hédio Silva Júnior jamais se envergonhou da sua condição de negro. Na entrevista que concedeu, em nenhum momento usou
o termo “afro-descendente”, tão ao gosto do “politicamente correto”, preferindo as expressões de
que tanto parece se orgulhar (“negro”, “comunidade negra”, “movimento negro”).
Assuntos espinhosos não faltaram na conversa. Febem,
discriminação racial no Poder Judiciário e no Ministério
Público, ações afirmativas, intolerância e o assassinato do
dentista Flávio Santana. Nada que nosso entrevistado não
tenha “tirado de letra”, sem meias-palavras.
Com muita satisfação, a APMP em Reflexão traz
entrevista exclusiva com o Secretário Estadual da Justiça e Defesa da Cidadania, Hédio Silva Júnior.
APMP em Reflexão: Conte-nos um pouco sobre
sua trajetória.
Hédio Silva Júnior: Minha história é muito comum.
Família de origem pobre, criado na periferia... mas
acredito que as palavras-chave são perseverança e
disciplina. Lutei contra todo tipo de adversidade e
espero que o Brasil possa, um dia, não exigir tanto
dos seus filhos que nascem em situação não-privilegiada. Eu acabo sendo uma referência para a
população negra brasileira e tenho dito às pessoas que, embora nosso país tenha toda a sorte de
discriminação, ainda assim é possível superar essas
barreiras.
APMP: Para uma história de vida como a sua ser
a regra, o segredo então está na perseverança e
na disciplina?
HSJ: Talvez o aprendizado familiar, direcionado para
que eu acreditasse em mim mesmo, tenha ajudado.
Isso trouxe para mim uma alta auto-estima. A pessoa precisa acreditar nela própria, ter perseverança
e disciplina. Eu não diria que esses três ingredientes constituem uma receita, mas são bons pontos
de partida para ser reconhecido em uma sociedade
complexa, como é a brasileira.
APMP: Falando em auto-estima, como anda o
orgulho do negro pela sua condição?
HSJ: Vem melhorando muito. O Brasil tem hoje, em
todos os seus rincões, entidades fundadas e organizadas por negros que apresentam diferentes formas
de linguagem e expressão. Todas elas lutam contra
a discriminação. Nos últimos anos o Brasil mudou
a referência estética, o padrão de beleza, e muitos
elementos da cultura negra passam a ser paulatinamente reconhecidos.
APMP: Poderia nos dar alguns exemplos?
HSJ: Temos 18 universidades públicas que adotam
o programa de inclusão de jovens negros e eles estão tendo o mesmo desempenho que os colegas.
Surgiram revistas e outros veículos de comunicação criados pela comunidade negra. Neste mês de
novembro, por exemplo, o Netinho de Paula está
lançando uma emissora de televisão, que, se não
é destinada exclusivamente ao negro, tem nele o
seu foco principal. Então, eu diria que a sociedade brasileira e as instituições públicas e privadas
passaram a compreender uma parte do problema
racial. Sou muito otimista em relação ao futuro do
Brasil, em que a cor ou a raça deixe de ser associada
à inferioridade.
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Contraponto
APMP: Qual sistema de classificação de raça é melhor: o feito por terceiros ou a autodeclaração?
HSJ: Em todos os países, classificação racial é um ato
arbitrário, ainda que baseado em critérios razoavelmente objetivos. Vou citar dois exemplos: na África do Sul,
no período do apartheid, uma mulher branca que se casasse com um homem negro passava a ser considerada
negra para fins de direito. Já nos Estados Unidos, a pessoa é considerada negra de acordo com o percentual de
sangue negro na cadeia genética.
APMP: E no Brasil?
HSJ: O Brasil tem a maior população negra do mundo, só
perde em números absolutos para a Nigéria. Somos, de
certa forma, um amálgama entre os grupos étnicos que
fundaram a nacionalidade: o branco europeu, o indígena
e os africanos trazidos para cá. Aqui, historicamente é o
fenótipo, a aparência que determina a classificação racial.
Lamartine Babo tem uma marcha carnavalesca que diz:
“o teu cabelo não nega mulata, porque és mulata na cor.
Mas como a cor não pega, mulata, mulata eu quero o seu
amor”. Deve ter sido em uma tarde agradável no Rio de
Janeiro que Lamartine Babo, ao olhar para uma mulher,
ficou em dúvida e a classificou por sua aparência.
APMP: E do ponto de vista legal?
HSJ: A lei das estatísticas criminais, que é de 1941, estabelece a heteroclassificação como método. É o escrivão
de polícia quem atribui a cor do indiciado. Em alguns
Estados, como São Paulo, você compra um formulário
para tirar o RG e nele consta uma pergunta sobre a cor.
É um caso, portanto, de autoclassificação. Mas, do ponto
de vista ético e metodológico, a própria ONU recomenda a autoclassificação e não a heteroclassificação. Claro
que, na dúvida, o fenótipo da pessoa sempre pesa mais
do que qualquer critério genético.
APMP: Como está a tolerância da sociedade brasileira com as minorias em geral?
HSJ: O Brasil configura uma rica geografia de identidades
culturais. Nós temos uma pluralidade religiosa, um Estado
laico - pelo menos formalmente - e uma Constituição que
atribui ao Estado o dever de proteger a opção religiosa,
tanto que, por exemplo, a Lei de Execuções Penais prevê
o direito do preso de acesso à assistência religiosa. Temos
judeus, budistas, muçulmanos, candomblecistas, as diferentes linhagens das religiões afro-brasileiras e, segundo
o último censo, 12 milhões de ateus. Além dos grupos que
historicamente enfrentam discriminação com base cultural, racional ou étnica, como os índios e os negros. Eu diria
que, nos últimos anos, o Brasil se dispôs a reconhecer a
gravidade desse problema.
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APMP: Mas nem sempre foi assim, certo?
HSJ: Não. Durante muito tempo nosso país negou a
existência do problema racial e isso foi péssimo. As
pessoas entendiam que não falar sobre o assunto ajudaria a resolver a questão, mas isso não acontece. Essa
“política do avestruz” varre o problema para debaixo
do tapete, mas não o tira de lá.
APMP: E a tolerância no âmbito mundial?
HSJ: O importante pensador francês, Alan Tourraine, escreveu um texto intitulado “Poderemos Viver Juntos?”,
em que aponta a alteridade como principal questão
para as democracias contemporâneas ocidentais neste
século. A própria globalização econômica impõe uma
convivência muito mais estreita e próxima entre as várias culturas e os vários grupos. Portanto, quanto mais a
sociedade e a democracia valorizam a diversidade, tanto
melhor para os indivíduos e para o funcionamento das
instituições. E o Brasil certamente tem tudo para dar
exemplo ao mundo de um país multirreligioso, pluricultural e democraticamente estruturado, onde todos possam usufruir das mesmas oportunidades.
Na África do Sul, no período do
apartheid, uma mulher branca
que se casasse com um homem
negro passava a ser considerada
negra para fins de direito.
APMP: Mas o mundo não está cada vez menos tolerante?
HSJ: Esse é o paradoxo da sociedade contemporânea. Por
um lado, os povos são cada vez mais chamados à convivência cotidianamente estreita. De outro, segundo a ONU,
75% dos conflitos armados em curso no mundo têm alguma motivação de natureza racial, cultural ou religiosa.
Muitas vezes você tem conflitos meramente econômicos,
nos quais são inseridos componentes de natureza cultural
ou religiosa como justificativa.
APMP: E qual a saída?
HSJ: A colocação de Tourraine, que acredito seja a mais
importante da atualidade, é: conviver com a diferença não
é somente uma questão econômica ou ética, mas, sobretudo, moral. Precisamos educar nossas próximas gerações
de que a fé, a aparência, a estética do indivíduo ou grupo
nada tem a ver com atributo moral ou intelectual.
Quem é Hédio Silva Júnior
Nascido em 1961, na cidade mineira de Três Corações,
formou-se em Direito pela Universidade São Judas Tadeu.
Atuou como consultor na Secretaria Especial de Políticas
e Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República, na UNESCO e no Programa das Nações Unidas para
o Desenvolvimento.
Doutor em Direito Constitucional e Mestre em Direito Processual Penal pela PUC-SP e diretor-executivo da ONG Centro de
Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdade.
Como coordenador da Comissão de Direitos Humanos da
OAB-SP, trabalhou para apurar a chacina de moradores de rua
em São Paulo e realizou inspeções em hospitais psiquiátricos
para verificar as condições de atendimento aos pacientes.
Publicou livros sobre a questão racial no Brasil, como “AntiRacismo - Coletânea de Leis Brasileiras (1998) e “Discriminação
Racial nas Escolas - Entre a Lei e as Práticas Sociais” (2002).
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Contraponto
APMP: O terrorismo tem dificultado muito essa
convivência, não é mesmo?
HSJ: Se parte de um grupo religioso utiliza o terrorismo como forma de explicitar seus dilemas, isso não
significa que os demais integrantes sejam assim. E,
às vezes, um Estado, para se defender, acaba difundindo a idéia de que toda uma religião é terrorista.
A luta pela igualdade implica a recusa de qualquer
generalização. As pessoas estão despertando cada
vez mais para a importância de uma solução pacífica e duradoura, que garanta o respeito recíproco,
a valorização de uma cultura de paz e de aceitação
das diversidades.
APMP: Quando o governador Geraldo Alckmin o escolheu para ocupar a Secretaria da Justiça e Defesa da
Cidadania os movimentos ligados à proteção dos direitos humanos se entusiasmaram. Qual a importância das
entidades da sociedade civil?
HSJ: Eu diria que as organizações da sociedade civil são
uma espécie de sal da terra. No momento em que, em
várias partes do mundo, as estruturas partidárias são
questionadas, principalmente no Brasil, com os fatos
recentes envolvendo a utilização de meios escusos para
manutenção de filiados ou conquista de apoio dentro do
Congresso Nacional, cada vez mais os partidos políticos
vão se tornando estruturas institucionais que atuam nos
momentos eleitorais. Mas quem atua no cotidiano das
pessoas reivindicando direitos, diagnosticando e dando
visibilidade a problemas até então no plano oculto são
as organizações da sociedade civil.
APMP: Que tipo de parceria é possível entre essas
entidades e o Estado?
HSJ: Tenho conversado com organizações de caráter
acadêmico, com as vinculadas a entidades de classe e
com as que lidam com temáticas nacionais, como movimento de mulheres, dos homossexuais etc. Com cada
uma delas é possível desenhar formas de ação conjunta. Se eu pudesse deixar uma marca do meu curto
período de gestão, seria a da parceira com a sociedade
civil, cuja criatividade e capital político podem contribuir para a resolução de vários problemas sociais e
para a promoção da cidadania.
APMP: Uma das áreas sensíveis da sua Secretaria
é a Febem e desde sua posse cessaram as rebeliões
quase diárias. Qual o segredo?
HSJ: Não há segredo. Aproveito para ressaltar o trabalho da Doutora Berenice Gianella, presidente da Febem,
bem como a contribuição que integrantes do Ministério Público de São Paulo deram para a Febem nos
últimos anos. Esse trabalho acumulado nos leva, hoje,
não a uma solução para a Febem, mas a um equacionamento do problema.
e o de disciplina. Porque os pais acumulam o trabalho de
educador e disciplinador, mas nas nossas unidades houve o
entendimento correto de que o educador não deve ocupar o
papel da disciplina, até para ampliar a possibilidade de aproximação, de criação de laços de afetividade.
APMP: E o que falta para a solução?
HSJ: O governador Alckmin tem feito um esforço extraordinariamente grande para que possamos descentralizar as unidades. Isso não é simples. Em algumas
cidades do nosso Estado, lamentavelmente, vereadores
propuseram leis proibindo a construção de unidades da
Febem. Mas o Judiciário tem sido enfático ao reconhecer a inconstitucionalidade dessas normas.
APMP: E a prevenção? Qual a fórmula para que os
índices de criminalidade infanto-juvenil não continuem crescendo?
HSJ: É preciso que a compreensão do problema da violência urbana não fique com foco restrito no crime e
no criminoso, no fenômeno da violência, que tem vários fatores, inclusive de natureza econômico-social.
Não é pouca coisa o fato de que, nos anos 70, a idade
média de um criminoso no Brasil era de 27 anos. Hoje,
está perto dos 20 anos. O valor médio do objeto de
crime era de cerca de 100 dólares, sendo que hoje está
por volta de 10 dólares. São elementos úteis para a
compreensão de uma das raízes da criminalidade.
Durante muito tempo nosso país
negou a existência do problema
racial e isso foi péssimo. As
pessoas entendiam que não falar
sobre o assunto ajudaria a resolver
a questão, mas isso não acontece.
APMP: A propósito, como avalia a divisão nas unidades da Febem entre as funções de educar e disciplinar?
HSJ: Quase todos os educadores em nossas unidades hoje
são vinculados à Secretaria de Educação. É importante que
o projeto tenha demarcado a figura do agente de educação
Uma secretaria de peso
APMP: Mas a solução do problema sócio-econômico
não passa primordialmente pela esfera federal?
