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Assinado por VERONICA QUIHILLABORDA IRAZABAL AMARAL em 14/10/2014 09:51:48.100 -0300
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Alino da Costa Monteiro (in memoriam) • Roberto de Figueiredo Caldas • Mauro Menezes • Claudio
Santos Gustavo Ramos • Marcelise Azevedo • Ranieri Resende • Monya Tavares • Raquel Rieger •
Rodrigo Torelly Luciana Martins • Denise Arantes • Andréa Magnani • Dervana Coimbra • Laís Pinto
• Paulo Lemgruber Rodrigo Castro • Renata Fleury • Cíntia Roberta Fernandes • Moacir Martins •
Verônica Amaral Raquel Perrota • Leandro Madureira • Adovaldo Medeiros Filho • Thiago Henrique Sidrim •
Rafaela Possera Pedro Mahin • Mara Cruz • Nathália Monici • Milena Pinheiro • Raissa Roussenq • Pedro
Felizola Rachel Dovera • Tércio Mourão • Marcelo Vieira • Juliana Bomfim • Rubstênia Silva • Hugo Moraes
Carolina Ávila • Rayanne Neves • João Gabriel Lopes • Catarina Lopes • Jéssica Costa • Danielle Ferreira
Aline Sterf • Roberto Drawanz • Érica Coutinho • Carina Pottes • Rodrigo Sampaio • Priscila Faro • Tatiana Dias
Virna Cruz • Luís Carlos Coentro • Vinicius Serrano
Excelentíssimo Senhor Ministro TEORI ZAVASCKI,
Relator perante o Excelso Supremo Tribunal Federal.
Processo: ARE nº 791.932/DF – com repercussão geral reconhecida
Caso paradigma do Tema nº 739
Recorrente: CONTAX S/A
Recorridos: TATIANE MEIRE DA SILVA e TELEMAR NORTE LESTE S/A
FEDERAÇÃO INTERESTADUAL DOS TRABALHADORES
E PESQUISADORES EM SERVIÇOS DE TELECOMUNICAÇÕES – FITRATELP
(Estatuto, ata de posse da atual Diretoria, CNPJ, registro da entidade no Ministério do Trabalho
e em Cartório em anexo), com sede no CLSW 104, bloco C, sala 160, Condomínio Portal
Plaza, Brasília, DF, CEP: 70.670-533, representada, na forma de seu Estatuto, por seu
Presidente, Luiz Carlos Torres de Alencar, brasileiro, casado, professor, portador do RG de nº
3.647.059-4 – SSP/SP e do CPF de nº 727.675.108-20, por intermédio de seus advogados
abaixo assinados, instrumento procuratório anexo, com escritório no Setor Bancário Sul,
Quadra 1, Bloco K (edifício Seguradoras), 2º, 5º e 14º andares, CEP 70.093-900, Brasília - DF,
endereço onde receberão as intimações e notificações, vem, na qualidade de entidade de
terceiro grau representante da categoria dos trabalhadores em telecomunicações, inclusive os
trabalhadores em empresas prestadoras de serviços interpostas e empresas tomadoras de
serviço, à presença de Vossa Excelência, requerer a sua intervenção no presente feito na
qualidade de
AMICUS CURIAE
com fundamento no termos do artigo 323, § 3º, do Regimento Interno dessa E. Corte, aduzindo
para tanto as seguintes razões.
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• Paulo Lemgruber Rodrigo Castro • Renata Fleury • Cíntia Roberta Fernandes • Moacir Martins •
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Rafaela Possera Pedro Mahin • Mara Cruz • Nathália Monici • Milena Pinheiro • Raissa Roussenq • Pedro
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1. Entidade sindical de terceiro grau apta a contribuir para a elucidação do cenário
fático e jurídico em que se situa o Tema nº 739/STF. Legitimidade representativa.
2. Impactos sociais e econômicos negativos da precarização resultante da
terceirização. Perfil e condições de trabalho dos terceirizados, especialmente em
call centers, a demonstrar a vulneração de direitos fundamentais dos
trabalhadores e o retrocesso da terceirização.
3. Recurso inadmissível pela infraconstitucionalidade do debate. Acórdão recorrido
que aplica interpretação sumulada, originária do Colendo TST, de normas
infraconstitucionais, especialmente dos artigos 2º e 3º da CLT. Inaplicabilidade
da norma em questão justificada pelos fatos colhidos em instrução probatória.
4. Sentido e alcance do artigo 94, II, da Lei nº 9.472/97. Impossibilidade de
terceirização das atividades-fim das empresas concessionárias de
telecomunicações. Interpretação legal pretendida pela Recorrente que gera
antinomia no sistema jurídico como um todo.
5. Cláusula de reserva de plenário e princípio da colegialidade ilesos. Simples
adoção de uma, entre as várias interpretações possíveis, dos artigos 25, § 1º, da
Lei nº 8.987/95 e 94, II, da Lei nº 9.472/97.
6. Pedido de reconsideração da decisão de sobrestamento das causas que
apresentem questão idêntica à que será resolvida com foros de repercussão geral
no presente caso. Extensão da suspensão que extrapola os limites do tema em
apreço. Sobrestamento possível somente em relação aos recursos extraordinários
pendentes de julgamento no tribunal de origem. Risco de dano inverso pelo
atraso no pagamento de verbas de natureza alimentar.
I.
1.
Síntese da questão constitucional discutida no Tema nº 739/STF.
A Federação-Requerente requer ingresso, na qualidade de amicus curiae,
neste processo em que foi alçado a esse Excelso Supremo Tribunal Federal (STF) recurso
extraordinário interposto em face do v. acórdão proferido pelo Colendo Tribunal Superior do Trabalho
– TST, para manter acórdão regional no sentido de reconhecer a responsabilidade de empresa
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operadora de telefonia por obrigações trabalhistas de atendente contratada por empresa prestadora de
serviços de call center (empresa interposta). O caso foi eleito como paradigma do Tema nº 739, em
recente votação no Plenário Virtual do Supremo Tribunal Federal, e o julgamento terá, portanto,
reverberações que extrapolam a relação subjetiva do referido processo.
2.
O Excelentíssimo Ministro Relator submeteu apenas um dos temas
elencados no apelo extraordinário à apreciação no Plenário Virtual do Excelso STF. Trata-se da
alegação de que o v. acórdão recorrido poderá ter deixado de observar a cláusula de reserva de plenário,
em eventual ofensa ao artigo 97 da Constituição Federal e à Súmula 10/STF.
3.
Portanto, será preciso averiguar, pelo Plenário do Excelso STF, na
oportunidade do julgamento do Tema nº 739, se a vedação de contratação de trabalhador que exerça
atividade-fim de empresa contratante de serviços de call center, por intermédio de empresa interposta,
depende da prévia declaração de inconstitucionalidade do artigo 94, II, da Lei nº 9.472/97.
II.
4.
Admissão da FITRATELP na qualidade de amicus curiae
Por representar justamente os trabalhadores-alvo do artigo 94, II, da Lei
nº 9.472/97, cuja (in)aplicabilidade reside no centro da controvérsia jurídica que justifica este
procedimento, conforme documentação anexa, a Federação Interestadual dos Trabalhadores e
Pesquisadores em Serviços de Telecomunicações – FITRATELP tem natural vocação para contribuir
com o esclarecimento e enriquecimento dos debates, seja com o oferecimento de seu singular ponto de
vista, seja com a contribuição de informações técnicas específicas do setor.
5.
Legitima-se, portanto, a integrar o feito na condição de amicus curiae,
tendo em vista o irrefutável impacto que a decisão a ser proferida no presente recurso – com
repercussão geral reconhecida – terá para a categoria profissional representada pela FederaçãoRequerente, que inclui os trabalhadores em telecomunicações, inclusive os contratados por empresas
prestadoras de serviços interpostas e tomadoras de serviço. Nesse sentido, é oportuno transcrever,
diretamente do registro sindical concedido pelo Ministério do Trabalho e Emprego, a descrição da
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categoria representada:
Categoria: A Coordenação das entidades a ela filiadas que tenham representação
da categoria profissional de todos os trabalhadores em telecomunicações, sejam
estes trabalhadores em empresas de Telecomunicações, inclusive os
trabalhadores em empresas interpostas e empresas tomadoras de serviço, em
que se forma o vínculo empregatício direta, indireta ou solidariamente com as
empresas de Telecomunicações; de Telefonia Móvel; de Centros de
Atendimento; de Call Centers; de Contact Centers; de Telemarketing; de
Transmissão de Dados; de Serviços de Internet; de Serviços Troncalizados de
Comunicação; de Rádiochamadas; em serviços de Projeto, Construção,
Instalação, Manutenção e Operação de Equipamentos e Meios Físicos de
Transmissão de Sinal; em serviços de Operação de Mesas Telefônicas,
telefonistas, teletipistas e os Trabalhadores em Atividades (Diretas e Indiretas) de
serviços, Pesquisas e Desenvolvimento em Ciência e Tecnologia do Setor de
Telecomunicações. (Destaques ausentes no original)
6.
Ressalte-se que a Requerente, congrega, atualmente, a representação de
trabalhadores de 9 (nove) Estados brasileiros (Piauí, Pará, Maranhão, Paraíba, Sergipe, Minas Gerais,
Rio Grande do Sul, São Paulo e Distrito Federal), conforme documentação anexa, evidenciando-se
estar plenamente satisfeito o requisito de “entidade de classe de âmbito nacional”, nos termos da
jurisprudência dessa Excelsa Corte:
AGRAVO
REGIMENTAL
–
AÇÃO
DIRETA
DE
INCONSTITUCIONALIDADE
– ASSOCIAÇÃO
NACIONAL DE
CIDADANIA (ASPIM) – ILEGITIMIDADE ATIVA – ENTIDADE DE CLASSE
DE ÂMBITO NACIONAL – NÃO CARACTERIZAÇÃO. 1. Mantida a decisão
de reconhecimento da inaptidão da agravante para instaurar controle abstrato de
normas, uma vez não se amoldar à hipótese de legitimação prevista no art. 103,
IX, “parte final”, da Constituição Federal. 2. Não se considera entidade de classe
a associação que, a pretexto de efetuar a defesa de toda a sociedade, patrocina
interesses de diversas categorias profissionais e/ou econômicas não homogêneas.
3. Ausente a comprovação do caráter nacional da entidade, consistente na
existência de membros ou associados em pelo menos nove estados da
federação, não bastante para esse fim a mera declaração formal do qualificativo
nos seus estatutos sociais. Precedente. 4. Agravo regimental a que se nega
provimento. (ADI 4230 AgR, Relator: Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno,
julgado em 01/08/2011 - destacou-se).
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7.
Sendo, como é, pertinente e útil a presente intervenção, requer-se a
admissão da FITRATELP, na qualidade de amicus curiae, nos termos do artigo 543-A, §6º, do Código
de Processo Civil e artigo 323, § 3º do Regimento Interno dessa E. Corte, de modo a contribuir para a
pluralização do debate constitucional e, também, para a legitimação das deliberações do Supremo
Tribunal Federal (ADI-QO nº 2.777/SP, Relator Ministro Cezar Peluso, Pleno, julgado em 26/11/2003,
ata publicada no DJ 15/12/2003).
III.
Contribuição técnica da FITRATELP para o esclarecimento do cenário fático em
que se situa o Tema nº 739. Perfil e condições de trabalho dos trabalhadores
terceirizados, especialmente em call centers. Impacto social e econômico da
terceirização.
8.
A análise da questão em exame no recurso ora submetido ao rito da
repercussão geral demanda, previamente, a apresentação do quadro fático no qual se inserem os
trabalhadores do setor de teleatendimento no Brasil, especialmente nos casos de prestação de serviços
para empresas do setor das telecomunicações.
9.
A questão do trabalho terceirizado no setor de telecomunicações ganhou
especial destaque após o processo de privatização do sistema Telebras, que ocorreu após a edição da
Lei nº 9.472/1997 (Lei Geral de Telecomunicações). A partir de uma leitura, permissa venia, imprecisa
daquela Lei, difundiu-se, no setor, a prática da terceirização de atividades que constituem, claramente,
a própria finalidade do empreendimento contratante. Tal prática, como se demonstrará mais adiante,
não encontra respaldo no formato do contrato de trabalho insculpido na CLT, além de contrariar o
escopo do constitucionalismo social vigente no País, tornando ainda mais precárias as condições de
trabalho de empregados que, em sua extensa maioria, encontram-se já em condição desigual no
mercado de trabalho.
10.
setor:
A esse respeito, convém trazer à colação o perfil dos empregados do
6
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De acordo com dados da RAIS – Relação Anual de Informações Sociais do
Ministério do Trabalho e Emprego relativos ao ano de 2011, a categoria de
trabalhadores que se ativa nesse setor é comporta, em sua maioria, por mulheres
(74% da força de trabalho), jovens (71% dos trabalhadores tem entre 18 e 29
anos), de classes média e baixa, com nível de escolaridade correspondente ao
ensino médio completo (82,9%), que estão ingressando no mercado de trabalho,
sub-remuneradas (81,3% percebem até dois salários mínimos) e inseridas em
categorias sindicais frágeis. A mão de obra empregada no serviço de call center
também é uma das mais rotativas do País1.
11.
Reportagem exibida pelo programa dominical “Fantástico”, em rede
nacional, pela TV Globo, no dia 5 de outubro de 2014, desnudou as condições adversas e abusivas
impostas pelas empresas prestadoras de serviços aos trabalhadores em serviços de call centers.
12.
Em matéria intitulada “Funcionários do setor de telemarketing relatam
série de abusos”, transcrita no sítio eletrônico da emissora e reproduzida em mídia eletrônica de vídeo
a ser anexada aos autos, o conceituado canal jornalístico expõe de maneira crua as lastimáveis
provações sofridas por operadores contratados para serviços de teleatendimento, inclusive pela
empresa recorrente (CONTAX S/A). A matéria relata denúncias formuladas por operadores de
telemarketing da imposição de abusos traduzidos em assédio moral, exploração trabalhista extrema,
humilhações e agressões pelo suposto descumprimento de metas e a espantosa fixação de escala para
ordenar a gravidez das funcionárias.
13.
Eis a transcrição integral da elucidativa matéria jornalística da Rede
Globo, que evidencia a depreciativa condição trabalhista resultante da proliferação de contratos de
terceirização de mão de obra no setor de call centers:
1
DUTRA, Renata Queiroz. Do outro lado da linha: poder judiciário, regulação e adoecimento dos trabalhadores em
call centers. São Paulo: LTr, 2014.
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No ramo de serviços, o setor de telemarketing é o que mais cresce no Brasil. Em três
anos, a oferta de postos de trabalho mais do que triplicou.
“A empresa vai te trazer metas irreais, que não existem”, diz uma ex-operadora.
Já são 1,5 milhão de trabalhadores. “São metas absurdas, são abusivas demais”, diz uma
ex-operadora.
Ao todo, 64% deles têm entre 18 e 29 anos. “É uma pressão tão forte que você não
consegue administrar”, diz uma ex-operadora.
Quando você precisa do telemarketing, o único contato é com a voz do profissional ao
telefone. O Fantástico foi saber o que acontece do outro lado da linha.
“Para mim, era um conto de fadas. Aquelas mesas com computadores, aquelas cadeiras
boas de sentar”, afirma uma ex-operadora.
O entusiasmo da ex-operadora virou desilusão nove meses depois de ser contratada para
o primeiro emprego. A voz dela começou a falhar.
“Eu iniciava a jornada de trabalho com uma voz, uma hora e meia depois, eu estava
rouca. Quando eu saía do trabalho, eu estava sem voz”, relembra.
Ela descobriu que estava com dois nódulos nas cordas vocais e foi afastada do
atendimento ao público. A ex-funcionária conta que passou a ser ridicularizada na
empresa. “Lixo. Eu fui apelidada de lixo”, conta.
E afirma que as agressões vinham dos chefes dela. “Foram oito meses de choro. De
choro, de choro, de choro”, diz a ex-operadora.
Ela procurou ajuda psiquiátrica. Tinha desenvolvido síndrome do pânico. “Eu tinha
medo de dormir. Quando o sono vinha, eu mesmo me despertava com medo de dormir
e ter os pesadelos, ter os sonhos com aquele ambiente de trabalho no qual eu vivi”,
relembra.
Em uma festa para o diretor da empresa, a operadora foi obrigada a encher centenas de
bexigas. “Teve um dia que, de uma só vez, eu enchi 300 bolas. Não tinha bombinha, eu
enchi na boca”, conta.
“Um supervisor cortou meu cabelo”, conta outra operadora.
O Fantástico encontrou outras histórias de humilhação, como a de uma mulher que diz
ter sido agredida por não cumprir as metas. “Ele voltou para mesa dele e jogou o cabelo
no lixo”, afirma.
As vítimas preferem não mostrar o rosto, porque ainda trabalham no setor e temem
represálias.
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"Todas aquelas pessoas, todos aqueles olhares e principalmente, o que mais marcante
ficou foi a risada dele depois de ele ter cortado meu cabelo", diz a operadora.
“Eu parei de amamentar o meu filho aos cinco meses por causa do antidepressivo. Eu
tinha pavor mesmo de ir trabalhar”, conta outra operadora.
Outra operadora conta que, durante a gravidez, teve uma infecção urinária porque a
empresa controlava o tempo de ir ao banheiro. “Você tem cinco minutos para ir no
banheiro”, conta.
Cinco minutos era o tempo total, em um expediente de seis horas.
Fantástico: Você grávida, com vontade de ir ao banheiro, qual era a orientação que te
davam?
Operadora: Não. Segura.
“A minha gerente montou uma planilha e organizou uma escala onde as funcionárias
deveriam engravidar pela ordem”, diz uma ex-operadora.
Uma escala de gravidez. Acontecia em uma empresa em Minas Gerais. “Quem fosse
engravidar teria que avisar com seis meses de antecedência”, conta a operadora.
A prioridade na escala de gravidez era para mulheres casadas e sem filhos. Depois, as
casadas que já tinham filho. As solteiras não podiam nunca.
“No meu caso, eu era casada e já tinha um filho, então eu não poderia ter outro. Eu
tinha que esperar quem não tinha ter filho primeiro”, afirma a operadora.
