PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 3ª REGIÃO Nona Turma PROCESSO nº 0011037-20.2014.5.03.0165 (RO) RECORRENTES: SIDNEI ALVIM SILVA (1) VIA OURO COLETIVOS LTDA. (2) RECORRIDOS: OS MESMOS RELATORA: DESEMBARGADORA MARIA STELA ÁLVARES DA SILVA CAMPOS EMENTA EMPRESA DE TRANSPORTE PÚBLICO URBANO. INTERVALO INTRAJORNADA. Nos termos do art. 71 §5º da CLT, com a redação dada pela Lei 12.619/12, é válida a cláusula estabelecida em acordo ou convenção coletiva que chancela o fracionamento do intervalo intrajornada de empregados de empresa de transporte coletivo, em razão das peculiaridades das condições de trabalho a que são submetidos esses trabalhadores. RELATÓRIO O MM. Juiz Lucas Vanucci Lins, da 2ª Vara do Trabalho de Nova Lima, julgou parcialmente procedente a reclamatória ajuizada por Sidnei Alvim Silva, para condenar a reclamada Via Ouro Coletivos Ltda. ao pagamento das parcelas discriminadas no dispositivo da r. sentença, id. 7e4e495, págs. 10/11, complementada pelos embargos de declaração de id. 8117eda. Reclamante e reclamada recorrem, conforme razões que respectivamente expõem em suas petições ids. 1602eb5 e 5142c2a. Contrarrazões pela reclamada- id. 9936825. Apesar de regularmente intimado (id. 3f91fe3), o reclamante não apresentou contrarrazões. É o relatório. QUESTÃO DE ORDEM Nada a deferir em relação ao requerimento formulado pela reclamada (id. 22131ea), de intimações em nome Dr. Matheus Bonaccorsi Fernandino, OAB/MG 88.005, uma vez que já Assinado eletronicamente. A Certificação Digital pertence a: Maria Stela Alvares da Silva Campos http://pje.trt3.jus.br/segundograu/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?nd=15022412165089700000002550380 Número do documento: 15022412165089700000002550380 Num. e674327 - Pág. 1 evidenciado registro neste sentido nos cadastros do PJE. JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE Conheço dos recursos ordinários interpostos pelas partes, satisfeitos os pressupostos de admissibilidade (as custas e depósito recursal foram corretamente recolhidos, cf. id. C705f14 e ddce679). Atendidos os pressupostos legais, as contrarrazões da reclamada também são conhecidas. PRELIMINAR DE JULGAMENTO EXTRA PETITA Sem razão a reclamada ao sustentar que o pagamento de horas extras pela redução da hora noturna não constou do rol de pedidos da inicial, tendo ocorrido julgamento extra petita. Não há falar em sentença extra petita, porquanto existiu pedido específico no item XIII, letra "i" (id. 719bc07- pág. 13): "Pagamento de diferenças de adicional noturno, inclusive sobre as horas prorrogadas, observando-se a redução da hora ficta noturna" (grifei). Rejeito. JUÍZO DE MÉRITO RECURSO DA RECLAMANTE HORAS EXTRAS PELAS PARTICIPAÇÕES EM REUNIÕES Insiste o reclamante que faz jus às horas extras pela participação obrigatória em reuniões fora do horário de trabalho. Sem razão. Embora incontroversa a existência de reuniões fora do horário de trabalho, Assinado eletronicamente. A Certificação Digital pertence a: Maria Stela Alvares da Silva Campos http://pje.trt3.jus.br/segundograu/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?nd=15022412165089700000002550380 Número do documento: 15022412165089700000002550380 Num. e674327 - Pág. 2 o autor não logrou demonstrar freqüência e obrigatoriedade na participação, o que foi objeto de declarações contraditórias pelas testemunhas, senão vejamos (cf. id. cfb1af6): A primeira testemunha do autor declarou que "o cobrador tinha participar de reuniões, sendo 4 a 5 por ano, as quais eram obrigatórias, pois tinham que preencher lista de presença; se não comparecessem às reuniões as pessoas ficavam de "cara virada" e a escala ficava mais pesada, o que já ocorreu com o depoente; as reuniões duravam em média de 1h, o que não era registrado no ponto; a reunião não era dentro do horário de trabalho". A segunda testemunha do autor afirmou que "o cobrador tinha que participar de reunião; tinha reunião de dois em dois meses, sendo obrigatória a participação; os que participavam das reuniões eram beneficiados nas escalas; a reunião durava em torno de 1h". A seu turno, a testemunha da reclamada declarou que "de três em três meses tinha uma reunião de 40/60 min que não era obrigatória, não havendo penalidade se não participassem, fora do horário de trabalho" (cf. Ata de Audiência de id. cfb1af6). Da análise dos depoimentos acima, conclui-se que conquanto as testemunhas do reclamante aleguem a obrigatoriedade na participação nas reuniões, ambas foram uníssonas em afirmar que a sanção para o não comparecimento era uma escala de trabalho mais pesada, sem especificarem o que seria, na verdade, essa escala 'pesada'. Note-se que a duração diária de trabalho do autor sofreu pouquíssimas variações, raramente extrapolando a jornada contratual de 6h40min. Ademais, a testemunha da reclamada afirmou que a participação nas reuniões não era obrigatória, o que tornou a prova oral dividida no aspecto. Dividida a prova oral, o autor não se desincumbiu do seu ônus de provar os fatos constitutivos de seu direito. Nego provimento. