O ESTUDO DA CULTURA PARA A ANÁLISE DOS MCM
O estudo da cultura para a análise dos meios
de comunicação de massa
Paulo de Carvalho Fragoso Filho
Graduando do 8º período de Comunicação Social com
habilitação em Relações Públicas
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O ESTUDO DA CULTURA PARA A ANÁLISE DOS MCM
Resumo
Encontra-se dificuldade em definir um caminho de pesquisa para os estudos culturais.
Por sua definição ter origem na sociologia, na antropologia e na filosofia, não existe ainda
uma proposta de linha de pesquisas para a área de comunicação social. Este artigo procura traçar uma linha de raciocínio para os estudos culturais na comunicação social, desde
o início da formação do conceito pela sociologia, passando pela Escola de Frankfurt até
a criação da sociedade de consumo. Por fim, o artigo apresenta o papel do comunicador
social neste cenário de mudanças culturais.
PALAVRAS-CHAVE
Sociedade de consumo, Escola de Frankfurt, Cultura, Indústria Cultural,
Dicotomia Cultural.
Abstract
It is difficult to set a search path for cultural studies. Its definition have originated in sociology, anthropology and philosophy, there is also a proposal for a line of research into the
area of social communication. This article seeks to draw a line of reasoning to cultural studies in media since the beginning of concept formation in sociology, through the Frankfurt School to the creation of a consumer society. Finally, the article presents the role of
social communicator of cultural change in this situation.
KEYWORDS
Consumer society, Frankfurt School, Culture, Culture Industry, Cultural Dichotomy.
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O ESTUDO DA CULTURA PARA A ANÁLISE DOS MCM
Apresentação
A cultura é algo inerente aos
agrupamentos humanos. Ainda assim,
é complexo falar de cultura, já que são
várias as áreas da ciência que estudam a
esta característica. Por isso, não existe uma
única definição de cultura.E, dentro de uma
mesma área de estudo, existem correntes
de pensamento que possuem definições
que se diferem entre si.
A comunicação social, por sua vez,
não possui um conceito próprio de cultura.
Utiliza-se, nos estudos de comunicação,
conceitos de diversos autores, de
acordo com a própria área de estudo do
comunicador social. Existem diversas
manifestações relativas às diversas culturas
existentes em uma mesma sociedade. E
cabe ao comunicador social determinar a
estratégia necessária para que possa atuar
com eficiência nestas culturas.
Conhecendo os conceitos e as
ferramentas utilizadas na construção das
diferentes culturas, o comunicador social
se transforma em um “comunicador de
culturas”, construídas das mais diversas
formas: tendo origem popular, no folclore;
partindo da elite dominante; ou criada
pelos meios de comunicação de massa.
Em todos os casos, o comunicador social
precisa conhecer a forma como a cultura
se manifesta nas sociedades para que
possa executar o trabalho de codificação,
transmissão e recepção de mensagens da
forma mais eficiente possível.
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A construção do conceito de
cultura
Como definir algo que não é tangível, que não pode ser medido por instrumentos e que pode ser analisada de diversas formas? Diante desta constatação, a
própria construção do conceito de cultura torna-se uma tarefa difícil. A natureza é
complexa no próprio homem e, mais ainda,
no mundo que o cerca, engloba, ameaça e
sustenta (RABUSKE, 1995; p. 49). MACEDO
ET AL (2008; In: http://meuartigo.brasilescola.com/educacao/cultura-consideracoes-preliminares.htm) afirma que “Cultura
pode ser definida de maneira diferenciada de
acordo com a ciência que se apropriar do termo”. Uma definição interessante é dada por
Edward Taylor¹:
Cultura é aquele todo complexo que inclui
o conhecimento, as crenças, a arte, a moral,
a lei, os costumes e todos os outros hábitos
e aptidões adquiridos pelo homem como
membro da sociedade.