HSJ: Sim. Aliás, é lamentável que o presidente da República tenha sido eleito prometendo o primeiro emprego, uma política consistente de inserção do jovem
no mercado de trabalho e não tenha feito absolutamente nada nessa área. É preciso uma ação conjugada
da União, dos Estados e Municípios para garantir escola
e lazer. Em São Paulo temos uma política belíssima comandada pelo Secretário Lars Grael, com a construção
de equipamentos públicos de lazer e esporte. É preciso
que os meios de comunicação desempenhem, também,
um papel importante para que a juventude
possa acreditar nela e volte a ter sonhos.
A Secretaria da Justiça e Defesa da Cidadania tem como sua principal missão reduzir a distância entre o Estado e a cidadania. Por meio
do contato permanente com os diversos órgãos governamentais, organizações e movimentos sociais, busca desenvolver projetos conjuntos
para a promoção da cidadania e dos direitos humanos. Exemplo disso
são os CICs (Centros de Integração da Cidadania), implantados em
áreas periféricas para resolver conflitos e prestar serviços públicos de
forma ágil e com a participação da comunidade. Além disso, a Secretaria incentiva a participação da população nas políticas públicas
por intermédio do Conselho Estadual de Entorpecentes e do Conselho
Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana.
A ela são vinculados o PROCON, o IPEM (Instituto de Pesos e
Medidas), o IMESC (Instituto de Medicina Social), a ITESP (Fundação
Instituto de Terras do Estado de São Paulo), a JUCESP (Junta Comercial do Estado de São Paulo) e a FEBEM (Fundação Estadual do
Bem-Estar do Menor).
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APMP: Temos uma declaração sua à revista “Isto
É” (NR: edição de 28/9/05) de que imperava no Poder Judiciário e no Ministério Público uma “cultura da internação”, que atingia inclusive adolescentes acusados de crimes mais leves. Mas os
promotores da infância e juventude afirmam que
só estão pedindo internação apenas em crimes
como roubo, homicídio, extorsão mediante seqüestro, estupro etc. A Secretaria ou a Febem já
desenvolveu algum estudo para verificar o percentual de jovens que não praticaram infrações
graves e estão internados?
HSJ: Nós estamos realizando agora esse
mapeamento, para que saibamos o impacto
dos atos infracionais leves nas internações. Às
vezes o jornalista edita uma frase do entrevistado que permite uma interpretação equivoca-
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Contraponto
da. O que eu disse foi que parte do Ministério Público
e do Judiciário tinha essa cultura de internação. Mas a
questão não se resume a esses protagonistas.
APMP: Como assim?
HSJ: A advocacia também tem um papel a desempenhar,
assim como nós, do Poder Executivo. Sem falar do Município, cujo a função de viabilizar a execução de medidas
sócio–educativas alternativas à internação é importantíssima. Não é matéria que admita uma visão simplista e
nem que se resolva com julgamentos e acusações de um
ou outro setor. A questão é complexa e demanda um esforço de todos. Quanto mais pudermos apostar e investir
em formas alternativas de medidas sócio-educativas e
reservar a internação para aqueles casos mais graves,
maior a probabilidade de recuperação e reintegração
dos nossos jovens em conflito com a lei.
APMP: Voltando à questão da discriminação racial, a
que pode ser atribuído o reduzido número de juízes e
promotores negros no Estado de São Paulo?
HSJ: A um conjunto de fatores. Até os anos 50, a cidade de São Paulo ainda tinha instituições de ensino
fundamental com normas explícitas de impedimento
de ingresso de crianças negras. Então, há um ponto de
partida desigual. Ainda hoje o número de estudantes negros nos cursos de Direito nas universidades públicas é
absolutamente desproporcional e inferior ao número de
negros na população do nosso país. Depois, vencido o
problema do ingresso, tem a questão da permanência no
ensino superior, que envolve custos com livros, alimentação, deslocamento. Quanto maior o número de negros
nos cursos de excelência, maior será o número dos que
estarão em condições de enfrentar os processos seletivos do Poder Judiciário e do Ministério Público.
APMP: Mas há algum tipo de discriminação no seio
dessas Instituições?
HSJ: Sem me referir especificamente ao Ministério Público ou ao Judiciário, é preciso que as instituições jurídicas também façam um esforço para eliminar qualquer
tipo de barreiras informais que possam prejudicar esse
acesso. Mais do que isso, quem sabe essas instituições
possam pensar numa forma de impulsionar o ingresso
de negros tanto no MP, quanto no Judiciário. O Brasil e
a sociedade só ganhariam com isso.
APMP: E chegamos à questão das ações afirmativas...
HSJ: Algumas pessoas se perguntam sobre o porquê
dessas medidas de ação afirmativa, como se fosse
uma invenção norte-americana. O Brasil tem política
de cotas desde a década de 30, quando o governo
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Getúlio introduziu na CLT a chamada lei da nacionalização do trabalho, por meio da qual se estabeleceu
que dois terços dos trabalhadores de qualquer empresa em atividade no Brasil deveriam ser nacionais. Essa
norma vigora até hoje.
APMP: Poderia nos dar outros exemplos?
HSJ: Em 1968 o Brasil adotou a “Lei do Boi”, que não
está mais em vigor. Ela previa que, em qualquer curso
ligado à agronomia e agricultura, deveria ser reservada
uma cota para filhos de agricultores e produtores rurais. Então, dizer que a ação afirmativa é uma invenção
norte-americana é um desconhecimento da realidade
brasileira, inclusive da história do sistema jurídico brasileiro. Hoje há medidas desse tipo em relação às mulheres candidatas a cargos eletivos e aos portadores de
deficiências.
Segundo a ONU, 75% dos conflitos
armados em curso no mundo têm
alguma motivação de natureza
racial, cultural ou religiosa.
Muitas vezes você tem conflitos
meramente econômicos, nos
quais são inseridos componentes
de natureza cultural ou religiosa
como justificativa.
brasileiros continua insistindo em negar o óbvio. Por
isso, quanto mais falarmos sobre esse assunto, maior
será a conscientização. Feliz o país em que os jovens
querem estudar. Que bom que nossos jovens negros
querem estudar e não traficar. Ou isso não é bom para
o Brasil? É paradoxal que haja ainda tanta resistência. Qualquer pessoa que ingressa na universidade e
não “dá conta”, o próprio sistema vai se encarregar de
excluir. Mas vamos parar com essa história de que vestibular mede competência. Competência é disponibilidade para aprender e retornar para a sociedade o que
foi aprendido na Academia.
APMP: Com relação às políticas afirmativas, poderia falar sobre as mais comuns, ou
seja, o sistema de cotas e o da pontuação
acrescida?
HSJ: No sistema de cotas há a reserva de um
percentual de vagas para negros ou outro tipo
de minoria, como faz a Universidade Federal de
São Paulo. O sistema de pontuação acrescida
será adotado no próximo vestibular das FATECs
paulistas. Neste caso, o aluno procedente de
escola pública terá um acréscimo de 8% na
nota final obtida no exame vestibular. Se ele
vier da escola pública e for negro, o adicional
será de 10%. Com a pontuação acrescida, não existe a
reserva de números de vagas, mas impulsiona o ingresso
de alunos negros.
APMP: Em que outras áreas são importantes as
ações afirmativas?
HSJ: É possível uma ação afirmativa no campo processual,
com a inversão do ônus da prova em favor do discriminado
no caso das ações de natureza civil. Também a concessão
de incentivos públicos a empresas que adotem a política de
ação afirmativa. Por exemplo, reivindicamos que a Lei das
Abdias do Nascimento
Ativista do movimento negro, professor, artista plástico, escritor, poeta, dramaturgo, foi senador e Secretário
de Estado no Rio de Janeiro. Professor emérito da Universidade do Estado de Nova Iorque, professor visitante
na Universidade de Yale e no Departamento de Línguas e
Literatura da Universidade de Ifé, na Nigéria.
Fundou em 1944 o Teatro Experimental do Negro no
Rio de Janeiro. É autor de mais de uma dezena de publicações sobre racismo, peças teatrais e religiosidade de
matriz africana.
Ao discursar na posse do Secretário Hédio Silva Júnior,
o senador Abdias do Nascimento, aos seus 91 anos, pediu
licença e inspiração dos Orixás para orientar a sua fala.
Ressaltou a importância do momento histórico possibilitado pelo governador Geraldo Alckmin e os merecimentos
do novo Secretário.
APMP: Por que é tão difícil implementar ações afirmativas no Brasil?
HSJ: Eu não consigo identificar um único argumento
de natureza ética ou jurídica contra essas políticas. Um
freqüente é o seguinte: recrutamento para universidade, somente com base no mérito. Mas não há correspondência entre vestibular e sala de aula. Aliás, nunca
houve. Muitas instituições de ensino adotam a lista de
chamadas. Ora, quem entrou na quarta chamada não
poderia ter, dentro desse raciocínio, o mesmo desempenho de quem entrou na primeira chamada. Portanto,
não existe argumento consistente contra as políticas
de ação afirmativa.
APMP: Não haveria relação com a relutância da
sociedade de admitir claramente que existe racismo no Brasil?
HSJ: Com certeza. Uma parcela cada vez menor dos
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Contraponto
Licitações preveja que o empate entre mais de um concorrente não se resolva por meio de sorteio, mas em favor da
empresa que tenha o maior número de negros. Os instrumentos são muitos.
APMP: Mas a maioria das pessoas liga a ação afirmativa apenas ao sistema de cotas ...
HSJ: Por isso a pergunta é oportuna. Para lembrar que
cota é um dos instrumentos para a política de promoção de igualdade. Significa que o poder público deve
ter o papel ativo de promover a igualdade e não só o
papel passivo de não discriminar. Antes acreditávamos que se o poder público não discriminasse, todas
as pessoas iriam usufruir a igualdade. Hoje não. Hoje
dizemos que o Estado tem que promover. Daí a ação
ser afirmativa, positiva.
APMP: Que lições a sociedade brasileira tira da
recente condenação dos policiais militares que
assassinaram o dentista Flávio Santana em 3 de
fevereiro do ano passado?
HSJ: Na época eu era o presidente da comissão de
direitos humanos e fui acompanhar a família na entrevista com o governador Geraldo Alckmin. E como
interlocutor da OAB eu registrei o trabalho exemplar
da Corregedoria da Polícia Militar, que investigou e
prendeu os homicidas em poucas horas.
APMP: Como está a visão das polícias no que
tange à discriminação?
HSJ: Tão ou mais importante que o trabalho
repressivo é o preventivo. Treinar os policiais para
que não reproduzam nas ruas os preconceitos e
estereótipos aprendidos socialmente. Tenho orgulho de dizer que neste mês de novembro São Paulo terá um programa de vanguarda na área policial, com a inserção da disciplina “Tutela Penal da
Igualdade”. Ela dará ênfase à discriminação racial,
mas contemplará também outras modalidades de
discriminação, como a intolerância religiosa.
APMP: Isso ocorrerá tanto na Polícia Civil quanto
na Militar?
HSJ: Sim. Os policiais de todas as carreiras e patentes
terão 45 horas de reflexão sobre esse tema, que exige
que as instituições façam mais do que reconhecer a
existência do problema. O desafio é responder: o que
fazer para evitar que o profissional reproduza, na instituição, aquilo de ruim que ainda se aprende no Brasil?
APMP: Voltando ao dentista Flávio... se ele, além de negro,
fosse pobre, o episódio teria tomado o mesmo rumo?
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HSJ: Muitas vezes, mortes envolvendo jovens pobres
da periferia, negros ou não, acabam não ganhando
da mídia a mesma repercussão. É um paradoxo, como
se a vida tivesse gradação de valor. Acho que no caso
do Flávio houve a combinação de alguns fatores para
a indignação social. Um garoto de classe média baixa, cujo pai é policial militar aposentado e que não
aceitou a história apresentada. Nada vai compensar
a família da perda de uma vida, mas o caso do Flávio
foi realmente emblemático.
nossos são questionados. Gostaríamos do seu comentário a respeito.
HSJ: Esse diálogo com a sociedade apenas enriquece a
instituição. É o chamado do novo século, o chamado do
diálogo, da parceria, da interação. Tanto a sociedade tem
criatividade e conhecimento que enriquecem a formação
do profissional, quanto o MP, em sua forma de atuar e
defender a lei, tem também uma contribuição a dar para
o aprendizado das organizações da sociedade civil. Acho
uma iniciativa da maior importância e reflete bem a sin-
promotor na colheita de provas na fase pré-judicial?
HSJ: Entendo conveniente, para o bem da sociedade brasileira e do próprio MP, que a polícia continue,
como previsto na Constituição, sendo a condutora, a
coordenadora do procedimento investigatório. Dentro
dessas limitações estabelecidas pela Constituição, tudo
aquilo que o MP puder fazer para enriquecer o trabalho
da polícia e agregar valor ao processo, é bom para a
sociedade. São muitos os casos emblemáticos do MP
estadual e federal na luta contra a criminalidade.
tonia que a atual diretoria da APMP tem com o que há de
mais moderno no pensamento político dos nossos dias.
APMP: Por fim, qual personalidade negra lhe serviu
de exemplo?
