DIANE DUCRET
MULHERES DE DITADORES
Tradução
Oscar Mascarenhas
ÍNDICE
INTRODUÇÃO:
Cartas de amor a um ditador
1. Benito Mussolini, la Duce Vità
Um revolucionário de órgãos irresistíveis
As amantes judias do fascismo
A mulher e a galinha, uma fábula mussoliniana
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30
30
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2. Lenine, o trio vermelho
Nádia, «o arenque»
A outra Troica
Jogo de damas no Kremlin
85
85
96
115
3. Estaline, amor, glória e datcha
A defunta Kato
Um playboy georgiano
A alegre suicida
A desconhecida de Ialta
119
119
123
127
141
4. António Salazar, jogos interditos a um seminarista
A Virgem de Viseu
As passantes do Hotel Borges
O amor toca sempre duas vezes
144
144
159
173
5. Bokassa: crónicas de Bangui, a libertina
Amor à primeira vista em Bangui
A rainha de Hardricourt
Valéry, um amigo que quer o vosso bem
181
181
193
197
6. Mao, o tigre destas damas
A mulher sem cabeça
A marcha do imperador
O amor é azul como uma maçã
210
210
217
222
7. Elena Ceausescu: luxo, calma e Securitate
Uma última seringa para o caminho
Itinerário de uma camarada desavergonhada
Santa Elena de Petresti
Do ciúme…
246
246
250
253
263
8. Um Führer chamado Desejo
A educação sentimental
As suicidas
Eva, à espera de Adolf
Magda, primeira-dama
279
279
289
299
318
Notas
Agradecimentos
341
353
INTRODUÇÃO
Cartas de amor a um ditador
Adorado Führer
«O Estado sucumbe precisamente porque V. deixa sucumbir as
mulheres. Querido Hitler, as mulheres esperam um futuro melhor1»,
Emmy Hoffmann, Dresda, 1932.
Como uma advertência, uma desconhecida abre o baile da correspondência privada de Adolf Hitler na chancelaria do Reich. Os
alemães esperam um futuro melhor e exigem que Hitler lho construa.
O intrépido chefe de fila do partido nazi deixar-se-á tomar por um
provinciano? As eleições que o conduzirão ao poder serão no ano
seguinte. Hitler soube escutar e incluir as mulheres no seu programa.
Para os alemães ele é o novo chanceler do Reich. Para os alemães,
ele é o Homem providencial, o Super-Homem.
A partir daí, as cartas que chegam à chancelaria privada não
correspondem, longe disso, ao protocolo habitual. Felicitações, conselhos bem-intencionados e declarações de amor pelo menos apaixonadas afluem todos os dias. Se muitos homens de todo o tipo de
profissões escrevem a Hitler, são as mulheres que remetem as correspondências mais íntimas. Elas não se dirigem ao chefe de Estado
nem ao ideólogo, mas ao homem Hitler, de quem esperam sentimentos de reciprocidade.
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MULHERES DE DITADORES
«Meu querido Führer,
Todos os dias sou levada a pensar em si, em todas as horas e
todos os minutos. Iria de boa vontade para Berlim ter consigo. Tenho
o direito de fazê-lo? Aconteça o que acontecer, a minha vida pertence-lhe. Gostaria muito de saber o que tudo isto significa. Já não
consigo trabalhar, porque estou sempre a pensar em si. Não posso
amar outras pessoas além de si. Esperemos que o meu desejo se realize.
Escreva-me, por favor, se eu tiver o direito de ir aí.»
É difícil imaginar o ditador de bigodinho na pele de um símbolo
sexual. É sobretudo desconcertante. No entanto, Adolf Hitler recebe
mais cartas dos fãs do que Mick Jagger e os Beatles juntos2. O afluxo
constante das cartas à chancelaria privada do Reich acompanha a
sua curva de popularidade: em 1925, os textos são tratados por um
só arquivista. De janeiro a abril de 1933, ele recebeu mais de 3000
cartas. No fim do ano, totalizou-se 5000. Em 1934 chegaram pelo
menos 12 000 cartas e em 1941 mais de 10 000. Na chancelaria,
organizam-se. As cartas serão guardadas no «Arquivo A», criado para
o efeito, onde se colocam as «rabiscadas por mulheres». Nestes
milhares de cartas, entre 1935 e 1938, nem um cartão de críticas
ou de advertências. A admiração é uniforme.