(TYLOR, 2003; In: http://www.infopedia.
pt/$edward-tylor)
O conceito de Tylor foi um dos primeiros a serem desenvolvidos para explicar a cultura. Logo, sua definição não apresenta todas as facetas possíveis para uma
análise mais completa. Tylor não aborda o
fator tempo, que deve ser considerado ao
se descrever a cultura, e não relaciona o conhecimento individual com o conhecimento coletivo para a criação da cultura de uma
determinada sociedade. Então, podemos
considerar o conceito apresentado por Orlando Fedeli²:
O ESTUDO DA CULTURA PARA A ANÁLISE DOS MCM
Alguém definiu cultura, sob o prisma
individual, como aquilo que permanece
após ter-se esquecido tudo o que se
aprendeu. Transplantando tal conceito
para o plano coletivo, poderíamos afirmar
que cultura é o resíduo, imune à ação do
tempo, dos conhecimentos - em sentido
amplo - fundamentais dos povos. A cultura
de determinada civilização vem a ser,
portanto, o conjunto de seus valores e
conhecimentos perenes.
(FEDELI,2008;In http://www.montfort.org.br/
old/index.php?secao=veritas&subsecao=arte&a
rtigo=cultura&lang=bra)
Para Fedeli, o conceito de cultura
é uma característica perene das sociedades humanas, que resiste ao tempo e que
é transmitido de forma inconsciente, que
caracteriza àquela civilização como única por seus valores e conhecimentos. Este
elemento temporal da cultura, transmitido
entre gerações, é corroborado por Ralph
Linton, que afirma que “cultura significa a
herança social e total da Humanidade; como
termo específico, uma cultura significa determinada variante da herança social” (LINTON, 1943; p. 96).
A cultura é uma estrutura. Para Rabuske, ao se constituir o “mundo dos homens³”, os diversos segmentos da cultura
não podem ser separados, e a modificação de algum destes fatores influencia os
outros. BARTLE (2007; In: http://cec.vcn.
bc.ca/mpfc/modules/per-culp.htm)
afirma que a cultura pode ser dividida em seis
dimensões, que se inter-relacionam para
a criação das crenças e valores que serão
transmitidos. Estas dimensões são Crença
Conceptual, Valor Estético, Social, Política,
Econômica e Tecnológica. Todas as dimensões interagem entre si, construindo os
elementos que constituem a cultura. Desta forma, “a religião influencia a economia e
vice-versa, as ciências e as artes interagem,
há uma interdependência entre organização familiar e sistema de produção de bens e
serviços”(RABUSKE, 1995; p. 30).
Considerando que a cultura caracteriza-se como o modo de vida de um agrupamento humano, pode-se afirmar que
existe uma pluralidade de culturas. Em
princípio, há tantas culturas quantos são os
povos. Um fenômeno contrário também é
observado na sociedade contemporânea:
a criação de múltiplas subculturas, desenvolvidas para atender a nichos sociais bem
estabelecidos. O fenômeno contrário também é observado na sociedade contemporânea: a criação de múltiplas subculturas,
desenvolvidas para atender a nichos sociais bem estabelecidos. BARTLE (2007;Op.
Cit.) afirma que as subculturas são um subconjunto de uma comunidade com variações face à comunidade maior, que tem
um conjunto de variáveis em todas as seis
dimensões. Segundo ele,“o conceito [de
subcultura] implica um subconjunto de valores ou crenças, enquanto que as variações
do subconjunto (subcultura) podem estar em
qualquer das seis dimensões culturais”.
A linha dos estudos culturais
de comunicação
Considerando o conceito de cultura
descrito por Fedeli, torna-se tarefa árdua
separar os conceitos existentes para que se
possa analisar melhor a influência mútua
entre cultura e os meios de comunicação
de massa. Com o objetivo de resolver esta
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O ESTUDO DA CULTURA PARA A ANÁLISE DOS MCM
questão, apresenta-se o diagrama abaixo,
que traça uma linha evolutiva dos estudos
culturais na comunicação.
Figura 1 - Esquema de descrição de evolução de estudos culturais. Desenvolvido pelo autor baseado nos
trabalhos de LARAIA (2006); KROEBER (1949); BOURDIEU (1974); FEDELI (2008); COSTA et al (2005); TOMAZI
(2000); BARBOSA (2010).
