Gabriela da Silva Dias Análise proteômica da variação individual em venenos de filhotes de Bothrops jararaca Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Toxinologia do Instituto Butantan, para obtenção do título de Mestre em Toxinologia. São Paulo 2013 Gabriela da Silva Dias Análise proteômica da variação individual em venenos de filhotes de Bothrops jararaca Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Toxinologia do Instituto Butantan, para obtenção do título de Mestre em Toxinologia. Orientadora: Solange Maria de Toledo Serrano São Paulo 2013 FICHA CATALOGRÁFICA Dias, Gabriela Análise proteômica da variação individual em venenos de filhotes de Bothrops jararaca/Gabriela da Silva Dias/ orientadora: Solange Maria de Toledo Serrano. – São Paulo, 2013 143 fls. : il. color. ; 30 cm. Dissertação (Mestrado) – Programa de Pós-Graduação em Toxinologia. Instituto Butantan, 2013 1. Bothrops. 2. Veneno de Serpente. 3. Proteômica 4. Filhotes. 5. Variabilidade Individual. I. Orientadora: de Toledo Serrano, Solange Maria. II. Programa de PósGraduação em Toxinologia. Instituto Butantan. III. Título. CDC 615.9 Elaborada com instruções fornecidas pela Biblioteca do Instituto Butantan POS-GRADUAÇÃO EM TOXINOLOGIA INSTITUTO BUTANTAN RESULTADO DA DEFESA DE DISSERTAÇÃO MESTRADO NOME DO ALUNO(A): Gabriela da Silva Dias DATA DO EXAME:.............../................ /................. BANCA EXAMINADORA: Profs. Drs. NOME Assinatura ________________________ (Presidente) ______________________ ________________________ ________________________ Aprovado(a) Reprovado(a) ( ______________________ ______________________ DECISÃO FINAL: APROVADO(A) ( ) ) ( ) ( ) REPROVADO(A) ( ( ) ( ) ( ) ) Comentários da Banca (opcional): Av. Vital Brasil, 1500 São Paulo,05503-‐900 Tel/Fax: (11) 3726-‐7222 r 2064 [email protected] http://posgrad.butantan.gov.br Dias G.S. 2013 AUTORIZAÇÃO PARA REPRODUÇÃO DO TRABALHO Eu, Gabriela da Silva Dias, mestranda pelo Programa de Pós- Graduação em Toxinologia, autorizo a reprodução deste trabalho no site da Secretaria da Saúde do Estado de São Paulo. ______________________________ Gabriela da Silva Dias Aluna ______________________________ Solange de Maria Toledo Serrano Orientador Dias G.S. 2013 Dedicatória Aos meus pais que me ensinaram a lição que nenhuma escola pode ensinar, às minhas amadas irmãs, Camila e Luciane, ao meu eterno namorado Alexandre pequenas Molly e e minhas Miney (em memória) Dias G.S. 2013 Dedicatória À minha orientadora Dra. Solange Maria de Toledo Serrano pela oportunidade aprendizado, Zelanis pela grandiosa e ao Dr. impecável e André co- orientação. Dias G.S. 2013 Agradecimentos Agradecimentos Esse pequeno espaço jamais representará a imensa gratidão que existe no meu coração para cada uma dessas pessoas citadas abaixo. Primeiramente agradeço a Deus por sempre me abençoar e guiar meus caminhos. À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). À diretora do Laboratório Especial de Toxinologia Aplicada do Instituto Butantan, Dra. Solange Maria de Toledo Serrano, que me deu essa grandiosa oportunidade de conhecer o mundo da pesquisa científica e me abrir os horizontes para o que é a vida. Ao Programa de Pós Graduação em Toxinologia do Instituto Butantan e seus funcionários: Kimie e Rosana. Ao Dr. Hugo Armelin, diretor do CAT/cepid por permitir desenvolver o trabalho. Aos membros da banca de qualificação, Dra. Ana Maria Moura da Silva (Laboratório de Imunopatologia), Dr. Marcelo Santoro (Laboratório de Fisiopatologia) e a Dr. Ida Shigueko (Laboratório de Fisiopatologia) pelas sugestões, pelas críticas valiosas e elogios. Ao Dr. André Zelanis, pela paciência e dedicação que teve desde quando eu nem pensava em começar o mestrado até finalizar o mesmo. Aos colegas do Laboratório de Herpetologia que forneceram gentilmente os filhotes para que pudéssemos fazer a extração do veneno e desenvolver esse projeto. Em especial ao Dr. Sávio Stefanini e a Dra. Marisa Rocha que dispenderam um tempo precioso comigo. Dias G.S. 2013 Agradecimentos À todos meus amigos do Laboratório Especial de Toxinologa Aplicada, Dr. Alexandre Tashima, Dra. Aline Lopes, Dra. Amanda Asega, Debora Andrade, Edson Takeshi, Eduardo Kitano, que me acolheram tão bem desde o primeiro momento que entrei, e sem excessão, me ajudaram, apoiaram em todos os momentos que passei por aqui e se tornaram uma agradável extensão da minha casa. À Dra Ana Helena que teve uma contribuição valiosa para esse projeto. À Dra Milene Menezes pela amizade, carinho e risadas. À Msc Ana Karina pela amizade, conselhos e inúmeras conversas. À Dra. Eliana Blini Marengo pela doçura e Dra. Fernanda Bruni pela calma que transmite. E que juntas fazem uma quinta feira ótima. À Luciana Bertholim pela companhia no Alemão. Aos funcionários da Laboratório Especial de Toxinoliogia Aplicada, em especial Isaías, Zezé, Cissa e Dona Cida que me acompanham desde o começo. Aos meus amigos da pós graduação, Hugo Vigerelli, Karina Kodama e Tarcísio Liberato que dividiram comigo as angústias e alegrias do dia-a-dia na vida de um estudante de pós graduação. Aos meus pais, Nilo Dias e Eliete da Silva Dias por serem exemplos de vida e por sempre me proporcionar mais do que poderiam. Às minhas irmãs, Camila e Luciane que sempre estiveram presentes em todos os momentos da minha vida dividindo sorrisos e lágrimas. Ao meu namorado, Alexandre, por sempre me apoiar nas decisões difíceis e incentivar meus estudos. Dias G.S. 2013 Agradecimentos Aos meus padrinhos Eliane e Saulo, que sempre foram como segundos pais pra mim. E a toda minha família que é meu alicerce de vida. À minha prima-amiga querida Simone Beu. Às minha amigas queridas Karen e Patrícia, que me acompanham desde a época que não sabíamos das responsabilidades da vida. À família do Alexandre: Zê, Sui, Fábio e Dona Almira que se tornou minha família também. Às amigas Jussara Santana, Paula Gouvêa e Fernanda Sasaki. Dias G.S. 2013 Epígrafe “Ela acreditava em anjo e, porque acreditava, eles existiam”. A Hora da estrela - Clarice Lispetor Dias G.S. 2013 Resumo RESUMO DIAS G.S. Análise proteômica da variação individual em venenos de filhotes de Bothrops jararaca. 2013. 144 fls. (Mestrado em Toxinologia) Programa de Pós-graduação em Toxinologia do Instituto Butantan, São PauloSP. Venenos do gênero Bothrops causam, além de efeitos locais, efeitos sistêmicos sobre os sistemas hemostático e cardiovascular. Mudanças ontogenéticas, além de variações relacionadas ao sexo do animal, na composição individual e atividades dos venenos de adultos, são características frequentemente reportadas na literatura, entretanto, a variação na composição individual de venenos de filhotes de serpentes deste gênero não é conhecida. Para este estudo, o veneno de 21 filhotes de B. jararaca foi extraído e estocado individualmente a -20°C até o uso. A quantificação de proteínas nos venenos variou entre os indivíduos, porém a maioria apresentou valores de 110-120 mg/ml. Os perfis eletroforéticos foram analisados com e sem redução das pontes de dissulfeto das proteínas e diversas diferenças foram visualizadas entre os venenos. O perfil eletroforético dos venenos com coloração para glicoproteínas mostrou sutis diferenças. A análise por Western blot utilizando um anticorpo anti-bothropasina mostrou reconhecimento significativo, porém variável, de bandas contendo metaloproteinases, na maioria dos venenos. Da mesma forma, a análise utilizando o anticorpo anti-MSP1/MSP2, revelou variação com relação às massas moleculares e intensidades das bandas reconhecidas contendo serinoproteinases. Considerando a importância da atividade proteolítica nos envenenamentos, foram utilizados dois substratos diferentes para a determinação dessa atividade: a proteína caseína, que pode ser degradada tanto por serinoproteinases como metaloproteinases e o substrato sintético LBenzoil-Arginil-pNA (L-BAPNA) que é degradado somente por serinoproteinases. Valores de atividade caseinolítica específica não apresentaram variação expressiva entre os venenos, porém quanto à atividade amidolítica sobre o substrato L-BAPNA os venenos mostraram