UNIVERSIDADE
CATÓLICA DE
BRASÍLIA
PRÓ-REITORIA DE GRADUAÇÃO
PROJETO DE PESQUISA DO TRABALHO DE
CONCLUSÃO DE CURSO
Direito
“CONTROLE JUDICIAL DOS ATOS ADMINISTRATIVOS”
Autor: Luiz Henrique Silva Almeida
Orientador: Prof. Airton Rocha Nóbrega
BRASÍLIA
2008
2
LUIZ HENRIQUE SILVA ALMEIDA
Controle Judicial dos atos administrativos
Trabalho
apresentado
ao
curso
de
graduação em Direito da Universidade
Católica de Brasília como requisito parcial
para obtenção do Título de Bacharel
Direito.
Orientador:
Nóbrega.
Brasília
2008
Professor
Airton
Rocha
3
Trabalho de autoria de Luiz Henrique Silva Almeida, intitulado “Controle
Judicial dos atos administrativos”, requisito parcial para obtenção do grau de
Bacharel em Direito, defendida e aprovada em ____/____/____, pela banca
examinadora constituída por:
_______________________________________
Prof. Airton Rocha Nóbrega
Orientador
_______________________________________
(Nome do componente da banca com titulação)
_______________________________________
(Nome do componente da banca com titulação)
4
Dedico o presente trabalho a minha filha
que me dá força todos os dias para
aprender mais; aos meus pais por todo
carinho
e
acadêmica.
apoio
em
minha
jornada
5
Primeiramente, agradeço a Deus que
sempre ilumina os meus passos.
Agradeço ao Professor Airton Rocha
Nóbrega pela orientação.
Com especial relevância, agradeço aos
meus pais por sempre estarem ao meu
lado, em todos os momentos que precisei
e ao meu irmão pela ajuda desde o início
do curso até a conclusão deste trabalho.
Agradeço ainda a minha namorada pelo
apoio e compreensão e aos meus amigos
Eisenhower, Leonardo, Amanda e Cláudia
pelo constante incentivo.
6
RESUMO
No presente trabalho discute-se a possibilidade do Poder judiciário exercer
um controle sobre o ato administrativo. Para isso foram desenvolvidos quatro
capítulos. Primeiramente verifica-se o ato administrativo em si através de um estudo
sobre a sua estrutura composta por conceito, requisitos e atributos. O segundo
capítulo trata das diferenças entre a revogação e a anulação do ato administrativo e
todas as nuances destes institutos. O terceiro capítulo trata das modalidades de
controle da administração pública. Por último, o quarto capítulo vai tratar do tema
específico deste trabalho: o controle judicial dos atos administrativos. Neste capítulo
comparam-se os entendimentos da doutrina clássica e da moderna quanto à
possibilidade do exame de mérito do ato administrativo pelo Judiciário.
Palavras chaves: Direito Administrativo, Ato Administrativo, Controle Judicial.
7
ABSTRACT
In the presented work it is discussed the possibility of an "administrative act"
control by the Judiciary. For this purpose there are four chapters. First, the
"administrative act" is verified thoroughly (concept, requisites and attributes). The
second chapter refers to the difference between "revogação" and "annulment" of the
"administrative act" and its contents. In the third chapter it is discussed the fields of
public administration control. Finally, the fourth chapter is developed the main subject
of the work: judicial control of the "administrative acts" - the classic and modern
doctrines comparisons regarding the possibility of "administrative act honor exam" by
the Judiciary.
Keys words:
8
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO......................................................................................................10
1 ATOS ADMINISTRATIVOS...............................................................................12
1.1 Conceito..............................................................................................12
1.2 Requisitos do Ato Administrativo.....................................................13
1.2.1 Competência ..........................................................................13
1.2.2 Finalidade................................................................................14
1.2.3 Forma .....................................................................................16
1.2.4 Motivo......................................................................................17
1.2.5 Objeto .....................................................................................18
1.3 Atributos do Ato Administrativo........................................................19
1.3.1 Presunção de Legitimidade ....................................................20
1.3.2 Imperatividade.........................................................................21
1.3.3 Auto-executoriedade...............................................................22
1.3.4 Tipicidade................................................................................24
2 REVOGAÇÃO E ANULAÇÃO DO ATO ADMINISTRATIVO ...........................26
2.1 Revogação ..........................................................................................26
2.1.1 Conceito..................................................................................26
2.1.2 Sujeito Ativo............................................................................26
2.1.3 Objeto da Revogação.............................................................27
2.1.4 Fundamentos da Revogação..................................................27
2.1.5 Motivos da Revogação...........................................................28
2.1.6 Efeitos da Revogação ............................................................28
2.2.7 Natureza do ato revogador.....................................................29
2.1.8 Revogação e indenização......................................................30
2.2 Anulação.............................................................................................31
2.2.1 Conceito.................................................................................31
2.2.2 Sujeitos Ativos da Anulação ..................................................31
2.2.3 Objeto da Anulação................................................................31
2.2.4 Fundamento da Anulação......................................................32
2.2.5 Motivos da Anulação .............................................................33
2.2.6 Efeitos da Anulação...............................................................33
9
2.2.7 Anulação e indenização.......................................................33
3 – CONTROLE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA ..........................................35
3.1 Definição de controle ......................................................................35
3.2 Modalidades de controle ................................................................36
3.2.1 Quanto ao órgão que a exerce ............................................36
3.2.1.1 Controle administrativo ou executivo..................... .36
3.2.1.2 Controle legislativo ou parlamentar ........................37
3.2.1.3 Controle judiciário ou judicial ..................................38
3.2.2 Quanto ao momento em que se efetuar ...............................39
3.2.2.1 Controle prévio ou preventivo .................................39
3.2.2.2 Controle concomitante ou sucessivo ......................40
3.2.2.3 Controle subseqüente ou corretivo........................ .40
3.2.3 Conforme o seu fundamento ................................................41
3.2.3.1 Controle hierárquico ................................................41
3.2.3.2 Controle finalístico ...................................................41
3.2.4 Conforme origem...................................................................42
3.2.4.1 Controle interno ......................................................42
3.2.4.2 Controle externo .....................................................42
3.2.4.3 Controle popular .....................................................42
3.2.5 Quanto ao aspecto a ser controlado ....................................43
3.2.5.1 Controle de legalidade ou legitimidade ..................43
3.2.5.2 Controle de mérito ..................................................43
4 CONTROLE JUDICIAL ATO ADMINISTRATIVO ..........................................46
4.1 Aspectos Gerais ..............................................................................46
4.2 Doutrina Clássica.............................................................................50
4.3 Doutrina Moderna............................................................................54
CONCLUSÃO ...................................................................................................63
REFERÊNCIAS .................................................................................................65
10
INTRODUÇÃO
O ramo do direito que é objeto deste trabalho é o Direito Administrativo, que
nas palavras de Hely Lopes Meirelles “é um conjunto harmônico de princípios
jurídicos que vão reger os órgãos, os agentes e as atividades públicas tendentes a
realizar concreta, direta e imediatamente os fins desejados pelo Estado”. 1
No Estado Democrático de Direito Brasileiro é grande a preocupação com os
direitos dos cidadãos. Parte dessa preocupação tem a ver com a limitação do poder
estatal visando coibir ações arbitrárias da administração pública. Para isso, a
administração pública deve se sujeitar à lei e aos princípios de direito que sustentam
o ordenamento jurídico pátrio.
O tema é de suma relevância para os operadores do direito diante da
controvérsia ainda existente a cerca da matéria, na medida em que existem duas
correntes com posições opostas para a solução da questão. A primeira é a corrente
clássica, a qual entende não ser possível o exame judicial do ato administrativo
tendo como um de seus argumentos o princípio da separação dos poderes. Já a
corrente moderna, com base em princípios constitucionais, defende o controle do
Judiciário sobre o mérito administrativo no caso concreto. Assim, esta monografia
pretende demonstrar a evolução do pensamento em relação à matéria a fim de
evitar que um ato da Administração Pública que fere princípios constitucionais, como
o da legalidade e da moralidade, prevaleça. O ato administrativo deve ser anulado
quando ofender a lei, a moral os bons costumes e qualquer princípio que rege uma
boa administração.
O trabalho é dividido em quatro capítulos. No primeiro é apresentado o ato
administrativo e sua estrutura, ou seja, conceito, requisitos e atributos. O segundo
capítulo mostra as diferenças entres os institutos da revogação e da anulação, duas
formas de extinção do ato administrativo de grande relevância. O terceiro capítulo é
apresentado o conceito de controle e suas modalidades. Por fim, no quarto capítulo,
o tema da monografia é apresentado, bem como as correntes que tratam da matéria.
1
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 32ª ed. São Paulo: Malheiros, 2006.
p. 29.
11
O objetivo deste trabalho é demonstrar se existe ou não a possibilidade do
Poder Judiciário realizar a fiscalização sobre o mérito administrativo.
12
1 ATOS ADMINISTRATIVOS
1.1 Conceito
Celso Antônio Bandeira de Mello, define o ato administrativo como:
“Declaração do Estado (ou de quem lhe faça às vezes – como, por
exemplo, um concessionário de serviço público), no exercício de
prerrogativas públicas, manifestada mediante providências jurídicas
complementares da lei a título de lhe dar cumprimento, e sujeitas a
controle de legitimidade por órgão jurisdicional.”.
A conceituação da doutrinadora Maria Sylvia Zanella Di Pietro é mais
restritiva, estabelecendo ela o ato administrativo como “a declaração do Estado ou
de quem o represente, que produz efeitos jurídicos imediatos, com observância da
lei, sob regime jurídico de direito público e sujeita a controle pelo Poder Judiciário.” 2
Em sua obra, Maria Sylvia Zanella Di Pietro critica o conceito dado por Celso
Antônio Bandeira de Mello para atos administrativos por incluir também os contratos
devido a sua amplitude. Além disso, diferentemente de Bandeira de Mello, a autora
também defende que o ato pode ser praticado por qualquer um dos Poderes e não
só pelo Poder Executivo.
Na verdade, como bem estabelece Hely Lopes Meirelles, “o conceito de ato
administrativo é fundamentalmente o mesmo do ato jurídico” 3 e também visa
adquirir, resguardar, transferir, modificar ou extinguir direitos, mas com o diferencial
de que possui uma finalidade pública nos seus atos.
Do mesmo modo entende Antônio Cecílio Moreira Pires. Em sua obra o autor
faz uma relação com o conceito de ato jurídico presente no Código Civil Brasileiro,
que de acordo com o artigo 81, é todo aquele que tem por fim imediato adquirir,
resguardar, transferir, modificar ou extinguir direitos. Pires acredita que o conceito
dado pelo Código Civil para ato jurídico serviria também no campo do direito
2
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 20. ed. São Paulo: Atlas, 2007, p. 180.
3
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 32. ed. Malheiros Editores, 2006, p.
149.
13
administrativo, para conceituar ato administrativo, fazendo – se a ressalva de que o
ato administrativo teria o aspecto da finalidade pública. 4
Apesar dessas pequenas discordâncias no âmbito doutrinário, todos os
autores quando conceituarem ato administrativo, destacaram alguns elementos que
são essenciais para sua caracterização:
1. A manifestação de vontade da administração pública;
2. a finalidade de adquirir, resguardar, transferir, modificar ou extinguir
direitos;
3. visando à finalidade pública.
1.2 Requisitos do Ato Administrativo
Para Hely Lopes Meirelles, os requisitos constituem a infra-estrutura do ato
administrativo e sem a harmonia desses elementos não é possível obter condições
de se ter um ato administrativo eficaz. 5
Segundo Meirelles, são requisitos do ato administrativo a competência,
finalidade, forma, motivo e objeto.
1.2.1 Competência
Para Carlos Pinto Coelho Motta, competência administrativa é:
“O requisito primordial do ato administrativo, já que para a sua
prática deverá estar o agente investido em poder legal específico
para o regular desempenho de suas funções. De fato, a
Administração Pública é composta por diversos órgãos, mediante os
quais realiza suas atribuições específicas. No exercício destas
atribuições, estes órgãos expedem atos administrativos, para os
4
PIRES, Antônio Cecílio Moreira. Manual de Direito Administrativo. São Paulo: WVC editora, 2002,
p. 38.
5
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 32. ed., São Paulo: Malheiros
Editores, 2006,p. 151.
14
quais terão que,
competências.” 6
necessariamente,
estar
investidos
em
A competência está relacionada com quem pratica o ato, ou seja, o agente
público que pratica o ato deve estar dotado de respaldo legal para que praticar em
nome da administração pública determinado ato.
A competência resulta da lei e é por ela delimitada. Somente pode haver
delegação quando as normas reguladoras da administração permitam tal atitude.
Assim, não é possível que o agente, por um critério discricionário delegar a
competência, pois se trata de um elemento vinculado do ato administrativo. 7
A competência não é exercida à livre discrição do agente pois é intransferível,
ou seja, não pode o titular da competência transferi-la nem permutá-la para outro
agente. Ademais o agente só pode praticar determinado ato fora do tempo, ou fora
do espaço determinado, a princípio pela lei, caso a própria lei ou outra o autorize. A
incompetência na prática do ato administrativo gera sua nulidade, tendo em vista
que é um elemento básico, indispensável para a eficácia do ato administrativo.
1.2.2 Finalidade
A finalidade nada mais é que o objetivo que se busca com a prática do ato,
mas de forma mediata, ou seja, o fim maior buscado de maneira ampla pela
administração quando pratica determinado ato. Fim este que sempre deve visar o
interesse público e o bem comum da sociedade.
Em outras palavras, é o requisito que impõe ao ato administrativo tenha como fim o
interesse da coletividade, o interesse público. Esse requisito do ato é vinculado, pois
não se pode admitir outro objetivo para um ato administrativo, que não seja o
interesse público.
6
MOTTA, Carlos Pinto Coelho. Curso Prático de Direito Administrativo. 2. ed. Belo Horizonte: Del
Rey, 2004, p.52.