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O ESTUDO DA CULTURA PARA A ANÁLISE DOS MCM
O conceito de dicotomia cultural se
refere àdiferença entre culturas. Portanto,
pode ser utilizada para descrever qualquer
divergência cultural. Neste artigo, comparam-se osseguintes conceitos-base: “cultura de elite” e “cultura popular”. A diferença
existente entre a cultura da elite e a cultura
popular é analisada por diversos autores.
BIZZOCHI (1999) afirma que
A história cultural tem sido marcada desde
sempre por essa divisão entre a cultura da
elite, considerada, aliás, por muito tempo
como a única forma possível de cultura, e a
cultura do povo, na verdade vista pela aristocracia dominante como a não-cultura,
isto é, como a ausência completa de civilização.
(BIZZOCHI, 1999;In: http://www.
aldobizzocchi.com.br/artigo14.asp)
A cultura de elite está ligada ao posicionamento privilegiado de alguns membros de uma sociedade. MACEDO APUD
CHAUÍ (2008; Op. Cit.) ressalta que “a elite
está no poder, acredita-se, não só porque detém a propriedade dos meios de produção e
o aparelho do Estado, mas porque tem competência para detê-los, isto é, detém o saber”.
É uma cultura que existe por ela mesma, e
nela encontra os atributos necessários para
sua sobrevivência.
A cultura de elite não é viável a uma
maioria, e sim a uma pequena classe social,
que possui condições para investir nesses
meios de produção e obter o conhecimento, estando subordinada ao capital que
esta elite possui como fator viabilizante
desta cultura.Por sua vez, a comunicação
desta cultura exige o conhecimento prévio
de ambas as partes, fazendo da linguagem
um elemento “isolador” de membros desta
cultura.
A cultura popular tem suas raízes nas
tradições, nos princípios, nos costumes, no
modo de ser daquele povo. Desta forma,
cada povo produz, por exemplo, uma arte
peculiar, reflexo de suas específicas qualidades, necessariamente diversa das artes
de outros povos. MACEDO (2008;Op. Cit.),
afirma que “a cultura do povo é na verdade
tudo que o caracteriza e o une. Sua tradição,
suas danças, músicas e tudo o mais que faz
parte da sua vida”.
Até a primeira metade do século XVII,
havia participação das elites nas festas de
rua, juntamente com as pessoas menos favorecidas. Isso significou que, ao longo dos
anos, a revolução científica fez com que os
costumes se transformassem e fosse criada
uma imensa distância entre as classes. A
cultura popular teve sua importância retomada a partir do Século XIX. Neste processo, a Igreja Católica teve participação fundamental. Segundo SANTOS e SANTIAGO,
A causa das transformações ocorridas na
cultura popular foi o fato de as reformas
religiosas empreenderem um esforço de
reformulação da religiosidade popular na
Europa com o objetivo de adaptar seus
caprichos e aparências, ainda no século
XVI.
(SANTOS, SANTIAGO, 2010; In: http://www.
biuvicente.com/professor/?p=408)
A cultura popular possui estrutura
rígida e conhecida pelos seus portadores.
Considerada como “cultura do povo”, a cultura popular se baseia no folclore, nas tradições e nos costumes daquela população,
existindo de maneira diferente à cultura
de elite. A cultura popular é conservadora
e inovadora ao mesmo tempo no sentido
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O ESTUDO DA CULTURA PARA A ANÁLISE DOS MCM
em que é ligada à tradição, mas incorpora
novos elementos culturais. Muitas vezes
a incorporação de elementos modernos
pela cultura popular, a transformação de
algumas festas tradicionais em espetáculos
para turistas ou a comercialização de produtos da arte popular são, na verdade, modos de preservar a cultura popular a qualquer custo e de seus produtores terem um
alcance maior do que o pequeno grupo de
que fazem parte.
A maior questão apresentada por
esta dicotomia de conceitos está no conflito
entre estas duas definições. Segundo BARTLE (2007; Op. Cit.), este conflito cultural é
causado por conflitos entre as dimensões
da cultura. Para ele, “todas as seis dimensões
culturais têm formas incompatíveis de funcionar, e essas podem ser a base do conflito
cultural, onde duas ou mais comunidades
diferem e tentam ocupar o mesmo espaço
ou território”. Esse espaço pode ser físico ou
pertencer a uma dimensão cultural.
