MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE Secretaria de Extrativismo e Desenvolvimento Rural Sustentável MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO SOCIAL E COMBATE À FOME Secretaria Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional CARTEIRA DE PROJETOS FOME ZERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL EM COMUNIDADES INDÍGENAS CARTEIRA INDÍGENA Apoio à Políticas Públicas para o Desenvolvimento Sustentável – BRA/00/022 Relatório Técnico da Consulta com foco nas Contribuições para a Revisão das Diretrizes da Carteira Indígena Encontro de Intercâmbio com os Povos Indígenas do Mato Grosso do Sul, Etnia Terena da Terra Indígena Buriti Terra Indígena Buriti, municípios de Sidrolândia e Dois irmãos do Buriti/MS Povo Terena Consultor: Aislan Vieira de Melo Cuiabá Março de 2008 2 SUMÁRIO 1. Apresentação ..........................................................................................................03 2. Contextualizando o Encontro ..................................................................................06 2.1 Terra Indígena Buriti: o local do encontro .................................................09 2.2 Os Presentes: acadêmicos, lideranças e mulheres .......................................13 3. O Encontro .............................................................................................................20 3.1 Primeiro Momento: apresentação dos participantes da razão e dos objetivos da reunião .................................................................20 3.2 Segundo Momento discussão dos possíveis benefícios, dificuldades e propostas de mudanças, e apresentação e discussão desses apontamentos........................................................................24 3.3 Terceiro momento: escolha dos representantes para participação na II Oficina Nacional..................................................................27 3.4 Quarto Momento: Encerramento ...............................................................29 4. Os Projetos da Terra Indígena Buriti .......................................................................29 5. O Carteira Indígena a partir da Perspectiva dos Terena da T.I Buriti e da T.I. Nioaque – resultados da consulta ........................................................38 5.1 Aspectos positivos destacados ...................................................................43 5.2 Dificuldades enfrentadas e propostas de mudanças....................................44 6. Considerações Finais...............................................................................................48 7. Referências Bibliográficas .......................................................................................48 3 Relatório Técnico da Consulta com foco nas Contribuições para a Revisão das Diretrizes da Carteira Indígena Encontro de Intercâmbio com os Povos Indígenas do Mato Grosso do Sul, Etnia Terena da Terra Indígena Buriti 1. Apresentação O presente relatório versa sobre os resultados da consulta realizada com a comunidade Terena da Terra Indígena Buriti, através de encontro na aldeia Água Azul no dia 13 de fevereiro de 2008, cujo objetivo foi o de levantar contribuições para a revisão das diretrizes e normas do programa Carteira Indígena. O programa Carteira de Projetos Fome Zero e Desenvolvimento Sustentável em Comunidades Indígenas – Carteira Indígena, implementado pelo Ministério do Meio Ambiente, por intermédio da Secretaria de Extrativismo e Desenvolvimento Rural Sustentável, e do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, por intermédio da Secretaria Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, foi criado em dezembro de 2003 como um programa de atendimento às comunidades indígenas com a finalidade de “apoiar e fomentar o desenvolvimento sustentável e a segurança alimentar em Comunidades Indígenas, no território nacional, com foco na produção de alimentos, agroextrativismo, artesanato e revitalização de práticas e saberes tradicionais associados a estas atividades, de acordo com as demandas das sociedades indígenas, respeitando suas identidades culturais e sua autonomia, e preservando e recuperando o meio ambiente.” (Diretrizes...2004/2005, p.5). No mês de junho de 2004 foi realizada a I Oficina Nacional de Trabalho da Carteira Indígena que instituiu as diretrizes e normas de funcionamento do programa, tendo a participação de representantes indígenas e não indígenas, dando início, assim, às ações que, até os dias de hoje, já atenderam e/ou estão atendendo cerca de 235 projetos em todo Brasil (cf. Encontros..., 2004/2005). Na I Oficina ficou estabelecido que as executoras dos projetos são as próprias comunidades indígenas, podendo se candidatar enviando projetos para serem fomentados e financiados pelo Carteira Indígena organizações indígenas e não indígenas juridicamente 4 instituídas, no caso das últimas as comunidades indígenas devem “apresentar um documento autorizando a organização proponente a apresentar o projeto em seu nome” (Diretrizes..., 2004/2005. p.8). Também, estabeleceu-se as linhas de financiamento, as atividades e os contextos das comunidades a serem prioritariamente atendidas, os valores dos financiamentos, e demais normas regulamentais. Como todo projeto de intervenção, o programa também prevê uma etapa de autoavaliação e avaliação pelos beneficiários e interessados diretos e indiretos. Essa etapa de avaliação e auto-avaliação dos resultados do programa teve início em meados de 2006, através de um Seminário Nacional de Avaliação de Implementação das Ações da Carteira, onde os beneficiários, representantes indígenas de organizações indígenas brasileiras de expressão, representantes não indígenas de organizações indigenistas e governamentais discutiram sobre as Diretrizes e Normas vigentes, resultando em algumas propostas de revisão das mesmas. A responsabilidade do processo de revisão do regulamento de funcionamento do Carteira Indígena é do Grupo de Trabalho de Revisão das Diretrizes e Normas de Funcionamento da Carteira Indígena, instituído ministerialmente, que em 2007 realizou uma “Oficina de Trabalho, com parceiros federais e membros do Grupo Gestor para aprofundar a reflexão e sugerir parâmetros para a revisão, a serem debatidos com os representantes indígenas em todo país” (Encontros..., 2007, p.6). A perspectiva indígena acerca do programa está sendo capitalizada através de consultas regionais. Os resultados dessas consultas constituirão o documento-base a partir do qual, na II Oficina Nacional, serão discutidos os novos rumos do programa com a presença de representantes dessas comunidades, de “organizações indígenas regionais, de organizações de mulheres, representantes indígenas na Comissão de Avaliação e Grupo Gestor da Carteira Indígena e membros da Comissão Nacional de Política Indigenista (CNPI), além de representantes dos parceiros-governamentais e não-governamentais” (Encontros..., 2007, p11). 5 Para as consultas às comunidades foi elaborada uma metodologia de referência com objetivos bem definidos1: - Proporcionar a troca de experiências entre os beneficiários dos projetos locais da Carteira Indígena; - Identificar o que precisa ser melhorado para que os projetos tenham efetiva sustentabilidade e atendam às demandas das comunidades indígenas, garantindo-se o respeito às suas especificidades e diferenças; - Identificar como os projetos da Carteira Indígena podem contribuir, ao mesmo tempo, para promover a segurança alimentar e nutricional das comunidades indígenas e para promover a preservação/conservação e recuperação ambiental e uso sustentável dos recursos naturais das suas terras; - Identificar os representantes indígenas para participarem da II Oficina Nacional da Carteira Indígena. Apesar de possuir objetivos bem definidos, o consultor/moderador de cada encontro poderia reelaborar uma metodologia específica, a partir da metodologia de referência e segundo suas próprias experiências, para alcançar tais objetivos. Assim, foram definidos 6 Encontros de Intercâmbio da Carteira Indígena, sendo todos regionais e em cidades estratégicas, com exceção do Encontro previsto com os povos indígenas de Mato Grosso do Sul, que foi dividido em dois Encontros, um com os povos Guarani e Kaiowá, no sul do Estado e outro com os Terena e os Guató, mais no centro do Estado. Outra particularidade desses Encontros no MS foram as realizações dos Encontros nas aldeias Guarani e Kaiowá (Terra Indígena de Dourados) e Terena e Guató (Terra Indígena Buriti). Não obstante, exigiu-se dos moderadores/consultores conhecimentos com as respectivas etnias (GuaraniKaiowá e Terena), bem como conhecimentos na área da Antropologia (Equipe da CI, informação oral). É neste contexto de consultas às comunidades indígenas atendidas pelo Carteira Indígena, com as devidas particularidades no que tange à consulta aos Terena, que o 1 Objetivos extraídos de: Dutra, Mara Vanessa Fonseca. Relatório Técnico contendo proposta de aprimoramento da metodologia das consultas regionais aos beneficiários e instituições da sua rede de apoio e apresentação em “Power Point” sobre os antecedentes do processo de revisão das Diretrizes da CI. Novembro de 2007. Contrato: 2007/001591, Termo de Referência nº 127069. 6 presente relatório se enquadra e deve ser percebido, ou seja, como parte integrante de um processo de avaliação e auto-avaliação de um programa governamental cujos gestores buscam o aprimoramento das diretrizes e normas de funcionamento através do autoreconhecimento de suas falhas e de suas positividades, bem como permitindo que os indígenas – os beneficiários, principais interessados e razão da existência do programa – teçam suas críticas, sugestões e elogios que serão valorizadas nesse processo. O momento das consultas às comunidades indígenas se constitui como o ponto central do processo de avaliação e auto-avaliação do Carteira Indígena, porque são as comunidades com suas particularidades históricas e culturais que vivenciam a execução do programa e sentem os resultados positivos e/ou negativos. Nesse sentido, a presença de um antropólogo, preferencialmente com conhecimentos sobre o povo indígena em específico, é fundamental para realizar a decodificação das informações para ambos os lados, o dos indígenas e o do programa. E, na medida em que o programa Carteira Indígena se coloca a serviço dos povos indígenas, essas consultas in loco consolidam uma aproximação com as comunidades produzindo confiança e respeito mútuo, como pude constatar no Encontro. Assim, procuro neste relatório apresentar a particularidade histórica e cultural dos Terena da Terra Indígena de Buriti a partir das contribuições que eles proporcionaram, para então podermos compreender as razões da satisfação com relação ao programa, as críticas, as dúvidas e as sugestões formuladas por eles. 2. Contextualizando o Encontro A data do Encontro foi acordada entre eu e Benedicto Zan, que se encarregou da logística do evento realizado no dia 13 de fevereiro de 2008, na escola Mbedi Reginaldo (ou Leornado Reginaldo) da aldeia Água Azul. A equipe era composta por: Benedicto Zan e Roberto Costa, representantes da CI de Brasília/DF, Leonardo, fotógrafo contratado, também de Brasília/DF, Miguel Jordão, representante da Administração Executiva Regional da Fundação Nacional do Índio de Campo Grande/MS, e eu, Aislan Vieira de Melo, antropólogo, consultor/moderador, de Cuiabá/MT. Cheguei em Campo Grande/MS, no dia 12 de fevereiro por volta das 17:45 e Roberto Costa, Miguel e Leonardo estavam me esperando no aeroporto, enquanto Zan ficou 7 na cidade de Sidrolândia, onde pernoitamos, para ajeitar os últimos detalhes. Nós apenas havíamos trocado mensagens eletrônicas, e eu já conhecia os projetos desenvolvidos pelos Terena de Buriti e o programa Carteira Indígena através de fotocópias dos projetos e materiais referentes ao Carteira Indígena enviados por Juliana Costa, e durante o jantar conversamos sobre os detalhes do Encontro. Saímos logo cedo para a aldeia, para iniciarmos os trabalhos às 07:00 hs. Chegando lá, organizamos as cadeiras no pátio da escola em forma de círculo, de modo que todos pudessem enxergar os demais presentes, íamos conversando com alguns Terena que já estavam no local – como o diretor da escola e o cacique –, caracterizamos o local com cartazes com informações sobre o CI; no dia anterior Zan e Roberto haviam colocado uma faixa informando o evento na frente da escola, bem como haviam realizado a cotação de preços para a compra de materiais e alimentos consumidos no evento. Enquanto organizávamos tudo, Zan fazia o credenciamento dos Terena que chegavam aos poucos e lhes entregava uma pasta com a cartilha Encontros de Intercâmbio com Povos Indígena do Brasil, fotocópia do cronograma das atividades do evento, um formulário de apresentação de projetos, uma caneta e um bloco de anotações, além de um crachá com o nome escrito. A previsão era a de que o início das atividades acontecesse às 07:00hs, porém, devido ao atraso de alguns dos participantes, demos início somente por volta das 08:00hs, quando também foi servido um café da manhã. Enquanto esperávamos íamos conversando sobre o programa, sobre a situação fundiária da Terra Indígena (que vive a finalização do processo de ampliação), sobre a educação escolar, sobre alguns amigos em comum, sobre a razão de estarmos ali, etc., o que nos aproximou da comunidade. O atraso, além de não prejudicar o andamento dos trabalhos que seguiram a programação prevista com algumas pequenas modificações nos horários, foi produtivo nesse sentido. 