7
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 32. ed., São Paulo: Malheiros
Editores, 2006, p. 151.
15
Qualquer ato administrativo que não tenha por finalidade o interesse público
será nulo, não importando ser um ato sem interesse público ou um ato desviado de
sua utilidade pública. 8
Em cada ato administrativo há um interesse público distinto, que deve ser
usado adequadamente pelo agente, pois este não pode dispor de um ato para
alcançar um fim diferente daquele previsto em lei, mesmo que tal ato possua
interesse público.
Por exemplo, caso a Administração pretenda aumentar sua receita, não pode
ela determinar a implantação de zona azul com a finalidade de ordenar
estacionamento em locais com grande volume de veículos. Para aumentar a receita,
o agente deve buscar no sistema legal um ato que tenha esse propósito, como
lançar mão de medidas tributárias. Este tipo de erro é capaz de anular o ato e tem o
nome de desvio de finalidade ou desvio de poder.
O ato que tem a sua finalidade expressa na norma legal ou implícita no
ordenamento da Administração deve ter um fim público e, por certo, sua alteração
caracteriza-se pelo desvio de finalidade ou desvio de poder os quais dão ensejo a
invalidação do ato. Para Celso Antônio Bandeira de Mello, ocorre desvio de poder:
“quando o agente se serve de um ato para satisfazer finalidade
alheia à natureza do ato utilizado”. Ou seja, quando um agente
dispõe de uma competência e a utiliza, para alcançar uma finalidade
diferente daquela em função da qual lhe foi dada à competência. 9
Há duas formas de ocorrer o desvio de finalidade. Uma acontece quando o
agente pratica um ato administrativo com uma finalidade que não seja o interesse
público, com um objetivo/interesse particular. Um exemplo disso é quando um
agente, utilizando-se de suas prerrogativas, determina a remoção de um funcionário
8
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 32. ed., São Paulo: Malheiros
Editores, 2006, p. 151-152
9
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 22. ed. São Paulo:
Malheiros Editores, 2006, p.388.
16
por ter com ele uma relação de inimizade. A outra forma de desvio de finalidade
acontece quando o agente pratica um ato objetivando um interesse público, mas se
utiliza de uma categoria de ato diversa da que deveria usar, como por exemplo ,
quando um servidor quer punir um funcionário por seus atrasos constantes e para
isso utiliza-se da remoção.
1.2.3 Forma
Para Diógenes Gasparini forma é:
“o revestimento do ato administrativo. É o modo pelo qual o ato
aparece, revela sua existência. É necessária à validade do ato. A
inexistência de forma leva à inexistência do ato, enquanto a sua
inobservância leva à nulidade, consoantes prescreve o art. 2º da Lei
de Ação Popular.” 10
Forma é a maneira com que o ato administrativo será exteriorizado. Constitui
elemento vinculado para que o ato seja editado com perfeição. No Direito Público
exige-se procedimentos especiais e a forma legal para que o ato se expresse
validamente, ao contrário do Direito Privado que preza pela vontade dos particulares
como forma de manifestação livre. Essa exigência advêm da necessidade de
documentar os atos administrativos que são freqüentemente contrastados com a lei
e aferidos pela administração pública e pelo Poder Judiciário.
Via de regra a forma dos atos administrativos é a escrita. Além de escrito o
ato pode ser oral (ordem dada a um servidor), pictórico (placa de sinalização de
trânsito), eletromecânico (semáforo) e mímico (policial orientando o trânsito). Essas
formas que não são as escritas, portanto exceções, somente são admissíveis em
casos de urgência, de transitoriedade da vontade administrativa ou em casos de
irrelevância do assunto para a administração pública. Quando não presentes essas
características nas exceções para o ato não escrito, e o ato não escrito for, o mesmo
será inválido. Do mesmo modo, o ato intempestivo é inválido, ou seja, quando a lei
ou a Constituição exigir a prática de um ato até determinado prazo, aquele não pode
10
GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo. 13. ed. Saraiva, 2008, p. 64.
17
ultrapassar este pois incorreria em vício de forma, conforme o disposto no art. 2º, §
único, b, da Lei da Ação Popular.
Cumpre ressaltar a comparação feita por Celso Antônio Bandeira de Mello
entre forma e formalização, frisando que formalização é “a específica maneira pela
qual o ato deve ser externado”. Para este autor “ enquanto a forma significa
exteriorização, formalização significa modo específico, o modo próprio, desta
exteriorização. 11
Já Hely Lopes Meirelles distingue a forma do ato administrativo do
procedimento administrativo. Segundo ele, forma é a maneira com que o ato é
revestido e procedimento é o desencadeamento de operações necessárias para a
realização do ato final com perfeição. 12
1.2.4 Motivo
Hely Lopes Meirelles, motivo “é a situação de direito ou de fato que determina
ou autoriza a realização do ato administrativo.” 13
Logo, motivo são situações que devem ser levadas em consideração para o
agir da Administração Pública competente. O motivo pode ser previsto ou não em
lei. Quando previsto em lei o agente só poderá praticar o ato se ocorrer àquela
situação prevista. No caso da lei não especificar os motivos, o agente poderá
escolher uma situação de fato para, à vista dela, praticar o ato administrativo, no
entanto, a validade desse ato dependerá da existência efetiva do motivo, quando
explicitado.
14
O motivo deverá ser correspondente com o fato concreto levando-se
em consideração a finalidade legal daquele ato.
11
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 22. ed. São Paulo:
Malheiros editores, 2006, p. 393-394.
12
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 32. ed., São Paulo: Malheiros
Editores, 2006, p. 153.
13
Ibidem.
14
GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo. 13. ed. Saraiva, 2008, p. 66.
18
A obrigatoriedade da existência dos motivos alegados e que determinam a
prática do ato administrativo como requisito de sua validade deu origem a teoria dos
motivos determinantes, que é abordado na obra de Celso Antônio Bandeira de
Mello:
“De acordo com esta teoria, os motivos que determinaram a vontade
do agente, isto é, os fatos que serviram de suporte à sua decisão,
integram a validade do ato. Sendo assim, a invocação de motivos de
fato falsos, inexistentes ou incorretamente qualificados vicia o ato
mesmo quando, conforme já se disse, a lei não haja estabelecido,
antecipadamente, os motivos que ensejariam a prática do ato. Uma
vez enunciado pelo agente os motivos em que se calçou, ainda
quando a lei não haja expressamente imposto a obrigação de
enunciá-los, o ato só será válido se estes realmente ocorreram e o
justificavam.” 15
Dessa forma, de acordo com a teoria dos motivos determinantes, só é válido
o ato se os motivos enunciados efetivamente acontecerem. Assim, quando o agente
público praticar um ato administrativo e apresentar a motivação estará ele a ela
vinculado, pois se restar provada a desconformidade entre a motivação apresentada
pelo agente e a verdade, o ato será nulo.
1.2.5 Objeto
Objeto é aquilo que a administração pública pretende realizar com a prática
de determinado ato administrativo. Aquilo que se pretende alcançar imediatamente
com a prática de determinado ato. É a conseqüência material imediata.
Todavia, tal requisito é controverso em nossa doutrina em relação a ser ou
não um elemento autônomo. Hely Lopes Meirelles acredita que o objeto deva ser um
objeto autônomo, acreditando que o objeto identifica-se com o conteúdo e o
conceitua como sendo:
Todo ato administrativo tem por objeto a criação, modificação ou
comprovação de situações jurídicas concernentes a pessoas, coisas
ou atividades sujeitas à ação do Poder Público. Nesse sentido, o
objeto identifica-se com o conteúdo do ato, através do qual a
15
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 22. ed. São Paulo:
Malheiros editores, 2006, p. 386.
19
Administração manifesta seu poder e sua vontade, ou atesta
simplesmente situações preexistentes. 16
Já Celso Antônio Bandeira de Mello acredita que o objeto deva estar inserido
dentro do conceito de conteúdo e que considerá-lo como elemento autônomo seria
uma questão meramente didática. Apesar disso, seu conceito é muito próximo ao
dado pelo professor Hely Lopes Meirelles:
Objeto é aquilo sobre que o ato dispõe. Não pode haver ato sem
que exista algo a que ele esteja reportado. É certo que, se o
conteúdo do ato fala sobre algo, é porque este algo constitui-se em
realidade que com ele não se confunde e, de outro lado, que o
objeto não é um elemento do ato, pois não o integra. Dantes o
considerávamos absorvido no conteúdo, ao invés de erigilo em
aspecto de relevância autônoma, por entender que tal opção
sistematizadora
era
mera
questão
didática,
resolúvel
indiferentemente de um ou de outro modo. A solução era incorreta. 17
1.3 Atributos do Ato Administrativo
Os atributos dos atos administrativos são qualidades especiais que os
diferenciam dos atos jurídicos. Isto é, são características que estão presentes
apenas do ato administrativo, pois estão intimamente ligadas à idéia de
exeqüibilidade do ato administrativo. Isto ocorre pois os atos administrativos são
praticados visando o interesse público. Logo tais atos necessitam de certos atributos
que os colocam em situação privilegiada em relação aos atos praticados por
particulares, com o objetivo de alcançar sua finalidade, ou seja, o interesse primário
da administração pública, que é o interesse da coletividade.
Antônio Cecílio Moreira Pires explica o fundamento de existência dos
atributos do ato administrativo:
No nosso sentir, os atributos do ato decorrem diretamente do regime
jurídico administrativo, ou seja, são conseqüências diretas das
16
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 32. ed. São Paulo: Malheiros
editores, 2006, p. 154.
17
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 22. ed. São Paulo:
Malheiros editores,2006, p. 377.
20
prerrogativas da Administração, que a colocam em uma posição
privilegiada em relação ao particular. 18
No tocante à definição do que são os atributos administrativos, os autores não
possuem posições muito conflitantes, a divergência reside na exposição desses
atributos.
Hely Lopes Meirelles considera como atributos do ato administrativo a
presunção de legitimidade, a imperatividade e a auto-executoriedade. No entanto,
estudaremos a classificação adota por Maria Sylvia Zanella Di Pietro, que
acrescenta a tipicidade aos atributos listados por Hely Lopes Meirelles.
1.3.1 Presunção de Legitimidade
À administração só é dado fazer o que estiver previsto em lei. Portanto, a
presunção de legitimidade decorre diretamente do princípio da legalidade. Assim,
tudo que a administração é presumivelmente legítimo. Até que não seja
categoricamente anulado, o ato conserva a presunção de que foi praticado de
acordo com a lei, pois a administração só pode agir segundo os ditames legais.
O autor José dos Santos Carvalho Filho assim dispõe sobre a presunção de
legitimidade:
O fundamento precípuo, no entanto, reside na circunstancia de que
se cuida de atos emanados de agentes detentores de parcela do
Poder Público, imbuídos, como é natural, do objetivo de alcançar o
interesse público que lhes compete proteger. Desse modo,
inconcebível seria admitir que não tivessem a aura de legitimidade,
permitindo-se que a todo momento sofressem algum entrave oposto
por pessoas de interesses contrários. Por esse motivo é que se há
de supor que presumivelmente estão em conformidade com a lei. 19
Como é presunção, a administração não precisa provar a legitimidade de
seus atos. Aquele que impugna o ato é quem deve provar a ilegitimidade. É o
18
PIRES, Antônio Cecílio Moreira. Manual de Direito Administrativo. São Paulo: WVC editora,
2002, p. 47.
19
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Lúmen
Juris. 10. ed. 2002, p.101.
21
administrado quem deve provar a ilegitimidade do ato administrativo, ele é que ira
alegar a ilegitimidade do ato. Enquanto não sobrevier o pronunciamento de que o
ato seja inválido, este deve ser considerado como válido e operante, tanto para a
administração, quanto para os administrados que estão sujeitos aos seus efeitos.
Porém, admite-se recurso administrativo ou judicial que conceda suspensão liminar,
deixando, assim, o ato suspeito sem efeitos até o pronunciamento final, quanto à
validade ou não do ato administrativo.
A vontade deve ser acolhida pelo particular imediatamente. Ainda que o
particular entenda ilegal o ato, até a anulação do mesmo, o administrado deve
atender ao ato.
Um aspecto importante a se destacar é a necessidade de existir a presunção
de legitimidade nos atos administrativos. O professor Antônio Cecílio Moreira Pires
diz o seguinte:
Sem o atributo da presunção de legitimidade todos os atos da
administração seriam diretamente questionáveis, tornando
impossível a consecução do interesse coletivo, obstaculizando a
supremacia do interesse público em face do interesse individual. 20
1.3.2 Imperatividade
É o atributo por meio do qual a administração impõe sua vontade
unilateralmente ao particular. Por esse atributo a administração pode gerar
obrigações a toda sociedade independente da aquiescência desta. Ele exprime a
força obrigatória ou coercitiva que tem o ato administrativo ante os seus
destinatários.
Tal atributo decorre da prerrogativa que tem o Poder Público de impor
unilateralmente obrigações a terceiros. Sendo assim, a imperatividade não existe em
todos os atos administrativos, como nos atos ampliativos da esfera jurídica do
administrado (autorização por exemplo) e nos atos enunciativos (certidões), mas
apenas nos atos que impõem obrigações.
20
PIRES, Antônio Cecílio Moreira. Manual de Direito Administrativo. São Paulo: WVC editora,
2002, p. 47.