O produtor de cultura popular e o de
cultura erudita podem ter a mesma sofisticação, mas na sociedade não possuem o
mesmo status social - a cultura erudita é a
que é legitimada e transmitida pelas escolas e outras instituições. MACEDO (2008;
Op. Cit.) afirma que “o problema começa
quando a elite, para que sua cultura se sobressaia, deprecia a do povo”. Para ela, uma
cultura não anula a outra, e ambas podem
coexistir, sem que a outra precise desaparecer. No Século XXI, o principal elemento
unificador desta dicotomia é a cultura de
massa. Segundo SANTOS e SANTIAGO,
Podemos analisar a cultura de massas
como um ponto de interseção entre a cultura erudita e a cultura popular porque os
elementos próprios da cultura de massas
são consumidos tanto por setores mais ex-
30
cluídos da sociedade quanto por elites.
(SANTOS e SANTIAGO, 2010; In: Op. Cit.).
A Escola de Frankfurt
O termo “Escola de Frankfurt” se refere às teorias desenvolvidas pelos membros
doInstituto de Pesquisa Social de Frankfurt4. Fundado e financiado por Felix Weil
no auditório da Universidade de Frankfurt
em 1924, o Instituto foi liderado por Max
Horkheimer e teve como principais nomes
os filósofos Hebert Marcuse, Jürgen Habermas e Theodor Adorno, o ensaísta Walter
Benjamim e o psicólogo Erich Fromm.
Os estudos desenvolvidos se baseiam
na teoria crítica criada por Horkheimer.
Publicada em 1937, a teoria crítica pode ser
definida como uma autoconsciência social
crítica que é objetivada na mudança e na
emancipação através do esclarecimento,
e não se liga dogmaticamente aos
seus próprios pressupostos doutrinais.
Horkheimer afirma que
Os fatos que os nossos sentidos apresentam para nós são socialmente efetuados de
duas maneiras: através do caráter histórico
do objeto percebido e através do caráter
histórico do órgão que percebe. Ambos não
são simplesmente naturais; eles são moldados por atividade humana, e também pelas
percepções individuais deles mesmos como
receptivos e passivos no ato da percepção.
(COSTA etAL APUD HORKHEIMER. 2003; In:
http://www.nead.unama.br/site/bibdigital/pdf/artigos_revistas/211.pdf)
A teoria crítica tinha como principal
objetivo combinar pensamento prático e
O ESTUDO DA CULTURA PARA A ANÁLISE DOS MCM
normativo para que possa “explicar o que
está errado com a realidade social corrente,
identificar atores para mudá-la e fornecer
normas claras para o criticismo e finalidades práticas para o futuro.” (AVRITZER, ET AL
APUD BOHMAN, 2004; p. 713)
Uma das teorias desenvolvidas seguindo esta linha de pensamentos foi o
conceito de “cultura de massa”: total de
ideias, perspectivas, atitudes, memes5,
imagens e outros fenômenos que são julgados como preferidos por um consenso
informal, contendo o mainstream6 de uma
dada cultura, especialmente a cultura ocidental do começo da metade do século XX
e o emergente mainstream global do final
do século XX e começo do século XXI.
Fortemente
influenciada
pela
mídia de massa, essa coleção de ideias
permeia o cotidiano da sociedade. Por
isso, costuma ser mais volátil, evoluindo
e se atualizando com maior agilidade.
Uma de suas características é a presença
dos Meios de Comunicação de Massa
(MCM). Esta presença faz a transmissão de
valores acontecer de maneira mais ágil,
permitindo a rápida atualização dos valores
e conhecimentos desta sociedade.
Edgar Morin considera o fenômeno
da cultura de massa como uma manifestação específica da sociedade moderna, esta
vista como essencialmente policultural.
Para ele, “a cultura de massa alimenta-se dos
sistemas simbólicos já existentes, possuindo
um caráter profundamente integrador” (SETTON APUD MORIN, p. 31). Logo, seguindo
esta ideia,os valores e referenciais das culturas locais, religiosas e étnicas são sempre
reutilizados por ela, que apenas ordena e
propõe uma forma de apropriação.