Mas a funcionária queria o segundo filho. Ela entrou na Justiça contra a empresa, a
BrasilCenter, e foi indenizada. Em email ao Fantástico, a BrasilCenter explicou que a
escala de gravidez foi um ato indevido de uma gestora que não está mais na equipe.
Quase 80% dos operadores de telemarketing são mulheres. A procuradora do Ministério
Público do Trabalho diz que em muitas empresas são comuns essas interferências
abusivas na vida pessoal das funcionárias.
“Não é só escala de gravidez, não. O empregador quer controlar o ciclo menstrual da
mulher porque, quando ele souber que ela está no período fértil, eles falam: 'olha não
esqueça que você está em sua semana fértil. Essa semana você não pode ter relações'”,
diz Renata Coelho, procuradora do Ministério Público do Trabalho.
O advogado da ex-funcionária da BrasilCenter acompanha outros casos na Justiça.
“Um supervisor, por não ter levado a sua equipe a bater a meta, foi colocado no eles
chamam de dinâmica motivacional, colocaram uma roupa de prisioneiro nele. Uma
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outra funcionária se vestiu de policial militar, e colocaram ele de quatro na frente da
equipe inteira”, conta Nélio Gouvêa Almeida Martins, advogado trabalhista.
Restrições de horários, invasão de privacidade, assédio moral. Todas as situações
relatadas à reportagem do Fantástico têm sempre o mesmo motivo: forçar os
funcionários a atingirem as metas.
Fantástico: O que é mais importante? Satisfazer o cliente ou bater a meta?
Operadora: Bater a meta.
Preste atenção no que outra mulher revela - ela trabalha no setor de retenção de uma
empresa de telemarketing. De dez clientes que querem cancelar um contrato, ela só
pode fazer um cancelamento. Os outros nove clientes, ela é obrigada a reter.
“Nove têm que ficar, essa é a meta. Se não ficar, você perde a sua meta, você não ganha
dinheiro, você é perseguido o tempo inteiro pela empresa, você vai ser o patinho feio da
equipe”, revela a funcionária
Para evitar que nove em dez consumidores consigam o que querem, vale tudo.
“Aquele funcionário certinho, que atende tudo muito bonito, atende o cliente bem, trata
o cliente bem, não consegue bater meta. Se você falar com muita clareza, de forma
detalhada e explicada para o cliente, você não vai reter absolutamente nada”, conta a
funcionária.
Fantástico: Então a orientação é confundir?
Funcionária: De forma induzida, sim.
A empresa onde ela trabalha é a Contax. A mesma empresa em que trabalhava a
operadora que teve o cabelo cortado. E também a que desenvolveu síndrome do pânico.
Procurada pela reportagem, a Contax respondeu, em nota, que não teve conhecimento,
pelos canais de comunicação da empresa, de nenhum dos acontecimentos citados. E
afirmou que vai apurar todas as denúncias, dizendo que elas estão em desacordo com os
princípios da empresa.
A funcionária que só tinha cinco minutos para ir ao banheiro trabalhava na empresa
Almaviva. Também por nota, a Almaviva negou que estipule tempo de uso dos
sanitários.
Um projeto de lei que regulamenta as condições de trabalho em telemarketing foi
apresentado em 2007 e ainda aguarda o parecer da Câmara dos Deputados em Brasília.
“Nós chamamos hoje os telecentros de senzalas modernas, porque os trabalhadores não
têm direito nem a ir ao sanitário”, afirma Joselito Ferreira, Federação Nacional dos
Trabalhadores em Telecomunicações
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“É um ambiente completamente permeado de assédio, de violência, de constrangimento
e de muito sofrimento”, diz Ana Soraya Vilas Boas, Fundacentro Ministério do
Trabalho e Emprego.
Mostrando o rosto, outros operadores confirmam o sofrimento do lado de lá do telefone.
"Pausa banheiro: 5 minutos. Almoço: 20 minutos", diz a operadora de telemarketing,
Elaíne Souza.
“O que você treina, o que você recebe a todo momento é que você tem que manter o
cliente a qualquer custo”, diz a operadora Bruna Peleteiro.
“Você entra em uma empresa com sonhos e você sai traumatizado”, relata a operadora
Dóris Queirós Vieira.
“Nós falamos, às vezes, da importância da primeira infância. Eu costumo comparar com
a importância do primeiro emprego. Então, ele está ali, no primeiro trabalho, cheio de
expectativas e de repente ele pensa: 'isso é trabalhar?' Isso não é trabalho, isso é castigo.
O prazer do trabalho, a dignidade pelo trabalho, o valor do trabalho, às vezes, nunca
mais vai conseguir ser desenvolvido nessa pessoa, dependendo da situação que ela se
submeteu ou que ela viu outra pessoa se submeter nesse ambiente”, diz a procuradora
Renata Coelho.2
14.
Tais nefastas condições de trabalho, denunciadas por importante veículo
de imprensa, a causar a indignação da sociedade, não constituem algo novo para os estudiosos das
relações de trabalho estabelecidas no setor, mercê da disseminação desenfreada da terceirização. Esse
é o panorama descrito no específico estudo recém-publicado pela pesquisadora da Universidade de
Brasília (UnB) Renata Queiroz Dutra, na obra intitulada “Do Outro Lado da Linha – Poder Judiciário,
Regulação e Adoecimento dos Trabalhadores em call centers”:
A maneira peculiar como a atividade de teleatendimento vem sendo gerida tem
construído uma especial vulnerabilidade dessa categoria de trabalhadores. A mão de obra
empregada hoje no setor possui um dos maiores índices de rotatividade no emprego
setoriais e desponta nos índices de adoecimento físico e psíquico (atribuído ao estresse
2
Vide o link: http://g1.globo.com/fantastico/noticia/2014/10/funcionarios-do-setor-de-telemarketing-relatam-serie-deabusos.html, com acesso em 13/10/2014.
11
Alino da Costa Monteiro (in memoriam) • Roberto de Figueiredo Caldas • Mauro Menezes • Claudio
Santos Gustavo Ramos • Marcelise Azevedo • Ranieri Resende • Monya Tavares • Raquel Rieger •
Rodrigo Torelly Luciana Martins • Denise Arantes • Andréa Magnani • Dervana Coimbra • Laís Pinto
• Paulo Lemgruber Rodrigo Castro • Renata Fleury • Cíntia Roberta Fernandes • Moacir Martins •
Verônica Amaral Raquel Perrota • Leandro Madureira • Adovaldo Medeiros Filho • Thiago Henrique Sidrim •
Rafaela Possera Pedro Mahin • Mara Cruz • Nathália Monici • Milena Pinheiro • Raissa Roussenq • Pedro
Felizola Rachel Dovera • Tércio Mourão • Marcelo Vieira • Juliana Bomfim • Rubstênia Silva • Hugo Moraes
Carolina Ávila • Rayanne Neves • João Gabriel Lopes • Catarina Lopes • Jéssica Costa • Danielle Ferreira
Aline Sterf • Roberto Drawanz • Érica Coutinho • Carina Pottes • Rodrigo Sampaio • Priscila Faro • Tatiana Dias
Virna Cruz • Luís Carlos Coentro • Vinicius Serrano
ocasionado pelo contato com os clientes, ao ritmo de trabalho intenso, com pausas
mínimas demarcadas até para uso dos sanitários, ao alto grau de vigilância dos
supervisores, às reiteradas notícias de assédio moral, dentre outros fatores).3
15.
Nesse mesmo sentido, pesquisas sociológicas têm indicado que o setor
concentra trabalhadores cuja inserção é dificultada em outros ramos econômicos, em razão de
discriminações que ainda persistem na sociedade. A socióloga Selma Venco aponta que, em suas
pesquisas de campo, pôde constatar a presença acentuada de homossexuais e transexuais, em índice
bastante superior ao que se verifica em outros segmentos:
A observação dos locais de trabalho indica a constituição de um espaço que abriga
esse segmento da população que, comumente, sofre discriminações em outros
setores da economia, em especial na prestação de serviços vis-à-vis, da mesma
forma que outros observados nas empresas com negros, obesos, portadores de
necessidades especiais, ou seja, pessoas que não correspondem ao ideário estético
ditado pela sociedade do consumo4.
16.
No entanto, em lugar de servir como modo de inclusão dessas pessoas,
tradicionalmente afastadas dos postos de trabalho, a prestação de serviços por trabalhadores
terceirizados no setor de call center implica, não raramente, diminuição da dignidade de trabalhadores
já bastante afetados pelos preconceitos amplamente disseminados.
17.
Isso se verifica facilmente dos dados de adoecimento relacionados ao
setor. Como aduzem Renata Dutra e Vitor Filgueiras:
Estudos de Sadi dal Rosso, realizados em vinte setores econômicos do Distrito
Federal, demonstram que o setor de telecomunicações se destaca dos demais
setores produtivos no que se refere aos quesitos doenças ocupacionais (14,9% de
média para os demais setores e 42,9% para o setor de telefonia), absenteísmo
por razões médicas (18,9% dos empregados dos demais setores declararam fazer
uso de atestado médico contra 73,5% dos empregados do setor de telefonia) e
3
DUTRA, Renata Queiroz. Do outro lado da linha: poder judiciário, regulação e adoecimento dos trabalhadores em
call centers. São Paulo: LTr, 2014, p. 102.
4
VENCO, Selma. “Centrais de Teleatividades: o surgimento dos colarinhos furta-cores?”. In: ANTUNES, Ricardo;
BRAGA, Ruy (orgs.). Infoproletários: degradação real do trabalho virtual.
12
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percepção dos trabalhadores acerca do aumento do ritmo e intensidade do trabalho
(57,5% para a média dos outros setores e 93% para o setor de telefonia). (Grifos
atuais)5.
18.
Realmente, os abusos promovidos nesse segmento específico vêm sendo
amplamente reconhecidos no âmbito do Poder Judiciário e dão uma mostra das consequências
inegavelmente deletérias ao regular desempenho do trabalho e até mesmo à concessão de condições
minimamente dignas de exercício da profissão, como, por exemplo, a prática comum de restrição ao
uso de banheiro durante o expediente6.
19.
Não bastasse isso, a submissão a regime terceirizado de prestação dos
serviços não apenas dificulta, como muitas vezes impede a reparação que deveria ser decorrente das
sucessivas violações verificadas. Os dados dos impactos da terceirização nos trabalhadores revelam o
patamar de gravidade a que podem chegar os efeitos perversos da conjugação do regime contratual
que rege a prestação de serviços com os caracteres específicos do setor de teleatendimento.
20.
Segundo dados da pesquisa Terceirização e Desenvolvimento7, realizada
pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) e pela Central
Única dos Trabalhadores (CUT), no ano de 2010, os empregados terceirizados correspondiam a 25,5%
do mercado formal de trabalho no Brasil.
21.
5
Os dados demonstram a maior suscetibilidade dos trabalhadores
DUTRA, Renata; FILGUEIRAS, Vitor. Adoecimento no telemarketing e regulação privada. Disponível em: <
http://indicadoresdeemprego.files.wordpress.com/2013/12/adoecimento-no-telemarketing-e-regulac3a7c3a3oprivada.pdf>. Consulta em 29.8.2014.
DANO MORAL. RESTRIÇÃO AO USO DE BANHEIRO. Esta Corte Superior considera que a restrição ao uso do
banheiro (tempo e frequência) expõe de forma desnecessária a privacidade e a intimidade do trabalhador, ofendendo a sua
dignidade. Por outro lado, não há como estabelecer de forma objetiva o tempo e a frequência do uso do banheiro para todas
as pessoas, devido às particularidades fisiológicas ou de saúde de cada um. Assim, o procedimento adotado pelas
reclamadas, no caso dos autos, é passível de indenização por dano moral. Recurso de revista de que se conhece e a que se
dá provimento.
RR - 82600-03.2008.5.24.0003 Data de Julgamento: 11/09/2013, Relatora Ministra: Kátia Magalhães Arruda, 6ª
Turma, Data de Publicação: DEJT 11/10/2013.
6
7
DIEESE/CUT. Terceirização e desenvolvimento: uma conta que não fecha. DIEESE/CUT: São Paulo, 2011.
13
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terceirizados a problemas relacionados com saúde e segurança no trabalho.
22.
Não surpreende, também, que os trabalhadores terceirizados enfrentem
uma muito maior rotatividade no emprego. Entre estes, há um tempo médio de permanência no trabalho
de 2,6 anos, enquanto os trabalhadores diretos ficam, em média, 5,8 anos no mesmo posto.
23.
Tal situação é agravada no setor de telemarketing. Pesquisas têm
indicado que “o processo de dispensa e admissão de novos trabalhadores (...) corrobora a hipótese do
desligamento como estratégia de omitir os casos de adoecimento”8. Em um dos casos estudados por
Renata Dutra e Vitor Filgueiras, o da empresa MB, verificou-se que, no ano de 2012, a empregadora
(prestadora de serviços a diversas tomadoras) registrou 6.901 vínculos trabalhistas. Iniciou aquele ano
com 2.690 trabalhadoras e trabalhadores e terminou com 2.577 (variação absoluta inferior a 5%). No
entanto, houve 4.652 desligamentos, número suficiente para quase duas trocas totais de empregados9.
24.
Ademais, a terceirização possui efeitos macroeconômicos claramente
regressivos. O tratamento discriminatório dispensado aos trabalhadores terceirizados faz com que a
remuneração destes seja, em geral, bastante inferior àquela contratada com trabalhadores diretos, até
mesmo por conta das condições de negociação coletiva bastante adversas aos terceirizados, mesmo
quando estes possuem a mesma qualificação acadêmica dos não-terceirizados. Veja-se, por exemplo,
a seguinte comparação no âmbito da Petrobras10:
DUTRA; FILGUEIRAS, op. cit., p. 15.
DUTRA; FILGUEIRAS, op. cit., p. 15.
10
DIEESE/CUT, op. cit., p. 18.
8
9
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Direitos
Trabalhadores diretos
Trabalhadores terceiros
Formação acadêmica
Superior completo
Superior completo
Exigências da função
Prestou concurso para nível
médio
Nível médio
R$ 2.800,00
R$ 1.300,00
R$ 600,00
R$ 291,00
R$ 17.000,00
Não recebe
100-150%
Segue a lei (50%-100%)
Paga 6% (recebe antecipado)
Funcionário paga 6% (recebe
atrasado)
Dependentes e após 28 anos se
for solteiro.
Não tem.
Salário médio
Auxílio-refeição
PLR
Horas extras
Transporte funcionário
Auxílio educação
25.
Como se pode verificar, a convivência, em uma mesma empresa, de
empregados diretos e terceirizados desenvolvendo atividades-fim pode ocasionar graves distorções em
termos de plena realização do princípio constitucional da igualdade, sob sua forma mais primordial: a
vedação da discriminação entre pessoas sujeitas a regimes jurídicos semelhantes.
26.
O principal efeito da terceirização, portanto, tem sido o enfraquecimento
das conquistas trabalhistas e o tratamento dos direitos dos trabalhadores como meros custos do
processo produtivo. Conforme assinala Renata Queiroz Dutra, esse efeito é visível no setor de
teleatendimento, com a depreciação do trabalho evidenciada por baixas remunerações, ausência de
benefícios sociais e insegurança laboral, além do adoecimento frequente dos operadores de call
centers.11
27.
Tais práticas apontam para o fenômeno que, no âmbito das ciências
sociais, tem se denominado precarização do trabalho. Por meio de inovadoras práticas de gestão,
segmentos empresariais acabam por violar, de maneira transversa, direitos fundamentais dos
11
DUTRA, Renata Queiroz. Do outro lado da linha: poder judiciário, regulação e adoecimento dos trabalhadores em
call centers. São Paulo: LTr, 2014, p. 122.
15
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trabalhadores, que se veem imersos em situação de grave insegurança laboral.
28.
Exemplo eloquente do que ora se apresenta é a realidade do Grupo CPFL
– Energia, que, por meio do processo de terceirização impôs drástica redução salarial a trabalhadores
da sua área de teleatendimento. O grupo criou, na sua própria estrutura, uma empresa intermediadora
que se responsabilizaria unicamente pelas atividades de call center, denominada CPFL – ATENDE –
Centro de Contatos e Atendimentos Ltda. A sócia majoritária da empresa é a própria CPFL – Energia
S.A. Com esse instrumento de gestão, a sócia majoritária fechou o seu call center e passou a aplicar
um piso salarial de R$ 600,00 (seiscentos reais), contra o piso de R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais)
antes pago aos contratados diretos, extinguindo também a maior parte dos benefícios advindos do
acordo coletivo de trabalho firmado com a categoria13.
29.
A relevância de tais elementos de natureza sociológica para a apreciação
do tema ora em discussão perante o Colendo STF tem sido enfatizada por estudiosos, tais como as
professoras da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Sayonara Grillo Coutinho Leonardo
da Silva e Ana Luísa de Souza Correia de Melo Palmisciano:
A regulação se constitui a partir de uma cultura própria, oxigenada pelo afluxo de
dados múltiplos, provenientes de diversos campos do saber. Conhecer as análises
sociológicas sobre os processos de transformação produtiva é fundamental para
entender os motivos pelos quais a terceirização é, hoje, a prática que mais
interpela a normatividade, erode a noção de responsabilidade social das empresas
e coloca novos desafios para o direito constitucional do trabalho.14
30.
Todos esses prejuízos têm sido corretamente reparados em inúmeros
processos pelas distintas instâncias do Poder Judiciário Trabalhista, sempre à luz da legislação
infraconstitucional do trabalho. Nesse passo, a eventual reversão de tais decisões impedirá a restituição
de direitos a milhões de trabalhadores terceirizados em todo o Brasil.
13
14
DIEESE/CUT, op. cit., p. 333.
SILVA, Sayonara Grillo Coutinho Lenardo da; PALMISCIANO, Ana Luísa de Souza Correia de Melo. A terceirização
sob o prisma do trabalho e do desenvolvimento social. In: Revista do Tribunal Superior do Trabalho. Vol. 80, nº 3,
jul/set 2014, p. 265-266.
16
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31.