significantemente diferentes, e alguns deles não apresentaram atividade enzimática sobre este substrato. Da mesma forma, a atividade coagulante sobre o plasma humano, determinada pela Dose Mínima Coagulante, mostrouse bastante variável entre os indivíduos. A análise dos venenos por cromatografia líquida acoplada a espectrometria de massas em tandem (LC-MS/MS) apresentou diferenças significativas entre algumas amostras, contudo uma característica ubíqua foi a presença do tripeptídeo <EKW em todos os venenos, um importante tripeptídeo, que é inibidor de metaloproteinases. O perfil eletroforético dos venenos, analisados com as proteínas submetidas à redução de pontes de dissulfeto, mostrou significativa variabilidade e a identificação de proteínas por digestão in gel com tripsina seguida de análise por LC-MS/MS foi realizada com o objetivo de identificar proteínas diferencialmente expressas nos venenos individuais de filhotes. Por outro lado, a análise eletroforética comparativa dos venenos em condições não Dias G.S. 2013 Resumo redutoras mostrou perfis individuais menos variáveis, quando comparados com a análise com redução, e a identificação de proteínas presentes em uma região do gel, que era semelhante entre os venenos, levou à identificação de metaloproteinases, L-aminoácido-oxidase, e aminopeptidase, que seriam toxinas comuns entre eles. Em conjunto, os resultados deste estudo demonstram a expressiva variabilidade individual nos venenos de filhotes de B. jararaca, fato que já havia sido demonstrado em venenos individuais de adultos desta espécie, e sugerem que a variação individual nos venenos está presente desde o nascimento, não sendo um reflexo da ontogenia do animal. Estes achados servem como subsídios para o entendimento das bases moleculares da variabilidade de venenos de serpentes, sobretudo da B. jararaca. Palavras-chave: Bothrops, filhotes,variabilidade individual. veneno de serpente, proteômica, Dias G.S. 2013 Abstract ABSTRACT DIAS G.S. Analysis of the individual variation of the venom proteome of Bothrops jararaca newborn specimens. 2013.144 p (Mestrado em Toxinologia) - Programa de Pós-graduação em Toxinologia do Instituto Butantan, São Paulo-SP. Envenomation by Bothrops snakes cause local damage as well as systemic, hemostatic and cardiovascular effects. Ontogenetic changes and variations related to animal gender, composition and activities of individual adult venoms are features commonly reported in the literature, however, the variation in the composition of newborn snake venom is still unknown. For this study, venom from 21 newborn specimens of B. jararaca was milked and stored at -20°C until use. Protein quantification in the fresh venoms varied among individuals however most of them showed values between 110 and 120 mg/ml. Venom electrophoretic profiles were analyzed under reducing and non-reducing conditions and showed various differential protein bands among the venoms. Glycoprotein staining showed some subtle variations in the individual venom glycoproteomes. Comparison of the venoms by Western blot analysis using an anti-metalloproteinase antibody (anti-bothropasin) showed intense recognition of various protein bands, however their molecular masses varied among the venoms. Likewise, recognition of serine proteinases in the venoms by an anti-serine proteinase antibody (anti-MSP1/MSP2) revealed bands of variable molecular masses in newborn venoms. Considering the importance of the proteolytic activity in B. jararaca accidents, two different substrates were used for measuring this activity: i) casein, a protein that can be degraded by both metalloproteinases and serine proteinases; ii) benzoyl-L-arginyl-pNA (L-BAPNA), a synthetic substrate which is only degraded by trypsin-like serine proteinases. The caseinolytic activity did not vary among the venoms, however, individual values of amidolytic activity upon L-BAPNA were significantly different among the venoms and some of them did not hydrolyze this substrate. Similarly, the coagulant activity was assessed by the determination of the Minimum Coagulant Dose and showed remarkable variability among the venoms. Analysis of the venoms by liquid chromatography coupled to tandem mass spectrometry (LC-MS/MS) showed significant differences between some samples, however, an interesting finding was the ubiquitous presence in these venoms of the tripeptide <E-K-W, which is an important inhibitor of venom metalloproteinases. The electrophoretic profiles of proteins submitted to reduction of disulfide bonds showed significant variability among the venoms and identification of proteins by in gel trypsin digestion followed by LC-MS/MS was carried out to identify proteins differentially expressed in the individual newborn venoms. On the other hand, the electrophoretic profiles of venoms analyzed under non-reducing conditions showed less individual variability and the identification of proteins present in a region of the gel which contained a broad protein band present in all venoms revealed the presence of metalloproteinases, L-amino acid oxidase, and amino peptidase as common components of these venoms. Dias G.S. 2013 Abstract Taken together, the results of this study demonstrate the significant individual variability in the venom of newborn B. jararaca specimens, a feature that has also been shown in adult specimens of this snake. Moreover, the findings of this work suggest that individual venom variability in B. jararaca exist since very early animal age and is not a result of ontogenetic changes. These findings can contribute for the understanding of the molecular basis of the variability of snake venoms, especially in B. jararaca. Keywords: Bothrops, snake venom, proteomics, newborn, individual variability. Dias G.S. 2013 Lista de Figuras LISTA DE FIGURAS Figura 1. Serpente Bothrops jararaca filhote. ................................................... 11 Figura 2. Perfil eletroforético dos venenos de filhotes de B. jararaca (proteínas não submetidas à redução) ............................................................................... 25 Figura 3. Perfil eletroforético dos venenos de filhotes de B. jararaca (proteínas submetidas à redução) ..................................................................................... 27 Figura 4. Perfil eletroforético dos venenos de filhotes de B. jararaca com coloração fluorescente para glicoproteínas. ...................................................... 29 Figura 5. Análise por Western blot dos venenos de filhotes de B. jararaca utilizando o anticorpo anti- bothropasina.. ......................................................... 31 Figura 6. Análise por Western blot dos venenos de filhotes de B. jararaca utilizando o anticorpo anti-MSP1/MSP2. ........................................................... 33 Figura 7. Atividade proteolítica de venenos de filhotes de B. jararaca utilizando como substrato a caseína.................................................................................. 35 Figura 8. Atividade amidolítica de venenos de filhotes de B. jararaca utilizando como substrato Benzoil-Arginil-p-nitroanilida. ................................................... 36 Figura 9. Perfis de LC-MS dos venenos de filhotes de B. jararaca .................. 39 Figura 10. Espectro representativo (MS/MS) do sequenciamento do íon correspondente ao peptídeo <E-K-W. ............................................................... 40 Figura 11. Perfil eletroforético dos venenos de filhotes de B. jararaca em gel de SDS-poliacrilamida (proteínas submetidas à redução) com indicação das bandas de proteínas recortadas para identificação por LC-MS/MS. ................. 42 Figura 12. Perfil eletroforético dos venenos de filhotes de B. jararaca em gel de SDS-poliacrilamida (proteínas não submetidas à redução) com indicação das bandas de proteínas recortadas para identificação por LC-MS/MS.. ................ 49 Figura 13. Comparação de características dos venenos de filhotes de B. jararaca machos e fêmeas utilizando o Teste T não pareado. .......................... 