Diferente das culturas popular e de
elite, a cultura de massa é produzida para
alimentar uma suposta necessidade de
consumo de cultura pela grande população.
Apesar de esta necessidade ser verdadeira,
a forma como a cultura é produzida, e
como seus valores são transmitidos,são o
que fazem desse conceito uma peça chave
para as pesquisas sobre os MCM.
A precificação da cultura
Para que a cultura seja produzida e
consumida de maneira comercial,é necessária a construção de uma estrutura que
possa cumprir com essa demanda. Esta estrutura é conceituada, inicialmente pelos
teóricos da Escola de Frankfurt, como “Indústria Cultural”. O conceito é apresentado,
inicialmente, por Adorno.
A indústria cultural pode ser definida como
o conjunto de meios de comunicação como,
o cinema, o rádio, a televisão, os jornais e
as revistas, que formam um sistema poderoso para gerar lucros e por serem mais
acessíveis às massas, exercem um tipo de
manipulação e controle social, ou seja, ela
não só edifica a mercantilização da cultura,
como também é legitimada pela demanda
desses produtos.
(COSTA etAL APUD HORKHEIMER. 2003;
Op. Cit.)
Outros filósofos complementam o
conceito apresentado pela Escola de Frankfurt. Um exemplo pode ser dado por Edgar
Morin (2001). Para ele,
O sistema da indústria cultural, por estar
submisso a uma demanda externa (subordinados aos detentores dos instrumentos
31
O ESTUDO DA CULTURA PARA A ANÁLISE DOS MCM
de produção e difusão), obedece aos imperativos da concorrência pela conquista de
mercado, ao passo que a estrutura de seu
produto decorre das condições econômicas
e sociais de sua produção.
(SETTON APUD MORIN,2001; Op. Cit.)
Morin afirma que os produtos da
indústria cultural obedecem às regras de
mercado, inclusive às regras de concorrência. Estes produtos do sistema da indústria
cultural, designados como “cultura média”
ou “arte média”, são destinados a um público muitas vezes qualificado de “médio”. É
lícito falar de cultura média para designar
os produtos do sistema da indústria cultural pelo fato de que estas obras produzidas
para o sua público encontram-se inteiramente definidas por ele.
Podem-se perceber duas particularidades encontradas em relação à “cultura
legítima7”. O primeiro é nítido: a transformação da cultura em investimento. Logo,
apenas investimentos rentáveis devem ser
patrocinados, já que precisam propiciar algum tipo de retorno (seja ele financeiro, de
mídia, imagem, relacionamento ou outro).
Com isso, elementos de cultura popular ou
de elite acabam segregados à categoria de
cultura de nicho.
Primeiro, temos que entender por
que o formato de indústria cultural funciona. Para que o mecanismo de qualquer
produto comercial funcione, são necessários três elementos: a indústria produtora,
a distribuidora e o consumidor, que fecha
o ciclo. Desta forma, a construção de um
produto cultural precisa seguir o mesmo
modelo de produção.
O segredo da indústria cultural para
possibilitar sua existência está em dar aos
32
produtos culturais o mesmo tratamento
dado aos produtos comerciais. Sendo assim,
a relação entre os conceitos apresentados,
nos produtos culturais, é simples: os
produtos de cultura são produzidos e
precisam ser enviados ao consumidor de
alguma forma. Esse papel logístico passa a
ser responsabilidade dos MCM. Cabendo a
eles, em conjunto com o próprio produto,
vendê-lo da melhor maneira possível.
A cultura de massa é algo comercial,
precisa ser estudada e antecipada para
que seja consumida de maneira simples e
rápida, gerando lucro para seu produtor
e distribuidor. Da mesma forma como um
produto cultural passa por um período
de pesquisa e desenvolvimento, a
cultura também passa por este processo,
onde o produtor analisa o público-alvo,
a rentabilidade daquele produto e a
tendência de consumo para a época de
seu lançamento, da mesma forma como é
desenvolvido um produto normal.
Considerando o lado capitalista da
indústria cultural, chegamos à segunda
particularidade observada: a “cultura de
consumo”. A cultura de consumo se caracteriza por criar “necessidades” na singularidade dos indivíduos, para que sejam reconhecidos, identificados como integrantes
desse ou daquele grupo. O que nos leva a
acreditar que o único meio de se construir
uma identidade é através do consumo de
bens materiais.
