30/ABRIL/2013
CLT 70 anos: "Carteira era usada pela polícia para
definir quem era vagabundo"
Três gerações lembram de quando tiraram o primeiro documento, o que isso
representou em suas vidas e quais eram as expectativas que tinham sobre o trabalho
formal
O metalúrgico aposentado Ademir Araujo Arruda, 57 anos: carteira de trabalho era sinônimo de
respeito
Em 1945, dois anos após a unificação da legislação trabalhista por meio da
Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), no governo de Getúlio Vargas, a dona de casa
Rachel Schmidt Pinto, de 83 anos, moradora da Zona Leste de São Paulo, tirou sua primeira
carteira de trabalho. O modelo tinha capa vermelha e vinha com a inscrição 'do menor'. Rachel
tinha apenas 14 anos.
O metalúrgico aposentado Ademir Antonio de Arruda, de 57 anos, também da Zona
Leste, lembra bem de quando tirou o documento aos 13 anos, com uma estampa do Juizado de
Menores, a pedido de sua mãe. Mas a época era outra, em 1969, nos tempos difíceis da
ditadura.
Naquela época, ter a carteira de trabalho significava não apenas um vínculo
empregatício, mas garantia uma certa segurança. "A carteira de trabalho era usada pela polícia
para definir quem era vagabundo. Com o documento, passamos a ter um nome, e a ser
respeitados."
Para o estudante Leonardo Gustavo da Silva Batista, 18 anos, a primeira carteira,
tirada há dois anos, significou um emprego melhor. Ele trabalhava desde os 13 anos, mas com
contrato informal, "um papel que assinava todo dia".
Três gerações de trabalhadores lembram da importância da legislação trabalhista
nesta segunda reportagem da série sobre os 70 anos da CLT e falam sobre expectativas e
conquistas no mercado de trabalho.
Aposentadoria pequena
Na transição do Brasil agrícola para o industrial, Rachel teve a sorte de começar
trabalhando na sessão de acabamento de uma tecelagem no Brás (região central de São Paulo),
quando a indústria têxtil aproveitava os bons ventos da economia. Ela perdeu sua mãe cedo.
Tinha um irmão no Exército e outros dois casados. Eram apenas ela, o pai e um irmão.
A dona de casa Rachel Schmidt, 83 anos, começou a trabalhar aos 14 anos com carteira assinada
Raquel entrou no mercado de trabalho para ajudar um pouco em casa, comprar roupas
e fazer seu enxoval de casamento. Com o salário, construiu sua casa e conseguiu fazer os
filhos estudarem, sonho da maioria das famílias na época. “Hoje eles estão bem de vida”, diz,
orgulhosa.
A aposentada trabalhou ali durante 14 anos, até os 28. Ganhava bem, entre quatro e
cinco salários mínimos, mais do que seu marido, que trabalhava em uma gráfica. Só saiu da
empresa porque foi vendida pelo patrão italiano para um turco. “Mudou para longe. Senão, eu
continuava”.
Na época, seu filho tinha sete anos, e influenciou na opção de passar a trabalhar em
casa, como pespontadeira, durante dez anos, sem registro. “Trabalhava até uma da manhã. Era
difícil encontrar trabalho. Pedia para ser registrada, mas não conseguia”.
O marido, na época, já trabalhava no departamento de cobrança da Arno, onde ficou
durante 20 anos. O tempo de carteira ajudou. Ele se aposentou com 42 anos de trabalho e
recebia dois salários. Rachel até hoje não se aposentou porque recebe a aposentadoria do
marido, maior do que a sua. Na carteira, tem apenas os 14 anos registrados.
Rachel reclama da aposentadoria, que, com o tempo, 'achatou'. "Antes não passava
apertado: comprava do bom e do melhor. Mas hoje puxo daqui e dali, mas o dinheiro não dá".
Tempos de luta
Ademir lembra do primeiro emprego como uma “vitória” e diz que ganhou "um nome"
ao tirar a carteira de trabalho. “Se ficasse na rua, era tachado das piores coisas".
Seu pai era empregado público, mas as condições de trabalho eram ruins e, o salário,
"de fome”. “Meu pai não sabia o que era final de semana. Na época, a legislação era um zero à
esquerda”
Ademir lembra do advento do Programa de Integração Social (PIS), em 1970. “Era a
única porção do salário que minha mãe não mexia. Uma alegria”. Mas sentia falta de
benefícios como planos médicos, cesta básica e vale transporte.
O aposentado conta que trabalhava de manhã e, ao abandonar o ginásio, estudava até
meia-noite, com os três irmãos, no Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai).
“Tinha esperança de dias melhores. Tudo o que tínhamos era bom, suado”. Ademir teve
apenas dois trabalhos registrados.
Ademir sempre foi sindicalizado. As condições precárias de segurança no trabalho o
levaram a se tornar ‘cipeiro’, o funcionário responsável na época por fiscalizar o uso de
equipamentos de segurança. "Era um tempo de muito emprego, mas mesmo assim tinha medo
de não conseguir outra ocupação caso fosse demitido".
Hoje, está satisfeito com a aposentadoria especial, por insalubridade do local de
trabalho. "É uma segurança: sempre estará ali. Infelizmente, muitos colegas não conseguiram
chegar até aqui".
O estudante Leonardo Gustavo Almeida da Silva Batista, 18 anos: trabalho melhor
Futuro
O estudante Leonardo Gustavo Almeida da Silva Batista, 18 anos, é trabalhador formal
há um ano e dois meses. Logo que fez 16 anos, tirou o documento, até que encontrou um
trabalho em uma indústria de peixe, como auxiliar de produção.
Mas o jovem já trabalhava desde muito cedo, com 13 anos, de modo informal, em uma
fábrica de sapatos nos fundos de uma casa na vizinhança da zona leste de São Paulo.
O emprego registrado significou mais liberdade, e quase o dobro do salário, sem
contar a experiência, que agora pode ser comprovada no documento. Ele faz serviços
adicionais para o patrão, e também horas extras, para 'turbinar' o salário registrado.
Leonardo não precisa ajudar em casa, onde mãe e avó trabalham como prestadoras de
serviços. Ele utiliza o salário para comprar objetos de uso pessoal, e ter a liberdade de ter as
próprias despesas.
(FONTE: MARÍLIA ALMEIDA – IG)
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