57 Figura 14. Dendrograma do agrupamento hierárquico dos venenos de filhotes de B. jararaca, evidenciando a divisão em dois grupos principais .................... 59 Dias G.S. 2013 Lista de Tabelas LISTA DE TABELAS Tabela 1. Toxinas isoladas do veneno de B. jararaca, com atuação sobre a hemostasia. ......................................................................................................... 7 Tabela 2. Dados dos espécimes de serpentes B. jararaca filhotes utilizados neste estudo. ..................................................................................................... 22 Tabela 3. Quantificação de proteínas presentes nos venenos individuais de B. jararaca filhotes. ................................................................................................ 23 Tabela 4. Atividade coagulante dos venenos de 21 filhotes de B. jararaca sobre o plasma humano. ............................................................................................. 37 Tabela 5. Identificação de diferentes bandas de proteínas dos venenos de filhotes de B. jararaca, indicadas na Figura 11, por LC-MS/MS. ....................... 43 Tabela 6. Identificação de diferentes bandas de proteínas dos venenos de filhotes de B. jararaca, indicadas na Figura 12, por LC-MS/MS ........................ 50 Dias G.S. 2013 Lista de Abreviaturas e Siglas LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS BPP: Bradykinin Potentiating Peptide (Peptídeo potenciador de bradicinina) BSA: Bovine Serum Albumin (soroalbumina bovina) CRISP: Cysteine- rich secretory protein ( Proteína secretada rica em cisteína) CTL: C-Type Lectin (Lectina tipo-C) DMC: Dose mínima coagulante DTT: DL-ditiotreitol FII: Fator II / Protrombina FIIa: Fator II ativado / trombina FLA2: Fosfolipase A2 FX: Fator X / Fator de Stuart FXa: Fator X ativado IAA: Iodoacetamina IgG: Imunoglobulina G kDa: Kilodalton LAAO: L-aminoácido oxidase L-BAPNA: L-Benzoil-Arginil-pNitroAnilida LC: Liquid chromatography (cromatografia líquida). LC-MS/MS: Liquid Chromatography coupled to tandem mass spectrometry (Cromatografia líquida acoplada à espectrometria de massas seqüencial) m/z: razão massa/carga MP: Metaloproteinase nm: nanômetro NPU: Número de peptídeos únicos PBS: Phosphate Buffered Saline (tampão fosfato-salina) pNa: para-nitroanilina Q-ToF: Quadrupole-Time of Flight (Quadrupolo- tempo de vôo) rpm: Rotações Por Minuto SDS: Sodium Dodecyl Sulfate (dodecil sulfato de sódio) Dias G.S. 2013 Lista de Abreviaturas e Siglas SDS-PAGE: Sodium Dodecil Sulfate - Polyacrylamide Gel Electrophoresis (Eletroforese em Gel de Poliacrilamida com Dodecil Sulfato de Sódio) SP: Serinoproteinase TFA: Trifluoracetic acid (ácido trifluoroacético) Tris: Tris (hidroximetil) aminometano VEGF: Vascular Endothelium Growth Factor (Fator de crescimento vascular endotelial) Dias G.S. 2013 Sumário SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ..................................................................................... 1 1.1. Proteoma e variabilidade dos venenos de serpentes do gênero Bothrops ................................................................................................... 1 1.2. Bothrops jararaca e seu veneno ....................................................... 6 1.3. Variabilidade no proteoma do veneno de B. jararaca ....................... 8 2. OBJETIVOS ....................................................................................... 12 3. MATERIAL E MÉTODOS .................................................................. 13 3.1. Extração dos venenos de filhotes ................................................... 13 3.2. Quantificação de proteínas ............................................................. 13 3.3. Eletroforese de proteínas em gel de SDS-poliacrilamida ............... 14 3.4. Atividade caseinolítica .................................................................... 14 3.5. Atividade amidolítica ....................................................................... 14 3.6. Atividade coagulante sobre o plasma– Dose Mínima Coagulante (DMC) .................................................................................................... 15 3.7. Análise do glicoproteoma................................................................ 15 3.8. Análise por Western blot ................................................................. 15 3.9. Digestão tripsínica in gel e identificação de proteínas por LC-MS/MS ............................................................................................................... 16 3.10. Análise do perfil proteico dos venenos por espectrometria de massas (LC-MS) .................................................................................... 19 3.11. Critério para identificação dos peptídeos e análise em banco de dados ..................................................................................................... 19 3.12. Análise estatística comparativa de algumas propriedades dos venenos ................................................................................................. 20 4. RESULTADOS ................................................................................... 21 4.1. Quantificação da concentração proteica nos venenos individuais de filhotes de B. jararaca ............................................................................ 21 4.2. Comparação do perfil eletroforético individual de venenos de filhotes de B. jararaca ......................................................................................... 24 4.3. Sub-proteoma de metaloproteinases. Análise por Western blot com o anticorpo anti-bothropasina ................................................................ 30 4.4. Sub-proteoma de serinoproteinases. Análise por Western blot com o anticorpo anti-MSP1/MSP2.................................................................... 32 4.5. Atividade proteolítica dos venenos individuais de filhotes de B. jararaca .................................................................................................. 34 4.5.1. Atividade caseinolítica ................................................................. 34 4.5.2. Atividade amidolítica .................................................................... 35 Dias G.S. 2013 Sumário 4.6. Atividade coagulante dos venenos individuais de filhotes de B. jararaca .................................................................................................. 36 4.7. Análise dos venenos de B. jararaca filhotes por espectrometria de massas (LC-MS) .................................................................................... 38 _Toc3495774384.8. Identificação de proteínas por espectrometria de massas em bandas diferenciais dos venenos..................................................... 41 4.9. Identificação de proteínas por espectrometria de massas em bandas comuns dos venenos ............................................................................. 48 4.10. Análise estatística comparativa de algumas propriedades dos venenos ................................................................................................. 56 4.10.1. Teste de comparação de médias entre machos e fêmeas ........ 56 4.10.2. Análise multivariada ................................................................... 57 5. DISCUSSÃO ...................................................................................... 60 6. CONCLUSÕES .................................................................................. 68 7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................. 