Essa constatação obtém o endosso do membro do Ministério Público do
Trabalho e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Rodrigo de Lacerda Carelli,
em estudo específico sobre o tema em discussão, ao alertar:
A pretensão aparente de liberação da ‘terceirização de mão de obra diante do que
se compreende atividade-fim’ representará um grave retrocesso nas relações
sociais e também um total descaso com a Justiça Especializada, na qual há anos o
problema vem sendo tratado, se não de uma maneira ainda eficaz para a solução
do fenômeno, pelo menos conseguindo evitar a sua explosão. Com a liberação da
terceirização, obviamente, se poderá pensar em subcontratações em série, não
havendo limites inferiores para a degradação das condições de trabalho.15
IV.
Contribuição jurídica da FITRATELP para o debate sobre o Tema nº 739.
32.
Em adição aos dados fáticos apresentados no tópico anterior, a
Federação-Interveniente buscará contribuir, também nesta peça, com a pluralização do debate jurídico
a respeito do tema, consoante se passa a deduzir.
a) Da possibilidade de reapreciação, pelo Plenário do E. STF, dos requisitos de
admissibilidade recursal.
33.
É certo que o Plenário Virtual do Excelso STF já se manifestou pela
existência de matéria constitucional do presente recurso; a circunstância, inclusive, é um dos elementos
que justifica a presente intervenção.
34.
Ocorre que a sistemática do Plenário Virtual, que fraciona em duas fases
o julgamento do recurso extraordinário interposto, não concede ao término da primeira etapa qualquer
efeito preclusivo, permanecendo o Plenário dessa Excelsa Corte com a competência de reapreciar os
requisitos de admissibilidade recursal, entre os quais se destaca a (infra) constitucionalidade do debate
e sua repercussão geral.
15
CARELLI, Rodrigo de Lacerda. O ativismo judicial do Supremo Tribunal Federal e o debate sobre a terceirização. In:
Revista do Tribunal Superior do Trabalho. Vol. 80, nº 3, jul/set 2014, p. 256.
17
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35.
O Plenário dessa Excelsa Corte já reviu, em outras assentadas, ao julgar
o mérito de processo com repercussão geral reconhecida, os requisitos de admissibilidade outrora
afirmados pelo Plenário Virtual16, o que demonstra que o acórdão proferido pelo Plenário Virtual
não tem o condão de encerrar o julgamento ou tornar preclusa a apreciação da presença de
questão constitucional suficiente para justificar a atuação dessa Excelsa Corte Suprema.
36.
Inúmeros precedentes, cujos relatores foram os Excelentíssimos
Ministros e Ministra Cármen Lúcia17, Dias Toffoli18, Joaquim Barbosa19 e Ricardo Lewandowski20,
são uníssonos em sustentar que a discussão jurídica a respeito da vedação da terceirização de serviço
de call center por empresa de telecomunicação é matéria infraconstitucional que não ofende a Súmula
Vinculante nº 10/STF ou o artigo 97 da Constituição Federal, tratando-se de mera interpretação de
normas infraconstitucionais, conforme fica evidente quando se analisam os sucessivos e históricos
debates travados no âmbito do Colendo Tribunal Superior do Trabalho por ocasião da sedimentação
do posicionamento jurisdicional em questão.
37.
Realmente, a apreciação da lide pelo v. acórdão recorrido gira em torno,
eminentemente, da aplicação dos artigos 2º e 3º da CLT, além do exame do artigo 94, II, da Lei Geral
de Telecomunicações ao caso concreto, à luz das provas colhidas em audiência.
38.
A Súmula nº 331/TST, invocada pelo v. acórdão regional e cuja
aplicação foi mantida pelo Colendo TST, permite a terceirização de mão-de-obra desde que não se
16
Nesse sentido, foram os julgamentos do RE nº 607.607, ARE nº 648.629 e RE nº 592.317.
17 ARE 803261, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, julgado em 25/04/2014, publicado em PROCESSO ELETRÔNICO
DJe-084 DIVULG 05/05/2014 PUBLIC 06/05/2014.
18 Rcl 16908 MC, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, julgado em 16/12/2013, publicado em PROCESSO ELETRÔNICO
DJe-022 DIVULG 31/01/2014 PUBLIC 03/02/2014, Rcl 16375 MC, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, julgado em
03/10/2013, publicado em PROCESSO ELETRÔNICO DJe-198 DIVULG 07/10/2013 PUBLIC 08/10/2013.
19AI 824319 AgR, Relator(a): Min. JOAQUIM BARBOSA, Segunda Turma, julgado em 01/03/2011, DJe-061 DIVULG
30-03-2011 PUBLIC 31-03-2011 EMENT VOL-02493-02 PP-00421.
20ARE 740893, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, julgado em 15/05/2013, publicado em PROCESSO
ELETRÔNICO DJe-094 DIVULG 17/05/2013 PUBLIC 20/05/2013.
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refira à atividade-fim porque, em tal hipótese, normalmente há pessoalidade e subordinação direta, a
implicar afronta aos artigos 2º e 3º da CLT. Nesse passo, o raciocínio empreendido pelo Colendo TST
para alcançar entendimento quanto à ilicitude na terceirização decorreu exclusivamente da
interpretação de normas infraconstitucionais aplicáveis ao caso, não havendo que se falar em ofensa
ao princípio da reserva de plenário de que cuida o artigo 97 da Constituição.
39.
Destarte, haja vista a estrita infraconstitucionalidade da discussão a
permear a v. decisão reclamada, que se limitou a seguir a esteira de precedentes do Colendo TST a
respeito do assunto, e conforme reiteradamente vem sendo decidido no âmbito desse Excelso STF,
requer-se, permissa maxima venia, a reconsideração ou reforma do juízo de admissibilidade positivo
do recurso em análise.
b) A Súmula nº 331/TST e a vedação da terceirização de atividades-fim. Aplicabilidade dos
artigos 2º e 3º da CLT. Histórico de evolução da legislação infraconstitucional sobre
terceirização.
40.
É certo que o exame, por determinada Turma do Tribunal Superior do
Trabalho, de questões que envolvem a terceirização de atividades de centrais de teleatendimento no
setor de telecomunicações tem por contexto a consolidação de jurisprudência já há muito assentada
pela Justiça do Trabalho. Tal entendimento foi sedimentado após a edição de enunciados
jurisprudenciais a partir de meados da década de 1980, voltados a unificar a interpretação judicial de
situações que envolvessem a crescente utilização da intermediação de mão-de-obra no País.
41.
A configuração atual do tema na jurisprudência do Colendo TST
decorreu da emergência das mais diversas situações fáticas, todas elas com viés de precarização dos
direitos trabalhistas, que chegaram à apreciação do Poder Judiciário. Tais situações decorreram das
alterações verificadas no mercado de trabalho brasileiro, que passou a constituir relações trilaterais de
trabalho, em substituição ao formato bilateral clássico do Direito do Trabalho, cuja razão de ser não
pode ser abstraída.
42.
A anterior articulação que envolvia simplesmente as figuras do
19
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empregador e do empregado, reunidos em razão dos requisitos constantes do artigo 2º da CLT, passava
a não se verificar na prática de alguns segmentos econômicos nos quais se adotou a prática da
contratação interempresarial de serviços que envolviam apenas o fornecimento de mão-de-obra para o
exercício de atividades específicas.
43.
A terceirização de atividades empresariais desafiava a lógica
desenvolvida desde longa data pelo Direito do Trabalho, vez que “dissocia a relação econômica de
trabalho da relação justrabalhista que lhe seria correspondente”21. Referida inovação na configuração
das relações entre tomadores e prestadores de serviços, agora intermediada por um terceiro, passou a
ser adotada no País a partir da edição de uma série de medidas legislativas que, nos setores público e
privado, excepcionaram a regra secular da legislação trabalhista, segundo a qual seria reconhecido o
vínculo empregatício sempre que constatadas a pessoalidade, a não-eventualidade, a onerosidade e a
subordinação na prestação laboral.
44.
Cabe rememorar que a CLT acolheu apenas duas figuras bastante
específicas que implicavam admissão da subcontratação de mão-de-obra: a empreitada e a
subempreitada, previstas no artigo 455 daquele Diploma, mas já presentes anteriormente na legislação
civil. De fato, a figura da terceirização não era elemento de destaque nas relações econômicas
desenvolvidas à época da elaboração da CLT. No entanto, os ensinamentos doutrinários então
existentes permitiam verificar que o tema já era objeto de preocupação dos estudiosos do Direito do
Trabalho.
45.
Convém destacar, nesse sentido, a reflexão desenvolvida por Evaristo de
Moraes Filho, ainda na década de 1930, a respeito do contrato de marchandage, definido pelo autor
como “uma convenção de sub-empreitada que diz respeito exclusivamente à mão-de-obra”22. Já àquela
época, alertava o referido autor para o grande risco de ocorrerem fraudes trabalhistas ou mesmo
eventos que impossibilitem a empresa que comercializa mão-de-obra de arcar com as parcelas devidas
21 DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 12 ed. São Paulo: Ltr, 2013, p. 436.
22 MORAES FILHO. Evaristo de. Contrato de trabalho (Formas, alteração e rescisão). São Paulo: Max Limonad,
1944.
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Felizola Rachel Dovera • Tércio Mourão • Marcelo Vieira • Juliana Bomfim • Rubstênia Silva • Hugo Moraes
Carolina Ávila • Rayanne Neves • João Gabriel Lopes • Catarina Lopes • Jéssica Costa • Danielle Ferreira
Aline Sterf • Roberto Drawanz • Érica Coutinho • Carina Pottes • Rodrigo Sampaio • Priscila Faro • Tatiana Dias
Virna Cruz • Luís Carlos Coentro • Vinicius Serrano
aos trabalhadores. Propunha, então, como solução para as hipóteses previstas na CLT, a adoção de um
mecanismo solidário de responsabilização objetiva pelas verbas trabalhistas, nos seguintes termos:
...a solução para o caso do marchandage (…) está em obrigar-se o empreiteiro
principal a responder por todos os ônus da legislação social, quando não o possa
fazer o sub-empreiteiro, e isto independente de colusão ou qualquer intenção de
prejudicar que, por acaso, tenham os dois ou um dêles23.
46.
O fenômeno ganhou relevo a partir do final da década de 1960, quando
começaram a se destacar, no âmbito da Administração Pública, as chamadas teorias da
descentralização administrativa. Nesse contexto, a título exemplificativo, o Decreto-Lei nº 200/1967
veio para permitir, em termos genéricos, a delegação, à iniciativa privada, da realização das chamadas
“tarefas executivas24”. A norma exigia, tão-somente, que o ator privado responsável pela execução das
mencionadas tarefas gozasse de desenvolvimento técnico suficiente para o desempenho da função.
47.
As atividades que poderiam ser terceirizadas foram definidas na Lei nº
5.645/197025, que delimitou a terceirização para o campo das atividades relacionadas com transporte,
conservação, custódia, operação de elevadores, limpeza e outras assemelhadas. Como observa
Maurício Godinho Delgado, é “inquestionável que todas as atividades referidas nesse rol encontramse unificadas pela circunstância de dizerem respeito a atividades de apoio, instrumentais, atividadesmeio”26.
23 MORAES FILHO, op. cit., p. 37.
24
Artigo 10. A execução das atividades da Administração Federal deverá ser amplamente descentralizada.
(…)
§ 7º Para melhor desincumbir-se das tarefas de planejamento, coordenação, supervisão e contrôle e com o objetivo de
impedir o crescimento desmesurado da máquina administrativa, a Administração procurará desobrigar-se da realização
material de tarefas executivas, recorrendo, sempre que possível, à execução indireta, mediante contrato, desde que
exista, na área, iniciativa privada suficientemente desenvolvida e capacitada a desempenhar os encargos de execução.
25
Eis o que se lê no parágrafo único do artigo 3º daquela norma: As atividades relacionadas com transporte, conservação,
custódia, operação de elevadores, limpeza e outras assemelhadas serão, de preferência, objeto de execução indireta,
mediante contrato, de acôrdo com o artigo 10, § 7º, do Decreto-lei número 200, de 25 de fevereiro de 1967 (grifos
atuais).
26 DELGADO, op. cit., p. 440.
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48.
Seguindo-se à abertura da possibilidade de terceirização de atividades no
setor público, dois novos diplomas normativos acabaram por estender a prática ao setor privado. A Lei
nº 6.019/197427, admitiu, quando da contratação de serviços temporários, a configuração trilateral da
prestação laboral. Posteriormente, foi editada a Lei nº 7.102/1983, que previu hipótese de terceirização
permanente, mas estritamente limitada ao ramo da vigilância de estabelecimentos bancários, sendo que
a Lei nº 8.863/1994 alargou as possibilidades de terceirização dos serviços de vigilância, transporte ou
garantia de transporte de qualquer tipo de carga, para qualquer instituição pública ou privada.
49.
O limite legal das possibilidades de terceirização de atividades não
impediu os setores econômicos de adotá-la com frequência, o que levou ao crescimento do volume de
demandas judiciais pretendendo, ora o reconhecimento do vínculo direto com o tomador de serviços,
ora a responsabilização destes pelas verbas remuneratórias e indenizatórias devidas aos trabalhadores.
50.
Diante da multiplicidade de respostas fornecidas pelos órgãos judiciários
no País, o Tribunal Superior do Trabalho foi instado a uniformizar a jurisprudência a respeito da
matéria, esforço que desaguou na edição do enunciado de súmula nº 256, em 1986, a seguir
reproduzido:
Salvo os casos de trabalho temporário e de serviço de vigilância, previstos nas
Leis nºs 6.019, de 03.01.1974, e 7.102, de 20.06.1983, é ilegal a contratação de
trabalhadores por empresa interposta, formando-se o vínculo empregatício
diretamente com o tomador dos serviços.
51.
Como é possível aferir, a súmula fixou a compreensão de que, em se
tratando do reconhecimento de vínculo laboral, existe uma regra geral sobre a qual se edificou todo o
Direito do Trabalho no Brasil: a natureza sinalagmática do vínculo existente entre aquele que empresta
sua força de trabalho em troca de salário e aquele que aufere as vantagens econômicas decorrentes da
prestação laboral. O Colendo TST reconheceu, por outro lado, que em determinados segmentos
27
Artigo 4º. Compreende-se como empresa de trabalho temporário a pessoa física ou jurídica urbana, cuja atividade consiste
em colocar à disposição de outras empresas, temporariamente, trabalhadores, devidamente qualificados, por elas
remunerados e assistidos.
22
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econômicos, desde que existente previsão legal, poderia ocorrer a mencionada prática, desde que não
fosse instrumento de burla à CLT.
52.
No entanto, conforme preleciona Maurício Godinho Delgado, a Súmula
nº 256 não continha expressa vedação à admissão de trabalhadores por entes estatais sem concurso
público28, vindo a proliferar, no âmbito estatal, a prática da terceirização, consubstanciada em
verdadeira fraude à regra inscrita no artigo 37, II, da já vigente Constituição de 1988. Com isso, o
Ministério Público do Trabalho deu início a diversas ações que visavam a adequar a contratação, por
empresas públicas e sociedades de economia mista, às balizas constitucionais, o que motivou a
modificação da Súmula nº 256, em 1993, quando o C. TST formulou o enunciado nº 331, cuja redação
original prescrevia:
CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LEGALIDADE. REVISÃO
DO ENUNCIADO Nº 256.
I - A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se
o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho
temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974).
II - A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não
gera vínculo de emprego com os órgãos da Administração Pública direta,
indireta ou fundacional (artigo 37, II, da CF/1988).
III - Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços
de vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem
como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde
que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.
IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador,
implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas
obrigações, desde que este haja participado da relação processual e constem
também do título executivo judicial (artigo 71 da Lei nº 8.666 /93).
53.
Além das previsões específicas relacionadas com a terceirização no setor
público, importa verificar que, a teor do que dispuseram os itens I e III da referida Súmula em sua
redação original, manteve-se a proibição genérica da terceirização trabalhista, fazendo-se prevalecer a
interpretação judicial que privilegia a integridade dos artigos 2º e 3º da CLT (que definem os conceitos
28 DELGADO, op. cit., p. 448.
23
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de empregador e de empregado, respectivamente), ou seja, proibindo-se a terceirização onde houvesse
pessoalidade e subordinação direta.
54.
O raciocínio empreendido pelo Colendo TST para alcançar tal
entendimento decorreu da interpretação da legislação ordinária então em vigor. Além das exceções
previstas nas Leis nº 6.019/1974 e nº 7.102/1983, incorporaram-se as exceções constantes da legislação
administrativa. O conceito de atividade-meio, afinal, deriva exatamente de uma interpretação que se
fez do disposto na Lei nº 5.475/1970, que aludia a “atividades relacionadas com transporte,
conservação, custódia, operação de elevadores, limpeza e outras assemelhadas”.
55.
Como é possível notar, ao longo de todo o histórico de desenvolvimento
da jurisprudência hoje consolidada a respeito da terceirização trabalhista, foram os critérios
infraconstitucionais que importaram para a determinação do posicionamento jurisprudencial da Justiça
do Trabalho. Tanto é assim que os critérios da Súmula nº 256 encontram-se essencialmente
preservados na Súmula nº 331, a despeito do fato de ambas estarem em vigor sob regimes
constitucionais distintos e, em grande medida, antagônicos.
56.
Elemento apto a atestar tal compreensão está na ressalva constante no
item III do novo enunciado, que determina que, caso se verifiquem, na situação concreta, a
subordinação direta e a pessoalidade, ter-se-á a conformação da relação de trabalho típica da CLT. Eis
a redação atual da Súmula 331/TST:
CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LEGALIDADE (nova redação do
item IV e inseridos os itens V e VI à redação) - Res. 174/2011, DEJT divulgado em
27, 30 e 31.05.2011.
I - A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo
diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº
6.019, de 03.01.1974).
II - A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo
de emprego com os órgãos da Administração Pública direta, indireta ou fundacional (art.
37, II, da CF/1988).
III - Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de
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vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de
serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a
pessoalidade e a subordinação direta.
IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a
responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde
que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial.
V - Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem
subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta
culposa no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666, de 21.06.1993, especialmente
na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de
serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero
inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente
contratada.