8 Escola Mbedi Reginaldo, local do Encontro – Foto Leonardo 9 2.1 Terra Indígena Buriti: o local do Encontro Contam os velhos que no início do mundo os Terena viviam dentro de um buraco e que não conheciam o mundo aqui de fora. Certa vez, um passarinho foi até a entrada do buraco e começou a cantar chamando-os para fora, e os Terena, então, seguiram o canto do passarinho, saíram do buraco e nunca mais voltaram para lá. Desde então os Terena vivem sobre a terra. Assim foi o princípio do mundo para os índios Terena, povo de língua do tronco lingüístico Aruak como os Paresi (MT), Enawene-nawe (MT), Baniwa (AM), Palikur (AP), Yawalapiti (MT), Wapishana (RR), entre outros que vivem em território brasileiro atualmente. A memória mais antiga do território tradicional Terena apresenta o Êxiva, na região do Chaco Paraguaio, como o local anterior à ocupação do território brasileiro, hoje, Estado de Mato Grosso do Sul. Os Terena começaram a migrar para as terras brasileiras no final do século XVII, devido aos ataques e conflitos com os espanhóis, atravessaram o rio Paraguai em botes feitos com couro de boi e começaram a ocupar tradicionalmente o território brasileiro, e teve início, então, a história dos Terena no Brasil. Conhecidos na literatura como constituintes do grande grupo Guaná (sendo os Terena um sub-grupo dentro desse), assim como os Layana, Kinikinau, Exoaladi e outros, os Terena sempre foram conhecidos como excelentes agricultores, abastecendo com provimentos povos como os antigos Guaikurus (hoje Kadiwéu), fortes da coroa portuguesa e missões religiosas, além disso, realizavam comércios de cerâmicas, tecelagem e produtos agrícolas através dos rios do Pantanal, nas várias cidades margeadas pelos rios chegando até a cidade de Cuiabá, estabelecendo um fluxo de trânsito nessa região. Com a Guerra do Paraguai (1864), os Terena perderam a hegemonia de suas terras de ocupação tradicional para os soldados brasileiros que se estabeleceram na região, bem como para o Império Brasileiro que incentivou a ocupação da região para assegurar a posse do território. Assim, sem terras, os Terena foram obrigados a se espalharem pelas fazendas da região que começaram a surgir, sendo absorvidos como mão-de-obra “escrava”. Essa situação perdurou até 1910, quando Marechal Candido Mariano Rondon, abrindo caminho para as Linhas Telegráficas e para a estrada férrea, e no comando do recém-criado Serviço de Proteção aos Índios (SPI) deu início aos processo de demarcações 10 das Reservas Indígenas para os Terena, que aos poucos se reagruparam novamente em várias aldeias. A categoria “Reserva” tinha um sentido bem especifico na época, era uma parcela do antigo territorial tradicional reservada para a moradia dos índios, muito longe da concepção e tamanho dos antigos territórios por eles tradicionalmente ocupados, importante é falar em Território Tradicional e não em “reserva”, visto que as terras que ocupam são tradicionalmente por eles ocupadas, e não reservadas para eles. Segundo VARGAS (2003, p. 109), (...) a Terra Indígena de Buriti formou-se quando muitos dos índios que viviam na Serra de Maracaju dividiram-se e alguns começaram a voltar para os antigos territórios que ocupavam (...) retornaram para a região de Buriti e ali permaneceram estabelecidos em suas antigas moradas, ou juntando-se com os Índios Terena que permaneceram na localidade, cultivando suas roças e criando alguns animais que possuíam, como gado, cavalo e porco. No entanto, a ocupação da região por não indígenas resultou no não respeito à territorialidade tradicional Terena na região, território este que, segundo a mesma autora, existem documentos de 1897 onde os Terena já requeriam a legalização de seu território junto ao governo brasileiro (Ibidem.). Mesmo a terra dos índios Terena, tendo sido prejudicada com as demarcações das propriedades particulares, uma vez que foram respeitadas todos os marcos estabelecidos pelos fazendeiros, obtiveram, pelo Decreto Estadual n° 834, de 14 de dezembro de 1928, a reserva de 2.000 mil hectares para a “colônia dos índios” (...) Nessa situação, prevaleceu a quantidade dque estipulou o Decrteo 834, de 2000 hectares de terras para os índios Terena de Buriti, deixando fora dos seus limites territoriais a área em que se encontravam os seus cemitérios, que passaram a pertencer às propriedades particulares (Idem., p. 116). Depois de realizada a delimitação da área, alguns Terena teriam ido até o Rio de Janeiro pedir a reavaliação dos limites estabelecidos (Idem.). O fato de irem até a autoridade maior, o Coronel Horta Barbosa, para solicitar a ampliação de seus territórios ao invés de buscarem pelos seus próprios meios, e o fato de tentativa de compra da mesma terra pelos Terena anos antes da delimitação de 1928, mostra a compreensão e o respeito que os Terena tinham pelas leis dos não indígenas, o que pode ser verificado nos dias de hoje com o cuidado que eles possuem pela burocracia da lei do branco que são trazidas para as relações internas da aldeia – seguem a rigorosamente os critérios não indígenas com relação ao voto para eleição de caciques, as eleições das associações seguem rigorosamente 11 seu estatuto, etc2. No entanto, apesar de delimitada desde 1928, a área de Buriti foi somente demarcada em 1945, o que não significou o fim do processo, pois continuamente os fazendeiros tentavam contra as terras dos Terena, bem como atualmente tramita um processo de revisão da área. Como a visão/concepção do SPI, na época, era a de que os índios deveriam ser “civilizados” pela sociedade nacional, integrando-se à mesma, pois o país necessitava “progredir” e os índios eram considerados empecilhos para o progresso, as “Reservas” demarcadas eram pequenas em extensão territorial. Diante dessa ideologia, muitos foram os danos causados para vários grupos indígenas, danos que perduram até os dias de hoje, como é o exemplo da Terra Indígena de Buriti que, atualmente, com uma população que gira em torno de 2000 a 3000 pessoas (PEREIRA, 2003), conta apenas com 2090 hectares, ou seja, a distribuição territorial não chega a 1 hectare por pessoa, uma parcela insuficiente para a sobrevivência de um povo tradicionalmente agrícola e com uma taxa de crescimento demográfico relativamente alta. Devido a pouca extensão territorial, uma parte da população Terena de Buriti saiu e foi buscar terras em outros lugares. Em 1982 um grupo pequeno saiu de Buriti e rumou para o Mato Grosso em busca de terras para morar, e depois de 20 anos, em 2003, conquistaram uma área de 30.000 hectares no norte do Estado de Mato Grosso, a Terra Indígena Terna Gleba Iriri, com cerca de 300 pessoas. Vemos, portanto, que a falta de perspectiva dentro da área obrigou uma parcela migrar procurando novas área onde pudessem proporcionar “um futuro melhor para os filhos” (Informação oral). A Terra Indígena Buriti era constituída pela aldeia Buriti – aldeia central onde até os dias de hoje fica o Posto Indígena da Funai – da qual surgiram também as aldeias Água Azul e Córrego do Meio, todas três consideradas antigas pelos moradores da T.I. Buriti. Desmembramentos mais recentes – da aldeia Buriti saíram as aldeias Recanto, Barreirinho, Oliveira e Tereré3; da aldeia Córrego do Meio saiu Lagoinha; e da aldeia Água Azul saiu Olho D’Água. Perfazendo, então, um complexo de 9 aldeias, cuja sustentabilidade 2 É claro que a compreensão das burocracias não indígenas não é total e nem perfeita, haja vista a dificuldade que em com relação à prestação de contas, por exemplo. 3 Esta última fica localizada na periferia da cidade de Sidrolândia, mas devido a relação intensa e a territorialidade Terena (ver Sant’Ana, 2006 e 2008 (no prelo)), deve ser percebida como constituindo a T.I. Buriti, além do que, está sob jurisdição do posto Indígena Buriti, segundo a AER/Funai de Campo Grande. 12 econômica segue as mesmas características das demais aldeias Terena: as aldeias são divididas em lotes por famílias, e tem a figura do cacique e do conselho tribal como representantes das aldeias nas questões internas e externas, funcionários públicos e os contratados das escolas, os contratados dos Postos de Saúde da Funasa, o chefe de Posto da Funai, atividades de agricultura como plantação de arroz, feijão, mandioca, batata, amendoim, maxixe, banana, etc. – sendo a maioria da produção para consumo interno, e parte é comercializada nas cidades – criação de animais como gado (leite e carne), porcos (carne e banha) e galinhas (carne, pouca, e ovos). Além disso, a caça e a pesca, apesar de ser em incursões reduzidas se comparada com época passadas, ainda possuem alguma importância. Diante dessas condições, o programa Carteira Indígena é percebido como algo muito satisfatório visto que proporciona uma via através da qual tem-se melhorado a qualidade nutricional da alimentação, sobretudo, das crianças – que são o principal foco de preocupação da sociedade Terena, pois todas as ações são orquestradas em função das crianças. Assim é que as aldeias Barreirinho, Lagoinha, Recanto, Água Azul, Oliveira, Olho D’Água e Buriti buscaram através do Carteira Indígena uma alternativa de autonomia econômica4 e alimentar. Com exceção da primeira que elaborou um projeto de piscicultura, as demais entenderam que a produção de leite seria melhor opção. Assim temos sete projetos aprovados, e seis sendo desenvolvidos, pois o projeto de piscicultura ainda falta aprovação pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente de MS (SEMA), com a concessão da licença de criação e comercialização do peixe. Cada um dos sete projetos foi enviado por aldeias diferentes, assim, temos que do complexo de nove aldeias somente as aldeias Córrego do Meio e Tereré não enviaram projetos. O local da reunião, a aldeia Água Azul, se constitui como uma das mais antigas da T.I. Buriti, e sua escola, Mbedi Reginaldo, é a única que possui ensino médio. Como já constatei em outras T.I. Terena, as escolas que possuem ensino médio são quase sempre percebidas como escolas centrais, pois todos os estudantes da T.Is.irão estudar lá, por isso, a centralidade de se escolher a escola Mbedi Reginaldo. 4 Autonomia econômica “entendida caso a caso como a somatória entre segurança alimentar e a produção de excedente comercialízável que lhes permita acessar bens e serviços externos considerados indispensáveis” (RICARDO, 2004, p.115). 13 De outro lado, uma vez que a reunião foi realizada na aldeia, a escola foi o espaço ideal para a realização de reuniões com esse propósito, pois é o espaço onde as influências das disputas políticas entre os grupos da sociedade Terena são menos acentuadas. Já dentro do espaço da escola, o local mais apropriado sempre é o pátio, visto que ele representa o espaço de acessibilidade a todos e não somente aos estudantes como é o caso da sala de aula, “a casa dos jovens”. 