A palavra de ordem dada aos funcionários encarregados do
correio é clara: não se responde às apaixonadas e devotas de Hitler.
A menos que a remetente anuncie a intenção de vir proximamente
a Berlim para beijar pessoalmente o seu adorado Führer. Nesse caso,
o diretor da chancelaria privada referencia a fã às autoridades policiais.
Uma resposta lacónica põe fim a toda a esperança de idílio:
«Minha senhora, cavalheiro,
Pela presente, acuso a receção da sua carta endereçada ao Führer
e comunico-lhe que este, por princípio, não se envolverá em nenhuma
relação privada.
Uma saudação alemã, Albert Bormann.»
Estes milhares de cartas de mulheres desinibidas deixam o líder
nazi muito desconfortável: as declarações de amor abstratas paralisam-no. Como estratégia, reconhece no entanto a importância de
uma correspondência deste tipo proveniente do povo. É o seu «baró-
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INTRODUÇÃO
metro da opinião pública». Mantém-se, porém, informado do conteúdo dos milhares de cartas recebidas. Rudolf Hess, encarregado
da correspondência até 1931, depois Albert Bormann preparam-lhe
resumos, para lhe facilitar a leitura.
A correspondência privada de Hitler, arquivada em Moscovo,
oferece um espelho das «seduzidas» do nacional-socialismo até à
carne. Ela desvenda um caráter desconhecido dos sistemas ditatoriais:
o seu poder repousa no potencial de sedução do ditador, tanto como
na sua coerção. O laço entre Hitler e o povo é também feito de
desejo. O argumento pode chocar. Mas é simplesmente humano.
A senhora Klose deseja assim participar na expansão do mito
Hitler. Dedica-lhe um poema em 1933, esperando poder divulgá-lo na imprensa:
«Todos nós aclamamos Hitler,
Que nos dá a paz e a esperança,
Oh tu! Nosso salvador!
Tu suportas os ataques e as censuras, sem esquecer o teu alvo!
Viva Adolf Hitler!
Heil Hitler, grita o mundo inteiro.
Ilustre e amado herói, é nossa a lealdade.
Levemo-lo todos em coro, levantemos os braços e gritemos unidos
“Heil Hitler”.»
Eis a resposta inesperada que ela recebe:
«Cara senhora Klose! O Führer transmite-lhe um agradecimento
cordial pela sua carta. Infelizmente, não podemos dar a autorização
para reproduzir este poema, dado que o Führer recusa, por princípio,
toda a forma de glorificação da sua pessoa.»
No inverno seguinte, a senhora von Heyden, de Plötz, envia-lhe
um grande pacote de mel, com recomendações para a sua saúde, explicando-lhe como aquecer cuidadosamente o néctar, a fim de que não
fique excessivamente líquido e não perca assim o seu «delicado aroma».
«Meu Führer, fiquei satisfeita por saber que recebeu o meu mel…
E gostaria ainda de enviar-lhe mais, de tempos a tempos, a fim de
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MULHERES DE DITADORES
participar desse modo nos vossos almoços… Que prazer em que este
produto natural da nossa Pomerânia contribua para alimentar o seu
enorme dispêndio de energia física e mental. Com admiração e sentimento,
Sr.ª von Heyden-Plötz.»
Para algumas das suas admiradoras, seria inconcebível e eminentemente prejudicial que tanta energia não servisse para mais do
que a política. Numerosas são as que têm outras sugestões a fazer.
Hartmannsdorf, 23 de abril de 1935:
«Querido Führer Adolf Hitler!
Uma mulher da Saxónia gostaria muito de ter um filho consigo.
É seguramente um intenso desejo muito particular e o simples pensamento de que não deverá ter filhos me obceca. Eis o desejo que
tenho a manifestar-lhe nesta carta.
Uma carta é uma questão de paciência. Podemos lê-la e pô-la
de lado. Podemos deixá-la ecoar por si, como uma linda melodia.
Podemos recebê-la como carta e segui-la.