VI – A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas
decorrentes da condenação referentes ao período da prestação laboral.
57.
E, de fato, assim constou do v. acórdão regional, mantido integralmente
pelo Colendo TST:
“Conquanto o artigo 94 da Lei 9.472/97 permita a terceirização dos serviços que
lhes são essenciais, tal dispositiva não autoriza a terceirização da atividade
econômica principal, com fraude à legislação trabalhista.
No caso, a reclamante foi contratada para prestar serviços exclusivamente à
segunda ré, conforme confessou o preposto da 1ª reclamada, na audiência de fl.
85.”
(Fl. 3 do acórdão recorrido – destacou-se).
58.
Esse é o ponto fundamental que se quer destacar perante a Excelsa Corte
Constitucional. Não se trata de negar vigência – e muito menos de declarar a
inconstitucionalidade, em inobservância ao princípio da reserva de plenário - ao artigo 94 da Lei
nº 9.472/97, mas sim de interpretá-lo em cotejo com outras normas infraconstitucionais,
especialmente trabalhistas, tendo em mira os fatos objeto de prova produzidos nos autos. Essa
tem sido a postura da Justiça do Trabalho quando aplica a Súmula nº 331/TST em casos de
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terceirização envolvendo operadores de call centers em empresas de telecomunicações.
59.
Essa é a cristalina conclusão tirada do exame do leading case
paradigmático sobre a matéria (Processo nº TST-RR-2938-13.2010.5.12.0016), lavrado pela Subseção
I Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho, sob a relatoria do Ministro
José Roberto Freire Pimenta (cópia do acórdão anexa), que assentou o seguinte entendimento:
TERCEIRIZAÇÃO ILÍCITA. EMPRESA DE TELECOMUNICAÇÕES.
CALL CENTER. ATIVIDADE-FIM DA RECLAMADA TOMADORA DE
SERVIÇOS. INTERPRETAÇÃO DOS ARTIGOS 25, § 1º. DA LEI Nº
8.987/95 E DO ARTIGO 94, INCISO II, DA LEI Nº 9.472/97 E APLICAÇÃO
DA SÚMULA Nº 331, ITENS I E III DO TST. VÍNCULO DE EMPREGO
ENTRE A TOMADORA DE SERVIÇOS E O TRABALHADOR
TERCEIRIZADO RECONHECIDO. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO DA
SÚMULA
VINCULANTE
Nº
10
DO
STF.
MATÉRIA
INFRACONSTITUCIONAL. (...)
5. Ademais, quando os órgãos fracionários dos Tribunais trabalhistas
interpretam preceitos legais como os ora examinados, não estão eles, em
absoluto, infringindo o disposto na Súmula Vinculante nº 10 e, nem tampouco,
violando o artigo 97 da Constituição Federal, que estabelece a cláusula de
reserva de plenário para a declaração de inconstitucionalidade das leis em sede
de controle difuso, pois não se estará, nesses casos, nem mesmo de forma
implícita, deixando de aplicar aqueles dispositivos legais por considera-los
inconstitucionais.
60.
Não é, portanto, a Constituição de 1988 o diploma normativo que
informa os critérios formais de restrição à terceirização trabalhista. Antes e sobretudo, foi a construção
legal ordinária (aí incluída a CLT), apreciada caso a caso, a partir de critérios de subsunção, que
permitiu a generalização dos requisitos de licitude da terceirização cristalizados por meio da Súmula
nº 331/TST.
c) Sentido e alcance do artigo 94, II, da Lei nº 9.472/97. Impossibilidade de terceirização
das atividades-fim das empresas concessionárias de telecomunicações.
61.
Não foi apenas o choque com a Consolidação das Leis do Trabalho -
CLT que justificou o reconhecimento pelo Tribunal Regional do Trabalho e, na sequência, pelo
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Colendo TST, da inaplicabilidade do artigo 94, II, da Lei nº 9.472/97 ao caso concreto. Rigorosamente,
a exegese correta do artigo de lei em questão não autoriza a contratação, por meio de empresa
interposta, de trabalhador que exerça atividade-fim de empresa de telecomunicações.
62.
Somente o excessivo apego à interpretação literal ou filológica, também
chamada gramatical, tornaria possível, de alguma forma, conferir ao inciso II do artigo 94 da Lei Geral
de Telecomunicações o sentido que lhe pretende dar a Recorrente. Eis o que dispõe o referido preceito
legal:
Art. 94. No cumprimento de seus deveres, a concessionária poderá, observadas
as condições e limites estabelecidos pela Agência:
II – contratar com terceiros o desenvolvimento de atividades inerentes,
acessórias ou complementares ao serviço, bem como a implementação de projetos
associados. (Destacou-se).
63.
Permissa maxima venia, apesar da pretensão da Recorrente, somente
seria possível considerar que a expressão “atividades inerentes (...) ao serviço” seria sinônimo de
“autorização legislativa ilimitada para contratar com terceiros”, se retirássemos o citado inciso do
ordenamento jurídico que o contém. Isso porque nosso sistema legal conta com diversas outras normas,
de índole infraconstitucional e constitucional, que não permitem conferir ao dispositivo em destaque a
abrangência literal que se pretende no apelo extraordinário.
64.
Calha, nesse particular, a clássica lição de Francesco Ferrara, a apregoar
que “o sentido literal é incerto, hipotético, equívoco, [pois] também os que atuam ´in fraudem legis´
observam o sentido literal da lei e, no entanto, violam o seu espírito”.29
65.
De igual modo, Carlos Maximiliano adverte que “o maior perigo, fonte
perene de erros, acha-se no (...) apego às palavras. (...) Cumpre tirar da fórmula tudo o que na mesma
se contém, implícita e explicitamente, o que, em regra, só é possível alcançar com experimentar os
29 FERRARA, Francesco. Como aplicar e interpretar as leis. Belo Horizonte: Líder, 2002, p. 35.
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vários recursos da Hermenêutica.”.30
66.
Nesse sentido, é indispensável que o trabalho hermenêutico não perca de
vista que existe uma coerência sistêmica, e que a interpretação do artigo 94, II, da Lei nº 9.472/97 não
prescinde de seu cotejo com os demais dispositivos pertinentes ao tema que integram o ordenamento
jurídico e nem tampouco de sua análise à luz dos fins sociais que servem de suporte teleológico para
a concessão do serviço público de telecomunicações.
67.
A primeira orientação para o intérprete, inclusive consolidada no artigo
5º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (Decreto-Lei nº 4.657, de 4.9.1942), é de que
“na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem
comum”, a demonstrar o cuidado que o legislador teve em fortalecer mecanismos que permitam resistir
a interpretações que, por apego excessivo à forma, acabem por comprometer a integridade e a coerência
sistêmica.
68.
No caso concreto a interpretação sistemática do artigo 94, II, da Lei nº
9.472/97, obtida em cotejo com o artigo 60, § 1º, do mesmo diploma legal, bem como com os artigos
2º, II, 14 e 25, caput e § 1º, da Lei nº 8.987, de 13.2.1995 (regime de concessão e permissão de serviços
públicos), e com o artigo 175 da Constituição, aponta não só para a existência de substanciais
diferenças entre a prestação propriamente dita do serviço público de telecomunicações e as chamadas
“atividades inerentes”, como também para a impossibilidade de se transferir o desempenho daquela
primeira a terceiros estranhos às empresas concessionárias. Transcreve-se, por oportuno, o inteiro teor
dos citados dispositivos legais:
Constituição Federal - Artigo 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei,
diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de
licitação, a prestação de serviços públicos.
Lei nº 9.472/97 - Artigo 14. Toda concessão de serviço público, precedida ou não
da execução de obra pública, será objeto de prévia licitação, nos termos da
legislação própria e com observância dos princípios da legalidade, moralidade,
30 SANTOS. Carlos Maximiliano Pereira dos. Hermenêutica e Aplicação do Direito. 8ª Edição. Rio de Janeiro: Freitas
Bastos, 1965, p. 111.
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publicidade, igualdade, do julgamento por critérios objetivos e da vinculação ao
instrumento convocatório.
Lei nº 9.472/97 – Artigo 60. Serviço de telecomunicações é o conjunto de
atividades que possibilita a oferta de telecomunicações.
§ 1º – Telecomunicação é a transmissão, emissão ou recepção, por fio,
radioeletricidade, meios ópticos ou qualquer outro processo eletromagnético, de
símbolos, caracteres, sinais escritos, imagens, sons ou informações de qualquer
natureza.
Lei nº 8.987/95 – Artigo 2º. Para os fins do disposto nesta Lei, considera-se:
II - concessão de serviço público: a delegação de sua prestação, feita pelo poder
concedente, mediante licitação, na modalidade de concorrência, à pessoa jurídica
ou consórcio de empresas que demonstre capacidade para seu desempenho, por
sua conta e risco e por prazo determinado.
69.
Tem-se, pois, que a delegação de um determinado serviço público a um
concessionário pressupõe a prestação daquele pela empresa vencedora do certame licitatório em que o
Poder Público atestou a capacidade técnica da referida pessoa jurídica.
70.
Outrossim, a análise do artigo 25, caput, da Lei nº 8.987/95, em cotejo
com seu § 1º, indica que o serviço público concedido à empresa vencedora do certame prévio não se
confunde com aquelas atividades conexas (inerentes, acessórias ou complementares) passíveis de
serem levadas a cabo por terceiros. Assim, enquanto o desempenho do serviço público
propriamente dito incumbe à concessionária, as atividades suplementares àquele primeiro
poderão, em caráter excepcional, ser destinadas a outros particulares não contemplados pela
concessão. Veja-se o que diz, textualmente, o artigo referido:
Artigo 25. Incumbe à concessionária a execução do serviço concedido, cabendolhe responder por todos os prejuízos causados ao poder concedente, aos usuários
ou a terceiros, sem que a fiscalização exercida pelo órgão competente exclua ou
atenue essa responsabilidade.
§ 1º. Sem prejuízo da responsabilidade a que se refere este artigo, a concessionária
poderá contratar com terceiros o desenvolvimento de atividades inerentes,
acessórias ou complementares ao serviço concedido, bem como a implementação
de projetos associados.
29
Alino da Costa Monteiro (in memoriam) • Roberto de Figueiredo Caldas • Mauro Menezes • Claudio
Santos Gustavo Ramos • Marcelise Azevedo • Ranieri Resende • Monya Tavares • Raquel Rieger •
Rodrigo Torelly Luciana Martins • Denise Arantes • Andréa Magnani • Dervana Coimbra • Laís Pinto
• Paulo Lemgruber Rodrigo Castro • Renata Fleury • Cíntia Roberta Fernandes • Moacir Martins •
Verônica Amaral Raquel Perrota • Leandro Madureira • Adovaldo Medeiros Filho • Thiago Henrique Sidrim •
Rafaela Possera Pedro Mahin • Mara Cruz • Nathália Monici • Milena Pinheiro • Raissa Roussenq • Pedro
Felizola Rachel Dovera • Tércio Mourão • Marcelo Vieira • Juliana Bomfim • Rubstênia Silva • Hugo Moraes
Carolina Ávila • Rayanne Neves • João Gabriel Lopes • Catarina Lopes • Jéssica Costa • Danielle Ferreira
Aline Sterf • Roberto Drawanz • Érica Coutinho • Carina Pottes • Rodrigo Sampaio • Priscila Faro • Tatiana Dias
Virna Cruz • Luís Carlos Coentro • Vinicius Serrano
71.
No caso do serviço público de telecomunicações, o conjunto de
prestações cuja execução se destina às empresas concessionárias é aquele definido de maneira
autoexplicativa no artigo 60, § 1º, da Lei nº 9.472/97, já transcrito.
72.
Infere-se, portanto, que as chamadas “atividades inerentes (...) ao
serviço” mencionadas no artigo 94, II, da Lei nº 9.472/97 não se confundem – sob pena de estar-se
adotando interpretação que gera antinomia sistêmica - com a própria prestação do serviço
público de telecomunicações, mesmo sendo a este intimamente ligadas. Dito em outros termos,
atividades inerentes são aquelas conexas à transmissão, emissão ou recepção dos sinais sonoros e
gráficos que, muito embora sejam necessárias ou mesmo imprescindíveis para a concretização das
referidas etapas, não integram o conjunto de procedimentos mencionado no artigo 60 da Lei nº
9.472/97.
73.
Não há dúvidas, portanto, de que, em cotejo com o teor do artigo 60, §
1º, da Lei nº 9.472/97, bem como com o artigo 25 da Lei nº 8.987/2005, as atividades que integram o
núcleo essencial do serviço público de telecomunicações devem ser desempenhadas diretamente pelas
respectivas concessionárias.
74.
Diante disso, qualquer interpretação do artigo 94, II, da Lei nº 9.472/97
que permita a terceirização de atividade-fim gerará uma antinomia no sistema normativo vigente,
permitindo conduta que o restante do ordenamento veda, inclusive conflitando com norma
constitucional.
75.
Assim, as “atividades inerentes” mencionadas no artigo 94, II, da Lei nº
9.472/97 não se confundem com o conjunto de misteres que integram o conceito de
“telecomunicações”. Entender-se o contrário, equivalerá a permitir o desempenho de serviço público
concedido por pessoas jurídicas estranhas às concessionárias, o que vai de encontro não só ao artigo
175 da Constituição Federal, como também aos artigos 2º, II, e 14 da Lei nº 8.987/95, conforme bem
assinala Celso Antônio Bandeira de Mello:
30
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Tendo sido visto que a concessão depende de licitação – até mesmo por
imposição constitucional – e como o que está em causa, ademais, é um serviço
público, não se compreenderia que o concessionário pudesse repassá-la a
outrem, com ou sem a concordância da Administração.
Com efeito, quem venceu o certame foi o concessionário, e não um terceiro
– sujeito, este, pois, que, de direito, não se credenciou, ao cabo da disputa aberta
com quaisquer interessados, ao exercício da atividade em pauta. Logo, admitir
a transferência da concessão seria uma burla ao princípio licitatório,
enfaticamente consagrado na Lei Magna em tema de concessão, e feriria o
princípio da isonomia, igualmente encarecido na Constituição.31 (Destacou-se).
76.
De igual modo, a compreensão do artigo 94, II, da Lei nº 9.742/97 à luz
dos fins sociais subjacentes à concessão do serviço público de telecomunicações (interpretação
teleológica) aponta para a imprescindibilidade de que a prestação deste último seja efetuada pelos
respectivos concessionários, vedando-se o repasse de tais misteres para terceiros alheios à prévia
licitação levada a cabo pelo Poder Público.
77.
Tal assertiva se constata na medida em que o próprio conceito jurídico
de “concessão de serviço público” pressupõe a implementação de uma relação bilateral entre o Poder
Público e o concessionário, tendo por objeto a transferência de encargos daquele primeiro para este
último, não se compatibilizando, portanto, com a delegação de suas atividades essenciais a outras
pessoas jurídicas, na forma pretendida pela Recorrente.
78.
Nesse sentido, Jean Rivero conceitua a concessão de serviço público
como “um modo de gestão de um serviço em que uma pessoa pública, o concedente, encarrega por um
contrato uma pessoa privada, o concessionário, de fazer funcionar o serviço durante um certo tempo.”32
Em reforço a tal definição, Hely Lopes Meirelles caracteriza o contrato de concessão como um “ajuste
de Direito Administrativo bilateral, oneroso, comutativo e realizado intuitu personæ”33.
31 MELLO. Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 18ª Edição. São Paulo: Malheiros Editores,
2005. p. 676-677.
32 RIVERO. Jean. Trad: SOARES. Rogério Ehrhardt. Direito Administrativo. Coimbra: Almedina, 1981. p. 515.
33 MEIRELLES. Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 25ª Edição. São Paulo: Malheiros Editores, 2000. p.
350.
31
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79.
De outro turno, o regime de concessão delineado no artigo 175 da
Constituição Federal, bem como nas Leis nº 8.987/95 e 9.472/97, tem por escopo a transferência dos
serviços públicos para particulares previamente selecionados que demonstrem capacidade suficiente
para prestá-los de forma adequada e apta a satisfazer as necessidades da população. Não por outra
razão, o artigo 2º, II, da Lei nº 8.987/95 classifica a concessão de serviço público como “a delegação”
da prestação deste último (...) “mediante licitação (...) à pessoa jurídica ou consórcio de empresas que
demonstre capacidade para seu desempenho, por sua conta e risco e por prazo determinado.” E,
paralelamente a isto, o artigo 6º do referido diploma legal determina que “toda concessão (...)
pressupõe a prestação de serviço adequado ao pleno atendimento dos usuários”, compreendendo-se
em tal definição o serviço que “satisfaz as condições de regularidade, continuidade, eficiência,
segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação.”
80.
Tendo em vista, portanto, o conceito de “concessão” delineado no artigo
2º, II, da Lei nº 8.987/95, bem como os fins sociais vislumbrados pelos dispositivos legais em comento
- a apontarem para a prestação adequada, eficiente, segura e contínua dos serviços públicos à
população por agentes devidamente capacitados – resta evidente que o desempenho de parcelas do
serviço de telecomunicações por terceiros estranhos às respectivas concessionárias não se
coaduna com as referidas finalidades.
81.
Com efeito, o eventual repasse de tais atividades-fim a terceiros, para
além de desvirtuar integralmente o conceito legal de “concessão”, acaba por colocar em risco a
prestação adequada, eficiente, segura e contínua do serviço público de telecomunicações, na medida
em que pessoas jurídicas diversas da concessionária devidamente habilitada pelo Poder Público no
respectivo processo licitatório exercerão os misteres que incumbem legalmente àquela, por força do
artigo 25, caput, da Lei n° 8.987/95 c/c o artigo 60, § 1°, da Lei n° 9.472/97.
82.
Diante disso, resta evidente que os fins sociais vislumbrados pelos
dispositivos a regulamentarem a concessão das atividades de telecomunicações – aí incluído o artigo
94, II, da Lei n° 9.472/97 – não se coadunam com o repasse do referido serviço público a terceiros,
inclusive e especialmente porque, quando a Lei fala em possibilidade de atividade inerente, não está
32
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ai incluído, conforme demonstrado, o exercício de atividade-fim da empresa de telecomunicações.
d) Cláusula de reserva de plenário e princípio da colegialidade ilesos. Perfeita preservação
do espírito e da literalidade do artigo 97 da Constituição.