HJS: Algumas pessoas tiveram importância. Posso citar
o presidente Nelson Mandela, o Dr. Martin Luther King
Jr., Agostinho Neto, importante liderança angolana na
luta pela independência dos países angolanos e africanos, e Samora Machel. No Brasil, certamente destacaria
Abdias do Nascimento. Ele foi e é para minha geração
uma figura ímpar, exemplo de determinação, entrega,
integridade pessoal e política. Mestre de todos nós. É
minha leitura de cabeceira, tenho quase toda a sua obra
e estou sempre bebendo da fonte.
Nos anos 70, a idade média
de um criminoso no Brasil
era de 27 anos. Hoje, está
perto dos 20 anos. O valor
médio do objeto de crime
era de cerca de 100 dólares,
sendo que hoje está por
volta de 10 dólares. São
elementos úteis para a
compreensão de uma das
raízes da criminalidade.
APMP: O MP de São Paulo tem sido um
bom defensor dos direitos das minorias?
HSJ: Não tenho dúvidas. Tenho visto o esforço do MP de diálogo com a sociedade,
com entidades de direitos humanos e com o
movimento negro, bem como o uso da ação
civil pública pelo MP para garantir programas sociais previstos em lei e que certas
esferas de governo não levam a sério na prática. Muitas
vezes o leigo confunde a figura do promotor de justiça
com o promotor de acusação. Promotor de Justiça, como
o próprio nome diz, tem o papel de garantir a aplicação
da lei. Por tudo isso, tenho muito orgulho da relação que
mantenho com o Procurador-Geral, Dr. Rodrigo, com o
Dr. Garreta e demais membros da instituição.
APMP: A APMP lançou recentemente a campanha
“O Ministério Público precisa de você!”, lembrando
a sociedade de que somos os defensores de seus direitos e pedindo apoio quando alguns instrumentos
APMP: Um dos questionamentos à nossa atuação
diz respeito à investigação na esfera penal. Poderia
também comentar o assunto?
HSJ: Não tenho dúvida da necessidade da participação ativa do MP na investigação, inclusive na fase do
inquérito policial, até pelo fato de caber ao MP o controle externo da atividade policial.
APMP: De que forma deve se dar a participação do
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Maxima Venia
1. Introdução
Contribuição de nossos associados para a Sociedade
A Revista APMP em Reflexão abre espaço para os seus associados divulgarem artigos
de interesse da comunidade e com isso aproximar nossa Instituição do destinatário
final de nossas ações: o cidadão. As condições para a publicação estão disponíveis na
página: www.apmp.com.br/apmpemreflexao/maximavenia. Colabore e escreva para:
[email protected], com sugestões de matérias ou artigos.
A
Os artigos da seção Maxima Venia são assinados, não refletindo necessariamente
a opinião do Conselho Editorial da Revista APMP em Reflexão
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circulação como interesse
difuso passível de tutela
pelo Ministério Público
Cláudia Maria Beré
Promotora de Justiça de Habitação e Urbanismo
Mestranda pela Faculdade de Arquitetura
e Urbanismo da USP
A circulação de pedestres e veículos é uma das funções
urbanas que vem, a cada ano, ganhando maior relevo,
seja pela magnitude da frota de veículos (4.900.000, somente na cidade de São Paulo), seja pelo número de acidentes de trânsito (17.218 acidentes com vítimas em São
Paulo, em 2002), seja pela importância dos deslocamentos na rotina das pessoas. Por tal motivo, o Ministério Público tem sido instado a atuar em questões relacionadas
à circulação. Essa atuação se justifica em função de ser a
circulação componente da ordem urbanística e deve visar
a garantia da livre circulação de pedestres e veículos e da
segurança do trânsito. Propõe-se, em razão da natureza
metaindividual do interesse ou direito à circulação, a atuação do Ministério Público, pela Promotoria de Justiça de
Habitação e Urbanismo, mediante a abertura de inquérito
civil e a propositura de ação civil pública.
O trânsito e o transporte têm se revelado como
grandes mazelas urbanas. Não importa se o deslocamento das pessoas é feito a pé, de bicicleta, motocicleta, automóvel, ônibus ou metrô: todos enfrentam
dificuldades, que vão de calçadas mal conservadas,
com buracos e obstáculos, vias esburacadas, congestionamentos e falta de segurança a transporte
coletivo de má-qualidade, lotado, caro.
O Anuário Estatístico de Acidentes de Trânsito,
divulgado pelo DENATRAN, revela que, no ano de
2002, somente na cidade de São Paulo - que, à épo-
ca, tinha uma população de 10.600.060 habitantes,
- ocorreram 17.218 acidentes de trânsito com vítimas, das quais 1.137 foram vítimas fatais e 24.599
não fatais.
A pesquisa denominada Impactos Sociais e Econômicos dos Acidentes de Trânsito nas Aglomerações Urbanas, realizada em maio de 2003, pelo
IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada,
menciona que os acidentes de trânsito trazem custos econômicos, além de dor, sofrimento e perda da
qualidade de vida para vítimas, familiares e sociedade. E, dentre os custos econômicos, podem ser
mencionados perda de produção, danos aos veículos,
despesas médico-hospitalares, processos judiciais,
congestionamento, custo previdenciário, resgate de
vítimas, remoção de veículos, danos ao mobiliário
urbano e propriedade de terceiros, danos à sinalização de trânsito, atendimento policial e de agentes
de trânsito.
Logo, é evidente a abrangência do interesse pela
circulação urbana, questão que, de um modo ou de
outro, afeta indistintamente todos os moradores da
cidade.
E o reflexo das questões relativas à circulação
sobre a qualidade de vida das pessoas tem feito com
que, muitas vezes, cheguem ao Ministério Público representações ligadas a esse assunto. Importa, pois, justificar a atuação ministerial quanto às
questões referentes à circulação.
A Constituição Federal de 1988, de modo inovador, consagrou um capítulo à política urbana. Esse
capítulo, composto pelos artigos 182 e 183, estabelece que a política de desenvolvimento urbano tem
por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das
funções sociais da cidade e garantir o bem-estar
de seus habitantes. Prevê, ainda, a edição de leis
municipais contendo o plano diretor e a edição de
lei federal que disponha sobre parcelamento ou edificação compulsórios, IPTU progressivo e desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida
pública. O capítulo se encerra com a previsão de
usucapião especial urbano e concessão de uso.
A lei federal prevista nas disposições constitucionais sobre política urbana somente foi aprovada em 2001. Trata-se da Lei Federal nº 10.257, de
10/07/2001, conhecida como Estatuto da Cidade,
que regulamenta os artigos 182 e 183 da Constituição Federal, estabelece diretrizes gerais da política
urbana e dá outras providências.
Ao arrolar as diretrizes gerais da política urbana, o Estatuto da Cidade, em seu artigo 2º, inciso I,
menciona a “garantia do direito a cidades susten-
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Maxima Venia
táveis, entendido como o direito à terra urbana, à
moradia, ao saneamento ambiental, à infra-estrutura urbana, ao transporte e aos serviços públicos,
ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras
gerações.”
Verifica-se, pois, que a circulação não é mencionada expressamente como integrante da cidade
sustentável. É certo que o dispositivo legal transcrito acima menciona o transporte, porém circulação
e transporte não são sinônimos. De acordo com o
Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, circulação
é a movimentação contínua de pessoas ou coisas,
fluxo, curso, marcha, deslocamento. Para o mesmo
dicionário, transporte é o ato ou efeito de transportar; transportação, veículo que serve para transpor.
Ora, tendo em vista que o Estatuto da Cidade
não faz expressa menção à circulação, embora esta
seja uma das funções primordiais da cidade, o presente trabalho se propõe a fundamentar a atuação
do Ministério Público nas questões relacionadas à
circulação e exemplificar casos em que essa atuação
é cabível.
2. Ordem urbanística
A Lei Federal nº 10.257/01, em seu art. 53, alterou o art. 1º, da Lei Federal nº 7.347/85, para expressamente incluir, entre os interesses protegidos
pela Lei da Ação Civil Pública, a ordem urbanística.
Importa, pois, discutir o conteúdo da expressão
“ordem urbanística”.
Antes mesmo da edição do Estatuto da Cidade,
a doutrina já se preocupava em definir o âmbito do
urbanismo e do Direito Urbanístico.
José Afonso da Silva entendia que “o urbanismo
Tão
importante
tornou-se o trânsito
para a vida nacional
que passou a ser instituído
um novo direito, ou seja, a
garantia a um trânsito seguro.
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é uma ciência, uma técnica e uma arte ao mesmo tempo, cujo objetivo é a organização do espaço
urbano, visando o bem-estar coletivo – através de
uma legislação, de um planejamento e da execução
de obras públicas que permitam o desempenho harmônico e progressivo das funções urbanas elementares: habitação, trabalho, recreação do corpo e do
espírito, circulação no espaço urbano”.
Com a entrada em vigor da Lei nº 10.257/01, a
doutrina passa a se preocupar com a explicitação
das expressões nela utilizadas, tais como “funções
sociais da cidade”, “cidades sustentáveis” e “ordem
urbanística”.
Ao comentar o artigo 2º do Estatuto da Cidade,
Odete Medauar sustenta que tal dispositivo “fixa
como objetivo da política urbana o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana. Nas funções sociais da cidade se entrevê a cidade como locus não somente geográfico
e de mera reunião de pessoas, mas como o espaço
destinado à habitação, ao trabalho, à circulação, ao
lazer, à integração entre os seres humanos, ao crescimento educacional e cultural”.
Lembrando a lição de José Afonso da Silva transcrita acima, José Carlos de Freitas observa que, desde
a edição da Carta de Atenas, em 1933, o urbanismo
caracteriza-se por quatro funções vitais: habitação,
trabalho, circulação no espaço urbano e recreação
do corpo e do espírito e em seguida acrescenta que
“ainda que se conteste a atualidade dessa premissa,
cumpre anotar que a Lei 10.257 incorporou expressamente as funções moradia, trabalho e lazer ao
definir o direito a cidades sustentáveis (art. 2º, I). A
circulação, função que se exerce nas vias públicas,
praças, parques, áreas verdes e de lazer (no meio
circulante), aparece nos dispositivos que tratam das
diretrizes da política urbana, quando essa lei faz
alusão a infra-estrutura, transporte, equipamentos
urbanos e comunitários (art. 2º, I, V, VI, “c” e “d”) e
aos elementos condicionantes do estudo de impacto
de vizinhança (art. 37, II e V).”
Para Carlos Ari Sundfeld, “ordem urbanística é
um conceito caro ao Estatuto da Cidade. Seu primeiro sentido é o de ordenamento: a ordem urbanística é o conjunto orgânico de imposições vinculantes (são as ‘normas de ordem pública’ a que
alude o art. 1º, parágrafo único) que condicionam
positiva e negativamente a ação individual na
cidade. O segundo sentido é o de estado: a
ordem urbanística é um estado de equilíbrio, que o conjunto de agentes envolvidos é
obrigado a buscar e preservar. Ao assentar
suas diretrizes gerais, o Estatuto expressa a convicção de que, nas cidades, o equilíbrio é possível
– e por isso necessário. Deve-se buscar o equilíbrio
das várias funções entre si (moradia, trabalho, lazer,
circulação etc)”.
Verifica-se, pois, que para todos os autores mencionados a circulação, bem como habitação, trabalho e recreação, integram a ordem urbanística.
3. Circulação e trânsito
Ao tratar da liberdade da pessoa física e da liberdade de locomoção, José Afonso da Silva destaca
que a Constituição Federal de 1988 reservou a ela
um dispositivo, o art. 5º, XV, que declara livre a locomoção no território nacional em tempo de paz,
podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele
entrar, permanecer ou dele sair com seus bens. Em
seguida, o festejado autor acrescenta que “direito
à circulação é manifestação característica da liberdade de locomoção: direito de ir, vir, ficar, parar,
estacionar. O direito de circular (ou liberdade de
circulação) consiste na faculdade de deslocar-se de
um ponto a outro através de uma via pública ou
afetada ao uso público”.
Segundo Toshio Mukai, “uma das funções básicas do urbanismo é permitir a circulação de pessoas
e semoventes em condições harmoniosas e adequadas, devendo a ordenação do território atender a tal
desiderato. Por essa razão, num estudo geral sobre
urbanismo, no Brasil, não podemos deixar de examinar a questão do tráfego, trânsito e sistema viário,
bem como a dos transportes urbanos, posto que as
legislações correspondentes, em aspectos pontuais,
influem no urbanismo”.
A circulação é um dos componentes do conceito
de trânsito estabelecido pelo art. 1º, § 1º, do Código de Trânsito Brasileiro: “considera-se trânsito a
utilização das vias por pessoas, veículos e animais,
isolados ou em grupos, conduzidos ou não, para fins
de circulação, parada, estacionamento e operação
de carga ou descarga”. Cumpre destacar que o § 2º,
do mesmo dispositivo legal, estabelece que “o trânsito, em condições seguras, é um direito de todos e
dever dos órgãos e entidades componentes do Sistema Nacional de Trânsito, a estes cabendo, no âmbito das respectivas competências, adotar as medidas
destinadas a assegurar esse direito”. Ademais, os órgãos e entidades componentes do Sistema Nacional
de Trânsito respondem, no âmbito das respectivas
competências, objetivamente, por danos causados
aos cidadãos em virtude de ação, omissão ou erro
na execução e manutenção de programas, projetos
e serviços que garantam o exercício do direito do
trânsito seguro, nos temos do § 3º, do dispositivo
legal já citado.