22
Alguns autores acrescentam entre os atributos a exigibilidade. Para Celso
Antônio Bandeira de Mello a exigibilidade ultrapassa o conceito de imperatividade,
por achar que sem o primeiro, o segundo fica sem efeito. Vejamos o que diz sobre a
exigibilidade:
É a qualidade em virtude da qual o Estado no exercício da função
administrativa, pode exigir de terceiros o cumprimento, a
observância, das obrigações que impôs. Não se confunde com a
simples imperatividade, pois, através dela, apenas se constitui uma
dada situação, se impõe uma obrigação. A exigibilidade é o atributo
do ato pelo qual se impele à obediência, ao atendimento da
obrigação já imposta, sem necessidade de recorrer ao Poder
Judiciário o administrado a observá-la. 21
A imperatividade não depende de uma declaração de validade, a partir de sua
existência o ato já passa a ser imperativo, até mesmo pela presunção de
legitimidade, o ato só deixa ser imperativo quando deixar de existir. 22
1.3.3 Auto-executoriedade
É o atributo por meio do qual a administração pode (em regra é discricionário)
executar o ato por meios próprios, com uso da força se necessário, sem a
autorização do judiciário e sem a aquiescência do administrado. Exemplos disso são
as demolições de edificações, apreensões de mercadorias, destruição de bens e
interdição de atividades.
Por ser uma medida extrema, deve ser vista com reservas. Não são todos os
atos administrativos que podem ser objeto de auto-executoriedade. Os princípios da
ampla defesa e do devido processo legal limitam esse atributo. Portanto, a autoexecutoriedade somente pode acontecer quando a lei expressamente a autorizar ou
em situações de emergência para a preservação de direito maior.
21
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 22. ed. São Paulo:
Malheiros editores, 2006. p. 401.
22
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 32. ed., São Paulo: Malheiros
Editores, 2006, p. 160-1161.
23
Segundo
Hely
Lopes
Meirelles
a
“auto-executoriedade
consiste
na
possibilidade que certos atos administrativos ensejam de imediata e direta execução
pela própria administração, independentemente de ordem judicial.” 23
Como não é um atributo inerente a todos os atos, para que haja autoexecutoriedade, deve haver previsão legal a respeito, ou quando a natureza da
situação exige que o agente faça uso de tal atributo sob pena de haver prejuízos
materiais, ou risco quanto à segurança de pessoas. 24
Seabra Fagundes trata do cuidado necessário para se fazer uso desse
atributo:
Tal processo executório tem cabimento quando as circunstâncias
indicam a necessidade premente da obtenção do fato ou coisa. Atua
pela utilização, por parte do administrador, dos chamados meios
diretos de coerção administrativa, de modo a tornar possível obter,
por coação absoluta, a própria prestação exigida do administrado,
ou, na sua impossibilidade, outra equivalente. 25
Esse atributo pode ser visto como uma forma de deixar o administrado
vulnerável a possíveis abusos por parte da administração. A respeito disso Celso
Antônio Bandeira de Mello diz o seguinte:
A executoriedade não deixa o administrado ao desabrigo de
proteção jurídica, pois pode-se sempre recorrer ao Poder Judiciário
tanto para impedir preventivamente sua utilização quanto para
sustar a medida executória aplicada, sempre que o uso desta
providência administrativa fira direitos dos ameaçados ou atingidos.
As medidas judiciais especialmente eficazes para a defesa do
administrado em hipóteses destas são o mandado de segurança
preventivo ou repressivo (art. 5, LXIX, da Constituição e Lei 1.533,
de 31.12.51, que regulou este instituto) e o habeas corpus (art. 5,
LXVIII, da Constituição), que também pode ser impetrado preventiva
ou repressivamente. Finalmente, o dano que houver resultado para
o particular em decorrência da ilegítima ou abusiva utilização da
23
Idem. p. 161.
24
PIRES, Antônio Cecílio Moreira. Manual de Direito Administrativo. São Paulo: WVC editora,
2002, p. 48.
25
SEABRA Fagundes, O Controle dos Atos Administrativos pelo Poder Judiciário. 3. ed. Rio de
Janeiro: Editora Forense, 1957, p. 246.
24
auto-executoriedade acarreta responsabilidade do Estado, isto é,
constitui o Poder Público na obrigação de indenizar o lesado (art. 37,
§ 6º). 26
Outro aspecto importante a ser observado é a distinção feita por Celso
Antônio Bandeira de Mello entre exigibilidade e executoriedade (termo utilizado pelo
autor). Segundo ele, a exigibilidade seria caracterizada pela obrigação do
administrado de cumprir o ato. Já a executoriedade seria a possibilidade de a
Administração praticar o ato (coerção material). Para este administrativista, a
diferença entre a imperatividade e a exigibilidade seria que a primeira apenas estaria
relacionada à possibilidade de a Administração, unilateralmente, criar a obrigação
para o particular e a segunda traduziria a noção de que o particular é obrigado a
cumprir a obrigação. Vejamos:
Sintetizando: graças à exigibilidade, a Administração pode valer-se
de meios que induzirão o administrado a atender ao comando
imperativo. Graças a executoriedade, quando esta exista, a
Administração pode ir além, isto é, pode satisfazer diretamente sua
pretensão jurídica compelindo materialmente o administrado, por
meios próprios e sem necessidade de ordem judicial para proceder
a esta compulsão. Quer dizer: pela exigibilidade pode-se induzir à
obediência, pela executoriedade pede-se compelir, constranger
fisicamente. 27
1.3.3 Tipicidade
Para a Prof ª Maria Sylvia Zanella Di Pietro a tipicidade “é o atributo pelo qual
o ato administrativo deve corresponder a figuras definidas previamente pela lei como
aptas a produzir determinados resultados” 28
Assim, tipicidade é o atributo por meio do qual o ato deve corresponder a uma
figura típica previamente estabelecida em lei. A administração não pode criar uma
26
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 22. ed. São Paulo:
Malheiros editores, 2006, p. 404.
27
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 22. ed. São Paulo:
Malheiros editores, 2006, p. 402.
28
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 20. ed. São Paulo. Editora Atlas, 2007,
p. 186.
25
nova modalidade de ato administrativo, ou seja, não pode criar um modelo de ato
administrativo diferente daqueles estabelecidos na lei administrativa.
Maria Sylvia correlaciona tal instituto com a tipicidade penal onde a autoridade
policial não pode criar um novo tipo penal.
Na verdade, a tipicidade se confunde com a própria idéia de legalidade, como
se fosse condição de validade do ato. Pois todos os atos administrativos legais, em
regra, serão típicos.
26
2 REVOGAÇÃO X ANULAÇÃO DO ATO ADMINISTRATIVO
Dentre as várias formas de extinção do ato administrativo traremos a baila os
institutos da revogação e da anulação por estarem ligadas ao tema deste trabalho.
Por esse motivo, merecem um estudo mais detalhado, abordando ponto a ponto as
duas espécies para fim de melhor compreensão.
2.1 Revogação
2.1.1 Conceito
A revogação nada mais é que a retirada, do mundo jurídico, de um ato
administrativo válido, mas que, segundo critério discricionário, tornou-se inoportuno
e inconveniente. Para o Prof. Diógenes Gasparini a revogação “é o ato
administrativo que retira, parcial ou totalmente, um ato administrativo válido e eficaz
do ordenamento jurídico, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados
os efeitos por ele já produzidos.” 29
Seguindo a mesma linha do conceito mencionado, o professor Carlos Pinto
Coelho Motta diz que a revogação:
“consiste na retirada definitiva de um ato administrativo do
ordenamento jurídico pela Administração Pública, mediante sua
substituição por outro, por não mais lhe ser conveniente e oportuno
à manutenção dos efeitos produzidos por este ato. É, pois, a retirada
de um ato administrativo perfeito, válido e eficaz que em um dado
momento tornou-se inconveniente e inoportuno.” 30
2.1.2 Sujeito Ativo
Somente a Administração Pública pode revogar o ato administrativo, o que
quer dizer que o sujeito ativo da revogação será uma autoridade no exercício de
funções e competências administrativas. Normalmente o agente que pratica a
revogação é o mesmo que praticou o ato a ser revogado, ou uma autoridade
29
GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. São Paulo: Saraiva. 13. 2008, p. 105.
30
MOTTA, Carlos Pinto Coelho. Curso Prático de Direito Administrativo. Coordenação de Carlos
Pinto Coelho Motta. Belo Horizonte: Del Rey. 2. ed. rev. atual. ampl. 2004, p.84-85.
27
superior do poder hierárquico. Eventualmente, a lei pode conferir competência para
revogação, fora da linha hierárquica, sendo assim uma exceção à regra geral de que
não cabe a nenhum poder estatal revogar atos dos outros.
Embora só o agente da Administração Pública, no exercício de uma
competência discricionária, possa fazer uma revogação, isso não quer dizer que o
Legislativo e o Judiciário não possam praticar a revogação, mas estão eles limitados
a revogar apenas os atos que praticaram administrativamente, exercendo função
atípica às suas funções. Assim, não pode o Judiciário revogar o ato administrativo
no desempenho de sua função de julgar nem o legislador pode revogá-lo em sua
função típica de legislar. 31
2.1.3 Objeto da Revogação
O objeto da revogação é um fator que a diferencia da anulação. Revoga-se o
ato administrativo válido e legal, podendo a revogação atingir o próprio ato ou os
efeitos jurídicos que dele decorreriam. Portanto, a revogação extingue o ato por
razões de conveniência e oportunidade e não de desconformidade com a lei.
A revogação incide tanto sobre atos eficazes quanto sobre os atos ineficazes.
No caso dos eficazes, o objetivo é acabar com as relações ainda não consumadas
pelo ato. Já quando se revoga um ato ineficaz, o que se quer é impedir que surjam
os efeitos que ocorrerão após o ato se tornar eficaz. 32
2.1.4 Fundamentos da Revogação
A revogação tem por fundamento o exercício de uma competência
discricionária, ou seja, uma liberdade em desfazer o ato, uma conveniência
administrativa.
31
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 22. ed. São Paulo:
Malheiros editores, 2006, p. 429.
32
Idem, p. 430.
28
O fundamento para revogação é a competência que permite ao agente
(Administração Pública) dispor sobre a oportunidade e conveniência sobre a mesma
situação que já foi objeto de anterior provimento. Sobre este assunto, vejamos o que
diz o autor Celso Antônio Bandeira de Mello:
Como qualquer competência, para que se possa ser exercida,
cumpre que seja uma competência atual sobre a matéria a ser
objeto de decisão. Isto é, requer que a autoridade desfrute dela, em
relação ao que vai ser revogado, no momento em que pretende
editar o ato de força revogatória. Não basta, pois, que haja tido
competência para expedir o ato que se quer revogar. É preciso que
ainda a mantenha, pois não é o reverso do poder de iniciativa sobre
certa questão. 33
Assim, cumpre ressaltar que este ato deve partir de uma competência
discricionária, ou seja, o agente usará critérios de conveniência e oportunidade da
administração pública para decidir sobre a revogação do ato.
2.1.5 Motivos da Revogação
Segundo o entendimento do Prof. Diógenes Gasparini o motivo da revogação
é a inconveniência ou inoportunidade do ato. Para o doutrinador, “verificada, a
qualquer tempo, a inconveniência ou a inoportunidade do ato administrativo, nasce
para a administração à competência e o dever de revogar. Esse motivo precisa ser
descrito no texto do ato administrativo revogador”.
Saliente-se que não é considerado motivo para a revogação os casos em que
o ato é retirado do ordenamento jurídico quando o agente percebeu que a situação
de fato que permitiu a prática do ato, na verdade não o permitia, havendo na
verdade um erro na percepção do agente que praticou o ato erroneamente. Neste
caso não há que se falar em revogação, mas sim em invalidação. 34
2.1.6 Efeitos da Revogação
33
Idem, p. 431-432.
34
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 22. ed. São Paulo:
Malheiros editores, 2006, p. 433.
29
Como a revogação só incide sobre atos ou efeitos jurídicos válidos, ela opera
efeitos tão-somente ex nunc, isto é, para o futuro, não retroagindo, sendo efeitos
pretéritos do ato administrativo são preservados.
Lembrando que a revogação pode atingir atos eficazes e ineficazes, atente-se
que no caso dos ineficazes a revogação irá impedir que estes venham a gerar
efeitos e no caso dos já eficazes a revogação irá atingir os efeitos já gerados pelo
ato de modo a dar fim à sua continuidade, impedindo seu ciclo de conseqüências
jurídicas, bem como impedir que gere novos efeitos. 35
Quando se estuda a revogação, umas das grandes indagações que surgem é
quando se questiona a possibilidade da revogação da revogação. O Diógenes
Gasparini afirma em sua obra que:
O ato de revogação é um ato administrativo consumado, e como tal
não existe mais. Desfez-se ao alcançar seu objetivo, revogando o
ato administrativo que era seu objeto. Ademais, se o objetivo é a
restauração do ato revogado, esta é inalcançável em nosso
ordenamento jurídico, ante a expressa vedação contida no §3º do
art. 2º da Lei de Introdução ao Código Civil. 36
2.1.7 Natureza do ato revogador
O ato revogador desfaz um ato administrativo anterior, sendo portanto um ato
administrativo de natureza constitutiva pois cria uma situação nova e não apenas
reconhece ou declara uma situação já existente. Ao falar da natureza do ato
revogador, o Prof. Celso Antônio Bandeira de Mello faz um paralelo com o ato
revogado:
A revogação exprime um poder positivo, idêntico ao do ato revogado
(ou que criou a relação revogada). Com efeito, com a revogação, o
que se está fazendo, tal como no ato anterior, é decidir sobre a
maneira de criar um interesse público. Trata-se de um novo
provimento pelo qual se modifica a disposição precedente. O segundo
difere do primeiro apenas em que dá solução diferente à mesma
35
Idem, p. 434.
36
GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. São Paulo: Saraiva. 13. 2008, p. 111.
30
questão, mas se pacifica com ele em que ambos são decisões
expedidas para criar um interesse público. 37
2.1.8 Revogação e Indenização
Via de regra as revogações não geram direito a indenização. O poder de
revoga, quando existe, é legítimo, ou seja, quando a revogação for legítima não há
direito à indenização. Entretanto, se a revogação não for legítima, ela será ato ilícito
e, por isso, gerará direito à indenização, uma vez que atingiu certos direito e causou
prejuízo.