83.
O caso eleito como paradigma para o Tema nº 739 de repercussão geral
no âmbito do Excelso Supremo Tribunal Federal gira em torno de v. acórdão proferido pelo Colendo
TST que, aplicando a Súmula 331/TST (itens I e III), manteve anterior decisão regional que reconheceu
a responsabilidade de empresa operadora de telefonia por obrigações trabalhistas relativas a atendente
de call center, porquanto as atividades do trabalhador terceirizado envolviam atendimento aos clientes,
contratação, alteração e encerramento de serviços, entre outros, a representar evidente atividade-fim
da empresa de telecomunicações.
84.
Ao submeter o Tema nº 739 ao Plenário Virtual, o Excelentíssimo
Ministro Relator ponderou que a não-aplicação do artigo 94, II, da Lei Geral de Telecomunicações
possivelmente defluiria de uma indireta declaração de inconstitucionalidade, o que, a seu turno, poderia
representar postura jurisdicional contrária à Súmula Vinculante nº 10 e ao artigo 97 da Constituição
Federal.
85.
Tais reflexões, contudo, dependeriam de o v. acórdão recorrido (e os
demais que sejam, eventualmente, a ele análogos) ter deixado de aplicar a norma sob a premissa de
que ela seria inconstitucional, o que não se verifica, em absoluto, na espécie, permissa venia. Em
verdade, o v. acórdão recorrido está construído sobre o debate – em sua essência já travado e
resolvido na Súmula nº 331/TST – de que a terceirização de atividade-fim para suprir
necessidade não-eventual em empresa de telecomunicações não convida à aplicação do artigo 94,
II, da Lei nº 9.472/97, que se destina a situações diversas, conforme se expôs no tópico anterior.
86.
Isso porque, sempre que reunidos os requisitos dos artigos 2º e 3º da
CLT, estar-se-á diante de um contrato individual de trabalho entre o trabalhador e a tomadora de
33
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serviços, a revelar o caráter escuso da participação de empresa interposta, situação evidentemente
diversa da prevista quando da edição da Lei Geral das Telecomunicações, cujo espírito não comporta,
evidentemente, permitir a burla das normas constitucionais e laborais vigentes. Trata-se, portanto,
da simples identificação de que o caso concreto está fora do escopo normativo de artigo de lei. Intactos,
portanto, a Súmula Vinculante nº 10 do E. STF, bem como o artigo 97 da Constituição.
87.
Conforme se verifica da leitura do trecho a seguir colacionado, extraído
do acórdão regional, mantido e transcrito no v. acórdão recorrido (do TST), as características
peculiares do caso – o exercício de atividades-fim da empresa, o fato de a prestação de serviços ser
feita em proveito exclusivo a uma única tomadora e a subordinação direta – demonstram que a
terceirização foi usada como forma de fraudar direitos laborais, ilicitude que afasta a aplicação da
Lei nº 9472/97 e que atrai a incidência da Súmula nº 331/TST, pelo que não houve, no caso, declaração
de inconstitucionalidade de dispositivo de lei, mas apenas interpretação sistemática das normas
pertinentes aos fatos apresentados:
No caso, a reclamante foi contratada para prestar serviços exclusivamente à
segunda ré, conforme confessou o preposto da 1ª reclamada, na audiência de f.
85.
Portanto, suas atividades estavam inseridas na dinâmica estrutural da empresa
tomadora de serviços, o que revela a presença de subordinação, dado que aponta
para a ilicitude da terceirização levada a efeito.
Em situações como estas, em que o empregado presta serviços exclusivamente a
um determinado tomador de serviços, na atividade econômica principal deste, a
relação de emprego com a prestadora de serviços representa apenas intermediação
irregular de mão-de-obra, com o intuito de evitar a obtenção de direitos
assegurados à categoria profissional dos empregados da tomadora, o que enseja
tratamentos desiguais, gerando situações repudiadas pela ordem juslaboral.
De fato, utilizar a terceirização de mão de obra para o único fim de reduzir custos
é desrespeitar os princípios constitucionais fundamentais da pessoa humana,
sobremodo os postulados de tutela do direito do trabalho. Não se pode esquecer,
ademais, que o princípio básico da nossa ordem econômica é a valorização do
trabalho humano, o que também ocorre com a nossa ordem social (artigos 170 e
193 da Constituição da República).
A terceirização das atividades tratadas neste caso implica o desvirtuamento de
normas trabalhistas e violação ao artigo 9º da CLT, que é parâmetro para a
interpretação de qualquer outro dispositivo infraconstitucional, incluindo-se a Lei
34
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9.742/97.
Vale frisar que não se está a declarar a impossibilidade de a tomadora terceirizar
serviços, mas apenas a se ponderar que, no caso específico dos autos, a
terceirização não atendeu aos princípios e normas de proteção efetiva ao trabalho
humano, fato que singulariza a presente contenda.
E a par da irregularidade da contratação - que já seria suficiente para o
deferimento do pleito obreiro - não se pode olvidar, ainda, que o conjunto
probatório constante dos autos revela a presença de todos os elementos
fáticojurídicos da relação de emprego previstos no artigo 3º da CLT, quais sejam:
trabalho prestado a um tomador, com pessoalidade, não eventualidade,
onerosidade e subordinação jurídica, essa última manifestada na sua modalidade
estrutural. (grifos atuais)
Portanto, suas atividades estavam inseridas na dinâmica estrutural da empresa
tomadora de serviços, o que revela a presença de subordinação, dado que aponta
para a ilicitude da terceirização levada a efeito.
Em situações como estas, em que o empregado presta serviços exclusivamente a
um determinado tomador de serviços, na atividade econômica principal deste, a
relação de emprego com a prestadora de serviços representa apenas intermediação
irregular de mão-de-obra, com o intuito de evitar a obtenção de direitos
assegurados à categoria profissional dos empregados da tomadora, o que enseja
tratamentos desiguais, gerando situações repudiadas pela ordem juslaboral.
De fato, utilizar a terceirização de mão de obra para o único fim de reduzir custos
é desrespeitar os princípios constitucionais fundamentais da pessoa humana,
sobremodo os postulados de tutela do direito do trabalho. Não se pode esquecer,
ademais, que o princípio básico da nossa ordem econômica é a valorização do
trabalho humano, o que também ocorre com a nossa ordem social (artigos 170 e
193 da Constituição da República).
A terceirização das atividades tratadas neste caso implica o desvirtuamento de
normas trabalhistas e violação ao artigo 9º da CLT, que é parâmetro para a
interpretação de qualquer outro dispositivo infraconstitucional, incluindo-se a Lei
9.742/97.
Vale frisar que não se está a declarar a impossibilidade de a tomadora terceirizar
serviços, mas apenas a se ponderar que, no caso específico dos autos, a
terceirização não atendeu aos princípios e normas de proteção efetiva ao trabalho
humano, fato que singulariza a presente contenda.
E a par da irregularidade da contratação - que já seria suficiente para o
deferimento do pleito obreiro - não se pode olvidar, ainda, que o conjunto
probatório constante dos autos revela a presença de todos os elementos fáticojurídicos da relação de emprego previstos no artigo 3º da CLT, quais sejam:
trabalho prestado a um tomador, com pessoalidade, não eventualidade,
onerosidade e subordinação jurídica, essa última manifestada na sua modalidade
estrutural.
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88.
Assim, a aplicação, in casu, da Súmula nº 331/TST, dispensou qualquer
declaração de inconstitucionalidade do artigo 94, II, da Lei nº 9.472/97. Tampouco houve o
esvaziamento, total ou parcial, do conteúdo normativo da disposição infraconstitucional em exame.
Ao contrário. O acórdão recorrido teve o cuidado de exteriorizar que a terceirização não é, em si,
vedada ou ilícita, mas que, neste caso específico, à luz do que foi produzido pelas testemunhas na
audiência de instrução, verificou-se que o instituto foi usado de forma ilícita.
89.
Realmente, a v. decisão recorrida apenas cuidou de proceder à subsunção
da hipótese fática dos autos à Lei nº 9.472/97, concluindo por sua inaplicabilidade ao caso concreto,
que em nada se assemelha ao controle de constitucionalidade que demanda prévia manifestação do
Órgão Especial ou à negativa de vigência à norma em destaque.
90.
Tal constatação pode ser asseverada pela remissão a outro acórdão
paradigmático sobre a matéria, proferido no âmbito do Tribunal Superior do Trabalho, sob a relatoria
do Ministro Luís Phillipe Vieira de Mello (Processo nº TST-RR-36100-07.2007.5.24.0004, 1ª Turma),
cuja ementa registra:
RECURSO DE REVISTA – BRASIL TELECOM S.A. – LEI GERAL DE
TELECOMUNICAÇÕES – SERVIÇOS DE CALL CENTER –
TERCEIRIZAÇÃO EM ATIVIDADE FIM – EMPRESA DO RAMO DE
TELECOMUNICAÇÕES – VÍNCULO EMPREGATÍCIO. (...)
A Lei Geral de Telecomunicações, em seus diversos dispositivos, cuida dos
serviços de telefonia em suas singularidades, e, em especial, no que concerne ao
seu art. 210 – STF ADIN 1668/98 – negando a suspensão da eficácia do referido
dispositivo, - quanto às concessões, às permissões, às autorizações e às respectivas
licitações, cuja dicção afasta da órbita de incidência de suas relações jurídicas as
Leis nº 8.666/93, 9.074/95 e 8.987/95. O art. 94, II, § 2º da Lei nº 9.472/97 dispõe
que a concessionária do serviço poderá contratar com terceiros o desenvolvimento
de atividades inerentes, acessórias ou complementares ao serviço. A leitura atenta
do dispositivo mencionado permite inferir que não houve autorização do
legislador para a intermediação de mão de obra, mas a contratação com terceiros
para o desenvolvimento de atividades inerentes, acessórias ou complementares ao
serviço. Ou seja, refere-se à prestação de serviços prevista no art. 593 do Código
Civil. A contratação permitida é ‘com terceiros’ e não ‘de terceiros’. A atividade
desenvolvida pela reclamante, objeto da pactuação existente entre as reclamadas,
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refere-se às atividades de call center (teleatendimento), os quais estão
intimamente relacionados aos direitos dos usuários dos serviços de
telecomunicações: a informação adequada sobre as condições de prestação de
serviços, suas tarifas, condições e preços e o direito a registrar e obter respostas a
reclamações quanto aos serviços públicos prestados. Ou seja, direitos assegurados
no art. 3º da Lei nº 9.472/97.
91.
Por outro lado, a jurisprudência dessa Excelsa Corte já está sedimentada
no sentido de que não ofende a Súmula Vinculante nº 10/STF o acórdão que deixa de aplicar
determinado dispositivo de lei a um caso concreto, mediante exercício de interpretação
infraconstitucional, conforme se verifica da leitura da ementa exemplificativa a seguir transcrita:
RESERVA DE PLENÁRIO – VERBETE VINCULANTE Nº 10 DA SÚMULA
DO
SUPREMO
–
INCONSTITUCIONALIDADE
VERSUS
INTERPRETAÇÃO DE NORMA LEGAL. O Verbete Vinculante nº 10 da
Súmula do Supremo não alcança situações jurídicas em que o órgão julgador
tenha dirimido conflito de interesses a partir de interpretação de norma legal.
(Rcl 10865 AgR, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado
em 27/02/2014, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-063 DIVULG 28-03-2014
PUBLIC 31-03-2014).
USURPAÇÃO DE COMPETÊNCIA DO STF. NEGATIVA DE SEGUIMENTO
A RECURSO EXTRAORDINÁRIO. EMPRÉSTIMO COMPULSÓRIO.
ELETROBRÁS. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO DA SÚMULA VINCULANTE
Nº 10. MERA INTERPRETAÇÃO DE TEXTO LEGAL QUE NÃO
CONSUBSTANCIA DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE POR
ÓRGÃO FRACIONÁRIO. PRECEDENTES. Decisões reiteradas desta Corte
têm respaldado a prerrogativa de conferir determinada interpretação à lei como
atributo inerente à própria atividade jurisdicional, o que, em consequência,
afasta a equiparação proposta pela parte vencida entre as hipóteses de
interpretação desfavorável a seus interesses e de declaração de
inconstitucionalidade do dispositivo analisado. Agravo regimental a que se
nega provimento.
(Rcl 12107 AgR, Relator(a): Min. ROSA WEBER, Tribunal Pleno, julgado em
13/06/2012, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-150 DIVULG 31-07-2012
PUBLIC 01-08-2012).
37
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RECLAMAÇÃO. SÚMULA VINCULANTE N. 10. REVISÃO DE
BENEFÍCIO. LEI N. 9.032/95. DECISÃO DA SEXTA TURMA DO SUPERIOR
TRIBUNAL DE JUSTIÇA. RESERVA DE PLENÁRIO. NÃO CONFIGURADO
O DESCUMPRIMENTO DA SÚMULA VINCULANTE N. 10 DO SUPREMO
TRIBUNAL FEDERAL.
1. A simples ausência de aplicação de uma dada norma jurídica ao caso sob exame
não caracteriza, apenas por isso, violação da orientação firmada pelo Supremo
Tribunal Federal.
2. Para caracterização da contrariedade á súmula vinculante n. 10, do Supremo
Tribunal Federal, é necessário que a decisão fundamente-se na incompatibilidade
entre a norma legal tomada com base dos argumentos expostos na ação e a
Constituição.
3. O Superior Tribunal de Justiça não declarou a inconstitucionalidade ou afastou
a incidência dos artigos 273, §2º, e 475-O, do Código de Processo Civil e do artigo
115, da Lei n. 8.213/91, restringindo-se a considerá-los inaplicáveis ao caso.
4. Reclamação julgada improcedente.
(Rcl 6.944/DF. Supremo Tribunal Federal – Tribunal Pleno, Rel. Min. Carmen
Lucia, j. 23.06.2010 – destacou-se).
92.
Bem por isso, a aplicação da Súmula nº 331/TST não implica declaração
de inconstitucionalidade (expressa ou pela via oblíqua) do artigo 94, II, da Lei nº 9.472/97, sendo
apenas a materialização do posicionamento adotado pelo Tribunal Pleno do Colendo TST de que, se o
trabalhador exerce, de forma perene, atividade-fim de determinada empresa, sua contratação por
empresa interposta ofende os artigos 2º e 3º da CLT, que tão precisamente caracterizam e identificam
o vínculo de emprego direto.
e) Simples adoção de uma, entre várias interpretações possíveis, dos artigos 25, § 1º, da Lei
nº 8.987/95 e 94, II, da Lei nº 9.472/97.
93.
É de se destacar, sob outro prisma, que a Eg. Turma do Colendo TST
apenas adotou uma, entre várias, das interpretações possíveis do artigo 94, II, da Lei nº 9.472/97. Nesse
sentido, vale a renovar a transcrição, agora integral, da ementa de precedente da Eg. Subseção de
Dissídios Individuais I do TST, que, à unanimidade, apreciando justamente caso de validade de
terceirização de serviços de call center por empresa de telefonia, entendeu:
38
Alino da Costa Monteiro (in memoriam) • Roberto de Figueiredo Caldas • Mauro Menezes • Claudio
Santos Gustavo Ramos • Marcelise Azevedo • Ranieri Resende • Monya Tavares • Raquel Rieger •
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• Paulo Lemgruber Rodrigo Castro • Renata Fleury • Cíntia Roberta Fernandes • Moacir Martins •
Verônica Amaral Raquel Perrota • Leandro Madureira • Adovaldo Medeiros Filho • Thiago Henrique Sidrim •
Rafaela Possera Pedro Mahin • Mara Cruz • Nathália Monici • Milena Pinheiro • Raissa Roussenq • Pedro
Felizola Rachel Dovera • Tércio Mourão • Marcelo Vieira • Juliana Bomfim • Rubstênia Silva • Hugo Moraes
Carolina Ávila • Rayanne Neves • João Gabriel Lopes • Catarina Lopes • Jéssica Costa • Danielle Ferreira
Aline Sterf • Roberto Drawanz • Érica Coutinho • Carina Pottes • Rodrigo Sampaio • Priscila Faro • Tatiana Dias
Virna Cruz • Luís Carlos Coentro • Vinicius Serrano
TERCEIRIZAÇÃO ILÍCITA. EMPRESA DE TELECOMUNICAÇÕES. CALL
CENTER. ATIVIDADE-FIM DA RECLAMADA TOMADORA DE SERVIÇOS.
INTERPRETAÇÃO DOS ARTIGOS 25, § 1º, DA LEI Nº 8.987/95 E DO
ARTIGO 94, INCISO II, DA LEI Nº 9.472/97 E APLICAÇÃO DA SÚMULA Nº
331, ITENS I E III, DO TST. VÍNCULO DE EMPREGO ENTRE A
TOMADORA DE SERVIÇOS E O TRABALHADOR TERCEIRIZADO
RECONHECIDO. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO DA SÚMULA
VINCULANTE Nº 10 DO STF. MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL.
1. O serviço de call center é atividade-fim – e não atividade-meio – das empresas
concessionárias de serviço de telecomunicações. Assim, em observância à Súmula
nº 331, itens I e III, do TST, que consagrou o entendimento de que a terceirização
só se justifica quando implicar na contratação da prestação de serviços
especializados por terceiros em atividades-meio, que permitam a concentração
dos esforços da empresa tomadora em suas atividades precípuas e essenciais, temse que a terceirização desses serviços de teleatendimento pelas empresas
telefônicas configura intermediação ilícita de mão de obra, devendo ser
reconhecido o vínculo de emprego desses trabalhadores terceirizados diretamente
com os tomadores de seus serviços.