Para Arnaldo Rizzardo, “tão importante tornouse o trânsito para a vida nacional que passou a ser
instituído um novo direito, ou seja, a garantia a um
trânsito seguro. Dentre os direitos fundamentais,
como a própria vida, a cidadania, a soberania, a
saúde, a liberdade, a moradia e tantos outros, proclamados no art. 5º da Constituição Federal, está o
direito ao trânsito seguro, regular, organizado, planejado, não apenas no pertinente à defesa da vida e
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Maxima Venia
da incolumidade física, mas também relativamente
à regularidade do próprio trafegar, de modo a facilitar a condução dos veículos e a locomoção das
pessoas”.
Ora, tendo em vista que a circulação integra o
conceito de trânsito, e que o trânsito seguro é um
direito de todos, constitui a circulação um direito
difuso.
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4. A ordem urbanística e
a circulação como direitos
difusos tutelados pela
ação civil pública
Como visto acima, o bom desempenho das funções urbanas constitui um direito difuso. Vale
aqui citar as definições dadas pela Lei Federal nº
8.078/90, o Código de Defesa do Consumidor, em
seu art. 81, parágrafo único:
“A defesa coletiva será exercida quando se
tratar de:
I – interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste Código, os transindividuais,
de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias
de fato;
II – interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste Código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que seja titular
grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre
si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base;
III – interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem
comum.”.
E no artigo 82, o mesmo diploma legal
reza que:
“Para os fins do art. 81, parágrafo único, são
legitimados concorrentemente:
I – o Ministério Público (...);”.
Por fim, o art. 117 do já citado diploma alterou
o art. 21 da Lei da Ação Civil Pública, dando-lhe a
seguinte redação:
“Aplicam-se à defesa dos direitos e interesses difusos, coletivos e individuais, no que for cabível, os
dispositivos do Título III da lei que institui o Código
de Defesa do Consumidor”.
Ora, a ordem urbanística trata-se de direito de
natureza indivisível, de que são titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato
– todas as pessoas que habitem, trabalhem, circulem ou tenham sua recreação na cidade.
Logo, constitui a ordem urbanística um direito difuso.
Este o entendimento de Celso Antonio Pacheco
Fiorillo: “Os artigos 53 e 54 do Estatuto da Cidade
são os mais importantes dispositivos da lei que organiza o Meio Ambiente Artificial em nosso país na
medida em que demonstram a natureza jurídica dos
bens tutelados pela Lei 10.257/2001 como prepon-
derantemente de direito material constitucional
coletivo e, no plano dos subsistemas jurídicos que
se harmonizam com o comando constitucional,
de direitos materiais metaindividuais. Destarte, a tutela material e processual dos direitos
apontados no Estatuto da Cidade não se esgota em face dos direitos materiais individuais;
ao contrário, é na verificação dos direitos
difusos, coletivos e individuais homogêneos
que se estabelece a importante contribuição de um Estatuto Normativo do século XXI. A inclusão do meio ambiente
1. A
artificial como novo inciso vinculado
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ao caput do art. 1º da Lei 7.347/85,
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atinente ao direito de
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circulação, reconhelação
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ceu que houve violação a
interesses transindividuais, de natureza
indivisível, afetos à coletividade:
pelo
“AÇÃO CIVIL PÚBLICA – Decreto de procedên- E. Superior
cia parcial – Irresignação fundada na fragilidade do Tribunal de Justiça.
contexto probatório – Inocorrência – ManifestaSe tomarmos como exemplo a cição de protesto de entidade sindical, cujo irregular dade de São Paulo, podemos verificar que, segunexercício consubstanciou ato lesivo aos interesses do informação veiculada no site da Companhia de
difusos – “...não se presta a atividade social a que Engenharia de Tráfego - CET: “atualmente a cidade
se destina uma entidade de classe, em sobrepujar a de São Paulo, uma das quatro maiores metrópoles
norma fundamental de toda a sociedade civilizada do mundo, conta com aproximadamente 14.600
quanto ao dever de não prejudicar a outrem, mor- km de vias, uma frota de veículos cadastrados de
mente quando ao exercitar-se um direito subjetivo, 4.900.000 e uma população de 10 milhões de hasua exorbitância atinge danosamente os interesses bitantes”. Ora, tais dados demonstram nitidamente
transindividuais, de natureza indivisível, afetos à que a circulação é uma questão urbana de grande
coletividade” – Pedido alternativo de minoração da relevância para pessoas indeterminadas: habitancondenação – Admissibilidade – Valor abstrato que, tes da cidade, usuários de automóveis, usuários das
sem embargo da preservação dos bens jurídicos le- vias públicas, aí compreendidos pedestres, ciclistas
sados, traduz importância exacerbada que compor- e usuários de transportes coletivos como ônibus, lota minoração – Recurso parcialmente provido para tações e táxis.
esse fim. (Apelação Cível nº 89.785-4/7, relator
E sendo a ordem urbanística interesse difuso,
Des. Leite Cintra)”
inequívoca a legitimidade do Ministério Público
É de se ressaltar que a decisão supra foi confirmada para ajuizar ação civil pública em sua defesa.
Propo
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(apro
vadas ições
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Maxima Venia
5. Atuação do Ministério
Público na defesa do direito de
circulação
Assim, na defesa da ordem urbanística e para
tutelar o direito de circulação, o Ministério Público
poderá atuar em inúmeros assuntos. Na Promotoria
de Justiça de Habitação e Urbanismo da Capital, já
foram instauradas investigações versando sobre os
seguintes temas relativos à circulação:
22
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• comércio ambulante: a instalação indiscriminada de ambulantes, os denominados “camelôs”,
sobre calçadas, calçadões e mesmo sobre o leito carroçável das ruas prejudica a circulação de pedestres
e de veículos, função primordial daqueles espaços
públicos, razão pela qual é necessária a ordenação
daquela atividade. Na cidade de São Paulo, existe lei municipal regulamentando a matéria e, para
o exercício da atividade pelo ambulante, ele deve
possuir um Termo de Permissão de Uso. Já houve
ação civil pública sobre o tema;
• autorização de utilização de via pública: a
realização de obras e eventos que possam perturbar
ou interromper o trânsito de veículos e pedestres
depende de autorização do órgão de trânsito, nos
termos do art. 95 do Código de Trânsito Brasileiro.
Como tais eventos muitas vezes não são precedidos
de autorização ou, por vezes, ainda que autorizados causam prejuízo à circulação, o Ministério Público tem recebido representações contra “shows”,
“trios-elétricos” e outros eventos, como a “Marcha
Para Jesus”, sendo necessário conciliar o interesse
dos participantes dos eventos com a necessidade de
circulação da população;
• bolsão residencial, fechamento de rua,
fechamento de calçada – o grave problema de
segurança pública que assola o país tem levado a
população a reivindicar o fechamento de vias para
controle da circulação de pessoas. Tais fechamentos,
contudo, prejudicam o direito de circulação dos não
moradores e, não raro, vigias e porteiros de espaços públicos cujo fechamento tenha sido autorizado
acabam por exigir identificação de cidadãos para
circular por um espaço que é público. Isso quando
não impedem totalmente essa circulação. O fechamento deve ser autorizado com base em lei municipal, a qual não pode, contudo, violar dispositivos
constitucionais. É necessário também conter prejuízos à circulação. Já foram ajuizadas ações civis
públicas sobre o tema;
• manifestação / passeata / paralisação do
trânsito em razão de greve: o direito constitucional de reunião e manifestação está previsto no art.
5º, XVI, da Constituição Federal, que, no entanto,
exige o prévio aviso à autoridade competente. Várias manifestações têm ocorrido sem tal aviso, em
dias úteis, causando graves transtornos à circulação
de veículos, razão pela qual foram ajuizadas ações
civis públicas visando à reparação de danos, bem
como as entidades que promovem tais manifestações vêm sendo instadas a proceder à comunicação
prévia para que haja divulgação da data e horário
do evento, possibilitando o estabelecimento de medidas que possam mitigar o impacto ao trânsito;
• pedágios: a Promotoria de Justiça de Habitação e
Urbanismo já instaurou investigações versando sobre a
possível implantação de pedágio urbano em São Paulo,
que acabou não ocorrendo, bem como sobre pedágios
existentes em rodovias, mas dentro de área urbana;
• lombadas: o art. 94, parágrafo único, do Código de Trânsito Brasileiro, proíbe a utilização de
ondulações transversais e de sonorizadores como
redutores de velocidade, salvo em casos especiais
definidos pelo órgão ou entidade competente, nos
padrões e critérios estabelecidos em Resolução do
CONTRAN. É notória a existência, em diversos locais, de lombadas fora de padrão antigas ou, mesmo,
clandestinas, razão pela qual o Ministério Público
tem procurado exigir dos municípios a adequação
das lombadas aos padrões oficiais. Já houve ação
civil pública sobre o tema;
• sinalização de trânsito: a Promotoria de Justiça de Habitação e Urbanismo já apurou a colocação de sinalização horizontal de trânsito, como
prismas, picolés, vasos e floreiras, visando verificar
sua adequação às disposições do Código de Trânsito
Brasileiro;
• mudança do sentido de fluxo: reclamações
contra a mudança do sentido de fluxo têm sido dirigidas ao Ministério Público, por vezes acompanhadas de alegações de favorecimento a determinados
moradores do local atingido. As autoridades responsáveis pela alteração têm sido instadas a apresentar
as justificativas técnicas para a modificação;
• atropelamentos: a Promotoria de Justiça de
Habitação e Urbanismo da Capital instaurou inquérito civil para apurar os locais com maior número
de atropelamentos e as medidas adotadas para evitá-los. Há também reclamações acerca de atropelamentos ligados a obras em calçadas, obrigando pedestres a andar pela rua, bem como atropelamentos
nos recém-implantados corredores de ônibus;
• passarelas: sobre este assunto, há casos relacionados à má-conservação de passarelas ou a sua
implantação para evitar atropelamentos em locais
perigosos. Embora o Ministério Público não possa
exigir a realização de obras que estejam no poder
discricionário do Administrador, poderá exigir
a adoção de medidas que favoreçam a segurança dos pedestres;
• tráfego de caminhões: são
freqüentes as reclamações contra o
tráfego de veículos pesados em vias
inadequadas a tal fim, devendo a au-
toridade de trânsito se manifestar sobre a viabilidade ou não de tal tráfego, bem como sinalizar a via e
fiscalizar o cumprimento de suas determinações;
• tráfego de ciclistas: chegou à Promotoria reclamação contra o tráfego de grupos de ciclistas
pelo campus da USP, intimidando motoristas e provocando danos em veículos;
• painéis televisivos: foi instaurada investigação para apurar riscos de acidentes com veículos
em função da distração que os painéis televisivos
podem provocar no motorista, tendo sido ajuizada
ação civil pública;
• fiscalização de trânsito: há inquérito civil
em andamento acerca da fiscalização de trânsito no
campus da USP;
• calçadas, pavimentação e buracos nas vias
públicas: várias são as representações versando sobre má conservação de calçadas e vias ou inexistência de pavimentação, incumbindo ao Ministério Público zelar pela segurança de pedestres e motoristas,
sem esquecer a discricionariedade na realização de
determinadas obras;
• ponto irregular de táxi: moradores denunciam a existência de pontos de táxi irregulares, prejudicando a possibilidade de estacionamento na via.
A autoridade competente deve ser instada a regularizar ou coibir o uso.
A análise dos casos mencionados acima demonstra a amplitude de assuntos que podem ser objeto
de investigação quanto ao tema circulação, sendo
possível verificar que a atuação do Ministério Público visa a assegurar:
a) a livre circulação de pedestres e veículos;
b) a segurança do trânsito.
A ordem
urbanística tratase de direito de
natureza indivisível, de
que são titulares pessoas
indeterminadas e ligadas por
circunstâncias de fato – todas as
pessoas que habitem, trabalhem,
circulem ou tenham sua recreação
na cidade.
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23
MP em Foco
X
Futuro do MP
Arrumando a casa
Uma queixa recorrente de promotores e procuradores de justiça é a de que, em sua Promotoria ou Procuradoria, alguns integrantes trabalham
mais do que outros. Isso não quer dizer que aqueles trabalhem melhor do que estes. Não se trata de
análise da qualidade do serviço.
Os reclamos dizem respeito à quantidade, ou
seja, alguns têm mais processos ou atribuições do
que outros.
De fato, em diversas Promotorias há desequilíbrio na distribuição de serviço, que com o passar
do tempo vem se aprofundando, em decorrência
de diversos fatores, alguns de longa data.
Depois da Lei da Ação Civil Pública (1985) e da
promulgação da Constituição de 1988, a defesa
dos interesses difusos e coletivos ganhou grande
MP do Futuro
Discussão sobre fatos que repercutirão nos rumos de nossa Instituição.