O fato dos atos administrativos visarem interesses públicos, não lhes dá o
direito de passar por cima dos direitos dos administrados pois, se assim ocorrer,
caberá ao administrado recorrer ao judiciário para rever seus danos. Para que isso
não ocorra foi criado pela lei o instituto da expropriação.
Para esse choque de interesses público e particular a lei trouxe a
expropriação que nada mais é que o dever de indenizar quem foi lesado pela
administração pública quando a prática de um ato. A própria Carta Magna prevê
uma hipótese de indenização prévia, justa e em dinheiro para aquele que teve sua
propriedade desapropriada afim de atender um interesse público. Desta forma a lei
pode fazer valer o interesse público e, ao mesmo tempo, amenizar a lesão sofrida
pelo particular através da reconstituição pecuniária. 38
Sobre a indenização no caso de revogação do ato administrativo, ensina
Celso Antônio Bandeira de Mello:
Assim depois de concedida regularmente uma licença para edificar e
iniciada a construção, a Administração não pode “revogar” ou
“cassar” esta licença sob alegação de que mudou o interesse
público ou de que alterou-se a legislação a respeito. Se o fizer, o
Judiciário, em havendo pedido do interessado, deve anular o ato
abusivo, pois cumpre à Administração expropriar o direito de
construir naqueles termos. Não é o mesmo ter que buscar em juízo
uma indenização por danos e ser buscado no Judiciário, com
37
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 22. ed. São Paulo:
Malheiros editores, 2006, p. 435.
38
Ibidem. p. 437-438
31
indenização prévia. São caminhos diferentes. Desassiste ao Poder
Público, através de comportamento abusivo, lançar o administrado
em via menos conveniente para ele. 39
2.2 Anulação
2.2.1 Conceito
Para alguns doutrinadores tratada como invalidação, a anulação é a forma de
retirada do ato administrativo do ordenamento jurídico por razões de ilegalidade.
Assim, a anulação deve ocorrer quando há vício no ato, relativo à ilegalidade ou
legitimidade (ofensa à lei ou ao Direito) sendo, portanto, sempre um controle de
legalidade, nunca um controle de mérito. Antônio Cecílio Moreira Pires conceitua a
anulação da seguinte maneira:
Consubstancia-se no desfazimento do ato administrativo por
questões de ilegalidade, podendo ser proferida de ofício pela
Administração ou de forma provocada pelo interessado. O Judiciário
também, em apreciando matéria levada a seu conhecimento, quer
através de ações ordinárias ou especiais, poderá proferir a anulação
do ato administrativo editado pela Administração. 40
2.2.2 Sujeitos Ativos da Anulação
A anulação do ato administrativo, diferentemente da revogação, pode ser
declarada tanto pela Administração Pública (autotutela) como pelo Poder Judiciário.
A administração pode anular um ato de ofício ou ao ser provocada por um
interessado, quando perceber que o mesmo é ilegal ou ilegítimo. Para o Poder
Judiciário agir ele necessita de provocação para poder anular um ato administrativo,
em observância ao princípio da inércia do judiciário. Ao juiz é vedado anular atos de
ofício.
2.2.3 Objeto da Anulação
39
Ibidem. p. 438
40
PIRES, Antônio Cecílio Moreira. Manual de Direito Administrativo. São Paulo: WVC editora, 2002,
p. 67.
32
Para o Prof Diógenes Gasparini, a anulação, por ele tratada como
invalidação, “incide sobre um ato administrativo inválido, isto é, produzido sem a
devida atenção ao ordenamento jurídico”. 41 Segundo o autor, geralmente, o objeto
do ato de invalidação é um ato administrativo ilegal e eficaz, de natureza abstrata e
concreta.
Se o ato for ineficaz, não há que se falar em efeitos ao se tratar de anulação,
pois, ela visará impedir que o ato gere efeitos e se torne um ato eficaz. O mesmo
ocorre com os atos abstratos e concretos, já que a fonte geradora de efeitos é o alvo
de destruição da anulação. Em suma, o objeto da anulação de atos ineficazes é o
próprio ato.
Diferentemente ocorre com o ato eficaz tendo em vista que este já gerou
efeitos. No caso do ato eficaz abstrato, a invalidação desfaz o ato visando que ele
pare de gerar efeitos jurídicos, ou seja, o que se visa atacar com a anulação não é
apenas o ato, mas também todas as relações jurídicas que foram geradas por ele.
Quando o ato é eficaz e concreto, a anulação extingue os efeitos produzidos
por já ter cumprido seu objetivo pois o ato já não existe mais.
2.2.4 Fundamento da Anulação
Sobre este tópico, assim leciona o professor Celso Antônio Bandeira de Mello:
“Para a administração o que fundamenta o ato invalidador é o dever
de obediência à legalidade, o que implica obrigação de restaurá-la
quando violada. Para o Judiciário é o exercício mesmo de sua
função de determinar o Direito aplicável no caso concreto”. 42
Aproveitando o conceito dado, chegamos à conclusão de que são dois os
parâmetros existentes utilizados para a anulação de atos administrativos. O primeiro
é utilizado pela administração pública que tem o dever de respeitar a lei. Já o
41
GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. São Paulo: Saraiva. 13. 2008, p. 113.
42
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 22. ed. São Paulo:
Malheiros editores, 2006. p. 443.
33
segundo parâmetro é utilizado pelo Judiciário, que é o de cumprir com sua função
precípua, determinar a forma de aplicação da lei ao caso concreto.
2.2.5 Motivo da Anulação
O motivo da anulação é a invalidade ou imprestabilidade jurídica do ato
administrativo, ou das relações por ele criadas com a lei. O Prof Diógenes Gasparini
acredita que o motivo “precisa ser devidamente demonstrado pela Administração
Pública, sob pena de ilegalidade da declaração invalidadora” 43 , se baseando na
jurisprudência de nossos Tribunais e trazendo como exemplo o RE 113.998-6-PR
(DJU, 30 jun. 1989).
2.2.6 Efeitos da Anulação
A anulação consiste na supressão do ato inválido e dos seus efeitos
invalidamente produzidos. Portanto, os efeitos da anulação são ex tunc, retroagindo
para apagar todos os efeitos pretéritos.
Essa retroatividade atinge o ato no momento de sua edição, acabando com
todos os seus efeitos até a data da efetiva anulação. Sobre o tema o Supremo
Tribunal Federal já se pronunciou dizendo que os atos nulos não originam direitos. É
o teor da Súmula 473 do STF:
A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de
vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos;
ou Revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade,
respeitados os Direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos,
a apreciação Judicial. 44
2.2.7 Anulação e dever de indenizar
Como bem explica o professor Diógenes Gasparini, se a anulação ocorre
antes que o administrado incorra em gastos gerados pelo ato viciado, não há que se
falar em indenização. Todavia, pode correr do administrado contrair gastos pó conta
do ato viciado e, nessa hipótese, o mesmo terá direito à indenização pelo dispêndio
43
GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. São Paulo: Saraiva. 13. 2008, p. 114.
44
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, Súmula. nº. 473, DJ de 10/12/1969.
34
que teve, inclusive por danos morais. Com relação à indenização no caso de
anulação do ato administrativo, Gasparini ensina:
A invalidação ou anulação não outorga ao então beneficiário do ato
extinto direito à indenização, desde que ela ocorra antes de
qualquer investimento ou realização de despesas. Esse
investimento ou a realização de despesas pode ser anterior e para
adquirir o direito ao prescrito pelo ato inválido ou posterior em razão
dos efeitos do próprio ato inválido. 45
Um acórdão do Supremo Tribunal Federal confirma essa possibilidade de
ressarcimento nos casos de anulação de atos administrativos:
EMENTA: Ato administrativo: ilegalidade: anulação e ressarcimento
de danos morais. Súmula 473. CF, art. 37, § 6º. A Administração
Pública pode anular seus próprios atos, quando inquinados de
ilegalidade (Súmula 473); mas, se a atividade do agente público
acarretou danos patrimoniais ou morais a outrem - salvo culpa
exclusiva dele, eles deverão ser ressarcidos, de acordo com o
disposto no art. 37, § 6º, da Constituição Federal. Relator: Min.
Sepúlveda Pertence. Data de Julgamento: 18.04.06. DJ de 12.05.06,
p. 11. 46
45
GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. São Paulo: Saraiva. 13. 2008, p. 116.
46
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. 1ª Turma. RE 460.881, Relator: Sepúlveda Pertence. Brasília,
DF, 18 abr. 06. DJ de 12.05.06, p. 40.
35
3 CONTROLE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
Diferentes
modalidades,
hipóteses,
instrumentos,
órgãos
de
controle
encontram-se previstos em diversos atos normativos, o que torna o estudo dessa
matéria difícil por não existir um diploma único que a discipline e nem a Constituição
a trate concentradamente em um específico título ou capítulo.
A idéia central é a de que o controle (ou revisão para alguns autores) da
Administração Pública nada mais é do que uma forma de assegurar proteção ao
direito dos administrados e do próprio Estado, reafirmando os fundamentos do
Estado Democrático de Direito, na medida em que é o povo o titular do patrimônio
público, e não a Administração, devendo ela estar sujeita, em toda a sua atuação,
sem qualquer exceção, ao princípio da indisponibilidade do interesse público, além
do dever de observar os princípios que informam o ordenamento jurídico, tais como:
o da legalidade, o da moralidade e o da eficiência, dentre outros.
Essa é uma das lições tiradas da obra de José Cretella Júnior, quando cita
Goodnow:
a revisão “é exercida, não há dúvida, no sentido de proteção dos
direitos dos administrados e de molde a assegurar o bem-estar
social. Nem por isso, entretanto, deixa de atender à eficácia do
poder governamental, que se consolida, quando há uniformidade de
ação e harmonia nos diferentes setores administrativos”. 47
3.1 Definição de controle
É a possibilidade de vigiar, orientar e corrigir atos administrativos que um
Poder, órgão ou autoridade exerce sobre a conduta funcional de outro.
Diógenes Gasparini define o controle da Administração Pública como “a
atribuição de vigilância, orientação e correção de certo órgão ou agente público
47
CRETELLA JÚNIOR, José. Controle jurisdicional do ato administrativo. Rio de Janeiro:
Forense, 1984. p.321.
36
sobre a atuação de outro ou de sua própria atuação, visando confirmá-la ou desfazêla, conforme seja ou não legal, conveniente, oportuna e eficiente”. 48
A propósito, cumpre ressalta que a Administração pública se sujeita a controle
por parte dos Poderes Judiciário e Legislativo, além de exercer, ela mesma, o
controle sobre os próprios atos. Conforme bem salienta Di Pietro, “esse controle
abrange não só os órgãos do Poder Executivo, mas também os dos demais
Poderes, quando exerçam função tipicamente administrativa”. 49
3.2 Modalidades de controle
3.2.1. Quanto ao órgão que o exerce:
3.2.1.1. Controle administrativo ou executivo
Controle administrativo é o exercido pelo Poder Executivo e pelos órgãos
administrativos do Legislativo e do Judiciário sobre suas próprias condutas, tendo
em vista aspectos de legalidade ou de conveniência (mérito). Duplo aspecto: a
legalidade do ato (controle de legalidade) ou a conveniência e oportunidade do ato
(controle de mérito).
Neste aspecto Hely Lopes define que:
“Controle administrativo é todo aquele que o Executivo e os órgãos
de administração dos demais Poderes exercem sobre suas próprias
atividades, visando a mantê-las dentro da lei, segundo as
necessidades do serviço e as exigências técnicas e econômicas de
sua realização, pelo quê é um controle de legalidade e de mérito.
Sob ambos esses aspectos pode e deve operar-se o controle
administrativo para que a atividade pública em geral se realize com
legitimidade e eficiência, atingindo a finalidade plena, que é a
satisfação das necessidades coletivas e atendimento dos direitos
individuais dos administrados.”.50
Portanto, o controle administrativo é um controle de legalidade e de mérito e
sempre interno (conforme veremos a frente), porque é realizado por órgãos
48
GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. São Paulo: Saraiva. 13. 2008, p. 947.
49
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 20. ed. São Paulo: Atlas, 2007, p. 671.
37
integrantes do mesmo Poder que praticou o ato. É deste controle que a
Administração pode rever seus atos podendo decidir pela anulação, revogação ou
alteração destes. Por isso importante à distinção feita entre revogação e anulação.
Para Diógenes Gasparini, “o fundamento do controle administrativo reside no
dever-poder de autotutela que a administração Pública tem sobre suas atividades,
atos e agentes” 50 . Normalmente, esse poder de autotutela é exercitado por órgãos
superiores em relação aos inferiores ou por órgãos especializados.
O controle administrativo pode ser exercido de ofício, ou seja, pela própria
Administração, ou mediante provocação dos interessados. Abrangendo, de um
modo geral, a fiscalização hierárquica e recursos administrativos. Hely Lopes
Meirelles conceitua a fiscalização hierárquica como sendo aquela que “é exercida
pelos órgãos superiores sobre os inferiores da mesma Administração, visando
ordenar, coordenar, orientar e corrigir suas atividade e agentes” 51 , e os recursos
administrativos como sendo “todos os meios hábeis a propiciar o reexame de
decisão interna pela própria Administração, por razões de legalidade e de mérito
administrativo” 52
3.2.1.2. Controle legislativo ou parlamentar
O controle legislativo ou parlamentar é o exercido pelos órgãos legislativos ou
por comissões parlamentares sobre determinados atos do Poder Executivo. Por
força do princípio da independência e harmonia dos Poderes (art. 2º da CF/1988), o
controle legislativo somente se verifica nas situações e nos limites expressamente
previstos no próprio texto constitucional.
50
GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. São Paulo: Saraiva. 13. 2008, p. 948.
51
MEIRELLES, HELY LOPES. Direito Administrativo Brasileiro. 32. ed. Malheiros Editores, 2006,
p. 670.
52
MEIRELLES, HELY LOPES. Direito Administrativo Brasileiro. 32. ed. Malheiros Editores, 2006,
p. 671.