2.2 Os Presentes: acadêmicos, lideranças, mulheres Estavam presentes5 tanto os representantes dos projetos como os membros das comunidades beneficiadas pelos projetos, mas não diretamente responsáveis por estes; alguns jovens estudantes – sendo dois deles alunos do curso de graduação em Agroecologia, oferecido pela Universidade Católica Dom Bosco de Campo Grande/MS – e, com exceção das mulheres que trabalharam na cozinha sem nenhuma participação nas discussões, nenhuma mulher estava presente, o que chamou a atenção de Roberto que chegou a mencionar durante a sua fala. Dificilmente as mulheres são chamadas para as reuniões políticas nas aldeias, mas a não presença das mulheres nas reuniões políticas não significa que elas não possuam voz na sociedade Terena, que sejam oprimidas pelos homens, pois, segundo Pereira (2003), a mulher e o homem têm importância nas decisões de foro doméstico, afetando assim as decisões mais gerais da aldeia. Sant’Ana (2006) destaca também que o mesmo valor dispensado à oratória dos homens é dispensado ao “choro ou canto ritualizado das mulheres” que são proferidos nos funerais, na chegada de visitantes distantes, em casamentos, em festas importantes, em agradecimento a algum presente especial ou dado por alguém em especial, e em momentos em que acreditam ser necessário ou sentem a necessidade do canto ritual, como em formaturas de parentes, por exemplo. A autora destaca, também, a presença significativa da mulher como xamã, koixomuneti, o que não se vê em muitas outras sociedades indígenas. Não obstante, atualmente as mulheres estão ocupando espaços que antes eram restritos aos homens como os de professor, diretoria de escola, agente de saúde, integrante 5 Estava prevista a presença de dois representantes Guató – provavelmente Dona Dalva e Severo –, mas não foi possível a presença de ambos. 14 do conselho tribal6. E, tradicionalmente, a mulher é percebida pela sociedade Terena como a principal via de ampliação das influências e dos conhecimentos sobre outras sociedades, o que resulta num developman7 da cultura Terena: Schimidt (s/d), Ladeira (2001) e Azanha (2001) destacam que uma das características dos povos de língua Aruak, e em específico dos Terena, é o expansionismo como forma de difundir suas influências, seus costumes, adquirir bens, incorporar outras tradições e fazer alianças. As mulheres Terena têm colaborado com esse movimento através do matrimônio com outras etnias, e atualmente com os purutuye (brancos) que vivem nos centros urbanos (...) (...) a mulher Terena expansionista acaba por criar outros espaços para as ações de seus parentes e afins (principalmente quando se casa com um purutuye e vai morar na cidade), proporcionando o acesso à outros bens e serviços que passam a fazer parte das trocas e das relações políticas dentro das aldeias (SANT’ANA, 2006, p.) Sant’Ana (2006) afirma que a relação entre os gêneros na sociedade Terena não pode ser vista apenas da perspectiva subordinação/dominação e, utilizando o conceito de englobamento de Lea (1994)8, conclui que o “modo de estar no mundo” feminino e masculino vai além da complementariedade nas funções sociais, pois os papéis que desempenham podem ser mesmo excludentes ou contraditórios, principalmente quando as mulheres são a ponte para o expansionismo trazendo para as aldeias novos elementos, rearranjos, ganhos, alianças e conflitos” (SANT’ANA, 2006, p ). Na cidade as mulheres assumem papéis diferentes do contexto de aldeia, sendo muitas vezes o chefe da casa, não somente como provedora economicamente, mas também como a organizadora do lar ditando as regras e as relações com a sociedade não indígena da cidade (Ibidem.). Assim é que a primeira aldeia urbana indígena do país surge em Campo Grande em 1995, e uma das principais lideranças é uma mulher, Enir Terena, que continua sendo uma das lideranças da comunidade e uma das articuladoras do movimento indígena na cidade, gozando de prestígio entre os políticos. Juntamente com Enir, existem outras mulheres Terena com grande influência na comunidade indígena Terena de Campo Grande, como Elida Julio – atualmente presidente da Associação dos Artesãos Indígenas Terena de Campo Grande, mas que foi durante muito tempo presidente da Associação das Feirantes 6 Conselho constituído pelo cacique e algumas das suas lideranças de confiança. O termo é emprestado de Sahlins (1997), e nos permite perceber a perspectiva nativa sobre as coisas alheias, ou seja, o uso que os indígenas fazem de objetos e símbolos alheios à sua cultura, produzindo uma transformação e influenciando as relações sociais internas daquela sociedade. 8 “O conceito de englobamento permite uma visão mais nuançada; ora a mulher engloba, por exemplo, quando o seu choro é ouvido pela aldeia inteira; ora é englobada, por exemplo, quando os homens tomam decisões relativas ao mundo dos brancos” (LÉA, 1994, p. 113). 7 15 Indígenas de Campo Grande –, Dona Júlia Marcos – atual presidente da Associação das Feirantes Indígenas de Campo Grande –, Anaize Canale – presidente da Associação dos Acadêmicos Indígenas de Mato Grosso do Sul –, entre outras. Apesar das mulheres estarem ausentes no Encontro, é preciso compreender o espaço que ela ocupa na sociedade Terena antes de tirarmos conclusões precipitadas, pois esses espaços são negociados e instituídos culturalmente, no caso, segundo os interesses da sociedade Terena. Contudo, com o advento dos movimentos feministas várias transformações têm ocorrido nas relações de gênero dentro da sociedade Terena, como podemos observar, por exemplo, nas influências de projetos governamentais e não governamentais que valorizam, recomendam e, não raras vezes, exigem a presença da mulher nos projetos, bem como outros que têm como foco as atividades femininas9, o que é extremamente positivo. No caso dos projetos financiados pelo Carteira Indígena em Buriti, como são voltados à criação do gado leiteiro10, atividade exclusivamente masculina, de certa forma é esperada a não presença da mulher nesse momento de discussão do projeto. O que não significa que elas não estejam presentes no projeto, pois, segundo Vandelis, “a mulher participa fazendo os doces e outros produtos derivados [do leite]” (Informação oral), conseqüentemente, ela estabelece suas relações de poder, pois sem o seu conhecimento não existem os derivados do leite. Haja vista que a mulher participa das decisões familiares, juntamente com os homens de suas famílias, vários aspectos dos projetos são debatidos, discutidos e modificados tendo em vista a perspectiva e influência feminina. Nesse sentido, a não presença física da mulher no Encontro, não representa um “estar fora” do processo, visto que a “política da casa” dá o tom da “política do pátio” também. Evidente que isso não é um quadro estanque, portanto, a participação ou não das mulheres na reunião pode ser modificada e repensada pela comunidade em seus respectivos anseios e desejos. Assim, a participação das mulheres nos projetos, pelo que pude perceber, está, ao menos, na distribuição do produto final, a exemplo das mulheres que vão paras as cidades comercializarem os produtos das roças dos homens da família. 9 Projeto Gerando Renda entre Mulheres Indígenas da Coordenadoria Especial de Políticas Públicas para a Mulher do governo do Estado de MS. 10 Com exceção de um que é piscicultura, mas ainda não está em andamento. 16 Outro grupo social que estava presente na reunião e que merece destaque é o dos jovens estudantes e/ou acadêmicos. A educação escolar é extremamente valorizada na sociedade Terena, chegando a ser a justificativa pública de muitas famílias para se mudarem para as cidades para que os filhos tenham oportunidade de freqüentar escolas que julgam ser melhores que as das aldeias. Segundo dados de 2005, havia cerca de 200 indígenas fazendo curso superior em Mato Grosso do Sul, sendo que 85% são da etnia Terena. O conhecimento escolar mexe com as estruturas políticas da sociedade Terena, pois muitas lideranças tradicionais não possuem esse tipo de conhecimento que, atualmente, é muito valorizado nas relações com a sociedade envolvente, por essa razão os jovens que estão indo para a universidade galgam espaços políticos antes distantes para a juventude. Contudo, em muitas aldeias os jovens acadêmicos têm sua atuação política restringida pelas ações dos caciques e lideranças tradicionais que privilegiam a senioridade e a tradição. Assim, a sociedade Terena vive um paradoxo: valorizam o estudo, ao passo que a maioria dos estudados possui pouco espaço de ação política. Acadêmico Célio Reginaldo – Foto Leonardo 17 A maior parte das pessoas presentes na reunião eram lideranças, sejam aquelas responsáveis diretamente pelos projetos, sejam aquelas que apenas refletem e procuram orientar os demais, como foi o caso de Estevão Reginaldo, que não participava diretamente de nenhum projeto, mas fez questão de salientar: Eu vim aqui para orientar os mais novos, conhecer os senhores, saber o que os senhores vieram fazer aqui, visitar a gente, reencontrei o senhor [referindo-se a mim, visto que já o conhecia], porque é sempre bom a gente estar perto, junto com os mais novos (...) porque a minha vez já passou, agora vocês [referindo-se aos seus parentes] é quem vão dar continuidade (Fala pública). Estevão Reginaldo tem atualmente cerca de 85 anos, é filho do fundador da aldeia Benedito Reginaldo, foi durante 40 anos professor da escola da Terra Indígena Buriti11, pertence à família dos naati, e é pai do atual cacique Dodô Reginaldo. Segundo Cardosode Oliveira (1968), a sociedade Terena se organiza em três instâncias hierárquicas, a saber: naati, waherê, kauti. Os naati, representam os chefes, são as famílias de lideranças, enquanto que os waherê, representam as pessoas comuns, aqueles que não são chefes; já kauti (categoria não mais presente), por sua vez, seriam os escravos, não como nós concebemos o termo, mas sim pessoas capturadas em guerras e criados por famílias Terena – que ficavam na base da estratificação social, mas que contraiam matrimônio e viviam como um membro da comunidade. Segundo a mitologia, os Terena se dividem em duas metades sukirikiâno e xumonó. Ressalto que “analisar os aspectos sócio-pol´tiicos Terena, e em particular os aspectos relativos ao faccionalismo e posicionamento dos naati, faz-se importante na medida em que tais elementos têm direcionado algumas associações e o movimento indígena local” (SANT’ANA, 2006, p. 7). Outros autores ressaltam que a unidade sócio-organizacional e política mais importante dos Terena são as parentelas agnáticas, os chamados troncos familiares. (...) as parentelas agnáticas (ienõchapá, ou “meus parentes”) – se constituem na unidade social de maior densidade, política e social, na sociedade Terena contemporânea, seja em situação de Reserva ou de cidade. Essa parentela é constituída por grupos domésticos ligados por laços agnáticos (linha de germanos masculinos), suas famílias de procriação (esposas, filhos e netos) e seus agregados eventuais (filhos adotivos, “primos”, ou “tios”), centrado (e organizado) na figura de um chefe – o pai ou (com a morte deste) o irmão mais velho. (AZANHA, 2004) 11 Quando foram nominar a escola da aldeia, foi feita uma eleição e os nomes era de Mbedi Reginaldo, que foi cacique durante muitos anos, e Estevão, ambos irmãos que gozam de respeitabilidade não somente por serem naati, mas pelo trabalho que desenvolveram servindo a comunidade que entende foi muito importante para todos (Dodô Reginaldo, informação oral). 