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS Insurge-se o reclamante contra o indeferimento do pedido de indenização por danos morais fundado em suposta sujeição a más condições de trabalho. A restrição de acesso ao uso de sanitários pode implicar em violação à intimidade do empregado, se esse fato se dá por ato ou omissão culposa do empregador. E os instrumentos normativos estabelecem a obrigação do empregador de manter sanitários, nos pontos de controle das linhas de ônibus, em condições de perfeita higiene, para uso de seus empregados (v.g. cláusula 35.2, da CCT 2013/2014, id. 1edc147- pág. 08). Assinado eletronicamente. A Certificação Digital pertence a: Maria Stela Alvares da Silva Campos http://pje.trt3.jus.br/segundograu/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?nd=15022412165089700000002550380 Número do documento: 15022412165089700000002550380 Num. e674327 - Pág. 3 Porém, cumpria ao reclamante o ônus de demonstrar a veracidade de suas alegações, nos termos dos arts. 818 da CLT e 333, I do CPC, do qual não se desvencilhou. Ao revés, embora alegue que não havia banheiros, o próprio autor confessou que "na garagem tinha banheiro e na rodoviária também". Ademais, sua testemunha Leandro Ambrosio da Silva declarou que "alguns porteiros do Alphaville deixavam usar o banheiro da portaria" (cf. ata de Audiência de id. cfb1af6). Portanto, se dele o reclamante nunca utilizou, o fez por sua vontade. Desta forma, não restaram demonstrados os fatos constitutivos do direito do autor, qual seja, a ausência de banheiros para uso. Provimento negado. DIFERENÇAS DE FGTS Sem razão o autor se insurge contra a r. sentença, argumentando que competia à reclamada trazer aos autos os extratos que apontassem a correção nos depósitos do FGTS, por se tratar de fato impeditivo do seu direito. O autor limitou-se a alegar, de maneira bastante genérica, que a reclamada não efetuou os depósitos do seu FGTS no período de 03/09/2009 a 04/04/2013 (id. 719bc07- pág. 12), não apresentando qualquer documento que constituísse ao menos indício de irregularidade dos depósitos. Não se pode olvidar que o empregado tem fácil acesso ao extrato de conta vinculada do FGTS e, ainda que não juntasse o extrato analítico, ao menos o saldo da conta vinculada poderia apresentar; não detém unicamente a reclamada documentação passível de demonstrar o montante de FGTS. Tanto o empregado como o empregador têm acesso aos dados de conta vinculada do FGTS depósitos e saldo existente. Assim, a solução passa pelo ônus da prova, que cabe ao reclamante, ao alegar existência de diferenças em seu favor - art. 333, I do CPC. Nego provimento. RECURSO DA RECLAMADA HORAS EXTRAS PELA REDUÇÃO DA HORA NOTURNA Sustenta a reclamada que a redução da hora noturna sempre foi respeitada, e quando o autor eventualmente prestou serviços em horário noturno recebeu o respectivo adicional. Sem razão. Assinado eletronicamente. A Certificação Digital pertence a: Maria Stela Alvares da Silva Campos http://pje.trt3.jus.br/segundograu/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?nd=15022412165089700000002550380 Número do documento: 15022412165089700000002550380 Num. e674327 - Pág. 4 Extrai-se do cotejo dos cartões de ponto com os recibos de pagamento juntados que a reclamada não observava a redução ficta da hora noturna. A título de amostragem, veja-se o cartão de id. 84a1203- pág. 02, que registra o labor em período noturno nos dias 22 a 27/08/2011, sendo que a jornada do autor em tais dias permaneceu de no limite contratual. E o recibo de pagamento correspondente demonstra que não houve pagamento de horas extras- id. 6d9859b- pág. 29. Assim, considerando que a reclamada não observava a redução da hora noturna, mantém-se incólume a sentença hostilizada. Desprovido. INTERVALO INTRAJORNADA Insurge-se a reclamada contra a sentença ao fundamento que o intervalo intrajornada fracionado era autorizado por negociação coletiva, sendo indevido o pagamento de 1 hora extra. A controvérsia travada nos autos se baseia na aplicação do contido nos instrumentos coletivos a respeito da jornada típica do motorista e cobrador de empresa de transporte coletivo urbano. A cláusula 42ª dos instrumentos coletivos, a exemplo da CCT 2013/2014 (id. 1edc147págs. 9/10), estabelece que a jornada de trabalho para motoristas e cobradores será 7 horas diárias, computados nesse tempo 20 minutos de intervalo para repouso e alimentação, sendo permitido o parcelamento e o gozo ao final de cada viagem. Entendo pela validade das cláusulas das CCT's, em razão da autonomia privada coletiva em realizar a negociação e firmar o instrumento normativo, cujo reconhecimento se impõe, por força do