KARL-OTTO APEL itinerÁrio formativo da ética do discurso Coleção ETHOS • Ética de Gaia: ensaios de ética socioambiental, Jelson Roberto de Oliveira, Wilton Borges dos Santos • Ética, Direito e Democracia, Manfredo Araújo de Oliveira • Ética e cidadania na educação: reflexões filosóficas e propostas de subsídios para aulas e reuniões, Antonio Bonifácio Rodrigues de Sousa • Ética pós-moderna, Zygmunt Bauman • Técnica, Medicina e Ética: sobre a prática do princípio responsabilidade, Hans Jonas • Ética, Direito e Política: a paz em Hobbes, Locke, Rousseau e Kant, Paulo César Nodari • Tratado de bioética: em prol de uma nova utopia civilizadora?, Christian Byk • Karl-Otto Apel: itinerário formativo da ética do discurso, Antonio Wardison C. Silva Antonio Wardison C. Silva karl-otto apel itinerÁrio formativo da ética do discurso Diretor editorial: Claudiano Avelino dos Santos Assistente editorial: Jacqueline Mendes Fontes Revisão: Caio Pereira Diagramação: Dirlene França Nobre da Silva Capa: Marcelo Campanhã Impressão e acabamento: PAULUS Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Silva, Antonio Wardison C. Karl-Otto Apel: itinerário formativo da ética do discurso / Antonio Wardison C. Silva. — São Paulo : Paulus, 2015. — (Coleção Ethos) ISBN 978-85-349-4148-8 1. Análise do discurso 2. Apel, Karl-Otto, 1922- 3. Ética 4. Filosofia - Discursos, ensaios, conferências 5. Retórica I. Título. II. Série. 15-01687CDD-401.41 Índices para catálogo sistemático: 1. Ética e análise do discurso: Linguística 401.41 1ª edição, 2015 © PAULUS – 2015 Rua Francisco Cruz, 229 04117-091 – São Paulo (Brasil) Tel.: (11) 5087-3700 – Fax: (11) 5579-3627 www.paulus.com.br [email protected] ISBN 978-85-349-4148-8 In memoriam, Lucivalda, minha mãe. Para Rodrigo e Tiago, meus irmãos; Cainan,Vitória e Sarah, meus sobrinhos. sumário PREFÁCIO ...............................................................................................9 INTRODUÇÃO.............................................................................................15 1. Problema de uma fundamentação ética na era da ciência......23 1.1 A situação do ser humano como problema ético................................24 1.2 A paradoxalidade da situação-problema: exigência de uma ética racional de responsabilidade solidária...........................27 1.3 Teorias que desafiam a fundamentação de uma ética racional...........33 1.3.1 A filosofia analítica..................................................................33 1.3.2 O decisionismo de Hans Albert.................................................41 1.3.3 A lógica da ciência de Wittgenstein..........................................45 1.3.4 Max Weber: racionalidades e postulados éticos........................52 1.3.5 O solipsismo metódico.............................................................59 2. transformação hermenêutico-semiótica da filosofia transcendental...........................................................67 2.1 A perspectiva crítica de Apel sobre o factum kantiano da razão.........68 2.2 A perspectiva hermenêutica de transformação da filosofia transcendental..................................................................................74 2.2.1 O novo paradigma da filosofia: a fenomenologia-hermenêutica de Heidegger e Gadamer.........................................................79 2.2.2 A perspectiva crítica de Apel à filosofia hermenêutica de Heidegger e Gadamer.........................................................85 2.3 A transformação semiótica da lógica transcendental kantiana............96 2.3.1 O postulado da comunidade de experimentação e interpretação........................................................................102 2.3.2 A crítica de Apel ao cientificismo de Peirce................................109 2.4 O conceito transcendental-hermenêutico de linguagem segundo Apel 115 7 A n t o n i o Wa rd i s o n C . S i l v a 3.arquitetura da Ética do Discurso..................................................123 3.1 A compreensão pragmático-transcendental da Ética do Discurso........124 3.2 A estrutura da Ética do Discurso........................................................129 3.2.1A dialogicidade entre a comunidade ideal (parte “A”) e a comunidade real (parte “B”) da Ética do Discurso..............134 3.3 A reflexão transcendental como fundamentação última da