18 (...) um grupo de parentes está articulado em torno da figura de um líder, geralmente um velho, um ancião identificado como um tronco. Caso esse velho venha a falecer, sua esposa pode assumir a posição de pessoa de referência para um grupo de parentes e, nesse caso, o tronco passa a ser uma mulher idosa. O mais comum, entretanto, é que a referência seja não apenas o homem, mas o casal de velhos, devendo este casal reunir alguns atributos como a estabilidade conjugal, o conhecimento da tradição e a liderança reconhecida para unir os parentes, resolver problemas de convivência interna ao grupo e dar conselhos aos mais jovens (...) a plena autonomia política do tronco e o direito de gerir internamente a maioria dos assuntos de ordem econômica, não excluem a existência de cooperação e intercâmbio entre os diversos troncos que ocupam uma região. (PEREIRA, 2004,sp) . Assim, as relações políticas internas da sociedade Terena são perpassadas pelas relações dentro e entre os troncos familiares agnáticos, e pela divisão vertical, os naati, os waherê e os kauti, e uma divisão horizontal, os sukirikiâno e os xumonó. Fortemente hierarquizada, a sociedade Terena estabelece que os casamentos sempre deviam acontecer de maneira endogâmica, porém, depois do desmembramento das comunidades e da sociedade Terena ocorrido por causa da Guerra do Paraguai (1864), houveram rearranjos nas formas de casamento, abrindo maior possibilidade para os matrimônios exogâmicos. No entanto, as uniões preferenciais ainda são os endogâmicos, pois percebe-se através dos comentários que “também, eles são diferentes”, quando se referem há alguma briga de casal exogâmico, cada família tomando parte de seu ente. Mas, nas últimas décadas, também, aconteceram transformações no que tange à escolha e tradicionalidade das lideranças, dos naati, pois a partir do momento em que o Serviço de Proteção aos Índios (posteriormente, em 1967, Fundação Nacional do Índio) instituiu a escolha do cacique por voto, foi possível a muitos waherê se tornarem caciques, o que resultou numa reorganização das relações políticas internas. Porém, em muitos locais os naati, ainda continuam na liderança, como é o caso da aldeia Água Azul em que Mbedi Reginaldo, o capitão Leonardo, foi cacique por 40 anos, sucedendo seu pai à frente da comunidade Terena da aldeia, deixando o cargo recentemente. O cacique atual, eleito por voto, Dodô Reginaldo, é sobrinho de Mbeti, portanto, também pertencente à classe dos naati. Na mitologia Terena existe a figura do Xuna-xati, que é o guerreiro,aquele que pode ascender à categoria de naati se for vitorioso o que demonstra que há a abertura para a 19 mobilidade social, pois, um waherê vencedor (um dos requisitos atualmente pode ser o estudo universitário, pós-graduação) pode alcançar o status de líder da comunidade. Foi, também, essa abertura que possibilitou muitos waherê galgarem status de liderança e respeito perante toda a sociedade Terena. Nesse contexto, numa aldeia Terena existem vários grupos políticos que lutam pela hegemonia do poder. Tais grupos são liderados ou por naati ou por um waherê, que aglutinam um certo número de pessoas e alianças de vários tipos: religiosas, políticopartidárias, econômicas, matrimoniais, etc. Atualmente, tanto um waherê quanto um naati consegue arregimentar pessoas para sustentarem seu poder (vários naati e vários waherê podem sustentá-lo), e pode acontecer de irmãos apóiarem grupos diferentes, mesmo rivais. Num contexto político em que as trocas de apóio são fluidas, isto é, em que grupos que hoje são rivais podem, no futuro, se tornarem aliados, se fundirem, se dividirem e constituírem outros grupos ou apoiarem grupos diferentes, as alianças políticas obedecem regras flexíveis que permitem a todas as pessoas12 escolherem as próprias alianças que pode não ser a mesma da de seus parentes, compondo um contexto em que as alianças políticas são contingentes. Com relação aos acadêmicos, nem sempre a relação entre acadêmicos e lideranças é mediada só por conflitos, pois Vandelis que é acadêmico do curso de Agroecologia foi o representante do projeto desenvolvido na aldeia Buriti. Outro exemplo de relação sem conflitos extremos foi a presença do grupo Terena da T.I. Nioaque, das aldeias Brejão, Taboquinha e Água Branca. Todos eram jovens, sendo o chefe do Posto Indígena da Funai da T.I., e quatro técnicos agrícolas, recém-formados e que constituíram um grupo GTAI – Grupo de Técnicos em Agropecuária Indígena. Os técnicos agrícolas se enquadram na categoria dos acadêmicos, pois trazem uma formação científica, que é “o pensamento do branco”. Interessante que no meio da reunião Alexandro, um deles, veio até mim apresentar o GTAI, dizendo das duas propostas e solicitando apoio nas suas empreitadas, buscando orientação em como conseguir espaço para trabalhar em área indígenas. A presença do grupo da T.I. Nioaque se deu porque eles também possuem um projeto que foi aprovado pelo Carteira Indígena, mas que ainda não foi liberado recurso. 12 É lógico que o sujeito obedece a certas demandas do grupo, pois ele é o seu grupo; as mulheres geralmente seguem as alianças estabelecidas pelo marido, mas existem casos em que as mulheres iniciam as relações de alianças através das trocas. 20 3. O Encontro Realizado na aldeia, com os representantes e/ou responsáveis pelos projetos e caciques das aldeias onde os projetos estão sendo desenvolvidos, o Encontro permitiu maior aproximação entre a equipe da Carteira Indígena e os beneficiários, promovendo assim maior confiança e contribuições, resultando num melhor aproveitamento da consulta. Segundo nossa lista de presença, 45 pessoas estavam presentes, mas na hora do almoço o cacique Dodô contou 100 pessoas. O número reduzido de pessoas também permitiu que a consulta tivesse duração de apenas um dia, beneficiando aqueles que trabalham diariamente, estando a reunião dividida em quatro partes, a saber: 3.1 1° Momento apresentação dos participantes, da razão e dos objetivos da reunião; Após o credenciamento dos participantes indígenas, demos continuidade aos trabalhos com a apresentação de todos os presentes, começando pela nossa equipe. Zan, Roberto, Leonardo, Miguel e, por fim, eu me apresentei. Todos dizendo o nome e sua função no Carteira Indígena. Eu me apresentei como antropólogo e expus minha experiência com os Terena da T.I. Taunay/Ipegue, de Campo Grande e da T.I. Teren Gleba Iriri e nomeei algumas pessoas conhecidas e amigas de expressão para a sociedade Terena, assim como nomeei Associações às quais dou assessoria voluntária. Para o Terena, não basta ouvir a sua história através de terceiros para que eles lhe conheçam, tenham referência sobre você e saibam que você tem conhecimento sobre a sua cultura, é preciso falar diretamente para ele. Publicizando a minha história para todos diretamente, passei a ser percebido de maneira diferente dos “funcionários do governo” – caso dos companheiros do CI, a exceção de Miguel que todos já conheciam –, estabelecendo outro tipo de relações, pois integrava um tipo particular de “parceiros”, recebendo outros tipos de informações. 21 Credenciamento dos participantes – Foto Leonardo 22 Apresentação dos participantes – Foto Leonardo 23 Em seguida, passamos a palavra para os indígenas que se levantavam e diziam nome, aldeia e função ou interesse nos projetos ou nos programas13, muitos contavam um pouco da sua história de luta para obter melhorias para a comunidade, elogiavam o programa e a iniciativa de irmos até lá vê-los, pois “é importante vocês estarem aqui, vindo de longe nos visitar, saber como a gente vive” (Terena, fala pública). Feitas as devidas apresentações, Roberto iniciou falando sobre o histórico do Carteira Indígena contextualizando o nosso Encontro como um momento de mudanças nas normas e diretrizes no funcionamento do programa para melhor atendê-los e as modificações futuras que serão feitas levando-se em consideração as dificuldades e sugestões das comunidades beneficiadas. Também falei sobre a importância do Encontro não só para as comunidades indígenas, mas também para o movimento indígena atual, mostrando para eles que há indígenas com poder de voto na avaliação de projetos a serem financiados pelo programa – o que é importantíssimo para os Terena – e que nessa comissão haviam representantes indígenas de MS, sendo o representante uma Terena de São Paulo provavelmente da T.I. Araribá – o que gerou discordância, primeiro por ser mulher, segundo por ser de São Paulo. Retomei alguns momentos como esse que havia presenciado e outros que tomei conhecimento por terceiros, como a última reunião estadual de educação, que aconteceu ali mesmo, em que a voz indígena foi fundamental para os resultados e foi um momento muito importante para os professores Terena estabelecerem outro tipo de relação com a Secretaria. Fazendo analogia com o Encontro do Carteira, destaquei a importância do momento e que estávamos ali para ouvi-los e levar as conclusões para a II Oficina que ocorreria em Brasília e que dali sairiam dois representantes. Enfim, foi um momento em que houve algumas perguntas por parte da comunidade. Foram explicados, também, o cronograma do trabalho e a dinâmica das atividades a serem desenvolvidas. Assim, foi realizado um pequeno intervalo para um novo café. 13 Algumas pessoas ainda não participavam de projetos e estavam ali para conhecerem mais sobre o programa. 24 3.2 2° Momento Discussão dos possíveis benefícios, dificuldades e propostas de mudança, e apresentação e discussão coletiva destes apontamentos; Divido esse momento em duas partes: a) Discussão dos possíveis benefícios, dificuldades e propostas de mudança – apontamentos acerca da metodologia. Esse foi o momento de reflexão, por parte dos Terena, sobre o programa e seus respectivos projetos. Eu sabia que os Terena são um povo muito autônomo, e que poderíamos deixá-los trabalhando sozinhos, com algumas pontuais intervenções, a exemplo do que eu já tinha feito em cursos ministrados em algumas aldeias. Esse tipo de metodologia permite que os Terena se expressem mais livremente, pois sabia que se direcionássemos o processo eles acabariam aceitando as nossas sugestões, frustrando assim os objetivos do Encontro que o era a de dar voz aos indígenas e a simetria nas relações, diálogos e busca por soluções. Cardoso de Oliveira (2006) faz uma reflexão sobre a necessidade dos representantes da sociedade nacional (e de sua burocracia) estabelecerem relações simétricas através de instrumentos e metodologias que possibilitem a menor relação de poder possível, tentando dessa forma diminuir as desigualdades e relações de poder entre a nossa sociedade e a sociedade indígenas, no que tange aos assuntos pertinentes aos nossos códigos culturais. Diz ele: Isso quer dizer que na relação entre índios e brancos, mediada ou não pelo Estado – leia-se Funai [leiam sociedade nacional e nossa burocracias] –, mesmo que formada uma comunidade interétnica de comunicação e de argumentação, e que pressuponha relações dialógicas democráticas – pelo mesmo na intenção do pólo dominante –, mesmo assim o diálogo estará comprometido pelas regras do discurso hegemônico. Essa situação estaria somente superada quando o índio interpelante pudesse por meio do diálogo contribuir efetivamente para a institucionalização de uma normatividade inteiramente nova, fruto da interação dada no interior da comunidade intecultural. Em caso contrário, persistiria uma sorte de comunicação distorcida entre índios e brancos, comprometendo a dimensão ética do discurso argumentativo (CARDOSO DE OLIVEIRA, 2006, p. 180). Com os Terena, a dialogia só poderia ser perseguida14 através desse tipo de metodologia, como experiências anteriores já haviam me mostrado. 14 A plenitude da dialogia no caso do Carteira Indígena não é possível porque existe uma lógica dominante, a do não indígena, e representávamos essa ordem. 