Depois da Lei da Ação
Civil Pública (1985) e da
promulgação da Constituição
de 1988, a defesa dos interesses
difusos e coletivos ganhou
grande destaque dentro da
Instituição. Isso, porém, não
repercutiu imediatamente e
vários anos decorreram até que
viesse o natural aumento do
número de inquéritos civis e
ações civis públicas.
destaque dentro da Instituição. Isso, porém, não
repercutiu imediatamente e vários anos decorreram até que viesse o natural aumento do número
de inquéritos civis e ações civis públicas.
Como conseqüência, promotores com atribuição na área da cidadania, meio ambiente, consumidor, habitação e urbanismo etc. viram paulatinamente a multiplicação de seus afazeres chegar,
em determinados casos, a níveis insuportáveis.
Por outro lado, com a chegada, embora tar-
26
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dia, da racionalização do exercício funcional no
chamado “cível tradicional”, os que oficiam nessa área experimentaram um sensível desafogo
no volume de feitos.
Também contribuíram para o mencionado desequilíbrio alguns fatores eventuais, como medidas administrativas dos Poderes Executivo e Judiciário, além de alterações legislativas como a Lei
nº. 9.099/95 e o Estatuto do Desarmamento.
O resultado dessas distorções é a natural perda
de eficiência da Instituição.
Há alternativas para solucionar o problema.
Uma delas está na equação criação/desnomenclaturação de cargos. Mas esse é o tema de nossa
próxima conversa.
A opção que vem sendo utilizada mais amiúde
é a de dividir aritmeticamente o número de feitos,
mediante a distribuição por “finais” de processos.
Já falamos sobre esse caminho na edição nº. 7
(págs. 18/19), mas não custa repetir a advertência
ali lançada: “A simplicidade da solução esconde
um fato preocupante: esse modelo impede que o
promotor seja, na prática, um agente político”.
Pesados os prós e contras, não há outra conclusão possível: a questão somente será equacionada
com a redistribuição equânime do serviço.
Entretanto, essa solução, inegavelmente a melhor, acarreta dois outros problemas, ainda mais
difíceis de resolver: como mensurar o desequilíbrio
e o desejado equilíbrio? Como viabilizar politicamente a redistribuição?
Onde encontrar as respostas? No novo modelo
de gestão. Veja como nas próximas páginas.
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27
MP em Foco
Equilíbrio
e justiça.
Para todos
Quando constatamos
que, às vezes, as tentativas de
redistribuição de atribuições enfrentam resistências no seio de cada Promotoria,
somos logo levados a crer que isso decorre de puro
individualismo dos que supostamente são beneficiados pela divisão desigual de serviço.
Claro que, por estarmos em uma Instituição
composta de seres humanos, posturas como essas
sempre existirão. Mas nem de longe constituem a
regra.
Na maior parte das vezes, a resistência em discutir a questão revela, ao mesmo tempo, instinto
de autodefesa e receio de aceitar uma medida tópica sem conhecer qual o projeto mais amplo na
qual ela deveria se incluir.
Quando um promotor ou procurador tem dificuldade em entender uma mudança que o afetará
diretamente, assim age porque, antes, quer saber a
que levará essa dose de sacrifício e se todos serão
chamados a contribuir com o mesmo quinhão em
prol do Ministério Público.
Enquanto a Administração Superior não detalhar claramente qual o rumo dado à Instituição,
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qual conformação terá o MP ao final dessa trajetória e quais critérios objetivos serão empregados
para que não haja favorecimentos indevidos, a resistência prosseguirá.
O novo modelo de gestão
mostrando o caminho
Apesar de reiteradamente repetirmos que o
novo modelo de gestão não se confunde com o
banco de dados institucional que lhe dá suporte,
alguns ainda fazem essa confusão simplificadora.
Nessa discussão sobre a redivisão de
atribuições é possível reforçar
a idéia da amplitude da
proposta.
Com efeito, no tra-
balho desenvolvido
pelo Departamento de
Estudos Institucionais da
APMP ficou consignado que os objetivos buscados com a implantação de um novo
modelo de gestão seriam:
a) No plano funcional:
a.1) obter expressivo resultado social;
a.2) assegurar a condição de agente
político do promotor.
b) No plano administrativo:
b.1) controle sobre a estrutura orgânica;
b.2) controle orçamentário;
b.3) racionalidade e eficiência.
(in “Um novo modelo de gestão
para o Ministério Público”, Edições
APMP 2003, págs. 35/36)
Para a consecução desses objetivos, um amplo
projeto tem que ser desenvolvido (com o amparo
do banco de dados e de órgãos de planejamento e
análise), indicando as medidas de curto, médio e
longo prazo a serem adotadas e, sobretudo, qual a
conformação final do Ministério Público ao término do projeto (estrutura organizacional, número
de membros e correspondentes atribuições, número de servidores e respectivas funções, número de
Um amplo projeto tem que
ser desenvolvido, indicando
as medidas de curto, médio e
longo prazo a serem adotadas e,
sobretudo, qual a conformação
final do Ministério Público ao
término do projeto
estagiários e tempo de duração do estágio, orçamento necessário para a manutenção dessa estrutura, plano contínuo de investimentos, orçamento
necessário para que o plano de investimentos não
seja interrompido etc.).
Atualmente os promotores e procuradores de justiça não sabem para onde se dirige
e como será o MP de São Paulo nas próximas
décadas. Por isso, não se sentem confortáveis para
aceitar alterações pontuais. Compreensíveis duas
perguntas que a Classe se faz: “Devo aceitar o sacrifício a troco de quê?” e “De todos será cobrada
a mesma dose?”.
As mudanças têm ocorrido ao sabor de acontecimentos fortuitos. A criação de mais uma Vara
Judicial na Comarca (até quando continuaremos a
reboque da falta de planejamento do Poder Judiciário?), a promoção ou remoção de algum integrante da Promotoria (a permitir a desnomenclaturação do cargo vago), a chegada à Promotoria de
um novo integrante disposto a aceitar, por gosto
Medidas tópicas e sem
amarração a um projeto amplo
trazem uma sensação de
insegurança que convida ao
comportamento conservador.
Noutras palavras, estimulam a
resistência às mudanças.
pessoal, as atribuições mais “problemáticas”, dentre outros eventos.
Medidas tópicas e sem amarração a um projeto
amplo, porém, trazem uma sensação de insegurança que convida ao comportamento conservador. Noutras palavras, estimulam a resistência às
mudanças.
Ao contrário, um programa de longo prazo democraticamente debatido e implantado permite
ao atingido por uma proposta de redistribuição de
atribuições compreender a razão da medida. E lhe
dá a tranqüilizadora convicção de que todos serão
chamados a
pagar a conta para
desfrutar de um Ministério Público melhor.
Mensurando o equilíbrio
Além de provar que mudanças são necessárias
para melhorar a atuação do Ministério Público, à
Administração Superior cabe demonstrar que as
propostas de redistribuição de atribuições trarão
efetivo equilíbrio entre os integrantes de uma
mesma Promotoria.
Chama a atenção o fato de que o empirismo
domina as comparações que um promotor ou procurador faz entre o seu volume de serviço e o de
outros colegas.
Hoje, sem o banco de dados institucional, tão
reclamado nesta seção, impossível medir objetivamente o trabalho de cada um. Até porque não se
pode dissociar essa medição do resultado do trabalho. Um promotor ou procurador pode trabalhar
à exaustão, sem que isso necessariamente leve ao
cumprimento das metas estabelecidas pela Instituição (metas que, aliás, atualmente não existem).
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29
MP em Foco
Por outro lado, um membro do MP que trabalhe menos horas diárias pode conseguir resultados
muito mais expressivos, dentro da mesma ótica.
Mas, enquanto persistir semelhante ausência de informações no MP de São Paulo, jamais
chegaremos a uma ou outra conclusão. E todos
continuarão acreditando piamente que trabalham
mais do que os outros, da mesma forma que a Instituição continuará derrapando na sua missão de
alavancar a evolução social.
À Administração Superior cabe
demonstrar que as propostas
de redistribuição de atribuições
trarão efetivo equilíbrio entre
os integrantes de uma mesma
Promotoria.
Sementes da APMP
frutificam pelo Brasil
Programa do XVI Congresso
Nacional traz temas do novo
modelo de gestão
Cenas do próximo capítulo
CRITÉRIOS OBJETIVOS
PARA A CRIAÇÃO E DESNOMENCLATURAÇÃO DE
CARGOS
- MELHORIA NO ORÇAMENTO DO MP
- INTER-RELACIONAMENTO COM A SOCIEDADE
- INCLUSÃO DO MP NO CENTRO DO DEBATE
DAS GRANDES QUESTÕES INSTITUCIONAIS
- ESTABELECIMENTO DE PRIORIDADES E METAS
- TRANSFORMAÇÃO DO PROMOTOR EM AGENTE POLÍTICO
- AFERIÇÃO OBJETIVA DO MERECIMENTO
- DESPOLITIZAÇÃO DAS DECISÕES ADMINISTRATIVAS E GERENCIAIS
- AVALIAÇÕES CORRECIONAIS MAIS JUSTAS
- REDISTRIBUIÇÃO EQUÂNIME DO SERVIÇO
- MODERNIZAÇÃO DA ESTRUTURA DE APOIO
SAIBA POR QUE...
... criar e extinguir cargos gera
tanta polêmica!
SAIBA COMO...
... encontrar um sistema que
evite injustiças!
Em meados de 2003, o Departamento de Estudos
Institucionais da APMP finalizou o trabalho “Um novo
modelo de gestão para o Ministério Público (bases de
uma necessária reengenharia institucional)”.
Em outubro do mesmo ano, a convite da CONAMP, o trabalho foi apresentado pelos procuradores Antonio Augusto Mello de Camargo Ferraz
e Renato Nascimento Fabbrini e pelos promotores
Eduardo Roberto Alcântara Del Campo e Paulo
Roberto Dias Júnior em painel do XV Congresso
Nacional do Ministério Público, realizado em Gramado, Rio Grande do Sul.
O temário daquele Congresso, no item “Política
Institucional e Administrativa”, previa apenas duas
sub-classificações relacionadas ao tema, a saber:
* Os Órgãos da Administração Superior e de
gestão administrativa do Ministério Público.
Propostas para os órgãos de planejamento, levantamento, análise e banco de dados.
... e saiba muito mais
nesta seção da APMP em
Reflexão.
A APMP agradece a colaboração de todos os associados com críticas e sugestões.
Aproveite, também, para sanar eventuais dúvidas sobre o novo modelo de gestão:
[email protected]
30
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ATENÇÃO!
* O controle de qualidade dos trabalhos dos agentes ministeriais. Eficiência do Ministério Público.
Dois anos depois, é alentador constatar que
um dos três sub-temas do XVI Congresso Nacional (Belo Horizonte-MG, de 6 a 9 de novembro de
2005) foi o “Ministério Público rumo à excelência
institucional-administrativa”, com ênfase a diversos conceitos cujas linhas gerais foram traçadas
no trabalho pioneiro da APMP.
* a eficiência, o controle e os indicadores de
qualidade dos agentes ministeriais e do Ministério Público
* a gestão do conhecimento, os sistemas de
informação e a tecnologia de informação no
Ministério Público
* Administração Superior: modelos de escolha,
exclusividade no exercício das funções e eficiência
* novos modelos de gestão do Ministério Público
como meios de eficiência, crescimento e aperfeiçoamento da Instituição – possibilidades da ISO9001, do planejamento e administração estratégicos, da gestão pela qualidade total, de métodos de
elaboração de projetos (PMBOK, RUP) etc.
São os promotores e procuradores de justiça de
São Paulo, por meio de sua APMP, retomando a
vanguarda no cenário nacional.
Até o fechamento desta edição, ainda não havia sido instalada a comissão de estudos para implantar o banco de dados institucional do MP.
Isso depois de mais de 100 dias da edição do Ato Normativo nº. 402-PGJ/
CPJ/CSMP/CGMP, de 27 de julho de 2005.
Importante ressaltar que, poucos dias após a edição desse ato, a APMP
indicou seus dois representantes na comissão.
Ao que parece que não era mesmo para valer. E mais uma oportunidade será perdida.
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MP em Foco
MP comemora
20 anos da Lei da
Ação Civil Pública
“Há 20 anos foi criada a Lei da Ação
Civil Pública, que deu ao Ministério Público o suporte
necessário para passar de autor em processos individuais a autor de ações
públicas em defesa do direito coletivo, investigando através de inquéritos civis, mediando acordos
ou defendendo interesses coletivos nas ações civis públicas. Desde então o Ministério Público de
São Paulo atua como guardião desses direitos, promovendo a cidadania e defendendo a coletividade
sempre que um ato individual, privado ou público, atente contra estes direitos. Aqui você encontra
algumas histórias dessa atuação. Mas elas são incontáveis. E, com a sua participação, irão se
multiplicar muito mais. Porque, onde tem Ministério Público, não tem mistério.”.
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Com o feliz título “Histórias Extraordinárias”,
abre-se a campanha publicitária deflagrada pela
Procuradoria-Geral de Justiça de São Paulo para,
além da comemoração do vigésimo aniversário da
Lei nº. 7.347/85, divulgar para a população alguns
resultados práticos da atuação de promotores de
justiça em todo o Estado com base
no diploma legal
que, não é
exagero dizer,
transformou o Ministério
Público em advogado do interesse social.