art. 7º, XXVI, da CF/88. A categoria resolveu pela redução do tempo do intervalo, em razão das peculiaridades do trabalho no serviço de transporte público, que possibilita aos trabalhadores, além do tempo do intervalo intrajornada, descansar nos intervalos das paradas entre os trajetos percorridos. A própria legislação trabalhista contém autorização expressa para fracionamento da pausa para a categoria dos motoristas de coletivos urbanos - art. 71 § 5º da CLT com a alteração introduzida pela Lei 12.219/12 - o que vem confirmar não ser este direito infenso à alteração mediante norma coletiva justificável em face da especificidade do trabalho. Dou provimento para excluir a condenação em horas extras pelos intervalos para refeição e descanso e correspondentes reflexos. INTERVALO INTERJORNADA Assinado eletronicamente. A Certificação Digital pertence a: Maria Stela Alvares da Silva Campos http://pje.trt3.jus.br/segundograu/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?nd=15022412165089700000002550380 Número do documento: 15022412165089700000002550380 Num. e674327 - Pág. 5 Alega a reclamada que o intervalo interjornada de 11 horas foi usufruído pelo autor. O apelo não prospera. Veja que, em recurso (id. 5142c2a - pág. 8), a empresa sequer se preocupa em desconstituir a aferição sentencial (id. 24c33e5 - pág. 5) que, se reportando ao cartão de ponto de id. ff751e3 - pág.11, evidenciou a existência de inobservância da pausa intervalar. Desprovejo. DIVISOR UTILIZADO Cumprindo jornada diária de 6h40 e de 40 horas semanais, nos termos da Cláusula 44.1 da CCT de 2010/2012 (id. 1edc147- pág. 27), por amostragem, o divisor aplicável na apuração das horas extras é '200', tal qual definido na r. sentença de origem. Nego provimento. REFLEXOS Também no que diz respeito às repercussões das horas extras, o apelo não prospera. Como a reclamada não remunerava corretamente as horas extras, os reflexos são meros consectários legais, devendo incidir sobre férias + 1/3, 13º salário, aviso prévio e FGTS + 40%, nos exatos termos deferidos pelo juízo de origem. Nada a prover. MATÉRIA REMANESCENTE AO APELO DO AUTOR MULTAS CONVENCIONAIS Postula o autor aplicação das multas previstas nas convenções coletivas em caso de violação às suas cláusulas, tais como as relativas à duração semanal do trabalho, intervalo intrajornada, adicionais de horas extras. Em virtude do decidido, remanesceu a condenação ao pagamento de horas extras decorrentes da não observância da duração ficta da hora noturna e dos intervalos interjornada. Nesse diapasão, houve violação da cláusula 42ª (id. 1edc147- págs. 09/10, que trata da jornada de trabalho. Assinado eletronicamente. A Certificação Digital pertence a: Maria Stela Alvares da Silva Campos http://pje.trt3.jus.br/segundograu/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?nd=15022412165089700000002550380 Número do documento: 15022412165089700000002550380 Num. e674327 - Pág. 6 Isto posto, provejo parcialmente o recurso para acrescer à condenação uma multa convencional por instrumento coletivo. ACÓRDÃO FUNDAMENTOS PELOS QUAIS, o Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, em sessão ordinária da Nona Turma, hoje realizada, à unanimidade, conheceu dos recursos; rejeitou a preliminar de julgamento extra petita suscitada no apelo da reclamada; no mérito, sem divergência, deu parcial provimento ao apelo do autor para acrescer à condenação o pagamento de uma multa convencional por instrumento coletivo violado, vigente no contrato de trabalho; por maioria de votos, deu também parcial provimento ao recurso da reclamada para excluir a condenação em horas extras pelos intervalos para refeição e descanso e seus reflexos, vencido o Exmo. Desembargador Ricardo Antônio Mohallem; inalterado o valor arbitrado para a condenação, ainda compatível. Tomaram parte no julgamento: Exmos. Desembargadora Maria Stela Álvares da Silva Campos (Relatora), Desembargador Ricardo Antônio Mohallem (Presidente) e Juiz Convocado Ricardo Marcelo Silva (substituindo o Exmo. Desembargador João Bosco Pinto Lara). Procurador do Trabalho: Dr. José Pedro dos Reis. Belo Horizonte, 17 de março de 2015. Procurador do Trabalho: Dr. José Pedro dos Reis. Belo Horizonte, 17 de março de 2015. MARIA STELA ÁLVARES DA SILVA CAMPOS Desembargadora Relatora Assinado eletronicamente. A Certificação Digital pertence a: Maria Stela Alvares da Silva Campos http://pje.trt3.jus.br/segundograu/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?nd=15022412165089700000002550380 Número do documento: 15022412165089700000002550380 Num. e674327 - Pág. 7 Assinado eletronicamente. A Certificação Digital pertence a: Maria Stela Alvares da Silva Campos http://pje.trt3.jus.br/segundograu/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?nd=15022412165089700000002550380 Número do documento: 15022412165089700000002550380 Num. e674327 - Pág. 8