69 Dias G.S. 2013 Introdução 1. INTRODUÇÃO 1.1. Proteoma e variabilidade dos venenos de serpentes do gênero Bothrops O gênero Bothrops pertence à família Viperidae, compreende mais de 30 espécies de serpentes, e tem esta denominação decorrente da língua grega: “Bothros” significa fosseta ou cavidade e “ops”, que significa olho ou face, uma alusão à fosseta loreal, localizada entre a narina e os olhos destas serpentes. (Carrasco et al, 2012). São caracterizadas pela ‘cabeça em formato de lança’, e estão amplamente distribuídas em regiões tropicais como América Latina, mais específicamente do nordeste do México até a Argentina e parte das ilhas do Caribe (Campbell e Lamar, 2004). Diversas espécies pertencentes a este gênero são responsáveis pelos acidentes ofídicos no continente Sul americano (Salomão et al. 1997; Warrel 2004). No Brasil, esse gênero compreende diversas espécies, dentre as quais estão: Bothrops jararaca (jararaca), B. jararacussu (jararacussu), B. alternatus (urutu-cruzeiro ), B. neuwiedi (jararaca-pintada) e B. moojeni (caissaca) (Melgarejo, 2003). O veneno dessas serpentes, que é produzido por glândulas exócrinas especializadas, consiste em uma secreção que contêm uma mistura complexa de proteínas e peptídeos bioativos que auxiliam a digestão de uma presa “não triturada”; constitui um mecanismo de defesa contra predadores/agressores e é o fator responsável pela subjugação das presas (Gans e Elliot, 1968; Thomas e Pough, 1979; Mackessy, 1993; Fry et al., 2006; Vonk et al., 2008). Algumas das proteínas presentes nos venenos do gênero Bothrops são enzimas, como serinoproteinases (Markland, 1998; Serrano e Maroun, 2005), metaloproteinases (Moura-da-Silva et al., 2007; Gutiérrez et al., 2005; Fox e Serrano, 2008), fosfolipases A2 (Kini, 2003, 2005), L-aminoácido oxidases (Du e Clemetson, 2002), e nucleotidases (Rael, 1998). Esses venenos contêm ainda outras proteínas como lectinas (Ogawa et al, 2005; Morita, 2005; Lu, 2005) e disintegrinas (Calvete et al, 2005). Os venenos produzidos por serpentes pertencentes à família Viperidae são conhecidos por conterem proteínas que 1 Dias G.S. 2013 Introdução interferem com o funcionamento normal do sistema hemostático (Markland, 1998; Braud et al, 2000; Fox e Serrano, 2005). As serinoproteinases de venenos de serpentes são classificadas no clan SA, família S1 da quimiotripsina (Barrett et al., 1995; Rawlings et al., 2008). A tripsina de mamíferos e as enzimas de venenos apresentam fold semelhante e, acredita-se, evoluíram a partir de um ancestral comum (Itoh et al., 1988). Estas enzimas possuem uma tríade catalítica bem conservada formada pelos resíduos His57, Asp102 e Ser195 (Serrano e Maroun, 2005). As serinoproteinases de venenos interferem especificamente nos mecanismos hemostáticos e apresentam resistência à inibição por inibidores plasmáticos de serinoproteinases (Parry et al., 1998). Em contraste com a tripsina, que apresenta uma vasta especificidade de substrato, as enzimas de venenos são caracterizadas pela alta especificidade, assim como as serinoproteinases de mamíferos que regulam a hemostasia (Serrano e Maroun, 2005). As metaloproteinases de venenos de serpentes são classificadas na família M12 das metaloproteinases, juntamente com outros dois grupos dessas enzimas: A Disintegrin and Metalloproteinase (ADAM) e A Disintegrin and Metalloproteinase with Thrombospondin Motifs (ADAMTS). As metaloproteinases são componentes abundantes em venenos de viperídeos e possuem em seu domínio catalítico um íon inorgânico (normalmente zinco) coordenado pelas cadeias laterais de três resíduos de histidina presentes na seqüência HEXXHXXGXXH, que é altamente conservada nessas proteínas (Hite et al. 1994; Bjarnason e Fox, 1995; Fox e Serrano, 2008). Com base na estrutura de seus precursores e das proteínas em forma madura (pósprocessamento) as metaloproteinases são divididas em três classes: P-I a P-III. Os precursores destas proteínas contém em comum um peptídeo sinal, e um pródomínio, que mantém a enzima em estado latente, sem atividade proteolítica (Grams et al, 1993; Stocker e Bode, 1995). Enzimas da classe P-I apresentam apenas o domínio catalítico, com massa molecular entre 20 kDa e 25 kDa (Bjarnason e Fox, 1995; Fox e Serrano, 2008). Enzimas da classe P-II possuem um domínio disintegrina na porção carboxil do domínio catalítico. Os precursores de enzimas da classe P-II podem gerar proteínas maduras formadas somente pelo domínio catalítico ou somente o domínio disintegrina (P-IIa), como a atrolisina-E, e também proteínas que conservam o domínio disintegrina na proteína madura como as 2 Dias G.S. 2013 Introdução metaloproteinases jerdonitina (proteína monomérica da classe P-IIb) e bilitoxina-1 (proteína dimérica da classe P-IIc). Estes precursores ainda podem gerar proteínas maduras compostas por disintegrinas homo-diméricas, como a contortrostatina, ou hetero-diméricas, como a acostatina, das classes P-IId e P-IIe, respectivamente (Fox e Serrano, 2005, 2008). Já as enzimas da classe P-III são proteínas com massa molecular entre 50 kDa e 110 kDa que apresentam na sua forma madura, além do domínio catalítico, o domínio tipo-disintegrina seguido de um domínio rico em resíduos de cisteínas na região C-terminal (Bjarnason e Fox, 1995; Fox e Serrano, 2008). A esta classe pertencem proteinases formadas pelos domínios citados, na forma monomérica (classe P-IIIa) como a atrolisina-A, HF3, e também na forma dimérica (classe P-IIIc), como a VAP1. Ainda, foi encontrada em venenos de viperídeos uma proteína composta somente pelos domínios tipo-disintegrina e rico em cisteínas, formada pelo processamento proteolítico de proteinases da classe PIIIb, como jarharagina, bothropasina e catrocollastatina, porém, o domínio catalítico destas enzimas ainda não foi isolado do veneno (Usami et al., 1994; Shimokawa et al., 1997). A antiga classe P-IV, hoje denominada classe P-IIId, é composta por enzimas que apresentam uma cadeia contendo os domínios encontrados nas proteinases da classe P-III, e mais duas cadeias de lectinas ligadas ao domínio rico em cisteínas por pontes dissulfeto. São representantes desta classe as proteinases RVV-X (Russell’s viper venom factor X activator) da Vipera russelli e VLFXA (Vipera lebetina venom factor X activator) da Vipera lebetina, ambas com atividade de ativação do fator X da coagulação (Fox e Serrano, 2005, 2008). As fosfolipases A2 (FLA2) são enzimas que hidrolisam glicerofosfolipídeos na posição sn-2 da cadeia de glicerol liberando lisofosfolípides e ácidos graxos (Kini e Iwanaga, 1986; Kini, 2003). São divididas em duas classes: citósólicas e secretadas, sendo as de veneno des serpentes, secretadas. As FLA2 de veneno apresentam similaridade de estrutura química e função catalítica com enzimas de mamíferos, entretanto as FLA2 de venenos são tóxicas e responsáveis por diversos efeitos farmacológicos, tais como interferência na agregação plaquetária, miotoxicidade, neurotoxicidade, entre outros (Gutiérrez e Lomonte, 1995; Kini, 1997, 2005). As lectinas tipo-C são proteínas que requerem íons de Ca+2 para sua interação com carboidratos específicos. Estas proteínas apresentam uma conformação típica em sua estrutura (um loop) cujos resíduos coordenam a ligação 3 Dias G.S. 2013 Introdução com íons de cálcio (Drickamer, 1988). A maioria das lectinas encontradas em venenos de serpentes não apresenta o loop de ligação com íons de Ca+2 e nem todas se ligam a carboidratos (Clemetson et al. 2001). As lectinas tipo-C são proteínas diméricas, e apresentam massa molecular de cerca de 30 kDa. Estas proteínas estão envolvidas principalmente nas alterações de processos hemostáticos decorrentes do envenenamento, interagindo principalmente com receptors plaquetários (Zingali et al. 2001). A variação em proteomas de venenos animais ocorre em diversos níveis, includindo interfamília, intergênero, interespécie, intersubspécie e intraespécie. A variação intraespécie pode acontecer ainda individualmente, devido à variação sazonal, dieta, habitat, idade e dimorfismo sexual (Chippaux et al, 1991). A complexidade dos venenos de serpentes tem sido analisada pela complementaridade das abordagens de transcriptômica e proteômica, que permitem a elucidação da composição e variabilidade das proteínas e peptídeos, identificação de modificações pós-traducionais, avaliação do processamento de precursores e de proteínas maduras, análises de filogenia molecular, entre outras (Tubbs et al., 2000; Ho, 2002; Kashima et al., 2004; Francischetti et al., 2004; Serrano et al., 2005; Menezes et al., 2006; Fox et al., 2006; Ching et al., 2006; Cidade et al., 