Os meus desejos misturam-se com os meus receios. A carta poderia não lhe ser entregue. V. não teria tempo para uma criança. Poderia
sentir-se demasiado velho para uma criança e ter já há muito tempo
afastado essa ideia como sendo impossível. Apesar de tudo, um filho
seu deveria ver a luz do dia. Este é o meu maior desejo, que eu aspiro
a satisfazer com toda a força do meu coração.
Friedel S.»
A 21 de abril de 1938, três mulheres de Ludwigsfelde, no Sul
de Berlim, manifestam por escrito a sua emoção depois de simplesmente a terem discutido entre elas:
«Meu Führer,
O acaso conduziu-nos à estação de Ludwigsfelde no dia do plebiscito. À aproximação do comboio, vimos na locomotiva um camarada
do partido em uniforme. Isso levantou-nos a dúvida sobre se o nosso
Führer estava no comboio. E não nos enganámos. Três mulheres radiantes de felicidade puderam avistar o seu Führer, tão alegremente eleito
e receberam em troca uma saudação amiga com a mão. Pela presente,
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INTRODUÇÃO
as três mulheres extremamente felizes agradecem de todo o seu coração
ao seu Führer e solicitam um autógrafo para cada uma delas, como
recordação deste instante tão maravilhoso e inesquecível. Sieg Heil!*
Obrigado ao nosso querido Führer!
Martha Imse, Anna Loppien, Elizabeth Pässler.»
No fim dos anos 1930, a admiração votada a Hitler está no seu
auge. As projeções românticas já não têm limites: «… calcule o que
um Sagitário pode fazer de um Carneiro. A eterna fêmea atraiu-vos!!
Exulta, então, meu coração e deixa-te enlaçar pelas estrelas! E diz-me uma vez mais, oh jovem, minha jovem mulher como eu vos amo.
Como me amas tu? Tu és as flores dos campos. Oh as margaridas3!»
«Porquê ser tão tímido e agir por vias tão secretas? Não posso
adivinhar os teus pensamentos. Estive ontem até às 11 e 30 no local
da sociedade de tiro da tua cidade, mas infelizmente não te vi. Tu
procuras uma mulher, eu procuro um homem. Nós poderíamos já
viver juntos desde há dois anos, se tu não agisses tão secretamente.»
«Eu não espero uma resposta tua desde há somente dois anos,
aproximadamente, mas já estou à espera desde há sete ou oito anos.»
Alexandria, Egito, 21 de novembro de 1938:
«Senhor Hitler,
Não sei muito bem como começar esta carta. Numerosos, numerosos foram os anos de dificuldades, angústias e preocupações morais,
de desconhecimento de mim, de busca de qualquer coisa de novo…
Mas tudo isso teve fim, num instante, quando compreendi que a tinha
em si, senhor Hitler. Sei que tem uma personalidade grande e poderosa
e que eu sou uma simples mulher insignificante que vive num país
longínquo, do qual provavelmente não regressará nunca, mas tem de
ouvir-me. Grande é a felicidade quando enfim encontro o objetivo
da minha vida, quando um raio de luz atravessa as nuvens e tudo
se ilumina! É o que me acontece… Tudo foi iluminado por um amor
tão grande, amor pelo meu Führer, o meu mestre, que por vezes eu
desejaria morrer com a sua foto à minha frente para nunca mais ver
* Expressão alemã com o sentido de «Salve Vitória», muito utilizada pelos nazis.
(As notas de pé de página são do Tradutor. As notas da Autora encontram-se reunidas
na parte final do livro.)
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MULHERES DE DITADORES
outro que não vós. Não escrevo ao mestre chanceler de um grande
Reich, escrevo simplesmente ao homem que eu amo e que seguirei até
ao fim da minha vida…
Sua até à morte, baronesa Elsa Hagen von Kilvein.»
Precisemos que nenhuma destas mulheres conhecia pessoalmente
o Führer.
Berlim, 10 de setembro de 1939:
«Meu querido e delicioso Adolf,
Tenho de escrever-te, porque estou muito só. Em minha casa, os
dois rapazes foram passear, Lenchen está em casa do seu amigo e eu
estou sentada a fazer trabalho doméstico. Coso, por exemplo, as meias
e faço a barrela. Gostaria de ir à rua, mas chove e tenho tanto que
fazer; sempre a trabalhar, não é, meu querido. […] Eu estou sempre
a olhar para as tuas fotos e ponho-as à minha frente antes de as beijar.