2. Com efeito, o aumento desses serviços nos últimos anos ocorreu em razão da
consolidação do Código de Defesa do Consumidor, que levou as empresas a
disponibilizarem os Serviços de Atendimento do Consumidor (SAC). E, diante
dessa exigência legal de manutenção de uma relação direta entre fornecedor e
consumidor, o serviço de call center tornou-se essencial às concessionárias dos
serviços de telefonia para possibilitar o necessário desenvolvimento de sua
atividade, pois é por meio dessa central de atendimento telefônico que o
consumidor, dentre tantas outras demandas, obtém informações, solicita e faz
reclamações sobre os serviços oferecidos pela empresa. Não é possível, portanto,
distinguir ou desvincular a atividade de call center da atividade fim da
concessionária de serviços de telefonia.
3. Por outro lado, a Lei nº 8.987/95, que disciplina a atuação das empresas
concessionárias e permissionárias de serviço público em geral, e a Lei nº 9.472/97,
que regula as concessões e permissões no setor das telecomunicações, são normas
de Direito Administrativo e, como tais, não foram promulgadas para regular
matéria trabalhista e não podem ser interpretadas e aplicadas de forma literal e
isolada, como se operassem em um vácuo normativo. Por isso mesmo, a questão
da licitude e dos efeitos da terceirização deve ser decidida pela Justiça do Trabalho
exclusivamente com base nos princípios e nas regras que norteiam o Direito do
Trabalho, de forma a interpretá-las e, eventualmente, aplicá-las de modo a não
esvaziar de sentido prático ou a negar vigência e eficácia às normas trabalhistas
que, em nosso País, disciplinam a prestação do trabalho subordinado, com a
aniquilação do próprio núcleo essencial do Direito do Trabalho – o princípio da
proteção do trabalhador, a parte hipossuficiente da relação de emprego, e as
próprias figuras do empregado e do empregador.
39
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4. Assim, não se pode mesmo, ao se interpretar o § 1º do artigo 25 da Lei nº
8.987/95 e o artigo 94, inciso II, da Lei nº 9.472/97, que tratam da possibilidade
de contratar com terceiros o desenvolvimento de "atividades inerentes" ao serviço,
expressão polissêmica e marcantemente imprecisa que pode ser compreendida em
várias acepções, concluir pela existência de autorização legal para a terceirização
de quaisquer de suas atividades-fim. Isso, em última análise, acabaria por permitir,
no limite, que elas desenvolvessem sua atividade empresarial sem ter em seus
quadros nenhum empregado e sim, apenas, trabalhadores terceirizados.
5. Ademais, quando os órgãos fracionários dos Tribunais trabalhistas interpretam
preceitos legais como os ora examinados, não estão eles, em absoluto, infringindo
o disposto na Súmula Vinculante nº 10 e, nem tampouco, violando o artigo 97 da
Constituição Federal, que estabelece a cláusula de reserva de plenário para a
declaração de inconstitucionalidade das leis em sede de controle difuso, pois não
se estará, nesses casos, nem mesmo de forma implícita, deixando de aplicar
aqueles dispositivos legais por considerá-los inconstitucionais.
6. A propósito, apesar da respeitável decisão monocrática proferida em
09/11/2010 no âmbito do Supremo Tribunal Federal, da lavra do ilustre Ministro
Gilmar Mendes (Rcl 10132 MC/PR – Paraná), na qual, em juízo sumário de
cognição e em caso idêntico a este, por vislumbrar a possibilidade de ter sido
violada a Súmula Vinculante nº 10 daquela Corte, deferiu-se o pedido de medida
liminar formulado por uma empresa concessionária dos serviços de
telecomunicações para suspender, até o julgamento final da reclamação
constitucional, os efeitos de acórdão proferido por uma das Turmas do TST, que
adotou o entendimento de que aqueles preceitos legais não autorizam, por si sós,
a terceirização de atividades-fim por essas concessionárias de serviços públicos,
verifica-se que essa decisão, a despeito de sua ilustre origem, é, data venia,
isolada. Com efeito, a pesquisa da jurisprudência daquela Suprema Corte revelou
que foi proferida, mais recentemente, quase uma dezena de decisões monocráticas
por vários outros Ministros do STF (Ministros Carlos Ayres Britto, Dias Toffoli,
Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia Antunes Rocha, Joaquim Barbosa e Luiz
Fux) em que, em casos idênticos ao presente, decidiu-se, ao contrário daquele
primeiro precedente, não ter havido violação da Súmula Vinculante nº 10, mas
mera interpretação dessas mesmas normas infraconstitucionais e nem, muito
menos, violação direta (mas, se tanto, mera violação oblíqua e reflexa) de
qualquer preceito constitucional pelas decisões do TST pelas quais, ao
interpretarem aqueles dispositivos das Leis 8.987/95 e 9.472/97,
consideraram que essas não autorizam a terceirização das atividades-fim
pelas empresas concessionárias dos serviços públicos em geral e,
especificamente, na área de telecomunicações, negando-se, assim, provimento
aos agravos de instrumento interpostos contra as decisões denegatórias de
seguimento dos recursos extraordinários daquelas empresas.
7. O entendimento aqui adotado já foi objeto de reiteradas decisões, por maioria,
da mesma SBDI-1 em sua composição completa (E-ED-RR-586341-
40
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05.1999.5.18.5555, Redator designado Ministro Vieira de Mello Filho, Data de
Julgamento: 29/05/2009 - DEJT de 16/10/2009; E-RR-134640-23.2008.5.03.
0010, Relatora Ministra Maria de Assis Calsing, Data de Julgamento: 28/06/2011,
DEJT de 10/08/2012).
8. Aliás, esse posicionamento também não foi desautorizado e nem superado pelos
elementos trazidos à consideração dos Ministros do TST na Audiência Pública
ocorrida no TST nos dias 04 e 05 de outubro de 2011 e convocada pela Presidência
desse Tribunal, os quais foram de grande valia para a sedimentação do
entendimento ora adotado. Os vastos dados estatísticos e sociológicos então
apresentados corroboraram as colocações daqueles que consideram que a
terceirização das atividades-fim é um fator de precarização do trabalho,
caracterizando-se pelos baixos salários dos empregados terceirizados e pela
redução indireta do salário dos empregados das empresas tomadoras, pela
ausência de estímulo à maior produtividade dos trabalhadores terceirizados e pela
divisão e desorganização dos integrantes da categoria profissional que atua no
âmbito das empresas tomadoras, com a consequente pulverização da
representação sindical de todos os trabalhadores interessados.
9. É importante ressaltar, por fim, que decisões como a presente não acarretam o
desemprego dos trabalhadores terceirizados, pois não eliminam quaisquer postos
de trabalho. Essas apenas declaram que a verdadeira empregadora desses
trabalhadores de call center é a empresa concessionária tomadora de seus serviços
que, por outro lado, continua obrigada a prestar tais serviços ao consumidor em
geral – só que, a partir de agora, exclusivamente na forma da legislação
trabalhista, isto é, por meio de seus próprios empregados.
10. Assim, diante da ilicitude da terceirização do serviço de call center prestado
pela reclamante no âmbito da empresa de telecomunicações reclamada, deve ser
reconhecida a existência, por todo o período laborado, de seu vínculo de emprego
diretamente com a concessionária de serviços de telefonia, nos exatos moldes do
item I da Súmula nº 331 do TST, com o consequente pagamento, pela verdadeira
empregadora e por sua litisconsorte, coautora desse ato ilícito, de todos os direitos
trabalhistas assegurados pela primeira a seus demais empregados.
Embargos conhecidos e desprovidos.
(SbDI-I, TST-ERR-2938-13.2010.5.12.0016, Rel. Min. José Roberto Freire
Pimenta, Decisão de 8.11.2012).
94.
Evidente, portanto, que a Eg. Turma do Colendo TST, interpretando os
dispositivos infraconstitucionais pertinentes, entendeu que não era lícita a terceirização na hipótese
dos autos, justamente no exercício da competência constitucional atribuída à Justiça do Trabalho
(artigo 114, I, da Constituição).
41
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95.
Obviamente, ao adotar interpretação que restringe aplicação de uma certa
norma a determinados casos concretos, mantendo-a em relação a outros, o órgão jurisdicional não
precisa declarar previamente (sequer de modo implícito), a inconstitucionalidade da referida norma.
Nesse sentido é o precedente a seguir transcrito:
Caderneta de poupança. Direito adquirido. Interpretação do artigo 17 da Medida
Provisória nº 32/89 convertida na Lei 7.730/89. Redução do percentual da inflação
aplicável ao caso. - Inexistência de ofensa ao artigo 97 da Constituição
Federal. Com efeito, o acórdão recorrido não declarou a inconstitucionalidade do
artigo 17, I, da Medida Provisória nº 32/89, convertida na Lei 7.730/89, mas,
apenas, em respeito ao direito adquirido, o interpretou no sentido de que não se
aplicava ele às cadernetas de poupança em que, antes da edição dela, já se iniciara
o período de aquisição da correção monetária. Note-se que no controle difuso
interpretação que restringe a aplicação de uma norma a alguns casos,
mantendo-a com relação a outros, não se identifica com a declaração de
inconstitucionalidade da norma que é a que se refere o artigo 97 da
Constituição, e isso porque, nesse sistema de controle, ao contrário do que ocorre
no controle concentrado, não é utilizável a técnica da declaração de
inconstitucionalidade sem redução do texto, por se lhe dar uma interpretação
conforme à Constituição, o que implica dizer que inconstitucional é a
interpretação da norma de modo que a coloque em choque com a Carta Magna, e
não a inconstitucionalidade dela mesma que admite interpretação que a
compatibiliza com esta. - Falta de prequestionamento (súmulas 282 e 356) da
questão constitucional relativa ao direito adquirido no que diz respeito à redução
do percentual da inflação aplicável ao caso. Recursos extraordinários não
conhecidos.
(RE 184093, Relator(a): Min. MOREIRA ALVES, Primeira Turma, julgado em
29/04/1997, DJ 05-09-1997 PP-41894 EMENT VOL-01881-05 PP-00862)
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM
AGRAVO. DIREITO TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO
DE SENTENÇA. CONTRIBUIÇÕES PARA O SESC, SENAC, SESI, SENAI,
SAT E SEBRAE. MULTA MORATÓRIA. ARGUIÇÃO DE INOBSERVÂNCIA
DA CLÁUSULA DE RESERVA DE PLENÁRIO. INOCORRÊNCIA. AGRAVO
REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. O princípio da reserva de plenário resta
indene nas hipóteses em que não há declaração de inconstitucionalidade por
órgão fracionário do Tribunal de origem, mas apenas a interpretação e a
conclusão de que a lei invocada não é aplicável ao caso em apreço.
Precedentes: AI 684.976-AgR, Rel. Min. Cármen Lúcia, Primeira Turma, DJe de
02/06/2010; e RE 612.800-AgR, Rel. Min. Ayres Britto, Segunda Turma, DJe de
05/12/2011. 2. In casu, o acórdão recorrido originariamente assentou: “Tributário.
Contribuição Previdenciária. Legalidade do SAT. Constitucionalidade da
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cobrança das contribuições para o SESC, SENAC, SESI, SENAI e SENAC das
empresas que atuam no ramo industrial e comercial. Precedentes. Aplicação da
taxa SELIC como índice de atualização dos débitos fiscais. Multa Moratória no
percentual de até 20%, a teor do disposto no artigo 59 da Lei n. 8.383/91. Apelação
parcialmente provida.” 3. Agravo regimental desprovido.
(ARE 676006 AgR, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em
22/05/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-110 DIVULG 05-06-2012
PUBLIC 06-06-2012).
96.
Conclui-se, então, que a adoção de interpretação de texto de lei,
ponderando-se o restante das leis vigentes e pertinentes ao caso, não ofende o princípio da reserva de
plenário e não convida à incidência da Súmula Vinculante nº 10.
V.
97.
Da exegese do artigo 94, II, da Lei nº 9.472/97 à luz da Constituição.
A interpretação que a Recorrente busca dar ao artigo 94, II, da Lei nº
9.472/97, emprestando ao termo “inerente” a qualidade de carta branca para a terceirização de toda e
qualquer atividade em empresas de telecomunicações, não encontra guarida em outras normas do
sistema constitucional vigente, consoante se deduzirá a seguir.
a) Interpretação do artigo 94, II, da Lei nº 9.472/97 à luz do artigo 7º da Constituição.
98.
O contexto histórico que antecedeu o surgimento do Direito do Trabalho
tem sua origem mais remota no período iniciado com a passagem da Idade Moderna para a
Contemporânea (Séc. XVIII), marcado pelo triunfo da filosofia iluminista, pelas revoluções que
destituíram as monarquias absolutistas, pela ascensão da burguesia como classe politicamente
dominante e, principalmente, pela sobreposição do liberalismo. Nesse cenário, os cidadãos “livres e
iguais” eram considerados pelo Estado como centros de direitos e, nesse sentido, titularizavam uma
esfera de ação pessoal imune à interferência do Poder Público, que abrangia, na visão de John Stuart
Mill, a noção liberal de “autonomia privada”34.
99.
34
Não tardou para que os excessos da exploração realizada nesse ambiente
MILL. John Stuartigo Trad: MADEIRA. Pedro. Sobre a Liberdade. Lisboa: Edições 70, p. 61.
43
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liberal de não-regulação das condições de trabalho ficassem evidentes, pois a falta de intervenção
estatal acabou por permitir a exploração dos seres humanos em nível insuportável. Como assevera
Mario de La Cueva, a grande falha é o fato de que as normas pressupunham um humano abstrato,
olvidando-se do trabalhador real, que se consumia nas fábricas, morria em decorrência da ação das
máquinas nos locais de trabalho e vivia em condições miseráveis.35
100.
Os malefícios da postura distante do Estado ficaram patentes com o
advento da máquina, pela qual a burguesia adquiriu exclusivamente para si os meios de produção,
tornando-se a protagonista do processo industrial. O obreiro passara a ser, como diria Marx, um
“apêndice da máquina”, podendo ser substituído por outro operário no desempenho de seus misteres
sem maiores dificuldades. A partir de então, o trabalhador viu-se alienado não só de sua força laboral,
como também de sua principal moeda de troca nas relações com os detentores dos meios de produção:
o conhecimento.36 Soma-se a isso o fato de que a migração aos núcleos urbanos industriais gerou um
verdadeiro “exército de reserva”.
101.
Não é difícil reconhecer a situação de absoluta preponderância do
empresário, que passou a determinar unilateralmente as condições laborais, permitindo o arcabouço
jurídico fundado na falsa premissa liberal-burguesa de igualdade entre os contratantes, que poderiam
dispor livremente de seus direitos, sem qualquer intervenção estatal. Essa exploração desmesurada do
trabalho humano, obtido pela imposição de verdadeiros contratos de adesão, impôs à classe
trabalhadora a mais completa degradação37.
102.
A situação social insuportável gerada pela exploração predatória da força
de trabalho no contexto do “livre mercado” e a ideia de “isonomia formal”, que, nas palavras de Fábio
Konder Comparato, configurava uma “pomposa inutilidade para a legião crescente de trabalhadores,
compelidos a se empregarem nas empresas capitalistas”38, precipitou a assunção de nova postura por
DE LA CUEVA, Mario. El Nuevo Derecho Mexicano Del Trabajo. Tomo I. 21ª Edición. México: Porrúa, 2007. p. 9.
MARX. Karl. Trad: SCHMIDT. Ronaldo Alves. O Capital. Edição resumida por Julian Borchardt. 7ª Edição. LTC
Editora: Rio de Janeiro, 1982. p. 112-113.
37
LYON-CAEN. Gérard; PÉLISSIER. Jean; SUPIOT. Alain. Droit du Travail. 19e. édition. Paris: Dalloz, 1998. p. 8.
38
COMPARATO. Fábio Konder. A Afirmação Histórica dos Direitos Humanos. 3ª Edição. São Paulo: Saraiva, 2003. p.
52.
35
36
44
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parte do Estado, que passou a tutelar, por intermédio da atividade legislativa, a parte hipossuficiente
(ou seja, os obreiros), novidade legislativa que configura, nas palavras de Palomeque Lopez, “a
primeira e transcendental manifestação histórica da intervenção dos poderes públicos nas relações
entre privados.”39
103.
No dizer de Washington Luís da Trindade, “formaram-se direitos
públicos subjetivos, irrecusáveis a qualquer pessoa e com força de incidência para a Vida, a Dignidade
e a Liberdade, numa palavra, a Justiça, para que se fizessem presentes no fatal desequilíbrio entre os
interesses individuais elementares e a arregimentação social e econômica do Estado Industrial”40.
104.
A partir da elaboração das normas protetivas, o Estado dessacralizou a
autonomia privada e a propriedade e passou a considerar a vida e a integridade física dos trabalhadores
como matérias de ordem pública que justificavam a limitação à livre estipulação contratual e ao
desempenho das atividades econômicas lesivas àqueles bens jurídicos41.
105.
O princípio protetivo permanece atual, e foi incorporado em nosso
ordenamento constitucional, tendo sido cristalizado pelo caput do artigo 7º, cujo espírito normativo
não permite dar à liberdade contratual amplitude tal que autorize a terceirização de atividade-fim. A
própria existência do Direito do Trabalho parte da premissa de que é possível e desejável limitar as
possibilidades de maximização de lucro às custas dos trabalhadores.
106.
Destaque-se que o discurso jurídico que subjaz às críticas lançadas à
limitação imposta à terceirização de atividade-fim está ligado à disfarçada resistência ao modelo de
proteção social, na suposta inconveniência de conformar a realidade social às normas jurídicas
existentes, sacrifício feito em nome de uma suposta melhora na competitividade ou eficiência no
exercício da atividade econômica.
LOPEZ. Manuel Carlos Palomeque. Trad: MOREIRA. António. Direito do Trabalho e Ideologia. Coimbra: Almedina,
2001. p. 30.
40
TRINDADE, Washington Luiz da. O superdireito nas relações de trabalho. Salvador: Ed. Salvador, 1982, p. 96.
41
CAZZETTA. Giovanni. Trad: ÁLVAREZ. Clara. Estado, juristas y trabajo. Itinerarios del Derecho Del Trabajo em
El siglo XX. Madrid: Marcial Pons, 2010. p.44-45.
39
45
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107.
Como sugere Ivo Dantas, a análise jurídica que depende da verificação
das relações de poder operantes não pode desprezar o exame da finalidade da norma42. Desse modo, a
realidade não deve determinar que se abra mão das altas finalidades do Direito do Trabalho, que tem
como eixo constitucional o artigo 7º da Constituição.