2006). Considerando que a diversidade e abundância de proteínas presentes nos venenos é extremamente variável, a análise proteômica é uma ferramenta importante para o entendimento da complexidade dos venenos. Análises proteômicas de venenos de serpentes têm revelado aspectos importantes em relação à variabilidade da composição do veneno, seja ela inter-específica ou intraespecífica (Fox e Serrano, 2008; Calvete et al, 2009; Gutiérrez et al., 2009). Neste contexto, diversos grupos têm estudado a complexidade e variabilidade dos proteomas de venenos de serpentes. Gutiérrez et al (2009) compararam o proteoma de venenos de B. asper, provenientes do Caribe e Costa Rica e verificaram variação geográfica com relação à presença de diversas classes de proteínas , tais como disintegrinas, FLA2, serinoproteinases, lectinas tipo-C, Cysteine-Rich Secretory Protein (CRISP), L-amino acido oxidase e metaloproteinases. Além disso, esses autores observaram ainda uma variação ontogenética importante, em que o veneno de espécimes neonatos apresentou uma alta proporção de metaloproteinases da classe P-III em relação ao veneno dos 4 Dias G.S. 2013 Introdução espécimes adultos, que por outro lado, apresentou maior expressão de metaloproteinases da classe P-I e FLA2 do tipo Lys-49. Guércio et al. (2006) analisaram o perfil proteômico de venenos de exemplares juvenis, sub-adultos e adultos de B. atrox, evidenciando uma pronunciada expressão de metaloproteinases no veneno dos adultos. De acordo com Vellard (1937) a variação intraespecífica do veneno de B. atrox, resultou na variabilidade do quadro clínico e isso evidencia-se em espécies que tem uma distribuição geográfica mais ampla, como é o caso da espécie citada acima. Sendo assim a diversidade intraespecífica interfere na variabilidade clínica do envenenamento, logo, merece mais consideração uma vez que os acidentes podem requerer diferentes tipos de tratamento. Estudos de Saldarriaga et al. (2003) relataram maior atividade coagulante nos venenos de exemplares jovens de B. asper e B. atrox da Colômbia. A variabilidade geográfica e intra-específica de venenos de serpentes B. asper provenientes da Costa Rica foi demonstrada principalmente no que diz respeito à toxicidade (Jimenez-Porras, 1964; Gutierrez et al., 1980; Aragon e Gubensek, 1981; Moreno et al., 1988). Gutiérrez et al (1980) mostraram que venenos de serpentes provenientes de regiões do Caribe causavam nos pacientes maiores efeitos hemorrágico e mionecrótico do que aqueles advindos de diferentes partes do Pacífico, que por sua vez apresentavam alta atividade proteolítica sobre a caseína. O processo de desenvolvimento de um indivíduo até a sua fase adulta (ontogenia) tem também importante reflexos na composição dos venenos. A variação ontogenética foi observada também no veneno de B. atrox, em que a atividade coagulante foi mais intensa para os espécimes jovens em relação ao veneno dos adultos (Lopez-Lozano et al., 2002). Em conjunto, esses trabalhos e outros demonstraram que de fato o conhecimento sobre os proteomas do venenos bem como sua variabilidade, seja de que tipo for, podem impactar a pesquisa básica, não só para aqueles que estudam evolução de espécies e a relação entre o conteúdo dos venenos e os efeitos observados no envenenamento, como também as ações relacionadas ao tratamento, incluindo a seleção dos antissoros e também a seleção de espécimes para a produção dos antissoros. 5 Dias G.S. 2013 Introdução 1.2. Bothrops jararaca e seu veneno A B. jararaca é uma das mais importantes espécies causadoras de acidentes ofídicos no Brasil. Os acidentes botrópicos correspondem a mais de 75% dos acidentes ofídicos no Brasil, segundo estatísticas do Sistema de Informação e Notificação de Agravos (SINAN) (Ministério da Saúde, 2010). As serpentes B. jararaca são solenóglifas e possuem hábitos predominantemente noturnos e generalistas, no entanto, exibem uma notável mudança na dieta associada ao desenvolvimento ontogenético, alimentando-se de presas ectotérmicas (principalmente artrópodes, lagartos e pequenos anfíbios) durante a fase juvenil, e de animais endotérmicos (principalmente pequenos mamíferos) durante a vida adulta (Sazima, 1992; Martins e Sazima, 2002). Distribuem-se desde o Sudeste da Bahia até a porção nordeste do Rio Grande do Sul, ocupando uma diversidade de habitats, desde Mata Atlântica até regiões abertas e áridas, com domínio predominantemente de cerrado (Campbell e Lamar, 1989). A característica principal do veneno de B. jararaca é a intensa atividade proteolítica. Cidade et al. (2006) analisaram um transcriptoma da glândula de veneno de B. jararaca e identificaram que 53% dos transcritos de toxinas é constituído de metaloproteinases, e 28% é constituído de serinoproteinases. Grande parte das toxinas isoladas do veneno de B. jararaca tem ação sobre componentes da cascata de coagulação sanguínea ou sobre componentes da matriz extracelular e do epitélio vascular (Theakston e Kamiguti, 2002; Serrano e Maroun, 2005; Mourada-Silva et al. 2007). Do veneno da B. jararaca foram isolados e caracterizados diversos componentes que mostraram interferir em eventos envolvidos na hemostasia (Tabela 1), incluindo metaloproteinases, serinoproteinases, fosfolipases A2, lectinas tipo-C e uma nucleotidase. 6 Dias G.S. 2013 Introdução Tabela 1. Toxinas isoladas do veneno de B. jararaca, com atuação sobre a hemostasia. Toxina Classe Atividade biológica Referência Bothrombina SP Atividade coagulante (liberação do fibrinopeptídeo A) sem efeito direto sobre Nishida et al., plaquetas a menos que haja presença de (1994) fibrinogênio PA-BJ SP Indução da agregação plaquetária pela interação com os receptores plaquetários PAR1 e PAR4 Serrano et al., (1995); Santos et al., (2000) TL-BJ SP Atividade coagulante (liberação do fibrinopeptídeo A ) sobre plasma e fibrinogênio Serrano et al., (2000) KN-BJ SP Liberação de bradicinina do cininogênio bovino de baixo peso molecular e atividade coagulante (liberação do fibrinopeptídeo A) Serrano et al., (1998) Bothrops protease A SP Atividades amidolítica e fibrinogenolítica Bothropasina MP (P-IIIb) Hemorragia Mandelbaum e Henriques (1964); Murayama et al., 2003; Paes-Leme et al., (2008) Mandelbaum et al., 1982; Assakura et al., 2003 Jararhagina MP (P-IIIb) Hemorragia Paine et al., 1992 e HF1 MP (P-III) Hemorragia HF2 MP (P-III) Hemorragia HF3 MP (P-III) Hemorragia Assakura et al., 1986 Assakura et al., 1986 Assakura et al., 1986; Silva et al, 2004 Jararafibrase I MP (P-III) Hemorragia e fibrinólise Maruyama et al., 1992 Jararafibrase II, III, IV MP (P-II) Hemorragia e fibrinólise Maruyama et al., 1992; Maruyama et al., 1993 J proteinase MP (P-II) Atividade caseinolítica Tanizaki et al., 1989 BJ-PI MP (P-I) Atividade fibrinogenolítica Oliveira et al., 2009 7 Dias G.S. 2013 Introdução BJ-PI2 MP (P-I) Atividade fibrinogenolítica; pró-inflamatória Da Silva et al., 2012 Bothrojaracina CTL Bloqueio da atividade da trombina sobre o fibrinogênio, bem como da ativação plaquetária mediada por fibrinogênio Zingali et al., 1993 Bothrocetina CTL Indução da agregação plaquetária pela interação com o fator de von Willebrand Brinkhous et al., 1981 Jararaca GPIbBP BJ-FLA2 CTL FLA2 Bothrojaractivase MP (P-II) Inibição da agregação plaquetária pela Fujimura et al., 1995 interação com a glicoproteína plaquetária Ib Indução de agregação plaquetária Serrano et al., 1999 Ativação do fator II da cascata de coagulação sanguínea e fibrinólise Berger et al., (2008) NT NPP-BJ Inibição da agregação plaquetária induzida por ADP Santoro et al., (2009) CTL –Lectina tipo-C; MP – Metaloproteinase; FLA2- Fosfolipase A2; SP- Serinoproteinase; NT nucleotidase. Tabela adaptada de Zelanis (2011) e atualizada. 