Abrir Nº EDIÇÃO: 852 | Finanças | 14.FEV.14 - 20:30 Luz no fim da Safra Títulos ligados ao agronegócio chegam a R$ 1 bilhão e fortalecem o financiamento aos produtores rurais Por Natália FLACH Há pouco verde no segundo andar do edifício 1.728 da avenida Paulista, coração financeiro de São Paulo. Mesmo assim, foi de lá que a securitizadora Brasil Agrosec estruturou uma operação para financiar produtores rurais de uma cooperativa de insumos agrícolas de Eldorado do Sul, município gaúcho a 1.160 quilômetros de distância. Dentre as várias opções de financiamento, a Cooplantio escolheu o Certificado de Recebíveis do Agronegócio (CRA) e captou cerca de R$ 35 milhões de investidores de todos os cantos do País. A emissão tem três séries, com prazos de um a três anos, que pagam juros de mercado medidos pelo CDI mais 3,25% ao ano. Dinheiro para o campo: (da esq. para a dir.) Sérgio Penteado, Clídio Carvalho e Rodrigo Bahia, sócios da Agrosec, prepararam a emissão de CRA para a Cooplantio Esse quadro revela que a distância entre a cidade e o campo nunca esteve tão pequena. A expectativa é de que ela diminua cada vez mais com a nova safra de recursos para o agronegócio, que vão além do crédito bancário. “O volume de CRA será bem maior em 2014”, diz Clídio Carvalho, diretor da Brasil Agrosec. No ano passado, o volume desses instrumentos de renda fixa, que garantem rentabilidade livre de impostos ao investidor e antecipam recursos ao produtor, cresceu 161,8% ao atingir R$ 969 milhões, segundo dados da Cetip. Um mês depois, no fim de janeiro, o total emitido de CRA já ultrapassava R$ 1,12 bilhão. Parte desse avanço, em um mês fraco para o mercado, se deve à operação de R$ 85,5 milhões que foi estruturada pela securitizadora Octante para a indústria de defensivos agrícolas CCAB, com prazo de dez meses e pagando juros de CDI mais 1% ao ano. Outra operação que acaba de sair do forno é a da securitizadora Gaia Agro, que emitiu R$ 32 milhões em CRA com prazo de dez meses e juros de CDI mais 2,4% ao ano, para a trading de café e algodão Inter Agrícola. “É a primeira operação fechada com uma trading, em vez de um produtor”, diz João Pacifico, diretor da Gaia. “Ela quer conquistar a exclusividade dos fornecedores ao oferecer esse benefício.” Fernando Hoirman, da Camargue: estruturando um Fundo para comprar usinas em recuperação Os especialistas esperam que os papéis do agronegócio repitam o sucesso dos Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRI), que são dedicados a levantar recursos para o investimento em imóveis. Criados em 1997, os CRI ganharam popularidade a partir de 2004. Em 2013, o total emitido atingiu R$ 45 bilhões. “O peso do agronegócio na economia brasileira deverá fazer com que os CRA alcancem esse volume em poucos anos”, prevê Fernanda Mello, diretora da Octante. Segundo a Confederação Nacional da Agricultura (CNA), os produtores deverão demandar R$ 191,7 bilhões para custear o plano safra 2013/2104. Desse total, dizem os especialistas, 50% virá do crédito agrícola dos bancos e os 50% restantes virão da reaplicação de recursos próprios, de adiantamentos de fornecedores e dos papéis do agronegócio. Mello avalia que, se atingissem os R$ 45 bilhões dos papéis imobiliários, os CRA representariam 23,5% da necessidade de capital do setor. Fato é que os bancos privados estão realmente voltando os olhos para o campo. No caso do Bradesco, o crédito rural teve um salto de 21,2% para R$ 8,39 bilhões, no ano passado. No Itaú Unibanco, o avanço foi de 10,5% e o Santander estabeleceu a meta de dobrar o peso desses empréstimos em sua carteira em três anos. João Pacifico, da Gaia: primeiro CRA de uma trading para financiar produtores rurais Esse caminho da roça faz parte da estratégia de tornar a carteira de crédito menos exposta a operações consideradas arriscadas. O Banco do Brasil, tradicional líder no crédito do agronegócio, conseguiu ampliar sua participação em 2013. Os resultados apresentados na quinta-feira 13 mostram que o financiamento rural atingiu R$ 144,8 bilhões, alta de 34,1% em relação a 2012. Com isso, o BB passou a deter 66,1% do mercado, segundo dados do Sistema Nacional de Crédito Rural. “Na safra 2013-2014, já desembolsamos 60% do nosso objetivo de R$ 70 bilhões”, afirma Ivan de Souza Monteiro, vice-presidente de gestão financeira do BB. Segundo Aguinaldo Barbieri, gerente-executivo da diretoria de mercado de capitais do BB, o CRA é um complemento dessa atuação do banco. “Esperamos, em 2014, fazer o dobro de emissões”, diz. “Mas vai depender das condições de mercado.” Essa nova colheita de recursos pode até salvar indústrias endividadas. A gestora de recursos paulista Camargue Capital está estruturando um fundo para comprar usinas de açúcar e álcool em recuperação judicial, no interior de São Paulo e no Nordeste, e sanear os seus balanços. “Fomos procurados por dois grupos que querem ser os aglutinadores desse processo”, afirma Fernando Hormain, da Camargue, sem revelar nomes. “A ideia é captar R$ 200 milhões e comprar algo como R$ 1 bilhão em ativos.” No ano passado, o grupo Clealco foi o único a fazer uma proposta de compra por uma usina em recuperação judicial, a Companhia Açucareira de Penápolis – Usina Campestre. Procurado, o grupo afirmou desconhecer o assunto. A nova safra de dinheiro para o campo deverá ajudar a transformar o País no maior produtor de soja do mundo. A previsão da safra 2013-2014, divulgada na terçafeira 11 pela Companhia Nacional de Abastecimento, é chegar a 90 milhões de toneladas de soja. Segundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico e a Food and Agriculture Organization, a demanda mundial por alimentos vai crescer entre 15% e 40% até 2019. A maior parte será suprida por países em desenvolvimento. Entre eles, com destaque, o Brasil. Que venham os recursos. Colaborou: Luiz Gustavo Pacete