filosofia....140 3.3.1A contribuição de Kohlberg para a fundamentação da ética discursiva...................................................................146 3.4 A relevância da Ética do Discurso.......................................................152 CONCLUSÃO...............................................................................................159 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..................................................................165 8 PREFÁCIO O livro de Antonio Wardison C. Silva sobre Apel, num momento em que os debates sobre ética contemplam a busca de um caminho para a conciliação entre uma ética antropocêntrica e uma pós-convencional, demandando uma simetria com cooriginalidade entre sujeito e objeto, traz uma grande contribuição ao estudo da filosofia no Brasil. Segundo o autor, a Ética do Discurso de Apel não é mera opção racionalista, mas uma clara tentativa, mediante uma pragmática, de construir os fundamentos de uma ética universal com o intuito de superar as deficiências das construções éticas até então. Com a apresentação do “itinerário” do pensamento de Apel, fica evidente que a sua proposta procura desvencilhar-se dos apelos deducionistas ligados às metafísicas teológicas ou teleológicas, e ainda das restritas abordagens linguísticas que se atenham à mera explicação, em que há a primazia de instrumentos lógicos equivalentes às ciências empírico-analíticas, ou à mera compreensão em que remanesce o risco de prevalência das proposições oriundas das éticas metafísicas ou de tradição. Apel vivenciou eventos extremos nos horrores da Segunda Guerra, à qual se seguiram a tensão e o sofrimento humanos decorrentes da constante ameaça de uma guerra nuclear, além da ausência de um modelo universal com vistas à promoção da justiça social, levando-o a rever os antigos modelos do pensa9 A n t o n i o Wa rd i s o n C . S i l v a mento racional. Como exposto de forma didática pelo autor, Apel, coerente com a sua proposta, penetra na história da filosofia e mostra as deficiências básicas dos sistemas tradicionais de pensamento em atender a demanda de uma ética universal, notadamente aqueles da filosofia contemporânea, como o de Wittgenstein e o de Heidegger. Com o autor, segue-se o caminho de Apel na busca do estabelecimento de uma pragmática universal para a fundação de uma ética de cunho estritamente racional, sem se desprezarem os ganhos da humanidade conquistados até então, afastadas as anteriores metafísicas e com tratamento simétrico aos conceitos de explicação e compreensão, além de incorporar soluções para os problemas lógicos da regressão e progressão infinitas no trabalho de justificação das ações compreendidas nas proposições morais. Com a pragmática,Apel busca evitar as soluções das metafísicas clássicas que, de forma infrutífera, apresentavam soluções conflitantes entre si e que não se abrem à possibilidade da experiência real perante o mundo como solução às correções morais sugeridas, o que torna impossível a universalização de um enunciado de correção moral aceitável por todos os envolvidos. Na sequência do “itinerário”, conforme exposto,Apel, na linha de pretensão de sua ética de cunho exclusivamente racional e sem recorrência a um modelo autoritário de imposição da norma, dogmaticamente constituída, procura, entre as éticas racionais, a sua diferenciação da demanda deontológica ao modo de Kant, ao mirar a experiência como antecipação, todavia sem a existência de um sujeito universal racionalmente constituído para o trato do discurso, já considerado como ação. Apel, estabelecido no campo do que se convencionou chamar de virada linguística, busca, sem a figura do sujeito kantiano da consciência universal, uma nova fundamentação transcendental da racionalidade que supere as dificuldades das filosofias estritamente amparadas na linguagem, dando o devido valor às análises 10 Prefácio semânticas, mas submetendo-as à conciliação entre explicação e compreensão no seio das proposições. O autor alemão, como se depreende – e de forma inovadora –, busca constituir uma ética na qual as funções de representação e comunicação da linguagem possam ser equiprimordiais, com as proposições, como unificação das impressões humanas, submetidas a uma pragmática. O livro indica como Apel, então, vai constituir o seu fundamento transcendental da racionalidade