1.3. Variabilidade no proteoma do veneno de B. jararaca A variabilidade individual do veneno de serpentes não é um assunto muito pesquisado; isso se dá pela dificuldade de manter os animais de forma individual nos biotérios. Embora o veneno de B. jararaca tenha sido alvo de diversos estudos, a extensão da variação individual de seu proteoma ainda é pouco conhecida. Em um estudo de Menezes et al. (2006) o proteoma do veneno de 18 espécimes de B. jararaca, provenientes de uma única ninhada, foi avaliado de forma individual, utilizando técnicas de eletroforese (unidimensional e bidimensional) e análise da atividades proteolíticas do veneno. Foi mostrado que venenos de fêmeas apresentavam um perfil eletroforético mais homogêneo quando comparado aos 8 Dias G.S. 2013 Introdução machos, bem como uma maior atividade proteolítica sobre a caseína. Ainda, a variabilidade do proteoma do veneno desses 18 espécimes de B. jararaca não pôde ser atribuída a condições do meio ambiente, idade ou até mesmo a dieta, já que todas nasceram e foram criadas sob as mesmas condições em biotério, fato que aponta para a herança genética das serpentes exercendo um importante papel no fenótipo do veneno. De acordo com Pimenta et al. (2007) o perfil de LC-MS desses 18 venenos individuais apresentou expressiva variabilidade. A análise da fração peptídica dos venenos por espectrometria de massas mostrou a presença de 11 peptídeos potenciadores da bradicinina (BPPs) (9a, 10b, 10c, 11a, 11d, 11e, 12b, 12c, 13a, 13b, 14a) distribuídos pelos venenos, porém o único peptídeo que foi encontrado em todas as amostras analisadas foi o BPP13a. Em outro estudo, Furtado et al. (1991) mostraram que o veneno de filhotes de B. jararaca apresentava um valor 12 vezes mais alto para a atividade coagulante sobre o plasma quando comparado com o veneno dos adultos desta mesma espécie. No estudo de Zingali (1993) variações individuais também puderam ser vistas nos perfis de expressão de isoformas de bothrojaracina, um inibidor de trombina isolado do veneno de B. jararaca. Embora hajam estudos de variações individuais em venenos de serpentes, nada se sabe sobre essas variações em venenos de filhotes. Em um estudo recente sobre a variabilidade do veneno de B. jararaca foi demonstrado que os venenos de espécimes filhotes e adultos apresentam atividade hemorrágica similar enquanto que o veneno de adultos tem uma atividade letal discretamente mais alta sobre camundongos, embora o veneno de filhotes seja extremamente mais potente sobre aves (Zelanis et al., 2010). Outro fato interessante é que a atividade coagulante do veneno de filhotes é cerca de dez vezes mais alta do que a do veneno de adultos. Essas diferenças nas atividades biológicas dos venenos foram também evidenciadas pelos perfis de eletroforese bidimensional, zimografia de gelatina, imunocoloração com anticorpos específicos, padrões de glicosilação e afinidade de glicoproteínas à concanavalina A. A análise da fração peptídica desses venenos revelou conteúdos diferentes de peptídeos em geral, enquanto que perfis semelhantes foram obtidos com relação aos BPPs. Em conjunto, esses resultados indicaram que a variação na dieta da B. jararaca, passando de presas ectotérmicas na idade juvenil para presas endotérmicas na vida 9 Dias G.S. 2013 Introdução adulta, está associada a mudanças no proteoma e peptidoma do veneno (Zelanis et al., 2010). Ainda, foi demonstrado que metaloproteinases estão entre as principais toxinas diferencialmente expressas nos venenos de indivíduos filhotes e adultos de B. jararaca e que o quociente de metaloproteinases da classe P-III/P-I é maior no veneno de filhotes do que no veneno de adultos (Zelanis et al, 2011). Em outro estudo foi mostrado que o transcriptoma de glândulas de veneno de espécimes adultos de B. jararaca apresenta principalmente transcritos de metaloproteinases (30%), precursor de peptídeos potenciadores de bradicinina (23%), lectinas tipo-C (22%), fosfolipases A2 (9%), e serinoproteinases (8%) (Zelanis et al., 2012). Por outro lado, em filhotes de B. jararaca, os transcritos de metaloproteinases são muito mais abundantes (53%), enquanto que outras classes de toxinas (fosfolipases A2, lectinas tipo-C, serinoproteinases e precursores de peptídeos potenciadores de bradicinina) aparecem em menor abundância. Esses achados, mostrando uma mudança substancial na composição do veneno durante o desenvolvimento do animal, correlacionam-se com análises de venenos de filhotes e adultos desta serpente, realizadas por abordagens proteômicas (Zelanis et al., 2010, 2011). Utilizando abordagem proteômicas e peptidômicas, este trabalho visa analisar a variabilidade individual do veneno da serpente B. jararaca obtido de filhotes (Figura 1). 10 Dias G.S. 2013 Introdução Figura 1. Serpente Bothrops jararaca filhote. (Foto:Sávio Stefanini) Considerando a variabilidade do veneno de B. jararaca relatada em diversos trabalhos e as implicações em aspectos clínicos e terapêuticos dos acidentes causados por filhotes e adultos de B. jararaca, torna-se importante um estudo detalhado, com um enfoque especial para a variabilidade individual dos venenos de filhotes. Uma abordagem proteômica associada a técnicas tradicionais de química de proteínas e ensaios biológicos pode evidenciar diferenças qualitativas ou quantitativas nos venenos de filhotes, fornecendo subsídios para o entendimento da variabilidade individual verificada nesta espécie e em venenos de outras espécies do mesmo gênero, no caso de venenos de espécimes adultos. Como regra geral na toxinologia, a exploração do conteúdo dos venenos de serpentes tem sido realizada com pools de venenos obtidos de espécimes adultos das serpentes, fato que aponta para o desconhecimento do conteúdo proteômico dos venenos de filhotes, e de sua variabilidade individual. 11 Dias G.S. 2013 Objetivos 2. OBJETIVOS O objetivo geral deste trabalho foi analisar as variações proteômicas individuais em venenos de espécimes filhotes de B. jararaca, nascidos na mesma época e mantidos nas mesmas condições de biotério. Objetivos específicos: - Analisar o perfil proteômico do veneno de cada espécime. - Analisar as variações proteômicas relacionadas ao sexo. 12 Dias G.S. 2013 Material e Métodos 3. MATERIAL E MÉTODOS 3.1. Extração dos venenos de filhotes A extração dos venenos de filhotes de B. jararaca foi realizada mensalmente, durante nove meses consecutivos no Laboratório de Herpetologia do Instituto Butantan, sob a coordenação do Pesquisador MSc. Savio Stefanini Sant'Anna. Foram selecionados espécimes filhotes (machos e fêmeas) de diferentes regiões do Estado de São Paulo, Santa Catarina e Minas Gerais e o estudo foi realizado com indivíduos cujo volume de veneno coletado era suficiente para a realização das análises, totalizando 21 amostras. Esses animais foram mantidos individualmente em cativeiro no Biotério de Serpentes do Laboratório de Herpetologia do Instituto Butantan. Para a extração de venenos, os animais foram inicialmente anestesiados com o auxílio de gás carbônico segundo protocolo descrito por Biasi et al. (1976) e, em seguida, o veneno foi extraído com o auxílio de capilares de vidro. Após a coleta, as amostras de veneno foram centrifugadas a 2000 x g, 4°C, por 30 min, para remoção do muco salivar, bem como presas ou escamas que eventualmente estavam presentes no veneno extraído. Após este processo os venenos foram acondicionados a temperatura de -20°C até o momento do uso. Os venenos não passaram pelo processo de liofilização devido ao pouco volume obtido, e foram aliquotados para evitar repetitivos processos de descongelamento. 3.2. Quantificação de proteínas A quantificação de proteínas presentes nos venenos foi realizada com diferentes quantidades de veneno, em triplicata, utilizando o reagente de Bradford (Bradford, 1976), adquirido da Sigma. Para estimar o teor protéico das amostras utilizamos uma curva padrão, construída com concentrações crescentes de soroalbumina bovina (Sigma). 13 Dias G.S. 2013 Material e Métodos 3.3. Eletroforese de proteínas em gel de SDS- poliacrilamida As análises eletroforéticas foram realizadas como descrito por Laemmli (1970). Foram utilizados géis de 10 x 8 cm x 1.5 mm e um sistema de eletroforese Hoefer (GE Healthcare). As amostras foram aquecidas a 95 °C durante 5 min e aplicadas em volume máximo de 30 µl. As corridas foram realizadas a temperatura ambiente. Para a coloração do gel foi utilizado o Coomassie Coloidal [(NH4)2SO4 8%, ácido fosfórico 0,68%, Coomassie Brilliant Blue-G250 (Sigma) 0,08%, metanol 25%]. A análise das imagens foi feita utilizando o software Image Master Platinum 6.0 (GE Healthcare). 