Ivo Poças Martins, Fevereiro 2007
Texto da proposta seleccionada do concurso “Intervenções na Cidade”
Trienal de Arquitectura de Lisboa
“Praça de Espanha”
www.pocasmartins-seabra.com
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Com a União Europeia a noção de fronteiras entre estados alterou-se: não existem
controlos alfandegários e promove-se a livre circulação. Tenta-se criar uma identidade
europeia da qual a moeda é a representação simbólica mais presente.
Nas notas de Euro a arquitectura serve para ilustrar a construção de uma civilização e a
sua evolução. No verso, representam-se portas e janelas em diferentes épocas simbolizando
as novas ligações e oportunidades entre os países membros.
Para a nota de 500€, que representa a contemporaneidade, levantam-se duas questões: a
do tipo de porta a usar e qual o significado de uma porta quando as fronteiras caem.
O arranha-céus funciona como uma representação arquitectónica da cidade
contemporânea e do seu desenvolvimento organizacional e económico, o que faz com que
seja um tema adequado a figurar numa nota. A construção de arranha-céus só se tornou
possível com a invenção do elevador. O seu movimento de subida e descida, como um
êmbolo numa seringa, criava um fluxo de vento que fazia com que as portas para a rua se
abrissem e fechassem com igual cadência. Parecia que o edifício alto se mexia nas suas
entranhas e respirava de forma compassada como um organismo vivo.
A porta giratória, criada para resolver este problema, tem então um significado de
controlo. Mantém-se permanentemente aberta conseguindo, simultaneamente, estar
sempre fechada.
Numa altura em que não existem fronteiras, as diferenças entre estados continua a existir
O controlo que sobre os países de fora da união europeia aumenta e as nossas cidades, cada
vez mais internacionais e europeias, também reflectem essa realidade.
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Embora se fale de uma cidade contínua no espaço, existe a distinção entre o espaço
urbano e suburbano. A representação cartográfica da fronteira é uma linha que, de acordo
com a Geometria, não tem espessura mas, no entanto, ela existe no espaço enquanto lugar.
Os limites da cidade desenham-se com vias asfaltadas que desempenham o papel
contraditório de ligação e de fronteira. Neste contexto, a rotunda, no nó entre as vias
radiais e as vias circulares, parece ser uma nova porta da urbe e o perpétuo movimento de
revolução dos carros que a percorrem surge como o ritual obrigatório para a atravessar.
Lembramos o carrossel de Jaques Tatti a encerrar a ilustração da cidade moderna de
Playtime: os que chegam e os que partem juntam-se e confundem-se por um breve
momento antes de seguirem em direcções distintas. O centro da rotunda é um espaço
circular sobrante que, sem nenhuma outra função, serve de suporte à ornamentação. A
escultura enquadrada num espaço ajardinado tem uma forma helicoidal celebrando nada
mais do que o movimento de rotação dos carros.
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A praça de Espanha, embora situada no interior da cidade, tem um significado de lugar
de transição. Funciona como um grande vazio urbano: um espaço arborizado contornado e
cruzado por vias de grande fluxo. No seu centro, um arco triunfal, reaproveitado de outro
local de Lisboa, marca timidamente que este espaço é também uma porta.
O Arco triunfal, para além de lembrar algum esquecido feito histórico, celebra a ausência
de muros: o seu derrube ou simplesmente o facto de não serem precisos. A liberdade de
movimentos aumenta à medida que se expandem e diluem os limites da cidade.
O espaço público representa uma conquista colectiva e a porta giratória monumental (à
escala do espaço que serve) no lugar do antigo arco, relança o debate sobre a necessidade
de conquistar este lugar de transição. A rotunda e a via rápida deixariam de existir como
resposta imediata no desenho da cidade.
Fica no entanto a memória do ritual antigo: o monumento, que se quer estático, induz o
movimento de rotação dos carros. Os painéis de vidro e alumínio misturam as imagens que
enquadram à transparência com as que reflectem. O museu, a embaixada, o teatro, a
mesquita, o mercado e as casas ganham aqui um novo espaço de interacção à medida que o
jardim isolado que escondia um monumento antigo vai sendo redescoberto. A praça
recupera o seu significado de fórum servindo de suporte às actividades que a limitam.
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A imagem a montar em outdoor na praça de Espanha será uma ampliação da
fotomontagem apresentada a concurso. O outdoor ficará instalado do lado da saída de
metro permitindo imediatamente o reconhecimento do ponto de vista da fotografia de
base.
Para além da eventual identificação das entidades promotoras, não se introduzirá
nenhum texto porque o objectivo da proposta é o de estimular o debate público sobre a
realidade local: provocar estranheza e fazer voltar as atenções para o centro do espaço em
questão.
Como já foi dito, o espaço público faz sentido enquanto conquista colectiva. Portanto, o
facto do arco que actualmente está na praça de Espanha ter sido retirado da rua de S. Bento
representou também um ganho de espaço nesse sítio. Depois de novamente desmontado
da praça onde está agora, as pedras do arco seriam repostas, seguindo a documentação
fotográfica da época, de forma a reconstituir rigorosamente os escombros do seu primeiro
desmonte.
A nova porta, em alumínio e vidro seria executada sem pormenores construtivos,
privilegiando a participação anónima em detrimento do traço do arquitecto enquanto
instrumento de transformação da cidade.
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Verso da nota de 500€
Verso da nota de 500€ alterada com referência à porta giratória
Fotograma de “Playtime”, Jaques Tatti, 1973
Registo fotográfico da praça de Espanha em Janeiro de 2007
Localização inicial do arco triunfal, na rua de S. Bento e depósito das suas pedras no Convento das Francesinhas após primeira demolição – Lisboa
Desaparecida
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“Praça de Espanha” - Ivo Poças Martins + Matilde Seabra