Crescendo
De todas as pessoas que podem falar sobre o bullying acredito que alguns dos
professores não estão capacitados para critica-lo. Poxa, como dar crédito a alguém
que durante metade da sua vida escolar te expõe a formar uma fila com os demais
coleguinhas em "escadinha", do menor para o maior, na hora de cantar o hino ?
Sim, como você já percebeu na minha revolta eu era um dos primeiros da fila, em
uma área nebulosa que classificaria como entre "semi-pigmeu" e baixinho. Podia ser
só minha neurose na época, mas ser o segundo ou terceiro da fila te colocava numa
posição de constante aflição à cada entrada e saída de ano: "e se esse tampinha aí
da minha frente sair da escola, como é que eu fico ?". Aí você cresce (não muito) e
descobre que não, a fila do banco não funciona em "escadinha" também.
É inevitável: você com aquele físico de nadador de piscina infantil se olhando
no espelho, se perguntando: quando é que eu vou crescer ? Levou um tempo pra
perceber que a puberdade não chega completinha -barba, cabelo e bigode- assim
pra todo mundo. A minha atrasou um pouco (entre tantas outras coisas mais
preocupantes que podem atrasar na adolescência) mas as espinhas…ah, essas
foram de uma pontualidade britânica até com direito a chá, de cadeira, que me
faziam tomar esperando incontáveis consultas em dermatologistas.
É engraçado nessa idade se sentir mais velho com uns fios de cabelo no
queixo, até ficar de queixo caído quando a vida decide levar os tão cobiçados fios
de volta te mostrando o que é envelhecer de verdade, mesmo já estando
literalmente careca de saber que o tempo chega para todos. A maçã de Newton e
as maçãs do rosto, todas perecem com a maturidade mas a gravidade da situação
encontra seu jeito de safar-se no botox, a descoberta de maior expressão, com o
perdão do trocadilho, na área da estética dos últimos anos. A tia que gostava de
apertar bochechas alheias e falar que fazer careta podia te deixar com o rosto
daquele jeito pra sempre, hoje, nem careta consegue fazer mais.
Me lembro de ouvir os garotos falarem que dava certo, uma barbada, era
garantido: passar a gilette no rosto iria estimular, forçar a barba a crescer. Via meus
pai e outros tios com pequenas cicatrizes provocadas por navalhas. Mais do que
esperar a boa-vontade capilar do tempo era preciso tomar uma atitude, era preciso
querer ser homem. E hoje vejo que a vida soube esperar o momento certo. Numa
das primeiras manhãs, desde que comecei a morar sozinho, vi aqueles pontinhos
pretos ainda curtinhos, que me fizeram ficar esperando durante anos da minha
ansiosa pre-adolescência. Algo tão banal me fez perceber que agora não há volta, a
vida adulta chega com toda força dando um tapa na sua cara,que até então era de
bundinha de nenê.
Você começa perceber que ganhou mais uma obrigação justamente na fase
em tudo vira obrigação. Hora de trabalhar duro, mas também de aproveitar a vida,
até que os fiozinhos vão ficando clarinhos como se fossem a "bandeira branca" da
barba e dos cabelos, se rendendo ao tempo, te deixando em paz consigo mesmo.
Espero seguir baixinho mas sonhando alto, alegre, interessado, duvidando de
mentiras cabeludas e questionando verdades absolutas… quer dizer, menos a Ana
Hickmann. Todo mundo sabe que mentira tem perna curta.
Pedro Malta
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