108.
Tal dispositivo, ao explicitar em seu caput que o rol de direitos não é
exaustivo, e ao adotar como objetivo a melhoria da condição social dos trabalhadores, visa a
salvaguardá-los da diminuição de seus direitos laborais, o que redundaria em retrocesso social, como
acontecerá se houver permissão para a terceirização de atividade-fim de empresas.
109.
Ademais, no contexto atual, a grande maioria das pessoas se integra à
economia por meio de seu próprio trabalho, de modo que a proteção da relação de emprego é o caminho
mais abrangente e seguro de realização de diversos princípios que animam o texto constitucional como
um todo, tais como o da dignidade da pessoa humana, da justiça social, do bem-estar social e
individual, da subordinação da propriedade à sua função socioambiental e da igualdade.43
110.
O artigo 7º da Lei Maior tem por intuito deliberado promover o equilíbrio
de forças nas relações laborais e, em especial, limitar, em nome de bens jurídicos titularizados pelos
obreiros (tais como a integridade física e o próprio direito à subsistência), o livre exercício da
autonomia privada e a fruição absoluta do direito à propriedade.
111.
Tal restrição à autonomia privada em nome da solidariedade coletiva
partiu da premissa de que o indivíduo não é um ser isolado, alheio à coletividade, de modo que suas
ações e omissões não se limitam nem se esgotam com a singela consecução de seus próprios interesses,
afetando, colateralmente, todos aqueles que se situam ao seu redor, mormente quando o sujeito em
questão detém considerável poder econômico.44
DANTAS, Ivo. Instituições de Direito Constitucional Brasileiro. Curitiba:Juruá, vol. I, 1999, p. 77
DELGADO, Maurício Godinho e DELGADO, Gabriela Neves. Tratado jurisprudencial de direito constitucional do
trabalho. Vol. II. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2013. p. 35-36
44
Não por outra razão, Carlos de Cabo Martin, ao discorrer sobre o conteúdo do princípio constitucional da solidariedade
deixou assente que:
42
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Santos Gustavo Ramos • Marcelise Azevedo • Ranieri Resende • Monya Tavares • Raquel Rieger •
Rodrigo Torelly Luciana Martins • Denise Arantes • Andréa Magnani • Dervana Coimbra • Laís Pinto
• Paulo Lemgruber Rodrigo Castro • Renata Fleury • Cíntia Roberta Fernandes • Moacir Martins •
Verônica Amaral Raquel Perrota • Leandro Madureira • Adovaldo Medeiros Filho • Thiago Henrique Sidrim •
Rafaela Possera Pedro Mahin • Mara Cruz • Nathália Monici • Milena Pinheiro • Raissa Roussenq • Pedro
Felizola Rachel Dovera • Tércio Mourão • Marcelo Vieira • Juliana Bomfim • Rubstênia Silva • Hugo Moraes
Carolina Ávila • Rayanne Neves • João Gabriel Lopes • Catarina Lopes • Jéssica Costa • Danielle Ferreira
Aline Sterf • Roberto Drawanz • Érica Coutinho • Carina Pottes • Rodrigo Sampaio • Priscila Faro • Tatiana Dias
Virna Cruz • Luís Carlos Coentro • Vinicius Serrano
112.
Ademais, não apenas o artigo 7º, mas a Constituição como um todo, não
permite a adoção da lógica meramente pragmática. A limitada lógica do desenvolvimento econômico
estrito deve ceder o passo a uma visão de desenvolvimento social e econômico que se preocupe
também com utilidades sociais de caráter coletivo e individual. O desenvolvimento econômico, nessa
perspectiva, deve ser colocado a serviço das escolhas políticas e jurídicas da sociedade brasileira, em
particular aquelas explicitadas no Texto Constitucional de 198845.
b) Interpretação do artigo 94, II, da Lei nº 9.472/97 à luz dos artigos 40, 195 e 201 da
Constituição.
113.
Por outro lado, não é possível ignorar que a extensão que se pretende dar
ao artigo 94, II, da Lei Geral de Telecomunicações colide com normas constitucionais relativas ao
sistema previdenciário brasileiro.
114.
Isso porque a terceirização de mão-de-obra gera depreciação das
condições de salário nas relações laborais. Se na relação direta com a empresa o trabalhador possui a
garantia de seus direitos trabalhistas, com níveis salariais estabelecidos em convenções coletivas, e
“O princípio constitucional da solidariedade conduz a configurar a cidadania como ativa e não passiva e, sobretudo,
como cidadania social e não meramente individual. A cidadania social, portanto, desde este ponto de vista, leva à
consideração de que em uma perspectiva jurídico-constitucional (com vistas naturalmente a seu efeito social) o
indivíduo não é (...) um ´a priori´, mas sim um resultado, uma ´construção´ feita a partir da relação com os outros. (...)
Por isso, a dignidade, nesse contexto de constitucionalismo de Estado social, adquire um nível novo não só em sua
aplicação, como direito, senão também como princípio (...) convertendo-a em princípio constitucional de ´realização
social´e, portanto, não só fonte de direitos, senão de deveres, porque neste contexto de inter-relação solidária do Estado
social , se estabelecem as bases para justificar uma ´Drittwirkung´ não apenas negativa e de defesa em relação aos
demais, como também positiva em relação aos outros.”
No original: “El principio constitucional de solidariedad (...) conduce a configurar la ciudadanía como activa y no
pasiva, y, sobretodo, como ciudadanía social y no meramente individual. La ciudadanía social, por tanto, desde este
punto de vista, lleva a considerar que en una perspectiva jurídico-constitucional (con vistas naturalmente a su efecto
social) el individuo no es (...) un a priori, sino un resultado, una <<construcción>> hecha a partir y en relación con los
otros. (...) Por eso, la dignidad, en este contexto del constitucionalismo del Estado social, adquiere un nivel nuevo no
sólo en su aplicación como derecho, sino que, como principio, legítima la implicación de cada uno en la de los demás,
convertiéndola en prtincipio constitucional de <<realización social>> y, por tanto, no sólo fuente de derechos, sino de
deberes, porque en este contexto de interrelación solidaria del Estado social, se establecen las bases para justificar una
Drittwirkung no ya negativa de defensa frente a los demás, sino positiva hacia los otros.” MARTÍN. Carlos de Cabo.
Teoría Constitucional de la Solidariedad. Madrid: Marcial Pons, 2006. p. 57-58.
45
FONTES, Saulo Tarcísio de Carvalho. "Direito ao Desenvolvimento e Terceirização: Inter-relações entre os siestemas
econômico, jurídico, político e moral". In: ÁVILA, Any et alli (org.). Mundo do Trabalho: Atualidades, Desafios e
Perspectivas - Homenagem ao Ministro Arnaldo Sussekind. São Paulo:LTr, 2014, p. 136
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Carolina Ávila • Rayanne Neves • João Gabriel Lopes • Catarina Lopes • Jéssica Costa • Danielle Ferreira
Aline Sterf • Roberto Drawanz • Érica Coutinho • Carina Pottes • Rodrigo Sampaio • Priscila Faro • Tatiana Dias
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onde há uma participação sindical nas negociações desses direitos, nas relações de terceirização essa
realidade assume papel precário. De fato, em relações triangulares, com a intermediação de uma
empresa na contratação da mão-de-obra, os trabalhadores na maioria das vezes estão vinculados com
salários muito menores em comparação aos dos trabalhadores efetivos46.
115.
Com isso, a terceirização provoca um empobrecimento do trabalhador e
implica o rompimento das condições intergeracionais de sustentação do modelo de proteção social
contributivo, absolutamente solidário. Se o trabalhador ganha menos, possui menor capacidade
contributiva para manter o sistema previdenciário e, portanto, o efeito nas contas previdenciárias é
imediato. Não é demais afirmar que a permissão da terceirização em atividades-fim gerará uma
sobrecarga imediata no sistema previdenciário, com déficits que deverão ser equacionados pelo
orçamento público. Isso porque, com o modelo adotado pela Constituição, o trabalhador contribui
diretamente sobre aquilo que recebe como fruto de seu trabalho, nos termos dos artigos 40, 195 e 201
da Constituição. O trabalhador é, portanto, fonte de custeio fundamental para a manutenção do sistema
protetivo previdenciário.
116.
Da mesma forma, as empresas também são responsáveis pelo custeio da
previdência, com a incidência direta de contribuições sobre a sua folha de remunerações. A partir do
momento em que essa empresa transfere a contratação de sua mão-de-obra para uma empresa
intermediadora, é sobre a folha de salários da empresa prestadora de serviços que incidirá a
contribuição patronal. Assim, o achatamento dos salários pagos ao empregado terceirizado implicará
em diminuição dupla da fonte de custeio: tanto a parte que lhe cabe quanto a parte sob responsabilidade
da empresa terão como referência esse salário.
117.
Além da ruptura das condições intergeracionais do sistema protetivo, o
empobrecimento social provoca o Estado a amplificar as políticas assistenciais inclusivas. Com
menores fontes de custeio, a seguridade social passa a ser financiada pelo orçamento público. A
diminuição da capacidade contributiva previdenciária dos trabalhadores e necessária adoção de
Em estudo realizado pelo IPEA, em 2010 o salário médio de um trabalhador terceirizado correspondia a cerca de 54%
do salário de um trabalhador efetivo.
46
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medidas assistenciais geram a necessidade de se aumentar o custeio do sistema de seguridade social
pelo orçamento público, o que implica aumento da carga tributária e evidente distribuição desse
prejuízo para toda a sociedade, inclusive para a classe empresarial.
118.
Quanto mais pobre for uma sociedade, menor será a capacidade do
Estado de garantir a segurança social. A terceirização leva, portanto, ao rompimento da ordem social,
porque implica diretamente no desfavorecimento do primado do trabalho.
119.
As eventuais alegações de que o processo de terceirização favorece a
geração de empregos e que isso gerará um aumento de receita previdenciário também não servem para
contrapor os argumentos aqui trazidos. Isso porque, na verdade, o grande objetivo da terceirização é o
de diminuir custos do empregador. Além disso, a empresa tomadora de serviços deixa de se
responsabilizar pelas contribuições sociais incidentes para a formação do SAT – Seguro Acidente de
Trabalho e também por aqueles incidentes a maior quando há a utilização de atividade que exija o
exercício de atividades insalubres ou perigosas.
120.
Ademais, a terceirização também permite que a empresa tomadora possa
se abster de empregar o número mínimo de deficientes físicos, garantido por lei (artigo 98 da Lei nº
8.213/1991) e em observância ao texto constitucional (artigo 7º, XXXI, CF), já que permite a
contratação de diversas empresas prestadoras de mão de obra contemplando, cada uma, o número
máximo de trabalhadores que deixem de exigir a contratação dos portadores de necessidades especiais.
121.
Também há que se considerar que o não-atingimento dos requisitos
necessários para a concessão de benefícios programados (aposentadorias por idade e por tempo de
contribuição) em virtude da precarização advinda da terceirização implica no fato de que esse
trabalhador fará jus a um benefício em momento muito mais longo e imprevisto que o trabalhador
incurso numa relação direta de emprego. Com isso, o risco social de adoecimento, acidente e invalidez
é significativamente maior para o trabalhador terceirizado.
122.
Mas não é só. Com a triangulação da relação de trabalho, o trabalhador
terceirizado fica impedido de se tornar participante do sistema de previdência complementar
49
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eventualmente patrocinado pela empresa tomadora de seus serviços. Os recursos garantidores das
reservas técnicos dos fundos de pensão são aplicados em mercados de capitais, bolsas de valores,
fundos de investimento e na rede imobiliária, de forma a garantir o adimplemento do contrato
previdenciário firmado entre as partes. Portanto, toda a sociedade se privilegia da poupança formada
pela previdência complementar. Com isso, não é somente o trabalhador terceirizado quem perde pela
impossibilidade de usufruir de direitos garantidos aos trabalhadores efetivados. A sociedade também
deixa de contar com esses recursos, investidos em empresas fundamentais para a estruturação e
crescimento do país, que também repercutem como uma importante poupança nacional.
123.
Em termos previdenciários-contributivos, o deságio provocado pela
terceirização, seja pela diminuição dos valores das contribuições, pelo aumento dos riscos sociais, pela
necessária provocação/atuação de um sistema não-contributivo para garantir a proteção que poderia
ser gerida pela previdência social-contributiva ou pelas fraudes ao custeio, é medida que deve ser
considerada de maneira ampliada.
c) Interpretação do artigo 94, II, da Lei nº 9.472/97 à luz dos artigos 5º, caput, 7º, XXVI, 8º
e 9º, da Constituição.
124.
As consequências danosas da terceirização de atividade-fim das
empresas não se esgotam naquelas sentidas pelos trabalhadores individualmente considerados. Entre
os efeitos perniciosos da prática, encontra-se a fragmentação das entidades coletivas que atuam em
nome dos trabalhadores, uma vez que a mão-de-obra terceirizada é, estatisticamente, mais volátil e
intercambiável, o que diminui expressivamente o poder de barganha de sindicatos obreiros junto aos
representantes empresariais.
125.
De fato, o estímulo sindical à solidariedade é amplamente desinflado
quando os trabalhadores dos distintos segmentos de uma mesma empresa são impedidos de realizar
negociações coletivas conjuntas, em razão de estarem formalmente vinculados a empregadores
distintos. Com um menor contingente de associados, as entidades sindicais são debilitadas, tornandose este um potencial benefício a mais concedido ao empregador nos processos negociais. Este, que já
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se encontra em posição superior em razão de ser detentor dos meios de produção, pode contar ainda
com as fraturas internas da organização obreira para obter condições ainda mais vantajosas nos acordos
pactuados com os trabalhadores.
126.
Note-se que tal problema é maximizado no Brasil, em razão dos estreitos
limites da organização e da negociação coletiva no âmbito das categorias profissionais.
127.
Com o estímulo à terceirização, reforça-se a piora nas condições de
trabalho e reduz-se o poder de barganha dos sindicatos, como têm demonstrado pesquisas recentes,
como aquelas empreendidas a partir da análise do Sistema de Acompanhamento de Contratações
Coletivas (SAAC), do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos. A
análise das convenções e acordos coletivos registrados no mencionado sistema entre os anos de 2005
e 2009 permitem concluir que apenas 34% das unidades de negociação analisadas apresentaram
alguma cláusula sobre terceirização47.
128.
Essas cláusulas podem ser divididas em alguns grupos, conforme o seu
conteúdo. Em 26% dos acordos e convenções analisados, incluíram-se normas sobre o modo e os
limites de contratação de mão-de-obra terceirizada, modalidade mais comum de cláusula presente nos
processos negociais. Trata-se de regras que, em sua maior parte, são puramente restritivas, objetivando
um resguardo contra uma terceirização ilimitada das atividades. Salvo algumas exceções em que se
preveem responsabilidades mais acentuadas para empresas tomadoras de serviço, elas dizem muito
pouco respeito a garantias concedidas aos trabalhadores terceirizados. Apenas se registraram garantias
aos terceirizados em 9,7% dos acordos e convenções presentes no sistema, referentes a processos
negociais com tomadoras de serviço. Em pouco mais de 3% dos instrumentos foram observadas
cláusulas que preveem a extensão das garantias acordadas com a categoria dita principal aos
trabalhadores terceirizados. No que tange a cláusulas sobre organização sindical, somente 7% dos
dispositivos têm previsão nesse sentido. O conteúdo de tais cláusulas é composto de disposições
relacionadas a comissões sindicais e de previsões sobre o acesso a informações sobre os casos de
47
Tais dados constam da nota técnica n. 112/2012, do DIEESE, “Terceirização e negociação coletiva: velhos e novos
desafios para o movimento sindical brasileiro”.
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terceirização realizados pelas empresas.
129.
Como se pode observar, os trabalhadores terceirizados acabam por ser
excluídos, em muitas ocasiões, dos processos negociais de empresas tomadoras de serviços,
sujeitando-se a condição mais precária que aquelas sob as quais se encontram outros trabalhadores que
desempenham suas atividades nos mesmos espaços empresariais.
130.
Essa é advertência contida em artigo de natureza focada ao tema em
discussão, da lavra dos Excelentíssimos Ministros do Tribunal Superior do Trabalho Augusto César
Leite de Carvalho e Lélio Bentes Corrêa:
Por fim, acentua-se a impropriedade de excluir-se o trabalhador de sua categoria
e representação sindical a pretexto de que a terceirização seria, ela mesma, a
atividade econômica da empresa interposta. Em rigor, a subcontratação de
serviços não se confunde com a realização de atividade econômica autônoma,
que forjaria uma fragmentação da categoria profissional com sequelas
imprevisíveis, mas ao compartilhamento da atividade econômica desenvolvida
pela empresa que terceiriza.48
131.
Conclui-se que a terceirização frustra a organização dos trabalhadores
em torno do sindicato que representa seus reais interesses e que a alta rotatividade mina a força de
coalizão para negociar e conquistar a melhoria de suas condições sociais. Esvaziam-se, com isso, a
eficácia e a função social do direito coletivo à organização sindical (artigo 8º da CR), à greve (artigo
9º da CR) e ao reconhecimento constitucional das convenções e acordos coletivos de trabalho (artigo
7º, XXVI, da CR), além de se quebrar a isonomia entre trabalhadores em iguais ou semelhantes
condições (artigo 5º, caput, da CR).
VI.
132.
48
Da improcedência das alegadas violações aos artigos 5º, II, 170 e 175 da
Constituição.
De forma irretocável, o Excelentíssimo Ministro Relator afirma que a
CARVALHO, Augusto César Leite de; CORRÊA, Lélio Bentes. Terceirização no âmbito da empresa privada. In: Revista
do Tribunal Superior do Trabalho. Vol. 80, nº 3, jul/set 2014, p.56-57.