Se o consumo é menor do que a demanda, a cultura passa a ser utilizada para
vender a si mesma. Enquanto uma indústria comum se utiliza de recursos de marketing e propaganda para escoar a produção,
a indústria se utiliza de outras ferramentas
para aumentar o consumo: sequências, exploração de outros produtos temáticos, en-
O ESTUDO DA CULTURA PARA A ANÁLISE DOS MCM
Figura 2 – Formato clássico de produção. Fonte: DIAS FILHO, Clóvis. Produção, distribuição e consumo dos
bens simbólicos: uma reflexão sobre os programas de apoio ao artesanato. Disponível em www.cult.ufba.br/
enecult2009/19543.pdf.
tre outros.Isso se torna explícito nos planos
de marketing da maior parte das empresas
fornecedoras de bens de consumo, nos
quais os consumidores em potencial são
definidos pelos grupos socioculturais aos
quais pertencem. Segundo BAUDRILLARD,
A produtividade, enquanto obsessão coletiva consignada nos livros de contas, desempenha antes de mais a função social de
mito. Para alimentar semelhante mito, tudo
é bom, mesmo a inversão de realidades objetivas, que introduzem a contradição nos
números que a sancionam (...) Todas as
sociedades desperdiçaram, dilapidaram,
gastaram e consumiram sempre além do
estritamente necessário, pela simples razão
de que é no consumo do excedente e do supérfluo que tanto o individuo como a sociedade, se sentem não só existir, mas viver.
(BAUDRILLARD, 2010; p. 38)
O consumo exacerbado passa, então,
a ser o único motivo da existência dos po-
vos e da felicidade. O consumo de produtos passa a ser o assunto discutido nas conversas e o objetivo do produto é suprir às
necessidades falsas criadas pela indústria
cultural. Por isso, este tipo de sociedade,
que se encontra em avançado estado de
capitalização e industrialização, é conceituado como “sociedade de consumo”.
O conceito atribuído designa uma
sociedade característica do mundo desenvolvido, em que a oferta excede geralmente a procura, os produtos são normalizados
e os padrões de consumo estão massificados. Este excesso de oferta levou ao desenvolvimento de estratégias de marketing
extremamente agressivas e sedutoras e às
facilidades de crédito, quer das empresas
industriais e de distribuição, quer do sistema financeiro (ELIAS, 2001). BARBOSA
(2010, p. 57) diferencia os dois conceitos no
quadro apresentado abaixo:
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O ESTUDO DA CULTURA PARA A ANÁLISE DOS MCM
Tabela 1 –Sociedade de Consumo X Cultura de Consumo. Fonte: BARBOSA, Lívia. Sociedade de consumo. 3ed.
Rio de Janeiro: Zahar, 2010.
O principal problema encontrado
neste tipo de sociedade é a sedução do
consumidor, que passa a ser iludido pelos
MCM a consumir a falsa felicidade distribuída por ela. Pois, para “vender” os produtos
culturais, a indústria cultural opera pela sedução do consumidor, isto é, há um nivelamento da produção cultural com vistas ao
mercado. Há desse modo, a criação de um
produto “médio”, voltado ao gosto público
“médio” do senso.
O público-alvo dos produtos de indústria cultural é considerado em posição
de desvantagem, por essa criação fantasiosa, em relação aos produtores de cultura.
Por causa dessa desvantagem, Jean Baudrillard propõe o conceito de “consumerismo”, em oposição ao consumismo. Para ele,
O Consumerismo designa um tipo de atitude oposta ao consumismo e que se caracteriza por um consumo racional, controlado
e responsável e que tem em contas as consequências econômicas, sociais, culturais e
ambientais do próprio ato de consumir.
34
(NUNES, apud BAUDRILLARD, 2008; In:
http://www.knoow.net/cienceconempr/
economia/consumerismo.htm.)
A diferença entre consumismo e consumerismo é nítida:
• Consumismo: Consumo irracional,
impulsivo, discriminado, sem olhar as
consequências, baseado em valores
materiais e na ostentação.