38
De um modo geral, este controle é desempenhado através da instauração de
Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs); dos pedidos de informação
requisitados; da convocação de autoridades para esclarecimentos; da fiscalização
financeira, contábil,operacional e orçamentária com o auxílio do Tribunal de Contas.
Conforme se depreende do que já foi dito, o controle parlamentar é um
controle externo, também se configurando como político, razão pela qual podem ser
controlados aspectos relativos à legalidade e à conveniência pública dos atos do
Poder Executivo que estejam sendo controlados.
Neste sentido aduz Seabra Fagundes:
“O controle legislativo ou parlamentar compete ao Poder Legislativo.
É essencialmente político, destinando-se à fiscalização das
atividades administrativas do ponto de vista geral da sua legalidade
e conveniência ao interesse coletivo. [...] No nosso regime político,
este tipo de controle tem um alcance muito restrito. É através da
elaboração orçamentária que se exerce mais de perto sobre a
Pública Administração. Dando-lhe os meios financeiros, restringindoos, ampliando-os, aquiescendo nas sugestões da proposta
governamental, ou rejeitando-as, o Parlamento pode influir, embora
dum ponto de vista geral, sobre o exercício da função
administrativa”. 53
Enfim, o Poder Legislativo possui, além da sua função precípua de legislar, a
função de controlar a atividade administrativa exercida pelos poderes Executivo e
Judiciário.
3.2.1.3. Controle judiciário ou judicial
Acerca da matéria, utilizaremos as palavras do Prof. Hely Lopes Meirelles:
Controle judiciário ou judicial é o exercido privativamente pelos
órgãos do Poder Judiciário sobre os atos administrativos do
Executivo, do Legislativo e do próprio Judiciário quando realiza
atividade administrativa. É um controle a posteriori, unicamente de
legalidade, por restrito à verificação da conformidade do ato com a
norma legal que o rege. Mas é sobretudo um meio de preservação
de direitos individuais, porque visa a impor a observância da lei em
cada caso concreto, quando reclamada por seus beneficiários.
53
FAGUNDES, Miguel Seabra. O Controle dos atos administrativos pelo Poder Judiciário. 3ª ed.
Rio de Janeiro: Forense, 1957. p. 123.
39
Esses direito podem ser públicos ou privados – não importa -, mas
sempre subjetivos e próprios de quem pede a correção judicial do
ato administrativo, salvo na ação popular e na ação civil pública, em
que o autor defende o patrimônio da comunidade lesado pela
Administração. 54
É, portanto, o controle externo realizado pelo Poder Judiciário, podendo ser
preventivo ou corretivo, através de ações constitucionais como habeas corpus,
habeas data, mandado de segurança, mandado de injunção, ação popular e ação
civil pública.
Por visar controlar os atos ilegais, imorais e ineficazes, mediante o exercício
do controle judicial dos atos administrativos somente se pode decretar a anulação, e
nunca a revogação, já que esta decorre do controle de mérito.
Essa modalidade de controle foi consagrado pela Constituição Federal como
uma das formas de efetivar o Estado Democrático de Direito. É neste sentido a
razão de ser do princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional, visto que o
Brasil adota o sistema de jurisdição una ao invés do sistema de jurisdição dupla.
Importante ressaltar que a anulação do ato, mediante controle judicial, uma
vez ofendida a lei ou princípios administrativos, operará efeitos retroativos, ex tunc,
isto é, efeitos que retroagem à origem do ato, desfazendo as relações dele
resultantes. O ato nulo não gera direitos ou obrigações para as partes, não cria
situações jurídicas definitivas e não admite convalidação.
3.2.2. Quanto ao momento em que se efetuar:
3.2.2.1. Controle prévio ou preventivo (a priori)
É um controle exercido antes do início da prática, ou antes, da conclusão do
ato administrativo, constituindo-se requisito para a validade ou produção de efeitos
54
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 32. ed. Malheiros Editores, 2006, p.
705-706.
40
do ato controlado. Ele procura impedir que administração pública produza um ato
eivado de ilegalidade, contrário ao interesse público 55 .
Exemplos de controle preventivo são a autorização do Senado Federal para
que a União, os Estados-membro ou os Municípios possam contrair empréstimo
externo e a liquidação da despesa para oportuno pagamento.
3.2.2.2. Controle concomitante ou sucessivo:
Diz-se concomitante o controle quando exercido durante a realização do ato e
que permite a verificação da regularidade de sua formação.
Hely Lopes Meirelles traz como exemplos deste controle à realização de
auditoria durante a execução do orçamento, o seguimento de um concurso pela
corregedoria competente e a fiscalização de um contrato em andamento.
56
3.2.2.3. Controle subseqüente ou corretivo (a posteriori)
Talvez o mais comum das modalidades, é aquele realizado depois que os
atos já foram praticados. Para a Profª. Di Pietro, o controle subseqüente “tem por
objetivo rever os atos já praticados, para corrigi-los, desfazê-los ou apenas confirmálos” 57
Hely Lopes Meireles traz como exemplos deste controle à homologação do
julgamento de uma concorrência e o visto das autoridades superiores em geral.
Destaca-se a observação feita por este autor no sentido de que o controle judicial
dos atos administrativos “é, normalmente, subseqüente ou corretivo, salvo em
55
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 20. ed. São Paulo: Atlas, 2007, p. 672.
56
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 32. ed. Malheiros Editores, 2006, p.
666.
57
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 20. ed. São Paulo: Atlas, 2007, p. 673
41
mandado de segurança preventivo, em ação civil pública e em ação popular, que,
em alguns casos, antecede a conclusão do ato impugnado. 58
3.2.3. Conforme o seu fundamento
3.2.3.1. Controle hierárquico:
É aquele que resulta automaticamente do escalonamento vertical dos órgãos
do Executivo, em que os inferiores estão subordinados aos superiores. Daí decorre
que, os órgãos superiores possuem sobre os inferiores, o controle total dos seus
atos, independentemente de norma que estabeleça este controle. Por este controle
podem os órgãos de cúpula supervisionar, coordenar, orientar, fiscalizar, aprovar,
revisar e avocar as atividades controladas, além de impor os meios corretivos aos
agentes responsáveis. 59
3.2.3.2. Controle finalístico:
Este controle é exercido pela Administração Direta sobre as pessoas jurídicas
integrantes da Administração Indireta. O controle finalístico, fundamentado numa
relação de vinculação entre pessoas e não em subordinação entre órgãos ou
agentes, restringe-se à verificação do enquadramento da entidade controlada no
programa geral do governo e à avaliação objetiva do antigimento, pela entidade, de
suas finalidades estatutárias. Nesse sentido se expressa Hely Lopes:
“É o que a norma legal estabelece para as entidades autônomas,
indicando a autoridade controladora, as faculdades a serem
exercitadas e as finalidades objetivadas. Por isso mesmo, é sempre
um controle limitado e externo. Não tem fundamento hierárquico,
porque não há subordinação entre a entidade controlada e a
autoridade ou o órgão controlador. É um controle teleológico, de
verificação do enquadramento da instituição no programa geral do
Governo e de seu acompanhamento dos atos de seus dirigentes no
58
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 32. ed. Malheiros Editores, 2006, p.
666.
59
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 32. ed. Malheiros Editores, 2006, p.
664.
42
desempenho de suas funções estatutárias, para o atingimento das
finalidades da entidade controlada”. 60
3.2.4. Conforme a origem:
3.2.4.1. Controle interno:
O controle interno é aquele exercido dentro de um mesmo Poder,
automaticamente ou por meio de órgãos integrantes de sua própria estrutura.
Significa dizer que é o controle efetivado pelo Executivo, Legislativo ou do Judiciário,
cada qual, no âmbito de suas atribuições, sobre seus serviços ou agentes.
O controle que o Ministério da Previdência e Assistência Social exerce sobre
terminados atos administrativos praticados pela autarquia do Instituto Nacional do
Seguro Social (INSS) é um exemplo de controle interno.
3.2.4.2. Controle externo:
É aquele realizado por um Poder sobre os atos administrativos praticados por
outro Poder. São exemplos deste tipo de controle a apreciação das contas do
Executivo e do Judiciário pelo Legislativo; a auditoria do Tribunal de Contas sobre a
efetivação de determinada despesa do Executivo; a anulação de um ato do
Executivo por decisão judicial; a sustação de ato normativo do Executivo pelo
Legislativo (CF, art. 49, V), dentre outros.
3.2.4.3. Controle popular:
É
aquele
exercido
pelos
administrado.
Inúmeros
mecanismos
constitucionalmente previstos possibilitam a verificação da regularidade da atuação
da Administração e impedem a prática de atos ilegítimos, lesivos ao indivíduo ou à
coletividade, e possibilitam a reparação dos danos decorrentes da prática de tais
atos. A ação popular é e o mandado de segurança são os exemplos mais comuns
deste controle.
60
MEIRELLES, HELY LOPES. Direito Administrativo Brasileiro. 32. ed. Malheiros Editores, 2006,
p. 665.
43
3.2.5. Quanto ao aspecto a ser controlado
3.2.5.1. Controle de legalidade ou legitimidade
É o controle em que se verifica se o ato foi praticado em conformidade com a
lei, confrontando-se a conduta administrativa e a conduta jurídica, que pode estar na
Constituição Federal, na lei ou mesmo em ato administrativo de caráter normativo. O
controle de legalidade ou legitimidade pode ser exercido pelo Executivo, Legislativo
ou Judiciário. Enquanto o Executivo o faz de ofício ou mediante provocação recursal,
o Legislativo só o faz nos casos expressos na Constituição, e o Judiciário mediante
provocação do interessado através de ação adequada.
Sobre a matéria Diógenes Gasparini se manifesta da seguinte forma:
O controle de legalidade é o que se preordena a verificar a
conformação, ou não, da atuação administrativa com a ordem
jurídica para confirmá-la ou desfazê-la. A conformação, ou não, da
atuação administrativa há de se dar com as normas jurídicas, que
vão desde a Constituição até as instruções normativas. Pode ser
realizado tanto pela Administração Pública como pelo Judiciário.
Assim, a extinção de um ato administrativo ilegal pelo Judiciário ou
pela própria Administração Pública é controle de legalidade. 61
3.2.5.2. controle de mérito:
É aquele realizado pela Administração Pública visando verificar a eficiência, a
oportunidade e a conveniência do ato controlado para o interesse público.
Para Hely Lopes o mérito administrativo consubstancia-se “na valoração dos
motivos e na escolha do objeto do ato, feitas pela Administração incumbida de sua
prática, quando autorizada a decidir sobre a conveniência, oportunidade e justiça do
ato a realizar”. 62 Conveniência e oportunidade são valorações feitas internamente
pela própria Administração sendo que a eficiência é constatada pela análise do
61
GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. São Paulo: Saraiva. 13. 2008, p. 947.
62
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 32. ed. Malheiros Editores, 2006, p.
154-155.
44
trinônimo
custo-tempo-benefício,
através
do
desenvolvimento
da
atividade
programada pela Administração e da produtividade de seus servidores.
Na opinião de Cretella Júnior:
“O mérito é o binômio consubstanciado nos vocábulos
“oportunidade”e “conveniência”. Mérito do ato administrativo é o
aspecto do ato administrativo que consulta a conveniência e a
oportunidade da medida tomada. Mérito é a indagação da
oportunidade e conveniência do ato, é a zona franca em que à
vontade do administrador resolve sobre as soluções mais
adequadas ao interesse público, é a sede do poder discricionário do
administrador, que se orienta por critérios de utilidade”. 63
O mérito administrativo localiza-se nos atos administrativos discricionários. E
por ato discricionário entenda-se o ato administrativo que possui, além de elementos
vinculados adstritos à lei que são a competência, a finalidade e a forma, outros que
são motivo e objeto, em relação aos quais a Administração é livre para decidir.
Apesar da divergência existente por haverem doutrinadores modernos que admitem
o mérito também nos aspectos da forma do ato administrativo. Por sua vez, o mérito
administrativo não está presente nos atos administrativos vinculados, que são
aqueles nos quais a Administração está adstrita à lei em todos os seus requisitos. É
o que diz Hely Lopes:
Nos atos vinculados, não há faculdade de opção do administrador,
mas unicamente a possibilidade de verificação dos pressupostos de
direito e de fato que condicionam o processus administrativo, não há
falar em mérito, visto que toda a atuação do Executivo se resume no
atendimento das imposições legais. 64
Deste modo, percebe-se que o mérito administrativo incide no motivo e no
objeto dos atos discricionários, quando o administrador tem certa liberdade para
valorar o motivo e escolher o objeto. O controle do mérito, inicialmente tratado, é
63
CRETELLA JÚNIOR, José. Manual de direito Administrativo. 6 ª ed. Rio de Janeiro: Forense,
1998. p. 153-154.
64
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 32. ed. Malheiros Editores, 2006, p.
155.
45
feito pela própria Administração e visa perquirir se aquele ato discricionário realizado
deixou, em certo momento, de ser conveniente e oportuno, em caso afirmativo,
poderá e deverá ser revogado pela Administração, com a finalidade de se atender
ao interesse público.
46
4 CONTROLE JUDICIAL DO ATO ADMINISTRATIVO
4.1 Aspectos Gerais
Sempre que o Judiciário é solicitado a resolver uma lide entre a administração
pública e um administrado, ocorre controle judicial de um ato administrativo. E é ao
Judiciário que incumbe dizer se o ato foi praticado em obediência aos preceitos
legais de direito.
Tal controle existe para que o administrado não fique a mercê de eventuais
lesões ou danos causados por atos praticados pela administração em desacordo
com a lei.