Sim, sim, meu amor, meu querido, meu bom Adolf, o amor é verdadeiro
como o ouro. […] E depois, a partir daqui, meu amor, imagino que
recebeste a minha encomenda com o bolo e igualmente que ele te agradou. O que eu te envio é inteiramente por puro amor. Vou agora
concluir. Meu amor, meu querido, meu bom Adolf, sê saudado e beijado
muitos milhares de vezes pela tua querida criada Miele.»
Admiradoras com pressa de chegar ao fim e apanhar o Führer
nas suas redes enviam-lhe nem mais nem menos do que contratos
de casamento:
«Pelo presente atestado assinado, a menina Anne-Marie R. toma-vos oficialmente como esposo.» Talvez elas esperem ver a ata devolvida
acrescentada com a assinatura do seu querido Adolf…
Dagmar Dassel, ela, nunca recebeu qualquer resposta de Hitler,
mas continuou a enviar-lhe numerosas cartas entusiastas e prolixas,
250 páginas no total. Primeiro envio a 25 de fevereiro de 1940, por
ocasião do 20.º aniversário da fundação do partido nazi. A extrema
veneração vai aumentando, até à carta de 11 de maio de 1941:
«Meu Führer, hoje posso afirmar o meu voto de lealdade e de
amor absoluto, as minhas ideias e sentimentos não pertencem senão
a vós, meu Führer, meu homem tão amado, o mais nobre, o mais
grandioso, o mais maravilhoso, único e genial, enviado de Deus,
16
INTRODUÇÃO
somente a vós, meu Führer, somente à vossa missão e redenção pacíficas, somente a vós, filho eleito, ungido, coroado e amado de Deus,
celeste mensageiro de paz, executor da vontade divina sobre a terra,
vosso povo e o vosso Reich pangermânico e vosso magnífico exército
de heróis, somente para vós, meu Führer, primeiro soldado e chefe
supremo deste soberbo exército, o general e estratego mais genial e
mais grandioso de todos os tempos, o chefe de Estado mais genial, o
maior Alemão, somente para vós, meu Führer, o herói mais augusto,
o grande vencedor de hoje e de sempre, somente para vós, meu Führer,
o homem mais puro mais sublime, eu me dedico, de todo o coração,
pelo vosso amor jubiloso e o do nosso povo e do Reich pangermânico...
a minha alma regozija-se para sempre. Meu Führer, Sr.ª Dagmar
Dassel.»
Berlim, 17 de julho de 1941:
«Caro Adi!*
Tu vais seguramente suspirar um pouco por mim. Quero enviar-te uma fotografia, como símbolo do meu amor. Junto, para ti, uma
pequena foto. Aqui eu pareço uma Madona no céu. Por vezes fico
muito triste. No dia 23 deste mês vou para o meu país natal. Tu já
estiveste em Karlsbad…** Daí pensarei em ti muitas vezes.
Beijos ardentes para ti, meu mauzão.
Ritschi.»
Algumas parecem deixar a pena andar à solta e descarregar o
coração das suas preocupações à medida que redigem uma missiva
ao guia da Alemanha.
Bad Kreuznach, 30 de setembro de 1941:
«Meu bem-amado,
Meu fiel querido, nosso grande Führer e general de génio “Salve
Vitória”, “Salve Vitória”, “Salve Vitória”. A maior operação de extermínio da história aproxima-se do fim com a sua brilhante vitória.
“Salve Vitória”, nosso grande e genial Führer e general, meu caro
* Diminutivo de Adolf, usado pela família na sua infância.
** Cidade termal hoje situada na República Checa, integrada na Alemanha nazi em
resultado do Acordo de Munique, em 1938.