25 Nesse sentido, nós dividimos os presentes em três grupos assim distribuídos: no primeiro grupo, representantes dos projetos enviados pelas aldeias Olho D’Água, Oliveira e Barreirinho; segundo grupo, representantes dos projetos enviados pelas aldeias Recanto e Água Azul; terceiro grupo, representantes dos projetos enviados pelas aldeias Buriti e Lagoinha. Os representantes das aldeias da T.I. Nioaque, que representavam um projeto, dividiram-se entre o primeiro (aldeia Brejão) e o segundo grupo (aldeias Taboquinha, Água Branca e Cabeceira), numa estratégia de conhecer os projetos e agir politicamente, já que eles eram minoria e visitantes, essa articulação lhes rendeu uma vaga na II Oficina Nacional. A maioria das demais pessoas que não eram representantes e nem diretamente responsáveis foram participar das discussões pertinentes aos projetos que diretamente são beneficiados, enquanto uma minoria, constituída em sua maior parte por jovens, ficou tomando tereré e conversando num canto. Talvez o fato dos jovens terem pouca força política nas decisões possa ter influenciado em tal postura. Assim dividimos os três grupos em duas salas de aulas e o terceiro ficou no pátio da escola. A dinâmica era a de que eles discutissem entre si os benefícios, as dificuldades e as sugestões para o aprimoramento do programa. Foram dados para eles papel pardo, tipo cartolina, que a escola nos forneceu, bem como caneta pincel para escreverem os pontos de cada um dos tópicos. Ao mesmo tempo haveria uma nova oportunidade de trocas de experiências entre projetos diferentes. Deve-se ressaltar que as turmas mais cheias foram as do primeiro e segundo grupos, e foram os grupos que utilizaram muito a lousa para irem destacando os pontos, para em seguida escreverem no papel. As discussões do primeiro grupo foram organizadas e lideradas por Amâncio, professor da Escola Mbedi Reginaldo, que não é representante e nem diretamente responsável por nenhum projeto; as discussões do segundo grupo foram lideradas e organizadas por Alexandro e Odilon, ambos técnicos agrícolas representantes da T.I. Nioaque; enquanto que as discussões do terceiro grupo foram lideradas e organizadas por Vandelis, acadêmico do curso de graduação em Agroecologia representando a aldeia Buriti, e por Fábio, cacique da aldeia Lagoinha e representante do projeto desenvolvido nesta aldeia. Nossa equipe ia apenas pontualmente suprindo dúvidas, auxiliando na construção construírem das frases e pensamentos, percorremos todos os grupos. 26 Após realizadas as discussões e escritos os benefícios, as dificuldades e as sugestões, foi realizado o intervalo do almoço. b) Apresentação e discussão coletiva destes apontamentos; No retorno do almoço, iniciamos com a apresentação dos resultados das discussões realizadas internamente pelos grupos. Nas salas de aulas os cartazes foram colados nas lousas, e no pátio foram colados nas paredes para melhor visualização do conteúdo por todos. Essa parte foi a da coletivização dos resultados das informações, numa troca de experiências mais ampla que a do momento anterior. Todos os presentes foram para a frente dos cartazes enquanto um dos componentes do grupo ia apresentando e explicando os cartazes15, todos que explicaram foram aqueles que lideraram e organizaram as discussões. Assim, Amâncio explicou os resultados das discussões do primeiro grupo, Alexandro e Odilon os do segundo, e Vandelis os do terceiro grupo. Interessante perceber que todos aqueles que apresentaram os resultados são pessoas que possuem o “conhecimento do branco”, aqueles que sabem “melhor falar a linguagem do branco”. Percebe-se, então, que a apresentação, apesar de ter a finalidade de compartilhar experiências e coletivizar as discussões, para eles, foi uma oportunidade de: mostrar para nós, os purutuye, que eles sabem se expressar na nossa linguagem e a partir de nossos códigos, o que nos leva a pensar que, da perspectiva deles, a apresentação era mais para nós do que para eles – haja vista que eles já conhecem os resultados de todos os grupos, porém essa foi a oportunidade para sistematizá-las. Por essa razão é que o cacique Fábio, que organizou as discussões juntamente com Vandelis, permitiu que este exercesse o dom da oratória nesse momento. Todos foram muito bem nas suas apresentações, tanto na articulação das palavras quanto na didática. Durante alguns momentos das apresentações nós do CI intervíamos para sanar algumas dúvidas, bem como havia intervenção da platéia com sugestões e exemplos. Durante as apresentações, eu fui realizando uma síntese rápida das falas e dos escritos para na seqüência apresentar as concordâncias entre os grupos dos pontos destacados, desmembrando também alguns pontos que durante o dia eu tinha discutido e/ou 15 Mais adiante, no tópico 5, detalharei os pontos destacados por eles nos cartazes. 27 escutado, para conferir se eu estava correto na minha compreensão. A finalidade também foi a de mostrar para eles o que eles tinham dito para confirmar, acrescentar, suprimir e discutir de maneira mais ampla novamente, trazendo as contribuições de Roberto e Zan que chegaram a sanar algumas dúvidas e deram alertas no que tange aos futuros projetos enviados ao CI. Mesmo depois de termos finalizados esse momento, foi dito que até irmos embora poderiam ainda avaliar suas colocações. Os resultados das discussões serão mencionados mais adiante visto que necessitam de destaque neste relatório. Finalizado esse momento, passamos para a escolha dos representantes para a II Oficina nacional. 3.3 3º Momento Escolha dos representantes para participação na II Oficina Nacional; Roberto iniciou esclarecendo a importância do momento e relembrando que os Guató também fazem parte das comunidades indígenas de MS atendidas pelo Carteira Indígena, mas que a decisão sobre os representantes seria da comunidade, e a equipe do CI iria acatar a decisão, desde que sejam pessoas que façam parte de algum projeto financiado pelo CI. Miguel também tomou a palavra e disse ser justo que uma das vagas fosse assegurada para um Guató, porque eles deveriam compartilhar com os eles a oportunidade. A comunidade respondeu dizendo que “os Guató sempre estão nas reuniões, lá em Brasília, qualquer reunião tem Guató. Chama Guató . Nós queremos ir lá para discutir, nós viemos aqui e sabemos do que se trata, os Guató não têm esse conhecimento . Nós nunca somos chamados, nunca temos oportunidade” (Amâncio, fala pública). Os caciques queriam se reunir e escolher os representantes, mas os demais se opuseram e participaram da escolha com o argumento de que os representantes das associações, através da qual os projetos são financiados, também teriam o direito de escolher. Assim, deixamos que eles se reunissem sem nossa interferência e nos apresentassem os nomes cujos dados (nome, endereço, telefone para contato, número da carteira de identidade e CPF) foram anotados por Roberto. Os nomes escolhidos foram: 1) Amâncio Vitorino Delfino, residente na aldeia Água Azul, T.I. Buriti escolhido para representar as aldeias dessa T.I. 28 Telefones para contato: (67) 3243 1491 (aldeia) e (67) 9605 4534 (celular). 2) Odilon Lídio Miranda, residente na aldeia Taboquinha, T.I. Nioaque, escolhido para representar as aldeias dessa T.I. Telefone para contato: (67) 3236 1997 (aldeia). Algumas considerações devem ser feitas sobre as escolhas. Foi frisado que, apesar de cada um estar representando a sua T.I., estarão representando os interesses dos povos indígenas de MS, mas o que os capacitou para serem os representantes é estarem ligados à projetos que estão sendo desenvolvidos nas respectivas T.Is. É interessante perceber que nenhum cacique conseguiu ou tentou sua indicação, porque foram indicados aqueles que possuem o conhecimento acadêmico, que irá dialogar nos códigos pertencentes às burocracias dos projetos, o que de certa forma democratiza as relações de poder, mas que também impõem, para eles, a necessidade dessa nova normatividade dada pela burocracia dos projetos. Destaca-se que Amâncio foi aquele que organizou e liderou as discussões sobre os projetos do primeiro grupo, bem como foi aquele em que apresentou os resultados. Parece que goza de certo prestígio na comunidade, pois mesmo sem ser responsável direto por um projeto conseguiu sua indicação. Outro ponto a ser destacado é que Odilon reside na aldeia Taboquinha em outra T.I., e por isso era visitante. Há pouco comentei que o grupo da T.I. Nioaque se dividiu assumindo pontos estratégicos em dois grupos de discussão (primeiro e segundo), cujo fruto foi conseguirem uma indicação. Odilon também foi quem estava organizando e liderando o seu grupo de discussão ao lado de Alexandro, mas provavelmente, conseguiu sua indicação porque Alexandro foi um dos representantes Terena do MS na última reunião do PDPI que aconteceu em Brasília, caracterizando um rodízio nas representações, talvez para que o grupo, constituído somente por jovens recém-formados – GTAI –, estão querendo modificar as relações políticas e pretendem não deixar um poder centralizado, ou outra conjectura possível seria a disputa interna dentro do GTAI, o fato de Odilon possuir o conhecimento acadêmico o gabaritou para representar os Terena mesmo que o projeto do 29 qual participa, Recuperação de Micro-bacias na T.I. Nioaque, ainda não esteja em andamento visto que o recurso ainda não foi creditado. 3.4 4º Momento Encerramento Após a escolha das indicações, prosseguimos para encerramento do Encontro com os agradecimentos e saudações. Foi um momento aberto a todos que pudessem falar: começamos nós do CI, depois foram as lideranças e por fim o cacique Dodô. Entre os Terena, todo encerramento de eventos com a presença de não indígenas segue o mesmo ritual: as lideranças falam sobre a importância do evento, sua percepção do mesmo, agradecem a presença dos purutuye, e assim as lideranças vão dizendo, e por fim, para encerrar, o cacique da aldeia faz o seu discurso seguindo o mesmo roteiro. No final, Leonardo registrou a presença de todos com uma foto. Seguimos para Campo Grande, onde no dia seguinte Zan e Roberto participariam de uma reunião na Secretaria do Meio-Ambiente do Estado e MS para tentarem resolver os problemas do projeto de piscicultura da aldeia Barreirinho, enquanto eu e Leonardo pernoitamos em Campo Grande e seguimos para Cuiabá e Brasília, respectivamente. 4. Os Projetos da Terra Indígena Buriti Neste tópico, procurarei compreender os projetos que estão sendo desenvolvidos através dos próprios projetos enviados e aprovados pela Comissão de Avaliação do Carteira Indígena, bem como os andamentos dos mesmos a partir dos Relatórios de Atividades sobre os respectivos projetos – cujo objetivo era o de verificar as dificuldade no andamento dos projetos –, produzidos a partir da visita realizada no final do mês de julho e início do mês de agosto de 2007 por Juliana Costa e Benedicto Zan, técnicos do CI, trazendo aspectos sociais e culturais dos Terena para melhor compreensão dos mesmos. Destaco que não tive acesso ao projeto enviado pelos Terena da T.I. Nioaque, por isso, minha reflexão se baseia nos projetos da T.I. Buriti. A seguir, destacarei os pontos positivos do programa, as dificuldades e as propostas de mudanças ressaltadas pelos Terena durante a consulta. Porém, como afirmei no início, 30 todos os apontamentos devem ser percebidos no contexto vivido pelos Terena da T.I. Buriti e da T.I. Nioaque. Projetos a) Projeto Pró-Alimento Sustentável – Aldeia Buriti (representante presente no Encontro: Vandelis Mamede) Enviado em fevereiro de 2005, a proponente é a Associação Indígena Terena da Aldeia Buriti, o presidente atual é Antonio Bernardo Gabriel, e a executora é a própria comunidade, sendo responsáveis pela execução o presidente e o diretor, Vandelis Mamede. O objetivo do projeto é aumentar a qualidade nutricional da comunidade da Aldeia Buriti através da inclusão do leite na alimentação cotidiana. Para tanto, propuseram implementar uma atividade leiteira, com a compra de 36 cabeças de bovinos (sendo um touro para reprodução e 37 vacas), que ficariam situados num total de 30 hectares. Segundo a proposta, um grupo de homens da comunidade seria capacitado por um médico veterinário da Coopaer – Cooperativa de Trabalho em Desenvolvimento Rural e Agronegócio – que os capacitará em todo o processo da atividade leiteira, “desde a formação do plantel de animais, manejo correto do gado, até a distribuição do leite para as famílias da comunidade” (Projeto...Aldeia Buriti, fev/2005). Essa metodologia resultaria numa capacitação de todos os envolvidos diretamente em toda a cadeia produtiva do leite. O valor do projeto é orçado em R$ 49.470,00, para beneficiar as 229 famílias da aldeia, totalizando, segundo dados da Funasa, 1029 pessoas, sendo 10 famílias diretamente envolvidas. Segundo o Relatório de Atividades – processo 02000.00963/2005-51, de 31 de julho de 2007, Juliana Costa e Benedicto Zan, constataram que os responsáveis pelo projeto haviam adquirido além de materiais permanentes e de consumo, 35 vacas girolanda, um touro e um cavalo, modificando o projeto original com a concordância da CI. Houve um remanejo do dinheiro, sem concordância do CI, para pagar despesas com contabilidade, o que não deveria ter acontecido, já que a empresa Coopaer havia se comprometido com essa função, por isso, a capacitação, de responsabilidade da Coopaer, que antes era para 10 pessoas passou para 20. 