em forma alternativa à monologia do sujeito universal da consciência da ética kantiana. E o faz com a compreensão da transformação da filosofia transcendental kantiana, realizada por Charles Sanders Peirce, mediante uma semiótica transcendental tridimensional, ou seja, mediante uma pragmática trivalente de interpretação de signos. Aclara-se que, partindo de uma filosofia maior, pela qual a racionalidade desemboca numa ética vinculada à práxis, Apel realiza um projeto de uma filosofia moral cognitiva fundada na razão prática. Mediante os elementos da filosofia pragmática, notadamente de Peirce e em especial da lógica triádica dos signos e da teoria consensual da verdade, como importantes à superação do falibilismo, Apel formula a sua pragmática transcendental. À clara descrição do autor da arquitetura da ética do discurso, formulada por Apel, é conferido sentido transcendental ao processo triádico sígnico de Peirce, com a sucessiva relação semiótica, objeto – signo – interpretante, que, ao se constituir como bem lógico na razoabilidade, submete-se, em forma de argumento, ao pressuposto pragmático, pondo-se à disposição da experiência comum. Ao modo da filosofia de Peirce, há cooriginalidade cosmológica entre sujeito e objeto, o que permite a Apel considerar, como antecipação, consideradas as dimensões sintática, semântica e pragmática, a ideia de que a relação entre consciência e alteridade ocorre levando-se em conta um cossujeito que se comunica com o primeiro sujeito por meio de signos e, entre todos, sucessivamente, constitui comunidade comunicacional. 11 A n t o n i o Wa rd i s o n C . S i l v a Dessa maneira, conforme expõe o autor, a demanda kantiana do feito da razão realiza-se como argumento ou discurso normativo, pelo qual interlocutores de direitos iguais comungam a pretensão de verdade e validade, excedendo a tradição e alcançando todos aqueles que possuem competência comunicativa. Para Apel, todas as proposições de conhecimento, para que tenham funcionalidade, mesmo que referidas a um mundo de coerções objetivas, requerem uma capacidade de consenso estabelecido a priori no seio da linguagem. Como mencionado pelo autor, cabe à ética o exame das proposições morais na sua dimensão a priori, como reflexão transcendental e não dedutiva, em busca de uma normatividade por consenso em bases racionais na relação recíproca entre dialogantes, sem a existência de sujeito universal para a constituição da correção moral das ações. O autor também qualifica a ética de Apel como pós-convencional, avançando, com seu caráter pragmático-transcendental, em relação à demanda kantiana de uma ética racional e que, ao mesmo tempo, não contemple uma metafísica fora da possível experiência prática. Também o autor observa que remanesce a polêmica sobre se Apel teria, ao final, mantido, em vários aspectos, a ética kantiana em seu postulado de pronunciamentos universais, agora traduzido na irredutibilidade das proposições morais com consenso em seu significado. Ou seja, ao demandar em sua pragmática que as proposições morais não contenham autocontradição performativa, não teria Apel se rea proximado do mecanismo da dedução transcendental kantiana? No entanto, por qualquer dimensão, o livro de Wardison traça um lúcido panorama sobre polêmicas no trato da ética e da moral na contemporaneidade e deixa, de forma irrefutável, a inegável necessidade do debate sobre a possibilidade de uma fundamentação transcendental da racionalidade, a qual passa pela incorporação dos procedimentos semióticos pragmáticos trazidos pela filosofia de Charles S. Peirce. Este alterou a relação 12 Prefácio procedimental entre significação e significado, deitando as raízes para novas pragmáticas na busca de justiça, sejam elas chamadas de formal, como em Habermas, ou transcendental, como em Apel, permitindo a pretensão de se substituir o sujeito geral e universal kantiano, detentor da razão transcendental, capaz de traçar pronunciamentos eternos, indicadores de correção moral para a conduta humana. Para os leitores de filosofia, o livro é um excelente itinerário não apenas para o conhecimento, mas também para o estudo da influência do Pragmatismo de Peirce no debate da filosofia contemporânea germânica sobre a possibilidade da fundamentação transcendental da racionalidade. José Luiz Zanette Centro de Estudos de Pragmatismo – PUC-SP 13