3.4. Atividade caseinolítica Para este ensaio foi utilizada a caseína N,N-Dimetilada (Sigma) como substrato, numa solução que continha 0,5 ml de solução tampão (Tris–HCl 0,1 M, pH 8,8, CaCl2 0,01 M), contendo 0,01 mg ou 0,02 mg do veneno e 0,5 ml de caseína 2% (solubilizada no mesmo tampão), por 30 min, a 37 °C. A reação foi interrompida com 1 ml de ácido tricloroacético 5%, a mistura foi centrifugada a 14.000 rpm, por 15 min e a absorbância do sobrenadante foi medida a 280 nm. Uma unidade de atividade foi definida como o aumento de 1 U da densidade óptica (DO) por min a 280 nm. A atividade específica foi expressa em unidades/mg de proteína. 3.5. Atividade amidolítica A atividade amidolítica foi determinada utilizando como substrato Benzoil-Arginil-p-nitroanilida (L-BAPNA) (Sigma), na concentração de 0,002 M em solução tampão de Tris-HCl 0,1 M, pH 8,0. O veneno foi utilizado nas doses de 0,01 mg e 0,02 mg de proteína em 450 µl de solução tampão. Após a adição da amostra de veneno à solução do substrato (450 µl), esta permaneceu por 30 min a 37°C. A reação foi interrompida com 100 µl de ácido acético 30% e a p 14 Dias G.S. 2013 Material e Métodos nitroanilina que é liberada pela atividade amidolítica de serinoproteinases foi medida a 405 nm no espectrofotômetro (Gene Quant- Amersham Biosciences). 3.6. Atividade coagulante sobre o plasma– Dose Mínima Coagulante (DMC) A Dose Mínima Coagulante (DMC) é definida como a menor quantidade de veneno capaz de coagular uma solução padronizada de fibrinogênio ou plasma citratado em 60 seg a 37°C (Theakston e Reid, 1983). Para este ensaio foi utilizado plasma humano citratado (contendo citrato de sódio 3,8%) e o ensaio foi realizado em triplicata. A 200 µL de plasma foram adicionados 100 µL de veneno em diferentes concentrações (obtidas através de diluições seriadas). As soluções de plasma foram mantidas em banho de gelo durante o uso, e a 37°C, quando nas cubetas do fibrômetro (BBL Fibrosystem, Becton Dickinson). 3.7. Análise do glicoproteoma Para a visualização das bandas de glicoproteínas presentes nas amostras de veneno analisadas por eletroforese foi utilizada a coloração fluorescente Pro-Q-Emerald (Invitrogen), seguindo as instruções do fabricante. A coloração para glicoproteínas foi realizada após a separação das proteínas por eletroforese em gel de SDS-poliacrilamida 12%. A visualização das bandas foi obtida após a exposição dos géis em transiluminador de ultravioleta (UV) a 300 nm. 3.8. Análise por Western blot A visualização do sub-proteoma de metaloproteinases e serinoproteinases das amostras de veneno de B. jararaca foi realizada por imunocoloração com um antissoro policlonal anti-bothropasina (metaloproteinase da classe P-III do veneno de B. jararaca; (Mandelbaum et 15 Dias G.S. 2013 Material e Métodos al., 1982) e um antissoro policlonal anti-MSP1/MSP2 (serinoproteinases do veneno de B. moojeni; Serrano et al., 1993), respectivamente. Após a eletroforese em gel de SDS-poliacrilamida 12 % as proteínas dos venenos foram transferidas eletroforeticamente para uma membrana de nitrocelulose (GE Healthcare) em uma cuba miniVE (GE Healthcare) preenchida com tampão de transferência (Tris 25 mM, glicina 192 mM, metanol 20% e SDS 0,037%). A transferência ocorreu sob voltagem fixa de 20V por 18 horas. Após este período, as membranas foram imersas em uma solução 0,5% de corante Ponceau S em ácido acético 1%, para se verificar a correta transferência das proteínas. Em seguida, as membranas foram lavadas com água destilada e imersas em uma solução de leite desnatado 5% em PBS (fosfato de sódio monobásico 0,05M, fosfato de sódio dibásico 0,05M, NaCl 0,15M) por 30 min, sob agitação. O anticorpo primário (policlonal, preparado em coelhos foi adicionado seguindo a diluição de 1:500 em uma solução de PBS contendo Tween 0,1%. As membranas foram incubadas por uma hora nesta solução, sob agitação. Em seguida, foram lavadas por 30 min com uma solução de PBS contendo Tween 0,1%. Finalmente, foi adicionado o anticorpo secundário (anti-IgG de coelho conjugado à peroxidase) na diluição de 1:1000 em solução de PBS contendo Tween 0,1% e as membranas foram imersas nesta solução por uma hora. A revelação se deu com a adição da solução de 4-cloro-1-naftol (Sigma) em TrisHCl 50 mM, NaCl 150 mM, pH 7,5 e 0,5% de peróxido de hidrogênio. 3.9. Digestão tripsínica in gel e identificação de proteínas por LC-MS/MS Bandas de proteínas de interesse, presentes no gel de SDSpoliacrilamida, foram recortadas e submetidas ao processo de digestão in gel segundo o protocolo descrito por Hanna et al., (2000), com algumas modificações. Todos os reagentes que foram utilizados foram preparados no momento do uso. 16 Dias G.S. 2013 Material e Métodos Inicialmente os fragmentos de gel recortados foram incubados em 500 µL de uma solução de metanol 50% /ácido acético 5% em água MilliQ® por duas horas. Em seguida, essa solução foi removida por aspiração com pipeta e 500 µL foram adicionados aos fragmentos de gel, permanecendo por mais uma hora nesta solução. Em seguida, os fragmentos de gel foram desidratados pela incubação por 10 min (2 vezes de 5 min) em 200 µL de acetonitrila (100%). A solução de acetonitrila foi aspirada com pipeta e o restante evaporado em um sistema de concentração a vácuo (speed vac). Após esta etapa, os pedaços de gel foram reidratados por 30 min em 30 µL (por fragmento de gel) da solução redutora (ditiotreitol 10 mM em bicarbonato de amônio 100 mM). Decorrido o tempo de reidratação com DTT, a solução foi aspirada com pipeta e os fragmentos de gel foram incubados por 30 min em 30 µL (por fragmento de gel) da solução alquilante (Iodoacetamida 50 mM em bicarbonato de amônio 100 mM). Em seguida, a solução alquilante foi removida por aspiração com pipeta e, os fragmentos de gel submetidos à incubação, por 10 min, em 100 µL (por fragmento de gel) de uma solução de bicarbonato de amônio 100 mM. Após esta etapa, a solução de bicarbonato de amônio foi retirada e 200 µL (por fragmento de gel) de acetonitrila 100% foram adicionados e os fragmentos de gel incubados nesta solução por 5 min. A solução de acetonitrila foi retirada e, novamente, os fragmentos de gel incubados, por 10 min, em 200 µL (por fragmento de gel) da solução de bicarbonato de amônio 100 mM. Na última etapa de desidratação, a solução de bicarbonato de amônio foi retirada e os fragmentos de gel incubados por 10 min (duas vezes de 5 min) em 200 µL de acetonitrila 100%. A solução de acetonitrila foi retirada por aspiração com pipeta e o restante evaporado em sistema speed vac. Os fragmentos de gel foram reidratados em 5 µL de uma solução de tripsina (50 ng/µL em bicarbonato de amônio 50 mM), em banho de gelo, por 30 min. Em seguida, a solução de tripsina foi retirada, uma solução de bicarbonato de amônio 50mM foi adicionada (em um volume suficiente para cobrir os fragmentos de gel) e os tubos contendo os fragmentos de gel foram incubados em banho termostatizado (a 37°C) por 18 horas. A extração dos peptídeos do gel foi feita com a adição de 30 µL (por fragmento de gel) da solução 1 - acido fórmico 5% (em água MilliQ) - e 17 Dias G.S. 2013 Material e Métodos incubação dos pedaços de gel por 10 min nesta solução, a temperatura ambiente. Em seguida, a solução contendo os peptídeos foi transferida para um novo tubo e, ao pedaço de gel do tubo anterior foram adicionados 12 µL (por fragmento de gel) da solução 2 - acido fórmico 5% em acetonitrila 50%. Os fragmentos de gel foram incubados por 20 min (duas vezes de 10 min) nesta solução, e a solução que foi transferida para o tubo contendo os peptídeos que foram extraídos com a solução 1. A solução será concentrada em speed vac e os peptídeos resultantes foram ressuspendidos em 20µL (por amostra) de ácido fórmico 0,1% e analisados em um espectrômetro de massas do tipo Quadrupolo – Tempo de Vôo com fonte de ionização nanospray (Q-ToF Ultima, Waters). Uma alíquota de 4,5 µl da solução de peptídeos foi aplicada numa coluna de trapping (coluna C-18; 180 µm x 20 mm, diâmetro interno e comprimento, respectivamente, Waters) com fluxo de 15 µl /min, ajustado diretamente no programa do cromatógrafo nano Acquity (Waters). Em seguida a mistura de peptídeos foi submetida à cromatografia líquida de fluxo nanométrico, utilizando coluna C-18 capilar de 100 µm x 100 mm (Waters), num fluxo de 600 nl/min, com um gradiente de 0 a 80 % de acetonitrila (solvente B) em ácido fórmico 0,1 %, (Solvente A) durante um total de 20 min (3 % de B em 1 min; 60 % de B em 14 min; 80 % de B em 2 min e 30 segundos; 80% de B em 1 min e de 80-3% de B em 1 min e 30 segundos). Como calibrante foi utilizada a infusão constante de uma solução de ácido fosfórico 0,1% / acetonitrila 25 % em água MilliQ®, num fluxo de 700 nl/min. No espectrômetro, a voltagem e a temperatura da fonte de ionização foram ajustadas para 3.4 kV e 100 °C, respectivamente. O espectrômetro foi operado no modo DDA, utilizando uma varredura de massas na região de m/z de 200 a 2000, seguida da dissociação induzida por colisão dos 3 íons mais intensos. O espectrômetro foi ajustado para operar com um tempo de exclusão dinâmica de 90 segundos (para se diminuir a aquisição repetitiva de um mesmo valor de m/z). 18 Dias G.S. 2013 Material e Métodos 3.10. Análise do perfil proteico dos venenos por espectrometria de massas (LC-MS) Uma alíquota de 4,5 µl da solução de veneno (contendo 1 µg, em ácido fórmico 0,1 %) foi aplicada numa coluna de trapping (conforme descrito no item 3.9.). A cromatografia ocorreu utilizando um gradiente de 0 a 80 % de acetonitrila (solvente B) em ácido fórmico 0,1 %, (Solvente A) durante um total de 60 min (3 % de B em 1 min; 45 % de B por 57,5 min; 80 % de B por 1 min e voltando a condição inicial de 80-3% de B em 1 min). A análise de massas foi realizada utilizando o espectrômetro Q-TOF Ultima (Waters), utilizando os mesmos parâmetros descritos anteriormente (item 3.9). 3.11. Critério para identificação dos peptídeos e análise em banco de dados Para identificação dos peptídeos gerados pela digestão das proteínas com tripsina utilizamos o banco não redundante do National Center for Biotechnology Information (nrNCBI Databank) e restringimos o universo de busca à taxonomia Serpentes, que contava com 25211 proteínas depositadas na data 20 de Junho de 2011. Como parâmetros de busca foram utilizados: i) uma clivagem perdida pela tripsina; ii) resíduos de cisteína carbamidometilados (que foram escolhidos como uma modificação fixa) e resíduos de metionina oxidados (que foram escolhidos como uma modificação variável). Utilizando o programa Mascot (Matrix Science), acessado através de um servidor instalado no Laboratório Especial de Toxinologia Aplicada (Mascot Server versão 2.2), para identificação, foram considerados os peptídeos cujos íons individuais excederam os valores de homology score associados e cujos scores para os íons de carga +1,+2, +3 e +4 e apresentaram valores maiores ou iguais a 10, 20, 20 e 40, respectivamente. 19 Dias G.S. 2013 Material e Métodos 3.12. Análise estatística comparativa de algumas propriedades dos venenos As amostras foram divididas em dois grupos: machos (n= 9) e fêmeas (n= 12). As variáveis analisadas foram: concentração proteica, atividade caseinolítica, atividade amidolítica e atividade coagulante. Para cada variável, foi realizado o teste de normalidade Kolmogorov-Smirnov (Henderson, 2006), que mostrou que todas apresentavam distribuição normal. Para a comparação de médias entre os dois grupos, empregou-se o Teste T com amostras independentes, considerando igualdade de variâncias em todas as comparações, fator este definido através da análise de igualdade de variâncias (estatística F). Para o Teste T, considerou-se um intervalo de confiança de 95%. Para a realização das análises estatísticas foi utilizado o pacote Action® (Estatcamp), que é um software livre (URL: http://www.portalaction.com.br), instalado como suplemento do MicrosoftTM Excel. Para a análise de cluster, foi utilizado o método de agrupamento hierárquico, considerando como parâmetros a distância euclidiana e encadeamento completo. As variáveis utilizadas na análise foram: sexo, atividade caseinolítica, atividade amidolítica e atividade coagulante. Foi omitida da análise a informação acerca da procedência geográfica das amostras, de modo que qualquer agrupamento que porventura separasse as amostras de acordo com a região de procedência seria baseado um reflexo das características do veneno e/ou sexo das serpentes. 20 Dias G.S. 2013 Resultados 4. RESULTADOS 4.1. Quantificação da concentração proteica nos venenos individuais de filhotes de B. jararaca Para este estudo foram coletadas amostras individuais de veneno de 21 filhotes de B. jararaca. A coleta foi realizada mensalmente, durante 9 meses consecutivos, juntamente com o Pesquisador Msc. Sávio Sant´anna. Embora nascidas no Instituto Butantan, no Laboratório de Herpetologia, sua progenitoras (que chegaram em estado de prenhez) são provenientes de 9 regiões diferentes (Tabela 2). A quantificação de proteínas foi feita utilizando duas concentrações do veneno em triplicata. A concentração de proteínas nos venenos frescos variou entre os indivíduos, porém a maioria deles apresentou valores entre 110 a 120 mg/ml, enquanto que dois espécimes apresentaram valores extremos abaixo (87 mg/ml) e acima (135 mg/ml) de concentração proteica (Tabela 3). 21 Dias G.S. 2013 Resultados Tabela 2. Dados dos espécimes de serpentes B. jararaca filhotes utilizados neste estudo. Amostras Procedência Sexo 1 São Bento do Sul-SC ♂ 2 São Bento do Sul-SC ♀ 3 São Bento do Sul-SC ♂ 4 São Bento do Sul-SC ♂ 5 São Bento do Sul-SC ♀ 6 São Bento do Sul-SC ♂ 7 São Bento do Sul-SC ♂ 8 São Bento do Sul-SC ♂ 9 Pilar do Sul-SP ♂ 10 Pilar do Sul-SP ♀ 11 Ibiúna-SP ♀ 12 Ibiúna-SP ♀ 13 São Lourenço da Serra-SP ♂ 14 São Lourenço da Serra-SP ♀ 15 São Lourenço da Serra-SP ♀ 16 Extrema-MG ♀ 17 Pilar do Sul-SP ♂ 18 Araçariguama-SP ♀ 19 Santana do Parnaíba-SP ♀ 20 Ribeirão Pires-SP ♀ 21 Tapiraí-SP ♀ 22 Dias G.S. 2013 Resultados Tabela 3. Quantificação de proteínas presentes nos venenos individuais de B. jararaca filhotes. Venenos Concentração proteica (mg/ml) 1 86,64 ± 3,9 2 108,28 ± 4,4 3 113,15 ± 3,3 4 90,9 ± 10,7 5 110,86 ±14,2 6 128,16 ± 3,9 7 116,67 ± 16,2 8 131,24 ± 12,0 9 118,97 ± 10,0 10 122,38 ± 11,5 11 110,09 ±5,7 12 129,71 ± 8,7 13 123,35 ± 10,1 14 110,50 ± 11,4 15 118,91 ± 16,6 16 127,76 ± 17,4 17 127,24 ± 18,0 18 106,15 ± 10,3 19 134,66 ± 13,1 20 119,13 ± 15,9 21 108,92 ± 15,7 Os valores representam a média ± desvio padrão de 3 determinações. 23 Dias G.S. 2013 Resultados 4.2. Comparação do perfil eletroforético individual de venenos de filhotes de B. jararaca Para a comparação dos proteomas dos venenos, a análise do perfil eletroforético, seja ela realizada com ou sem redução das pontes de dissulfeto das proteínas, é uma técnica útil para se entender a natureza da complexidade dos componentes do veneno. Para visualização inicial do perfil protéico individual dos venenos, 20 µg de cada amostra foram submetidos à eletroforese em gel de SDS-poliacrilamida 12% e os géis foram corados com Azul de Coomassie Coloidal. Diversas diferenças foram visualizadas entre as 21 amostras de venenos de filhotes, sendo elas pertencentes à mesma ninhada ou à ninhadas diferentes. A variabilidade também pôde ser vista de acordo com o sexo e a região. Na Figura 2, pode-se verificar bandas distintas no perfil eletroforético, em condições não redutoras, desde a região de massa molecular abaixo de 10 kDa, até acima de 70 kDa. Foram visualizadas bandas similares, mas não idênticas em intensidade, em todas as amostras, como aquelas presentes na região de 45-50 kDa. Verificamos também que todas os venenos apresentaram perfil de bandas bem distinto na região de 18 a 22 kDa. Na Figura 2, as massas moleculares indicadas para as bandas de proteínas dos venenos não são exatas já que as proteínas não foram submetidas à redução de suas pontes de dissulfeto e assim não são comparáveis exatamente àquelas das proteínas marcadoras de massa molecular que foram submetidas à redução. 24