31 b) Projeto Pró-Alimento Sustentável – Aldeia Barreirinho (representantes presentes no Encontro: João Vitorino Delfino e Lourenço Rodrigues Mamede) Enviado também em fevereiro de 2005, a associação proponente é a Associação Indígena Terena da Aldeia Olho D’Água, o atual presidente é João Vitorino Delfino, e a executora é a comunidade Barreirinho, sendo responsáveis pelo projeto o cacique Lourenço Rodrigues Mamede e os indígenas Egídio Rodrigues Mamede e Valdecir Rodrigues Mamede. Ressalta-se que a comunidade Indígena Terena de Barreirinho não possui uma associação constituída juridicamente, por isso recorreram aos parentes da aldeia Olho D’Água utilizando a sua associação como proponente. Também com o objetivo de melhorar a qualidade nutricional alimentar dos moradores da comunidade, os Terena propuseram incluir o peixe mais regularmente na alimentação através da implantação da atividade da piscicultura na aldeia. A produção coletiva seria realizada pelos homens que seriam capacitados por um técnico especializado em todos as fases da cadeia produtiva, desde escolha da espécie de peixe mais adequada para o cultivo, passando por aspectos topográficos da área de implantação do projeto, pela qualidade da água a ser utilizada no abastecimento dos tanques, chegando até as técnicas de manejo dos peixes. A capacitação teria efeito dominó, ou seja, alguns seriam capacitados para passar o conhecimento aos outros. O valor do projeto foi orçado em R$ 47.447,59, para beneficiar 23 famílias moradoras, totalizando cerca de 100 pessoas, sendo que 3 famílias estariam envolvidas diretamente com o projeto. Segundo o Relatório de Atividades – Processo 02000.00967/2005-30, de 02 de agosto de 2007, Juliana e Zan, constataram que até aquele “momento não foi possível executar o projeto tendo em vista que o licenciamento ambiental não foi liberado” (Relatórios de Atividades ... Aldeia Barreirinho, 2007). No Relatório consta que no dia 02 de abril de 2007 através de ofício (OFÍCIO/GLA/IMASUL/Nº0231/07), a SEMA – Secretaria de Estado de Meio-Ambiente de Mato Grosso do Sul – solicitou o envio de vários documentos para que o licenciamento pudesse ter sido liberado, mas “o sr. Ronaldo, (Coopaer) informou que os documentos solicitados ainda não haviam sido providenciados, mas se comprometeu a encaminhá-los para a Sema o mais breve possível” (Ibidem.). Na oportunidade a comunidade perguntou se o projeto poderia ser mudado para atividade 32 leiteira, mas os técnicos lhes informaram que o processo seria demorado, razão pela qual eles continuaram insistindo na atividade da piscicultura. Até o dia 13 de fevereiro de 2008, o licenciamento ambiental ainda não tinha sido liberado, por isso Zan e Roberto, no dia seguinte iriam ter uma reunião na Sema para averiguar a situação. c) Projeto Pró-Alimento Sustentável – Aldeia Oliveira (representantes presentes no Encontro: Nilson, cacique, e Antonio Bernardo Gabriel, presidente da associação) Enviado em março de 2005, a proponente do projeto é a Associação Indígena Terena da Aldeia Buriti, cujo presidente é Antonio Bernardo Gabriel, e a executora é a comunidade Terena da Aldeia Oliveira, sendo os responsáveis pelo projeto Moisés Silva Gabião Filho, Sidmar Alcântara, Nilson Dias Cordeiro, José Henrique Maciel Gomes, Josimar da Silva Honorato, Adir Gabilon da Silva e Nélio Dias Cordeiro. Uma vez que a comunidade não possui organização juridicamente estabelecida, solicitou apoio dos parentes da associação da aldeia Buriti. A atividade leiteira também foi a alternativa encontrada pela comunidade para aprimorar o valor nutricional da alimentação, seguindo o mesmo método da aldeia Buriti, em que os capacitados passam os conhecimentos adquiridos através de capacitação por técnico aos demais. Para desenvolver a atividade leiteira propuseram a compra de 33 vacas e um touro, bem como outros materiais de consumo e permanentes, que estariam cercados numa área de 25,2531 hectares, para beneficiar cerca de 130 pessoas de 39 famílias que residem na aldeia, estando 7 diretamente envolvidas no projeto. O projeto foi orçado em R$ 48.806,00. O Relatório de Atividades, de 31 de julho de 2007, elaborado por Juliana e Zan, aponta que foram adquiridas materiais de consumo e permanentes e 22 vacas, e que com a segunda parcela a comunidade solicitou o remanejamento do saldo para comprar 9 vacas, um touro e um cavalo. d) Projeto Pró-Alimento Sustentável – Aldeia Olho D’Água (representantes presentes no Encontro: Olívio, cacique, e João Vitorino Delfino, presidente da associação) O projeto proposto pela Associação dos Moradores Indígenas da Olho D’Água, presidida por João Vitorino, foi enviado em abril de 2005, sendo executado pela própria 33 comunidade, cujos responsáveis são: Eduardo da Silva (vice-presidente da associação), Alísio da Silva, Edson Gabriel da Silva, Eugênio Roberto Reginaldo, Natalício da Silva, Geder Roberto Reginaldo, Romilso André Vitorino. Com a mesma finalidade de resolver ou amenizar o problema na qualidade nutricional da alimentação da população moradora da aldeia, propuseram iniciar a atividade leiteira com a compra de 13 vacas e um touro que seriam gerenciadas pela própria comunidade com a capacitação dada por técnico especializado, seguindo a mesma metodologia dominó, uns passando os conhecimentos aos demais. A compra dos bovinos e dos materiais de consumo e permanentes foram orçados em R$ 27.648,00, para beneficiar cerca de 450 pessoas organizadas em cerca de 100 famílias, sendo que dessas famílias 7 estariam diretamente envolvidas no projeto. Juliana e Zan afirmaram no Relatório de Atividades – Processo 02000.001723/2005-74, de 02 de agosto de 2007, que na oportunidade a comunidade ressaltou “que o projeto precisaria de adequações orçamentárias. Essas adequações, de acordo com a comunidade, são importantes para o bom funcionamento do projeto” (Relatório de Atividades...Aldeia Olho d’Água, 2007). Pois, outros insumos não previstos seriam necessários, por isso foi acertado o remanejamento do orçamento, ficando, além dos materiais permanentes e de consumo, acertado a compra de 11 vacas, um touro e um cavalo. e) Projeto Pró-Alimento Sustentável – Aldeia Recanto (representantes presentes no Encontro: Pedro da Silva, presidente da associação proponente, e Geronso Santana da Silva, cacique) A comunidade enviou o projeto em abril de 2005 através da Associação de Produtores Agrícolas Indígenas da Aldeia Recanto – APAI, com a finalidade da melhoria da qualidade nutricional alimentar dos moradores da aldeia, por isso elaboraram o projeto de inclusão do leite e derivados na alimentação, propondo a implantação da atividade leiteira na aldeia. A execução do projeto é da própria comunidade, e os responsáveis são: Adenir da Silva Pereira, Adário da Silva Mamedes, Ananias Mario Jorge, Jovair Cruz Bernardo, Eloir Manoel Cafaro, Geronso Santana da Silva, Irene José Pereira, Catarino Santana da Silva. 34 A metodologia - similar a dos demais projetos de atividade leiteira enviados pela comunidade Terena da T.I. Buriti - estabelece a capacitação de alguns homens na cadeia produtiva, sendo os mesmos os responsáveis na transmissão dos conhecimentos adquiridos aos demais moradores que se interessassem. Para beneficiar cerca de 173 pessoas de 34 famílias, além de materiais permanentes e de consumo, propuseram a compra de 33 vacas e um touro, com 8 famílias estando diretamente envolvidas. O projeto foi orçado em R$ 49.906,00. O Relatório de Atividades – Processo 02000.001861/2005-53, de 01 de agosto de 2007, de Juliana e Zan, aponta que foram comprados 19 vacas e um touro, e que devido “a falta de experiência, a proponente utilizou a taxa da administração para comprar dois cavalos, arreio, tralha e para fazer a marca da associação” (Relatório ...Aldeia Recanto, 2007). Outro apontamento importante foi o fato dos indígenas reclamarem da ausência da assistência técnica da Coopaer, além de destacarem a presença da Funai no auxílio para realizar as compras dos bovinos. Apesar do remanejamento do orçamento feito sem prévia autorização da CI, os cavalos estão sendo utilizados do desenvolvimento do projeto. Foi realizado, também, o remanejamento do orçamento da segunda parcela, após solicitação dos indígenas. f) Projeto Pró-Alimento Sustentável – Aldeia Lagoinha (representantes presentes no Encontro: Fábio, cacique, e Gesse, proponente) Mais um projeto enviado no mês de abril de 2005, tendo como proponente a Associação dos Pequenos Agricultores Indígenas da Aldeia Lagoinha, cujo presidente é Marcelino Gabriel Manoel, sendo executado pela própria comunidade tendo como responsáveis: José Marcelino Jorge, Ivo Jorge, Adelor Honorato Lopes, Fábio Marcelino Jorge, Gerson Gabriel Marcelino, Basílio Jorge, Agenor Honorato Lopes, Gesse Marcelino Gabriel. Orçado em R$ 25.890,00, a comunidade propôs a implantação da atividade leiteira através da capacitação de um grupo de homens que aprenderiam com um técnico especializado; todas as técnicas da cadeia produtiva do leite, por usa vez, seriam transmitidas para os demais. O projeto não menciona números de famílias beneficiadas, mas no encontro soubemos que toda a comunidade da aldeia é beneficiada. A proposta previa a compra de 13 vacas e um touro, bem como materiais de consumo e permanentes. 35 De acordo com o Relatório de Atividades – Processo 02000.001863/2005-42, de 30 de julho de 2007, de Juliana e Zan, os indígenas destacaram o apoio da Funai e Coopaer na realização das compras dos animais e dos insumos, mas sugeriram a importância da capacitação para a compra dos últimos, para que a comunidade pudesse ter maior autonomia. Com a primeira parcela do financiamento os indígenas compraram 10 vacas, materiais permanentes e de consumo. Devido às dificuldades que tiveram com relação a alimentação das vacas, solicitaram o remanejamento dos recursos da segunda parcela, que foi autorizada pela equipe do CI. g) Projeto Pró-Alimento Sustentável – Aldeia Água Azul (representantes presentes no Encontro: Dodô Reginaldo, cacique, e João Vitorino Delfino, proponente) Foi o último projeto enviado pelos Terena da T.I. Buriti que foi aprovado, sendo enviado em julho de 2005 pela proponente Associação dos Moradores Indígenas do Olho D’Água, cujo presidente é João Vitorino Delfino, e a executora é a própria comunidade, os responsáveis são: Zezinho Jorge (hoje falecido), Dodô Reginaldo, Demanir Duarte, Valmir Delfino, Jason Roberto, Dionízio Vitorino, Arão Lourenço, Izaque Delfino, e mais 20 moradores que estavam em anexo ao projeto. A finalidade também é a mesma dos demais projetos, ou seja, melhorar a qualidade nutricional da alimentação dos moradores da comunidade. Para tanto, propuseram a implantação da atividade leiteira para introduzirem o leite mais regularmente na alimentação. Através da capacitação de 28 moradores nas técnicas da cadeia produtiva do leite, através de curso ministrado por um técnico especializado, estes ficariam encarregados de distribuírem o leite dentre as 82 famílias que residem na aldeia durante o primeiro ano do projeto, pois a partir do segundo ano, eles deveriam transmitir o conhecimento para os demais, havendo, assim, ciclos anuais de rodízio entre os responsáveis pelas atividades anualmente. O projeto foi orçado em R$ 49.528,00, para atender as 82 famílias, totalizando cerca de 427 pessoas, por isso propuseram a compra de 32 vacas e um touro, bem como materiais permanentes e de consumo. Segundo o Relatório de Atividades – Processo 02000.001725/2005-63, de 01 de agosto de 2007, Juliana e Zan, apontam que os indígenas relataram que tiveram dificuldades na compra do gado, dos materiais e no manejo do gado, e também a morte do 36 cacique Zezinho prejudicou o andamento, já que ele era um dos responsáveis pelo projeto. Ressalto a importância significativa da morte do cacique, pois entre os Terena quando alguém morre geralmente algumas modificações são realizadas, seja no local de moradia ou onde o morto costumava sempre