Sobre a importância deste controle para o nosso Estado, leciona a Prfª. Di
Pietro:
“o controle judicial constitui, juntamente com o princípio da
legalidade, um dos fundamentos em que repousa o Estado de
Direito. De nada adiantaria sujeitar-se a Administração Pública à lei
se seus atos não pudessem ser controlados por um órgão dotado de
garantias de imparcialidade que permitam apreciar e invalidar os
atos ilícitos por ela praticados”. 65
Do mesmo modo assevera Seabra Fagundes:
“No Estado brasileiro ainda mais se acentua a importância do
controle jurisdicional sobre os atos administrativos, porque, sendo o
regime
presidencial,
caracteriza-se,
particularmente,
pela
supremacia do Poder Executivo sobre o Legislativo, cujo controle
sobre aquele é insignificante. Praticamente, no Poder Judiciário está
o único elemento fiscalizador das atividades executivas”. 66
Por adotarmos no Brasil o sistema de jurisdição única, como dito
anteriormente, sempre que houver qualquer questionamento a respeito de aplicar a
lei a um caso concreto, cabe unicamente ao Poder Judiciário decidir de forma
65
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 20. ed. São Paulo: Atlas, 2007, p. 689.
66
FAGUNDES, Miguel Seabra. O controle dos atos administrativos pelo Poder Judiciário. 3. ed.
Rio de Janeiro: 1957. p. 128.
47
definitiva a forma adequada de aplicação. Assim, cabe ao Judiciário controlar a
legalidade e legitimidade dos atos da administração pública. 67
Cumpre ressaltar os ensinamentos de Alexandre de Moraes ao abordar o
princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional presente na Constituição
Federal de 1988, em seu artigo 5º inciso XXXV, no qual prevê que a lei não excluirá
da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito. Para o autor este
princípio garante a apreciação, por parte do Judiciário, de todo ato administrativo
que implique em lesão ou ameaça a direitos, independentemente do ato ser
vinculado ou discricionário, pois ambos são capazes de causar uma lesão ao direito
do administrados. 68
Nessa linha de raciocínio, Hely Lopes Meirelles afirma que os atos
administrativos devem observar a lei e os princípios que regem a administração
pública. Vejamos:
Todo ato administrativo, de qualquer autoridade ou Poder, para ser
legítimo e operante, há que ser praticado em conformidade com a
norma legal pertinente (princípio da legalidade), com a moral da
instituição (princípio da moralidade), com a destinação pública
própria (princípio da finalidade), com a divulgação oficial necessária
(princípio da publicidade) e com presteza e rendimento funcional
(princípio da eficiência). Faltando, contrariando ou desviando – se
desses princípios básicos, a Administração Pública vicia o ato,
expondo-o a anulação por ela mesma ou pelo Poder Judiciário, se
requerida pelo interessado. 69
Dessa forma, existem dois tipos de atos que sofrem a verificação da sua
legalidade e legitimidade: os atos vinculados e os discricionários. Quanto aos atos
vinculados, não há muita discussão, pois estes deverão ser cumpridos estritamente
de acordo com a lei. Assim, se o agente público, ao cumprir um ato vinculado, não o
67
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 22. ed. São Paulo:
Malheiros editores, 2006, p. 916.
68
MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. São
Paulo: Atlas, 2002, p. 291-292.
69
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 32. ed., São Paulo: Malheiros
Editores, 2006, p. 808.
48
fez de modo a cumprir o que está previsto no dispositivo legal, o seu ato é passível
de anulação. O professor Edimur Ferreira de Faria assim conceitua os atos
vinculados:
São denominados atos vinculados ou editados em virtude do poder
vinculado ou regrado aqueles em que o agente público não tem
oportunidade de escolha. A lei já lhe traçou previamente a direção e
a conduta que deve adotar, ante o caso concreto. Nessa hipótese, a
norma traça a linha que servirá de pauta para o agente editor do ato.
A ele não é facultada a escolha; terá de praticar o ato no momento,
nas condições, e modos preditos pela norma jurídica. O
comportamento comissivo em desacordo com esse regramento
conduz à nulidade do ato e o omissivo enseja o questionamento em
juízo pelo interessado, contra a inércia do agente. Em razão dessas
circunstâncias é que se diz que o ato é vinculado ou regrado. 70
Já o ato discricionário é aquele em que a lei atribui ao agente uma liberdade
de atuação para adequar o ato sob os critérios de conveniência e oportunidade, mas
sempre visando o interesse público. Acerca da discricionariedade, O Profº. Celso
Antônio Bandeira de Mello afirma que a margem de “liberdade conferida pela lei ao
administrador a fim de que este cumpra o dever de integrar com sua vontade ou
juízo a norma jurídica, diante do caso concreto, segundo critérios subjetivos
próprios, a fim de dar satisfação aos objetos consagrados no sistema legal.” 71
Outro conceito de discricionariedade que pode ser aqui mostrado e observado
é o do doutrinador Diógenes Gasparini:
Discricionários são os atos administrativos praticados pela
Administração Pública conforme um dos comportamentos que a lei
prescreve. Assim, cabe à Administração Pública escolher dito
comportamento. Essa escolha, se faz por critérios de conveniência e
oportunidade, ou seja, de mérito. Há conveniência sempre que o ato
interessa, convém ou satisfaz ao interesse público. Há oportunidade
quando o ato é praticado no momento adequado à satisfação do
interesse público. São juízos subjetivos do agente competente sobre
70
FARIA, Edimur Ferreira de. Curso de direito administrativo positivo. 4. ed., Belo Horizonte: Del
Rey, 2001, p. 242
71
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 22. ed. São Paulo:
Malheiros editores, 2006, p. 414.
49
certos fatos e que levam essa autoridade a decidir de um ou de
outro modo. 72
Uma simples análise a respeito dos atos administrativos nos permite concluir
que o ato administrativo discricionário é passível de apreciação pelo Judiciário pois
este possui elementos de natureza vinculada, ou seja, devem seguir os ditames da
lei. Sobre o que foi afirmado, o professor Hely Lopes Meirelles diz:
Por aí se vê que a discricionariedade é sempre relativa e parcial,
porque, quanto à competência, à forma e à finalidade do ato, a
autoridade está subordinada ao que a lei dispõe, como para
qualquer ato vinculado. Com efeito, o administrador, mesmo para a
prática de ato discricionário, deverá ter competência legal para
praticá-lo; deverá obedecer a forma legal para sua realização; e
deverá atender à finalidade legal de todo ato administrativo, que é o
interesse público. O ato discricionário praticado por autoridade
incompetente, ou realizado por forma diversa da prescrita em lei, ou
informado de finalidade estranha ao interesse público, é ilegítimo e
nulo. Em tal circunstancia, deixaria de ser ato discricionário para ser
ato arbitrário – ilegal, portanto. 73
A apreciação do ato discricionário é possível quando este se torna arbitrário e,
portanto, passível de anulação. Se o agente administrativo não observa os limites da
discricionariedade e os ultrapassa, esse agente está praticando um ato arbitrário.
Com relação à arbitrariedade no ordenamento jurídico vejamos os ensinamentos do
doutrinador José Cretella Júnior:
Nos Estados de direito, em que rege o principio da legalidade, o
Poder Público não pode ser arbitrário, mas condicionado por normas
que lhe ditam os meios de agir. O Estado impõe a ordem jurídica e
ele mesmo se subordina a esta ordem jurídica. A máxima, suporta a
lei que fizeste rege todos os cidadãos, mas rege também o próprio
Estado. Se o Estado transgride a norma, se o agente público
procede de modo contrário ao sistema jurídico, está procedendo
ilegalmente. É o que se denomina, então, poder arbitrário do agente
público. 74
72
GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo. 13ed. Saraiva, 5 ed., São Paulo: Saraiva, 2008, p.
98.
73
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 28. ed. São Paulo: Malheiros
Editores, 2003, p. 115.
74
CRETELLA, Júnior José. Manual de Direito Administrativo.Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 148
50
A apreciação dos atos administrativos discricionários pelo Judiciário, em
relação aos seus elementos vinculados, não há divergência entre os doutrinadores
pois todos concordam que o ato administrativo discricionário deve ser passível de
apreciação pelo Judiciário quando faltar-lhe legalidade ou legitimidade.
A divergência doutrinária se encontra na apreciação do mérito administrativo
pelo Judiciário. Para Hely Lopes Meirelles: “O mérito administrativo consubstanciase, portanto, na valoração dos motivos e na escolha do objeto do ato, feitas pela
administração incumbida de sua prática, quando autorizada a decidir sobre a
conveniência, oportunidade e justiça do ato a realizar.” 75
Desse modo, a divergência existente acerca do controle judicial dos atos
administrativos é sobre a possibilidade de o Poder Judiciário controlar o mérito do
ato administrativo, quando coube ao agente público decidir com base na
conveniência e oportunidade qual a melhor escolha a ser feita pelo bem do interesse
público.
Duas são as correntes existentes. Uma que defende que a apreciação do
Judiciário deve ser apenas quanto à legalidade e legitimidade do ato, não podendo
adentrar nos quesitos de conveniência e oportunidade, pois neste caso o Poder
Judiciário estaria interferindo na seara do Poder Executivo e outra que defende a
apreciação do mérito do ato por parte do Judiciário quando o ato resulte em lesão ou
ameaça a direito dos administrados, não importando sua natureza, com base no
artigo 5º inciso XXXV da Constituição Federal. São elas as correntes clássica e
moderna.
4.2 Doutrina clássica
A corrente contrária à apreciação do mérito administrativo pelo Poder
Judiciário tem por base o princípio constitucional da separação dos poderes, o qual
diz que os poderes são independentes e harmônicos entre si, não admitindo
interferência nas funções precípuas de cada um.
75
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 32. ed. São Paulo: Malheiros
Editores, 2006, p. 154-155.
51
Nesse sistema visa-se um equilíbrio entre os três poderes de modo que
possam trabalhar em conjunto, sob fiscalização recíproca. Sistema esse conhecido
por tripartição dos poderes. Sobre a matéria o doutrinador constitucional Alexandre
de Moraes nos ensina:
Ocorre, porém, que, apesar de independentes, os poderes de
Estado devem atuar de maneira harmônica, privilegiando a
cooperação e a lealdade institucionais e as práticas de guerrilhas
institucionais, que acabam minando a coesão governamental e a
confiança popular na condução dos negócios públicos pelos agentes
políticos. Para tanto, a Constituição Federal consagra um complexo
mecanismo de controles recíprocos entre os três poderes, de forma
que, ao mesmo tempo, um Poder controle os demais e por eles seja
controlado. Esse mecanismo denomina-se teoria dos freios e
contrapesos. 76
O controle do mérito pelo Judiciário sofre uma grande resistência da corrente
clássica, pois estes acham que, no que tange ao alcance do controle dos atos
administrativos, não cabe ao Poder Judiciário adentrar no juízo de conveniência,
oportunidade ou eficiência da Administração, nem na valoração dos motivos ou na
escolha do objeto, que caracterizam o mérito administrativo. Para eles, deve o
Judiciário limitar-se a apreciá-lo sob o prisma da legalidade e legitimidade.
Ao lado da doutrina tradicional está Seabra Fagundes que diz:
Ao Poder Judiciário é vedado apreciar, no exercício do controle
jurisdicional, o mérito dos atos administrativos. Cabe-lhes examinálos, tão somente , sob o prisma da legalidade. Este é o limite do
controle, quanto à extensão. [...]. O mérito é de atribuição exclusiva
do Poder Executivo, e o Poder Judiciário, nele penetrando, “faria
obra de administrador, violando, dessarte, o princípio de separação
e independência dos poderes”94. Os elementos que o constituem
são dependentes de critério político e meios técnicos peculiares ao
exercício do Poder Administrativo, e estranhos ao âmbito
estritamente jurídico, da apreciação jurisdicional. A análise da
legalidade tem um sentido puramente jurídico.” 77
76
MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. São
Paulo: Atlas, 2002, p. 137-138.
77
FAGUNDES, Miguel Seabra. O controle dos atos administrativos pelo Poder Judiciário. 3. ed.
Rio de Janeiro: 1957. p. 167-168.
52
Hely Lopes Meirelles, um dos defensores da não apreciação judiciário do
mérito administrativo, faz suas considerações em relação à matéria:
Ao Poder Judiciário é permitido perquirir todos os aspectos de
legalidade e legitimidade para descobrir e pronunciar a nulidade do
ato administrativo onde ela se encontre, e seja qual for o artifício que
a encubra. O que não se permite ao Judiciário é pronunciar – se
sobre o mérito administrativo, ou seja, sobre a conveniência,
oportunidade, eficiência ou justiça do ato, porque, se assim agisse,
estaria emitindo pronunciamento de administração, e não de
jurisdição judicial. O mérito administrativo, relacionando – se com
conveniências do Governo ou com elementos técnicos, refoge do
âmbito do Poder Judiciário, cuja missão é de aferir a conformação
do ato com a lei escrita, ou, na sua falta, com os princípios gerais do
Direito. 78
Do mesmo modo pensa Diógenes Gasparini que também expressa sua clara
sua posição contrária a sujeição do mérito administrativo ao controle jurisdicional:
Costuma-se, sem muito cuidado, dizer que o ato administrativo
discricionário é insuscetível de exame pelo Judiciário. Tal afirmação
não é verdadeira. O que não se admite em relação a ele é o exame
por esse Poder da conveniência e da oportunidade, isto é, do mérito
da decisão tomada pela Administração Pública, conforme vêm
decidindo nossos Tribunais (RF, 225:96 e RT 446:213). 79
Farta é a jurisprudência neste sentido, especialmente no Superior Tribunal de
Justiça. Eis alguns julgados:
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 2ª Turma. Recurso Ordinário
em Mandado de Segurança nº 129 Ementa: Reexame do mérito
pelo poder judiciário. A independência e autonomia dos poderes
registram nítida distinção entre a instancia judiciária e a
administrativa. O mérito do ato administrativo, entendido como juízo
de oportunidade e conveniência é próprio do administrador. Vedado
ao judiciário substituí-lo. Admissível, porém, analisar os
fundamentos da decisão para concluir se a opção guarda respaldo
jurídico. Dentre conclusões legalmente admissíveis, a administração
escolhe a que melhor atenda o interesse público. Resta ao judiciário
julgar a conformidade do ato com o direito. Relator: Ministro Luiz
78
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 32. ed., São Paulo: Malheiros
Editores, 2006, p. 707-708
79
GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo, 13 ed. São Paulo: Saraiva, 2008, pg. 99-100.