Em cerimônia realizada no dia 18 de
outubro, no auditório Queiroz Filho do edifício
sede do Ministério Público de São Paulo, a campanha foi lançada com a exibição do material de
comunicação escrito e as peças radiofônicas, televisivas e de mídia eletrônica.
Chamou a atenção o caráter lúdico das peças,
bem apropriado para atingir a população e baseado em ilustrações e charges dos consagrados artistas Attílio, Angeli, Baptistão, Daniel Caballero,
Caco Galhardo, Clarissa Tossin, Elisa Sassi, Guto
Lacaz, Jean Claude, Jean Galvão, Laura Beatriz, Líbero, Orlando, Paulo Caruso e Spacca. Os trabalhos
foram preparados especialmente para a campanha
e cedidos graciosamente ao Ministério Público de
São Paulo, assim como o trabalho da agência Futura, DCR Comunicação.
O evento foi prestigiado por diversas autoridades, destacando-se o Vice-Governador Cláudio
Lembo e o Presidente da APAMAGIS Celso Limongi.
No âmbito interno, nossa equipe registrou a presença do Corregedor-Geral do Ministério Público
Paulo Hideo Shimizu, do Presidente da APMP João
Antonio Garreta Prats e, claro, do nosso Procurador-Geral Rodrigo César Rebello Pinho, que presidiu a solenidade.
Na platéia estavam Attílio, Daniel Caballero,
Elisa Sassi, Líbero e Spacca. Ao lado dos demais
artistas nomeados, eles ilustraram textos que contaram o desenrolar de treze casos de atuação do
Ministério Público na área de interesses difusos e
coletivos que, ao longo desses vinte anos, beneficiaram o povo paulista.
A campanha repercutiu favoravelmente na
imprensa, sendo objeto de editorial na edição de
23/10/05 do jornal “O Estado de São Paulo” e de
menção na “Veja São Paulo”, edição de 30/10/05.
A Revista APMP em Reflexão cumprimenta a
Procuradoria-Geral de Justiça e os idealizadores
da tese de Grupo de Estudos que originou a Lei da
Ação Civil Pública.
“Preparado por um grupo de magistrados, promotores e procuradores estaduais paulistas (...), o primeiro projeto da ação civil pública foi apresentado em 1984 pelo então deputado - e hoje ministro - Flávio Bierrenbach. Logo
após, o Ministério Público de São Paulo elaborou um projeto complementar, incorporando ao primeiro a tutela dos
consumidores, a figura jurídica do inquérito civil e a autorização para entidades da sociedade civil impetrarem essa
ação. E, com uma rapidez surpreendente, o Congresso aprovou os projetos após um ano de tramitação.” (trecho
do editorial de “O Estado de São Paulo” a respeito da Lei da Ação Civil Pública e da campanha da PGJ)
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G
MP em Foco
rupos de Estudos
Aprovada a tese
sobre a participação
do MP na política
de segurança pública
A chuva veio forte, mas não esfriou os ânimos
dos participantes da primeira etapa do XXXIII Seminário Jurídico dos Grupos de Estudos de São
Paulo, realizada entre os dias 28 e 30 de outubro
no Hotel de Lazer & Spa Thermas de Ibirá.
Nos trabalhos de abertura, procedeu-se à escolha do Coordenador Geral dos Grupos de Estudos para o ano de 2006. Eleito por aclamação, o
procurador de justiça aposentado Darcy Paulillo
Os debates
A confraternização
Na sessão plenária do sábado, a mesa foi
composta pelo Coordenador Geral Albino Ferragini, por seu Adjunto Antônio Domingues Farto
Neto, pelo Presidente da APMP João Antonio
Garreta Prats, pelo Corregedor-Geral Paulo Hideo Shimizu e pelo Procurador-Geral Rodrigo
César Rebello Pinho, nomeado Presidente de
Honra do evento.
Foram debatidas as conclusões extraídas das
dezenove reuniões regionais de Grupos de Estudos
sobre o tema central “A participação do Ministério
Público na elaboração de uma política de segurança pública”.
Das 50 conclusões sistematizadas por comissão
designada para esse fim, 12 foram objeto de pedidos de destaque para votação separada.
Como é marca registrada dos eventos promovidos
pela APMP, o clima amigável foi a tônica no encontro.
Nos intervalos das sessões de trabalho e no tempo livre, os associados e seus familiares aproveitaram
as opções de lazer oferecidas pelo hotel, bem como
sentiram o espírito de uma típica cidade do interior,
como é Termas de Ibirá.
O fato de o hotel ter sido “fechado” pela APMP
e não comportar um número exagerado de hóspedes contribuiu para a união e o congraçamento de
todos. Quer nos bate-papos informais no balneário exclusivo do estabelecimento, quer durante o
happy hour diário, quer, finalmente, após os jantares, quando alguns colegas “semi-profissionais” na
arte do canto iam madrugada adentro dando um
show de sustenidos e bemóis.
dos Passos sucederá o promotor de justiça Albino
Ferragini, que passa para a função de Coordenador Adjunto, ao lado do promotor de justiça Carlos
Melluso Júnior. Todos tomarão posse na segunda
etapa do seminário, em dezembro.
Aproveitou-se a presença de vários Coordenadores regionais para um balanço do novo formato dos
Grupos de Estudos adotado em 2005. Ao final das
manifestações, a certeza de que o saldo foi positivo.
Após produtivas discussões e a votação dos
destaques supressivos e modificativos, 44 conclusões vieram a compor a redação final da tese, que
será divulgada não somente no âmbito externo,
mas também para as autoridades e organismos
responsáveis, direta ou indiretamente, pela segurança pública.
Convém ressaltar a legitimidade da tese aprovada, discutida ao longo de seis meses por 619
(seiscentos e dezenove) membros do MP de São
Paulo, da ativa e aposentados, que estiveram nas
reuniões regionais e na plenária.
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E Comandatuba
vem aí...
Encerrado o encontro, aos participantes e
àqueles que não puderam vir resta aguardar
a segunda etapa do XXXIII Seminário
Jurídico, de 7 a 11 de dezembro no Hotel
Transamérica – Ilha de Comandatuba.
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35
MP em Foco
Grupos de Estudos:
nos passos de um
democrata
Um exemplo
de dedicação
ao Ministério
Público
Imagine-se já com tempo
suficiente para a
aposentadoria. O que você
faria? Passaria para a
inatividade e curtiria a fam
ília e o justo descanso depois de uma vida de
dicada à Instituição?
Ou, além de continuar tra
balhando, assumiria o
encargo extra de viajar mi
lhares de quilômetros
por ano para fomentar o
debate institucional?
Não sabemos quanto a você,
leitor, mas o promotor de justiça Albino Ferrag
ini, da longínqua Araçatuba, fez a segunda opçã
o. E por quatro vezes!
Ao deixar a função de Coord
enador Geral dos
Grupos de Estudos, Albino
passa para a história
como aquele que conduziu
com tanta competência
o processo de introdução de
um novo formato para
os trabalhos desenvolvidos
ao longo deste ano.
Apesar de envolvido em grave
problema de saúde
em sua família, Albino fez qu
estão de comparecer ao
XXXIII Seminário Jurídico, mo
strando o quanto ama
a Instituição que o acolhe há
mais de 25 anos.
36
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vitalidade de um proAos 75 anos, mas com a
o, Darcy Paulillo dos Pasmotor de justiça substitut
ão Geral dos Grupos de
sos assumirá a Coordenaç
primeiramente, consoliEstudos com três desafios:
to adotado neste ano (se
dar em 2006 o novo forma
Executiva); em segundo
assim decidir a Comissão
ior de jovens promotolugar, atrair um número ma
es regionais e; por fim,
res e promotoras às reuniõ
s para a sociedade.
abrir os Grupos de Estudo
sto pelo próprio CoO terceiro desafio foi impo
a passagem pelo MP de
ordenador Geral, já que su
regime militar) foi caracSão Paulo (abreviada pelo
com os setores sociais
terizada pela aproximação
classe trabalhadora.
organizados, sobretudo da
de justiça aposenDesejamos ao procurador
l e professor de História
tado, ex-deputado federa
Paulillo dos Passos uma
Econômica do Brasil Darcy
ral dos Grupos de Estugestão na Coordenação Ge
pria história de vida.
dos tão rica quanto sua pró
Emocionou a todos o dis
curso de despedida do
Coordenador Geral. Nada
mais justos, portanto, os
elogios dirigidos ao coleg
a Albino pelo Procurador-Geral, pelo Corregedo
r-Geral e pelo Presidente da APMP, que fizeram
uso da palavra no encerramento dos trabalhos.
Elogios, porém, que serão
sempre insuficientes, se comparados à dedic
ação demonstrada pelo
querido Albino durante to
da a sua carreira.
Por isso, Albino Ferragini, ac
eite as sinceras homenagens da Revista APMP em
Reflexão e, acreditamos,
de todos os seus colegas de
Ministério Público. Continuamos a contar com sua
valorosa contribuição.
Algumas das conclusões
aprovadas
1. A violência se instaura
pela incapacidade do Estado
Brasileiro de:
a) administrar Justiça;
cial;
b) estruturar devidamente o aparelho poli
esa
c) promover o desenvolvimento e a def
o de
dos fundamentos do Estado Democrátic
ição
ribu
dist
à
s
Direito, em especial os relativo
e a uma
de renda, ao acesso universal à cultura
ial.
educação de qualidade e à inclusão soc
4. O Promotor d
incumbido da dee Justiça, agente
fundamentais, tefesa dos direitos
interferir, cobrar m o papel de
na implementaç e sugerir medidas
públicas sobre dirão de políticas
visando ao comb eitos sociais,
primárias da crimate das causas
negativas para a inalidade e
segurança públic
a.
6. A participação do MP na
elaboração de política de
segurança pública depende:
a) da efetiva adoção do modelo
constitucional do Promotor como agente
político, modificador da realidade social;
b) da definição de metas prioritárias,
objetivas e globais de atuação, inclusive de
médio e longo prazo;
c) de sua interação com os organismos
sociais e de governo;
d) do gerenciamento de seus recursos
humanos.
12. É imprescindível a adoção de
um novo modelo de gestão para
o Ministério Público, baseado
em banco de dados, visando à
convergência lógica e racional na
alocação dos recursos humanos,
orçamentários e logísticos da
Instituição, para o efetivo exercício
da função de agente político.
plano
17. Na área criminal, o ve
de atuação funcional de ncretas
indicar as prioridades co o
e exeqüíveis do Ministério
Público para determinad has
período, bem como as lin
comuns de atuação das ção dos
Promotorias, com avalia
resultados alcançados.
39. Os órgãos da
Administração Superior
devem valorizar as
Promotorias e os
Promotores de Justiça com
atuação direcionada à
comunidade.
Veja a íntegra da tese aprovada em
www.apmp.com.br/institucional/grpestudos.htm
www.apmp.com.br
37
APMP Destinos
Flórida
(também)
para adultos
Imagine-se num lugar cercado por um mar azul, com muito sol, onde você pode mergulhar e
ver carcaças de navios piratas, correr de kart e visitar o interior de naves espaciais. Ao contrário dos
reinos muito distantes dos contos de fada, esse lugar existe e ironicamente abriga a capital mundial
da fantasia. Estamos falando da Flórida! Conheça a história dessa península e descubra que ela é um
lugar de diversão para crianças ...E adultos.
por Cristiane Sommer
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do especialmente para esse fim.
Não perca o sensacional Castillo de San Marcos, um forte todo feito com areia e ... conchas
trituradas.Conheça também a Oldest House
- a primeira casa da cidade - e
o Oldest Store
Saint Augustine,
a primeira
cidade norteamericana.
Em 1513, o primeiro explorador
europeu, Ponce de Leon, chegou à Flórida. Alguns historiadores afirmam que ele buscava
a fonte da juventude, supostamente localizada em
uma ilha ao norte de Cuba.
As terras descobertas foram reivindicadas ao
rei da Espanha e batizadas como La Florida, pois
o desembarque do navegador ocorreu na época da
Páscoa, que em espanhol se chama Pascua Florida.
Passaram-se cerca de 50 anos até que a região fosse
colonizada. O receio de que os franceses tomassem
posse da península fez com que soldados espanhóis
fundassem Saint Augustine em 1566. Foi dessa forma que surgiu o primeiro assentamento do atual
território dos Estados Unidos.
Assim, se você gosta do turismo histórico,
vale a pena conhecer o local. Faça um
tour numa carruagem ou num
trem turístico reserva-
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Museum. Passe também pelos
três parques estaduais que cercam o município:
o Anastacia State Recreation Area, local de abrigo
para inúmeras espécies de pássaros; o Faver Dykes
Park e o Guana River State.