andar ou trabalhar. Esse aspecto cultural certamente influenciou o desenvolvimento do projeto. Na oportunidade, a equipe do CI constatou que foram comprados 14 vacas leiteiras, doze novilhas e um reprodutor. Houve discordância com relação ao valor solicitado pela Coopaer para realizar a assistência técnica (R$ 3.000,00), por isso abriram mão desta. Em razão dos gados adquiridos com os recursos terem sido colocados no mesmo espaço que os animais já existentes na aldeia, houve a morte de 10 vacas em razão de falta de alimentação. Algumas Considerações sobre os Projetos Todos os projetos possuem semelhanças que devem ser destacadas e compreendidas dentro do contexto vivido pelos Terena. - Os problemas identificados: Desnutrição das crianças e sua relação com a causa de óbitos infantis; terra indígena insuficiente para a prática agrícola; inexistência de outras atividades que gerem renda; e crescente fluxo de jovens para as cidades a procura de empregos. - Benefícios sociais do projeto: Alternativa de alimento produzido pela própria comunidade; alternativa de geração de renda com o excedente da produção. - Linha Prioritária: Práticas sustentáveis de produção de alimentos. - A mesma assessoria técnica: Coopaer. - Mesma atividade na maioria dos projetos: Vaca leiteira - Contrapartida da comunidade: Mão-de-obra Como mencionei antes, a situação fundiária vista a partir da equação população por hectares (menos de um por pessoa) não permite uma vasta e satisfatória produção agrícola, atividade preferencial e tradicional dos Terena, como também é escassa a caça, a pesca ou a coleta, razões pelas quais muitos saem a procura de empregos nas cidades da região a busca de recursos para garantir a sobrevivência do grupo − o extremo nesse processo foi a 37 migração nos últimos anos de várias famílias da TI Buriti para as terras no Estado de Mato Grosso em busca de um local em que pudessem vislumbrar um futuro para as crianças. Daí a preocupação em incrementar a alimentação e também gerar atividade que resulte em geração renda para garantir a subsistência. O fato de seis dos sete projetos propostos e aprovados serem de atividade leiteira é compreensível na medida em que os Terena tem uma longa história no manejo com o gado, sendo que documentos do século XIX já apontavam os Terena, juntamente com os Guaicuru, como sendo criadores de gado (VARGAS, 2003). Também, quando suas terras no sul de Mato Grosso foram expropriadas, eles trabalharam durante muito tempo em fazendas criadoras de gado. O fato de solicitarem a assistência técnica se justifica menos pelo aprendizado do manejo com o gado, do que pelo aprendizado dos cuidados sanitários necessários para a retirada do leite para a venda. Deve-se ressaltar que o único projeto que teve mortes durante o primeiro ano de desenvolvimento do projeto, segundo os Relatórios de Atividades, foi o projeto da aldeia Água Azul, a única que recusou a assistência técnica, mas também a única que vivenciou a morte de um dos responsáveis, do líder da comunidade, o que, como mencionei, teve influências no desenvolvimento do projeto. Argumento que relacionar a morte dos gados diretamente e somente à falta de assistência técnica – por falha da própria comunidade que desprezou esse serviço por considerar o custo elevado – é desprezar a perspectiva cultural, variável fundamental quando se trata de um povo culturalmente diferenciado da sociedade nacional, haja vista que os indicadores mensuráveis são sempre a partir dos códigos da sociedade hegemônica. Daí, sobretudo, a importância da construção de uma comunidade interétnica de comunicação e argumentação (CARDOSO DE OLIVEIRA, 2006). Todos os projetos, apesar de apontarem o envolvimento direto de parte das famílias residentes nas respectivas aldeias, enfatizam que os benefícios são direcionados a todos os moradores. Outro fato importante é que todas as propostas estavam baseadas na contrapartida da comunidade com mão-de-obra na construção das cercas, na preparação do solo, na produção de alimentos para o gado, no manejo com o gado, na preparação da estrutura do projeto de piscicultura, mostrando o envolvimento da comunidade para alcançar os objetivos. Voltarei a esse ponto mais adiante quando destacar as sugestões da comunidade. 38 As associações proponentes foram todas da própria comunidade Terena da T.I. Buriti, sendo um total de 4 associações juridicamente regularizadas e com situação regular junto a Receita Federal. Sobre as associações, Sant’Ana (2004, 2006) afirma que organizados em grupos, os Terena, atualmente, estão recorrendo, também, à constituição de associações juridicamente regularizadas, ou não, com o objetivo de manter e construir relações políticas e sociais com um ou mais grupos familiares (relembro que as alianças dos grupos são fluidas). A autora recorre às tramas políticas para diferenciar as características das associações em contexto urbano e em contexto de aldeia, e que o fenômeno do associativismo entre os Terena deve ser compreendido por essa perspectiva, ou seja, através dos usos, das funções e do espaço sócio-cultural que as associações ocupam na visão de mundo Terena (SANT’ANA, 2006). Nesse sentido, percebendo a sociedade Terena como estando organizada em grupos políticos que disputam alianças, poder, recursos, como também os diálogos com o “mundo dos brancos” e seus projetos, podemos compreender a lógica da existência de várias associações numa mesma T.I. o que reflete e respeita a atual configuração sócio-político-cultural interna na T.I. 5. O Carteira Indígena a partir da perspectiva dos Terena da T.I. Buriti e da T.I. Nioaque – resultados da consulta Todo o percurso traçado até aqui foi necessário para melhor compreendermos a perspectiva Terena acerca do programa, por isso, destacarei a partir de agora os resultados das contribuições obtidas durante a consulta, tanto através dos resultados das discussões em grupo que foram apresentadas coletivamente utilizando-se os cartazes, quanto através das informações que obtive em conversas informais com alguns dos presentes. As conversas casuais surgiram em muitos momentos em que eu me dirigi a eles ou eles se dirigiram a mim a partir de assuntos sobre parentes, acontecimentos que haviam ocorrido em Campo Grande ou nas aldeias, informações sobre a constituição de associações, informações sobre projetos, troca de idéias de projetos, etc. Esses momentos somente foram possíveis devido a minha história de uma década em contato os Terena, o que possibilitou que eles ficassem mais à vontade para expor outras informações comigo. É necessário ressaltar que os aspectos positivos foram menos destacados, o que é natural, já que o objetivo de nossa visita foi o de obter contribuições que proporcionassem 39 embasamento para modificações futuras no regulamento do programa, além disso, todos os projetos estão passando pelo momento de execução, o que significa que o interesse maior no momento foi o de nos mostrar as dificuldades e as sugestões de mudanças. Diante disso, irei reproduzir os cartazes escritos pelos grupos, e logo depois apontarei primeiramente os aspectos positivos, para em seguida apontar as dificuldades e as propostas de mudança. 40 Cartaz elaborado pelo grupo constituído por representantes e/ou responsáveis dos projetos desenvolvidos nas aldeias Olho D’Água, Oliveira e Brejão. Dificuldades Benefícios Mudanças Recursos não contemplados Derivados do leite atende a Mudança no valor no projeto para plantio de atendido no projeto comunidade cana e napiê para ração de (mínimo R$ 100.000,00) gado Seca, degradação de União comunitária pastagem Redação mais simples nos Manual de prestação de contas mais simples Auto-estima da comunidade Presença mais efetiva dos formulários para técnicos do Carteira apresentação de projetos Indígena Melhoria na qualidade nutricional da comunidade 41 Cartaz elaborado pelo grupo constituído por representantes e/ou responsáveis dos projetos desenvolvidos nas aldeias Recanto e Água Azul. Dificuldades Benefícios Mudanças Na elaboração do projeto União da comunidade Parcela única por falta de informação Falta de assistência técnica Benefício na execução do projeto: com leite derivados e Acompanhamento mais constante dos técnicos da -na compra; plantio; manejo; Carteira Indígena prestação de contas; local apropriado para tira leite (curral) Plantação de capineiras e Venda da produção (bezerro) Ter representantes Terena aquisição de implementos na comissão de avaliação de agrícolas projetos (titular) Aprendizagem no manuseio Capacitação com animais leiteiro beneficiados dos antes da liberação dos recursos Melhoria da qualidade Facilitar nutricional da comunidade a prestação de contas Envolver no mínimo cinco pessoas para a aquisição de compras do projeto 42 Cartaz elaborado pelo grupo constituído por representantes e/ou responsáveis dos projetos desenvolvidos nas aldeias Buriti, Lagoinha, Água Branca, Taboquinha e Cabeceira. Dificuldades Benefícios Mudanças Prestação de contas: O programa é bom Visitas - notas; tomada de preços Dificuldade mais freqüentes [equipe da CI] em Melhorou compreender o manual técnicas a qualidade Maior agilidade no processo nutricional de análise e liberação dos recursos Em compreender formulário de projetos o Esterco como adubo, Recurso correta asó Diversidade, para Associações veteranas os derivados Aumentar [do leite] Informação um compostagem, gera outras parcela, ou parcela única atividades Colocar a idéia no papel sem do Parcerias: Funai, Coopaer valor [de financiamento] Despesas extras Carteira Indígena Lucratividade a longo prazo Remuneração com a venda de bezerros Recursos sem devolução Integração comunitária responsável de pessoa 43 5.1 Aspectos positivos destacados De modo mais geral: importância do programa; valorização da auto-estima da comunidade; o fato dos recursos não serem empréstimos; integração da comunidade; melhoria na qualidade nutricional da alimentação; De modo mais específico: geração de renda a longo prazo através de produtos derivados do leite e da venda de bezerros machos; criação de atividades alternativas para geração de renda evitando assim o fluxo de jovens para as cidades. Durante as conversas públicas os Terena enfatizaram a importância das visitas da equipe do CI nas aldeias, por isso sugeriram que as visitas fossem freqüentes, fato verificado na forma como fomos bem recebidos pela comunidade. A positividade do programa também ficou evidente não somente nas falas públicas, mas também nas discussões internas dentro dos grupos. Ressaltaram que a concepção do programa, com as comunidades propondo seus projetos e não “sendo trazidos de cima para baixo, com a comunidade só aceitando” (Terena, informação oral), proporcionou tanto a valorização da auto-estima da comunidade, como a auto-sustentabilidade alimentar. Outro ponto destacado foi o fato de que o programa não realiza empréstimos, mas financia projetos sem a necessidade de devolução do dinheiro empregado. Ainda de modo mais geral, afirmaram que os projetos proporcionam maior união da comunidade indígena porque todos precisam se unir “para o projeto dar certo” (Terena, informação oral). Aqui, lembro a tendência da sociedade Terena em trabalhar em grupos dentro da comunidade, o que é uma característica das populações ameríndias, ao contrário da lógica na qual se baseiam muitos projetos elaborados pelas instituições governamentais e não governamentais, isto é, a lógica segundo a qual os povos indígenas se organizam comunitariamente, “como se os indígenas estivessem disponíveis culturalmente para formar cooperativas igualitárias, o que não coincide com os fatos, nem com as tradições” (LEONEL, 2000, p. 333). Pois, a produção de grande número desses agrupamentos tem como base o parentesco e a cooperação no trabalho, o que não se confunde com coletivismo, pois ali se sabe o que pertence a cada um, apesar de os recursos encontrarem-se mais disponíveis ao uso comum do que na cultura majoritária. Embora fundados na solidariedade e reciprocidade, não existe socialização da produção, nem a predisposição idealizada por bem-intencionados (Ibidem.). 