53
Vicente Cernicchiaro. Brasília, DF, 14 mar. 90. DJ de 02.4.90, p.
24. 80
Neste acórdão defende-se o sistema da tripartição dos poderes sem que haja
a interferência da instância judiciária na administrativa. Nítido o receio do julgado em
não invadir a esfera do agente executivo.
ADMINISTRATIVO – ANISTIA – PROCESSO ADMINISTRATIVO –
DEMORA NA APRECIAÇÃO – OMISSÃO.
1. É certo que não incumbe ao Judiciário adentrar no mérito
administrativo substituindo o juízo de valor a ser proferido pela
Administração Pública. Sem embargo, insere-se no âmbito do
controle judicial a aferição da legalidade dos atos administrativos.
Donde sobressai a necessidade de o Estado cumprir os prazos
legais e regulamentares de tramitação e apreciação do processo
administrativo, notadamente quando envolvem interesses de
particular.
2. No caso presente, o processo perdura há mais de quatro anos;
tempo suficiente a ensejar um pronunciamento da Administração
Pública. O acúmulo de serviço não representa uma justificativa
plausível para morosidade estatal, pois o particular tem
constitucionalmente assegurado o direito de receber uma resposta
do Estado à sua pretensão. Precedente: MS 10792/DF; Rel. Min.
Hamilton Carvalhido, DJ 21.8.2006.
Ordem concedida, para determinar que a autoridade coatora aprecie
o processo administrativo do impetrante em 60 dias.
Relator: Ministro HUMBERTO MARTINS. Brasília, DF, 28 fev. 07. DJ
de 12.3.07, p. 185. 81
Depreende-se deste julgado que a conveniência e oportunidade do ato
administrativo discricionário não estão contempladas, em princípio, no controle
jurisdicional do Estado.
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. AUDITOR
FISCAL. PENA DE DEMISSÃO. PROCESSO ADMINISTRATIVO.
80
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 2ª Turma. MS nº 129, Relator: Luiz Vicente Cernicchiaro.
Brasília, DF, 14 mar 90. DJ de 02.4.90, p. 2453.
81
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Primeira Seção. MS 10478 / DF, Relator: Humberto Martins.
Brasília, DF, 28 fev. 07. DJ de 12.03.2007 p. 185.
54
RELATÓRIO DA COMISSÃO DISCIPLINAR. POSSIBILIDADE DE
APLICAÇÃO DE PENA DIVERSA. AUTORIDADE COMPETENTE.
REEXAME DO MÉRITO ADMINISTRATIVO. IMPOSSIBILIDADE.
RECURSO ORDINÁRIO IMPROVIDO.
1. Consoante firme jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça,
no âmbito do controle jurisdicional do processo administrativo
disciplinar, compete ao Poder Judiciário apreciar apenas a
regularidade do procedimento, à luz dos princípios do contraditório,
da ampla defesa e do devido processo legal.
2. A gravação de conversa realizada por um dos interlocutores é
considerada como prova lícita, não configurando interceptação
telefônica, e serve como suporte para o oferecimento da denúncia,
tanto no que tange à materialidade do delito como em relação aos
indícios de sua autoria. Precedentes.
3. Configurada a hipótese de flagrante esperado, não há falar em
crime impossível e, conseqüentemente, em prova ilícita.
4. O art. 190 da Lei Complementar Estadual 68/92 exige apenas que
os membros da comissão processante sejam servidores estáveis do
quadro do Estado de Rondônia, não vedando que exerçam,
também, funções comissionadas.
5. A decisão que aplicou ao recorrente a pena de demissão, com
impedimento de assumir cargo público pelo prazo de 5 anos, nos
termos do art. 170, § 1º, da Lei Complementar Estadual 68/92,
encontra-se devidamente fundamentada. Ademais, todas as
garantias constitucionais foram asseguradas a ele no decorrer do
processo administrativo, em que foi assistido por advogado e
apresentou defesa.
6. Recurso ordinário improvido.
Relator: Ministro Arnaldo Esteves Lima. Brasília, DF, 10 out. 06. DJ
de 30.10.06, p. 335. 82
Também neste acórdão, o Ministro do Arnaldo Esteves manifesta o
entendimento de que não cabe ao Judiciário adentrar no juízo administrativo,
devendo o Judiciário analisar apenas a regularidade do processo, ou seja, a sua
legalidade e legitimidade.
4.3 Doutrina moderna
82
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Quinta Turma. RMS 19785 / RO, Relator: Arnaldo Esteves
Lima. Brasília, DF, 10 out. 06. DJ de 30.10.2006 p. 335.
55
A doutrina a favor da apreciação do mérito administrativo pelo Poder
Judiciário surgiu com o advento da Constituição Federal de 1988, que segundo eles
traz um entendimento de administração pública democrática, em que deve dar
liberdade ao Poder Judiciário para apreciar de forma ampla os atos administrativos,
mesmo aqueles compostos de discricionariedade. Essa corrente chama essa nova
fase de constitucionalização da administração pública.
Para essa corrente, os princípios trazidos pela na Carta Magna visam o
interesse público e por isso admitem a interpretação acima, já que o impedimento de
se
questionar
em
juízo
os
critérios
de
discricionariedade
utilizados
administrativamente não está em consonância com as regras da boa administração
e com a finalidade da própria administração pública.
Tais ensinamentos são abordados na obra do doutrinador Alexandre de
Moraes como veremos a seguir:
A Constituição da Republica de 1988, ao constitucionalizar os
princípios e preceitos básicos da Administração Pública, permitiu um
alargamento da função jurisdicional sobre os atos administrativos,
consagrando a plena incidência do controle de constitucionalidade.
Essa permissão, juntamente com a característica aberta dos
princípios e preceitos constitucionais básicos sobre Administração
Pública, acabou por ampliar a ingerência do Poder Judiciário nos
negócios da Administração Pública (...) 83
De forma semelhando, o Prof. Fábio Barbalho Leite fala sobre a possibilidade
do controle judicial do ato administrativo, fazendo referência à Constituição da
República:
Ora, podendo os atos da Administração Pública tanto ameaçar como
efetivamente lesar os direitos dos administrados, e, diante, dos
princípios retro mencionados, advém à óbvia possibilidade do
exame judicial dos atos administrativos. E também, se essa
possibilidade advém da própria Constituição Federal de 1988, é
igualmente óbvio que ao Judiciário lhe é permitido examinar atos
83
MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. São
Paulo: Atlas, 2002, p. 768
56
administrativos quando desrespeitam os requisitos constitucionais
da legalidade, moralidade e eficiência. 84
Frente aos princípios esculpidos na Constituição Federal 1988, especialmente
o da legalidade, o da moralidade administrativa e o da eficiência, notória a força que
ganhou a doutrina moderna na defesa da apreciação jurisdicional dos atos
administrativos, tanto dos vinculados como dos discricionários. É esta a opinião de
Celso Antônio Bandeira de Mello:
Assim como ao Judiciário compete fulminar todo comportamento
ilegítimo da Administração que apareça como frontal violação da
ordem jurídica, compete-lhe, igualmente, fulminar qualquer
comportamento administrativo que a pretexto de exercer apreciação
ou decisão discricionária, ultrapassar as fronteiras dela, isto é,
desbordar dos limites de liberdade que lhe assistiam, violando, por
tal modo, os ditames normativos que assinalam os confins da
liberdade discricionária. 85
Nesse passo é o raciocínio do Prof. José Ribamar Barreiro Soares, o qual
defende que:
A doutrina clássica do controle judicial dos atos administrativos já
não atende aos avanços do Estado Democrático de Direito. A
tendência atual é no sentido de permitir o controle judicial dos atos
administrativos também quanto ao seu mérito, ou seja, a
conveniência e a oportunidade, no que tange ao aspecto da
moralidade administrativa. A solução de equilíbrio no que diz
respeito à extensão do controle judicial do ato administrativo será
aquela que permita, na defesa do interesse público, a bem da
moralidade do ato administrativo e com base nos princípios da boa
administração e do atendimento ao melhor interesse público, a
anulação dos atos administrativos por motivo de conveniência e
oportunidade, quando sob o manto de tais aspectos, escondam-se
intenções escusas, imorais e maliciosas por parte do administrador
público, violando os princípios que norteiam a moralidade pública, a
boa administração e o melhor atendimento. 86
84
LEITE, Fábio Barbalho. O controle dos atos administrativos. Revista dos Tribunais, São Paulo,
vol. 6, nº 25. out/dez. 1998, p. 225.
85
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 22. ed. São Paulo:
Malheiros editores, 2006, p. 429.
86
SOARES, José Ribamar Barreiros. O Controle judicial do mérito administrativo. Brasília:
Brasília Jurídica, 1999. p. 9-10.
57
A finalidade é outro princípio que deve ser sempre observado de modo que,
ao verificar qualquer tipo de distorção que torne a finalidade diversa do interesse
público, o ato deve ser anulado de imediato. Celso Antônio Bandeira de Mello faz
uma relação entre o poder discricionário e a obrigação de se atender o interesse
público como finalidade:
Se a lei regula vinculadamente a conduta administrativa, está com
isto declarando saber qual o comportamento único que, a seu juízo,
atenderá com exatidão, nos casos concretos, ao interesse público
por ela almejado. Daí que se pré-selecionou o ato a ser praticado e
o fez obrigatório, excluindo qualquer interferência do administrador
na apreciação dos fatos deflagradores da aplicação da norma e
qualquer avaliação quanto à providência mais adequada para
atender a finalidade legal. Uma vez que, no comum dos casos de
discricionariedade, teria sido perfeitamente possível redigir a lei em
termos vinculados, tem-se de concluir que a única razão lógica
capaz de justificar a outorga de discrição reside em que não se
considerou possível fixar, de antemão, qual seria qual seria o
comportamento administrativo pretendido como imprescindível e
reputado capaz de assegurar, em todos os casos, a única solução
prestante para atender com perfeição o interesse público que
inspirou a norma. Daí a outorga da discricionariedade para que o
administrador – que é quem se defronta com os casos concretos –
pudesse, ante a fisionomia própria de cada qual, atinar com a
providência apta a satisfazer rigorosamente o intuito legal. 87
O doutrinador explica que o exame a análise judiciária deve primeiramente
avaliar se há ou não discricionariedade e posteriormente, o seu limite. O que será
colocado sob análise do judiciário é se houve ou não excessos na livre atuação do
agente público, se agindo discricionariamente este não usurpou do ato
administrativo para se beneficiar ou a terceiro.
A
vinculação
dos
atos
administrativos
discricionários
aos
princípios
constitucionais é uma forma de se evitar que o interesse particular se sobressaia ao
interesse público pois do contrário, poderão os agentes públicos se esconder atrás
dos atos discricionários para atingir as finalidades que lhes convêm.
Nesse sentido, o constitucionalista Alexandre de Moraes deixa sua
contribuição: ‘Assim, mesmo o ato administrativo discricionário está vinculado ao
87
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Discricionariedade e Controle Jurisdicional. 2. ed. São
Paulo: Malheiros editores, 2003, p. 33.
58
império constitucional e legal, pois, como muito bem ressaltado por Chevalier, “o
objetivo do Estado de Direito é limitar o poder do Estado pelo Direito”’ 88
Vejamos agora decisões judiciais que seguem o entendimento da doutrina
moderna a respeito da apreciação do mérito administrativo por parte do Judiciário.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 1ª Primeira Seção. REsp
443310 Ementa: Administrativo. Ação ordinária. Impugnação de
multa. Art. 630, §5º da CLT. Transporte dos fiscais do trabalho.
Passe livre. Linha Seletiva. Discricionariedade do ato administrativo.
Controle. Possibilidade. Princípios da razoabilidade e da
proporcionalidade do Ato.
1. Ação ordinária ajuizada pela recorrente, em que impugnou a
multa aplicada por violação ao art. 630, § 5º da CLT, porquanto, no
seu entender, é obrigada a conceder a gratuidade legal apenas no
tocante ao transporte comum, não se estendendo o referido
benefício ao transporte seletivo, que conduz um número menor de
passageiros, dispondo de comodidades como ar condicionado,
televisão, som ambiente, que o serviço comum não possui, tendo
acentuado, ainda, que os passageiros optantes pelo transporte
seletivo, pagam uma tarifa maior em razão do diferencial do serviço
prestado.
2. A atuação da Administração Pública deve seguir os parâmetros
da razoabilidade e da proporcionalidade, que censuram o ato
administrativo que não guarde uma proporção adequada entre os
meios que emprega e o fim que a lei almeja alcançar.
3. A razoabilidade encontra ressonância na ajustabilidade da
providência administrativa consoante o consenso social acerca do
que é usual e sensato. Razoável é conceito que se infere a contrário
sensu; vale dizer, escapa à razoabilidade "aquilo que não pode ser".
A proporcionalidade, como uma das facetas da razoabilidade revela
que nem todos os meios justificam os
fins. Os meios conducentes à consecução das finalidades, quando
exorbitantes, superam a proporcionalidade, porquanto medidas
imoderadas em confronto com o resultado almejado.
4. É excepcional a intervenção estatal no domínio econômico,
máxime no sistema de livre iniciativa. Sob esse pálio, a intervenção
há de se pautar pela razoabilidade, que in casu,
recomenda que a concessão de passe livre aos fiscais do trabalho
mantenha a finalidade de viabilizar o bom andamento do seu serviço
à luz do princípio da menor onerosidade possível. Havendo linhas
regulares, com o mesmo itinerário, não há razoabilidade em que os
fiscais utilizem-se gratuitamente de um serviço prestado
seletivamente. O fato de a lei conceder a esses servidores a
possibilidade de deslocamento, não significa que deva ser no meio
de transporte mais oneroso.