Key West
Saint Augustine foi por muito tempo um dos
poucos núcleos urbanos da Flórida. A ausência de
metais preciosos fez com que os espanhóis dessem
preferência à exploração dos territórios pertencentes aos maias, astecas e incas. Entre a segunda
metade do século XVII e o começo do XVIII, a importância da península esteve vinculada a sua posição estratégica. A proximidade com o Caribe - local
de partida das frotas anuais espanholas repletas de
ouro e prata - fez da região um dos principais focos
da pirataria. São dessa época os piratas mais conhecidos, ou seja, os das histórias, romances e filmes:
Morgan, o capitão Kidd, “Barba Negra”, “Black Bart”
Roberts e Thomas Tew. Em Key West, existem vários
museus que guardam relíquias desse período. Um
deles, o “Port Royal”, possui em seu acervo mapas e
documentos originais, além de cartaz que oferecia
recompensa pela cabeça de Henry Evory, o pirata
que assolou o Oceano Índico. Também está exposta
ao público a “Jolly Roger”: a famosa bandeira pirata
com o emblema da caveira e os dois
ossos cruzados.
Outro ponto forte da cidade
são os mergulhos submarinos. Visite o Parque Nacional Marinho
de Jonh Pennekamp, que é um
grande santuário de corais. As
belezas naturais são apenas
uma parte das riquezas que
o fundo do mar abriga. A
grande incidência de furacões transformou a localidade
em uma das regiões do mundo com maior índice
de naufrágios. Assim, você poderá ver centenas de
destroços que contemplam mais de 500 anos da
história marítima do continente. Belas paisagens,
no entanto, não são encontradas apenas dentro da
água. O Key West Lighthouse, um farol que data de
1848, proporciona a melhor vista sobre a cidade e o
mar. Segundo alguns, Key West possui o pôr-do-sol
mais bonito do mundo (esses provavelmente nunca
estiveram em Itacaré...).
A Flórida é realmente
excêntrica (ao menos para
os norte-americanos).
No ano de 1819, a Flórida foi cedida pelos espanhóis aos norte-americanos. Foi a partir desse momento que começou a se desenvolver. Por volta de
1880, a descoberta de fosfato e o advento das plantações de laranja fizeram a economia prosperar. O
capital excedente gerado por essas atividades, o clima e as praias foram os fatores fundamentais para
tornar a Flórida um dos principais pólos turísticos
dos Estados Unidos. Fort Lauderdale foi uma cidade
que cresceu muito com o turismo. Hoje, próximo a
ela está o Sawgrass Mills Mall, o maior shopping
center de lojas de fábrica e pontas de estoque da
Flórida. Prepare-se para andar, porque esse templo
do consumo possui o melhor que o “american way
of life” tem a oferecer. Lá, você encontra desde as
marcas mais famosas (Saks Fifth Avenue, Macy’s,
Sean e Marshall) até as desconhecidas. A variedade de produtos vendidos é grande: roupas, sapatos,
acessórios, maquiagens, brinquedos, aparelhos eletrônicos, ferramentas, vitaminas, entre outros itens.
É programa para dia inteiro.
Se fazer compras não é o seu passatempo favorito, experimente visitar o Museum of Discovery
A Flórida e os
furacões
Todos os anos a Flórida é atingida por furacões
que se formam no Atlântico e no Golfo do México.
O período de vigilância começa em maio e vai até
dezembro. Apesar disso, você pode fazer sua viagem
nesses meses, pois o National Hurricane Center está
sempre a postos monitorando o que acontece com
as tormentas. Em caso de perigo, a mobilização é
total e há tempo suficiente para deixar os locais que
serão atingidos pelo furacão.
Discute-se na comunidade científica as razões
dos fenômenos terem aumentado, tanto na freqüência quanto na intensidade. Alguns atribuem
isso ao “efeito estufa”.
Por ironia do destino, culpa-se em grande parte o clã dos Bush. Primeiro pela forte relação com
a indústria petrolífera, depois pelas duas guerras
no Iraque e, finalmente, pela quebra do Protocolo
de Kyoto. Não custa lembrar que a Flórida é governada por Jeb Bush e foi palco de suspeitas de
fraude na primeira eleição de George W. Bush.
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and Science, cuja principal atração é um cinema 3D
com sala gigante de projeção. Outra opção é o Billie
Swamp Safari, onde você encontrará índios nativos
e poderá apreciar o artesanato local, além de fazer
passeios de airboat e um tour para conhecer um
ecossistema com animais vistos de perto.
A capital mundial do
charuto.
Durante o século XIX, os Estados Unidos se tornaram uma potência econômica e militar mundial.
Sua hegemonia sobre o mundo foi consolidada no
século XX. A influência norte-americana pôde ser
vista em 1929 com a quebra da Bolsa de Nova Iorque, que não somente abateu a economia do país
como também da América Latina e da Europa.
Foi nesse contexto que Tampa perdeu seu título de “capital mundial do charuto”.
Atualmente, a cidade arrecada grande parte de sua
renda através do turismo. Se você for visitá-la, não
deixe de conhecer Ybor City, um bairro tipicamente
latino. Sua origem está ligada à figura de dom Vicente Martinez Ybor, proprietário de uma fábrica de
charutos. O prédio que abrigava a indústria foi preservado e hoje é ocupado por escritórios. Perto dessa imponente construção existe o Ybor City State Museum
Park, um museu instalado em uma padaria desativada.
Lá, com a ajuda de monitores, muitos deles voluntários, você conhecerá a história do bairro.
Visite o Ybor City State e assista à fabricação
manual de charutos. A maior parte da produção é
mecanizada, sendo a técnica artesanal de confecção
restrita às apresentações turísticas. Visite também
La Sétima, uma via que alinha bares, restaurantes,
tabacarias e que costuma ser bastante requisitada
pelo público jovem.
Mesmo sendo um bairro histórico, Ybor City possui um senso “cenográfico” que nos faz sentir
dentro de um filme. Em 2001, foi instalada uma réplica do bonde que circulou pela
ruas entre 1890 e 1945. O padrão estético
é levado muito a sério. Para garantir que o
local não se descaracterize, existe uma comissão que controla o estilo arquitetônico
das novas construções.
Yes, a Flórida tem
tecnologia!
O contexto da Guerra Fria transformou
a Flórida em um pólo tecnológico. Sua
proximidade com a linha do Equador fez
com que um centro de lançamento de foguetes fosse
instalado em Cabo Canaveral. No Kennedy Space
Center, aconteceram alguns
dos eventos mais surpreendentes do século XX, como
a famosa missão Apolo XI.
O centro espacial foi aberto
ao público em 1992 e conta
com um centro de visitantes
de 17 mil metros quadrados,
que é uma mistura de parque
temático científico com museu. Encante-se com as naves
espaciais que ficam expostas.
Além de olhar, você poderá en-
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trar em uma Apolo e ver um módulo idêntico ao que
desceu na Lua. Não deixe de comprar e experimentar a comida que é levada nas viagens espaciais! É
um prato cheio para quem já sonhou algum dia em
ser astronauta.
Agora, se seu sonho de criança era ser piloto de
carros, visite Daytona e conheça seu famoso autódromo. Surpreenda-se com o tamanho e a extensão
de suas arquibancadas: elas abrigam mais de 150 mil
pessoas, uma capacidade similar à do Maracanã. Nesse
circuito são disputados sete eventos da NASCAR, entre
eles as 500 milhas de Daytona. Para quem gosta de
fortes emoções, existe a possibilidade de se alugar um
kart e dar algumas voltas na mesma pista que o fusquinha falante, o simpático Herbie, competiu.
Soy loco por ti
América!
O pós-guerra não trouxe apenas foguetes para
a Flórida. Milhares de cubanos migraram para os
Estados Unidos por causa da Revolução de 1959.
A maior comunidade cubana nos Estados Unidos
localiza-se em Miami. A influência latina é muito
grande, por isso não estranhe se você ouvir música
caribenha no rádio ou pessoas falando espanhol nas
ruas. A cidade é formada por 22 distritos, entre eles
Miami Beach, Miami Springs e Key Biscayne. Para
quem gosta de praia, esse é o lugar certo. As mais
freqüentadas são as de Miami Beach. Outras opções
badaladas são: Sunny Isles, Haulover, Bal Harbour,
Surfside, Virginia Key e South Beach. As mais calmas localizam-se nas ilhas ao sul da cidade.
Guarde energia para a
noite e prepare-se para
uma infinidade de opções
de bares e boates à beira
mar. Há desde os sofisticados nightclubs em South Beach e Coconut Grove, a shows e espetáculos
de música latina, rock e hip
hop. Escolha um deles e dance até se acabar. Reserve tempo e dinheiro para as compras.
Miami possui lojas das melhores
grifes do mundo. Confira o que
é vendido na Washington ou
Collins Street ou vá ao Lincoln
Road Pedestrian Mall, uma rua
para pedestres com restaurantes,
cafés e muitas lojas com bons preços.
Palm Beach é boa opção para quem gosta de badalação e não quer saber de Miami. Esse condado possui 75 quilômetros de costa margeada pelo
Atlântico e é formado por 38 municípios. A região
é ótima para se mergulhar, já que a água do mar é
quente e cristalina. Se você prefere praticar esportes fora da água, Palm Beach possui cerca de 150
campos de golfe, fato que lhe garantiu o título de
capital do golfe na Flórida. Esse número só é superado pela quantidade de lojas. Tiffany, Tourneau,
Ralph Lauren, Armani e Louis Vuitton são apenas
algumas das grifes famosas, distribuídas entre as
200 lojas da Worth Avenue. Se você não resiste a
um souvenir, mas não quer gastar tanto, vá conhecer o Palm Beach Outlet. Lá, as roupas de grife vem
direto da fábrica e chegam a custar 70% menos do
que nas outras lojas. A vida noturna é outro ponto
forte de Palm Beach. No centro de Delray Beach, o
agito é constante. Na rua principal, um show chamado Art & Jazz on the Avenue proporciona aos
turistas uma noite agradável, com música ao vivo,
comida e arte. Se você gosta de teatro, confira os
espetáculos em cartaz no teatro Raymond F. Kravis
Center for the Performing Arts, em West Palm Beach. “O Fantasma da Ópera”, “Cats”, “Evita” e “Jesus
Christ Superstar” são alguns exemplos de peças que
já foram encenadas no local. Enfim, a Flórida proporciona atrações que vão muito além dos parques
temáticos. Com tantas opções, nem as crianças
sentirão falta deles.
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Cultura & Lazer
B
uddy Guy
no Brasil
Eric Clapton garante: ele é o rei das guitarras. Buddy Guy, uma das lendas
vivas do blues, se apresenta no Credicard Hall, São Paulo, no próximo dia 25
de novembro. Todo seu talento lhe rendeu cinco Grammy Awards faturados em
44 anos de carreira. Além de Clapton, o guitarrista também dobrou o coração
de gente como Jimi Hendrix e Stevie Ray Vaughan.
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Cultura & Lazer
Quem comparecer terá o gostinho de ouvir – e ver
- sucessos como “Damn Right, I Got The Blues”, “Look
On Yonder Wall” e “Wacht Yourself”, além das mais recentes composições, como “Do Your Thing”, de Keith
Richards, “Cut you Loose”, “Ain’t no Sunshine”, “Price
you Gotta Pay” e “I Put a Spell on You”, faixas inéditas
do novo álbum “Bring ‘em In”.
O rei do blues de Chicago foi aceito como um
dos modernizadores da utilização da guitarra no
blues. Muitos consideram seu estilo bastante semelhante de B.B. King. Bom, para se ter idéia do
reconhecimento de seu trabalho, a Fender produziu um modelo especial de guitarra em sua homenagem, a “Buddy Guy Polka Dot Strat”.
Com ele vêm músicos de altíssimo nível, como
Timothy Austin (bateria), Martin Sammon (teclado), Cornelius Hall “Ric” (guitarra), Orlando Wright
(baixo) e Jason Moynihan (saxofone).
Buddy nasceu e cresceu na Louisiana, Estados
Unidos, e começou a tocar profissionalmente na
região de Baton Rouge no início dos anos 50. Mas
sua carreira começou a se firmar, mesmo, por volta de 1957, quando se mudou para Chicago. Num
dos desafios promovidos por um clube da cidade,
Buddy Guy venceu Magic Sam e Otis Rush, dois
grandes nomes locais. Daí por diante, a trajetória
é só de “gols de placa”.
Gravou dois singles para a Artistic, “Sit And
Cry” e “This Is The End” e se tornou requisitado
músico de estúdio, tocando com grandes nomes
do blues, como Muddy Waters, Willie Dixon, Little
Walter, Sonny Boy Williamson e Koko Taylor.
Em 1962, seu disco “Stone Crazy” alcançou a
12ª colocação nas paradas de Rhythmn And Blues.
Em 1989, abriu seu próprio clube, o famoso “Legends”, em Chicago, atraindo velhos e novos fãs
de blues e roqueiros influenciados pelo blues .
E eis que, em 1991, uma deliciosa surpresa,
tanto para Buddy, como para seus fãs: Eric Clapton o convida para tocar com ele no Royal Albert
Hall, em Londres. As performances com Clapton
foram tão significativas que o levaram a assinar
um contrato com a Silvertone. No novo selo, ele
gravou “Damn Right, I’ve Got The Blues”, um aclamado disco de retorno, que contou com participações de Clapton, Jeff Beck e Mark Knopfler, guitarristas para ninguém botar defeito.
De lá para cá, Buddy Guy não parou de gravar
álbuns de alta qualidade, tanto que recebeu cinco
Grammy Awards,, além de ser indicado, em 95, ao
Rock and Roll of Fame,, por Eric Clapton e B.B King.