52
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Súmula nº 636/STF não permite conhecer do recurso extraordinário quanto à suposta ofensa ao artigo
5º, II, da Constituição, uma vez que não é possível rever a interpretação dada a normas
infraconstitucionais pelo v. acórdão recorrido. Tampouco vislumbrou violação direta ao texto
constitucional quanto à alegada ofensa ao princípio do devido processo legal, do contraditório e da
ampla defesa, tema já reputado infraconstitucional pelo Plenário Virtual do Excelso STF. Por fim,
acertadamente identificou a ausência de qualquer prequestionamento quanto aos artigos 5º, II, artigo
170, III, e artigo 175 da Constituição Federal, conforme se verifica da leitura do trecho abaixo
transcrito, retirado da manifestação submetida ao Plenário Virtual:
3. No que toca à alegação de ofensa ao artigo 5º, II, da Constituição Federal, em
relação ao princípio da legalidade, incide o óbice da Súmula 636/STF: Não cabe
recurso extraordinário por contrariedade ao princípio constitucional da legalidade,
quando a sua verificação pressuponha rever a interpretação dada a normas
infraconstitucionais pela decisão recorrida.
4. No que toca aos artigos 5º, II, LIV, 170, III, 175, da Constituição Federal, não
há prequestionamento no acórdão recorrido, tampouco a questão foi suscitada no
momento oportuno, em sede dos embargos de declaração, razão pela qual não
pode ser o recurso extraordinário conhecido no ponto, incidindo o óbice das
súmulas 282 e 356 do STF. Da mesma forma, no tocante aos artigos 5º, II, e 170,
III, da CF, o acórdão recorrido limitou-se a afirmar que eventual ofensa seria
reflexa, o que não autorizaria o recurso de revista. Assim, não há que se cogitar o
prequestionamento de tais dispositivos.
5. Quanto à alegação de ofensa aos princípios do devido processo legal, do
contraditório e da ampla defesa, diz respeito a temas cuja existência de
repercussão geral foi rejeitada por esta Corte na análise do ARE 748.371-RG (Rel.
Min. GILMAR MENDES, Tema 660), por se tratar de questão
infraconstitucional. Registre-se que a decisão de inexistência de repercussão geral
tem eficácia em relação a todos os recursos sobre matéria idêntica (artigo 543-A,
§ 5º, do CPC c/c artigo 327, § 1º, do RISTF).
133.
Em que pese a precisão dos fundamentos erigidos como óbices ao
conhecimento do apelo extraordinário quanto às referidas violações constitucionais, considerando o
entendimento cristalizado na Súmula nº 292/STF, a FITRATELP, prudentemente, oferece elementos
fáticos e jurídicos para também contribuir com a análise destas questões, caso venham a ser objeto de
deliberação colegiada.
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a) Da inexistência de ofensa ao artigo 170, III, CF. Ao revés, a função social da propriedade
é princípio desrespeitado pela terceirização em atividade-fim.
134.
A Recorrente afirma que a vedação da terceirização em atividade-fim
seria medida contrária à função social da propriedade, insculpida no inciso III do artigo 170 da
Constituição, uma vez que a Súmula nº 331/TST representaria obstáculo à busca do pleno emprego.
Absolutamente sem razão, porém.
135.
De início, cumpre rememorar que a relativização do direito à
propriedade, de modo a acomodar os demais direitos e princípios que poderiam, aparentemente, à
propriedade se contrapor, não é ideia recente. Já em 1917, a Constituição Mexicana determinava, em
seu artigo 27, que "A Nação terá, a todo tempo, o direito de impor à propriedade privada as
determinações ditadas pelo interesse público", noção repetida, dois anos mais tarde, na Constituição
de Weimar, que, em seu artigo 153, prescrevia que "A propriedade obriga e seu uso e exercício devem
ao mesmo tempo representar uma função no interesse social", preceito que não perdeu, pelo decurso
dos anos, sua relevância e pertinência.
136.
Nesse cenário internacional de valorização dos direitos humanos e
sociais, é inevitável que nosso ordenamento jurídico também evoluísse para tornar insustentável uma
concepção intransigente da propriedade, afastando-se de antigas e superadas premissas liberais da
individualidade, da liberdade e da propriedade, entendidas de modo absoluto, incompatíveis, assim,
com a centralidade da dignidade da pessoa e da valorização do trabalho.
137.
Se é verdade que a Constituição protege a propriedade, não é menos
verdade que demanda o respeito a sua função social. E, diferentemente do que foi afirmado pela
Recorrente, o respeito à função social da propriedade não passa pela autorização da terceirização de
atividade-fim. Ao revés. A prática reiterada da terceirização, especialmente em atividades-fim das
empresas, leva à crescente precarização dos direitos trabalhistas.
138.
É de se destacar o completo distanciamento entre o quadro fático
identificado na realidade e a insustentável afirmativa, feita pela Recorrente, de que o v. acórdão
54
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recorrido violaria o inciso III do artigo 170 da Constituição porque a terceirização de atividade-fim
seria ferramenta para a obtenção do pleno emprego, e que seu uso ofertaria, aos terceirizados, direitos
como recolhimento de INSS e de FGTS. Em verdade, o que os dados apresentados nos diversos estudos
anexos demonstram é que o vínculo empregatício que nasce do contrato de terceirização é
caracterizado pelo aumento no número e na gravidade dos acidentes de trabalho, pelos baixos salários,
pela submissão do terceirizado a condições de trabalho inferiores às experimentadas pelos
trabalhadores diretamente vinculados à empresa tomadora, bem como pelo enfraquecimento da
representação sindical.
139.
Não é coincidência, diga-se, que esse tipo de contrato é muitas vezes
utilizado quando há submissão de trabalhadores à condição análoga à de escravo e outras formas
degradantes de exploração da mão-de-obra, a demonstrar que a mera formalização do emprego não
constitui valor em si.
140.
Ademais, não há como sustentar que a terceirização permitiria aumentar
o número de vagas de emprego disponíveis. Veja-se que a experiência internacional ensina que, longe
de ser instrumento de efetivação do pleno emprego, a terceirização tem estreita ligação com o
desemprego estrutural e com a fuga das vagas de emprego. Como bem leciona Ermida Uriarte:
“O problema do emprego não é o Direito do Trabalho, nem o sistema de relações
de trabalho, cuja incidência no emprego é muito relativa. O verdadeiro problema
é um sistema que destrói mais do que gera postos de trabalho. A substituição da
mão-de-obra por tecnologia, a possibilidade técnica de produzir com menos mãode-obra, mais a conveniência economicista de manter um desemprego funcional
são os problemas reais. A solução não está no Direito do Trabalho, mas fora,
porque o problema em si está fora. A solução não pode ser uma progressiva
degradação das condições de trabalho, porque seria suicida e porque, além disso,
nenhum empregador contrata trabalhador de que não precisa, só porque é mais
barato, e nenhum empregador deixa de contratar trabalhador de que precisa,
porque é um pouco mais caro.”49
49
URIARTE, Oscar Ermida apud SUSSEKIND, Arnaldo. Direito constitucional do trabalho. 4ª Edição. Rio de Janeiro:
Renovar, 2010. p. 55.
55
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• Paulo Lemgruber Rodrigo Castro • Renata Fleury • Cíntia Roberta Fernandes • Moacir Martins •
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Rafaela Possera Pedro Mahin • Mara Cruz • Nathália Monici • Milena Pinheiro • Raissa Roussenq • Pedro
Felizola Rachel Dovera • Tércio Mourão • Marcelo Vieira • Juliana Bomfim • Rubstênia Silva • Hugo Moraes
Carolina Ávila • Rayanne Neves • João Gabriel Lopes • Catarina Lopes • Jéssica Costa • Danielle Ferreira
Aline Sterf • Roberto Drawanz • Érica Coutinho • Carina Pottes • Rodrigo Sampaio • Priscila Faro • Tatiana Dias
Virna Cruz • Luís Carlos Coentro • Vinicius Serrano
141.
O destacado jurista uruguaio registra, ademais, que na Argentina o
processo de flexibilização iniciado em 1991 foi acompanhado de um persistente aumento da
desocupação, que chegou a 20%, e da contratação precária, que chegou aos 85%. No Chile, o
desemprego aumentou a 20% após a reforma trabalhista de 1978/79 e, no Uruguai, o desemprego de
descolou do índice histórico de 10% e alcançou quase 20% durante o lapso da flexibilização50.
142.
Em suma, o que se vê é que o v. acórdão recorrido, longe de ofender, em
verdade prestigia o artigo 170, III, da Constituição, não merecendo provimento o recurso também nesse
particular.
b) Da inexistência de ofensa ao artigo 5º, II, da Constituição.
143.
A Súmula nº 636/STF obstaculiza o conhecimento do recurso quanto à
suposta ofensa ao princípio da legalidade, nos seguintes termos: “Não cabe recurso extraordinário por
contrariedade ao princípio constitucional da legalidade, quando a sua verificação pressuponha rever
a interpretação dada a normas infraconstitucionais pela decisão recorrida.”
144.
Acrescente-se a isso o fato de que no Tema nº 660, que teve como
leading case o ARE nº 748.371, de relatoria do Excelentíssimo Ministro Gilmar Mendes, o Plenário
Virtual asseverou que a violação ao princípio da legalidade é matéria infraconstitucional.
145.
Consoante fora destacado em tópico próprio, há diversos dispositivos
infraconstitucionais que devem ser examinados pelo julgador na avaliação de eventual fraude aos
direitos trabalhistas, em decorrência da adoção de terceirização em atividade-fim, merecendo destaque
os artigos 2º e 3º da CLT. De fato, ao definir empregador e empregado, além de tratar especificamente
do contrato de trabalho em seus artigos 442 e seguintes, a CLT estabelece caracteres básicos que
permitem defini-lo como “o negócio jurídico expresso ou tácito mediante o qual uma pessoa natural
obriga-se perante pessoa natural, jurídica ou ente despersonificado a uma prestação pessoal, não
50
Idem, ibidem.
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eventual, subordinada e onerosa de serviços”51.
146.
Havendo regulamentação infraconstitucional, e sendo ela clara no
sentido de limitar a terceirização de atividade-fim, ausente está o pressuposto mínimo necessário para
a invocação do inciso II do artigo 5º da Constituição, que abriga, como se extrai de sua literalidade, o
exercício da liberdade individual apenas nos espaços em que inexista regulamentação estatal, e, mesmo
assim, sempre que respeitados os princípios constitucionais pertinentes.
VII.
147.
Do pleito de reconsideração da decisão de suspensão das ações que tramitam na
Justiça do Trabalho.
Finalmente, manifesta-se a Federação-Interveniente sobre o pedido de
sobrestamento de todas a causas que apresentem questão idêntica à aqui tratada, no âmbito da Justiça
do Trabalho, formulado pela CONTAX e pela FEBRATEL. Referido pedido foi deferido, por meio de
v. decisão proferida em 23.9.2014, em que se determinou “o sobrestamento de todas a causas que
apresentem questão idêntica à que será resolvida com foros de repercussão geral no presente caso,
sem prejuízo do término de sua fase instrutória, bem como das execuções já iniciadas”.
148.
A v. decisão em questão, data maxima venia¸ merece ser objeto de
reconsideração, ao menos parcial, uma vez que a extensão da suspensão extrapola os limites do tema
em apreço.
149.
Com efeito, o artigo 328 do Regimento Interno do STF, que embasa tanto
o pedido de suspensão, quanto o subsequente deferimento, refere-se exclusivamente aos recursos
extraordinários que versem sobre matéria idêntica à debatida em sede de repercussão geral.
Transcreve-se trecho de voto do Excelentíssimo Ministro Cezar Peluso, adotado de forma unânime
pelo Plenário dessa Excelsa Corte, proferido em sede de reclamação interposta por litigante que
pretendeu ver suspenso processo que trata de matéria idêntica a tema que aguarda julgamento:
“O sobrestamento de recursos até o julgamento da matéria no Supremo Tribunal
51
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: Ltr, 2010, p. 468.
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Federal, de que tratam o § 1º do art. 543-B do Código de Processo Civil e os arts.
328 e 328-A do Regimento Interno desta Corte, concerne apenas aos recursos
extraordinários pendentes de julgamento no tribunal de origem.” (Rcl 6828 AgR,
Relator Ministro CEZAR PELUSO, Tribunal Pleno, julgado em 04/03/2009, DJe
07-05-2009 - grifos atuais).
150.
Nesse passo, as causas em que não houve, ainda, interposição de recurso
extraordinário, não poderiam ser objeto de suspensão processual.
151.
Por outro lado, não se deve perder de vista que a repercussão geral que
resultou no Tema nº 739/STF foi declarada sob a exclusiva premissa de que o tema envolve a
declaração (in)constitucionalidade do artigo 94, II, Lei nº 9.472/97, à luz do art. 97 da Constituição e
da Súmula Vinculante nº 10/STF.
152.
Assim, ao abarcar processos de instâncias ordinárias e sem
pronunciamento judicial, tem-se que a decisão cuja reconsideração ora se requer poderá atingir até
mesmo os feitos nos quais é impossível dizer se o magistrado ou o tribunal deixará de aplicar a Lei
Geral de Telecomunicações, ou então aqueles em que há pedidos diversos, inclusive de verbas salariais
e rescisórias, o que é muito comum em causas trabalhistas. Nesse cenário, o só fato de constar pedido,
em reclamação trabalhista, de responsabilização de empresa tomadora de serviços, seria suficiente para
retardar, indefinidamente, o recebimento de verbas de natureza alimentar.
153.
Por outro lado, à medida que a repercussão geral foi reconhecida
estritamente visando ao exame da observância do princípio da reserva de plenário, não se pode permitir
que o sobrestamento alcance decisões de primeiro grau de jurisdição, mas apenas os processos nos
quais um órgão fracionário de tribunal tenha deixado de aplicar a Lei Geral de Telecomunicações por
entendê-la inconstitucional, sem submeter a questão ao crivo da maioria absoluta de seus membros ou
de órgão especial.
154.
Nesse contexto, o deferimento da liminar pleiteada acarreta, em verdade,
dano inverso, em face do inegável engessamento que impõe às instâncias ordinárias da Justiça do
Trabalho, que se verão desprovidas de sua função primordial de interpretação das leis trabalhistas e da
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Constituição, mesmo diante do ajuizamento de ações trabalhistas que denunciem situações de fraudes
e de violações de direitos constitucionais trabalhistas em atividades de call center.
155.
Estar-se-á ferindo, com isso, o princípio da conformidade funcional, que
visa exatamente a:
Impedir, em sede de concretização da constituição, a alteração da
repartição de funções constitucionalmente estabelecida. O seu alcance
primeiro é este: o órgão (ou órgãos) encarregado da interpretação da lei
constitucional não pode chegar a um resultado que subverta ou perturbe
o esquema organizatório-funcional constitucionalmente estabelecido
(Ehmke).52
156.
O risco de dano inverso se estende, ainda, aos milhares de trabalhadores
atingidos pelos efeitos nefastos da terceirização em atividades de call center, que se veriam
subitamente desprotegidos das fraudes perpetradas em nome desse instituto e reiteradamente
desveladas pela Justiça do Trabalho.
VIII.
157.
Conclusão
Por todo o exposto, requer seja admitido o ingresso da FITRATELP, na
qualidade de amicus curiae, com o consequente deferimento de sua participação no processo, inclusive
para fins de sustentação oral na sessão de julgamento do presente recurso.
158.
Requer-se, por oportuno, a reconsideração (total ou, sucessivamente,
parcial) da v. decisão proferida em 23.9.2014, em que se determinou o sobrestamento de todas a causas
que apresentem questão idêntica à que será resolvida com foros de repercussão geral no presente caso,
sem prejuízo do término de sua fase instrutória, bem como das execuções já iniciadas, porquanto: (a)
a extensão da suspensão extrapola os limites do tema em apreço; (b) o sobrestamento de recursos até
o julgamento da matéria no Supremo Tribunal Federal, de que tratam o § 1º do art. 543-B do CPC e os
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição.7ª ed. Coimbra: Edições
Almedina, 2008, p. 1224.
52
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arts. 328 e 328-A do RISTF, concerne apenas aos recursos extraordinários pendentes de julgamento
no tribunal de origem; (c) a medida poderá acarretar dano inverso, postergando, por tempo indefinido,
o pagamento de verbas de natureza alimentar.
159.
Espera, por fim, que dessa participação possa resultar o reconhecimento
de que o recurso em apreço não reúne as condições mínimas de admissibilidade, e, caso venha a ter o
seu mérito apreciado, que lhe seja negado provimento, ante a perfeita adequação do v. acórdão
recorrido ao texto constitucional, uma vez que a limitação à terceirização de atividade-fim de empresa
concessionária de serviços de telecomunicações não representa desrespeito à cláusula de reserva de
plenário, de que cuidam o artigo 97 da Constituição e a Súmula Vinculante nº 10/STF.
Brasília - DF, 13 de outubro de 2014.
Roberto de Figueiredo Caldas
OAB/DF nº 5.939
Mauro de Azevedo Menezes
OAB/DF nº 19.241
Gustavo Teixeira Ramos
OAB/DF nº 17.725
Veronica Quihillaborda Irazabal Amaral
OAB/DF nº 19.489
João Gabriel Pimentel Lopes
OAB/DF nº 40.637
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ROL DE DOCUMENTOS ANEXOS
Doc. 01 – Procuração, ata de prorrogação do mandato, ata de eleição e posse e estatuto.
Doc. 02 – CNPJ da FITRATELP.
Doc. 03 – Dissertação de mestrado intitulada “Do outro lado da linha: poder judiciário, regulação e
adoecimento dos trabalhadores em call centers” (Renata Queiroz Dutra).
Doc. 04 – Estudo intitulado “Terceirização e desenvolvimento - uma conta que não fecha” (DIEESE).
Doc. 05 – Estudo intitulado “Terceirização e negociação coletiva - velhos e novos desafios para o
movimento sindical brasileiro” (DIEESE).
Doc. 06 – Estudo intitulado “O processo de terceirização e seus efeitos sobre as relações de emprego
no Brasil” (DIEESE).
Doc. 07 – Acórdão TST-E-RR-2938-13.2010.5.12.0016, Relator Ministro Freire Pimenta, DJ
26.3.2013.
Doc. 08 – Acórdão TST-RR-36100-07.2007.5.24.0004, Relator Ministro Vieira de Mello, DJ
30.11.2012.
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leia aqui a íntegra do pedido de intervenção como amicus curiae