44 Tal afirmação pode ser percebida muito claramente através da territorialidade Terena, cuja concepção de organização territorial com casas distantes umas das outras, mesmo as dos parentes mais próximos como filhos casados e irmãos, favorece e incita a produção econômica de maneira mais autônoma, bem como as áreas de agricultura estão sempre ao redor das casas, as roças familiares. Essa concepção territorial lhes custa, não raras vezes, a legitimidade de sua indianidade, pois muitas pessoas consideram que os Terena perderam sua organização tradicional indígena, quando não compreendem que tal territorialidade é resultado da singularidade histórica e cultural do povo Terena. Dos pontos positivos mais específicos, destaca-se o aprendizado do manejo dos animais, sobretudo, a parte sanitária. Assim como o benefício que o leite está gerando no incremento da alimentação, inclusive possibilitando a produção de derivados do leite, como os doces feitos pelas mulheres que são consumidos. Também, a reprodução do gado gera um produto a mais na venda a longo prazo, visto que os bezerros machos são vendidos, enquanto que as fêmeas se tornaram reprodutoras e produziram o leite. De outro lado, o esterco produzido pelo gado se torna adubo das lavouras, gerando outras atividades. 5.2 Dificuldades enfrentadas e propostas de mudanças As dificuldades e as propostas de mudanças podem ser sistematizadas a partir de três momentos: a) compreensão do programa e acesso as informações; b) elaboração do projeto; c) execução do projeto. a) Compreensão do problema e chegada das informações Enquanto ainda estávamos preparando o local e esperando a chegada dos demais e íamos conversando com os indígenas, ou em minhas conversas informais muitas perguntas surgiram: Quais são os tipos de projeto financiáveis pelo CI? Quando posso enviar um projeto? Qual o valor de financiamento do projeto? Posso enviar este ou aquele projeto? Vocês vão elaborar os projetos hoje? Pode-se perceber, então, que as informações relativas ao programa não chegam de maneira satisfatória, seja porque as informações não chegam de forma correta, seja porque a linguagem utilizada por quem transmitiu as informações não permitiu a decodificação por parte dos indígenas. Nas conversas informais que tive, os indígenas disseram que é preciso 45 que a própria equipe do CI vá até as aldeias para apresentar o programa. Não conheço o sistema utilizado atualmente para a disseminação das informações, mas conheço apenas um Terena que sabe como funciona o CI, o que significa que qualquer que seja a metodologia atualmente utilizada ela deve ser repensada, ao menos no Mato Grosso do Sul. Pois a linguagem do manual foi considerada complicada, por isso ter o manual não significa que as informações chegaram satisfatoriamente ao seu destino. b) Elaboração do projeto No que tange a elaboração do projeto, em conversas informais, constatei que há dois tipos de problemas: um que diz respeito à dificuldade de transmitir a idéia do projeto para o papel, isto é, eles sabem o que desejam e qual é o planejamento, mas têm dificuldades de colocar em linguagem escrita; a outra é a dificuldade que eles têm tido em compreender o formulário. A primeira é uma dificuldade que sempre encontro nas associações Terena com as quais dou assessoria, o que tento suprir através das conversas e dos cursos voluntários. Mesmo os não indígenas têm dificuldade de transmitir para o papel as suas idéias, por isso é natural a dificuldade dos indígenas. Quando essa dificuldade é suprida, surge a segunda, pois a estrutura e a linguagem do formulário também é percebida com certa complexidade. Assim, se você sabe transmitir sua idéia para o papel, enquadrá-la no formulário passa a ser o desafio. Não foi dada nenhuma sugestão para suprir a dificuldade na elaboração dos projetos (até porque eles sempre contam com assessorias externas, o que deveria ser revisto dado a importância de se fornecer capacitação a esses indígenas para que eles possam exercer plenamente a sua autonomia), mas com relação ao formulário, foi sugerido a simplificação do mesmo, com palavras mais simples ou com explicações mais pormenorizadas e com exemplos. Como ressaltei acima, para sanar essas dificuldades eles têm recorrido à assistência técnica (no caso especifico aqui a Coopaer) o que tem proporcionado menos autonomia e mais uma dependência. Da mesma forma, eles têm recorrido a FUNAI para a prestação de contas. Como o programa tem como objetivo a auto-sustentabilidade nutricional das comunidades indígenas, é fundamental que se crie alternativas para a capacitação dos 46 mesmos para que estes possam ter o controle de todas as etapas do processo que envolve os projetos, ou, pelo menos, naquelas etapas em que é possível buscar uma qualificação interna16. c) Execução do projeto Uma das dificuldades relatadas por eles diz respeito à demora na aprovação do projeto, o que resultou em defasagem do orçamento, visto que o mesmo foi realizado no ano de 2005, mas a primeira parcela creditada somente em 2006, prejudicando o andamento do planejamento. Da mesma maneira, aconteceu com a segunda parcela que saiu cerca de seis meses após a primeira parcela, mediante prestação de contas. A sugestão dada para solucionar foi uma maior agilidade no processo de avaliação dos projetos, assim como a liberação de parcela única e total dos recursos previstos, ou então, para aquelas associações que já desenvolveram um projeto financiado pelo CI de maneira correta e que proporem um segundo projeto, ou seja, para associações veteranas em financiamento do CI, seja dada a liberação dos recursos do segundo projeto de uma única vez. Essas medidas solucionariam o problema da defasagem dos recursos. Sobre a morosidade na avaliação dos projetos, os representantes da CI disseram que os projetos enviados no ano de 2006 estavam sendo avaliados agora, mas não aprofundaram os motivos da demora. Ainda sobre os recursos, foi solicitado o aumento no valor dos projetos, pois consideram o teto baixo para desenvolverem um projeto satisfatório. Essa sugestão deve ser entendida no contexto das aldeias Terena do MS, pois elas são populosas, sendo a menor população a da aldeia Barreirinho com 100 pessoas, o que é exceção nas aldeias Terena de MS. Por essa razão, um projeto de R$ 50.000,00 para atender cerca de 300 ou 450 pessoas, como é o caso da aldeia Buriti, não é suficiente. Aqui retomo uma característica já destacada da sociedade Terena para dar algumas sugestões. Haja vista que as aldeias Terena se organizam através de grupos 16 Por exemplo, para a prestação de contas creio que a contratação de um contador é bem vinda, já que não interfere diretamente nas idéias e concepções do projeto, já na parte da elaboração do projeto, creio que é fundamental que os indígenas recebam cursos de capacitação para que possa elaborar tranqüilamente seus projetos, o que não exclui que possam receber qualificação para a prestação de contas também, assim conquistam amplamente a autonomia. 47 políticos/familiares e de alianças − e que o “comunitarismo” não é próprio do universo indígena − creio que para atender uma população com a das aldeias da T.I. Taunay/Ipegue, por exemplo, cuja população de cada aldeia gira entre cerca de 600 ou 900 pessoas, é preciso possibilitar que uma única aldeia possa encaminhar mais de um projeto, através de suas respectivas associações, beneficiando assim toda a aldeia. Com relação ao formulário dos projetos, e devido aos imprevistos que possam acontecer no percurso – como foram os imprevistos de gastos para a compra de remédios para o gado que adoeceu, bem como o aumento de preços de um ano para outro − sugiro que haja um tópico no formulário que trate das despesas extras. As despesas extras seriam para situações emergenciais, bem como para a realização da cotação de preços, como foi dito: E para fazer o mapa de preços como eles falam, o dinheiro sai da onde? Nós temos que se virar e gastar para fazer isso (Fábio, cacique, informação oral). Assim, também, destacaram que para comprar mais alimento para o gado, devido a seca que aconteceu, tinham que solicitar remanejamento dos recursos para o CI através de ofício, o que tornou moroso o processo. Quando surgiram essas questões, os representantes da CI explicaram que não era possível a colocação de tal tópico com relação ao orçamento. Porém, como é um momento de modificações das normas e dada a sugestão da própria comunidade, considerei relevante colocar esse ponto. Ainda no que tange a avaliação dos projetos, foi solicitado que houvesse um representante Terena na comissão de avaliação. A presença da assistência técnica da CI no que tange ao andamento dos projetos, às dúvidas a serem tiradas, etc. (como foi a nossa visita ou a visita anterior realizada por Juliana e Zan) deveriam ser mais constantes, segundo a comunidade, pois acreditam que as dificuldades no que tange a compra do gado e a prestação de contas poderiam ser bem menores com a presença da equipe da CI. Solicitaram também a capacitação dos responsáveis pelo projeto no que tange ao uso dos recursos – notas fiscais, tomada de preços, formulário, etc. – antes da liberação dos recursos. Sugeriram que nas compra feitas com os recursos do CI se constitua uma comissão de ao menos 5 pessoas para aumentar a fiscalização sobre os recursos. Alguns dos Relatórios de Atividades de Zan e Juliana destacam que os indígenas tiveram dificuldades em realizar a prestação de contas, bem como em outros é mencionado 48 o fato de que a segunda parcela será liberada mediante o envio da prestação de contas. As dificuldades com a prestação de contas foi uma das maiores dificuldades relatadas, sendo sugerida a facilitação da mesma através, também, da simplificação do manual. 6. Considerações Finais Procurei demonstrar neste relatório a percepção dos Terena da T.I. Buriti e T.I. Nioaque sobre o programa, tomando-se em consideração as particularidades sóciohistórico-culturais, visto que as propostas para as mudanças nas normas e diretrizes da CI só podem ser compreendidas se percebidas a partir dessas particularidades. Busquei apontar a importância dos cursos de capacitação para uma real e plena autonomia dos Terena em seus projetos, como também o desejo dos mesmos em dar continuidade a parceria com o CIA. Destaca-se que a metodologia utilizada de consultas às comunidades indígenas atendidas é de fundamental importância, tanto para o aprimoramento do programa e aproximação com a realidade vivida pelos grupos atendidos, como também, para a efetivação do diálogo intercultural, numa atitude clara de valorização e respeito as especificidades das sociedades indígenas, grupos que foram por diversas vezes a ao longo da história excluídos dos diálogos e processos de construção das políticas públicas. 7. Referências Bibliográficas Citadas AZANHA, G. Verbetes sobre os Terena. In:. ISA, 2004. http://www.socioambiental.org/pib/epi/terena/terena.shtm CARDOSO DE OLIVEIRA, R.. Urbanização e Tribalismo. Rio de Janeiro: Zahar, 1968. ______. Etnicidade, eticidade e globalização. In: O trabalho do antropólogo. São Paulo; Unesp, 2006, pp.169-188. Diretrizes Gerais de Funcionamento e Acesso aos Recursos para Projetos. Carteira Indígena. Brasília/DF, 2004/2005. DUTRA, Mara Vanessa Fonseca. Relatório Técnico contendo proposta de aprimoramento da metodologia das consultas regionais aos beneficiários e instituições da sua rede de apoio e apresentação em “Power Point” sobre os antecedentes do processo de revisão das Diretrizes da CI. Novembro de 2007. Contrato: 2007/001591, Termo de Referência nº 127069. 49 HILL, J. & SANTOS-GRANERO, F. Comparative Arawakan Histories. Illinois, University of Illinois Press, 2002. LANNA, Marcos. “Nota sobre Marcel Mauss e o Ensaio sobre a Dádiva”. Rev. Sociol. Pol., Curitiba, 14: p. 173-194, 2000. LEA, V. Gênero feminino Mebengokrê (Kayapó): desvelando representações desgastadas. Cadernos Pagu (3), Núcleo de Estudos de Gênero/Unicamp, Campinas, 1994. LEONEL, M. Bio-sociodiversidade: preservação e mercado. Estudos Avançados, 14 (38), São Paulo, 2000. Encontros de Intercâmbio com os Povos Indígenas do Brasil. Consultas sobre as Diretrizes e Normas de Funcionamento. Carteira Indígena. Brasil, outubro a dezembro de 2007 MAUSS, Marcel. 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