• Consumerismo: Consumo racional,
controlado, seletivo, baseado em valores sociais e ambientais e no respeito
pelas gerações futuras.
O consumerismo é uma proposta para que
a sociedade possa se manter consciente dentro do cenário de indústria cultural.
Baudrillard procura, com o consumerismo,
fortalecer a instituição da sociedade consumidora, resistindo aos apelos dos MCM
sobre a população a qual influencia.
O ESTUDO DA CULTURA PARA A ANÁLISE DOS MCM
O resultado do consumerismo no Brasil é a
construção de instituições que auxiliem o
consumidor a filtrar as informações que recebem pelos MCM. Além disso, órgãos que
fiscalizam a publicidade acabam desenvolvendo ações pró-consumerismo, já que
protegem o consumidor de abusos causados pela publicidade de produtos e serviços comerciais.
Conclusão
A divergência entre culturas é um
dos grandes fatores de conflito. Cada uma
possui suas características em cada uma
de suas dimensões. É possível ainda que a
criação de subculturas possa gerar conflitos
dentro de uma cultura (BARTLE, 2007; Op.
Cit.). A cultura de massa passa a ter a função
de unificar estas comunidades, com suas
subculturas, em torno de valores comuns.
Este será uma das funções do profissional
de comunicação.
A importância atual de se estudar
as culturas é nítida. O estudo do conceito
de cultura e da dicotomia entre cultura de
elite e cultura popular permite a compreensão da influência dos MCM na sociedade
antiga – e na construção da geração atual,
enquanto os conceitos desenvolvidos pela
Escola de Frankfurt são fundamentais para
entender o poder da influência dos MCM
na construção da cultura da sociedade atual – e das gerações futuras.
Conhecer as culturas permite que o
profissional de comunicação tenha um conhecimento maior sobre os stakeholders
que lhe interessem. É necessário conhecer
os pontos de conflito entre culturas, para
que o trabalho de comunicação seja eficaz e para que a mensagem gere o mínimo
possível de impacto negativo.
É perceptível que nos encaminhamos
para a construção da sociedade de
consumo. Para BARBOSA (2010), esta
é a consequência das sociedades
extremamente industrializadas. Enquanto
houver evolução do capitalismo, existirão
pessoas consumindo e existirão pessoas
construindo produtos culturais, para suprir
necessidades criadas para esse público
e posicionando as outras culturas para o
status de cultura de nicho (BAUDRILLARD,
2010).
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Notas
1. Antropólogo inglês, nascido em 1832 e
falecido em 1917, foi um dos fundadores
da antropologia, cuja obra é vocacionada
principalmente para o entendimento da
cultura.
2. Historiador católico brasileiro, doutor em
história pela USP. Foi professor universitário e fundador da Associação Cultural Montefort.
3. Para Rabuske, o Homem não se limita ao
mundo natural; ele o transcende e o transforma. Ou seja, diferentemente de outros
seres, o humano se autoproduz reproduzindo o meio que o circunda; recria o mundo natural e o já criado, criando novo significado e novas formas de aproveitamento
das realidades já existentes.
4. Originalmente, o nome do Instituto era
“Instituto de pesquisa sobre a história do socialismo e do movimento operário, através
da história econômica e história e crítica da
O ESTUDO DA CULTURA PARA A ANÁLISE DOS MCM
economia política” (em alemão, Institut für
Forschungenüber die Geschichte dês Sozialismusund der Arbeiterbewegung, über
Wirtschafts geschichteund Geschichteund
Kritik der politischen Ökonomie).
5. O termo meme é usado para descrever
um conceito que se espalha via Internet.
O termo é uma referência ao conceito de
memes, que se refere a uma teoria ampla
de informações culturais criada por Richard
Dawkins em 1976 no seu livro The Selfish
Gene.
6. Mainstream (“corrente principal”) é um
termo inglês que designa o pensamento ou
gosto corrente da maioria da população.
7. Conceito cunhado pelo autor, para diferenciar a cultura originada da sociedade
com a cultura criada e introduzida na sociedade pela indústria cultural.
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O estudo da cultura para a análise dos meios de comunicação de