17
MULHERES DE DITADORES
Führer e fiel amor. Deixa-me, hoje, apertar-te contra o meu coração
e sobretudo agradecer por todo o teu grande trabalho, a tua aplicação
e o teu pensamento. Não posso fazer mais do que rezar pelo meu
querido e suplicar ao Senhor por ti meu amor e pela bênção da tua
grande obra. Todos os teus esforços e os teus cuidados não são para
mais ninguém do que nós e a nossa tão grande e bela pátria. […]
Também tu pensas muito na tua Jose? Sim? Sim? Guarda-me
bem, meu amor fiel, eu ser-te-ei eternamente fiel e boa e não te
inquietes mais comigo. Hoje fizemos mais uma vez uma bela saída
a cavalo e de carro a Spreitel. É uma linda casa da floresta em
madeira. No trajeto cantámos todos lindas canções, havia ainda
um lugar vago na viatura e teria rejubilado se o meu amor tivesse
podido ser um dos nossos. Mas regozijemo-nos com a guerra. Sim?
Sim? Meu querido. Agradeço-te também por tudo o que é amor e
fidelidade, por tudo o que é belo. Tu és tão adorável e bom para
comigo. Isso faz-me tão rica e feliz, meu grande, fiel amor. Desola-me tanto e muitas vezes que tu tenhas tanto trabalho, mas depois
da guerra a situação também ficará melhor para ti, meu amor. […]
Mas temos de pôr termo a esta pequena cavaqueira, meu amor.
Voltei a contar-te tudo, deixa-te apertar fortemente contra o meu
coração e aceita as mais sinceras e cordiais saudações, meu amor
fiel, Adolf Hitler.
Jose, a tua menina.»
U. Grombach, 29 de março de 1943:
«Caríssimo Senhor ministro do império!
… O meu marido tornou-se-me estranho, apenas porque trago
no meu coração o Melhor. Ele quis ir de férias a 20 de março, mas
isso foi adiado, para quando não sei ainda, só que essa foi então e
sempre a minha ideia, se ele não vem é porque as coisas não estão
bem, tanto mais o tempo passa, menos o meu marido e eu estamos
de acordo. Mesmo se eu não vos conhecesse, isso valia o mesmo.
Desde a primeira hora em que ouvi falar de Adolf Hitler, foi o sinal
de uma nova fé, da força, do poder, do amor. Ele é o modelo da minha
vida até que os meus olhos se fechem para sempre, eu quero pois
questionar-me e lutar por ele até ao fim… Gostaria para começar
de insistir no que falei na última noite com a jardineira. Isso foi
para mim mais penoso porque ela perguntou-me o que eu pensava
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INTRODUÇÃO
da situação de guerra. Respondi somente que com os nossos U-Boote,
ela deveria acabar bem e que a América um dia seria vencida.*
[…] Eu penso tanto em ti e em nós dois, o amor está já tão profundamente enraizado. Tu dás-me continuamente tantas coisas a compreender que eu conheço cada sinal. Peço-te, daqui em diante, acima
de tudo, que não possa haver dúvidas. Não quero ser senão tua. […]
Tenho sempre no meu coração o desejo de que o nosso bom Führer, o
nosso salvador esteja sempre de boa saúde e que nós o guardemos
ainda por muito tempo, porque sem ele, nós não somos nada.
Com devoção e fidelidade eu te saúdo com o “Heil Hitler”.**
Sr.ª Rosa M.»
Berlim, 6 de março de 1944:
«Caro Senhor chanceler do império!
Como não teve interesse nem amor por mim e a minha mensagem
não vos conquistou, a minha confiança em si não pode continuar a
florescer. Escreva-me por favor, de qualquer forma, as razões. E porque é que não tem confiança em mim? Sem isso, a nossa relação nem
sequer começa. Um homem que ama uma jovem mulher também tem
iniciativa e tudo corre bem. Com os seus lamentos não, tornou-se-me um mistério. Seria melhor para nós se pudéssemos conversar de
viva voz. No entanto, nunca ainda me escreveu, nem se anunciou.
Devo portanto supor que não sou a vossa feliz eleita.
Vou agora concluir e deixar-lhe ternas saudações.
Anna N.»
O inconsciente, estádio supremo da sedução
A sedução exercida por Hitler sobre as mulheres é pois extremamente penetrante. Elas escrevem-lhe, empenham-se nele e na
sua causa, partilham a sua visão da nação alemã. Mas que outro
estado conduz à sedução, à subjugação sexual, que não o chegar ao
inconsciente? Sendo a Alemanha pioneira em matéria de psicanálise,
oferece-nos um material precioso, que nos revela a ligação íntima
* Designação popular para a força de submarinos alemã.
** «Salve Hitler.»
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