5. Recurso especial conhecido e improvido.
88
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional Administrativo. 3. ed. São Paulo: Editora Ática,
2006, p. 135-136.
59
Relator: Min. Luiz Fux. Data de Julgamento: 21.10.03. DJ de
3.11.03, p. 249. 89
Neste acórdão permite-se a atuação judicial no controle do mérito haja vista
que deve a Administração obedecer aos princípios da proporcionalidade e
razoabilidade. Assim, depreende-se do acórdão que deve haver uma coerência e
proporção entre o ato escolhido e o seu objetivo, sempre com interesse público.
AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONCURSO. POLÍCIA FEDERAL.
EXAMES MÉDICOS. ATRASO DE CINCO MINUTOS NA
ENTREGA.
PRINCÍPIOS
DA
RAZOABILIDADE
E
DA
PROPORCIONALIDADE.
1. Considera-se desarrazoada e desproporcional a eliminação de
candidato em concurso em razão de ter comparecido para
apresentação dos exames médicos com atraso de apenas cinco
minutos do prazo fixado pela Administração.
2. Data de entrega dos exames médicos coincidente com
feriado municipal, dia da Padroeira de Salvador, acarretando
congestionamentos em toda a redondeza da festividade,
ocasionando o atraso em referência.
3. Aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.
4. Ausência de prejuízo à Administração e de violação ao
princípio da isonomia. 5. Agravo improvido.
Relator: Selene Maria de Almeida. Brasília, DF, 31 maio. 06. DJ de
29.06.06, p. 98. 90
Outro precedente que analisou critérios de razoabilidade e proporcionalidade
para adentrar no mérito do ato administrativo, o acórdão acima entendeu que a
administração não foi razoável e proporcional ao não aceitar os exames médicos de
um candidato em concurso público porque ele se atrasara cinco minutos. O
congestionamento na cidade em dia de feriado justificaria o atraso do candidato em
tempo irrisório. O acórdão ainda argumentou que a administração não teve prejuízo
com o atraso e com base em tais argumentos anulou o ato administrativo que
eliminou o candidato em razão do atraso.
89
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 1ª Turma. REsp. nº 443310, Relator: Luiz Fux. Brasília, DF,
13 out. 99. DJ de 06.12.99, p. 62
90
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL. 5ª Turma. AG 2005.01.00.012078-5, Relatora: Selene Maria de
Almeida. Brasília, DF, 31 maio. 06. DJ de 29.06.06, p.98.
60
ADMINISTRATIVO. ENSINO. PROCESSO ADMINISTRATIVO.
SANÇÃO DISCIPLINAR EM VIRTUDE DO FURTO DE ANIMAIS NO
INTERIOR DO ESTABELECIMENTO DE ENSINO. CONTROLE
JUDICIAL. POSSIBILIDADE. PROPORCIONALIDADE E
RAZOABILIDADE. FATO CONSUMADO.
1. Impetrou-se mandado de segurança com objetivo de afastar
sanção disciplinar, em virtude do furto de animais no interior de
escola agrotécnica, que culminou com a perda do direito dos
impetrantes de freqüentarem o curso técnico na instituição de
ensino, quando restavam apenas 45 (quarenta e cinco) dias letivos
para concluí-lo.
2. Não procede a argumentação de que ao Poder Judiciário é
defeso ingressar no campo próprio da discricionariedade do
administrador, sob pena de ferir a regra de independência dos
poderes do Estado.
3. De fato, na concepção tradicional, o ato administrativo (a
expulsão do aluno subsume-se no conceito de ato administrativo) é
visto sob dois aspectos – o mérito e a legalidade - para efeito de só
permitir o controle judicial sobre a legalidade. Mas mesmo na teoria
tradicional é aceito o controle da existência e adequação dos
motivos, em relação ao objeto (conteúdo) do ato, matéria que, para
esse fim, é transportada para o campo da legalidade.
4. O mérito do ato administrativo está, sim, sujeito a controle judicial,
sob o critério de razoabilidade. O juiz não irá avaliar se o
administrador, como é de seu dever, fez o melhor uso da
competência administrativa, mas cabe-lhe ponderar se o ato
conteve-se dentro de padrões médios, de limites aceitáveis,
fora dos quais considera-se erro e, como tal, sujeito à anulação.
5. O conceito de razoabilidade, pela valoração que envolve, não
evita uma zona de penumbra, fenômeno que, ultrapassado o
racionalismo, tornou-se típico das instituições jurídicas. Na dúvida
sobre se um ato comporta-se ou não dentro de fronteiras razoáveis,
deve o juiz optar pela sua confirmação.
6. Na hipótese dos autos, ainda que a autoridade administrativa
repute grave a falta cometida pelos impetrantes/apelados, sua
expulsão, faltando apenas 45 (quarenta e cinco) dias letivos para a
conclusão do curso, mostra-se inconveniente e desnecessária,
acarretando desperdício de recursos.
7. Além disso, com base no princípio da praticidade recomenda-se
que seja respeitada a situação consolidada pela concessão da
segurança em meados de 2004, sob pena de injustiça maior, a esta
altura.
8. Há que se pensar, além da coerência lógica, no resultado prático
do julgamento, pois se aos impetrantes só restavam 45 (quarenta e
cinco) dias para terminar o curso, já devem tê-lo concluído.
9. Apelação e remessa oficial improvidas.
Relator: João Batista Moreira. Brasília, DF, 21 set. 05. DJ de
05.10.05, p. 44. 91
91
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL. 5ª Turma. AMS 2003.41.00.005383-0, Relator: João Batista Moreira.
Brasília, DF, 21 set. 05. DJ de 05.10.05, p.44.
61
Esse acórdão é mais explícito em combater a doutrina clássica, defendendo
que o Judiciário pode adentrar no campo da discricionariedade sem ferir o princípio
da separação dos poderes. O acórdão inclusive considerou o ato praticado
inconveniente e desnecessário, determinando a sua anulação. Este precedente,
apesar de adentrar no mérito administrativo, atentou-se aos limites aceitáveis.
ADMINISTRATIVO E
PROCESSUAL CIVIL. CONCURSO
PÚBLICO. REPROVAÇÃO DE CANDIDATO. PRETENSÃO DE
REVISÃO DO RESULTADO PELO PODER JUDICIÁRIO.
IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA. INEXISTÊNCIA.
1. A argumentação de que ao Poder Judiciário não é permitido
avaliar o conteúdo de resposta de questão em concurso público tem
a mesma natureza daquela segundo a qual o juiz não pode
ingressar no campo próprio da discricionariedade (discricionariedade
técnica) do administrador.
2. A reprovação de candidato em concurso público subsume-se no
conceito de ato administrativo.
3. O conteúdo do ato administrativo, ainda que o ato classificado
como discricionário, está, sim, sujeito a controle judicial, sob o
critério de razoabilidade.
4. O juiz não irá avaliar se o administrador, como é de seu dever, fez
o melhor uso da competência administrativa; no caso de um
concurso, se a banca examinadora elegeu como padrão a melhor
resposta para a questão, mas cabe-lhe ponderar (quando for o caso,
mediante instrução probatória) se o ato conteve-se dentro de limites
aceitáveis. Na dúvida sobre se o ato está ou não dentro do razoável,
deve optar por sua confirmação, preservando a solução dada pela
banca examinadora.
5. A barreira que tem sido oposta ao controle judicial do ato de
formulação e correção de provas, sob o rótulo de preservação da
discricionariedade da Administração, atende, na realidade, ao
objetivo prático de evitar a inundação do Poder Judiciário com
litígios dessa natureza, de difícil exame, pela quantidade e porque
dependentes da apreciação de matérias altamente especializadas. A
verdadeira razão é uma suposta impossibilidade material, não
impossibilidade jurídica.
6. Caberá ao ora apelante o ônus de demonstrar, mediante perícia
ou outro meio apropriado, que a opção eleita pela banca
examinadora está fora dos limites da razoabilidade, resultando a
dúvida em seu prejuízo. A dificuldade que terá
nessa empreitada não pode ser considerada, a priori,
impossibilidade jurídica do pedido.
7. Reforma de sentença em que foi indeferida a petição inicial.
8. Apelação provida.
Relator: Selene Maria de Almeida. Brasília, DF, 20 jan. 06. DJ de
20.03.06, p. 96. 92
92
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL. 3ª Seção. AC 2001.36.00.010081-9, Relatora: Selene Maria de
Almeida. Brasília, DF, 20 jan. 06. DJ de 20.03.06, p.96.
62
No supracitado acórdão a pretensão de rever o resultado de concurso público
pelo Judiciário é considerada impossível, mas por inviabilidade desta revisão
decorreu da inviabilidade material e não jurídica. Ainda que o ato administrativo não
tenha sido revisto judicialmente, clara é a posição da Seção de que mesmo o ato
administrativo discricionário está sujeito ao controle judicial.
63
CONCLUSÃO
O presente trabalho abordou posicionamentos da doutrina clássica e da
moderna acerca do “controle judicial dos atos administrativos” com o fito de analisar
a possibilidade ou não do Poder Judiciário examinar a discricionariedade
administrativa.
A atuação do agente público deve estar atrelada aos princípios basilares da
Administração Pública. Portanto, ilegal é a atuação do administrador que inobserva
quaisquer um destes princípios, pois estes são os alicerces de todo ordenamento
jurídico. Por óbvio que o ato manifestamente ilegal deva sofrer um controle, seja ele
qual for.
Nesta
monografia
tentamos
demonstrar
que,
até
mesmo
os
atos
discricionários são passíveis de controle judicial, desde que estejam em desacordo
com a lei. Embora o mérito administrativo tenha sido criado para que o administrador
público pudesse, diante do caso concreto, tomar a melhor providência para atender
o interesse público, sabe-se que não foi a intenção deixar uma abertura para o
administrador público atuar ilicitamente, ou seja, contrário à lei, às regras da boa
administração pública e aos princípios constitucionais em geral.
A discricionariedade é um elemento fundamental para que a Administração
Pública pratique seus atos, mas configura também um elemento de difícil
apreciação. A Administração não pode se utilizar dessa liberdade para manter o
Poder Judiciário inerte diante de eventuais abusos no uso deste elemento do ato
administrativo.
A liberdade de se escolher o momento mais oportuno e conveniente não pode
ser confundida com independência do agente público. Este, na verdade, é
completamente dependente dos princípios da administração pública trazidos pela
Constituição
Federal,
principalmente
os
princípios
da
razoabilidade,
da
proporcionalidade e da finalidade. A discricionariedade existe não como uma forma
de dar liberdade ao agente público e sim como uma forma que a administração
pública encontrou para poder superar o fato de não conseguir prever todas as
hipóteses no mundo dos fatos, concedendo assim ao agente público a
64
responsabilidade de decidir qual a forma que melhor atende o interesse público em
uma determinada situação.
Desse modo, não se pode permitir que o agente público atue, desonesta,
ineficaz e ilegalmente, ao fazer mau uso da coisa pública, com a justificativa de que
se está na seara da discricionariedade administrativa. A discricionariedade
administrativa é a liberdade para agir dentro dos limites legítimos que o
ordenamento jurídico impõe. Assim, pode o administrado pedir ao Poder Judiciário
que examine os atos discricionários para verificar se os atos são legítimos, ou seja,
se conformam-se com a lei e com os princípios e o juiz poderá e deverá examinar
tudo aquilo que importe lesão ou ameaça a direito do administrados.
Logo, se toda atuação do administrador público está pautada na estrita
observância aos princípios constitucionais, equivale dizer que todo ato produzido
pelo administrador público, no exercício de suas funções, deve se conformar com os
princípios constitucionais e com as regras da boa administração pública. Então,
conclui-se que, até mesmo os atos discricionários, estão obrigados a se nortearem
pelos mesmos princípios constitucionais e regras da boa administração aplicados
aos demais atos administrativos podendo sofre controle por parte do Poder
Judiciário sempre que houver algum vício, ainda que no mérito.
65
REFERÊNCIAS
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FARIA, Edimur Ferreira de. Curso de direito administrativo positivo. 4. ed. Belo
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GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2008.
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MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 32. ed. São Paulo:
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MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação
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______. Direito Constitucional Administrativo. 3. ed. São Paulo: Editora Ática, 2006.
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Horizonte: Del Rey, 2004.
PIRES, Antônio Cecílio Moreira. Manual de Direito Administrativo. São Paulo: WVC
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SOARES, José Ribamar Barreiros. O Controle judicial do mérito administrativo.
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SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 2ª Turma. MS nº 129, Relator: Luiz Vicente
Cernicchiaro. Brasília, DF, 14 mar 90. DJ de 02.4.90.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Primeira Seção. MS 10478 / DF, Relator:
Humberto Martins. Brasília, DF, 28 fev. 07. DJ de 12.03.2007 p. 185.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Quinta Turma. RMS 19785 / RO, Relator:
Arnaldo Esteves Lima. Brasília, DF, 10 out. 06. DJ de 30.10.2006 p. 335.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 1ª Turma. REsp. nº 443310, Relator: Luiz Fux.
Brasília, DF, 13 out. 99. DJ de 06.12.99, p. 62
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. 1ª Turma. RE 460.881, Relator: Sepúlveda
Pertence. Brasília, DF, 18 abr. 06. DJ de 12.05.06, p. 40.
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL. 5ª Turma. AG 2005.01.00.012078-5, Relatora:
Selene Maria de Almeida. Brasília, DF, 31 maio. 06. DJ de 29.06.06, p.98.
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL. 5ª Turma. AMS 2003.41.00.005383-0, Relator:
João Batista Moreira. Brasília, DF, 21 set. 05. DJ de 05.10.05, p.44.
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL. 3ª Seção. AC 2001.36.00.010081-9, Relatora:
Selene Maria de Almeida. Brasília, DF, 20 jan. 06. DJ de 20.03.06, p.96.
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