Blues, uma saudável tristeza...
A melancolia envolvente do blues vem de
uma história marcada pelos desabafos de uma
minoria social – a população negra americana
- que procurava expressar suas tristezas decorrentes do estado de espírito pós Guerra de
Secessão. Dotado de simplicidade, sensualidade,
poesia, humor e ironia, o blues foi criado por
pessoas sem conhecimentos formais em música. Por isso, baseava-se na improvisação verbal
e instrumental, características que marcaram
profundamente o gênero. A simplicidade das
letras permitiu que os bluesmen pudessem expressar suas emoções enquanto improvisavam.
Esta estrutura era composta por uma progressão harmônica fixa, bem conhecida por todos,
de forma que a tocavam de maneira quase que
automática.
Auto-proclamado “Pai do Blues”, W.C. Handy
conta que ouviu este tipo de música pela primeira vez no Delta do Mississippi, em 1903. No
final da década de 20, o blues proliferava por
todo o Delta e podia ser ouvido em Fish Fries e
Juke Joints, sendo interpretado por nomes como
Charley Patton, Son House, Willie Brown, Bo
Carter, Mississippi Sheiks e Tommy Johnson. O
grande nome do Delta era John Lee Hooker, famoso por Boogie Chillun, primeiramente gravado
para o selo Vee Jay Records em 1948.
Nos anos quarenta, o coração do blues mudou-se para a região sul de Chicago. Lá surgiram grandes nomes, como Elmore James, Willie
Mabon, Jimmy Rogers, Sonny Boy Williamson,
Otis Spann, Willie Dixon, Muddy Waters e Howlin’ Wolf. Entre as canções mais representativas deste período podem ser destacadas Hoochie
Coochie Man, Mannish Boy, Sloppy Drunk e Don’t
Start Me Talkin.
BUDDY GUYnida Nações Unidas,
(ave
Onde: Credicard Hall
o).
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mbro, às 22h
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P
Gastronomia
etróleo
Vermelho
Há trinta anos ele profetizou: a carne será o petróleo vermelho do Brasil. Sorte de quem ouviu. Mais
ainda: de quem deu ouvidos. Marcos Guardabassi, um
dos maiores entendedores do mundo, provou para todo
o país, ao longo de sua trajetória, que a carne brasileira é um dos seus trunfos econômicos. Com sangue
cooperativista e muito esforço realizado pela abertura
deste mercado, ele garante que a carne é um produto
acessível a toda a população brasileira. Imaginem, vocês, que os brasileiros tratam o músculo como carne
de segunda e, na Itália, ela tem valor diferenciado e
é aproveitada em pratos especialíssimos. Como diz o
mestre, é tudo uma questão de cultura alimentar.
Apesar de conhecer bem a cor de um coração, ele
garante que o seu é verde-amarelo, mesmo tendo a
plena consciência de que sua vocação seria muito melhor remunerada nos Estados Unidos ou na Europa.
Ele cresceu vendendo carne nas ruas: bucho, rabo, fígado... E toda essa simplicidade ainda transparece, tanto em
seu rosto, como na emoção de suas palavras quando conversa sobre seus ideais, seus sonhos e, melhor que isso, suas
realizações. É um ser humano que acredita no seu país e,
como um pai que vai observando o crescimento do filho, orgulha-se de ver onde o Brasil chegou e o quanto ainda vai
evoluir. Criou 150 cortes de carne, batizou a nossa conhecida
fraldinha e também o steak de açougueiro.
Nesta entrevista, ele dá uma injeção de auto-estima
ao país, salientando sua incomparável extensão territorial para a criação de bois e as vantagens de ser o único
local no mundo capaz de produzir qualquer tipo de boi.
APMP – Para começar, dê-nos um panorama geral
sobre a carne no Brasil.
Marcos Guardabassi - Há trinta anos, quando eu disse
que a carne, no Brasil, seria o petróleo vermelho, muita
MG - Analisando os americanos, percebemos que eles fizeram o seguinte: num dado momento, precisavam agregar
valor a um produto altamente de “commodity”, que era o
milho. Eles compreenderam que se dessem o milho para o
boi estariam, portanto, agregando alto valor. Mas para que
isso acontecesse, precisavam melhorar a genética de sua
produção e criar um bom sistema de alimentação. E foi o
que fizeram. Mas onde eles pecaram e ainda pecam?
Na cultura alimentar. Porque, num dado momento,
levaram uma parte do boi para a industrialização
- parte do dianteiro e grande parte da costela. E do
traseiro limitaram-se a fazer meia dúzia de cortes, ou
seja, não informaram o consumidor sobre novas possibilidades. Resultado: não conseguem aumentar o preço e nem
agregar mais valor.
APMP – As pessoas dizem que a carne nos Estados
Unidos é muito macia...
MG - De fato ela é, pois nela são acrescidos extratos de
carne. O animal tem uma boa genética, uma super alimentação e anabolizantes.
gente não acreditou.
Costumava dizer que
produtor brasileiro sabia
fazer boi, mas não carne. E
está aí. Hoje o Brasil tem o
maior rebanho do mundo,
não é o maior em volume de
carnes, mas sim no número de
cabeças.
APMP – Com relação aos tipos de corte, como a
carne é vista mundialmente?
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APMP – E os europeus? Também tiveram o mesmo processo que os americanos?
MG - A Europa tem limitações territoriais e,
por isso, não pode produzir carne em grande
escala como os EUA. Por outro lado, os europeus têm uma boa genética e grande cultura
alimentar da carne, tanto que os melhores açougueiros do mundo estão na Itália e na França. Eles
souberam inserir o produto dentro de um contexto
alimentar, apesar de terem deixado uma lacuna: a
do hábito do churrasco. O que costumam fazer é um
pedaço de carne cercado de molho. Isso porque lá a carne
é muito cara, justamente por não conseguirem produzi-
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Gastronomia
O Brasil é o único país que pode
se dar ao luxo de perguntar ao
resto do mundo que tipo de carne
eles querem que seja produzida.
Todas as regiões podem tratar
de boi e com qualquer tipo de
genética. Temos o maior rebanho
de zebuínos do mundo.
la em grande escala. Quando entramos na América do
Sul, e aqui me refiro a Brasil, Uruguai, Paraguai, Bolívia e
Argentina, a grande diferença é que, no século passado,
os ingleses entraram na Argentina para produzir carne e
levaram a melhor genética que tinham. Por isso, durante
muitos anos, a Argentina produziu carne melhor do que
nós. E eles foram os primeiros exportadores.
APMP – Onde estava o Brasil nessa época?
MG - O Brasil nem era conhecido. Quando entraram
bois aqui, não foi para o abastecimento de carne, mas
para mão-de-obra. Nós não tínhamos cultura alimentar, diferente da Argentina, que a adquiriu por conta
dos ingleses. Mas, hoje, temos o maior rebanho bovino comercial do mundo. O que o brasileiro ainda não
aprendeu - e precisa fazê-lo rapidamente - é que o boi
emprega trinta e seis empregos diretos.
APMP – Então como vê o Brasil neste exato momento?
MG - O Brasil é o único país que pode se dar ao luxo
de perguntar ao resto do mundo que tipo de carne eles
querem que seja produzida. Todas as nossas regiões
podem tratar de boi e com qualquer tipo de genética.
Temos o maior rebanho de zebuínos do mundo. Geneticamente, a carne do zebu não é feita para ser macia.
Este animal produz carne de alto sabor, alta nutrição
e muita qualidade. O zebu só deixa a desejar um pouco na maciez. O grande erro que cometemos é vender
carne de zebu apenas como commodity, quando deveríamos vendê-la como produto de altíssima qualidade,
porque é um animal que se alimenta em pastagens, ou
seja, vegetal, e só aqui ele tem condição de comer desta maneira. Outra coisa: é um animal extremamente
saudável pelo baixo teor de gordura que tem na parte
interna da carne.
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APMP – Aponte mais um equívoco do Brasil?
MG - Aqui fala-se muito em carne de primeira e de
segunda. Isso não existe! O que existe é boi de boa
qualidade e de qualidade inferior. Ou seja, não é porque você come um ossobuco, prato originário da Itália, feito com músculo, que você é rico. E se você comer músculo numa sopa, isso não significa que você
seja pobre.
APMP – Quer dizer que o brasileiro não come tanta
carne porque não valoriza as mais baratas?
MG - Claro! Veja só: quem disse que língua não é proteína animal? E que fígado não é altamente nutritivo?
Aqui fala-se muito em carne de
primeira e de segunda. Isso não
existe! O que existe é boi de boa
qualidade e de qualidade inferior. Ou
seja, não é porque você come um
ossobuco, um prato originário da
Itália, feito com músculo, que você é
rico. E se você comer músculo numa
sopa que você é pobre.
E por que a comida de pobre do brasileiro é a comida
de rico na Europa? Lá, comer fígado, dobradinha,
língua, é coisa de gente rica! O boi só tem um
rabo! Uma língua! Por que a língua e o rabo,
por exemplo, custam tão barato aqui e tão
caro na Europa? É tudo uma questão de
cultura alimentar...
APMP – Como o governo lida com
esse assunto?
MG - Olha, o
Pratini de Moraes e o nosso
atual ministro
Roberto Rodrigues sabem disso.
Mas acho que os
ministros anteriores não tiveram a
mesma atitude.
(...) no século passado, os ingleses
entraram na Argentina para
produzir carne, levaram a melhor
genética. Por isso, durante muitos
anos, a Argentina produziu carne
melhor do que nós. E eles foram
os primeiros exportadores.
APMP – E o que acha do momento atual?
MG - Penso que o Brasil tem que se voltar firmemente
para o mercado interno, promovendo uma maior divulgação da proteína animal, principalmente a carne. O
frango ganhou espaço - e não estou dizendo no sentido competitivo. Veja, o frango precisa de uma boa
estrutura cultural para ser consumido e foi exatamente
o que a Sadia, a Perdigão e empresas do ramo fizeram.
Devemos fazer isso com a carne. Outra coisa: o produtor tem que saber o que o consumidor quer comer, conhecer todo o processo da carne para, então, produzir
com qualidade, mesmo que ele ache que o frigorífico
não paga o que merece. Tem que se unir para dizer: nós
queremos produzir o melhor do melhor.
APMP – De onde vem esse hiato na questão da cultura alimentar brasileira?
MG - Não sei se é bem uma falha ou um processo...
Acho que é algo mais ou menos assim: o americano, para ter alguma história, tem que comprar dos outros. Já a nossa é de colonização,
grande parte pelos europeus. Eles deixaram muitas coisas boas e ruins. Acho que
devemos encontrar nosso nicho para
tudo isso. Encontrar nosso caminho e
ele depende de cultura. E não estou
me referindo a alfabetização. A Europa, cinqüenta anos atrás, tinha 40%
de analfabetos, mas tinha cultura.
APMP – Sua análise é otimista, então, com relação
ao Brasil?
MG - Sim, inclusive os produtores estão se movimentando para isso. Agora não tem mais volta. Daqui para
a frente nós daremos um salto de qualidade que o
mundo não deu em cem anos com a proteína animal.
Isso porque nós temos competência e capacidade para
dar esse salto com mais rapidez do que qualquer país.
APMP – Por que você ainda aposta no Brasil e não
se mudou para a Europa ou outro lugar onde a cultura da carne seja mais difundida?
MG - Ah... esse meu coração é, antes de vermelho, verde, amarelo, azul e branco... Tenho uma brasilidade tão
grande... Gosto muito da Europa, mas eu amo o Brasil.
Diria que por ter começado a vender bucho, rabo e coração na rua e ser tão reconhecido como sou, poxa, só
posso dizer que fico muito gratificado. Mesmo sabendo
que se eu estivesse nos Estados Unidos eu estaria muito mais rico. A verdade é que eu amo este nosso país.
E acredito muito nele. Estou satisfeito em ver nossos
avanços e ansioso por presenciar as grandes mudanças
que estão por vir.
Febre Aftosa
Alguns dias depois da concessão desta entrevista,
eclodiu o problema da febre aftosa no Brasil, mais precisamente no Mato Grosso do Sul, fato que levou 49 países
a interromper a importação do produto brasileiro.
Trata-se, na verdade, de grave trauma para o setor agropecuário brasileiro num momento político
conturbado.
Grande parte do setor pecuário culpa o governo federal pela escassez de recursos para a prevenção e pela
falta de agilidade.
Importante frisar que a doença não se transmite
para o ser humano.
Os grandes problemas decorrem da necessidade
de se sacrificar animais em larga escala para evitar a
propagação do vírus e a perda da boa imagem que o
produto brasileiro ostentava no exterior.
Estima-se que as perdas atinjam quase dois bilhões
de dólares.
O Brasil, maior exportador mundial de carne, ostenta ainda excelência na qualidade do produto em
diversos Estados, como o de São Paulo, que estão livres
não apenas da febre aftosa como também de outras
doenças típicas do Primeiro Mundo, como o “Mal da
Vaca Louca”.
Noutras palavras, churrasquear aqui continua sendo um dos melhores programas.
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Hédio Silva Júnior - Associação Paulista do Ministério Público